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Calendário do Advento em contos – 1ª

semana
Introdução e 7 contos de Georg Dreissig

Trabalho das professoras de Timburi – SP,


durante a realização do projeto Dom da Palavra.
Muitas famílias cultivam no tempo que precede o Natal uma bela
tradição: no “cantinho das festas do ano” vão montando aos poucos a
paisagem, na qual Maria e José com seu burrinho vão para Belém. Na
primeira semana do Advento, são espalhadas apenas pedras sobre
um tecido marrom, sendo que as mais bonitas formam o caminho para
a mãe de Deus. Na segunda semana, são postas plantas – pinhas e
musgos, e também algumas plantas de vaso como “palmeiras”; – na
terceira semana, os animais – sobretudo as ovelhas no prado –
finalmente, na quarta semana, os homens, os pastores que cuidam
das ovelhas.

O surgimento da paisagem pode ser entremeado de pequenas


histórias que, no decorrer das quatro semanas do Advento,
introduzem sucessivamente os elementos da Natureza, o reino das
plantas, dos animais e finalmente dos seres humanos.O livrinho foi
feito para ser lido. Como calendário do Advento que, de história em
história, vai avançando diariamente e conduz até a noite de Natal, é
bem adequado para alunos. Para crianças pequenas seria bom
escolhermos, de cada uma das quatro partes, só uma história para
cada semana e a contarmos durante a semana inteira, talvez
encerrando-a e tornando-a real na paisagem montada do Advento.O
essencial na criação das histórias foi, principalmente, a alegria com a
chegada do Natal. Ela não só despertou o prazer de narrar, mas,
acima de tudo, o desejo de fazê-lo de maneira adequada à criança,
mostrando que o acontecimento natalino é esperado ansiosamente no
mundo inteiro. A sensibilidade deve ser despertada, de história em
história, de modo que a luz do Natal aos poucos brilhe cada vez mais,
até que na Noite Santa se irradie em toda a sua plenitude. Algumas
sugestões eu devo a histórias natalinas conhecidas, principalmente
aos doces relatos do poeta flamengo Felix Timmermans. O mais
importante, porém, para o surgimento da coletânea foram, na verdade,
dois olhos brilhantes e maravilhados de criança e duas orelhinhas que
sempre queriam ouvir mais. Georg Dreissig

Créditos
Realização da Escola Waldorf Rudolf Steiner
Título Original: Das Licht in der Laterne – Adventskalender in
Geschichten
Autor: Georg Dreissig
Título em Português: A LUZ NA LANTERNA – Um Calendário do
Advento em Histórias
Tradutoras: Ione Rosa Matera Veras, Mariliza Platzer e Edith Asbeck
Digitação de Vanessa V. B. Mendes e Walkiria P. Cavalcanti – Março
de 2013.
Revisão de Ruth Salles – Setembro de 2017.

1. O CAMINHO DE PEDRAS PARA BELÉM

Maria e José estavam indo para Belém. O burrinho trotava animado na


frente deles. José estava acostumado a caminhar e tinha um bom
cajado; assim, podia dar passadas bem firmes. Maria, a querida Mãe
Divina, esforçava-se o máximo para manter a mesma marcha. Mas
seus pés delicados batiam volta e meia nas pedras escuras e
pontudas do caminho. Mesmo cerrando os dentes para que sua dor
não fosse percebida, uma lágrima escorreu de seus olhos. O burrinho
nada percebeu, nem José, que estava muito ocupado em não errar o
caminho. O anjo, porém, que acompanhava os três em sua
caminhada, reparou que Maria chorava. Inclinou-se para ela e
perguntou: “Ó querida serva do Senhor, por que você está chorando?
Você está a caminho de Belém, onde dará à luz a Criança Divina. Isso
não lhe dá alegria?” Maria respondeu: “Estou muito feliz em poder
acolher a Criança, e também não me quero queixar. Só que as pedras
escuras e pontudas cortam e ferem meus pés, de modo que é difícil
para mim andar depressa.” Quando o anjo ouviu aquilo, pousou seu
resplandecente olhar celestial nas pedras, e vejam só; elas se
transformaram. Arredondaram suas arestas e pontas, tomaram belas
cores brilhantes, e algumas ficaram até transparentes como vidro,
faiscando na luz que emanava do Anjo.
Maria, então, pôde andar com segurança em sua estrada cintilante e
colorida, e nenhuma dor dificultou de novo seu caminho para Belém.

2. O SEGREDO DA PEDRA GRANDE

Um dia, a caminho de Belém, Maria e José chegaram diante de uma


imensa pedra. Esta ficava bem no meio da estrada e obrigava os
viajantes a passar pela direita ou pela esquerda através do mato, ou a
subir por cima dela. Porém havia algo de muito especial com essa
pedra. Antes, quando a estrada estava sendo construída, sete homens
fortes tiveram que usar toda a sua força, a fim de rolar a pedra para o
lado. Mas quando, no dia seguinte, voltaram ao seu trabalho, a
enorme pedra estava exatamente no seu antigo lugar, como se tivesse
continuado sempre lá. Então, os homens fortes cuspiram nas mãos e
se empenharam mais uma vez em seu duro trabalho. Rolaram de
novo a grande pedra para fora do caminho e, no dia seguinte,
novamente a encontraram onde ela estava antes. Dessa vez, os
homens reclamaram mais ainda. Depois, pela terceira vez, puseram
mãos à obra e, usando de toda a sua força, tiraram a pedra do
caminho. Quando, porém, no dia seguinte encontraram a pedra
novamente em seu antigo lugar, nenhum dos homens reclamou mais,
e eles perguntavam uns aos outros o que aquilo queria dizer. Não
conseguindo achar resposta às suas perguntas, procuraram por um
santo homem, que vivia solitário em uma floresta, e lhe contaram a
respeito da pedra que sempre voltava ao seu antigo lugar. O santo
homem ouviu-os com atenção, abanou a cabeça compreensivamente
e lhes respondeu: “Aquele que deve tirar essa poderosa pedra do
caminho ainda não apareceu. Deixem-na aí onde ela está, e permitam
que ela seja rolada desse lugar pela pessoa a isso destinada.” Os
homens fortes seguiram seu conselho, e assim a pedra enorme
continuou imóvel no meio da estrada, para aflição de muitos viajantes.

Também Maria e José pararam diante da pedra. Naturalmente José


não a podia rolar para o lado, nem com a ajuda do burrinho. Enquanto
eles assim ficaram parados pensativos diante do obstáculo, José
bateu sem querer com seu cajado na pedra. Foi uma batidinha bem
leve. Mas, assim que o cajado tocou na pedra, esta se partiu ao meio.
As duas metades caíram, uma para a direita e outra para a esquerda
do caminho. E agora se podia ver que a poderosa pedra tinha dentro
dela uma porção de cristais, que brilhavam maravilhosamente à luz do
Sol.
Pouco depois, chegou também o santo homem àquela estrada.
Quando viu a pedra partida e os cristais faiscando em seu interior,
seus olhos brilharam: “Aquele que estava destinado a tirar a pedra do
caminho já apareceu.” – disse ele para si mesmo. E seu coração se
encheu de alegria e esperança.

3. POR QUE A ÁGUA VIRA GELO NA ÉPOCA DO INVERNO


(lembrando que o Menino Jesus nasceu no hemisfério norte, quando
era inverno)

Um dia, a caminho de Belém, Maria e José chegaram a um rio. Este


não era muito largo, nem muito profundo, mas a água naquela época
do ano era gelada. Quando o burrinho mergulhava nela seu casco,
doía tanto que rapidamente ele o retirava de novo, e depois não havia
meios de fazê-lo atravessar o rio. Em parte alguma se via uma ponte
ou um barco. Que deveriam fazer? José já erguia seu manto para
cruzar o rio a pé, carregando Maria nas costas. Mas isso Maria não
quis aceitar, pois receava que o frio excessivo lhe fizesse mal à saúde.
Em vez disso, ela se aproximou da margem e cantou baixinho: “Onda
do rio, sempre tão esperta, pare, pare, fique quieta! Forme ponte,
forme nosso chão! Assim todos passarão!”

Então, foi como se um delicado tinir de sinos respondesse de dentro


d’água, e de repente o rio parou de correr e formou uma ponte,
transparente como vidro, mas tão firme, que não só Maria, mas
também José e o burrinho puderam passar por ela.

Desde esse dia, a água se transforma em gelo no inverno. Quando


Maria carregava seu filho na Terra, ela não devia ser impedida em seu
caminho. Devia poder caminhar segura por toda parte.

4. O MILAGRE NO POÇO

Naquela época em que José e Maria caminhavam com seu burrinho


para Belém, as pessoas não tinham ainda torneiras em suas casas,
daquelas que a gente só abre quando quer água. Não, elas tinham de
pegar seus baldes, ir até o poço e dele tirar a água. Na maioria das
vezes, eram mulheres e mocinhas que faziam isso. E, ao se
encontrarem ali, gostavam de bater um papinho e contar as
novidades. Foi o que fez Ruth naquela noite, quando pegou seu balde
e foi até o poço. Mas, quando estava saindo de sua casa, ela notou no
céu uma estrela que brilhava tão clara, que ofuscava todas as outras e
até a lua, com seu brilho. A moça parou, olhando admirada para ela, e
se esqueceu do tempo e do que ia fazer. Que será que aquela estrela,
que brilhava tão maravilhosamente, queria anunciar? Só quando
sentiu os dedos doerem de frio, Ruth despertou de seus sonhos e
correu rapidamente para o poço. Lá não se via mais viva alma. Todas
as outras moças já tinham ido embora. Rapidamente, Ruth pendurou
seu balde na corrente, para fazê-lo descer ao poço. Mais aí ela
hesitou de novo. Porque o espelho da água brilhava como se fosse
puro ouro, e isso vinha da luz daquela estrela, que se refletia na água.
“Que brilho, que resplendor!” – murmurava a mocinha, enlevada – “Ah,
se a Vovó também pudesse ver isto!”. Mas a avó estava em casa,
sentada em sua cadeira, pois suas pernas tinham enfraquecido com a
idade, e não a sustentavam mais. Cuidadosamente, para que a água
brilhante não se revolvesse, Ruth fez descer o balde. Mas, ao puxá-lo
depois para cima, admirou-se naquela noite pela terceira vez; pois a
água do balde também brilhava como ouro. Com cuidado, a menina
pôs o dedo dentro da água e depois a provou: tinha o sabor de
sempre. Ruth, então, tirou o balde da corrente e correu mais que
depressa até a avó. “Veja só, Vovó!” – ela exclamou, assim que abriu
a porta – “Veja o que lhe estou trazendo!” E então lhe mostrou a água,
que brilhava tão maravilhosamente como ouro. “Olhe, a água
conservou o brilho da estrela resplandecente, para que você também
o possa ver.” – explicou a menina alegremente. Pensativa, a velha
senhora olhou para a água dourada. Depois perguntou: “Que luz será
essa, que está começando a brilhar sobre o mundo, que a água pura
reflete seu brilho sem parar?” – e, virando-se para Ruth, continuou –
“E em seus olhos ela também já começou a brilhar. Cuide bem dela.”

A notícia da água dourada se espalhou rapidamente pela região, e


todas as pessoas corriam ao poço para pegar um pouco. Mas, por
mais que tirassem a água, ela conservava o brilho. Ela o conservou,
sim. Mas até quando? Até quando o Menino Jesus nasceu em Belém,
e então a sua luz iluminou o mundo.

5. O QUE O VENTOU CANTOU PARA MARIA

A caminhada em terra desconhecida não era fácil para Maria. Poucas


vezes ela havia saído de Nazaré e, até então, nunca experimentara
pedir à noite por uma pousada, ou até dormir na beira da estrada.
Durante o dia, quando o sol gentilmente iluminava o mundo e eles
caminhavam rapidamente, para chegar a tempo a Belém, não era tão
difícil. Mas, quando se deitavam à noite, Maria de repente notava
como o coração lhe ficava pesado, e a saudade lhe apertava a
garganta. Aí, no escuro, ela pensava em Nazaré, em sua casinha com
as roseiras no jardim e o perfume do jasmim embaixo de sua janela; e
se lembrava do som que o vento fazia quando passava por entre as
folhas de árvores e arbustos, ou de quando desenhava suas ondas
em cima do trigal. Ah, sim, para ela o vento, era seu amigo especial.
Quando ele soprava de manhã pela janela aberta de seu quarto, ela já
sabia, antes de olhar para fora, que tipo de dia iria fazer; sabia-o
através de seu sussurro suave, ou de seu sopro raivoso, através dos
odores ou da umidade que lhe trazia. Mas ali, naquele caminho,
parecia estar soprando um outro vento, um vento de inverno, frio e
desconhecido, e assim a Mãe Divina se sentia mais solitária.

Mas não é verdade: o vento sopra onde quer. Assim ele também
soprava em volta de Maria e notava sua tristeza. Que poderia fazer
para consolá-la? Ele se calou por muito tempo e pensou. Na verdade
era inverno, e sua obrigação era assobiar muito através de todas as
frestas e buracos, e uivar por todos os cantos. Mas a querida Mãe
Divina estava em terra desconhecida, tão sozinha e desamparada…
E, de repente, o vento começou a entoar outra melodia, um canto de
primavera em Nazaré, das sementes brotando, das folhinhas novas
aparecendo, da maravilha das flores e dos zumbidos das abelhas. Tão
suave e ameno soava o seu canto de primavera, que Maria se sentiu
aquecida em seu coração e adormeceu com alegria.

O bom vento! Ele não pôde deixar de se preocupar com Maria, a


querida Mãe Divina. Por isso, não se admirem se, de repente,
começar a ficar mais quente antes do Natal, a ponto de todos
pensarem que o inverno já se foi. É apenas o vento cantando seu
canto de primavera, para que Maria não se sinta tão sozinha e
desamparada em terra estranha.

6. A AGULHA DE PRATA DA LUA E O FIO DE OURO DAS


ESTRELAS

Cheio de tímida veneração, José olhava para a querida esposa, que


carregava em seu ventre o Menino Jesus. Ele fazia tudo que
imaginava para tornar a vida de Maria mais leve e mais bela. Mas
José era um homem pobre: vestidos e joias, com que os ricos
presenteavam suas esposas, ele não podia comprar para Maria. Isso
às vezes lhe pesava muito, apesar de a querida Mãe Divina nunca se
queixar de não ter nada com que se enfeitar.
Agora, eles estavam a caminho de Belém, e todos os dias sentiam,
sofrendo, o que significava ser pobre: passavam fome – porque não
tinham dinheiro para comprar algo para comer, e as pessoas não lhes
davam nada – e dormiam ao relento, porque todas as portas das
casas se fechavam diante deles. “Ela é a Mãe Divina,” – murmurava
sempre José consigo mesmo – “e você a deixa andar por aí como
uma mendiga.” Quase todos os dias ele imaginava o que poderia
vender para conseguir comprar algo para Maria, para enfeitá-la e
deixá-la feliz. Mas ele não possuía nada que fosse dispensável,
exceto talvez seu cajado; e este ninguém compraria, pois o próprio
José o havia cortado na floresta.

Uma noite, quando precisaram novamente dormir ao relento, José


teve um sonho. Sonhou que um homem se aproximava e tocava em
seu ombro. José podia reconhecer, pelas vestes do homem, que ele
era muito rico. O homem, porém, não o olhava com desprezo, e sim
bem amavelmente; quando José lhe perguntou o que poderia fazer
por ele, o desconhecido respondeu: “Ouvi dizer que você quer vender
seu cajado. Gostaria de adquiri-lo.” Admirado, José se abaixou para
pegar o cajado, e aí notou que este não era entalhado na madeira,
mas sim artisticamente forjado de ouro e prata. José o entregou ao
desconhecido, e este disse: “Agora, também vou pagar por ele.” Com
estas palavras, estendeu a mão direita para cima. De repente, o céu
começou a emitir sons, e as estrelas mandavam fios dourados para
baixo. O homem os pegou e os enrolou, como um grosso novelo, em
volta do cajado. Depois, ergueu a mão esquerda e… veja só: para
dentro dela deslizou a forma prateada de barquinho da lua e se
transformou numa agulha prateada. Então o desconhecido tirou o
novelo dourado do bastão e entregou novelo e agulha ao admirado
José. “Leve isto como pagamento.” – disse ele. Assim que pronunciou
essas palavras, desapareceu. José continuou olhando admirado o
novelo de fios dourados das estrelas e a agulha prateada da lua e não
sabia o que fazer com eles. Mas aí as coisas se moveram em sua
mão. Sozinho, o fio de ouro se enfiou na agulha de prata e, por si só,
esta começou a costurar. Ela costurava, com os fios dourados,
estrelas brilhantes no manto azul de Maria, até acabar com todo o
novelo; então o manto ficou parecendo uma cópia do céu. Aí, a agulha
prateada se lançou outra vez até as estrelas e ficou sendo novamente
o barquinho prateado da lua.

José acordou alegre no dia seguinte. Ah, que sonho lindo tivera! A seu
lado, ele viu deitado o cajado de madeira que naquela noite fora tão
transformado. Agora, ele era de novo seu velho cajado, como sempre.
Então, quando seu olhar caiu sobre o manto azul de Maria, seu
coração começou a saltar de alegria. Pois estrelas brilhantes estavam
costuradas com fios dourados no pobre manto. Maria também ficou
feliz e disse: “Ah, agora meu manto está, na verdade, fino demais para
mim!”

Foi assim que Maria, embora José fosse tão pobre, pôde usar o lindo
manto de estrelas da rainha do céu.

7. A LUZ NA LANTERNA

Titus, o estalajadeiro, pegou a lanterna, pois lá fora já escurecera. Ele


ainda queria ir ao estábulo, para deixar lá feno fresco para Remus, o
boi. Quando acendeu a vela, notou que ela já estava pequena, quase
toda derretida. “Para um caminho curto ainda deve durar.” – murmurou
ele. E saiu para o quintal. A luz suave da vela afugentava o escuro da
noite. Chegando ao estábulo, Titus pendurou a lanterna num gancho
do teto e começou seu trabalho. Ele estava justamente colocando o
feno fresco dentro da manjedoura, quando ouviu sua mulher
chamando: “Titus, onde você está? Chegaram hóspedes!” Então, o
estalajadeiro deixou cair o feno e pegou a lanterna. Mas, nesse
momento, a luz flamejou outra vez bem forte, para logo depois se
apagar. “Não faz mal” – resmungou Titus. Deixou a lanterna
pendurada sobre a manjedoura, e passou depressa pelo quintal
escuro até a casa.

No dia seguinte, Titus já havia esquecido a lanterna. Somente à noite


ele a procurou e se lembrou de que ela devia estar pendurada no
gancho, em cima da manjedoura, no estábulo. Titus procurou uma
vela nova para substituir a velha de dentro da lanterna. Mas, quando
saiu para o quintal, viu uma luz suave brilhando através da pequena
janela do estábulo. Admirado, ele coçou a cabeça. Quem teria
acendido aquela luz ali? Ele mesmo não tinha visto que ela se
apagara na noite anterior? Chamou sua mulher, pois ela também
deveria olhar aquela luz misteriosa. “Esquisito, não é?” – resmungou
ele, quando entraram no estábulo e contemplaram a luz dentro da
lanterna. “Está ardendo simplesmente para nada.” A mulher
respondeu: “Sabe-se lá por que não quer se apagar… É melhor não
incomodá-la, até que ela se apague sozinha.” Assim aconteceu que,
quando Maria e José com o burrinho estavam procurando
hospedagem na noite de Natal, acharam o estábulo já iluminado com
aquela luz suave. Ela continuou brilhando, até que a Criança Divina
nasceu iluminando o mundo.
Mas agora vocês, com certeza, vão querer saber que luz misteriosa
era aquela, que continuava brilhando na lanterna e nem pensava em
se apagar. Não, realmente não era uma vela comum. Vou revelar a
vocês. Uma estrelinha se havia introduzido na lanterna. Ela queria
estar bem perto, quando a Criança Divina fosse nascer. Por isso, ela
se meteu secretamente na lanterna e brilhava ali tão amorosamente.
Se Titus tivesse olhado com cuidado, também ele teria percebido.

Créditos
Realização da Escola Waldorf Rudolf Steiner
Título Original: Das Licht in der Laterne – Adventskalender in
Geschichten
Autor: Georg Dreissig
Título em Português: A LUZ NA LANTERNA – Um Calendário do
Advento em Histórias
Tradutoras: Ione Rosa Matera Veras, Mariliza Platzer e Edith Asbeck
Digitação de Vanessa V. B. Mendes e Walkiria P. Cavalcanti – Março
de 2013.
Revisão de Ruth Salles – Setembro de 2017.

Calendário do Advento em contos – 2ª


semana
7 contos de Georg Dreissig
1. PORQUE AS MAÇÃS SÃO VERMELHAS

No Jardim do Paraíso, havia uma árvore que pertencia só a Deus.


Nela cresciam as maçãs vermelhas mais belas que possamos
imaginar. Se um animalzinho passava por ali ou se um passarinho
voasse por cima, sempre olhavam extasiados para aquela árvore
maravilhosa com maçãs vermelhas. Inclusive Adão e Eva, que viviam
no Jardim do Paraíso, ficavam muitas vezes admirados com aquela
árvore, cujos frutos só pertenciam a Deus. Um dia, porém, Eva foi
seduzida pela serpente, pegou a maçã, provou-a e deu também a
Adão para comer. Então, de repente, a beleza da árvore foi liquidada.
E, quando Adão e Eva foram expulsos do Paraíso, o Paraíso também
perdeu sua mais bela árvore. A macieira levou tamanho susto que
suas maçãs ficaram totalmente sem cor e duras. Se alguém as
provasse, não as acharia mais doces e suculentas, mas sim muito
amargas.

Contudo, a macieira deveria recuperar sua beleza, mas só muitas


centenas de anos depois. Havia uma remanescente da árvore do
Paraíso no jardim de Maria e José, em Nazaré. Ela crescera atrofiada
e dava, anualmente, pequenas maçãs duras e amargas. Ninguém
queria comê-las, nem mesmo o burrinho. Mas, quando o anjo foi à
casa de Maria anunciar que ela seria a Mãe do Filho de Deus, ele foi
também até a macieira do jardim e sussurrou-lhe uma mensagem:
“Prepare-se, macieira, pois seu tempo de penúria acabou. Na noite de
Natal vai nascer uma Criança, e ela será o próprio Filho de Deus.
Lembre-se de que você é a árvore que carrega os frutos de Deus.”

Isto se deu na primavera. Qual não foi o espanto de Maria e José ao


perceberem, nas semanas seguintes, que aquela arvorezinha
começou a se esticar e depois floresceu lindamente. Logo se ouviu na
ramagem um zunir e um zumbir, pois vieram abelhas petiscar nas
flores.

Quando, no outono, amadureceram as frutas, elas não eram


pequenas e duras como antes, mas sim redondas, grandes e
vermelhas. Vocês bem podem imaginar porque. É que elas estavam
felizes por serem novamente as frutas de Deus, que ia mandar seu
Filho à Terra. Chegando a época da colheita, Maria juntou as maçãs
numa cesta e disse a José: “Vamos guardá-las para nosso Filhinho.”
Por isso, quando tiveram de viajar para Belém, o burrinho carregava
nas costas um saco de maçãs vermelhas, que eles não comeram nem
nas horas de muita fome.

Assim acabou a maldição da macieira. Dali por diante, ela pôde


novamente dar seus frutos aos homens; mas todo ano algumas ficam
reservadas para o Menino Jesus: as mais vermelhinhas. Elas nos
lembram como a macieira se alegra com a vinda do Filho de Deus á
Terra, e por isso devem ser guardadas para enfeitar nossa mesa de
Natal.

2. O CARDO PRATEADO

Quando Deus, o Senhor, fez as plantas, perguntou a cada uma como


ela gostaria de ser. Uma gostaria de ser grande e poderosa, a outra
gostaria de ter um perfume adorável, uma desejava ter flores
vermelhas, outra as queria azuis, e outra, brancas. Todos os seus
desejos Deus, o Senhor, satisfazia com prazer. Assim, Ele perguntou
a uma plantinha: “Então, querida criatura, qual é o seu desejo mais
íntimo? Você quer ser grande ou pequena, ter flores amarelas,
vermelhas ou azuis?” A plantinha respondeu: “Está tudo bem para
mim. Com prazer ficarei presa ao solo e também terei espinhos, mas
se você puder satisfazer meu único desejo, é que minhas flores se
mantenham até o nascimento do Menino Jesus.” Aí, Deus, o Senhor,
sorriu amavelmente e deu à plantinha a sua forma. Ela cresce bem
discretamente rente ao solo, e suas folhas são cobertas de espinhos.
A flor, porém, brilha como uma linda estrela prateada e, mesmo
florescendo e sendo colhida no verão, continua viva até que venha a
época do Natal, para alegrar o Menino Jesus.

3. NA FLORESTA DE ESPINHOS

Em seu caminho para Belém, Maria e José tinham de atravessar uma


floresta. Secos e lenhosos erguiam-se os troncos áridos, e no meio
deles cresciam arbustos, duros e nodosos, ostentando em vez de
folhas, espinhos pontiagudos. Estes atingiam os viajantes, rasgando
suas vestes. E o burrinho, então, que não se podia desviar como os
homens, levava a pior; os espinhos continuamente entravam em seu
pobre pelo, até que ele, por fim, não queria mais andar. Não adiantava
pedir nem ralhar. O burrinho empacava e gritava um lastimoso “Hin-
hon”, todas as vezes que José, com seu cajado, queria forçá-lo a
andar. Aí José ralhou com os arbustos espinhentos, que lhes
dificultavam tanto a viagem. Maria, porém, a querida Mãe Divina, pôs
suavemente a mão sobre o ombro do marido e disse: “Querido José,
não reclame tanto dos arbustos de espinhos. Eles não podem produzir
outra coisa além de espinhos, pois o clima é muito seco nesta região.
Se eles tivessem mais água – eu lhe dou minha palavra – dariam
rosas perfumadas para nós e para nosso querido filho.” Depois, ela
elevou os olhos ao céu e pediu: “Meu Deus amado, faça com que sua
bondade desça como orvalho vivificante, a fim de que estes pobres
arbustos de espinhos se possam transformar como desejam.”

Assim que Maria pronunciou essa oração, caiu do céu um suave


orvalho sobre os arbustos espinhosos. Estes absorveram a água com
toda a alegria e, enquanto o faziam, todos os seus espinhos caíram.
No lugar deles, porém, floresceram rosas maravilhosas; elas
brilhavam nas mais lindas cores e pareciam apostar, umas com as
outras, qual delas daria o perfume mais agradável. Maria e José
agradeceram pelo milagre. O burrinho por sua vez, ficou de novo
muito alegre e, esticava o nariz para o ar perfumado, trotando com
prazer na frente, rumo a Belém.

4. OS TUBÉRCULOS MODESTOS

Um negociante fez uma viagem a terras distantes e, ao voltar, trouxe


consigo muitos presentes maravilhosos: tecidos e utensílios, joias e
especiarias. Para cada pessoa de sua família, ele trouxe um presente
especial. Para sua esposa, porém, deu um saquinho de aparência
muito simples, mas que continha o que ele havia adquirido de mais
caro. “Cuide bem dele” – disse o negociante à sua mulher – “pois ouvi
dizer que este saquinho possui o dom da profecia. Ele nos anunciará
quando o Rei do Mundo virá até nós.” A mulher se admirou com
aquilo; pôs o ouvido sobre o tecido rústico do saquinho, mas não
percebeu som algum. De vez em quando pegava o saquinho,
observava-o atentamente, mas não conseguia descobrir nele nada
que fosse excepcional. Quando finalmente o marido saiu outra vez de
viagem, ela pegou o saquinho, entrou furtivamente na floresta e, tendo
a certeza de não ser vista por ninguém, abriu-o e olhou dentro. E o
que ela viu? Alguns tubérculos comuns, pequenos e pouco vistosos.
“É este todo o seu segredo?” – exclamou a mulher decepcionada.

E espalhou os tubérculos pelo caminho, enquanto voltava para


casa.Os tubérculos modestos foram deixados no caminho da floresta,
expostos ao tempo e ao vento, até que a terra e o pó vagarosamente
os cobriram.

Mais tarde, em seu caminho para Belém, Maria e José passaram


justamente por aquela floresta. Foi então que se viu que o negociante
dissera a verdade: Sob os pés da querida Mãe Divina, os tubérculos
brotaram, e deles cresceram pequenas flores branco- prateadas, que
brilhavam como se o caminho estivesse semeado de estrelas. Eles
anunciam também hoje a vinda do Rei do Mundo. Por isso, as rosas-
de-natal (que é o nome dessas flores) desabrocham na época do
Natal.

5. OS PINHEIROS

Quando Deus, o Senhor, criou as árvores, deu-lhes raízes para que se


firmassem bem na terra e também galhos que se pudessem direcionar
para o alto, para o céu. Pois foi do céu que elas vieram, e disso elas
não se deviam esquecer. Desde então, as árvores, numa saudosa
lembrança, estendem seus galhos para o alto, como que em
silenciosa e constante oração. Assim também fez o pinheiro, e como
seus ramos erguidos para o alto eram muito amplos e compridos, ele
sobrepujava as outras árvores. Hoje ele é muito diferente, e a razão é
a seguinte.

Mais uma vez, Maria, a querida Mãe Divina, e seu marido José não
tinham achado nenhum abrigo à noite e estavam longe de qualquer
moradia. Assim, tiveram que se abrigar no meio da floresta, junto ao
tronco de um delgado pinheiro. Ali eles tentaram dormir. Mas o vento
soprava muito gelado, e começou a nevar, primeiro de leve depois
mais forte. Eles se espremiam junto ao tronco da árvore, que era alta
mas lhes dava pouco abrigo. Maria, então, passou carinhosamente
suas mãos delicadas no tronco do pinheiro e pediu: “Sinto interromper
a silenciosa oração que você envia para o alto, para o Pai de todos
nós. Mas veja, o próprio Deus se inclinou para a Terra, pois é seu
Filho que carrego em meu ventre, e ele precisa de sua ajuda.” Assim
que a Mãe Divina disse essas palavras, um tremor percorreu toda a
árvore e, vagarosamente, seus galhos se foram abaixando, abaixando
até tomarem a forma de um largo telhado. Até então, os galhos do
pinheiro também perdiam suas folhas no outono como as outras
árvores, mas a partir desse instante elas espetaram de novo suas
agulhas verdes e assim ficaram para sempre. Foi desse modo que
Maria e José encontraram, sob os galhos do pinheiro, um abrigo
seguro para a noite.

Desde então, por haver interrompido sua oração silenciosa em favor


da sagrada família, o pinheirinho foi honrado especialmente. Ele pode,
no Natal, portar velas brilhantes em seus compassivos galhos
abaixados e, mais que todas as outras árvores, irradiar uma linda luz
diante dos homens e diante de Deus.

6. COMO O ABRUNHEIRO FOI HONRADO

Fazia tempo que a colheita havia sido feita, pois o outono já passara e
começava o frio rigoroso do inverno. Arbustos e árvores estavam sem
folhas e sem frutos e alimentavam o sonho de uma primavera
luminosa, do esplendor das flores e do zumbir das abelhas. Também o
abrunheiro perdera as folhas. Mas seus frutos ainda se penduravam
nos galhos secos. Ninguém os quisera. Quando as mulheres tinham
vindo no outono em busca de bagas, colhiam as de amora, olhando o
abrunheiro só de relance e continuando a andar. “Olhem só o
abrunheiro! Que sujeitinho desagradável com seus espinhos
pontudos!” – disseram umas às outras – “Ele defende suas bagas, que
aliás ninguém quer. Pode bem guardá-las, pois são acres e não têm
sabor.” Por isso as bagas azul-escuras ficavam penduradas entre os
espinhos no arbusto, que já havia sofrido a primeira geada. O que o
arbusto não daria para se carregar de bagas doces, de que as
pessoas tanto gostavam, como as da framboesa. Ele até renunciaria
às suas lindas flores brancas. Mas todos os desejos não mudavam o
fato de que ele era um pé de abrunho e não de framboesa.

E tudo estava certo assim. Pois um dia, Maria e José, em seu caminho
para Belém, vinham passando pela floresta. Estavam cansados e com
fome. Sem querer, seu olhar caiu nas bagas escuras do arbusto cheio
de espinhos. “Olhe só, José!” – exclamou Maria – “O querido arbusto
guardou seus frutos para nós!” E, sem se importar com os espinhos
pontudos, a Mãe Divina começou a colher os abrunhos. José, porém,
respondeu: “Evite esse arbusto. Seus frutos são intragáveis. Veja,
ninguém os quis.” Mas Maria não se deixou enganar. “Como podem
ser saborosos, se eles têm de aguentar todo esse tempo um frio tão
forte? Até nós, seres humanos, ficaríamos amargos. Quem sabe ficam
mais agradáveis, se os colocarmos no calor.”

À noite, conseguiram hospedagem na casa de camponeses amáveis.


Estes também se admiraram muito com os frutos que Maria trazia.
“Vocês conseguiram tirá-los do abrunheiro? E ele o deixou de boa
vontade?” A querida Mãe Divina confirmou: “Sim, de boa vontade. Ele
não é tão mau quanto seus espinhos parecem ser!” Então, ela pediu
um pouco de água quente, e dentro dela colocou os frutos; e assim
toda a geada, todo o frio foi tirado deles. No dia seguinte, ela ofereceu
a José e aos camponeses um suco vermelho, maravilhosamente
brilhante, do qual eles gostaram tanto, que com prazer tomariam mais.
“Ele faz um bem!” – disse José. – “Não sinto mais o frio e o corpo
enregelado. Maria, como você fabricou isso sozinha?” Então a Mãe
Divina sorriu alegremente e respondeu: “Eu não fabriquei nada. Foi o
abrunheiro. Ele guardou esta bebida gostosa para nós em suas bagas,
para que possamos, tal como ele, enfrentar o frio do inverno.”

Desde então, os homens olham o abrunheiro espinhoso com mais


amor e sabem valorizar seus frutos, que só amadurecem com a
geada. E o abrunheiro ficou feliz por ser um pé de abrunho e não um
pé de framboesa. Pois só assim ele pôde dar seus frutos para a
querida Mãe Divina, em seu caminho para Belém.
7. O SEGREDO DAS ROSAS

Como ficou feliz a Mãe Divina por causa das rosas que de repente
floresceram nos arbustos espinhosos! Ela colheu um ramalhete e, daí
por diante, seu braço o carregava enrolado sob o manto. E as rosas
continuavam frescas e mantinham seu perfume adorável para Maria.

Nisso, quando Maria e José chegaram perto de Jerusalém,


aproximaram-se deles três soldados romanos. Estes se comportavam
como grandes senhores, e já de longe gritavam: “Abram caminho para
o exército romano!” O pobre burrinho, que vinha trotando sem saber
de nada, levou do mais forte dos três uma tal pancada no flanco, que
pulou assustado para o lado. Maria e José ficaram parados à beira do
caminho; na verdade havia ali lugar para todos, mas eles não queriam
dar motivo para brigas. E era justamente isso que o soldado grosseiro
estava procurando. Quando ele viu Maria tão humildemente com o
manto envolvendo as rosas, acercou-se dela e, rindo sarcasticamente
junto a seu rosto, gritou: “Ei passarinho, que está você escondendo de
nós? Vamos ver se não precisamos disso!” Mas, assim que ele
agarrou as rosas, puxou a mão criminosa, praguejando e insultando.
Ela estava toda arranhada e sangrando. “Que você carrega aí?” –
perguntou a Maria. Ela então abriu o manto e mostrou só um ramo
com espinhos. Antes que o soldado se refizesse do assombro, seus
companheiros se aproximaram, e um deles disse: “Deixe-a, Varus.
Quem sabe qual é a dor que esta mulher terá que suportar, para
precisar enfeitar-se com espinhos?” Já arrependido, o outro, que havia
começado a briga com aquelas pessoas pobres, seguiu em silêncio
seus companheiros.

Maria, porém, olhava para os ramos de espinhos em seus braços. O


orvalho abençoado de Deus não os havia deixado florescer? Onde
estavam agora as rosas? Tudo se acabara? José, que percebeu sua
tristeza, pôs suavemente a mão sobre seus ombros e falou
consoladoramente: “Elas floresceram por tanto tempo para você,
Maria. Dê-se por satisfeita e jogue fora os ramos secos.” Maria,
porém, sacudiu a cabeça e respondeu: “Eu conheço o segredo dos
ramos de rosas. Como poderia então deixá-los de lado?” E, com
cuidado, envolveu novamente no manto os pobres ramos, que na
verdade pareciam não precisar mais de proteção alguma. Mas, em
seu coração, continuavam soando as palavras daquele soldado
romano: “Quem sabe qual é a dor que esta mulher terá de suportar,
para que tenha de se enfeitar com espinhos?” Que as pessoas
pensassem o que quisessem; os espinhos antes haviam florescido.
Deveria ela desprezá-los agora em sua miséria? De repente, Maria
sentiu novamente o adorável perfume que as rosas por tanto tempo
haviam exalado para ela. E, quando ela olhou com cuidado debaixo de
seu manto, os ramos floresciam novamente mais lindos ainda. Essas
rosas se mantiveram vivas para Maria, até que ela deu à luz ao
Menino Jesus, no estábulo de Belém.

Créditos
Realização da Escola Waldorf Rudolf Steiner
Título Original: Das Licht in der Laterne – Adventskalender in
Geschichten
Autor: Georg Dreissig
Título em Português: A LUZ NA LANTERNA – Um Calendário do
Advento em Histórias
Tradutoras: Ione Rosa Matera Veras, Mariliza Platzer e Edith Asbeck
Digitação de Vanessa V. B. Mendes e Walkiria P. Cavalcanti – Março
de 2013.
Revisão de Ruth Salles – Setembro de 2017.

Calendário do Advento em contos – 3ª


semana
7 contos de Georg Dreissig
Ratinhos de Natal
1. PORQUE O BURRINHO NÃO QUERIA PARAR

Os burrinhos são animais muito teimosos. São fortes e perseverantes,


e conseguem levar cargas muito pesadas. Mas às vezes
simplesmente estão sem vontade e não adianta pedir nem brigar com
eles; se não quiserem obedecer, não obedecerão. Se você quiser
forçá-los a trabalhar, eles fincam seus cascos no chão, e você pode
puxar ou empurrar, mas não consegue tirá-los do lugar. Quando você
estiver desesperado, pode acontecer que sua teimosia desapareça de
repente – como que por encanto – e seu burrinho volte a ser a criatura
mais querida, prestativa e fiel que você possa imaginar.
Pois também era assim com o burrinho de Maria e José, e a viagem
para Belém teria sido ainda mais difícil e longa, se o burrinho não
tivesse se transformado num animal de carga dócil e pacífico. E isso
aconteceu da seguinte maneira:

José estava carregando o burrinho com os poucos pertences que


iriam necessitar na viagem à Belém, e o burrinho manteve-se quieto, e
parecia ser o animal mais dócil e amável de toda a Nazaré. Mas
quando José tomou da corda para puxá-lo, este empacou e não quis
dar nenhum passo à frente. José tentou convencê-lo com carinhos e
depois com ameaças: o burrinho fincou os cascos no chão e não se
moveu. Então Maria tentou a sorte, fez-lhe carinho entre as orelhas e
pediu-lhe que viesse, por favor, pois o caminho para Belém era longo
e teriam que se apressar. Mas o burrinho continuou empacado e não
quis saber de conversa. Neste apuro, interveio o Anjo Gabriel. Sem
que Maria e José o tivessem visto, ele se aproximou do burrinho e
disse: “Você é tão pequeno e fraco, que tem toda a razão em não
querer ir a Belém, pois o caminho certamente lhe será muito penoso.
Vou chamar alguns Anjos, para que levem sua carga, e assim você
poderá ficar aqui. Só me dá pena – adicionou o Anjo, lamentando –
você não poder então ouvir os Anjos cantando, quando o Menino
Jesus nascer, nem poder provar do feno doce sobre o qual o Menino
estará deitado…”

Anjos cantando? Feno doce? E ele aqui tão bobo, empacado,


correndo o perigo de perder as melhores coisas do mundo? O
burrinho pôs as orelhas em pé e ficou à escuta, como se o canto dos
Anjos já pudesse ser ouvido. O focinho ele esticou no ar, farejando,
pois parecia mesmo que o cheiro do feno doce já vinha ao seu
encontro. Esqueceu-se totalmente de empacar. O burrinho nem quis
seguir obediente a Maria e José; não, ele corria, alegre, na frente e
não via a hora de chegar a Belém. De noite, mal parava para
descansar, e de manhã, antes do nascer do sol, já começava a zurrar
“Hin-hon!”, que significa: “Levantem-se, vamos depressa para Belém,
para junto dos Anjos cantando e do feno doce. Não há tempo a
perder!”

Sim, é assim que um burrinho pode às vezes se transformar, se ficar à


escuta, bem atento, e ouvir o que o Anjo lhe diz.

2. O QUE A ARANHA FEZ PARA MARIA


Em uma noite, Maria e José se alojaram numa caverna para passar a
noite. Ao entrarem, José viu uma aranha rastejando por ali e quis
espantá-la com seu cajado. Mas, nesse momento, Maria disse
delicadamente: “Ah, José, deixe esse querido animalzinho. Eu não
tenho medo dos seres criados por Deus, e há lugar para todos nós
aqui!” Depois, deitaram-se para descansar.

Naquela noite, soprava um vento constante. Ele queria, antes que o


Menino Jesus nascesse, limpar logo todas as estrelas do céu, para
que seu brilho dourado resplandecesse na noite de Natal. O vento
também soprou dentro da caverna, e a Mãe Divina sentiu tanto frio,
que mal conseguia fechar os olhos, apesar de se envolver com o seu
manto de estrelas. José há tempos caíra no sono e não percebera o
quanto ela se sentia enregelada.

Mas alguém notou o estado de Maria: foi a pequena aranha. Ela


envolvera a Mãe Divina em seu pequeno coração, porque Maria falara
dela de maneira tão amorosa. Então, a aranha se pós a trabalhar o
melhor que podia e fez uma fina e maravilhosa teia na entrada da
caverna. Vocês podem talvez pensar que uma teia de aranha não
segura o vento que vem de fora. Mas, apesar de delicada como era, a
aranha fez uma cortina impermeável e grossa, que a violência do
vento não atravessava. Assim, Maria pôde ainda dormir um bom sono.

Quando, na manhã seguinte, ela avistou a fina teia de aranha na


entrada da caverna, ficou sabendo quem a havia ajudado e agradeceu
de coração ao pequeno animalzinho, que se escondera contente
numa fenda na rocha da caverna.

3. PORQUE O RABO DOS COELHOS É BRANCO

O coelhinho correu brincando no prado durante todo o verão, pulou o


quanto queria e, de tanta alegria de viver, deu muitas cambalhotas.
Mas, quando o inverno chegou, o prado se cobriu de neve e o sol quis
brilhar cada vez menos, e o coelhinho se meteu de volta em sua toca.
Esta era bem forrada com folhas e capim. O coelhinho acomodou-se
com seu focinho pequenino entre as patinhas e tratou de ficar deitado
e dormindo até a chegada da primavera. Só se a fome ficava muito
forte é que ele deixava sua aquecida cova, mas tratava de voltar
ligeiro, quando sua barriguinha estava novamente cheia.

Certo dia o coelhinho sonhou que um anjo veio até sua toca, puxou-o
levemente pelas longas orelhas para acordá-lo e lhe falou. O
coelhinho abriu os olhos e olhou em volta. Não podia mais ver o anjo
do seu sonho. Mas ainda se lembrou de suas palavras: “Estão aí duas
pessoas pobres que perderam o caminho nesta neve. Corra e ajude-
as a encontrá-lo. Seu narizinho vai conduzi-lo em segurança. E de fato
foi assim! Não longe dali o coelhinho avistou os dois: um homem e
uma mulher, e com eles um burrinho. O homem olhava em volta
procurando pelo caminho, mas não o via, porque tudo estava coberto
de neve. O coelhinho, porém, sentiu um cheiro de fumaça, que subia
das chaminés das casas que ficavam escondidas numa baixada.
Depressa pulou por cima da neve até Maria e José, ficou de pé nas
patas traseiras e saiu pulando em direção à aldeia. Quando se virou
de volta, viu que as pessoas continuavam no mesmo lugar, olhando-o
espantadas. Ele então voltou até elas, mais uma vez ficou de pé nas
patas traseiras, depois deu cambalhotas que marcaram um pequeno
caminho na neve. Então Maria e José compreenderam o que o
coelhinho queria dizer e o seguiram. Pulando e saltando, o coelhinho
correu à frente até que puderam ver a aldeia. Lá, o coelhinho parou e
balançou alegremente suas orelhas compridas. E como ficou satisfeito
quando José lhe agradeceu de todo o coração! Ficou, porém, mais
feliz ainda quando a querida Mãe Divina se abaixou até ele, acariciou-
o suavemente e sacudiu a neve de seu pelo, de todo o seu pelo; só na
ponta do rabinho ficou um pouco de neve. Foi assim que o rabinho
ainda estava branco com a neve, quando o coelhinho finalmente pulou
para dentro de sua toca tão quentinha.

Mas, ao chegar a primavera, e tendo a neve lá fora já se derretido, o


rabinho do coelho continuou branco, e isso acontece até hoje com
todos os coelhos. É a lembrança daquela vez em que um coelhinho
guiou Maria e José com segurança através da neve.

4. A PROVISÃO DO ESQUILO

No outono, o esquilo juntara nozes diligentemente. Aqui e ali, ele tinha


montado uma despensa, cobrindo tudo cuidadosamente com folhas,
terra e galhos, para que tudo ficasse protegido e ninguém
descobrisse. Só havia um problema. Depois de ter escondido tão bem
todas as nozes, o próprio esquilo não conseguia mais achá-las. E
quando chegou o inverno, da mesa da Mãe Natureza, tão ricamente
arrumada no verão, só restou uma escassa refeição: também o
esquilo teve de passar fome, apesar de toda a sua provisão. Que
maçada! Agora ele teria que fazer uma coisa que não lhe agradava
nem um pouco: teria de se arriscar para conseguir algo de comestível
na fazenda dos camponeses.
Então, uma vez aconteceu que o esquilo foi testemunha de um
acontecimento nada agradável. Duas pessoas pobres bateram à porta
de uma casa, pedindo esmola, mas foram escorraçadas aos gritos e
berros pela dona da casa. Quando o esquilinho viu a tristeza no rosto
das pessoas, ele sentiu uma dor em seu pequeno coração, desejando
ardentemente poder ajudá-los. Ah! Se ele pudesse apenas achar suas
despensas!

Bem depressa, ele voltou pulando para a floresta, a fim de procurar


mais uma vez. E eis que de repente tudo ficou muito fácil. Não que ele
de repente tivesse se lembrado. Mas por toda parte onde ele havia
escondido suas nozes, agora parecia brilhar na terra uma luzinha,
mostrando-lhe o caminho. Então ele escavou e desenterrou, encheu
as suas bochechas e saiu pulando atrás dos pobres andarilhos. Na
verdade, ele estava um pouco amedrontado, mas quando viu o doce
olhar de Maria e José, perdeu toda a timidez. Com um pulo ligeiro,
deixou no caminho duas nozes para cada um. Vocês acham que isto é
muito pouco para uma barriga vazia? Mas o que é dado com amor é
sempre um pouco mais do que parece. Maria e José agradeceram ao
pequeno companheiro, comeram as nozes, saciando um pouco sua
fome.

Daí para a frente, o esquilinho se sentiu bem. Pois, sempre que ele
procurava suas despensas, brilhavam luzinhas no chão, de modo que
ele nunca mais precisou escavar em vão atrás das nozes.

5. PEDRO, O CÃO DE GUARDA

Mais uma vez, em seu caminho para Belém, Maria e José procuraram
em vão uma pousada para a noite, e já acreditavam ter que passar a
noite ao ar livre. José, então, na penumbra do crepúsculo, viu uma
casinha sem luz, bem longe. Chegando mais perto, perceberam que
não era moradia de pessoas, mas um aprisco para ovelhas. De
qualquer modo, teriam um telhado sobre suas cabeças e um pouco de
calor.

Só que Maria e José não haviam contado com Pedro.

Pedro era o cão de guarda. Durante o dia, ele ajudava o pastor a levar
as ovelhas ao pasto, mas de noite cuidava do aprisco para que
nenhum ladrão se acercasse das ovelhas. Quando Pedro percebeu
pessoas se aproximando, pulou, arrastou a pesada corrente na qual
estava amarrado e latiu ameaçadoramente: “Au, au!” E isso queria
dizer: “Cuidado! Aqui vocês têm de me prestar contas! Não cheguem
muito perto!” Ao ouvir aqueles latidos ferozes, José deu de ombros e
se voltou. “Não podemos fazer nada,” – disse ele a Maria – “será mais
difícil ainda lidar com esse guarda do que com pessoas de coração
duro.” Maria também parou, e ficou ouvindo os latidos de Pedro, que
demonstravam como estava satisfeito em manter afastados aqueles
seres humanos. Mas depois Maria disse: “José, vamos pelo menos
tentar! As noites estão tão frias, que não conseguiremos dormir, sem
ter um telhado sobre nossas cabeças.” E, dizendo isso, foi andando
tranquilamente em direção ao aprisco.

Pedro, então, ficou fora de si de raiva. Latia e pulava preso à corrente,


em direção à Mãe Divina. Mas, antes que José pudesse intervir com
seu cajado, algo inesperado aconteceu. Como se obedecesse a uma
ordem inaudível, Pedro parou de latir, ficou quieto, olhou para Maria,
que havia chegado ao seu alcance, e de repente começou a abanar o
rabo, para lá e para cá, para cá e para lá. E o cão de guarda saltou
como um cabritinho para perto de Maria e deitou- se de costas, com
as patas para o ar. Maria inclinou-se para afagar-lhe a barriga. Pedro
deu mais uma rosnada quando José se acercou, mas a mão carinhosa
de Maria o tranquilizou de novo. “Olhe só como este malandrinho
puxou sua corrente,” – disse Maria a José – seu pescoço está todo
ferido. E passou suavemente seus dedos delicados nas feridas. Pedro
nem se moveu.

Mais tarde, o cachorro desejou ardentemente poder entrar no aprisco


e ficar bem junto de Maria; mas como isso não era possível, deitou-se
bem perto da porta, e seu pequeno coração pulava de alegria, pois
essa noite iria cuidar também da Mãe Divina.

No dia seguinte, bem cedo, chegou o pastor, para ver como estavam
as ovelhas. De longe viu, porém, uma cena que o deixou muito
admirado. A porta do aprisco abriu-se, e um homem e uma mulher,
seguidos por um burrinho, saíram de lá. E Pedro, o feroz cão de
guarda, pulou de encontro a eles, abanando o rabo, e lambeu a mão
da mulher. Enquanto isso, as ovelhas baliam como se estivesse com
elas alguém que conhecessem e de quem gostassem muito. O pastor
ficou observando tudo aquilo, como se estivesse sonhando e, só
depois que Maria e José haviam partido, acordou de seus
pensamentos. “Ei, Pedro,” – disse ao cão – “quem foram seus
hóspedes?” Ah, se ele entendesse a língua dos cães! Pedro lhe teria
contado com certeza quem passara a noite no aprisco.
Quando, porém, o pastor se inclinou para o cachorro, viu que as
horríveis feridas de seu pescoço haviam sarado durante aquela noite.
E ficou mais admirado ainda!

6. DO CARNEIRO QUE NÃO QUERIA SER TOSQUIADO

Branco-como-a-neve era o carneirinho mais bonito de todo o rebanho;


o branco de sua lã brilhava muito mais que a de seus companheiros.
Mas isto também era a única coisa que o diferenciava. De manhã,
sempre acompanhava de boa vontade o rebanho para o campo e, à
noite, voltava obediente para o redil. Mas, quando chegava com a
primavera o tempo da tosquia, num repente acabava-se toda a
obediência. Enquanto as outras ovelhas sujeitavam-se à tosquia,
Branco-como-a-neve saía correndo toda vez que alguém queria
agarrar sua lã e fugia aos pinotes. Não, ele não queria, de modo
algum, entregar sua lã. Por fim, o pastor cansou-se de correr atrás do
carneirinho e decidiu: Branco-como-a-neve vai então ficar com sua lã
de inverno. Ele verá quanto calor vai sentir no verão com sua lã
grossa.

Então, quando todos os outros carneiros iam para o campo já


tosquiados, enquanto sua lã, amarrada em grandes fardos, era
vendida no mercado, Branco-como-a-neve continuava pastando com
seu grosso casaco de lã. Não, na verdade não foi fácil quando o verão
chegou. Vez ou outra o carneirinho sentiu calor e, sempre que podia,
procurava uma sombra para se refrescar. O pastor bem que queria
ajudar seu carneirinho e ainda livrá-lo de sua lã. Mas nem assim
Branco-como-a-neve permitiu que o pastor se aproximasse com o
tosador. Sim, mas para quem ele queria guardar sua lã?

Chegou o inverno e, com ele, aquela noite em que Maria e José


pernoitaram no estábulo. No dia seguinte, porém, Branco-como-a-
neve estava totalmente transformado, postou-se diante do pastor e,
com vários sinais procurou deixar claro que queria, de qualquer
maneira, ser tosquiado. “Mas isto não é possível.” – disse o pastor –
“Agora no inverno você precisa de sua lã.” Branco-como-a-neve,
porém, não parou de implorar e, como de nada adiantasse, o
carneirinho ficou muito triste, parou de comer e, mesmo ouvindo boas
palavras, não se moveu mais. “Então, que seja feita a sua vontade.” –
suspirou o pastor finalmente e, pegando o tosador começou a tosá-lo.
Branco-como-a-neve permaneceu muito quieto, como se nunca
tivesse sido teimoso na vida, até que seu último cachinho branco
fosse cortado. Mas, para que o carneirinho não tivesse que passar
tanto frio, o pastor procurou um velho casaco e lã e o vestiu com ele.
Da lã tosquiada, porém, ele fez uma trouxinha e guardou-a, pois ainda
faltavam muitos meses para a próxima venda no mercado.

Contudo, quando finalmente a época do mercado de lã chegou, a


trouxinha de lã branca já tinha sido presenteada há bastante tempo. O
próprio pastor a havia levado para o Menino Jesus, que nasceu num
estábulo em Belém. E, finalmente, ele descobriu para quem Branco-
como-a-neve tinha guardado sua linda lã branca.

7. OS RATINHOS DE NATAL

Em Belém havia um estábulo velho e caindo aos pedaços; nela


habitava Remus, o boi. Feno e palha espalhavam-se pelo chão, e no
canto ficava a manjedoura, da qual Remus comia. Justamente nesse
estábulo devia vir ao mundo o Menino Jesus. Quando o anjo Gabriel
deu uma olhada lá dentro, levou um susto e exclamou: “Nesta sujeira
e nesta desordem a Criança divina não pode enxergar a luz do
mundo. Você, boi Remus, faça alguma para que este lugar fique
bonito e arrumado.” Mas o boi, pensativo, só olhava o anjo com seus
grandes olhos redondos, e continuava a comer calmamente. Ali no
estábulo tudo estava como sempre estivera, e por ele poderia
continuar assim.

Com que prazer o anjo Gabriel teria começado ele mesmo a pôr
ordem no local! Mas isso ele não o podia fazer com suas mãos de luz.
Quem o ajudaria? De repente, ouviu um chiado fino e delicado e,
quando procurou no estábulo, percebeu um pequeno ratinho, que o
olhava de seu buraco, no canto. O ratinho tinha visto o anjo e agora
chamava seus filhinhos; eles também deveriam ver a aparição celeste.
Então, Gabriel se dirigiu aos ratinhos e pediu: “Vocês não querem
ajudar a pôr em ordem o estábulo, a fim de que o Menino Jesus tenha
um lugar bonito para nascer, na noite de Natal?” Os ratinhos não
esperaram que ele pedisse duas vezes. Rapidamente saíram de seu
buraco, agarrando cada um uma palhinha e desaparecendo com ela
rapidamente. Logo depois, apareceram outra vez, continuaram a
arrumar e, em pouquíssimo tempo o velho estábulo estava lindo e em
ordem. Até o boi gostava mais dele assim do que antes. Aí, Gabriel
elogiou os ratinhos e disse: “Porque vocês me ajudaram tão
diligentemente, devem ser chamados de Ratinhos do Natal e, quando
o Menino Jesus nascer, vocês estarão entre os primeiros que poderão
vê-lo.” Com isso, os ratinhos ficaram felizes e passaram a esperar
ansiosamente pela noite de Natal.
Créditos
Realização da Escola Waldorf Rudolf Steiner
Título Original: Das Licht in der Laterne – Adventskalender in
Geschichten
Autor: Georg Dreissig
Título em Português: A LUZ NA LANTERNA – Um Calendário do
Advento em Histórias
Tradutoras: Ione Rosa Matera Veras, Mariliza Platzer e Edith Asbeck
Digitação de Vanessa V. B. Mendes e Walkiria P. Cavalcanti – Março
de 2013.
Revisão de Ruth Salles – Setembro de 2017.

Calendário do Advento em contos – 4ª


semana
7 contos de Georg Dreissig
O velho Porteiro
1. UM PUNHADO DE PALHA

Certa noite, Maria e José bateram na porta de um camponês e pediram abrigo


para passar a noite. Mas o camponês era um homem rabugento e duro de
coração, que não gostava de ajudar sem ser pago. Mas como ele viu que não
conseguia tirar nada daquelas pessoas pobres, mostrou-lhes um canto do
quintal e disse: “Ali, onde o telhado sobressai, vocês podem deitar-se no
chão.” Maria, então, perguntou baixinho: “E o senhor não teria um punhado
de palha, para não precisarmos dormir na terra fria?” Os olhos do camponês
brilharam encolerizados. Mas depois ele cedeu: “Bem, um punhado eu dou,
mas nada mais.” E ele mesmo foi até o celeiro e puxou do imenso monte de
palha um punhado, deu a José e bateu a porta.

José olhou preocupado aquele pouquinho de palha. Que faria ele só com isso?
Maria, porém, tomou-as delicadamente de sua mão e começou a espalhá-las
no chão, palha por palha. E vejam só: a palha deu para fazer um leito para os
dois, e até para o burrinho ainda sobrou um pouco. Assim, os três puderam até
dormir bem.
Na manhã seguinte, antes de partirem, Maria e José agradeceram ao
hospedeiro pouco amável. Este resmungou e os deixou partir. Quando ele
mesmo foi mais tarde ao quintal, notou novamente as palhas, que ainda
estavam espalhadas onde Maria e José haviam dormido, aqui uma, lá outra, só
mesmo um punhado. Ele já queria ficar zangado, pois os dois hóspedes não
tinham arrumado as palhas. Mas quando observou mais atentamente, viu que
elas eram puro ouro. Pegou uma e balançou-a na mão. Com a outra mão ele
bateu com a testa e exclamou: “Você é um bobo! Deveria ter deixado essa
gente dormir dentro do celeiro, pois assim toda a sua palha seria agora de
ouro!” Bom, agora era tarde demais. Mas, pelo menos, ele resolveu vender por
um bom dinheiro as poucas palhas que ficaram ali. O camponês, duro de
coração, as envolveu em um pano e caminhou até a cidade mais próxima.
Depois de muita pechincha, ele achou um ouvires, que lhe pagaria um bom
preço. Satisfeito com o lucro que tinha conseguido com o pobre abrigo que
oferecera, tirou as palhas do pano. Como ele ficou perplexo e como o ourives
riu na sua cara, quando apenas palhas comuns apareceram de dentro do pano!

Assim, o camponês só trouxe para casa essa caçoada, que se manteve nele por
longo tempo, por causa da dádiva da sagrada família, que ele gostaria de ter
vendido.

2. A SOPA QUENTE DA MULHER POBRE

Rebeca era a mulher mais pobre da aldeia. Ela só tinha a roupa do corpo, o
que era muito pouco, pois a saia e a blusa estavam esfarrapadas e as meias e
os sapatos cheios de buracos. Todos a conheciam, e Rebeca conhecia todas as
pessoas da aldeia e sabia onde podia pedir algo quando estava com fome e
onde era possível dormir abrigada, quando o duro inverno não deixava que
passasse a noite ao ar livre. Ela vivia miseravelmente, mas estava acostumada
e nem conseguia imaginar que pudesse ser diferente. Uma vez, um fazendeiro
lhe disse que realmente tinha muita pena dela e ela respondeu: “Pelo menos
sei que não sofro de algo que vocês sofrem!” E como ele a olhasse muito
espantado ela continuou: “Eu peço esmola a todos vocês. Mas nunca veio
alguém pedir-me alguma coisa!” E, com um sorriso maroto, pegou o pão que
o fazendeiro lhe havia dado, prendeu-o debaixo do braço e foi embora.

Mas, naquele inverno em que aconteceu esta história que lhes quero contar,
havia muita necessidade na região, e as pessoas mal tinham o suficiente para
satisfazer a própria fome. A mendiga só a muito custo conseguia ajuda e tinha
que bater em muitas portas, para conseguir uma pequena refeição. Um dia,
Rebeca havia pedido um pouco de sopa quente, e o que lhe deram mal deu
para encher metade de sua jarrinha. Quando se sentou à beira da estrada para
comer, ela viu de repente se aproximarem um homem e uma mulher com um
burrinho. Vocês já adivinharam: eram Maria e José em seu caminho para
Belém. O homem parecia estar muito abatido, e a expressão no rosto pálido da
jovem mulher era tão sofrida, que até Rebeca ficou com pena deles. “Ei,
amigos!” – chamou ela – “por que estão abatidos e tão tristes? Que lhes
falta?” José olhou em silêncio para ela, medindo de relance a jarra que ela
tinha na mão. Maria, porém, respondeu baixinho: “Nada temos para comer, e
por isso está difícil caminhar.” Rebeca perguntou: “Mas por que não compram
alguma coisa?” “Não temos dinheiro para comprar comida.” – foi a resposta.
“E por que não pedem?” – Rebeca quis saber. “Nós tentamos” – confessou
Maria envergonhada – “mas ninguém quis dar alguma coisa.” A mendiga
replicou: “É, eu sei. Os tempos estão ruins. Todos têm pouco. Olhem só o que
me deram!” E mostrou-lhes a jarra com aquele pouquinho de sopa. E, de
repente, teve uma ideia extraordinária, uma ideia que nunca lhe havia ocorrido
em toda a sua vida. E ela perguntou cautelosamente: “Vocês têm alguma
vasilha aí?” Sim, Maria e José tinham uma vasilha. “Então vamos repartir” –
decidiu a mendiga – “minha sopa e sua fome.” José desempacotou sua vasilha,
e Rebeca derramou nela um pouco de sopa, e depois mais um tanto. Sua
própria jarra ficou vazia, mas ela segurou-a de tal modo que Maria e José não
o notaram. Quando a pobre viu as duas pessoas famintas tomando a sopa,
sentiu uma alegria como nunca antes havia sentido. Até mesmo esqueceu por
alguns instantes sua própria fome.

Ah, Maria e José levaram só poucos minutos para acabar com a sopa, e
novamente se puseram a caminho. Rebeca ainda ficou por longo tempo
seguindo com os olhos os viajantes, que haviam ensinado a ela um sentimento
que lhe era desconhecido e lhe dera tanta alegria. Por fim, quando se inclinou
para pegar sua jarra vazia, viu que ela estava cheia até a borda com uma sopa
deliciosa e quentinha, que lhe satisfez toda a fome.

3. JUNTO À FOGUEIRA DOS PASTORES

Nos campos diante dos portões da cidade de Belém, ardia uma fogueira. Em
volta dela, sentados, alguns pastores se aqueciam, pois era inverno e as noites
eram frias. Ao redor deles, em círculo, as ovelhas deitavam-se em calma e
paz. Só os cães passavam sem cessar por entre o rebanho, e vigiavam. “Como
seria bom” – suspirou de repente Samuel, o pastor jovem – “se não existissem
mais lobos que ameaçassem o rebanho…” Jacó, porém, abanou teimoso a
cabeça e respondeu ao companheiro: “Que adianta sonhar? Enquanto houver
ovelhas, haverá lobos que as ameacem.” Aí, Elias, o velho, levantando a
cabeça branca, olhou os dois com seus olhos claros e disse misteriosamente:
“Quem sabe, quem sabe. Soube de uma profecia, que diz que um dia os lobos
pastarão pacificamente com as ovelhas.” Samuel logo perguntou: “Quando
será isso?” O velho balançou pensativamente a cabeça: “No livro está escrito
que um dia o Filho de Deus nascerá como homem. Então acabará toda
inimizade na Terra, e haverá paz entre os homens e os animais. Mas quando
esse dia virá, ninguém sabe dizer.”

Pensativos, os pastores olhavam para o fogo. De repente, começaram a ouvir


um lindo canto, tão suave, que lhes tocou o coração. Quando eles se viraram,
vinham vindo pelo caminho que levava à cidade um homem velho e uma
mulher jovem com seu manto azul, acompanhados por um burrinho. E a
mulher cantava, cantava para a criança que carregava sob seu coração, e uma
paz serena se espalhava pelas almas que a ouviam.

Os pastores continuaram a olhar a mulher, até ela desaparecer de suas vistas.


Quando finalmente se voltaram de novo para a fogueira, notaram que também
as ovelhas haviam virado a cabeça para Belém, e mesmo os cães haviam
parado com sua corrida infatigável e escutavam, com as orelhas em pé. De
repente, Samuel apontou cuidadosamente por sobre o rebanho e sussurrou:
“Vejam! Ali! Não é nenhum dos nossos cães. É um lobo!” Os outros pastores
seguiram seu sinal e concordaram com a cabeça. Sim, o lobo estava junto das
ovelhas. Tal como estas, ele estava parado, tocado pela magia da canção, e
olhava na direção de Belém. Nesse momento, iluminou-se o rosto do velho
Elias e ele exclamou: “Agora mesmo achávamos que o milagre do qual
falamos iria acontecer num futuro distante, e agora ele está bem próximo. O
Filho de Deus vem ao mundo. O sinal é infalível: em paz, o lobo pasta com os
cordeiros.” Samuel virou-se para o velho e perguntou: “O senhor acha que a
jovem, que cantou tão lindamente, era a Mãe Divina?” Elias concordou com a
cabeça e respondeu: “Acho, sim. Ela deve ser a Mãe Divina.” E nisso o velho
pastor tinha toda a razão.

4. O VELHO PORTEIRO

Simeão, o velho porteiro, sentado à janela, observava o dançar dos flocos de


neve e pensava em tempos passados. Ele já vivera noventa anos, e passara
setenta vigiando os portões de Belém. De manhã, aos primeiros raios de sol
que brilhavam no horizonte, ele abria os portões, e tornava a cerrá-los quando
o último raio de sol desaparecia. Ele havia observado muitas pessoas entrando
e saindo pelos portões e, com o tempo, aprendera a reconhecer se tinham
bondade ou maldade no pensamento. Ultimamente, as forças o estavam
abandonando, e só com esforço ele levantava as chaves pesadas; os portões
enormes ele mal conseguia mover nos gonzos. Então, um homem mais jovem
assumira seu posto. Simeão só vigiava agora um único portão, um que era
pequeno, discreto, na face oriental dos muros da cidade. Esse portão, durante a
sua vida, nunca fora aberto e tinha o nome de “A porta alta”. A chave daquele
portão, seu antecessor lhe havia confiado quando ele ainda era jovem,
ordenando-lhe que cuidasse para que o ferro da chave não enferrujasse.
Simeão, porém, sem dúvida saberia reconhecer o tempo de abrir a “porta
alta”. Assim, ele guardou a chave de ferro e cuidou dela durante anos e anos,
mas nunca lhe veio o chamado para abrir a porta. Pensando nisso, o velho se
levantou pesadamente de sua cadeira, andou poucos passos até o armário e
retirou dele a chave. Depois, sentou-se de novo à janela e, enquanto observava
o silencioso cair da neve, esfregava continuamente a pontinha de seu casaco
de lã na chave de ferro e a polia, até que ela começou a brilhar como se fosse
de prata. “Você saberá, quando vier o chamado.” – dissera-lhe seu antecessor.
Quando Simeão se lembrava dessas palavras, sentia sempre um leve receio de
um dia, talvez, ter de abrir a porta, mas não estar acordado para isso.

Então ele percebeu que, de repente, o céu começou a brilhar no Oriente, como
se não estivesse oculto pelas nuvens de neve. A luz ficou cada vez mais clara,
e nessa luz apareceu uma porta alta e dourada, que se abriu. Dessa porta alta e
dourada saiu uma criancinha. Ela se virou e, amavelmente, acenou com sua
mãozinha para o velho porteiro na janela, e começou a andar numa estrada
invisível rumo à Terra. Enquanto isso, ela continuamente olhava para Simeão,
que observava admirado esse acontecimento. De repente, porém, ele
exclamou: “A porta alta! A criança está vindo para a porta alta, e eu aqui
sentado, comendo mosca!” Tão rápido quanto pôde, levantou-se e, com seu
casaco de lã, andou na neve até o muro oriental da cidade. Não encontrou
ninguém em seu caminho. Com esse tempo, as pessoas preferiam ficar em
suas casas. Mesmo não podendo mais reconhecer a porta dourada no céu, ele
podia ainda imaginar seu brilho claro no Oriente. Enfim chegou até a porta
alta, e finalmente pôde meter a chave prateada na fechadura. Esta se deixou
abrir facilmente. E então se abriu o pequeno pórtico e se abriu a porta alta
silenciosamente, e do outro lado estava a Criança. Com confiança ela estendeu
a mão, e disse a Simeão: “Muito obrigado, porque você ouviu meu chamado e
me abriu a porta. Também eu guardei o portão aberto para você. Veja!”
Quando o velho porteiro ergueu os olhos, viu novamente a porta dourada do
céu. Estava bem aberta, e uma estrada luminosa levava até ela. Aí, Simeão riu
bem alegremente e começou a se aproximar da porta do céu. A criança o
olhava, até que ele desapareceu.

Passaram-se alguns dias, até que as pessoas deram por falta do velho porteiro.
Procuraram por ele, mas não o encontraram. Então, aconteceu que um dia
apareceram estranhos na cidade, um homem com sua jovem mulher e um
burrinho. O novo porteiro, porém, não os vira entrar e estava muito espantado.
Por isso, ele foi até a porta alta; encontrou-a aberta e com a chave na
fechadura. “Será que o velho Simeão ficou confuso da cabeça e abriu a porta
antes de partir?” – resmungou o homem. E, fechando novamente a porta,
levou consigo a chave. Ele não suspeitava que aquele, para quem a porta alta
deveria ser aberta, já havia passado por ela.
5. DANIEL E A FLAUTA

Quando Daniel apareceu nas ruas de Belém e tocava sua pequena flauta, as
pessoas não conseguiam deixar de ouvi-lo e de se alegrar. Apesar disso,
Daniel era, na verdade, um menino digno de pena. Tinha, de nascença, o
coração fraco, que não lhe permitia brincar com as outras crianças, sua perna
esquerda mancava um pouco e, o que era mais lastimável, ele era cego. Nunca
tinha visto o sol, o céu ou o mundo maravilhoso. Mas, quando tocava sua
flauta, – e isso ele fazia por onde andasse – não havia nada de tristeza em suas
melodias. Daniel era uma criança alegre, e sua alegria era contagiante.

Estava-se em pleno inverno, quando um dia as pessoas acordaram e, olhando


pelas janelas, nada mais viram além de um véu cinzento. Toda a cidade de
Belém estava envolta num nevoeiro esquisito que impedia toda visão; e até os
becos e cantos conhecidos pareciam estranhos e irreais. Só uma pessoa não se
afetava com isso: Daniel. Assim, nem o nevoeiro podia mantê-lo em casa.
Justamente nesse dia, uma força o puxava para fora. Naquela época, não se
festejava ainda o Natal. Mas a alegria que o menino sentia era exatamente a
mesma que hoje sentimos, quando a festa luminosa se aproxima. Ele pegou
sua flauta, e sua audição aguçada o levou com segurança para fora do portão
da cidade. Ali, ele foi seguindo o muro até chegar à pedra na qual mais
gostava de se sentar. Portanto, mesmo com o nevoeiro, ele se sentou e tocou
em sua flauta: “Filha de Sião, alegre-se!” Ah, agora ele não era mais o
pequeno menino cego, agora ele era uma banda de música de casamento, que
tocava para o noivo real e sua jovem esposa. Ele o fazia com todo o ardor e
nada notava do nevoeiro que ondeava em sua volta e tirava a visão das
pessoas, para que… Sim, para que Maria e José pudessem encontrar a porta
alta. Pois a profecia tinha de se cumprir: que eles entrassem na cidade por ela,
e por nenhum outro lado.

Maria e José tinham perdido o caminho na espessa névoa e vagavam naquele


mundo misterioso, sem saber onde estavam. De repente, seus ouvidos
perceberam o canto da flauta: “Filha de Sião, alegre-se!”. Eles pararam e
escutaram a melodia maravilhosa, e depois outra vez caminharam, seguindo a
agradável música. “Que anjo nos estará guiando?” – perguntou a querida Mãe
Divina. Foi então que eles viram aparecer o menino por entre a névoa,
encolhido sobre a pedra e com a flauta nos lábios. Ali eles pararam, ouvindo
com atenção a música, até que ela acabou. Daniel virou-se na sua direção e
lhes perguntou: “Quem são vocês e o que procuram aqui?” José respondeu:
“Somos pobres viajantes e estamos procurando o caminho para Belém.”
“Pobres viajantes?” – perguntou o menino admirado. E parecia examiná-los
atentamente, apesar de seus olhos cegos. Mas depois acrescentou: “O muro da
cidade é esse aí. É só segui-lo que chegarão ao portão.” Naquele momento,
realmente Maria e José conseguiram perceber o muro, como uma sombra
escura. Agradeceram ao flautista e seguiram seu caminho. Este os levou à
porta alta, àquele pequeno portão que havia sido aberto para eles e que tinha
ainda a chave prateada na fechadura. Por ali eles passaram.

Cada vez mais longe, eles continuaram a ouvir a música da flauta, pois Daniel
tocava sem parar. Ele tinha que tocar para expressar sua alegria, já que tinha
visto algo maravilhoso! Havia muita luz em volta dele. E nessa luz ele
conseguira perceber dois vultos, que levavam consigo uma Criança, uma
criancinha, que lhe havia acenado: “Venha!” Sim, ele iria, quando chegasse a
hora. Mas, por enquanto, tinha que tocar, como se a música pudesse expulsar
toda a névoa e tirar dos homens toda a cegueira.

6. OS ESTALAJADEIROS DE BELÉM

Finalmente, depois de longa caminhada, Maria e José alcançaram Belém.


Estavam cansados da longa viagem, e até mesmo o burrinho deixava a cabeça
pendida de tão exausto. Mas onde encontrariam um albergue, um lugar onde
pudessem ficar e uma cama para dormir? Foram de porta em porta, batiam
aqui e ali, pediam aos diversos estalajadeiros que os deixassem entrar. Mas
ninguém os quis receber, pois José era pobre e não poderia pagar muito pela
hospedagem. “Vão-se embora,” – diziam sempre – “esta casa é minha, aqui
vocês não entram!”

Já havia escurecido, e Maria e José ainda andavam pelas ruas, e o burrinho


trotava cansado ao lado deles, espantado por não conseguirem onde ficar. Por
fim, só havia mais uma estalagem na beira da cidade, uma casa pequena com
um velho e carcomido estábulo no pátio. Sem muita coragem, José bateu na
porta. Quando o estalajadeiro abriu, puderam ver logo que a sala estava cheia
de gente, e quase não se atreveram a fazer o pedido. Mas Titus, o
estalajadeiro, olhou-os com pena, percebeu que estavam exaustos, que
precisavam de um abrigo. Coçou a cabeça e resmungou: “Que farei agora?
Aqui estão duas pessoas e um burrinho, todos muito cansados, precisando de
um lugar para dormir. Minha estalagem pode abrigar pessoas cansadas. Mas a
casa está cheia. Até nos bancos há pessoas dormindo. Pensativo, Titus passou
a vista pelo pátio já escuro. De repente, seus olhos brilharam, e ele exclamou:
“Mas a lanterna já está acesa no estábulo! Quem sabe está justamente
esperando por vocês! Sigam-me, homem, mulher e burrinho! Terão uma
casinha só para vocês! Não é muito grande nem muito mobiliada. Mas lá
vocês terão, pelo menos, um telhado sobre suas cabeças e palha para servir de
cama.” E para onde o estalajadeiro os levou? Vocês já sabem! Para o estábulo
que os ratinhos do Natal haviam arrumado tão bem, onde o boi Remus
mastigava seu feno e uma estrelinha se escondera dentro da lanterna e
espalhava sua luz amorosa.

Portanto, foi lá que se hospedaram Maria e José e também o burrinho que os


seguira até Belém; e Remus, o boi, aceitou de bom grado a companhia.
Finalmente haviam chegado, sim, finalmente podia… Sim, o quê? Finalmente
a santa Noite de Natal podia descer sobre a terra!

7. O FILHO DE DEUS

Quando a Noite Santa se aproximou, tudo ficou bem quieto na Terra. Era
como se o mundo prendesse a respiração. Nos céus, porém, os anjos olhavam
para as mais altas esferas celestes, onde os querubins e serafins formavam um
círculo em volta do trono de Deus. E aí aconteceu o que era há tanto tempo
esperado, e tão ardentemente desejado: De repente o círculo se abriu, e o trono
de Deus se tornou visível para todos os seres celestes. Do trono, porém, saiu
Um, tão claro e luminoso, tão sereno e puro, que mesmo com línguas de anjos
não seria possível descrever. Cordialmente, Ele olhou para o círculo de anjos,
que só queriam, reverentemente, contemplá-lo. Então, Ele deu um passo para
o lado, e o olhar sério e santo do Pai trespassou as esferas dos seres celestes.
Diante Dele, abriu-se um caminho luminoso, descendo cada vez mais baixo
até a Terra. Lá, então, os seres celestes viram um pobre estábulo, onde uma
mulher e um homem estavam sentados junto a uma manjedoura, em
companhia do burro e do boi. O homem estava com muito sono. A mulher,
porém, voltou seu olhar para o céu e, quando ela percebeu o caminho
luminoso, elevou os braços. Nisso, o Ser de Luz, o Filho de Deus, que havia
saído do trono de Deus, começou a descer pelo caminho luminoso, descendo
cada vez mais, saudado e acompanhado pelos coros de anjos, cujo canto se
intensificava, à medida que Ele passava. Enquanto Ele passava de um círculo
celeste ao outro, ele continuamente se transformava; ficou primeiro como um
dos anjos mais elevados, como um serafim, como um querubim, e trocava
uma forma de glória por outra, como se fossem vestes. Então, Ele chegou ao
círculo dos arcanjos, depois ao círculo dos anjos, do qual logo depois saiu. O
estábulo pobre resplandeceu em claridade, quando o Luminoso se aproximou
de Maria e inclinou sobre ela sua sombra luminosa. Sua luz, porém, se
espelhava nos olhinhos da Criança pequenina que a Mãe Divina segurava no
colo. Aí, novamente o coro dos anjos ressoou no céu, e a Terra refletia o canto
de louvor dos seres celestes: “Hoje nasceu para nós o Salvador, que é Cristo, o
Senhor.”

Desde essa noite, nunca mais se cerrou o círculo dos serafins e querubins. O
caminho luminoso continua sempre descendo do trono de Deus até a Terra, e
Cristo anda por ele todos os anos, do Pai até os Homens, para nascer entre eles
e se tornar semelhante a eles; e para plantar Sua luz em seus corações, a fim
de que essa luz se irradie de seus olhos, assim como um dia se irradiou dos
olhos do Menino Jesus.

Créditos
Realização da Escola Waldorf Rudolf Steiner
Título Original: Das Licht in der Laterne – Adventskalender in Geschichten
Autor: Georg Dreissig
Título em Português: A LUZ NA LANTERNA – Um Calendário do Advento
em Histórias
Tradutoras: Ione Rosa Matera Veras, Mariliza Platzer e Edith Asbeck
Digitação de Vanessa V. B. Mendes e Walkiria P. Cavalcanti – Março de
2013.
Revisão de Ruth Salles – Setembro de 2017.

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