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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI

INTERVENÇÕES FENOMENOLÓGICAS E EXISTENCIAIS

Nome:
Ana Júlia Teixeira de Freitas Cota
RA: 125111347557

São Paulo
2022
Através de uma janela
Caro leitor, permita-me expor uma descrição de uma cena observada por mim
durante meu semestre na faculdade. O caminho é longo até o meu destino final, e durante o
percurso tenho a liberdade de observar os carros em movimentos, árvores com frutos, flores
florindo, pessoas andando, e cachorros passeando, mas uma cena em especial me chamou
atenção. Fretado parado no semáforo, uma avenida movimentada, e uma mulher com toda
alegria no meio dos carros vendendo água, creio que esse é o seu trabalho, pois todos os dias
no mesmo horário, com chuva ou sol, está vendendo água para as pessoas que estão no seus
carros. Você deve estar se perguntando, mas o que em toda essa cena de uma mulher
vendendo água, me fez despertar a observação. Ela não estava sozinha, e nunca esteve, um
menininho, acredito que tenha seus 4 anos de idade, estava junto a ela, mas não ao lado
vendendo, e sim sentado em uma calçada que divide as avenidas.
Desconheço qual é a relação familiar dos dois, mas aparenta ser sua avó, e
enquanto a senhora vende sua mercadoria para o sustento, o menino no meio dos carros,
brinca sozinho. Tenho observado todos os dias essa cena, observando cada detalhe, quando
vamos passar perto, fico atenta, e a cena se repete toda vez. O menino no mesmo lugar,
esperando sua avó vender, brincando no imaginário, ou com um carrinho, mas nem sempre a
criança está com o desejo de estar naquele lugar. Um dia o fretado parou rapidamente, olho
para o lado e o menino está com as pernas cruzadas, triste, olhando para os lados, sem
vontade de brincar, apenas esperando. Não ter o contato direto, pode trazer a muitas
hipóteses, a qual relação familiar a senhora e o menino possuem, o motivo da criança
acompanhar todos os dias, a história de vida da senhora, mora perto ou longe, o que
aconteceu para estar nas ruas vendendo, o que leva estar no mesmo lugar todos os dias, não
mudando sua rota, penso que poderia existir a possibilidade de uma conversa, mas o simples
fato da observação já diz muitas coisas.
Minhas observações são rápidas, contínuas, mas quem determina o tempo é o
semáforo. Passar alguns minutos observando, poderia ser diferente do que ficar sentada por
uma manhã ou tarde envolvendo-se na rotina dos dois. Os carros vão, as pessoas passam, mas
o que fica é a determinação e a necessidade da senhora vender a água ou refrigerante, para
pagar suas contas, ou sustentar o restante da família. A vida de estar vendendo nas ruas é
corrida, e muitas vezes perigoso para ambos lados, o menino no meio dos carros, com essa
idade, quer estar correndo, experimentando outras brincadeiras, e precisa ficar sentadinho.
Percebo que ao mesmo tempo que a senhora está vendendo, ela está cuidando do seu neto,
fica supervisionando, chama a atenção quando necessário.
Análise Crítica-Compreensiva
Através da janela conseguimos observar muitas coisas, o olhar vai nos
ensinando e com ele aprendemos, que cada observar pode trazer muitos cenários. A cena
observada para essa análise pontua algumas reflexões do cuidado, da questão da existência do
ser, do brincar, e da responsabilidade. Dentro da observação podemos conversar sobre duas
existências, a da senhora, e a da criança, por meio da fenomenologia que Heidegger afirma
que a existência diz a respeito ao modo de ser do homem no mundo, sempre localizada no
tempo e no espaço.

Ser é cada vez o ser de um ente. O todo do ente pode se tornar o


campo em que se põem em liberdade e se delimitam determinados domínios de coisa,
segundo seus diversos âmbitos. Domínios de coisas que de sua parte, por exemplo,
história, natureza, espaço, vida. (HEIDEGER, 2012)

O ser da criança existe em toda a cena, através do seu brincar, do seu histórico,
do seu entendimento por estar naquele espaço. A criança tem sua essência, seu contexto, está
inserido no meio com sua avó com certeza diz algo a ele, só não sabemos o que é dado e
imaginado pelo fato de não existir um contato concreto, apenas observável. Penso que
quando estou no fretado o ser criança no meio da avenida, está acontecendo, ou está
faltando? Não sei como é durante a tarde, pois os minutos que fico observando pode ser
pequeno pelo o que acontece, se estuda, ou se fica o tempo inteiro com avó, como é o restante
do seu ser, mas com o que vejo, fico reflexiva. Podem pensar que ele é uma criança, não
entende o que está acontecendo, deve estar gostando de brincar na rua. Como diz a música de
Erasmo Carlos,
"Ele é uma criança, não entende nada"
Por dentro eu ria, satisfeito e mudo

Eu era um homem e entendia tudo

Hoje só com meus problemas

Rezo muito, mas eu não me iludo

Sempre me dizem quando fico sério:

"Ele é um homem e entende tudo"

As pessoas enxergam muitas vezes a criança como um ser que não entende
nada, não cria conteúdos e experiências, e tenho certeza que o menino de 4 anos está em
construção com seus limites e espaço no mundo, seja ele com tempo na rua, na escola, e em
casa. O ser da senhora se encontra aos meus olhos além de vendedora, não reconheço seu
cotidiano, mas o espaço que observo através da janela, é pequeno para identificar suas
questões do existir. O idoso tem uma bagagem de experiências, e o fato da senhora precisar
trabalhar nessa fase de vida, diz muito do mundo onde ela está inserida, é necessário, então
ela faz um trabalho digno e com muita garra.
Ser idoso é ter a coragem de olhar para frente e dizer que traz consigo um
mundo de conhecimento. Ser idoso é ser gente. Ser idoso é poder dizer que
tem a dádiva da vida E o poder da mente Que possui uma vasta experiência E
carrega em sua guarida a realização e a gratidão da existência. (Dionésia,
Maria).

Não posso trazer muitas colocações relacionadas aos pensamentos e relatos da senhora e do
menino, pois minha cena ficou apenas na observação através da janela do fretado, que por si
só fala e traz hipóteses e reflexões com o olhar da fenomenologia existencial. É importante
entender esse lado do cenário com um referencial, seja de autor, música ou poema, pois
conectar meus pensamentos com as teorias desenvolve um nicho de respostas às dúvidas que
surgiam durante a observação.
Referências

ANTUNES Arnaldo, Sou uma criança e não entendo nada, 2010.


https://www.youtube.com/watch?v=wE03bMygbjQ

BRAGA, Tatiana Benevides Magalhães e FARINHA, Marciana Gonçalves. Heidegger: em


busca de sentido para a existência humana. Rev. abordagem gestalt. [online]. 2017, vol.23,
n.1 [citado 2022-12-06], pp. 65-73 . Disponível em:
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-68672017000100008&l
ng=pt&nrm=iso>. ISSN 1809-6867.

EM família, CASA DE REPOUSO, poesia SER IDOSO.


https://www.casaderepousoemfamilia.com.br/noticias/ser-idoso/

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