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Abrace o desconforto

Jean Alessandro
Material Exclusivo aos alunos do Horizonte Cognitivo

Desconforto. Por que você odeia tanto ele? Por que você foge tanto dele? A resposta é óbvia. Pela
natureza aparente de valência negativa que é estar vivendo um desconforto. Pela tensão que é
gerada dentro de você quando você está desconfortável.

Mas parando para pensar na vida atual, nas pessoas que você admira, na imagem que você projeta
de você a daqui 5 anos: não é 1) uma grande distância de tempo e 2) uma grande quantidade de
desconforto que separa aquilo que é hoje só potencial, daquilo que será potencial transformado em
realidade?

Seu objetivo não deve ser fugir do desconforto. Não deve ser diminuir ele. Mas aprender a trabalhar
com ele. Usar ele como ferramenta. Seu objetivo nesta jornada é transcender a ideia de que o
desconforto é negativo e a aprender a lidar com a sensação ruim que o desconforto naturalmente te
gera hoje. O reconforto é um dos melhores amigos do antinatural.

Você precisa fazer as pazes com o desconforto. Essa é uma das formas de transcender o sofrimento e
de ter uma das maiores armas para ter sucesso em qualquer área da vida. Pessoas naturais são
usadas pelo seu sofrimento, são afastadas pelo seu ego de tudo que gera desconforto.

Pessoas competentes sabem usar o desconforto e sabem sofrer com inteligência, e pelas coisas certas.
Um dos principais problemas da vida desnaturalizada (a vida onde a discrepância da lacuna
evolutiva é gigante) é se perder no conforto, viver dominado por eventos naturais. A vida não é
confortável, estável, certa. Se você acha que ela é, é por que alguém está te protegendo da verdade,
e você ainda não saiu do conforto do lar dos seus pais, ou por que você nunca tentou algo difícil.

Estamos rodando no meio do nada, dentro de uma bola azul. Nada é certo. Nada é estável. A vida é
extremamente desa adora. Veja apenas pelo simples fato de que somos animais que sabem sobre a
própria morte. Nem precisamos ir muito além disso.

Precisamos aprender a lidar com a incerteza, mas nosso cérebro odeia isso.

Nesta aula trazemos o desa o: busque ativamente o desconforto a partir de hoje na sua
vida. Por que Jean? Por que eu acho que um dos grandes pilares que atrapalham sua vida hoje,
junto com o manejo incorreto do estresse (quando você tenta amenizar o estresse com compras,
pornogra a, álcool, maconha, cigarro, jogos, redes sociais) é a falta de busca de situações
signi cativas e desconfortáveis.

Nossa vida atual gera cada vez mais estresse, ao passo que nos demanda cada vez menos
desconforto. Para obtermos comida, luz, aquecimento, informação, todas as nossas necessidades,
precisamos nos esforçar cada vez menos.

A ideia dessa aula veio enquanto eu tomava banho. Iniciei dias atrás da data desta aula uma prática
de tomar um banho meio quente e meio frio. Por quê? Para testar meu desempenho frente a uma
situação desconfortável.

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Banho gelado é uma das coisas que eu acho mais desconfortáveis atualmente. Neste dia em questão,
tive uma concentração bem maior no banho, e comecei a perceber o frio não como a experiencia
de conotação negativa que costumava experienciar, mas como apenas uma experiência. Tentava
não julgar o frio como ruim, o desconforto físico como ruim, enquanto a água fria corria pelo
corpo.

Veja: a diferença da carícia para a dor é apenas a intensidade da frequência de disparo do neurônio
sensorial da pele. Digamos que se ele dispara 3x por segundo, isso seria uma carícia. Se ele dispara
7000x por segundo, seria uma dor insuportável. Então perceba que, se sua carne e seu tecido de
pele não estiverem sendo dani cados, a dor seria uma espécie de "alarme falso”. A dor seria uma
ilusão sensorial útil. Enquanto eu não cravar um al nete na pele, a dor seria só um aviso: algo ruim
pode ocorrer.

Não há perigo nenhum em tomar um banho gelado. Meu corpo não sabe disso. Ele acha que estou
cando num ambiente que pode me deixar com hipotermia, e manda mensagens que são
interpretadas pelo cérebro, e voltam para o corpo como emoções de medo, raiva, estresse.

Neste exemplo do meu banho vemos como uma situação de estresse siológico pode ser:
1 - vivenciada sem ser percebida como ruim;
2 - escolhida volitivamente, e por isso o efeito deletério do estresse não vai ser existir;
3 - ser amenizada pela experiência subjetiva da consciência (e quanto mais treino, mais tudo isso é
possível de ser “controlado”).

Chegamos aqui a um ponto interessante: se é verdade que uma situação de estresse físico pode ser
amenizada, ou pode ser sentida como algo interessante, e positivo, podemos fazer o mesmo com
experiencias de estresse emocional ou cognitivo?

Sim. Na maior parte das vezes, o que julga e cria o sofrimento é o self. Ele é o pai de quase todo o
estresse emocional. O ego, ou o self, ou como queira chamar, a entidade que você se identi ca com,
aquela que você acha que existe dentro de você como se fosse um homúnculo que controla tudo, é
quem gera a maior parte do sofrimento que você experiencia.

O ego é o grande campeão de gerar eventos naturais internos. Falamos muito nas outras
aulas de quantos eventos naturais são gerados pelas indústrias, pela sociedade e pela cultura. Mas os
eventos naturais mais capciosos, os mais difíceis de combater, de achar, de superar, são os internos,
gerados pelo ego. Você não quer errar, porque errar signi ca ferir seu ego, e não querer ferir seu
ego é minar a possibilidade de acerto, de crescimento e é, na verdade, proteger o seu pior
carrasco.

Alguns esquemas possibilitam com que as pessoas experienciem melhor o desconforto. Na minha
visão, o capitalismo é um desses esquemas. O impulso egoísta de querer mais para si, de querer se
assegurar acumulando recursos é usado para que as pessoas produzam numa estrutura mais
complexa do que sua própria família. Se as pessoas não produzem, não temos produtos. Vejo na
clínica claramente que, se não fosse pelo status, dinheiro, acesso a bens e experiências, ou
reconhecimento, muita gente não faria metade do que faz. Se não existisse esse esquema,
provavelmente eu também não estaria tão motivado a acordar e fazer muito mais do que minha
preguiça diz para fazer. Sem entrar nos pontos ruins do capitalismo, ok? Não é esse o ponto. O
ponto é: muitas pessoas saem de casa todos os dias, pegam trem, estudam 12h, trabalham 14h em
busca de algo. Se não tivesse esse algo, o que essas pessoas fariam? Estaria tudo em paz, todo mundo
feliz vestido de rosa e se amando? Provavelmente não. O mundo é muito mais complexo do que a
utopia que projetamos. Uma pessoa tem as motivações tão complexas que algumas vezes eu levo
meses até encontrar a con guração correta que permite com que ela veja sentido na vida dela, que

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dirá dar motivação para 7 bilhões de pessoas! Você me diria: ”De tudo para todo mundo e todo
mundo cará feliz” Errado. O mais correto seria: tire das pessoas algo pelo que lutar e elas não
terão mais nada. É simples assim.

Voltando a história do desconforto.

Por que você deve buscar alguma situação desa adora? Para que sua mente consiga controlar os
eventos naturais. Quando estou em baixo da água gelada, vários eventos naturais acontecem:
meu corpo ca frio, isso me impele a sair dali, tenho pensamentos do tipo: "ah, hoje vou car só 40
segundos, hoje está muito frio…” O coração acelerado, a mente reclamando, o frio na pele. Tudo
isso são eventos naturais. Eventos que a natureza programou para acontecerem, mas que me tiram
da possibilidade de fazer o que eu quero: tomar o tal banho gelado.

Depois que você consegue superar uma bomba de eventos naturais vem uma das sensações mais
prazeirosas que existem: a sensação de controlar o próprio comportamento.

Nós adoramos a percepção de controle. Os bebes riem de repetições das brincadeiras por
entenderem que o mundo é previsível, e se é previsível, seu cérebro produz serotonina ou dopamina.
É ótimo ter sensação de controle, ainda mais controle de você mesmo. Para muitas pessoas que
fumam, bebem, consomem pornogra a, ou seja lá o que for, o pior problema não é a alteração
cerebral, neural, endócrina, ou seja lá qual for. O pior problema é a culpa e a sensação de não
estarem no controle de si mesmas.

Se você buscar uma situação todo dia de desconforto ativo e com sentido, e conseguir superar,
durante isso, os eventos naturais, você vai se sentir muito bem. Sentirá autoe cácia, previsibilidade.
Isso tudo acalma a ansiedade e diminui o estresse.

Qual a pior coisa de você viver sob o domínio dos eventos naturais? Seu sistema dopaminérgico
perde a sensibilidade. Você vai precisar de cada vez mais do que quer que seja para obter o
mesmo nível de recompensa.

A segunda coisa que você perde muitas vezes é o sentido das coisas. Quando as coisas são
grati cantes, porém muito fáceis, não há desa o, e o cérebro gosta de resolver problemas, portanto
não há mais nada ali. Também há um certo vazio. O tédio bate logo quando a recompensa vem de
algo muito fácil. Quando você já sabe o nal do lme, ou como zerar o jogo, ambos perdem a
graça. A novidade e a di culdade precisam estar presentes. Viver atolado nos eventos naturais pode
até suprir a novidade, visto que você pode passar horas na internet e sempre ver coisas diferentes,
mas não supre a necessidade de desa o e superação.

Muitas coisas que você considera dadas por certas são, na realidade, fruto de um esquema
antinatural hiper-complexo. O sistema de saneamento, a venda de produtos da feira, seu banho
quente. Precisa pelo menos uma pessoa que plante a comida, muitas que façam as manutenções na
usina, uma pessoa que construiu o chuveiro (várias pessoas). Etc… Nada é tão certo e dado como
parece na sua vida dentro da sua bolha moderna. O mundo é um arranjo de muitos eventos
naturais e eventos antinaturais. A antinaturalidade é organizar a natureza e superar esses eventos.
Todos esses pensamentos me passaram pela cabeça enquanto estava neste banho.

Tomar meu banho frio me faz valorizar mais tudo. Eu percebo que não é tudo dado como
garantido. Isso me faz dar mais valor e ser mais grato ao que já tenho. Isso libera serotonina, e me
deixa menos ansioso por mais. Ansiar por mais sem saber aproveitar o que se tem é loucura. Você
acha que está correndo para frente e nem sequer está pisando no chão. Nao faz o menor sentido.
Você vai se habituando com a falta de esforço, alimentando uma sensação de ingratidão, se

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acostumando com querer mais do que você tem sem valorizar o que tem, vai passando a só
enxergar a lacuna do que não tem.

Você vai sendo escravo de buscar mais por dopamina enquanto sua serotonina vai baixando. Seria
apenas coincidência que muitos dos transtornos mentais tem ou baixa de serotonina ou alterações
de dopamina? Essa é a con guração de muitas vidas: busca insana dopaminérgica e uma baixa
brutal serotoninérgica. Resultado: uma pessoa estressada, ansiosa, ingrata, deprimida. A famosa
corrida dos ratos. Eu diria: corrida dos ratos estressados mega-dopaminérgicos e hipo-
serotoninérgicos.

Por que você vai ser grato a algo que está dado como garantido? Quem sai por ai agradecendo a luz
elétrica? Talvez uma pessoa que viveu sem isso.

Não que cego pelo conforto. Na sua busca, aprenda a ter um sentido, aprenda a correr pelo menos
numa rodinha de ratos mais so sticada. Aprenda a ter satisfação enquanto anda pela vida,
percebendo as coisas que você anda obtendo enquanto anda. Aprecie a vida. A vida é uma jornada
eterna de incompletude, mas ela pode ser vivida de uma forma parcialmente satisfeita. você vai
morrer, ora! Está correndo com tanta pressa para onde? Muita pressa de viver no m das contas é
pressa de morrer logo.

Busque todo dia entrar em contato com atividades nas quais você esteja em desconforto, em
expansão. Mas não qualquer atividade. Ela precisa ter sentido. Esse sentido pode estar atrelado a
seus objetivos, projetos e planos. Observe sua mente e seu corpo enquanto você faz isso. Observe o
que seu ego diz. Observe se não é ele o campeão de eventos naturais. Registre tudo isso. Faca
registro diário da sua experiência mental e comportamental. Vamos ter uma aula de como fazer isso
também.

Fugir do desconforto é a raiz de grande parte dos transtornos mentais. No TOC a pessoa foge da
incerteza, faz rituais para se sentir segura. Na depressão a pessoa tenta fugir do desconforto de se
frustrar. No transtorno de pânico a pessoa tenta fugir do desconforto de sentir medo. Na ansiedade
social a pessoa quer fugir da dor social, do julgamento e da vergonha de ser exposta. No TDAH a
pessoa foge de coisas chatas, burocráticas e massantes.

Quase todos os transtornos fazem com que a pessoa separe o mundo de forma binária em coisas
confortáveis e desconfortáveis e se prenda nas confortáveis. Quase todos os tratamentos consistem
em colocar o indivíduo em frente a algo em que ele tem que enfrentar desconforto.

Aprendizagem é dor, expansão é desconforto. Entre a vida que você quer e você tem apenas tempo,
mentalidade e muito desconforto. O tempo vai passar por si mesmo. Não se preocupe com isso :D.
Mentalidade eu te trago aqui no antinatural. Você só ca mesmo com o restante…

Busque ativamente o desconforto!

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