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CONVOCAÇÃO PÚBLICA PARA O TRIBUNAL POPULAR DOS CRIMES DO
LATIFÚNDIO E DA GRILAGEM DE TERRAS
19 de fevereiro de 2024
Jorge Moreno
Secretário Geral
OAB/MA 4.520
O vale do Rio Gurupi, assim como todo o Maranhão, é área em que vivem inúmeras
comunidades tradicionais camponesas. Uma parte dessas comunidades vivia de forma
tranquila até que, em 2008, chegou na região o grileiro Nestor Osvaldo Finger (conhecido
como “Gaúcho”), se reivindicando proprietário de uma área que, no início, alegava ser de
52.000 hectares. Depois, ao não conseguir nem dizer onde estaria toda essa terra, titulou
em seu nome, de maneira fraudulenta, via Cartório do Ofício Único de Maracaçumé/MA,
o total de 12.000 hectares de terras – local onde estão, encravadas, as terras de trabalho e
moradia de 7 comunidades: Iricuri, Murujá, Pimentinha, Manaus da Beira, Nova Vida,
Vilela (Gleba Campina) e Glória.
Figura 1: Em amarelo as 12.000 ha cujo registro cartorial são, atualmente, do espólio de Nestor Osvaldo
Finger, os pontos em vermelho são os povoados cujos moradores têm terras, trabalham ou vivem na área.
O ponto azul, para referência, é a cidade de Amapá do MA
Entre 2008 e 2011, Finger se ocupou de “regularizar” terras griladas em seu nome: é em
2011, por exemplo, que consegue que o INCRA faça a Emissão do Certificado de
Cadastro do Imóvel Rural (CCIR) dessas terras... No entanto, toda a documentação da
“Fazenda Santa Inês” já havia sido cancelada pelo mesmo INCRA em 2003, quando
houve investigação conjunta deste órgão federal com a Organização das Nações Unidas
(ONU), onde se identificou que na cadeia dominial da referida fazenda constava o nome
de Domingos José da Costa, um dos 100 maiores grileiros do país – segundo apurou
referida investigação. Além disso, constava na cadeia dominial o nome de Onofre Gim da
Cunha, que, em 1997, havia feito denúncia crime ao Ministério Público Federal de que
seu nome estava sendo usado em um esquema criminoso de grilagem de terras no
Maranhão, e que ele nunca possuíra terras neste estado.
Os posseiros da Gleba Campina, por sua vez, já ocupavam essa terra desde 1997, muito
antes da chegada de Finger; tendo formalizado a Associação de Trabalhadores em
Agricultura Familiar do Povoado Vilela em 2005. Quando o grileiro chegou, em 2008,
houve um período de convívio “amigável”, até que, em 2011, o fazendeiro “muda de
postura” e começa a ameaçar os camponeses e proibi-los de plantar roça ou de
realizar qualquer outra atividade na área, se dizendo o proprietário de todas aquelas
terras. O que era ameaça vai se agravando, e então os posseiros começam a ter seus
barracos queimados; a sofrer ameaças de pistoleiros com armas apontadas em suas
cabeças; a ter suas casas alvejadas e sua produção destruída – com mais de 9 toneladas
de arroz queimadas em caso com repercussão nacional. Inúmeros Boletins de Ocorrência
foram realizados para denunciar essas situações, mas nunca houve investigação.
Logo após a morte de Nestor Osvaldo Finger (12 de novembro de 2021), os herdeiros
venderam os 12.000 ha, e, quando o comprador percebeu que os 12.000 ha já eram
ocupados por comunidades, não fez o pagamento combinado. Após 2 anos da venda, no
dia 28 de outubro de 2023, a Família Finger invadiu com pistoleiros a sede da fazenda
que já tinha vendido, e voltou a destruir as propriedades dos camponeses da Gleba
Campina, moradores do Povoado Vilela. Importante deixar claro que a sede da Fazenda
na beira do Rio Gurupi (700 ha) é de propriedade desses fazendeiros, mas eles não
aceitam apenas este território e querem reivindicar, com documentos falsos, as
propriedades das comunidades em volta.
É neste contexto acima mencionado que a comunidade busca por justiça e procura todas
as autoridades do estado na capital São Luís, realizando também suas manifestações
públicas. A primeira manifestação após a invasão da sede da fazenda foi em 15 de
novembro na BR 316, onde os camponeses conseguem reunião com a SSP/MA, o MP, o
TJMA e outras autoridades e denunciam todo o caso. Apesar disso, em 28 de novembro,
o Juiz substituto da Vara Agrária Cristiano Simas dá sentença de reintegração de posse
favorável ao grileiro! A comunidade responde com uma segunda manifestação, já no dia
29 de novembro, na MA 206.
No início dessa manifestação ocorre de um homem de capacete, óculos escuros e jaqueta
fechada aparecer no meio do ato, e, sem se identificar, atirar para cima e em seguida
na mão de um dos posseiros mais antigos da Gleba Campina e morador do Povoado
Vilela. Esse senhor que efetuou os disparos foi imobilizado pela população e, mais tarde,
descobriu se tratar de um policial militar da cidade de Cândido Mendes – MA. A
SSP/MA, por meio da imprensa, fez uma campanha de criminalização das vítimas da
tentativa de assassinato no Povoado Vilela: o trabalhador alvejado perdeu um de seus
dedos e, na cobertura de imprensa, a foto de sua mão baleada foi identificada como sendo
do PM de Cândido Mendes! Os moradores, desde então, têm sofrido diversas ameaças
das polícias militar e civil do estado do Maranhão, para além das que já sofriam por parte
dos pistoleiros da Fazenda. O camponês atingido foi procurado pela polícia no hospital e
em sua casa, mesmo sendo vítima da violência; ao não o encontrarem, deixaram uma
ameaça de morte para seus familiares.
No dia 03 de janeiro dois guardas de Cândido Mendes foram encontrados mortos no limite
da área de posse da Gleba Campina. Sabemos e já denunciamos que os pistoleiros da
Fazenda estavam destruindo diversas propriedades da região, não só dos posseiros da
Gleba Campina. O delegado enviado de São Luís para investigar o caso tomou os
depoimentos de outros dois pistoleiros, de nomes “Ceguinho” e “Carrapato” e nestes eles
admitem que andavam armados destruindo casas, roças, carroças, cercas dos posseiros da
Gleba Campina e de outros... E nada disso foi investigado! Pelo contrário, a comunidade
segue sendo acossada e ameaçada durante as incursões policiais, como as denunciadas
em nota do dia 10/02/2024, numa operação comandada pelo Sargento Arlan, de Boa Vista
do Gurupi, conhecido de longa data da família Finger.
Figura 5: Sargento Arlan, à esquerda, em foto publicada em redes sociais com Nestor Finger e sua viúva,
Carla Storch, ao centro.