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LM. 156. bi iti 46. OrdenagSes Afonsinas a) Elaboragao ¢ inicio da vigéncia Os elementos essenciais relativos a historia das Ordenagdes Afonsinas constam do proémio do scu livro I('). ‘Ai se referem os pedidos insistentes, formulados em Cortes, no sentido de ser elabo- rada uma colectanea do direito vigente que evitasse as incertezas derivadas da grande dispersio ¢ confusio das normas, com graves prejuizos para a vida juridica ¢ a administragao da justgaw D. Joao | atendeu essas representagdes € encarregou Jodo Mendes, corregedor da Corte, de preparar a obra pretendhda Entretanto, ocorria a morte de D. Jodo Le, pouco depors, a de Jodo Mendes. Por determinagao de D. Duarte, a conunuaydo dos traba- Ihos preparatérios foi confiada ao Doutor Rut Fernandes, outro = Ordenxsens do Senhor Rey D- Affonso V, Coimbra, 1792, nfo assinada, mas que s¢ sabe ser da autora de Luly foauains Connbin DA SILVA, lente substituto da Faculdade de Levy. Alem de outros estundos Socestivamente indicados, consultar M. J. ALMUDA Costa, Ondemagios, ets 18 “Dic, de Hist, de Port.”, vol. III, pags. 206 € segs: € a em “temas de Historia do Direito”, pags. 62 ¢ segs., € 71 € seg., com largas inulicagdes HOT) “Nota de A eenagho" pe! 5 e segs., da reprodugio fac-simile (Lisboa, 1984) da referida edigdo das Ordenagdes Afonsinas. (") Ver, ainda, a “Prefagio” das 269 HISTORIA DO DIREITO PORTUGUES jurista de méritos firmados, que pertencia ao conselho do rei, Porém, a obra ainda nfo estava conclufda no fim do breve governo de D. Duarte. Falecido este rei, o Infante D. Pedro, regente na menoridade de D. Afonso V, incitou o compilador a aplicar-se a tarefa. Rui Fernandes viria a consider4-la concluida em 28 de Julho de 1446, na “villa da Arruda” (!). © projecto foi seguidamente submetido a uma comissio composta pelo mesmo Rui Fernandes e por outros trés juristas, o Doutor Lopo Vasques, corregedor da cidade de Lis- boa, Luis Martins e Fernao Rodrigues, do desembargo do rei. Apés ter recebido alguns retoques, procedeu-se 4 sua publicaggo com o titulo de Ordenagdes, em nome de D. Afonso V. Desconhece-se a duracio exacta dos trabalhos de revisio. Parece de admitir, todavia, que a aprovaco das Ordenacées se S tenha verificado pelos fins de 1446 ou, mais provavelmente, em > < 1447, portanto, ainda antes de D. Pedro abandonar a regéncia, nos comecos do ano imediato. Como quer que seja, cabe-lhe a posigao = = de grande impulsionador da obra. Ja na famosa “Carta de Bruges”, = dirigida por D. Pedro dessa cidade flamenga— onde permaneceu _» © desde os tiltimos dias de Dezembro de 1425 até meados de Margo * de 1426—a seu irmao D. Duarte, antes da subida ao trono, se salienta a urgéncia da compilagio das leis do Reino (?). Afigura-se, sintetizando, que os anos de 1446 ¢ de 1447 foram, presumivelmente, o da entrega do projecto conclufdo e o da publi- cago das Ordenagées. Mais dificil se mostra a determinagao da data da sua entrada em vigor. Deve salientar-se, a este propésito, que no havia na época uma regra pratica definida sobre a forma de dar publicidade aos diplomas legais e o inicio da correspondente vigéncia (*). Além disso, ainda nao se utilizava a imprensa, pelo que (') Cfr. o liv. V, tit. 119, § 31. A “Villa da Arruda” referida no texto € a actual Arruda dos Vinhos. (2) Pode consultar-se, por ex., in Chart. Univ. Port, cit., vol. III (140% -1430), Lisboa, 1969, pags. 311 e segs. (n.° 856), designadamente pag. 317. (?) Ver, supra, pags. 256 e seg. 270 PERIODO DO DIREITO PORTUGUE SDE INSPIRACKO R ° OMANO-CANONIC, cs cA laboriosas ¢ dispendiosas ('), necessérias a difusto do Ordenagbes em todo 0 Pais, fora da chancelaia regi’ © co nais superiores. Acresce que se verificavam, como eabid los tribu- desniveis de preparag3o técnica entre os magistrado ° aed intervenientes na vida juridica dos centros urbanos ¢ das | € ae deles afastadas. Talvez caiba, também, levar-se em linha de ena. hostilidade manifestada, apés Alfarrobeira (1449), a tudo o onc ligava ao Infante D. Pedro. ee Essa efectiva generalizagio—e a medida em que se realizou constitui outro problema— deve, consequentemente, ter-se ope- rado, apenas, depois de dobrados os meados de quatrocentos (”) Facilitava tal difusio 0 facto de as Ordenagées nao apresentarem inovagées profundas enquanto utilizaram, numa larga escala, fontes anteriores. Realizaram, por assim dizer, uma consolidag3o do direito precedente, posto que, em muitos aspectos, se observem alteragdes expressivas. De qualquer modo, é inexacta a opinio esporddica que levanta a davida da propria vigéncia das Ordenagdes Afonsinas. A ampla expanséo que alcangaram encontra-se indiciada pelos exem- plares, embora truncados ou parciais, que se conhecem. os manuscritos de obras ju s DA Rosa Pereira, Livros de i e (‘) Quanto a estes aspectos, salientando que dicas eram dos mais caros, ver as indicagdes de Isata Direito na Idade Média, cit., in “Lusitania Sacra’, tomo VII, pags. 13 ¢ se MarTIM DE ALBUQUERQUE, Bartolo e Bartolismo na Histéria do Direito Portugués, cit., in “Bol. do Min. da Just.”, n.° 304, pags. 32 € seg. ; (?) Sobre o aes consultar MARCELLO eee es Le ea vol. I, pags. 531 € segs. O objectivo de promover 0 conheciment ige i 3 is encontra-se na base da conjec- ef ‘Afonsinas em todo o Pais made que D Jono io Lourenco da Fonseca de promover tura de que D. Joo II incumbiu o licencia od n wees eefereades num anico tomo, porventara consisindo num repertério ov indice alfabético (ver, por todos, NuNo J ae Gomes Pea ma abreviamento dos cinco livros das Ordenagies, ao tempo a 1 Joao I, da Just.”, cit., n.° 309, pags. 31 € segs:)- am HISTORIA DO DIREITO PORTUGUES 4) Fontes utlizadas. Técnica legsltiva Com as Ordenagées Afonsinas procurou-se, essencialmente, sistematizar e actualizar o direito vigente. Assim, utilizaram-se na sua elaboragio as varias espécies de fontes anteriores ("): leis gerais, resolugées régias, subsequentes a petigdes ou dividas apresentadas em Cortes ou mesmo fora destas(?), concérdias, concordatas ¢ bulas (°), inquirigées, costumes gerais ¢ locais, estilos da Corte e dos tribunais superiores, ou seja, jurisprudéncia, praxes ou costumes ai formados (*); bem como normas extraidas das Siete Partidas e precei- tos de direito romano e de direito canénico, designados, respecti- vamente, por “leis imperiais” ou “direito imperial” e “santos cano- nes” ou “decretal”, encontrando-se também alusdes ao “direito comum” (5). Quanto a técnica _legislativa, empregou-se, via de regra, o chamado estilo compilatério. Quer dizer, transcrevem-se, na integra, as fontes anteriores, declarando-se depois os termos em que esses preceitos eram confirmados, alterados ou afastados (°). i i (') A respeito dessas diversas categorias de fontes, ver, supra, pags. 191 € segs., ¢ 254 € segs. (7) Por ex., liv. I, tit. 69, ¢ liv. II, tit. 29, § 15. (?) Por ex., liv. II, tit. 94. (*) Por ex., liv. IIL, tit. 110, e liv. V, tit. 18, § 3, e tit. 44. (°) Ver a exemplificagao de todas as fontes mencionadas feita por MAR- CELLO CaeTANo, Lig. de Hist. do Dir. Port., cit., pags. 259 e seg., ¢ Hist. do Dir. Port., cit., vol. I, pags. 540 e segs. Sao escassos os vestigios do direito mugulmano (liv. IL, tits. 28 € 99). (°) Eis dois exemplos: “ElRey Dom Affonso o Terceiro de Louvada Memoria em seu tempo fez Ley, per que ordenou e estabeleceo, que se 0 Autor for entregue per revelia d’alguuns bets de raiz (...) 1. A qual Ley vista per Nés, ademdo em ella: Dizemos, que se depois esse Autor, que assy for emtregue dalguits bets per revelia, ¢ receber delles (...) 2. E com esta declaragam e addi- am Mandamos que se guarde e cumpra a dita Ley d’ElRey Dom Affonso, assy como em ella he contheudo, e per Nés adido ¢ declarado.” (liv. Ill, tit. 47); 272 PERIODO PO DIREITO PORTUGUES DE INSPIRAGKO ROMANO-CANONICA Contudo, nem sempre se adoptou esse sistema. Designad: mente, em quase todo 0 livro I, utilizou-se o estilo decretério ou le tivo, que consiste na formulagio directa das normas sem refera cia 45 suas eventuais fontes precedentes, me Essa diferenga de estilo tem sido explicada com a atribuiggo da autoria do livro I a Jodo Mendes ¢ a dos restantes a Rui Fernan- des, ou pelo facto de aquele texto conter matéria original, nao contemplada em fontes nacionais anteriores. Trata-se de simples conjecturas, apresentando-se a segunda, porventura, s6 por si, sufi- cientemente justificativa ('). , c) Sistematizagao e contetido Talvez por influéncia dos Decretais de Gregério IX (7), as Orde- nag6es Afonsinas encontram-se divididas em cinco livros. Cada um dos livros compreende certo mimero de titulos, com rubricas indi- cativas do seu objecto, e estes, frequentemente, acham-se subdivi- didos em paragrafos (+). Todos os livros so precedidos de um proémio, que no primeiro se apresenta mais extenso, em consequéncia de nele se narrar, como jé se observou, a historia da compilacao. O livro I, que abrange 72 titulos, ocupa-se dos regimentos dos diversos cargos piblicos, tanto régios como municipais, compreen- dendo o governo, a justiga, a fazenda e 0 exército. No livro HI, te meu Senhor, ¢ Padre da muito louvada, ¢ esclarecida aque se segue (...) 4. E vista per ra, como em ella he conteudo.”” ta absolutamente invaridvel, “ElRey Dom Eduart memoria em seu tempo fez Ley em esta forma, nés a dita Ley, mandanos que se guarde, ¢ cump! (liv. IV, tit. 20). Alias, 0 formulario nao se apresen| 10s casos transcritos, pequenas alteragdes. AETANO, Hist. do Dir. Port., cit., vol. 1, pag. 541, € cit., pag. 249. sofrendo, por vezes, como ni () Ver Marcetto C. Nuno J. Espinosa Gomes pA Siva, Hist. do Dir. Port, (?) Ver, supra, pag. 245. | C)A divisio em paragrafos foi apenas introduzida ou beneficiada com a edicio impressa do século xvii (cfr. a respectiva “Prefaga0", cit. pigs. XXVIII © seg.) 273

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