Você está na página 1de 21

Introdução e 7 contos de Georg Dreissig

Muitas famílias cultivam no tempo que precede o Natal uma bela tradição: no “cantinho
das festas do ano” vão montando aos poucos a paisagem, na qual Maria e José com seu
burrinho vão para Belém. Na primeira semana do Advento, são espalhadas apenas pedras
sobre um tecido marrom, sendo que as mais bonitas formam o caminho para a mãe de Deus.
Na segunda semana, são postas plantas – pinhas e musgos, e também algumas plantas de vaso
como “palmeiras”; – na terceira semana, os animais – sobretudo as ovelhas no prado –
finalmente, na quarta semana, os homens, os pastores que cuidam das ovelhas.
O surgimento da paisagem pode ser entremeado de pequenas histórias que, no decorrer
das quatro semanas do Advento, introduzem sucessivamente os elementos da Natureza, o
reino das plantas, dos animais e finalmente dos seres humanos. O livrinho foi feito para ser
lido. Como calendário do Advento que, de história em história, vai avançando diariamente e
conduz até a noite de Natal, é bem adequado para alunos. Para crianças pequenas seria bom
escolhermos, de cada uma das quatro partes, só uma história para cada semana e a contarmos
durante a semana inteira, talvez encerrando-a e tornando-a real na paisagem montada do
Advento.O essencial na criação das histórias foi, principalmente, a alegria com a chegada do
Natal. Ela não só despertou o prazer de narrar, mas, acima de tudo, o desejo de fazê-lo de
maneira adequada à criança, mostrando que o acontecimento natalino é esperado
ansiosamente no mundo inteiro. A sensibilidade deve ser despertada, de história em história,
de modo que a luz do Natal aos poucos brilhe cada vez mais, até que na Noite Santa se irradie
em toda a sua plenitude. Algumas sugestões eu devo a histórias natalinas conhecidas,
principalmente aos doces relatos do poeta flamengo Felix Timmermans. O mais importante,
porém, para o surgimento da coletânea foram, na verdade, dois olhos brilhantes e
maravilhados de criança e duas orelhinhas que sempre queriam ouvir mais. Georg
Dreissig
1. O CAMINHO DE PEDRAS PARA BELÉM
Maria e José estavam indo para Belém. O burrinho trotava animado na frente deles.
José estava acostumado a caminhar e tinha um bom cajado; assim, podia dar passadas bem
firmes. Maria, a querida Mãe Divina, esforçava-se o máximo para manter a mesma marcha.
Mas seus pés delicados batiam volta e meia nas pedras escuras e pontudas do caminho.
Mesmo cerrando os dentes para que sua dor não fosse percebida, uma lágrima escorreu de
seus olhos. O burrinho nada percebeu, nem José, que estava muito ocupado em não errar o
caminho. O anjo, porém, que acompanhava os três em sua caminhada, reparou que Maria
chorava. Inclinou-se para ela e perguntou: “Ó querida serva do Senhor, por que você está
chorando? Você está a caminho de Belém, onde dará à luz a Criança Divina. Isso não lhe dá
alegria?” Maria respondeu: “Estou muito feliz em poder acolher a Criança, e também não me
quero queixar. Só que as pedras escuras e pontudas cortam e ferem meus pés, de modo que é
difícil para mim andar depressa.” Quando o anjo ouviu aquilo, pousou seu resplandecente
olhar celestial nas pedras, e vejam só; elas se transformaram. Arredondaram suas arestas e
pontas, tomaram belas cores brilhantes, e algumas ficaram até transparentes como vidro,
faiscando na luz que emanava do Anjo.
Maria, então, pôde andar com segurança em sua estrada cintilante e colorida, e
nenhuma dor dificultou de novo seu caminho para Belém.
2. O SEGREDO DA PEDRA GRANDE
Um dia, a caminho de Belém, Maria e José chegaram diante de uma imensa pedra. Esta
ficava bem no meio da estrada e obrigava os viajantes a passar pela direita ou pela esquerda
através do mato, ou a subir por cima dela. Porém havia algo de muito especial com essa pedra.
Antes, quando a estrada estava sendo construída, sete homens fortes tiveram que usar toda a
sua força, a fim de rolar a pedra para o lado. Mas quando, no dia seguinte, voltaram ao seu
trabalho, a enorme pedra estava exatamente no seu antigo lugar, como se tivesse continuado
sempre lá. Então, os homens fortes cuspiram nas mãos e se empenharam mais uma vez em
seu duro trabalho. Rolaram de novo a grande pedra para fora do caminho e, no dia seguinte,
novamente a encontraram onde ela estava antes. Dessa vez, os homens reclamaram mais
ainda.
Depois, pela terceira vez, puseram mãos à obra e, usando de toda a sua força, tiraram a
pedra do caminho. Quando, porém, no dia seguinte encontraram a pedra novamente em seu
antigo lugar, nenhum dos homens reclamou mais, e eles perguntavam uns aos outros o que
aquilo queria dizer. Não conseguindo achar resposta às suas perguntas, procuraram por um
santo homem, que vivia solitário em uma floresta, e lhe contaram a respeito da pedra que
sempre voltava ao seu antigo lugar. O santo homem ouviu-os com atenção, abanou a cabeça
compreensivamente e lhes respondeu: “Aquele que deve tirar essa poderosa pedra do caminho
ainda não apareceu. Deixem-na aí onde ela está, e permitam que ela seja rolada desse lugar
pela pessoa a isso destinada.” Os homens fortes seguiram seu conselho, e assim a pedra
enorme continuou imóvel no meio da estrada, para aflição de muitos viajantes.
Também Maria e José pararam diante da pedra. Naturalmente José não a podia rolar
para o lado, nem com a ajuda do burrinho. Enquanto eles assim ficaram parados pensativos
diante do obstáculo, José bateu sem querer com seu cajado na pedra. Foi uma batidinha bem
leve. Mas, assim que o cajado tocou na pedra, esta se partiu ao meio. As duas metades caíram,
uma para a direita e outra para a esquerda do caminho. E agora se podia ver que a poderosa
pedra tinha dentro dela uma porção de cristais, que brilhavam maravilhosamente à luz do Sol.
Pouco depois, chegou também o santo homem àquela estrada. Quando viu a pedra
partida e os cristais faiscando em seu interior, seus olhos brilharam: “Aquele que estava
destinado a tirar a pedra do caminho já apareceu.” – disse ele para si mesmo. E seu coração
se encheu de alegria e esperança.

3. POR QUE A ÁGUA VIRA GELO NA ÉPOCA DO INVERNO


(lembrando que o Menino Jesus nasceu no hemisfério norte, quando era inverno)
Um dia, a caminho de Belém, Maria e José chegaram a um rio. Este não era muito
largo, nem muito profundo, mas a água naquela época do ano era gelada. Quando o burrinho
mergulhava nela seu casco, doía tanto que rapidamente ele o retirava de novo, e depois não
havia meios de fazê-lo atravessar o rio. Em parte alguma se via uma ponte ou um barco. Que
deveriam fazer? José já erguia seu manto para cruzar o rio a pé, carregando Maria nas costas.
Mas isso Maria não quis aceitar, pois receava que o frio excessivo lhe fizesse mal à saúde.
Em vez disso, ela se aproximou da margem e cantou baixinho: “Onda do rio, sempre tão
esperta, pare, pare, fique quieta! Forme ponte, forme nosso chão! Assim todos passarão!”
Então, foi como se um delicado tinir de sinos respondesse de dentro d’água, e de
repente o rio parou de correr e formou uma ponte, transparente como vidro, mas tão firme,
que não só Maria, mas também José e o burrinho puderam passar por ela.
Desde esse dia, a água se transforma em gelo no inverno. Quando Maria carregava seu
filho na Terra, ela não devia ser impedida em seu caminho. Devia poder caminhar segura por
toda parte.

4. O MILAGRE NO POÇO
Naquela época em que José e Maria caminhavam com seu burrinho para Belém, as
pessoas não tinham ainda torneiras em suas casas, daquelas que a gente só abre quando quer
água. Não, elas tinham de pegar seus baldes, ir até o poço e dele tirar a água. Na maioria das
vezes, eram mulheres e mocinhas que faziam isso. E, ao se encontrarem ali, gostavam de
bater um papinho e contar as novidades. Foi o que fez Ruth naquela noite, quando pegou seu
balde e foi até o poço. Mas, quando estava saindo de sua casa, ela notou no céu uma estrela
que brilhava tão clara, que ofuscava todas as outras e até a lua, com seu brilho. A moça parou,
olhando admirada para ela, e se esqueceu do tempo e do que ia fazer. Que será que aquela
estrela, que brilhava tão maravilhosamente, queria anunciar? Só quando sentiu os dedos
doerem de frio, Ruth despertou de seus sonhos e correu rapidamente para o poço. Lá não se
via mais viva alma. Todas as outras moças já tinham ido embora. Rapidamente, Ruth
pendurou seu balde na corrente, para fazê-lo descer ao poço. Mais aí ela hesitou de novo.
Porque o espelho da água brilhava como se fosse puro ouro, e isso vinha da luz daquela
estrela, que se refletia na água. “Que brilho, que resplendor!” – murmurava a mocinha,
enlevada – “Ah, se a Vovó também pudesse ver isto!”. Mas a avó estava em casa, sentada em
sua cadeira, pois suas pernas tinham enfraquecido com a idade, e não a sustentavam mais.
Cuidadosamente, para que a água brilhante não se revolvesse, Ruth fez descer o balde. Mas,
ao puxá-lo depois para cima, admirou-se naquela noite pela terceira vez; pois a água do balde
também brilhava como ouro. Com cuidado, a menina pôs o dedo dentro da água e depois a
provou: tinha o sabor de sempre. Ruth, então, tirou o balde da corrente e correu mais que
depressa até a avó. “Veja só, Vovó!” – ela exclamou, assim que abriu a porta – “Veja o que
lhe estou trazendo!” E então lhe mostrou a água, que brilhava tão maravilhosamente como
ouro. “Olhe, a água conservou o brilho da estrela resplandecente, para que você também o
possa ver.” – explicou a menina alegremente. Pensativa, a velha senhora olhou para a água
dourada. Depois perguntou: “Que luz será essa, que está começando a brilhar sobre o mundo,
que a água pura reflete seu brilho sem parar?” – e, virando-se para Ruth, continuou – “E em
seus olhos ela também já começou a brilhar. Cuide bem dela.”
A notícia da água dourada se espalhou rapidamente pela região, e todas as pessoas
corriam ao poço para pegar um pouco. Mas, por mais que tirassem a água, ela conservava o
brilho. Ela o conservou, sim. Mas até quando? Até quando o Menino Jesus nasceu em Belém,
e então a sua luz iluminou o mundo.

5. O QUE O VENTOU CANTOU PARA MARIA


A caminhada em terra desconhecida não era fácil para Maria. Poucas vezes ela havia
saído de Nazaré e, até então, nunca experimentara pedir à noite por uma pousada, ou até
dormir na beira da estrada. Durante o dia, quando o sol gentilmente iluminava o mundo e eles
caminhavam rapidamente, para chegar a tempo a Belém, não era tão difícil. Mas, quando se
deitavam à noite, Maria de repente notava como o coração lhe ficava pesado, e a saudade lhe
apertava a garganta. Aí, no escuro, ela pensava em Nazaré, em sua casinha com as roseiras
no jardim e o perfume do jasmim embaixo de sua janela; e se lembrava do som que o vento
fazia quando passava por entre as folhas de árvores e arbustos, ou de quando desenhava suas
ondas em cima do trigal. Ah, sim, para ela o vento, era seu amigo especial. Quando ele
soprava de manhã pela janela aberta de seu quarto, ela já sabia, antes de olhar para fora, que
tipo de dia iria fazer; sabia-o através de seu sussurro suave, ou de seu sopro raivoso, através
dos odores ou da umidade que lhe trazia. Mas ali, naquele caminho, parecia estar soprando
um outro vento, um vento de inverno, frio e desconhecido, e assim a Mãe Divina se sentia
mais solitária.
Mas não é verdade: o vento sopra onde quer. Assim ele também soprava em volta de
Maria e notava sua tristeza. Que poderia fazer para consolá-la? Ele se calou por muito tempo
e pensou. Na verdade era inverno, e sua obrigação era assobiar muito através de todas as
frestas e buracos, e uivar por todos os cantos. Mas a querida Mãe Divina estava em terra
desconhecida, tão sozinha e desamparada… E, de repente, o vento começou a entoar outra
melodia, um canto de primavera em Nazaré, das sementes brotando, das folhinhas novas
aparecendo, da maravilha das flores e dos zumbidos das abelhas. Tão suave e ameno soava o
seu canto de primavera, que Maria se sentiu aquecida em seu coração e adormeceu com
alegria.
O bom vento! Ele não pôde deixar de se preocupar com Maria, a querida Mãe Divina.
Por isso, não se admirem se, de repente, começar a ficar mais quente antes do Natal, a ponto
de todos pensarem que o inverno já se foi. É apenas o vento cantando seu canto de primavera,
para que Maria não se sinta tão sozinha e desamparada em terra estranha.

6. A AGULHA DE PRATA DA LUA E O FIO DE OURO DAS ESTRELAS


Cheio de tímida veneração, José olhava para a querida esposa, que carregava em seu
ventre o Menino Jesus. Ele fazia tudo que imaginava para tornar a vida de Maria mais leve e
mais bela. Mas José era um homem pobre: vestidos e joias, com que os ricos presenteavam
suas esposas, ele não podia comprar para Maria. Isso às vezes lhe pesava muito, apesar de a
querida Mãe Divina nunca se queixar de não ter nada com que se enfeitar.
Agora, eles estavam a caminho de Belém, e todos os dias sentiam, sofrendo, o que
significava ser pobre: passavam fome – porque não tinham dinheiro para comprar algo para
comer, e as pessoas não lhes davam nada – e dormiam ao relento, porque todas as portas das
casas se fechavam diante deles. “Ela é a Mãe Divina,” – murmurava sempre José consigo
mesmo – “e você a deixa andar por aí como uma mendiga.” Quase todos os dias ele imaginava
o que poderia vender para conseguir comprar algo para Maria, para enfeitá-la e deixá-la feliz.
Mas ele não possuía nada que fosse dispensável, exceto talvez seu cajado; e este ninguém
compraria, pois o próprio José o havia cortado na floresta.
Uma noite, quando precisaram novamente dormir ao relento, José teve um sonho.
Sonhou que um homem se aproximava e tocava em seu ombro. José podia reconhecer, pelas
vestes do homem, que ele era muito rico. O homem, porém, não o olhava com desprezo, e
sim bem amavelmente; quando José lhe perguntou o que poderia fazer por ele, o desconhecido
respondeu: “Ouvi dizer que você quer vender seu cajado. Gostaria de adquiri-lo.” Admirado,
José se abaixou para pegar o cajado, e aí notou que este não era entalhado na madeira, mas
sim artisticamente forjado de ouro e prata. José o entregou ao desconhecido, e este disse:
“Agora, também vou pagar por ele.” Com estas palavras, estendeu a mão direita para cima.
De repente, o céu começou a emitir sons, e as estrelas mandavam fios dourados para baixo.
O homem os pegou e os enrolou, como um grosso novelo, em volta do cajado. Depois, ergueu
a mão esquerda e… veja só: para dentro dela deslizou a forma prateada de barquinho da lua
e se transformou numa agulha prateada. Então o desconhecido tirou o novelo dourado do
bastão e entregou novelo e agulha ao admirado José. “Leve isto como pagamento.” – disse
ele. Assim que pronunciou essas palavras, desapareceu. José continuou olhando admirado o
novelo de fios dourados das estrelas e a agulha prateada da lua e não sabia o que fazer com
eles. Mas aí as coisas se moveram em sua mão. Sozinho, o fio de ouro se enfiou na agulha de
prata e, por si só, esta começou a costurar. Ela costurava, com os fios dourados, estrelas
brilhantes no manto azul de Maria, até acabar com todo o novelo; então o manto ficou
parecendo uma cópia do céu. Aí, a agulha prateada se lançou outra vez até as estrelas e ficou
sendo novamente o barquinho prateado da lua.
José acordou alegre no dia seguinte. Ah, que sonho lindo tivera! A seu lado, ele viu
deitado o cajado de madeira que naquela noite fora tão transformado. Agora, ele era de novo
seu velho cajado, como sempre. Então, quando seu olhar caiu sobre o manto azul de Maria,
seu coração começou a saltar de alegria. Pois estrelas brilhantes estavam costuradas com fios
dourados no pobre manto. Maria também ficou feliz e disse: “Ah, agora meu manto está, na
verdade, fino demais para mim!”. Foi assim que Maria, embora José fosse tão pobre, pôde
usar o lindo manto de estrelas da rainha do céu.

7. A LUZ NA LANTERNA
Titus, o estalajadeiro, pegou a lanterna, pois lá fora já escurecera. Ele ainda queria ir
ao estábulo, para deixar lá feno fresco para Remus, o boi. Quando acendeu a vela, notou que
ela já estava pequena, quase toda derretida. “Para um caminho curto ainda deve durar.” –
murmurou ele. E saiu para o quintal. A luz suave da vela afugentava o escuro da noite.
Chegando ao estábulo, Titus pendurou a lanterna num gancho do teto e começou seu trabalho.
Ele estava justamente colocando o feno fresco dentro da manjedoura, quando ouviu sua
mulher chamando: “Titus, onde você está? Chegaram hóspedes!” Então, o estalajadeiro
deixou cair o feno e pegou a lanterna. Mas, nesse momento, a luz flamejou outra vez bem
forte, para logo depois se apagar. “Não faz mal” – resmungou Titus. Deixou a lanterna
pendurada sobre a manjedoura, e passou depressa pelo quintal escuro até a casa.
No dia seguinte, Titus já havia esquecido a lanterna. Somente à noite ele a procurou e
se lembrou de que ela devia estar pendurada no gancho, em cima da manjedoura, no estábulo.
Titus procurou uma vela nova para substituir a velha de dentro da lanterna. Mas, quando saiu
para o quintal, viu uma luz suave brilhando através da pequena janela do estábulo. Admirado,
ele coçou a cabeça. Quem teria acendido aquela luz ali? Ele mesmo não tinha visto que ela
se apagara na noite anterior? Chamou sua mulher, pois ela também deveria olhar aquela luz
misteriosa. “Esquisito, não é?” – resmungou ele, quando entraram no estábulo e
contemplaram a luz dentro da lanterna. “Está ardendo simplesmente para nada.” A mulher
respondeu: “Sabe-se lá por que não quer se apagar… É melhor não incomodá-la, até que ela
se apague sozinha.” Assim aconteceu que, quando Maria e José com o burrinho estavam
procurando hospedagem na noite de Natal, acharam o estábulo já iluminado com aquela luz
suave. Ela continuou brilhando, até que a Criança Divina nasceu iluminando o mundo.
Mas agora vocês, com certeza, vão querer saber que luz misteriosa era aquela, que
continuava brilhando na lanterna e nem pensava em se apagar. Não, realmente não era uma
vela comum. Vou revelar a vocês. Uma estrelinha se havia introduzido na lanterna. Ela queria
estar bem perto, quando a Criança Divina fosse nascer. Por isso, ela se meteu secretamente
na lanterna e brilhava ali tão amorosamente. Se Titus tivesse olhado com cuidado, também
ele teria percebido.
______________________________________________________________________
2ª SEMANA: 7 contos de Georg Dreissig
1. PORQUE AS MAÇÃS SÃO VERMELHAS
No Jardim do Paraíso, havia uma árvore que pertencia só a Deus. Nela cresciam as
maçãs vermelhas mais belas que possamos imaginar. Se um animalzinho passava por ali ou
se um passarinho voasse por cima, sempre olhavam extasiados para aquela árvore
maravilhosa com maçãs vermelhas. Inclusive Adão e Eva, que viviam no Jardim do Paraíso,
ficavam muitas vezes admirados com aquela árvore, cujos frutos só pertenciam a Deus. Um
dia, porém, Eva foi seduzida pela serpente, pegou a maçã, provou-a e deu também a Adão
para comer. Então, de repente, a beleza da árvore foi liquidada. E, quando Adão e Eva foram
expulsos do Paraíso, o Paraíso também perdeu sua mais bela árvore. A macieira levou
tamanho susto que suas maçãs ficaram totalmente sem cor e duras. Se alguém as provasse,
não as acharia mais doces e suculentas, mas sim muito amargas.
Contudo, a macieira deveria recuperar sua beleza, mas só muitas centenas de anos
depois. Havia uma remanescente da árvore do Paraíso no jardim de Maria e José, em Nazaré.
Ela crescera atrofiada e dava, anualmente, pequenas maçãs duras e amargas. Ninguém queria
comê-las, nem mesmo o burrinho. Mas, quando o anjo foi à casa de Maria anunciar que ela
seria a Mãe do Filho de Deus, ele foi também até a macieira do jardim e sussurrou-lhe uma
mensagem: “Prepare-se, macieira, pois seu tempo de penúria acabou. Na noite de Natal vai
nascer uma Criança, e ela será o próprio Filho de Deus. Lembre-se de que você é a árvore
que carrega os frutos de Deus.”
Isto se deu na primavera. Qual não foi o espanto de Maria e José ao perceberem, nas
semanas seguintes, que aquela arvorezinha começou a se esticar e depois floresceu
lindamente. Logo se ouviu na ramagem um zunir e um zumbir, pois vieram abelhas petiscar
nas flores.
Quando, no outono, amadureceram as frutas, elas não eram pequenas e duras como
antes, mas sim redondas, grandes e vermelhas. Vocês bem podem imaginar porque. É que
elas estavam felizes por serem novamente as frutas de Deus, que ia mandar seu Filho à Terra.
Chegando a época da colheita, Maria juntou as maçãs numa cesta e disse a José: “Vamos
guardá-las para nosso Filhinho.” Por isso, quando tiveram de viajar para Belém, o burrinho
carregava nas costas um saco de maçãs vermelhas, que eles não comeram nem nas horas de
muita fome.
Assim acabou a maldição da macieira. Dali por diante, ela pôde novamente dar seus
frutos aos homens; mas todo ano algumas ficam reservadas para o Menino Jesus: as mais
vermelhinhas. Elas nos lembram como a macieira se alegra com a vinda do Filho de Deus á
Terra, e por isso devem ser guardadas para enfeitar nossa mesa de Natal.
2. O CARDO PRATEADO
Quando Deus, o Senhor, fez as plantas, perguntou a cada uma como ela gostaria de ser.
Uma gostaria de ser grande e poderosa, a outra gostaria de ter um perfume adorável, uma
desejava ter flores vermelhas, outra as queria azuis, e outra, brancas. Todos os seus desejos
Deus, o Senhor, satisfazia com prazer. Assim, Ele perguntou a uma plantinha: “Então, querida
criatura, qual é o seu desejo mais íntimo? Você quer ser grande ou pequena, ter flores
amarelas, vermelhas ou azuis?” A plantinha respondeu: “Está tudo bem para mim. Com
prazer ficarei presa ao solo e também terei espinhos, mas se você puder satisfazer meu único
desejo, é que minhas flores se mantenham até o nascimento do Menino Jesus.” Aí, Deus, o
Senhor, sorriu amavelmente e deu à plantinha a sua forma. Ela cresce bem discretamente
rente ao solo, e suas folhas são cobertas de espinhos. A flor, porém, brilha como uma linda
estrela prateada e, mesmo florescendo e sendo colhida no verão, continua viva até que venha
a época do Natal, para alegrar o Menino Jesus.
3. NA FLORESTA DE ESPINHOS
Em seu caminho para Belém, Maria e José tinham de atravessar uma floresta. Secos e
lenhosos erguiam-se os troncos áridos, e no meio deles cresciam arbustos, duros e nodosos,
ostentando em vez de folhas, espinhos pontiagudos. Estes atingiam os viajantes, rasgando
suas vestes. E o burrinho, então, que não se podia desviar como os homens, levava a pior; os
espinhos continuamente entravam em seu pobre pelo, até que ele, por fim, não queria mais
andar. Não adiantava pedir nem ralhar. O burrinho empacava e gritava um lastimoso “Hin-
hon”, todas as vezes que José, com seu cajado, queria forçá-lo a andar. Aí José ralhou com
os arbustos espinhentos, que lhes dificultavam tanto a viagem. Maria, porém, a querida Mãe
Divina, pôs suavemente a mão sobre o ombro do marido e disse: “Querido José, não reclame
tanto dos arbustos de espinhos. Eles não podem produzir outra coisa além de espinhos, pois
o clima é muito seco nesta região. Se eles tivessem mais água – eu lhe dou minha palavra –
dariam rosas perfumadas para nós e para nosso querido filho.” Depois, ela elevou os olhos ao
céu e pediu: “Meu Deus amado, faça com que sua bondade desça como orvalho vivificante,
a fim de que estes pobres arbustos de espinhos se possam transformar como desejam.”
Assim que Maria pronunciou essa oração, caiu do céu um suave orvalho sobre os
arbustos espinhosos. Estes absorveram a água com toda a alegria e, enquanto o faziam, todos
os seus espinhos caíram. No lugar deles, porém, floresceram rosas maravilhosas; elas
brilhavam nas mais lindas cores e pareciam apostar, umas com as outras, qual delas daria o
perfume mais agradável. Maria e José agradeceram pelo milagre. O burrinho por sua vez,
ficou de novo muito alegre e, esticava o nariz para o ar perfumado, trotando com prazer na
frente, rumo a Belém.
4. OS TUBÉRCULOS MODESTOS
Um negociante fez uma viagem a terras distantes e, ao voltar, trouxe consigo muitos
presentes maravilhosos: tecidos e utensílios, joias e especiarias. Para cada pessoa de sua
família, ele trouxe um presente especial. Para sua esposa, porém, deu um saquinho de
aparência muito simples, mas que continha o que ele havia adquirido de mais caro. “Cuide
bem dele” – disse o negociante à sua mulher – “pois ouvi dizer que este saquinho possui o
dom da profecia. Ele nos anunciará quando o Rei do Mundo virá até nós.” A mulher se
admirou com aquilo; pôs o ouvido sobre o tecido rústico do saquinho, mas não percebeu som
algum. De vez em quando pegava o saquinho, observava-o atentamente, mas não conseguia
descobrir nele nada que fosse excepcional. Quando finalmente o marido saiu outra vez de
viagem, ela pegou o saquinho, entrou furtivamente na floresta e, tendo a certeza de não ser
vista por ninguém, abriu-o e olhou dentro. E o que ela viu? Alguns tubérculos comuns,
pequenos e pouco vistosos. “É este todo o seu segredo?” – exclamou a mulher decepcionada.
E espalhou os tubérculos pelo caminho, enquanto voltava para casa. Os tubérculos
modestos foram deixados no caminho da floresta, expostos ao tempo e ao vento, até que a
terra e o pó vagarosamente os cobriram.
Mais tarde, em seu caminho para Belém, Maria e José passaram justamente por aquela
floresta. Foi então que se viu que o negociante dissera a verdade: Sob os pés da querida Mãe
Divina, os tubérculos brotaram, e deles cresceram pequenas flores branco- prateadas, que
brilhavam como se o caminho estivesse semeado de estrelas. Eles anunciam também hoje a
vinda do Rei do Mundo. Por isso, as rosas-de-natal (que é o nome dessas flores) desabrocham
na época do Natal.
5. OS PINHEIROS
Quando Deus, o Senhor, criou as árvores, deu-lhes raízes para que se firmassem bem
na terra e também galhos que se pudessem direcionar para o alto, para o céu. Pois foi do céu
que elas vieram, e disso elas não se deviam esquecer. Desde então, as árvores, numa saudosa
lembrança, estendem seus galhos para o alto, como que em silenciosa e constante oração.
Assim também fez o pinheiro, e como seus ramos erguidos para o alto eram muito amplos e
compridos, ele sobrepujava as outras árvores. Hoje ele é muito diferente, e a razão é a
seguinte.
Mais uma vez, Maria, a querida Mãe Divina, e seu marido José não tinham achado
nenhum abrigo à noite e estavam longe de qualquer moradia. Assim, tiveram que se abrigar
no meio da floresta, junto ao tronco de um delgado pinheiro. Ali eles tentaram dormir. Mas
o vento soprava muito gelado, e começou a nevar, primeiro de leve depois mais forte. Eles se
espremiam junto ao tronco da árvore, que era alta mas lhes dava pouco abrigo. Maria, então,
passou carinhosamente suas mãos delicadas no tronco do pinheiro e pediu: “Sinto interromper
a silenciosa oração que você envia para o alto, para o Pai de todos nós. Mas veja, o próprio
Deus se inclinou para a Terra, pois é seu Filho que carrego em meu ventre, e ele precisa de
sua ajuda.” Assim que a Mãe Divina disse essas palavras, um tremor percorreu toda a árvore
e, vagarosamente, seus galhos se foram abaixando, abaixando até tomarem a forma de um
largo telhado. Até então, os galhos do pinheiro também perdiam suas folhas no outono como
as outras árvores, mas a partir desse instante elas espetaram de novo suas agulhas verdes e
assim ficaram para sempre. Foi desse modo que Maria e José encontraram, sob os galhos do
pinheiro, um abrigo seguro para a noite.
Desde então, por haver interrompido sua oração silenciosa em favor da sagrada família,
o pinheirinho foi honrado especialmente. Ele pode, no Natal, portar velas brilhantes em seus
compassivos galhos abaixados e, mais que todas as outras árvores, irradiar uma linda luz
diante dos homens e diante de Deus.
6. COMO O ABRUNHEIRO FOI HONRADO
Fazia tempo que a colheita havia sido feita, pois o outono já passara e começava o frio
rigoroso do inverno. Arbustos e árvores estavam sem folhas e sem frutos e alimentavam o
sonho de uma primavera luminosa, do esplendor das flores e do zumbir das abelhas. Também
o abrunheiro perdera as folhas. Mas seus frutos ainda se penduravam nos galhos secos.
Ninguém os quisera. Quando as mulheres tinham vindo no outono em busca de bagas,
colhiam as de amora, olhando o abrunheiro só de relance e continuando a andar. “Olhem só
o abrunheiro! Que sujeitinho desagradável com seus espinhos pontudos!” – disseram umas
às outras – “Ele defende suas bagas, que aliás ninguém quer. Pode bem guardá-las, pois são
acres e não têm sabor.” Por isso as bagas azul-escuras ficavam penduradas entre os espinhos
no arbusto, que já havia sofrido a primeira geada. O que o arbusto não daria para se carregar
de bagas doces, de que as pessoas tanto gostavam, como as da framboesa. Ele até renunciaria
às suas lindas flores brancas. Mas todos os desejos não mudavam o fato de que ele era um pé
de abrunho e não de framboesa.
E tudo estava certo assim. Pois um dia, Maria e José, em seu caminho para Belém,
vinham passando pela floresta. Estavam cansados e com fome. Sem querer, seu olhar caiu
nas bagas escuras do arbusto cheio de espinhos. “Olhe só, José!” – exclamou Maria – “O
querido arbusto guardou seus frutos para nós!” E, sem se importar com os espinhos pontudos,
a Mãe Divina começou a colher os abrunhos. José, porém, respondeu: “Evite esse arbusto.
Seus frutos são intragáveis. Veja, ninguém os quis.” Mas Maria não se deixou enganar.
“Como podem ser saborosos, se eles têm de aguentar todo esse tempo um frio tão forte? Até
nós, seres humanos, ficaríamos amargos. Quem sabe ficam mais agradáveis, se os colocarmos
no calor.”
À noite, conseguiram hospedagem na casa de camponeses amáveis. Estes também se
admiraram muito com os frutos que Maria trazia. “Vocês conseguiram tirá-los do abrunheiro?
E ele o deixou de boa vontade?” A querida Mãe Divina confirmou: “Sim, de boa vontade.
Ele não é tão mau quanto seus espinhos parecem ser!” Então, ela pediu um pouco de água
quente, e dentro dela colocou os frutos; e assim toda a geada, todo o frio foi tirado deles. No
dia seguinte, ela ofereceu a José e aos camponeses um suco vermelho, maravilhosamente
brilhante, do qual eles gostaram tanto, que com prazer tomariam mais. “Ele faz um bem!” –
disse José. – “Não sinto mais o frio e o corpo enregelado. Maria, como você fabricou isso
sozinha?” Então a Mãe Divina sorriu alegremente e respondeu: “Eu não fabriquei nada. Foi
o abrunheiro. Ele guardou esta bebida gostosa para nós em suas bagas, para que possamos,
tal como ele, enfrentar o frio do inverno.”
Desde então, os homens olham o abrunheiro espinhoso com mais amor e sabem
valorizar seus frutos, que só amadurecem com a geada. E o abrunheiro ficou feliz por ser um
pé de abrunho e não um pé de framboesa. Pois só assim ele pôde dar seus frutos para a querida
Mãe Divina, em seu caminho para Belém.
7. O SEGREDO DAS ROSAS
Como ficou feliz a Mãe Divina por causa das rosas que de repente floresceram nos
arbustos espinhosos! Ela colheu um ramalhete e, daí por diante, seu braço o carregava
enrolado sob o manto. E as rosas continuavam frescas e mantinham seu perfume adorável
para Maria.
Nisso, quando Maria e José chegaram perto de Jerusalém, aproximaram-se deles três
soldados romanos. Estes se comportavam como grandes senhores, e já de longe gritavam:
“Abram caminho para o exército romano!” O pobre burrinho, que vinha trotando sem saber
de nada, levou do mais forte dos três uma tal pancada no flanco, que pulou assustado para o
lado. Maria e José ficaram parados à beira do caminho; na verdade havia ali lugar para todos,
mas eles não queriam dar motivo para brigas. E era justamente isso que o soldado grosseiro
estava procurando. Quando ele viu Maria tão humildemente com o manto envolvendo as
rosas, acercou-se dela e, rindo sarcasticamente junto a seu rosto, gritou: “Ei passarinho, que
está você escondendo de nós? Vamos ver se não precisamos disso!” Mas, assim que ele
agarrou as rosas, puxou a mão criminosa, praguejando e insultando. Ela estava toda arranhada
e sangrando. “Que você carrega aí?” – perguntou a Maria. Ela então abriu o manto e mostrou
só um ramo com espinhos. Antes que o soldado se refizesse do assombro, seus companheiros
se aproximaram, e um deles disse: “Deixe-a, Varus. Quem sabe qual é a dor que esta mulher
terá que suportar, para precisar enfeitar-se com espinhos?” Já arrependido, o outro, que havia
começado a briga com aquelas pessoas pobres, seguiu em silêncio seus companheiros.
Maria, porém, olhava para os ramos de espinhos em seus braços. O orvalho abençoado
de Deus não os havia deixado florescer? Onde estavam agora as rosas? Tudo se acabara?
José, que percebeu sua tristeza, pôs suavemente a mão sobre seus ombros e falou
consoladoramente: “Elas floresceram por tanto tempo para você, Maria. Dê-se por satisfeita
e jogue fora os ramos secos.” Maria, porém, sacudiu a cabeça e respondeu: “Eu conheço o
segredo dos ramos de rosas. Como poderia então deixá-los de lado?” E, com cuidado,
envolveu novamente no manto os pobres ramos, que na verdade pareciam não precisar mais
de proteção alguma. Mas, em seu coração, continuavam soando as palavras daquele soldado
romano: “Quem sabe qual é a dor que esta mulher terá de suportar, para que tenha de se
enfeitar com espinhos?” Que as pessoas pensassem o que quisessem; os espinhos antes
haviam florescido. Deveria ela desprezá-los agora em sua miséria? De repente, Maria sentiu
novamente o adorável perfume que as rosas por tanto tempo haviam exalado para ela. E,
quando ela olhou com cuidado debaixo de seu manto, os ramos floresciam novamente mais
lindos ainda. Essas rosas se mantiveram vivas para Maria, até que ela deu à luz ao Menino
Jesus, no estábulo de Belém.
______________________________________________________________________
3ª Semama 7 contos de Georg Dreissig
1. PORQUE O BURRINHO NÃO QUERIA PARAR
Os burrinhos são animais muito teimosos. São fortes e perseverantes, e conseguem
levar cargas muito pesadas. Mas às vezes simplesmente estão sem vontade e não adianta pedir
nem brigar com eles; se não quiserem obedecer, não obedecerão. Se você quiser forçá-los a
trabalhar, eles fincam seus cascos no chão, e você pode puxar ou empurrar, mas não consegue
tirá-los do lugar. Quando você estiver desesperado, pode acontecer que sua teimosia
desapareça de repente – como que por encanto – e seu burrinho volte a ser a criatura mais
querida, prestativa e fiel que você possa imaginar.
Pois também era assim com o burrinho de Maria e José, e a viagem para Belém teria
sido ainda mais difícil e longa, se o burrinho não tivesse se transformado num animal de carga
dócil e pacífico. E isso aconteceu da seguinte maneira:
José estava carregando o burrinho com os poucos pertences que iriam necessitar na
viagem à Belém, e o burrinho manteve-se quieto, e parecia ser o animal mais dócil e amável
de toda a Nazaré. Mas quando José tomou da corda para puxá-lo, este empacou e não quis
dar nenhum passo à frente. José tentou convencê-lo com carinhos e depois com ameaças: o
burrinho fincou os cascos no chão e não se moveu. Então Maria tentou a sorte, fez-lhe carinho
entre as orelhas e pediu-lhe que viesse, por favor, pois o caminho para Belém era longo e
teriam que se apressar. Mas o burrinho continuou empacado e não quis saber de conversa.
Neste apuro, interveio o Anjo Gabriel. Sem que Maria e José o tivessem visto, ele se
aproximou do burrinho e disse: “Você é tão pequeno e fraco, que tem toda a razão em não
querer ir a Belém, pois o caminho certamente lhe será muito penoso. Vou chamar alguns
Anjos, para que levem sua carga, e assim você poderá ficar aqui. Só me dá pena – adicionou
o Anjo, lamentando – você não poder então ouvir os Anjos cantando, quando o Menino Jesus
nascer, nem poder provar do feno doce sobre o qual o Menino estará deitado…”
Anjos cantando? Feno doce? E ele aqui tão bobo, empacado, correndo o perigo de
perder as melhores coisas do mundo? O burrinho pôs as orelhas em pé e ficou à escuta, como
se o canto dos Anjos já pudesse ser ouvido. O focinho ele esticou no ar, farejando, pois parecia
mesmo que o cheiro do feno doce já vinha ao seu encontro. Esqueceu-se totalmente de
empacar. O burrinho nem quis seguir obediente a Maria e José; não, ele corria, alegre, na
frente e não via a hora de chegar a Belém. De noite, mal parava para descansar, e de manhã,
antes do nascer do sol, já começava a zurrar “Hin-hon!”, que significa: “Levantem-se, vamos
depressa para Belém, para junto dos Anjos cantando e do feno doce. Não há tempo a perder!”.
Sim, é assim que um burrinho pode às vezes se transformar, se ficar à escuta, bem atento, e
ouvir o que o Anjo lhe diz.
2. O QUE A ARANHA FEZ PARA MARIA
Em uma noite, Maria e José se alojaram numa caverna para passar a noite. Ao entrarem,
José viu uma aranha rastejando por ali e quis espantá-la com seu cajado. Mas, nesse momento,
Maria disse delicadamente: “Ah, José, deixe esse querido animalzinho. Eu não tenho medo
dos seres criados por Deus, e há lugar para todos nós aqui!” Depois, deitaram-se para
descansar.
Naquela noite, soprava um vento constante. Ele queria, antes que o Menino Jesus
nascesse, limpar logo todas as estrelas do céu, para que seu brilho dourado resplandecesse na
noite de Natal. O vento também soprou dentro da caverna, e a Mãe Divina sentiu tanto frio,
que mal conseguia fechar os olhos, apesar de se envolver com o seu manto de estrelas. José
há tempos caíra no sono e não percebera o quanto ela se sentia enregelada.
Mas alguém notou o estado de Maria: foi a pequena aranha. Ela envolvera a Mãe Divina
em seu pequeno coração, porque Maria falara dela de maneira tão amorosa. Então, a aranha
se pós a trabalhar o melhor que podia e fez uma fina e maravilhosa teia na entrada da caverna.
Vocês podem talvez pensar que uma teia de aranha não segura o vento que vem de fora. Mas,
apesar de delicada como era, a aranha fez uma cortina impermeável e grossa, que a violência
do vento não atravessava. Assim, Maria pôde ainda dormir um bom sono.
Quando, na manhã seguinte, ela avistou a fina teia de aranha na entrada da caverna,
ficou sabendo quem a havia ajudado e agradeceu de coração ao pequeno animalzinho, que se
escondera contente numa fenda na rocha da caverna.
3. PORQUE O RABO DOS COELHOS É BRANCO
O coelhinho correu brincando no prado durante todo o verão, pulou o quanto queria e,
de tanta alegria de viver, deu muitas cambalhotas. Mas, quando o inverno chegou, o prado se
cobriu de neve e o sol quis brilhar cada vez menos, e o coelhinho se meteu de volta em sua
toca. Esta era bem forrada com folhas e capim. O coelhinho acomodou-se com seu focinho
pequenino entre as patinhas e tratou de ficar deitado e dormindo até a chegada da primavera.
Só se a fome ficava muito forte é que ele deixava sua aquecida cova, mas tratava de voltar
ligeiro, quando sua barriguinha estava novamente cheia.
Certo dia o coelhinho sonhou que um anjo veio até sua toca, puxou-o levemente pelas
longas orelhas para acordá-lo e lhe falou. O coelhinho abriu os olhos e olhou em volta. Não
podia mais ver o anjo do seu sonho. Mas ainda se lembrou de suas palavras: “Estão aí duas
pessoas pobres que perderam o caminho nesta neve. Corra e ajude-as a encontrá-lo. Seu
narizinho vai conduzi-lo em segurança. E de fato foi assim! Não longe dali o coelhinho
avistou os dois: um homem e uma mulher, e com eles um burrinho. O homem olhava em
volta procurando pelo caminho, mas não o via, porque tudo estava coberto de neve. O
coelhinho, porém, sentiu um cheiro de fumaça, que subia das chaminés das casas que ficavam
escondidas numa baixada. Depressa pulou por cima da neve até Maria e José, ficou de pé nas
patas traseiras e saiu pulando em direção à aldeia. Quando se virou de volta, viu que as
pessoas continuavam no mesmo lugar, olhando-o espantadas. Ele então voltou até elas, mais
uma vez ficou de pé nas patas traseiras, depois deu cambalhotas que marcaram um pequeno
caminho na neve. Então Maria e José compreenderam o que o coelhinho queria dizer e o
seguiram. Pulando e saltando, o coelhinho correu à frente até que puderam ver a aldeia. Lá,
o coelhinho parou e balançou alegremente suas orelhas compridas. E como ficou satisfeito
quando José lhe agradeceu de todo o coração! Ficou, porém, mais feliz ainda quando a querida
Mãe Divina se abaixou até ele, acariciou-o suavemente e sacudiu a neve de seu pelo, de todo
o seu pelo; só na ponta do rabinho ficou um pouco de neve. Foi assim que o rabinho ainda
estava branco com a neve, quando o coelhinho finalmente pulou para dentro de sua toca tão
quentinha.
Mas, ao chegar a primavera, e tendo a neve lá fora já se derretido, o rabinho do coelho
continuou branco, e isso acontece até hoje com todos os coelhos. É a lembrança daquela vez
em que um coelhinho guiou Maria e José com segurança através da neve.
4. A PROVISÃO DO ESQUILO
No outono, o esquilo juntara nozes diligentemente. Aqui e ali, ele tinha montado uma
despensa, cobrindo tudo cuidadosamente com folhas, terra e galhos, para que tudo ficasse
protegido e ninguém descobrisse. Só havia um problema. Depois de ter escondido tão bem
todas as nozes, o próprio esquilo não conseguia mais achá-las. E quando chegou o inverno,
da mesa da Mãe Natureza, tão ricamente arrumada no verão, só restou uma escassa refeição:
também o esquilo teve de passar fome, apesar de toda a sua provisão. Que maçada! Agora ele
teria que fazer uma coisa que não lhe agradava nem um pouco: teria de se arriscar para
conseguir algo de comestível na fazenda dos camponeses.
Então, uma vez aconteceu que o esquilo foi testemunha de um acontecimento nada
agradável. Duas pessoas pobres bateram à porta de uma casa, pedindo esmola, mas foram
escorraçadas aos gritos e berros pela dona da casa. Quando o esquilinho viu a tristeza no rosto
das pessoas, ele sentiu uma dor em seu pequeno coração, desejando ardentemente poder
ajudá-los. Ah! Se ele pudesse apenas achar suas despensas!
Bem depressa, ele voltou pulando para a floresta, a fim de procurar mais uma vez. E
eis que de repente tudo ficou muito fácil. Não que ele de repente tivesse se lembrado. Mas
por toda parte onde ele havia escondido suas nozes, agora parecia brilhar na terra uma luzinha,
mostrando-lhe o caminho. Então ele escavou e desenterrou, encheu as suas bochechas e saiu
pulando atrás dos pobres andarilhos. Na verdade, ele estava um pouco amedrontado, mas
quando viu o doce olhar de Maria e José, perdeu toda a timidez. Com um pulo ligeiro, deixou
no caminho duas nozes para cada um. Vocês acham que isto é muito pouco para uma barriga
vazia? Mas o que é dado com amor é sempre um pouco mais do que parece. Maria e José
agradeceram ao pequeno companheiro, comeram as nozes, saciando um pouco sua fome.
Daí para a frente, o esquilinho se sentiu bem. Pois, sempre que ele procurava suas
despensas, brilhavam luzinhas no chão, de modo que ele nunca mais precisou escavar em vão
atrás das nozes.
5. PEDRO, O CÃO DE GUARDA
Mais uma vez, em seu caminho para Belém, Maria e José procuraram em vão uma
pousada para a noite, e já acreditavam ter que passar a noite ao ar livre. José, então, na
penumbra do crepúsculo, viu uma casinha sem luz, bem longe. Chegando mais perto,
perceberam que não era moradia de pessoas, mas um aprisco para ovelhas. De qualquer modo,
teriam um telhado sobre suas cabeças e um pouco de calor. Só que Maria e José não haviam
contado com Pedro.
Pedro era o cão de guarda. Durante o dia, ele ajudava o pastor a levar as ovelhas ao
pasto, mas de noite cuidava do aprisco para que nenhum ladrão se acercasse das ovelhas.
Quando Pedro percebeu pessoas se aproximando, pulou, arrastou a pesada corrente na qual
estava amarrado e latiu ameaçadoramente: “Au, au!” E isso queria dizer: “Cuidado! Aqui
vocês têm de me prestar contas! Não cheguem muito perto!” Ao ouvir aqueles latidos ferozes,
José deu de ombros e se voltou. “Não podemos fazer nada,” – disse ele a Maria – “será mais
difícil ainda lidar com esse guarda do que com pessoas de coração duro.” Maria também
parou, e ficou ouvindo os latidos de Pedro, que demonstravam como estava satisfeito em
manter afastados aqueles seres humanos. Mas depois Maria disse: “José, vamos pelo menos
tentar! As noites estão tão frias, que não conseguiremos dormir, sem ter um telhado sobre
nossas cabeças.” E, dizendo isso, foi andando tranquilamente em direção ao aprisco.
Pedro, então, ficou fora de si de raiva. Latia e pulava preso à corrente, em direção à
Mãe Divina. Mas, antes que José pudesse intervir com seu cajado, algo inesperado aconteceu.
Como se obedecesse a uma ordem inaudível, Pedro parou de latir, ficou quieto, olhou para
Maria, que havia chegado ao seu alcance, e de repente começou a abanar o rabo, para lá e
para cá, para cá e para lá. E o cão de guarda saltou como um cabritinho para perto de Maria
e deitou- se de costas, com as patas para o ar. Maria inclinou-se para afagar-lhe a barriga.
Pedro deu mais uma rosnada quando José se acercou, mas a mão carinhosa de Maria o
tranquilizou de novo. “Olhe só como este malandrinho puxou sua corrente,” – disse Maria a
José – seu pescoço está todo ferido. E passou suavemente seus dedos delicados nas feridas.
Pedro nem se moveu.
Mais tarde, o cachorro desejou ardentemente poder entrar no aprisco e ficar bem junto
de Maria; mas como isso não era possível, deitou-se bem perto da porta, e seu pequeno
coração pulava de alegria, pois essa noite iria cuidar também da Mãe Divina.
No dia seguinte, bem cedo, chegou o pastor, para ver como estavam as ovelhas. De
longe viu, porém, uma cena que o deixou muito admirado. A porta do aprisco abriu-se, e um
homem e uma mulher, seguidos por um burrinho, saíram de lá. E Pedro, o feroz cão de guarda,
pulou de encontro a eles, abanando o rabo, e lambeu a mão da mulher. Enquanto isso, as
ovelhas baliam como se estivesse com elas alguém que conhecessem e de quem gostassem
muito. O pastor ficou observando tudo aquilo, como se estivesse sonhando e, só depois que
Maria e José haviam partido, acordou de seus pensamentos. “Ei, Pedro,” – disse ao cão –
“quem foram seus hóspedes?” Ah, se ele entendesse a língua dos cães! Pedro lhe teria contado
com certeza quem passara a noite no aprisco.
Quando, porém, o pastor se inclinou para o cachorro, viu que as horríveis feridas de
seu pescoço haviam sarado durante aquela noite. E ficou mais admirado ainda!
6. DO CARNEIRO QUE NÃO QUERIA SER TOSQUIADO
Branco-como-a-neve era o carneirinho mais bonito de todo o rebanho; o branco de sua
lã brilhava muito mais que a de seus companheiros. Mas isto também era a única coisa que o
diferenciava. De manhã, sempre acompanhava de boa vontade o rebanho para o campo e, à
noite, voltava obediente para o redil. Mas, quando chegava com a primavera o tempo da
tosquia, num repente acabava-se toda a obediência. Enquanto as outras ovelhas sujeitavam-
se à tosquia, Branco-como-a-neve saía correndo toda vez que alguém queria agarrar sua lã e
fugia aos pinotes. Não, ele não queria, de modo algum, entregar sua lã. Por fim, o pastor
cansou-se de correr atrás do carneirinho e decidiu: Branco-como-a-neve vai então ficar com
sua lã de inverno. Ele verá quanto calor vai sentir no verão com sua lã grossa.
Então, quando todos os outros carneiros iam para o campo já tosquiados, enquanto sua
lã, amarrada em grandes fardos, era vendida no mercado, Branco-como-a-neve continuava
pastando com seu grosso casaco de lã. Não, na verdade não foi fácil quando o verão chegou.
Vez ou outra o carneirinho sentiu calor e, sempre que podia, procurava uma sombra para se
refrescar. O pastor bem que queria ajudar seu carneirinho e ainda livrá-lo de sua lã. Mas nem
assim Branco-como-a-neve permitiu que o pastor se aproximasse com o tosador. Sim, mas
para quem ele queria guardar sua lã?
Chegou o inverno e, com ele, aquela noite em que Maria e José pernoitaram no
estábulo. No dia seguinte, porém, Branco-como-a-neve estava totalmente transformado,
postou-se diante do pastor e, com vários sinais procurou deixar claro que queria, de qualquer
maneira, ser tosquiado. “Mas isto não é possível.” – disse o pastor – “Agora no inverno você
precisa de sua lã.” Branco-como-a-neve, porém, não parou de implorar e, como de nada
adiantasse, o carneirinho ficou muito triste, parou de comer e, mesmo ouvindo boas palavras,
não se moveu mais. “Então, que seja feita a sua vontade.” – suspirou o pastor finalmente e,
pegando o tosador começou a tosá-lo. Branco-como-a-neve permaneceu muito quieto, como
se nunca tivesse sido teimoso na vida, até que seu último cachinho branco fosse cortado. Mas,
para que o carneirinho não tivesse que passar tanto frio, o pastor procurou um velho casaco e
lã e o vestiu com ele. Da lã tosquiada, porém, ele fez uma trouxinha e guardou-a, pois ainda
faltavam muitos meses para a próxima venda no mercado.
Contudo, quando finalmente a época do mercado de lã chegou, a trouxinha de lã branca
já tinha sido presenteada há bastante tempo. O próprio pastor a havia levado para o Menino
Jesus, que nasceu num estábulo em Belém. E, finalmente, ele descobriu para quem Branco-
como-a-neve tinha guardado sua linda lã branca.
7. OS RATINHOS DE NATAL
Em Belém havia um estábulo velho e caindo aos pedaços; nela habitava Remus, o boi.
Feno e palha espalhavam-se pelo chão, e no canto ficava a manjedoura, da qual Remus comia.
Justamente nesse estábulo devia vir ao mundo o Menino Jesus. Quando o anjo Gabriel deu
uma olhada lá dentro, levou um susto e exclamou: “Nesta sujeira e nesta desordem a Criança
divina não pode enxergar a luz do mundo. Você, boi Remus, faça alguma para que este lugar
fique bonito e arrumado.” Mas o boi, pensativo, só olhava o anjo com seus grandes olhos
redondos, e continuava a comer calmamente. Ali no estábulo tudo estava como sempre
estivera, e por ele poderia continuar assim.
Com que prazer o anjo Gabriel teria começado ele mesmo a pôr ordem no local! Mas
isso ele não o podia fazer com suas mãos de luz. Quem o ajudaria? De repente, ouviu um
chiado fino e delicado e, quando procurou no estábulo, percebeu um pequeno ratinho, que o
olhava de seu buraco, no canto. O ratinho tinha visto o anjo e agora chamava seus filhinhos;
eles também deveriam ver a aparição celeste. Então, Gabriel se dirigiu aos ratinhos e pediu:
“Vocês não querem ajudar a pôr em ordem o estábulo, a fim de que o Menino Jesus tenha um
lugar bonito para nascer, na noite de Natal?” Os ratinhos não esperaram que ele pedisse duas
vezes. Rapidamente saíram de seu buraco, agarrando cada um uma palhinha e desaparecendo
com ela rapidamente. Logo depois, apareceram outra vez, continuaram a arrumar e, em
pouquíssimo tempo o velho estábulo estava lindo e em ordem. Até o boi gostava mais dele
assim do que antes. Aí, Gabriel elogiou os ratinhos e disse: “Porque vocês me ajudaram tão
diligentemente, devem ser chamados de Ratinhos do Natal e, quando o Menino Jesus nascer,
vocês estarão entre os primeiros que poderão vê-lo.” Com isso, os ratinhos ficaram felizes e
passaram a esperar ansiosamente pela noite de Natal.
______________________________________________________________________
4ª Semana 7 contos de Georg Dreissig
1. UM PUNHADO DE PALHA
Certa noite, Maria e José bateram na porta de um camponês e pediram abrigo para
passar a noite. Mas o camponês era um homem rabugento e duro de coração, que não gostava
de ajudar sem ser pago. Mas como ele viu que não conseguia tirar nada daquelas pessoas
pobres, mostrou-lhes um canto do quintal e disse: “Ali, onde o telhado sobressai, vocês
podem deitar-se no chão.” Maria, então, perguntou baixinho: “E o senhor não teria um
punhado de palha, para não precisarmos dormir na terra fria?” Os olhos do camponês
brilharam encolerizados. Mas depois ele cedeu: “Bem, um punhado eu dou, mas nada mais.”
E ele mesmo foi até o celeiro e puxou do imenso monte de palha um punhado, deu a José e
bateu a porta.
José olhou preocupado aquele pouquinho de palha. Que faria ele só com isso? Maria,
porém, tomou-as delicadamente de sua mão e começou a espalhá-las no chão, palha por palha.
E vejam só: a palha deu para fazer um leito para os dois, e até para o burrinho ainda sobrou
um pouco. Assim, os três puderam até dormir bem.
Na manhã seguinte, antes de partirem, Maria e José agradeceram ao hospedeiro pouco
amável. Este resmungou e os deixou partir. Quando ele mesmo foi mais tarde ao quintal,
notou novamente as palhas, que ainda estavam espalhadas onde Maria e José haviam
dormido, aqui uma, lá outra, só mesmo um punhado. Ele já queria ficar zangado, pois os dois
hóspedes não tinham arrumado as palhas. Mas quando observou mais atentamente, viu que
elas eram puro ouro. Pegou uma e balançou-a na mão. Com a outra mão ele bateu com a testa
e exclamou: “Você é um bobo! Deveria ter deixado essa gente dormir dentro do celeiro, pois
assim toda a sua palha seria agora de ouro!” Bom, agora era tarde demais. Mas, pelo menos,
ele resolveu vender por um bom dinheiro as poucas palhas que ficaram ali. O camponês, duro
de coração, as envolveu em um pano e caminhou até a cidade mais próxima. Depois de muita
pechincha, ele achou um ouvires, que lhe pagaria um bom preço. Satisfeito com o lucro que
tinha conseguido com o pobre abrigo que oferecera, tirou as palhas do pano. Como ele ficou
perplexo e como o ourives riu na sua cara, quando apenas palhas comuns apareceram de
dentro do pano! Assim, o camponês só trouxe para casa essa caçoada, que se manteve nele
por longo tempo, por causa da dádiva da sagrada família, que ele gostaria de ter vendido.
2. A SOPA QUENTE DA MULHER POBRE
Rebeca era a mulher mais pobre da aldeia. Ela só tinha a roupa do corpo, o que era
muito pouco, pois a saia e a blusa estavam esfarrapadas e as meias e os sapatos cheios de
buracos. Todos a conheciam, e Rebeca conhecia todas as pessoas da aldeia e sabia onde podia
pedir algo quando estava com fome e onde era possível dormir abrigada, quando o duro
inverno não deixava que passasse a noite ao ar livre. Ela vivia miseravelmente, mas estava
acostumada e nem conseguia imaginar que pudesse ser diferente. Uma vez, um fazendeiro
lhe disse que realmente tinha muita pena dela e ela respondeu: “Pelo menos sei que não sofro
de algo que vocês sofrem!” E como ele a olhasse muito espantado ela continuou: “Eu peço
esmola a todos vocês. Mas nunca veio alguém pedir-me alguma coisa!” E, com um sorriso
maroto, pegou o pão que o fazendeiro lhe havia dado, prendeu-o debaixo do braço e foi
embora.
Mas, naquele inverno em que aconteceu esta história que lhes quero contar, havia muita
necessidade na região, e as pessoas mal tinham o suficiente para satisfazer a própria fome. A
mendiga só a muito custo conseguia ajuda e tinha que bater em muitas portas, para conseguir
uma pequena refeição. Um dia, Rebeca havia pedido um pouco de sopa quente, e o que lhe
deram mal deu para encher metade de sua jarrinha. Quando se sentou à beira da estrada para
comer, ela viu de repente se aproximarem um homem e uma mulher com um burrinho. Vocês
já adivinharam: eram Maria e José em seu caminho para Belém. O homem parecia estar muito
abatido, e a expressão no rosto pálido da jovem mulher era tão sofrida, que até Rebeca ficou
com pena deles. “Ei, amigos!” – chamou ela – “por que estão abatidos e tão tristes? Que lhes
falta?” José olhou em silêncio para ela, medindo de relance a jarra que ela tinha na mão.
Maria, porém, respondeu baixinho: “Nada temos para comer, e por isso está difícil caminhar.”
Rebeca perguntou: “Mas por que não compram alguma coisa?” “Não temos dinheiro para
comprar comida.” – foi a resposta. “E por que não pedem?” – Rebeca quis saber. “Nós
tentamos” – confessou Maria envergonhada – “mas ninguém quis dar alguma coisa.” A
mendiga replicou: “É, eu sei. Os tempos estão ruins. Todos têm pouco. Olhem só o que me
deram!” E mostrou-lhes a jarra com aquele pouquinho de sopa. E, de repente, teve uma ideia
extraordinária, uma ideia que nunca lhe havia ocorrido em toda a sua vida. E ela perguntou
cautelosamente: “Vocês têm alguma vasilha aí?” Sim, Maria e José tinham uma vasilha.
“Então vamos repartir” – decidiu a mendiga – “minha sopa e sua fome.” José desempacotou
sua vasilha, e Rebeca derramou nela um pouco de sopa, e depois mais um tanto. Sua própria
jarra ficou vazia, mas ela segurou-a de tal modo que Maria e José não o notaram. Quando a
pobre viu as duas pessoas famintas tomando a sopa, sentiu uma alegria como nunca antes
havia sentido. Até mesmo esqueceu por alguns instantes sua própria fome.
Ah, Maria e José levaram só poucos minutos para acabar com a sopa, e novamente se
puseram a caminho. Rebeca ainda ficou por longo tempo seguindo com os olhos os viajantes,
que haviam ensinado a ela um sentimento que lhe era desconhecido e lhe dera tanta alegria.
Por fim, quando se inclinou para pegar sua jarra vazia, viu que ela estava cheia até a borda
com uma sopa deliciosa e quentinha, que lhe satisfez toda a fome.
3. JUNTO À FOGUEIRA DOS PASTORES
Nos campos diante dos portões da cidade de Belém, ardia uma fogueira. Em volta dela,
sentados, alguns pastores se aqueciam, pois era inverno e as noites eram frias. Ao redor deles,
em círculo, as ovelhas deitavam-se em calma e paz. Só os cães passavam sem cessar por entre
o rebanho, e vigiavam. “Como seria bom” – suspirou de repente Samuel, o pastor jovem –
“se não existissem mais lobos que ameaçassem o rebanho…” Jacó, porém, abanou teimoso a
cabeça e respondeu ao companheiro: “Que adianta sonhar? Enquanto houver ovelhas, haverá
lobos que as ameacem.” Aí, Elias, o velho, levantando a cabeça branca, olhou os dois com
seus olhos claros e disse misteriosamente: “Quem sabe, quem sabe. Soube de uma profecia,
que diz que um dia os lobos pastarão pacificamente com as ovelhas.” Samuel logo perguntou:
“Quando será isso?” O velho balançou pensativamente a cabeça: “No livro está escrito que
um dia o Filho de Deus nascerá como homem. Então acabará toda inimizade na Terra, e
haverá paz entre os homens e os animais. Mas quando esse dia virá, ninguém sabe dizer.”
Pensativos, os pastores olhavam para o fogo. De repente, começaram a ouvir um lindo
canto, tão suave, que lhes tocou o coração. Quando eles se viraram, vinham vindo pelo
caminho que levava à cidade um homem velho e uma mulher jovem com seu manto azul,
acompanhados por um burrinho. E a mulher cantava, cantava para a criança que carregava
sob seu coração, e uma paz serena se espalhava pelas almas que a ouviam.
Os pastores continuaram a olhar a mulher, até ela desaparecer de suas vistas. Quando
finalmente se voltaram de novo para a fogueira, notaram que também as ovelhas haviam
virado a cabeça para Belém, e mesmo os cães haviam parado com sua corrida infatigável e
escutavam, com as orelhas em pé. De repente, Samuel apontou cuidadosamente por sobre o
rebanho e sussurrou: “Vejam! Ali! Não é nenhum dos nossos cães. É um lobo!” Os outros
pastores seguiram seu sinal e concordaram com a cabeça. Sim, o lobo estava junto das
ovelhas. Tal como estas, ele estava parado, tocado pela magia da canção, e olhava na direção
de Belém. Nesse momento, iluminou-se o rosto do velho Elias e ele exclamou: “Agora mesmo
achávamos que o milagre do qual falamos iria acontecer num futuro distante, e agora ele está
bem próximo. O Filho de Deus vem ao mundo. O sinal é infalível: em paz, o lobo pasta com
os cordeiros.” Samuel virou-se para o velho e perguntou: “O senhor acha que a jovem, que
cantou tão lindamente, era a Mãe Divina?” Elias concordou com a cabeça e respondeu:
“Acho, sim. Ela deve ser a Mãe Divina.” E nisso o velho pastor tinha toda a razão.
4. O VELHO PORTEIRO
Simeão, o velho porteiro, sentado à janela, observava o dançar dos flocos de neve e
pensava em tempos passados. Ele já vivera noventa anos, e passara setenta vigiando os
portões de Belém. De manhã, aos primeiros raios de sol que brilhavam no horizonte, ele abria
os portões, e tornava a cerrá-los quando o último raio de sol desaparecia. Ele havia observado
muitas pessoas entrando e saindo pelos portões e, com o tempo, aprendera a reconhecer se
tinham bondade ou maldade no pensamento. Ultimamente, as forças o estavam abandonando,
e só com esforço ele levantava as chaves pesadas; os portões enormes ele mal conseguia
mover nos gonzos. Então, um homem mais jovem assumira seu posto. Simeão só vigiava
agora um único portão, um que era pequeno, discreto, na face oriental dos muros da cidade.
Esse portão, durante a sua vida, nunca fora aberto e tinha o nome de “A porta alta”. A chave
daquele portão, seu antecessor lhe havia confiado quando ele ainda era jovem, ordenando-lhe
que cuidasse para que o ferro da chave não enferrujasse. Simeão, porém, sem dúvida saberia
reconhecer o tempo de abrir a “porta alta”. Assim, ele guardou a chave de ferro e cuidou dela
durante anos e anos, mas nunca lhe veio o chamado para abrir a porta. Pensando nisso, o
velho se levantou pesadamente de sua cadeira, andou poucos passos até o armário e retirou
dele a chave. Depois, sentou-se de novo à janela e, enquanto observava o silencioso cair da
neve, esfregava continuamente a pontinha de seu casaco de lã na chave de ferro e a polia, até
que ela começou a brilhar como se fosse de prata. “Você saberá, quando vier o chamado.” –
dissera-lhe seu antecessor. Quando Simeão se lembrava dessas palavras, sentia sempre um
leve receio de um dia, talvez, ter de abrir a porta, mas não estar acordado para isso.
Então ele percebeu que, de repente, o céu começou a brilhar no Oriente, como se não
estivesse oculto pelas nuvens de neve. A luz ficou cada vez mais clara, e nessa luz apareceu
uma porta alta e dourada, que se abriu. Dessa porta alta e dourada saiu uma criancinha. Ela
se virou e, amavelmente, acenou com sua mãozinha para o velho porteiro na janela, e
começou a andar numa estrada invisível rumo à Terra. Enquanto isso, ela continuamente
olhava para Simeão, que observava admirado esse acontecimento. De repente, porém, ele
exclamou: “A porta alta! A criança está vindo para a porta alta, e eu aqui sentado, comendo
mosca!” Tão rápido quanto pôde, levantou-se e, com seu casaco de lã, andou na neve até o
muro oriental da cidade. Não encontrou ninguém em seu caminho. Com esse tempo, as
pessoas preferiam ficar em suas casas. Mesmo não podendo mais reconhecer a porta dourada
no céu, ele podia ainda imaginar seu brilho claro no Oriente. Enfim chegou até a porta alta, e
finalmente pôde meter a chave prateada na fechadura. Esta se deixou abrir facilmente. E então
se abriu o pequeno pórtico e se abriu a porta alta silenciosamente, e do outro lado estava a
Criança. Com confiança ela estendeu a mão, e disse a Simeão: “Muito obrigado, porque você
ouviu meu chamado e me abriu a porta. Também eu guardei o portão aberto para você. Veja!”
Quando o velho porteiro ergueu os olhos, viu novamente a porta dourada do céu. Estava bem
aberta, e uma estrada luminosa levava até ela. Aí, Simeão riu bem alegremente e começou a
se aproximar da porta do céu. A criança o olhava, até que ele desapareceu.
Passaram-se alguns dias, até que as pessoas deram por falta do velho porteiro.
Procuraram por ele, mas não o encontraram. Então, aconteceu que um dia apareceram
estranhos na cidade, um homem com sua jovem mulher e um burrinho. O novo porteiro,
porém, não os vira entrar e estava muito espantado. Por isso, ele foi até a porta alta; encontrou-
a aberta e com a chave na fechadura. “Será que o velho Simeão ficou confuso da cabeça e
abriu a porta antes de partir?” – resmungou o homem. E, fechando novamente a porta, levou
consigo a chave. Ele não suspeitava que aquele, para quem a porta alta deveria ser aberta, já
havia passado por ela.
5. DANIEL E A FLAUTA
Quando Daniel apareceu nas ruas de Belém e tocava sua pequena flauta, as pessoas não
conseguiam deixar de ouvi-lo e de se alegrar. Apesar disso, Daniel era, na verdade, um
menino digno de pena. Tinha, de nascença, o coração fraco, que não lhe permitia brincar com
as outras crianças, sua perna esquerda mancava um pouco e, o que era mais lastimável, ele
era cego. Nunca tinha visto o sol, o céu ou o mundo maravilhoso. Mas, quando tocava sua
flauta, – e isso ele fazia por onde andasse – não havia nada de tristeza em suas melodias.
Daniel era uma criança alegre, e sua alegria era contagiante.
Estava-se em pleno inverno, quando um dia as pessoas acordaram e, olhando pelas
janelas, nada mais viram além de um véu cinzento. Toda a cidade de Belém estava envolta
num nevoeiro esquisito que impedia toda visão; e até os becos e cantos conhecidos pareciam
estranhos e irreais. Só uma pessoa não se afetava com isso: Daniel. Assim, nem o nevoeiro
podia mantê-lo em casa. Justamente nesse dia, uma força o puxava para fora. Naquela época,
não se festejava ainda o Natal. Mas a alegria que o menino sentia era exatamente a mesma
que hoje sentimos, quando a festa luminosa se aproxima. Ele pegou sua flauta, e sua audição
aguçada o levou com segurança para fora do portão da cidade. Ali, ele foi seguindo o muro
até chegar à pedra na qual mais gostava de se sentar. Portanto, mesmo com o nevoeiro, ele se
sentou e tocou em sua flauta: “Filha de Sião, alegre-se!” Ah, agora ele não era mais o pequeno
menino cego, agora ele era uma banda de música de casamento, que tocava para o noivo real
e sua jovem esposa. Ele o fazia com todo o ardor e nada notava do nevoeiro que ondeava em
sua volta e tirava a visão das pessoas, para que… Sim, para que Maria e José pudessem
encontrar a porta alta. Pois a profecia tinha de se cumprir: que eles entrassem na cidade por
ela, e por nenhum outro lado.
Maria e José tinham perdido o caminho na espessa névoa e vagavam naquele mundo
misterioso, sem saber onde estavam. De repente, seus ouvidos perceberam o canto da flauta:
“Filha de Sião, alegre-se!”. Eles pararam e escutaram a melodia maravilhosa, e depois outra
vez caminharam, seguindo a agradável música. “Que anjo nos estará guiando?” – perguntou
a querida Mãe Divina. Foi então que eles viram aparecer o menino por entre a névoa,
encolhido sobre a pedra e com a flauta nos lábios. Ali eles pararam, ouvindo com atenção a
música, até que ela acabou. Daniel virou-se na sua direção e lhes perguntou: “Quem são vocês
e o que procuram aqui?” José respondeu: “Somos pobres viajantes e estamos procurando o
caminho para Belém.” “Pobres viajantes?” – perguntou o menino admirado. E parecia
examiná-los atentamente, apesar de seus olhos cegos. Mas depois acrescentou: “O muro da
cidade é esse aí. É só segui-lo que chegarão ao portão.” Naquele momento, realmente Maria
e José conseguiram perceber o muro, como uma sombra escura. Agradeceram ao flautista e
seguiram seu caminho. Este os levou à porta alta, àquele pequeno portão que havia sido aberto
para eles e que tinha ainda a chave prateada na fechadura. Por ali eles passaram.
Cada vez mais longe, eles continuaram a ouvir a música da flauta, pois Daniel tocava
sem parar. Ele tinha que tocar para expressar sua alegria, já que tinha visto algo maravilhoso!
Havia muita luz em volta dele. E nessa luz ele conseguira perceber dois vultos, que levavam
consigo uma Criança, uma criancinha, que lhe havia acenado: “Venha!” Sim, ele iria, quando
chegasse a hora. Mas, por enquanto, tinha que tocar, como se a música pudesse expulsar toda
a névoa e tirar dos homens toda a cegueira.
6. OS ESTALAJADEIROS DE BELÉM
Finalmente, depois de longa caminhada, Maria e José alcançaram Belém. Estavam
cansados da longa viagem, e até mesmo o burrinho deixava a cabeça pendida de tão exausto.
Mas onde encontrariam um albergue, um lugar onde pudessem ficar e uma cama para dormir?
Foram de porta em porta, batiam aqui e ali, pediam aos diversos estalajadeiros que os
deixassem entrar. Mas ninguém os quis receber, pois José era pobre e não poderia pagar muito
pela hospedagem. “Vão-se embora,” – diziam sempre – “esta casa é minha, aqui vocês não
entram!”
Já havia escurecido, e Maria e José ainda andavam pelas ruas, e o burrinho trotava
cansado ao lado deles, espantado por não conseguirem onde ficar. Por fim, só havia mais uma
estalagem na beira da cidade, uma casa pequena com um velho e carcomido estábulo no pátio.
Sem muita coragem, José bateu na porta. Quando o estalajadeiro abriu, puderam ver logo que
a sala estava cheia de gente, e quase não se atreveram a fazer o pedido. Mas Titus, o
estalajadeiro, olhou-os com pena, percebeu que estavam exaustos, que precisavam de um
abrigo. Coçou a cabeça e resmungou: “Que farei agora? Aqui estão duas pessoas e um
burrinho, todos muito cansados, precisando de um lugar para dormir. Minha estalagem pode
abrigar pessoas cansadas. Mas a casa está cheia. Até nos bancos há pessoas dormindo.
Pensativo, Titus passou a vista pelo pátio já escuro. De repente, seus olhos brilharam, e ele
exclamou: “Mas a lanterna já está acesa no estábulo! Quem sabe está justamente esperando
por vocês! Sigam-me, homem, mulher e burrinho! Terão uma casinha só para vocês! Não é
muito grande nem muito mobiliada. Mas lá vocês terão, pelo menos, um telhado sobre suas
cabeças e palha para servir de cama.” E para onde o estalajadeiro os levou? Vocês já sabem!
Para o estábulo que os ratinhos do Natal haviam arrumado tão bem, onde o boi Remus
mastigava seu feno e uma estrelinha se escondera dentro da lanterna e espalhava sua luz
amorosa.
Portanto, foi lá que se hospedaram Maria e José e também o burrinho que os seguira
até Belém; e Remus, o boi, aceitou de bom grado a companhia. Finalmente haviam chegado,
sim, finalmente podia… Sim, o quê? Finalmente a santa Noite de Natal podia descer sobre a
terra!
7. O FILHO DE DEUS
Quando a Noite Santa se aproximou, tudo ficou bem quieto na Terra. Era como se o
mundo prendesse a respiração. Nos céus, porém, os anjos olhavam para as mais altas esferas
celestes, onde os querubins e serafins formavam um círculo em volta do trono de Deus. E aí
aconteceu o que era há tanto tempo esperado, e tão ardentemente desejado: De repente o
círculo se abriu, e o trono de Deus se tornou visível para todos os seres celestes. Do trono,
porém, saiu Um, tão claro e luminoso, tão sereno e puro, que mesmo com línguas de anjos
não seria possível descrever. Cordialmente, Ele olhou para o círculo de anjos, que só queriam,
reverentemente, contemplá-lo. Então, Ele deu um passo para o lado, e o olhar sério e santo
do Pai trespassou as esferas dos seres celestes. Diante Dele, abriu-se um caminho luminoso,
descendo cada vez mais baixo até a Terra. Lá, então, os seres celestes viram um pobre
estábulo, onde uma mulher e um homem estavam sentados junto a uma manjedoura, em
companhia do burro e do boi. O homem estava com muito sono. A mulher, porém, voltou seu
olhar para o céu e, quando ela percebeu o caminho luminoso, elevou os braços. Nisso, o Ser
de Luz, o Filho de Deus, que havia saído do trono de Deus, começou a descer pelo caminho
luminoso, descendo cada vez mais, saudado e acompanhado pelos coros de anjos, cujo canto
se intensificava, à medida que Ele passava. Enquanto Ele passava de um círculo celeste ao
outro, ele continuamente se transformava; ficou primeiro como um dos anjos mais elevados,
como um serafim, como um querubim, e trocava uma forma de glória por outra, como se
fossem vestes. Então, Ele chegou ao círculo dos arcanjos, depois ao círculo dos anjos, do qual
logo depois saiu. O estábulo pobre resplandeceu em claridade, quando o Luminoso se
aproximou de Maria e inclinou sobre ela sua sombra luminosa. Sua luz, porém, se espelhava
nos olhinhos da Criança pequenina que a Mãe Divina segurava no colo. Aí, novamente o coro
dos anjos ressoou no céu, e a Terra refletia o canto de louvor dos seres celestes: “Hoje nasceu
para nós o Salvador, que é Cristo, o Senhor.”
Desde essa noite, nunca mais se cerrou o círculo dos serafins e querubins. O caminho
luminoso continua sempre descendo do trono de Deus até a Terra, e Cristo anda por ele todos
os anos, do Pai até os Homens, para nascer entre eles e se tornar semelhante a eles; e para
plantar Sua luz em seus corações, a fim de que essa luz se irradie de seus olhos, assim como
um dia se irradiou dos olhos do Menino Jesus.
Créditos
Realização da Escola Waldorf Rudolf Steiner
Título Original: Das Licht in der Laterne – Adventskalender in Geschichten
Autor: Georg Dreissig
Título em Português: A LUZ NA LANTERNA – Um Calendário do Advento em Histórias
Tradutoras: Ione Rosa Matera Veras, Mariliza Platzer e Edith Asbeck
Digitação de Vanessa V. B. Mendes e Walkiria P. Cavalcanti – Março de 2013.
Revisão de Ruth Salles – Setembro de 2017.

Você também pode gostar