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Resumo: Este trabalho constitui parte de pesquisa em andamento, focalizada em duas Maria de Fátima Cleômenis Botelho
bibliotecas universitárias da Universidade Federal da Bahia, cujo objetivo á conhecer a Mestranda do Programa de Pós-
Graduação em Ciência da Informação –
relação dessas bibliotecas e de seus bibliotecários com os usuários com deficiência, PPGCI/UFBA. Bibliotecária do
visando contribuir para o aperfeiçoamento desse atendimento. Na perspectiva da Sistema Universitário de Bibliotecas da
Ciência da Informação, o artigo focaliza a teoria da informação centrada nos estudos e UFBA.
necessidades de satisfação dos usuários. Aborda também o conceito de mediação da mfcbotelho@gmail.com
informação em sua relação com a leitura e apropriação dos sentidos, bem como a
importância do Serviço de Referência e sua prática relacionada às competências em Kátia de Carvalho
informação, dos profissionais bibliotecários que atuam em bibliotecas universitárias Doutora em Ciência da Informação,
no atendimento de usuários com deficiência. Professora do PPGCI/UFBA
.kcarvalho560@gmail.com
Abstract: This work is part of search in progress, focused in two university libraries
of the Federal University of Bahia, whose aim will know the relationship of these
libraries and their librarians with users with disabilities to contribute to the
improvement of this service. From the perspective of Information Science, the article
focuses on information theory and studies focused on needs of user satisfaction. It also
discusses the concept of mediating information in its relationship with reading and
appropriation of the senses, as well as the importance of the service reference and
practice related to information literacy, professional librarians working in academic
libraries in serving users with disabilities.
1 INTRODUÇÃO
O homem nunca produziu tanta informação de contexto social como no século XX.
A informação passou a ser a peça chave para o desenvolvimento social e o forte impacto
das novas tecnologias sobre a sociedade pós-industrial e pós-moderna passou a impor uma
total reengenharia nos processos de produção e distribuição da informação no mundo
globalizado. As mudanças que se verificam na sociedade se traduzem a cada dia, em novas
e contundentes exigências. O acesso à informação se constitui em direito de todos,
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inclusive das pessoas com deficiência, que apesar de historicamente segregadas, também
reivindicam o exercício desse direito.
Nesse contexto, esse artigo se propõe a abordar questões relativas ao papel da
biblioteca universitária e do profissional bibliotecário que nela atua, diante da realidade que
se configura, no que se refere à mediação da informação para usuários com deficiência e
com vistas à concepção de uma biblioteca universitária mediadora e inclusiva.
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também a americana Brenda Dervin e sua teoria do sense-making, que propõe tratar a
necessidade de informação com foco na relevância (no que produz sentido).
De acordo com Rozados (2003, p. 87), “as Ciências Cognitivas preocupam-se em
entender a forma como se dá a apropriação do conhecimento pelos indivíduos.” De acordo
com essa abordagem, o conceito de “necessidades de informação” se constitui em um dos
aspectos mais importantes e segundo Silva (2012, p. 108), as necessidades de informação
estão relacionadas ao pensamento e construção dos sentidos. O autor observa também que a
necessidade de informação não é um fenômeno isolado, “[...] mas um procedimento com
fundamentos finalísticos” e que a satisfação do usuário é um desses principais
fundamentos.
Assim, percebe-se que essa nítida ligação de complemento entre necessidade de
informação e satisfação dos usuários está diretamente relacionada ao uso da informação,
que para Le Coadic (1996) é o produto final de um ciclo que se inicia com a necessidade e
termina com a o uso da informação, conforme a Figura 1.
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Para ele, entretanto, a biblioteconomia acabou relegando a leitura a um plano inferior de
interesse, na sua ânsia de obter status e de dizer-se “Ciência da Informação”. A leitura,
portanto, foi entendida como algo prescindível dentro da Ciência da Informação
(ALMEIDA JÚNIOR, 2007).
Contudo, ela é um elemento imprescindível, seja limitada à palavra escrita ou não.
Para o autor, há uma limitação muito grande na concepção que temos sobre a leitura, que
trazemos de nossa própria formação. Desde os primeiros anos na escola, a leitura tem sido
entendida e relacionada aos suportes da escrita, ou seja, “Aprendemos a ler e a escrever a
palavra” (ALMEIDA JÚNIOR, 2007, p. 37).
Dessa forma, não era de se esperar outra coisa da formação do bibliotecário, que foi
instruído desde o início a entender, sobretudo, a leitura da palavra escrita e em suporte
palpável (livros, revistas, e outros). No entanto, Almeida Júnior (2007, p. 34) defende que
“[...] a leitura está no cerne da apropriação da informação [...]”, sendo um erro
desconsiderá-la ou conferir a ela uma importância menor. O profissional que lida
diariamente com a informação precisa entender que as linguagens são variadas, que os
suportes não são únicos ou estáticos e que a prática da leitura deve estar presente na sua
ação profissional e em todos os espaços em que atua.
Assim, é possível afirmar que a mediação está impregnada no fazer diário do
bibliotecário, mas historicamente observa-se uma prática um pouco diferente. Almeida
Júnior e Bortolin (2007) analisam com propriedade o caráter preservacionista assumido
pela biblioteconomia ao longo de sua história, observando que na dicotomia existente entre
a disseminação e a preservação, essa última parece ter sido vitoriosa.
Ribeiro (2010) refere-se, nesse sentido, ao chamado “paradigma custodial,
historicista e patrimonial” no qual a ideia da preservação sempre se sobrepôs a ideia do
acesso. Em nome da preservação, as bibliotecas se transformaram em meros repositórios ou
mesmo em depósitos de livros.
Além de desenhar um triste estereótipo, Almeida Júnior e Bortolin (2007, p. 4)
tentam reafirmar a concepção por eles defendida de que “[...] o suporte era entendido como
algo formado, indissoluvelmente, pelo objeto físico e pelo conteúdo”. Apesar de não
negarem o valor da preservação que permite que o conhecimento e as ideias dos homens se
mantenham, os autores lembram que as ideias que ficaram foram aquelas que puderam ser
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registradas, ou seja, aquelas provenientes de alfabetizados ou de pessoas com condições
mínimas para se apropriarem do conhecimento de sua época (ALMEIDA JÚNIOR;
BORTOLIN, 2007).
Dessa maneira, deixam claro que o bibliotecário não pode mais ser visto como o
profissional passivo, neutro e destinado a servir apenas, mas sim como aquele que participa
efetivamente da sociedade na qual está inserido e contribui para a construção da história da
humanidade.
Além disso, a neutralidade e a imparcialidade não são possíveis, uma vez que o
profissional da informação atua como matéria prima, que por si só não é neutra e não pode
ser imparcial. A informação, portanto, estará sempre impregnada por ideologias, interesses
econômicos, políticos e culturais. O usuário deve ser ativo e participativo, ator central do
processo de apropriação e não mais aquele ser passivo e mero receptor da informação, mas
deve determinar a existência ou não da informação.
Nessa perspectiva, Iser (1999), em sua análise teórica da literatura, defende a
existência de uma interação entre o texto e o leitor, corroborando a existência de uma
autoria compartilhada entre autor e leitor. Para Iser (1999), cabe ao leitor “descobrir
equivalências” e “formular padrões” no decorrer da leitura que levem ao surgimento de
vários contextos e possibilidades no seu ponto de vista. Assim, “O ponto de vista do leitor
oscila sem cessar durante a leitura e atualiza o sentido em diferentes direções, pois as
relações, uma vez estabelecidas, dificilmente podem ser mantidas” (ISER, 1999, p. 167). O
pensamento de Iser fundamenta a concepção da mediação da informação, pois para ele o
texto não vem pronto, não é completo em si mesmo, mas necessita do leitor para interpretá-
lo e lhe dar sentido.
É grande a responsabilidade que recai sobre o bibliotecário, que em seu fazer diário,
seja no setor de aquisição, de referência ou no processamento técnico da biblioteca, atua
como agente mediador da informação. Questões como neutralidade e imparcialidade
parecem ter sido demasiadamente internalizadas na formação desses profissionais e acabam
sendo percebidas no distanciamento construído entre o bibliotecário e seu usuário de
informação, que, afinal, é a razão de ser (ou deveria ser) dessa mediação.
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4 O PROFISSIONAL BIBLIOTECÁRIO E O USUÁRIO: O BIBLIOTECÁRIO
MEDIADOR
Por sobrevivência, estes devem ir além das tarefas rotineiras, como empréstimo
domiciliar, serviço de orientação de usuários e levantamentos bibliográficos on-
line para assumir outros encargos, a exemplo da avaliação, planejamento,
implantação de redes de informação em empresas industriais; programas de
gerenciamento de informação na automação de bibliotecas e instituições
congêneres; e edição de revistas técnico-científicas. (TARGINO, 2010, p. 44).
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Em sua reflexão sobre as transformações que vêm ocorrendo no papel do
profissional bibliotecário face às transformações sociais, culturais e tecnológicas, Oddone
(1998) revela a sua preocupação com o futuro desse profissional ao afirmar:
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Na perspectiva dos conceitos da ALA, Dudziak nos dá a seguinte definição:
A partir da análise da evolução do conceito e seguindo a concepção de
information literacy voltada ao aprendizado ao longo da vida, pode-se defini-la
como o processo contínuo de internalização de fundamentos conceituais,
atitudinais e de habilidades necessário à compreensão e interação permanente
com o universo informacional e sua dinâmica, de modo a proporcionar um
aprendizado ao longo da vida. (DUDZIAK, 2003, p. 28).
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importância de se estar atento aos “aspectos atitudinais”. As barreiras atitudinais são as
piores e mais resistentes, pois, sem perceber, as pessoas acabam praticando uma
discriminação involuntária (MAZZONI et al., 2001).
De fato, falsas soluções tais como, acessos trancados a cadeado, elevadores
desligados, guichês e sanitários separados, são exemplos dessa discriminação velada. Numa
biblioteca inclusiva, a sinalização deve ser pensada levando em consideração a diversidade
de seus usuários e os serviços devem ser disponibilizados também via Internet, de forma a
ampliar as possibilidades de acesso para todos. Além disso, deve haver uma preocupação
constante com a ampliação do acervo de obras em versão digital, de forma a dar apoio aos
trabalhos acadêmicos nos níveis de graduação e pós-graduação. É recomendável também,
que a biblioteca possua um espaço de acessibilidade, com recursos de mobiliário adequado,
hardware, software e toda infraestrutura necessária para leituras e pesquisas dos usuários
com deficiência, sem que esse espaço seja de uso exclusivo deles. Nesse ponto é importante
enfatizar – nenhum usuário deve ser segregado (MAZZONI et al., 2001).
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
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J. P. (Org.). A leitura como prática pedagógica na formação do profissional da
informação. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 2007. p. 33-45.
CASTELLS, M. A sociedade em rede. 6. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1999. (A era de
informação: economia, sociedade e cultura, v.1).
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GOMES, H. F. A mediação da informação, comunicação e educação na construção do
conhecimento. DataGramaZero, Revista de Ciência da Informação, Rio de Janeiro, v.9,
n.1, p. 1-16 fev. 2008.
ISER, W. O ato da leitura: uma teoria do efeito estético. São Paulo: Ed. 34, 1999. v. 2.
LE COADIC, Y-F. A ciência da informação. 2. ed. Brasília, DF: Briquet de Lemos, 2004.
124p.
LE COADIC, Y-F. A ciência da informação. Brasília, DF: Briquet de Lemos, 1996. 115
p.