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Dissertação/Produto Final
BOA VISTA/RR
2023
JOANA SARMENTO DE MATOS
BOA VISTA/RR
2023
TERMO DE CIÊNCIA E AUTORIZAÇÃO PARA PUBLICAÇÃO DE TCC, TESES E
DISSERTAÇÕES ELETRÔNICAS NO SITE DA UERR
Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-graduação
como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título
de Mestre em Segurança Pública,
Direitos Humanos e Cidadania
pela Universidade Estadual de
Roraima.
BOA VISTA / RR
2023
JOANA SARMENTO DE MATOS
_______________________________________
Prof. Drª. Leila Chagas de Souza Costa (UERR)
(Presidente da Banca)
Universidade Estadual de Roraima – UERR
______________________________________
Prof. (a) Dr. (a) Fernando Cesar Costa Xavier
Universidade Estadual de Roraima
Membro Interno
_____________________________________
Prof. Dr. Regys Odlare Lima de Freitas
Universidade Estadual de Roraima -UERR
- Membro Titular
. ______________________________________
Prof. Dr. Rildo Dias da Silva - Membro Titular
Universidade Estadual de Roraima -UERR
- Membro Titular
_____________________________________________
Prof. Dr. Edgard Vinícius Cacho Zanette –
Suplente
À minha família e ao Henrique: luz em
momentos de escuridão.
AGRADECIMENTOS
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 10
2 CASOS QUE MERECEM SER LEMBRADOS PARA NÃO SEREM REPETIDOS:
BREVE HISTÓRICO DO CONTEXTO .......................................................................... 14
3 TEORIAS SOBRE AS DOENÇAS MENTAIS NO SISTEMA DE SAÚDE ................. 24
3.1 MAIS UMA VEZ COUTURE: ENTRE O DIREITO E A JUSTIÇA ........................... 28
3.2 MEDIDAS CÍVEIS E CRIMINAIS ............................................................................. 32
4 O PERCURSO METODOLÓGICO ............................................................................. 47
4.1 METODOLOGIA ....................................................................................................... 48
5 ANÁLISE E DISCUSSÃO............................................................................................ 52
5.1 CONSIDERAÇÕES PENAIS E PROCESSUAIS PENAIS ...................................... 57
5.2 MÉDICO LEGAIS, FILOSÓFICAS E LITERÁRIAS ................................................. 65
5.3 O SISTEMA PENAL E AS DOENÇAS MENTAIS ................................................... 79
5.4 MOVIMENTO DA LUTA ANTIMANICOMIAL..........................................................84
REFERÊNCIAS .............................................................................................................. 91
ANEXO A- A RESOLUÇÃO N. 487, DE 15 DE FEVEREIRO DE 2023 do CNJ...........95
10
1. INTRODUÇÃO
Marginal errante
Desejo vago
Perpassa
em vaga nuvem
o desespero do agora
Angústia indescritível
povoa por completo
o existente
na procura
do instante verdadeiro
Perguntas e problemas
definitivamente lançados
ao resto da caminhada
do marginal errante
Pesado é o fardo
alçado às costas
com os famintos do mundo
as injustas estruturas sociais
os monopólios ideológicos
a liberdade de fazer o que mandam
o direito de buscar o impossível
conjuntamente com o seu semelhante, ainda que dele não necessite. Com isso,
é possível parafrasear Maurice Druon, em o “O menino do dedo verde”, para se
afirmar: estar-se-á pensando demais.
Nesse contexto, abre-se um parêntese para a reflexão de que enquanto
não houver vontade política, políticas públicas com interesses inconfessáveis,
responsabilidade e seriedade com o dinheiro público, não haverá solução para
a questão do acolhimento, internação e tratamento humanizado para doentes
mentais ou portadores de transtornos mentais.
Se formos refletir acerca dos estágios da humanidade, precisamos nos
lembrar que há cerca de alguns bilhões de anos, a matéria, a energia, o tempo
e o espaço surgiram naquilo que é conhecido como o Big Bang, recebendo a
denominação de física. Aproximadamente 300 mil anos depois, a matéria e a
energia começaram a se aglutinar em estruturas complexas, denominadas
átomos, que se combinaram em moléculas e a isso deu-se o nome de química.
Na sequência, podemos citar ainda que pouco mais de 3 bilhões de anos,
certas moléculas formaram estruturas grandes e complexas, recebendo o nome
e organismos e a isso deu-se o nome de biologia. Em torno de 70 mil anos, esses
organismos, já pertencentes à espécie Homo Sapiens, se desenvolveram em
estruturas, denominadas culturas. O desenvolvimento dessas culturas foi
recepcionado com o nome de História.
O interessante é que em quaisquer desses estágios da origem do mundo,
contemplou-se o homo com problemas mentais e, como sabemos, essa
singularidade é intrínseca do próprio ser humano no mundo. A esse respeito,
Lombroso, muito tempo depois, elaborou teorias para categorizar os criminosos.
A princípio, endeusado. Depois, repudiado. Atualmente, far-lhe-ia muito bem
uma outra leitura de suas observações. Tivesse ele os instrumentos tecnológicos
hoje existentes, como eletroencefalograma, tomografia computadorizada, do
cérebro mapeado com cores diferentes, para diferentes funções, provavelmente
a história das doenças mentais, em criminosos, poderia ser, radicalmente,
diferente.
Nesse contexto, este estudo concentrar-se-á no exame de medida de
segurança detentiva (ou ambulatorial), para pessoas com transtornos mentais e
alta periculosidade: desafios para a execução penal no estado de Roraima. O
objetivo geral consiste em um voo panorâmico sobre as implicações da medida
12
capítulo traz algumas análises e discussões por fim, o quinto capítulo consiste
na análise e discussão dos dados obtidos. Por fim, o sexto capítulo traz as
considerações finais, com alguns apontamentos e direcionamentos.
14
dela. Enquanto isso, o grupo se voltava para a adolescente aterrorizada. Ela foi
estuprada, sodomizada e espancada durante cinco longos dias, e ao final deles,
“Champinha” ordenou que ela caminhasse pela mata, porque ele iria soltá-la.
Logo em seguida, alguns disparos e a garota foi morta.
Encontrado o casal, “Champinha” foi encaminhado para a fundação casa,
com medida detentiva por sua idade, onde deveria ficar até os 18 anos. Os
agentes penalmente responsáveis foram todos condenados, uma vez que
mentalmente capazes.
Ocorre que “Champinha” se tornou um grande problema jurídico:
legalmente, deveria ser posto em liberdade aos 18 anos, mas do ponto de vista
de sua periculosidade, e alta periculosidade, já que ele declarava a todo instante
que, uma vez solto, iria voltar a matar, foi diagnosticado com doença mental e
sua soltura era temerária.
Os trabalhadores do Direito sabem que não se pode aplicar duas penas
para o mesmo fato gerador. O que fazer então? Foi construída uma casa de
custódia e tratamento para doentes mentais e, coincidência ou não,
“Champinha”, já com 18 anos, foi seu primeiro interno, onde se encontra até os
dias atuais.
A esse respeito, o psiquiatra forense, chamado Guido Palomba,
renomado em todo país, cunhou a seguinte expressão para definir a nova
situação de “Champinha”: uma verdadeira gambiarra jurídica. Prefere-se o
amparo de Eduardo Juan Couture: “Teu dever é lutar pelo Direito, mas se um dia
encontrares o Direito em conflito com a Justiça, luta pela Justiça”.
Até onde se sabe, a casa de Custódia e Tratamento que abrigou
“Champinha” possui boas acomodações e bons profissionais para acompanhá-
lo. Os pais da adolescente, destroçados, se separaram pouco tempo depois. É
isso que acontece no mais das vezes: o ato criminoso não afeta apenas o
ofendido, mas todo o universo que gravita em torno dele.
O Art. 5o da Lei de Saúde mental diz que:
O paciente há longo tempo hospitalizado ou para o qual se caracterize
situação de grave dependência institucional, decorrente de seu quadro
clínico ou de ausência de suporte social, será objeto de política
específica de alta planejada e reabilitação psicossocial assistida, sob
responsabilidade da autoridade sanitária competente e supervisão de
instância a ser definida pelo Poder Executivo, assegurada a
continuidade do tratamento, quando necessário (Brasil, 2002, p. 16).
17
Quando jovem, fez parte de um grupo chamado “senta pua”, onde foi
abusado sexualmente. Assim, tanto o sexo, quanto a violência foram
introduzidas na sua biografia. Por não conseguir ser aprovado nem na
Escola Naval, nem na Aeronáutica e nem na Polícia Militar (Fagundes,
2020).
1 Assim se convencionou chamar o caso de Kalberg da Silva Magalhães, cujo processo principal
tramitou na Vara de Execuções Penais, na comarca de Boa Vista, sob o número 0011104-
55.2014.8.23.0010.
2 MARQUES, Marcelo. Preso é agredido após ser visto em ato obsceno com foto de mulher, em
RR. G1 RR, de 20 mar, 2014. Disponível em:
http://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2014/03/preso-e-agredido-apos-ser-visto-em-ato-
obsceno-com-foto-de-mulher-em-rr.html
22
3 As falas atribuídas aqui à mãe de Kalberg (que convém não ser identificada) são reais, embora
adaptadas, e foram obtidas a parte do testemunho de servidores do Poder Judiciário que
estiveram presentes no atendimento prestado a ela.
23
destes conceitos a cada caso concreto será, sempre, uma “espada de Dâmocles”
pendente sobre a cabeça do julgador.
Nesse contexto, decisões respeitáveis se voltam no sentido de que a
medida de segurança detentiva não pode ser perpétua. Antes, o contrário, deve
estar jungida à pena aplicada ao ofensor da norma, e, numa aplicação mais dura,
à pena máxima cominada ao delito cometido. Dessa maneira, há que se indagar:
como dar “alta”, juridicamente, para ofensores extremamente perigosos, se é
sabido que doença mental não tem cura? A outra visão, a qual filiar-se-á é a de
que, como doença incurável, o transgressor não deverá ser colocado em
liberdade.
Faz-se necessário considerar que a decisão de conceder uma alta
depende de vários fatores, incluindo a avaliação da equipe médica sobre a
condição da pessoa e se ela é considerada segura para ela mesma e para a
sociedade. No caso de ofensores extremamente perigosos com problemas de
saúde mental, a decisão de conceder uma alta é ainda mais complexa e envolve
considerações de saúde pública, direitos humanos e segurança.
A equipe médica pode trabalhar com órgãos de justiça criminal e outros
profissionais da saúde para avaliar o risco e determinar o melhor curso de ação.
Entretanto, considera-se que em casos de ofensores extremamente perigosos,
o mais recomendável é que necessário se mantenha a pessoa em um ambiente
institucional por questões de segurança, mesmo que sua doença mental não
tenha cura.
Considera-se que as decisões sobre a liberação de ofensores
extremamente perigosos precisam ser muito cuidadosas e baseadas em
avaliações rigorosas e revisões frequentes. É importante que sejam tomadas
medidas eficazes para garantir a segurança da sociedade e dos indivíduos
envolvidos. Assim, também serão oferecidas, humildemente, alternativas, ou
soluções, ainda que paliativas, para que o sentenciado permaneça em casa de
recolhimento para doentes mentais, porque sua insanidade há de colocar a ele,
a sua família e a toda comunidade, em perigo: iminente, real e concreto.
Feitas essas considerações, há de se trazer a questão da doença de
Graves, provocada por uma hiperatividade da tireoide. A origem exata da doença
de Graves ainda é desconhecida. No entanto, é amplamente aceito que é uma
condição autoimune, ou seja, ocorre quando o sistema imunológico ataca o
27
Lembramos mais uma vez a afirmação de Couture: “Teu dever é lutar pelo
Direito, mas se um dia encontrares o Direito em conflito com a Justiça, luta pela
Justiça” que nos sugere que existe uma diferença entre o conceito de Direito e
Justiça, e que em algumas situações, esses conceitos podem entrar em conflito.
O dever da pessoa é lutar pelo Direito, mas se um dia encontrar o Direito em
conflito com a Justiça, então a escolha deve ser pela Justiça.
Assim, a Justiça é entendida como uma questão moral e eticamente
correta, enquanto o Direito é uma questão de regras e leis estabelecidas.
Embora seja importante seguir as regras e leis, às vezes, essas regras podem
ser injustas ou não levar em consideração todas as circunstâncias. Nessas
situações, é importante lutar pela Justiça e buscar fazer o que é certo e justo,
mesmo que isso signifique questionar ou ignorar o Direito.
29
pessoa representa perigo iminente a si mesma ou aos outros. Além disso, a APA
defende que a restrição da liberdade deve ser implementada de forma justa e
equilibrada, respeitando os direitos humanos e garantindo o bem-estar da
pessoa em questão.
Enfim, compreendemos que a restrição da liberdade de pessoas com
transtornos mentais ou comportamento desviante é uma questão complexa, que
envolve questões éticas, legais e de saúde pública e a importância de se abordar
essa questão de forma cuidadosa e equilibrada, respeitando os direitos humanos
e garantindo o bem-estar da pessoa em questão.
Por isso, frisamos e pontuamos que quaisquer medidas tomadas, devem
estar de acordo com a lei e a Constituição e os direitos humanos devem
representar uma limitação: quaisquer que sejam as soluções propostas, elas não
devem violar a dignidade de quaisquer dos envolvidos, inclusive a dessas
pessoas com transtornos de ordem mental.
Em Roraima, a aplicação da lei penal para elas é um desafio
especialmente preocupante. Há um número de presos com transtornos mentais
ainda não levantado e tornado público. Até o levantamento dos dados é
impreciso. Nos anos de 2017 a 2022 em busca junto ao Sistema Prisional pela
busca junto ao SEEU- Sistema de Execução Penal Unificado tramitou-se por
volta de 40 processos com o agrupador de medida de segurança.
De outra parte, a infraestrutura disponível para esses pacientes judiciários
apresenta inúmeras irregularidades: até hoje, não há um hospital de custódia
onde essas pessoas possam ser internadas e monitoradas; e interná-las “em
outro estabelecimento adequado” também não é uma tarefa fácil, pois em
qualquer outro estabelecimento há riscos para os profissionais que vão lidar com
esses sujeitos e que não possuem capacitação adequada.
O ideal seria, a partir de uma cooperação permanente entre o sistema de
justiça e o sistema de saúde, que o paradigma da não intervenção delineado na
lei de saúde mental fosse respeitado; porém, ao mesmo tempo, que a
identificação clínica de surtos violentos pudesse ser antevista a tempo de haver
uma intervenção das forças de segurança, com o auxílio do sistema de saúde.
Entretando, isso certamente seria muito custoso e demandaria mais recursos
humanos e mais especializados do que o que existe atualmente no Sistema da
arte em Roraima.
31
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI No 10.216, DE 6 DE ABRIL DE 2001.
Dispõe sobre a proteção e os
direitos das pessoas portadoras
de transtornos mentais e
redireciona o modelo
assistencial em saúde mental.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso
Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
preciso considerar que esse tipo de parceria pode ser utópica em algumas
situações e que é necessário abordar desafios sociais, econômicos e culturais
para garantir a efetividade dessas políticas. Assim, no modesto entender de
quem redige, é muito mais útil nessa situação toda que que os gestores sejam,
efetivamente gestores.
Voltando ao caso “Champinha”, a casa de acolhimento foi construída para
ele em tempo recorde e funciona até hoje. Por que em outros casos não haveria
de acontecer a mesma coisa? E mais uma vez se misturam, “doença mental”
com transtornos mentais que, conforme já demonstrado, são coisas diversas,
muito embora possam ser abrigados sob o mesmo teto e administração.
Como decorrência de uma luta antimanicomial, a Lei 10.216/2001,
proposta pelo deputado mineiro Paulo Delgado, objetivou um novo modelo de
tratamento às pessoas com sofrimento mental, e pretendeu criar estruturas de
atendimento à saúde mental, como os Centros de Atendimento Psicossociais
(Caps), que deveriam se espalhar por todo o país, dando ênfase ao profissional
psicólogo, que passou a ser uma referência.
Com todo respeito aos profissionais que trabalharam arduamente para
que esta lei viesse a luz, há de se perguntar: 20 anos depois, qual a mudança,
significativa, para a sociedade e para os familiares que ela representou?
Não se atreverá a dizer nada, mas pode-se assegurar que, para melhor,
quase nada. Os doentes mentais, ou com transtornos mentais somente
conseguem ficar isolados mediante internação. Fora dela, existe um mundo
atraente e sedutor, composto por amigos, não tão amigos, familiares esgotados,
drogas lícitas e ilícitas que, unidas aos medicamentos prescritos, transformam o
paciente em verdadeiras bombas relógio, prontas para explodir. E com certeza
e com frequência explodem.
Citar-se-á o seguinte exemplo, mas não o único: uma jovem que trabalhou
por alguns anos em um Hospital Psiquiátrico em Belo Horizonte. Sempre era,
nos dias de visitação, designada para recepcionar os familiares dos internos e
verificar se o que estava sendo levado poderia ou não entrar no estabelecimento.
Por repetidas vezes interceptou o ingresso de garrafas e café, com fundo falso,
que continha significativa quantidade de bebida alcoólica, frutas, com o miolo
retirado, e no oco deixado, substância entorpecentes.
39
Quem não tem capacidade para “consentir” não tem capacidade para
“desconsentir”. Noção elementar do direito. Nesta situação, a decisão de
internação voluntária ou a descontinuação desta, deve ser tomada por uma
pessoa legalmente autorizada a representá-las, como um representante legal ou
um tutor.
Além disso, é importante lembrar que a internação voluntária é uma
questão muito delicada e que envolve uma série de direitos e garantias. Por esta
razão, é fundamental que as pessoas que desejam solicitar ou descontinuar a
sua internação voluntária estejam cientes dos seus direitos e tenham acesso a
um advogado ou a um profissional de saúde mental para auxiliá-los na tomada
de decisões.
Mais um exemplo prático: um paciente, a pedido da própria mãe, foi
internado em um Hospital Psiquiátrico na cidade de Juiz de Fora, quando eles
42
O texto desde artigo vale por sua literalidade: se somente o médico pode
proceder a internação, somente ele pode se valer da desinternação. A inovação
da comunicação ao Ministério Público é salutar, seja quando da internação
43
e falta de políticas públicas eficazes. Além disso, pode haver falta de vontade
política para abordar este tema, o que é uma questão grave que precisa ser
endereçada para garantir que a lei seja implementada e efetiva.
A implementação da lei de saúde mental é fundamental para garantir o
atendimento adequado de pacientes com doenças mentais ou transtornos
mentais. É necessário que o estado gestor invista em recursos financeiros, em
equipes de profissionais capacitados e em políticas públicas eficazes para
garantir a efetividade da lei e a proteção dos direitos dos pacientes.
47
4 O PERCURSO METODOLÓGICO
4.1 METODOLOGIA
5 ANÁLISE E DISCUSSÃO
pode ser desadaptada para pessoas com transtornos mentais, que muitas vezes
requerem tratamento especializado e não respondem bem à privação da
liberdade.
A segunda forma é o hospital de custódia, que é uma instituição destinada
ao tratamento de pessoas com transtornos mentais e comportamento desviante
que representam perigo à sociedade. Nesse tipo de estabelecimento, a pessoa
é submetida a tratamento médico e psicológico, além de ter sua liberdade restrita
para preservar a segurança dos outros. O hospital de custódia é uma alternativa
mais adequada do que a prisão para pessoas com transtornos mentais, pois
oferece um ambiente mais propício para o tratamento e recuperação da saúde
mental.
Por fim, existe a possibilidade de restrição da liberdade em outro
estabelecimento adequado, que pode ser um hospital psiquiátrico ou uma clínica
especializada, por exemplo. O importante é que o estabelecimento escolhido
seja adequado para o tratamento da pessoa com transtorno mental, ofereça
condições adequadas de segurança e garanta o respeito aos direitos
fundamentais da pessoa.
O conceito de medida de segurança é um instituto dos Direitos Penal e
Processual Penal, que tem como objetivo proteger a sociedade de indivíduos
que apresentam comportamentos desviantes e representam ameaça para o
bem-estar coletivo. A medida de segurança é aplicada ao indivíduo que tenha
praticado crime, mas não tenha sido condenado a uma pena privativa de
liberdade.
Apenas para fins de comparação, as penas são medidas impostas pelo
Estado a quem praticou crime e foram condenadas, já as medidas de segurança
são aplicadas a indivíduos que, apesar de não terem sido condenados,
representam perigo à sociedade. Os princípios penais se aplicam tanto às penas
quanto às medidas de segurança, garantindo a proteção aos direitos e garantias
fundamentais.
Para que a medida de segurança seja aplicada, é necessário que existam
requisitos que justifiquem sua aplicação, tais como a periculosidade efetiva do
indivíduo, ou seja, a probabilidade de ele envolver-se em condutas criminosas.
Além disso, a medida de segurança só pode ser aplicada após um juízo de
57
frequentado várias escolas especiais, teve problemas para ler e escrever até a
idade adulta.
Em sua fase adulta, Rosemary protagonizou diversos episódios violentos
e ataques de raiva, atingindo quem estivesse por perto. Em um dos incidentes,
por exemplo, Rosemary chegou a atacar subitamente seu avô materno, Honey
Fitz. A família Kennedy chegou a interná-la em um convento, mas ela fugia
diversas vezes. Quando as freiras relataram que Rosemary fugia para se
encontrar com homens nos bares, o pai (Joseph Kennedy) decidiu tomar uma
providência.
Em novembro de 1941, sem consultar a esposa, Joseph autorizou que
Rosemary fosse lobotomizada. Na época, ela tinha 23 anos. No entanto, depois
da cirurgia, Rosemary nunca conseguiu mais andar ou falar. Durante a maior
parte do tempo, sua existência foi um segredo.
A cidade de Barbacena, no interior de Minas Gerais, em 1903 ficou
conhecida como a “Cidade dos Loucos”, por abrigar sete instituições
psiquiátricas, sendo a mais famosa o “Hospital Colônia”. No entanto, 70% dos
internados não apresentavam simplesmente nenhum registro de doença mental.
Eram homossexuais, alcoólatras, militantes políticos, mães solteiras, mendigos,
negros, pobres, índios, pessoas sem documento.
Os internos viviam mal, nus, forçados a trabalhar como suposta terapia
em pátios ou em celas. Faltavam água encanada e alimentos. Muitos internos
bebiam e se banhavam no esgoto a céu aberto. Cerca de 60 mil internos
morreram de fome, frio ou diarreia durante nove décadas até o fechamento do
Hospital Colônia, que aconteceu na década de 1990. Os "tratamentos" envolviam
choques e torturas físicas/psicológicas.
A lobotomia diminuiu na década de 1950, uma vez que boa parte dos
“médicos que realizavam o procedimento não era formada por neurocirurgiões,
e muitos dos lobotomizados eram submetidos a este “tratamento” sem
consentimento próprio, ou de seus familiares ou de algum representante legal.
Foi justamente nessa época que os cientistas desenvolveram medicamentos
psicoterapêuticos, muito mais eficazes e seguros no tratamento de transtornos
mentais do que a lobotomia. Em 1960, o psiquiatra italiano Franco Basaglia
(1988), revolucionou o tratamento relacionado a transtornos mentais, investindo
uma abordagem de reinserção territorial e cultural do paciente na comunidade,
65
Figura 2- A vila
METADE
para viver com uma consciência de segurança. Nietzsche faz sua essa angústia
“desesperada” do homem metafísico diante do “avanço do niilismo”. Supera,
porém, tal angústia, quando observa que a morte de Deus é um acontecimento
cultural e existencial necessário para purificar a face de Deus e, por conseguinte,
a fé em Deus”.
Este ensinamento filosófico explica, por si mesmo, todas as angústias
pelas quais passa um doente mental ou um portador de transtorno mental com
uma diferença: estes não possuem discernimento de todo o seu entorno, ou,
quando o possuem, é de modo limitado pela autodeterminação. Bergson, outro
grande filósofo do século XX, declarou: “Captar o ritmo da evolução criadora, ou
seja, a caracterização qualitativa do desenvolvimento temporal dos organismos,
é uma possibilidade de razão intuitiva.
A intuição é a alma da metafísica e é função complementar em relação à
ciência. O saber total, que é a forma de sabedoria sintética e equilibradora da
existência humana, deve conjugar análise e intuição, quer para poder exprimir a
unidade da vida no jogo múltiplo das suas formas e dos seus nexos intrínsecos,
quer para captar como que sob forma de musicalidade e de amor inefável o “elã
vital” que se abre no universo e o caracteriza como potência e sabedoria divinas”
(Penzo; Gibellini, 1993, p. 77 e 78).
Não se aprofundará muito no fascinante mundo filosófico para não fugir
ao tema do presente estudo. O pouco que foi dito já sintetiza a razão da filosofia:
do homem e para o homem; do ser humano, para o ser humano, doente mental
ou não, portador de distúrbios mentais ou não.
Penetrar-se-á agora um ponto que pode ser tido e havido como o mais
intrincado a ser resolvido, dirimido e interpretado pelos operadores do direito.
Este ponto diz respeito a conflito de normas e aos princípios da anterioridade da
lei penal, da reserva legal, da legalidade e da generalidade das leis versus a
especificidade das leis.
Em poucas palavras, o princípio da anterioridade da Lei Penal resulta na
irretroatividade da lei penal, que não alcançará os fatos praticados antes de sua
vigência, ainda que venham a ser futuramente tidos como crime. Já o “princípio
da reserva legal ocorre quando uma norma constitucional atribui determinada
matéria exclusivamente à lei formal (ou a atos equiparados, na interpretação
76
Federal, e muito menos nos códigos Penal e de Processo Penal, por uma razão
que pode passar despercebida: aquela Lei dispõe sobre a proteção e os
direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o
modelo assistencial em saúde mental. (sem o negrito no original).
E os Códigos Penal e de Processo penal, afinados com a Constituição da
República são taxativos ao afirmar que seus dispositivos contemplam agentes
que praticaram, em tese crimes, e que são doentes mentais ou portadores de
desenvolvimento mental incompleto ou retardado.
Os diplomas legais já mencionados funcionarão como amalgama da
construção do direito, em cada caso concreto. Tudo se afina, tudo se completa,
tudo se interlaça, perpassando o raciocínio do Magistrado ao dizer o direito.
Se acaso pairar alguma dúvida no que respeita a aplicação harmoniosa
destes três diplomas legais, qual seja, a Constituição de 1988, o Código Penal e
o Código de Processo Penal, através dos artigos já mencionados, ainda resta o
artigo 3º da Lei substantiva penal, interpretação extensiva e aplicação da
analogia, quando assim prescreve: “A lei processual penal admitirá interpretação
extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais
de direito”. Observe-se que não se invoca qualquer tipo de ativismo judicial, mas
de aplicação destes institutos naquilo que for pertinente.
Hélio Tornaghi (1991, p. 91), tem um ensinamento a respeito de toda e
qualquer interpretação, que vale a pena a reprodução: “Intérprete era o
intermediário entre o vendedor e um comprador de uma mercadoria e que lhe
fixava o preço (pretium). Daí, isto é, de inter e pretium, lhe adveio o nome:
intérprete. Acontece que, para desempenhar sua missão, ele precisava falar as
línguas das partes. Por isso chamava-se interpretação o ato de tornar manifesto
par cada uma delas o que a outra diz. A expressão generalizou-se e passou a
significar o ato de manifestar o sentido de alguma coisa. Fala-se em
interpretação do contrato, do testamento, da lei e assim por diante” (grifo do
autor).
Constata-se, sem muita dificuldade, que interpretar é a manifestação do
sentido de alguma coisa, não a “criação” de alguma coisa, como tem acontecido
com muita frequência com o ativismo judicial. E para tornar isto bem mais
explícito, continua-se com o ensinamento de Hélio Tornaghi, na mesma página
“Interpretar a lei é tornar-lhe claro o sentido.
78
(...) Por mais previdente que seja o legislador, a lei poderá ter lacunas:
é possível que não haja regulado algo que devia regular. A aplicação
dela exige, então, o preenchimento da lacuna porque a lei pode ser
lacunosa, mas o Direito não. Uma das maneiras de preencher as falhas
da lei é a analogia. Se a razão de disciplinar uma situação jurídica
prevista é a mesma que existiria para ordenar a não prevista, então é
legítimo aplicar (analogicamente) à segunda o que é que é dito da
primeira. A própria origem da palavra analogia (aná=segundo +
lógos=razão) mostra sua função: onde existe a mesma razão aí deve
aplicar-se o mesmo preceito (ubi eadem ratio ibi idem jus) (grifo do
autor).
Isso significa que, em teoria, o direito positivo deve ser harmonizado com
os princípios do direito natural, de forma a garantir que a ordem jurídica seja justa
e equitativa. No entanto, em alguns casos, o direito positivo pode ser
inconsistente com os princípios do direito natural, o que requer uma revisão ou
reformulação das leis existentes.
Além disso, é importante perceber os princípios de direito natural como
uma referência para avaliar a validade das normas jurídicas positivas. Dessa
forma, os princípios do direito natural fornecem uma base ética e moral para o
direito, ajudando a garantir que as leis sejam justas e compatíveis com a
consciência moral da sociedade. Enfim, destaca-se a importância da harmonia
entre os princípios do direito natural e o direito positivo, e a necessidade de que
o direito positivo seja compatível com os princípios do direito natural para garantir
a justiça e a equidade na ordem jurídica.
de responder por seus atos criminosos. Se o agente for plenamente capaz, ele
receberá pena, conforme o mínimo e o máximo pelo delito por ele praticado.
Se o agente for relativamente incapaz, receberá pena, que será reduzida
na proporção em que fixada pelo parágrafo único do artigo 26 do Código Penal:
“de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental
ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente
capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com
esse entendimento (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984). Se o agente
for inimputável por completo, receberá pedida de medida de segurança, que,
dependendo do caso poderá ser detentiva ou ambulatorial.
A medida de segurança é aplicada ao agente que não possuía, ao tempo
da ação ou omissão típica e antijurídica, capacidade mental de entender a
ilicitude de sua ação, ou de autodeterminar-se de acordo com o caráter ilícito do
fato. Para aplicação da Medida de Segurança o Magistrado deve estar convicto
da periculosidade do agente devido, diretamente relacionada à sua doença
mental, permitindo deliberar sobre sua internação em instituição psiquiátrica para
tratamento de sua patologia. Sempre bom lembrar o disposto no artigo 182 do
Código de Processo Penal, para as perícias e laudos em geral: “O juiz não ficará
adstrito ao laudo, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte”
É o denominado sistema liberatório. Por óbvio que, para refutar qualquer
laudo, o juiz, além de ter de fundamentar, à exaustão, a sua decisão, seja no
todo seja em parte, militará em favor dele a presunção de vasto conhecimento
médico legal e de patologias mentais, sob pena de ser uma decisão facilmente
desfeita. Ainda seguindo Hélio Tornaghi ( 1991, p.255), aprende-se:
Na lei brasileira a causa biológica é indispensável: é preciso que a
incapacidade decorras de doença mental, ou de desenvolvimento
mental retardado ou incompleto (de perturbação da saúde mental, diz
também o parágrafo único do art. 26 do CP). Mas não basta que ocorra
a causa, porque pode acontecer que o doente mental tenha podido
compreender inteiramente o ocará ter ilícito do fato e dirigir a própria
vontade na conformidade do que entendeu.
Mais uma vez fica claro: não se fala, em momento algum, em transtorno
mental, o que reforça a unidade das legislações já citadas, a partir da
Constituição Federal, fazendo um todo harmônico com a Lei 10.216/2001, que
trata da periculosidade de pessoas com transtorno mental que desafia medida
81
tratamentos, ideia baseada apenas nos preconceitos que cercam a doença men-
tal. O Movimento da Luta antimanicomial faz lembrar que como todo cidadão
estas pessoas têm o direito fundamental à liberdade, o direito a viver em socie-
dade, além do direto a receber cuidado e tratamento sem que para isto tenham
que abrir mão de seu lugar de cidadãos” (Associação De Volta pra Casa - Blog
da Saúde/Ministério da Saúde).
Não se trata de preconceitos, mas de pós conceitos. A literatura jurídica e
médico legal está cheia de exemplo vivos do sofrimento de familiares e cuidado-
res, profissionais ou não, que não conseguem contornar situações de grave e
real risco às próprias integridades físicas e de terceiros.
Escreveu Joana Domingos Vargas, In FAMILIARES OU DESCONHECI-
DOS? A relação entre os protagonistas do estupro no fluxo do Sistema de Justiça
Criminal:
Mais uma vez a lógica está sendo desafiada. A gênese da política antima-
nicomial remonta ao Projeto de Lei, transformado na Lei Ordinária 10216/2001,
de autoria do então Deputado mineiro Paulo Delgado, e data de 12/09/1989.
Sua ementa “dispõe sobre a extinção progressiva dos manicômios e sua
substituição por outros recursos assistenciais e regulamenta a internação psiqui-
átrica compulsória. Nova Ementa do Substitutivo do Senado: dispõe sobre a pro-
teção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona
o modelo assistencial em saúde mental. Em resumo, estabelecido ficou que “a
internação psiquiátrica só será indicada quando os recursos extra-hospitalares
se mostrarem insuficientes”.
Há de se perguntar: quem irá determinar essa hipossuficiênia dos recur-
sos extra hospitalares? O Magistrado? Uma junta de psiquiatras? Uma comissão
multidisciplinar? A vida é dinâmica. A doença mental e os transtornos mentais
bem mais dinâmicos o são. Como equacionar todas estas questões? A respostas
a estas questões vai fazer efervescer, ainda mais o ativismo judicial, que já se
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4
Texto: José Elias Murad, Drogas: o que é preciso saber, editora lê,1997. Imagem: homem
ganha prêmio por viver pastando como um bode.
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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
MARQUES, Marcelo. Preso é agredido após ser visto em ato obsceno com foto
de mulher, em RR. G1 RR, de 20 mar, 2014. Disponível em:
http://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2014/03/preso-e-agredido-apos-ser-visto-
em-ato-obsceno-com-foto-de-mulher-em-rr.html.
MATTOS, Virgílio. Crime e psiquiatria – uma saída: preliminares para a
desconstrução das medidas de segurança. Rio de Janeiro: Revan, 2006.
MENDES, Soraia da Rosa; DALUL FARIA, Gustavo. A (Dis)Funcionalidade Da
Medida De Segurança no paradigma da Reforma Psiquiátrica. Revista Brasileira
de Ciências Criminais, vol. 144, jun. 2018.
MINAYO, M. C. S. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Rio de
Janeiro: Fiocruz, 2010. pp. 185-221.
MURAD, José Elias. Drogas: o que é preciso saber, editora lê,1997. Imagem:
homem ganha prêmio por viver pastando como um bode. Disponível em: <
https://pingodeouvido.com/cristiano-escritor-e-redator/>. Acesso em 10 nov 2023.
ambiente político e legal que assegure a garantia dos direitos humanos das pessoas
com deficiências psicossociais;
CONSIDERANDO o art. 9º, § 3º, da Resolução CNJ n. 213/2015, que dispõe sobre a
realização de audiência de custódia, disciplinando sobre a garantia de acesso aos
serviços médico e psicossocial, resguardada sua natureza voluntária, para pessoas que
apresentem quadro de transtorno mental ou dependência química;
RESOLVE:
CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 1º Instituir a Política Antimanicomial do Poder Judiciário, por meio de procedimentos
para o tratamento das pessoas com transtorno mental ou qualquer forma de deficiência
psicossocial que estejam custodiadas, sejam investigadas, acusadas, rés ou privadas
de liberdade, em cumprimento de pena ou de medida de segurança, em prisão
domiciliar, em cumprimento de alternativas penais, monitoração eletrônica ou outras
medidas em meio aberto, e conferir diretrizes para assegurar os direitos dessa
população.
IV – equipe conectora: equipe vinculada ao Sistema Único de Saúde (SUS) que exerça
função análoga à da EAP;
VII – Modelo Orientador: modelo elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça com o
objetivo de instruir o Poder Judiciário acerca dos fluxos a serem adotados para o
cuidado da pessoa com transtorno mental submetida a procedimento criminal, em local
adequado à atenção em saúde a fim de adotar os parâmetros dispostos na presente
Resolução.
Parágrafo único. Estão abrangidas por esta Resolução, nos termos do caput deste
artigo, as pessoas em sofrimento ou com transtorno mental relacionado ao Num.
5029601 - Pág. 6Assinado eletronicamente por: ROSA MARIA PIRES WEBER -
24/02/2023 21:03:38
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https://www.cnj.jus.br:443/pjecnj/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=2302
2421033876500000004565616 Número do documento:
23022421033876500000004565616 uso abusivo de álcool e outras drogas, que serão
encaminhadas para a rede de saúde, nos termos do art. 23-A da Lei n. 11.343/2006,
garantidos os direitos previstos na Lei n. 10.216/2001.
Art. 3º São princípios e diretrizes que regem o tratamento das pessoas com transtorno
mental no âmbito da jurisdição penal:
XII – respeito à territorialidade dos serviços e ao tratamento no meio social em que vive
a pessoa, visando sempre a manutenção dos laços familiares e comunitários.
CAPÍTULO II
DAS DIRETRIZES DA POLÍTICA ANTIMANICOMIAL
Seção I
Das audiências de custódia
103
Art. 5º Nos casos em que a autoridade judicial, com apoio da equipe multidisciplinar e
após ouvidos o Ministério Público e a defesa, entender que a pessoa apresentada à
audiência de custódia está em situação de crise em saúde mental e sem condições de
participar do ato, solicitará tentativas de manejo de crise pela equipe qualificada.
§ 1º Para efeitos deste artigo, entende-se por manejo da crise o imediato acionamento
de equipe de saúde da Raps para a tomada de medidas emergenciais e referenciamento
do paciente ao serviço de saúde, além da realização de ações de escuta, compreensão
da condição pessoal, produção imediata de consensos possíveis, mediação entre a
pessoa e as demais presentes no ambiente e a restauração do diálogo, bem como, o
quanto antes, a identificação dos fatores que possivelmente desencadearam a crise.
§ 3º Caso a pessoa não receba alta médica para ser apresentada em juízo no prazo
legal, a autoridade judicial poderá realizar o ato no local em que a pessoa se encontrar
e, nos casos em que o deslocamento se mostre inviável, deverá providenciar a
condução para a realização da audiência de custódia imediatamente após restabelecida
sua condição de saúde ou de apresentação.
Art. 7º Nos casos dos art. 4º ou 5º, não sendo hipótese de relaxamento da prisão, a
autoridade judicial avaliará a necessidade e adequação de eventual medida cautelar,
consideradas as condições de saúde da pessoa apresentada e evitando a imposição
de:
I – medida que dificulte o acesso ou a continuidade do melhor tratamento disponível, ou
que apresente exigências incompatíveis ou de difícil cumprimento diante do quadro de
saúde apresentado; e
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Seção II
Da necessidade de tratamento em saúde mental no curso de prisão preventiva ou outra
medida cautelar
Art. 10. A análise sobre a imputabilidade da pessoa, quando necessária, poderá ser
qualificada com requisição de informações sobre o atendimento e o tratamento
dispensado nos serviços aos quais a pessoa esteja vinculada, respeitado o sigilo de
informações pessoais e médicas.
Seção III
Da medida de segurança
Art. 11. Na sentença criminal que imponha medida de segurança, a autoridade judicial
determinará a modalidade mais indicada ao tratamento de saúde da pessoa acusada,
considerados a avaliação biopsicossocial, outros exames eventualmente realizados na
fase instrutória e os cuidados a serem prestados em meio aberto.
Parágrafo único. A autoridade judicial levará em conta, nas decisões que envolvam
imposição ou alteração do cumprimento de medida de segurança, os pareceres das
equipes multiprofissionais que atendem o paciente na Raps, da EAP ou outra equipe
conectora.
Subseção I
Do tratamento ambulatorial
107
Subseção II
Da medida de internação
Art. 13. A imposição de medida de segurança de internação ou de internação provisória
ocorrerá em hipóteses absolutamente excepcionais, quando não cabíveis ou suficientes
108
Seção IV
Da necessidade de tratamento em saúde mental no curso da execução da pena Art. 15.
Nos casos em que a pessoa submetida ao cumprimento de pena necessitar de
tratamento em saúde mental, a autoridade judicial avaliará a necessidade e adequação
109
Seção V
Da desinstitucionalização
Art. 16. No prazo de até 6 (seis) meses, contados a partir da entrada em vigor desta
Resolução, a autoridade judicial competente revisará os processos a fim de avaliar a
possibilidade de extinção da medida em curso, progressão para tratamento ambulatorial
em meio aberto ou transferência para estabelecimento de saúde adequado, nos casos
relativos:
III – a pessoas com transtorno mental ou deficiência psicossocial que estejam em prisão
processual ou cumprimento de pena em unidades prisionais, delegacias de polícia ou
estabelecimentos congêneres.
Art. 17. Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a autoridade judicial competente
para a execução penal determinará a elaboração, no prazo de 12 (doze) meses
contados da entrada em vigor desta Resolução, de PTS para todos os pacientes em
medida de segurança que ainda estiverem internados em HCTP, em instituições
congêneres ou unidades prisionais, com vistas à alta planejada e à reabilitação
psicossocial assistida em meio aberto, a serem apresentadas no processo ou em
audiência judicial que conte com a participação de representantes das entidades
envolvidas nos PTSs.
CAPÍTULO III
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 19. Recomenda-se, sempre que possível, em qualquer fase processual, a derivação
de processos criminais que envolvem pessoas com transtorno mental ou qualquer forma
de deficiência psicossocial para programas comunitários ou judiciários de justiça
restaurativa, a partir da utilização de vias consensuais alternativas,Num. 5029601 - Pág.
15Assinado eletronicamente por: ROSA MARIA PIRES WEBER - 24/02/2023 21:03:38
https://www.cnj.jus.br:443/pjecnj/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=2302
2421033876500000004565616 Número do documento:
23022421033876500000004565616 visando à desinstitucionalização, em consonância
com os princípios norteadores da justiça restaurativa presentes na Resolução CNJ n.
225/2016.
III – fomentar a atuação do Poder Judiciário de modo articulado com a EAP e demais
equipes conectoras para a identificação de pessoas com transtorno mental ou qualquer
forma de deficiência psicossocial em unidades de custódia potencialmente destinatários
de medidas terapêuticas;
Art. 22. Esta Resolução também será aplicada aos adolescentes com transtorno ou
sofrimento mental apreendidos, processados por cometimento de ato infracional ou em
cumprimento de medida socioeducativa, no que couber, enquanto não for elaborado ato
normativo próprio, considerando-se a condição de pessoa em desenvolvimento, o
princípio da prioridade absoluta e as devidas adaptações, conforme previsão do Estatuto
da Criança e do Adolescente.
Art. 24. Esta Resolução entra em vigor em 90 (noventa) dias após sua publicação.
Ministra ROSA WEBER. Num. 5029601 - Pág. 17Assinado eletronicamente por: ROSA
MARIA PIRES WEBER - 24/02/2023 21:03:38
https://www.cnj.jus.br:443/pjecnj/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=2302
2421033876500000004565616 Número do documento:
23022421033876500000004565616.