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A
FORÇA
D OÁLCOOL
, 1
BSMHMnHHHBHBB^
Daniel Nascimento Daliavalle*
// U s o u F O R T E PARA B E B I D A !
POSSO T O M A R V Á R I A S E NÃO
• H F I C O B Ê B A D O ! " Q U E M NUNCA
E S C U T O U ESSA AUTOPROMOÇÃO DE
UM A M I G O OU C O N H E C I D O D U R A N T E
U M A F E S T A DO C O L É G I O , DA F A C U L -
D A D E , OU DO E S C R I T Ó R I O ? E S S A G L A -
M O R I Z A C Ã O DO B E B E R É M U I T O M A I S
COMUM Q U E IMAGINAMOS E A P A R E -
C E E M T O D O S OS E S T R A T O S S O C I A I S E
E M T O D A S AS I D A D E S . E M T E M P O S D E
F A C E B O O K E R E D E S SOCIAIS, V E M O S
CONSTANTEMENTE VERDADEIRAS
B E A T I F I C A Ç Õ E S D E B E B I D A S ALCOÓ-
LICAS, COM R E V E R Ê N C I A I N C L U S I V E ,
T R A D U Z I D A AO M U N D O D I G I T A L C O M O
P O S T A G E N S D E FOTOS COM " K I T S " D E
B E B I D A , ASSOCIADOS A COMENTÁ-
RIOS E N A L T E C E N D O O P R A Z E R PRO-
PORCIONADO POR T A L SUBSTÂNCIA:
" H O J E A N O I T E VAI S E R F O R T E ! " .
TAIS COMENTÁRIOS F A Z E M MUITAS
O U T R A S PESSOAS S E S E N T I R E M "CA-
R E T A S " P O R NÁO C O N S E G U I R E M E N -
T E N D E R POR QUÊ, MUITAS V E Z E S , A
Q U A N T I D A D E E NÃO A Q U A L I D A D E É O
MAIS IMPORTANTE.
O ler 1110 álcool rcícre se a um gniiule yju[m cie
moléculas orgânicas c|ue possuem um grupo liidroxila
{ 011) ligatio a um átomo de carbono saturado. O álcool
etílic o, também chamado etanol, é a forma comum do
álcool, às v(r/.es chamado de álcool de tebida, c; é usado
para beber. Sua fórmula química é CH, Ql^ OH.
Os paladares e sabores característicos das bebi
das que contêm álcool resultam de seus métodos de
produção, (jue geram vários congéneres no produto
linal, incluindo metanol, butanol, aldeídos, fenc)is, ta
niiios e cjuanticlacles traço de vários mcítais. I.mbora
os congéneres possam conferir algutis efeitos psicoa
tivos diferenciais nas bebidas que contém álcool, es
sas diferenças são mínimas em comparação aos cífei
tos cio próprio etanol (Kaplan & Sadock, 2(){)7). Iodas
essas subslánc:ias, associadas ao contc;xto em que o
ato de beber sc- insere, muitas vcv/.es gera um ambien
te (íxtremaineiilc pra/eroso e c|ue, assim como todas
as coisas (|ue gcuam pra/er. airmcnrlam a vontade de
busca pela repetição de tais sensações. O início do uso
de álcool, muitas ve/es, está associado ao contexto
social e á fac ililação da aproximação quc> o mcísmo
causa entre as pessoas. Muitas pessoas, mesmo as
C)ue não possuem transtoinos rel.icionados ao álcool,
sentem se distantes e não participativas em festas
que não possuem bebidas alcoólicas. Ao |)asso que o
co|)o na mão, mesmo cjuc; dentio dele contenha uma
bebida não alc:oc')lica (uiri guai anã, por exem[)lc), para
[)arc;c:er um destilado), faz com c|ue automatic.miente
SOCIABILIDADE - A FORÇA DO ÁLCOOL
a pessoa se sinta pertencente ao grupo. Em alguns que concluíram a faculdade do que entre os que não
ambientes e grupos sociais, existe um estímulo ao concluíram o ensino médio. Mas podemos perceber
consumo excessivo de álcool, por exemplo, entre que os transtornos relacionados ao álcool aparecem
adolescente e estudantes universitários e em casas entre pessoas de todas as classes socioeconómicas.
noturnas, respectivamente. Entretanto, alguns gru- De fato, pessoas que são o estereótipo alcoolista
pos culturais e étnicos são mais reservados do que de rua constituem menos de 57» da população com
outros quanto ao consumo. Por exemplo, os asiáti- transtornos relacionados ao álcool nos Estados Uni-
cos. Existe inclusive uma explicação científica para dos ( Kaplan & Sadock, 2007).
esse menor consumo entre os asiáticos, partindo de Cabe salientar que as mulheres tendem a ser
descobertas de variações em enzimas metaboliza- mais sensíveis aos efeitos adversos do uso do álcool
doras do álcool em até 40/í dos japoneses, chineses, quando usam a mesma quantidade de doses que ho-
coremos e grupos relacionados em todo o mundo. mens. Uma das explicações é que as mulheres apre-
Essa alteração é causada por padrões genéticos di- sentarem menor quantidade de uma enzima que de-
ferentes e afetam a resposta ao álcooL Ao consumir grada o álcool no estômago, sendo mais suscetíveis
a substância, os asiáticos podem exibir rubor na aos seus efeitos.
face e sentirem palpitações, reações que podem ser Entretanto, sabemos, hoje em dia, que a genética
tão graves a ponto de limitar ou impedir novas i n - talvez tenha um papel mais relevante que o ambiente
gestões, e consequentemente, reduzir o risco para familiar no risco de desenvolvimento de transtornos
transtorno por uso de álcool (DSM-5, 2014). relacionados ao uso do álcool. Sabese que indivíduos
Assim como os fatores culturais, os hábitos fa- com história familiar positiva para transtornos por
miliares, em especial dos pais para com a bebida, uso de álcool têm de 3 a 4 vezes mais chance de de-
podem afetar os hábitos das pessoas em relação ao senvolverem problemas com uso de álcool, mesmo
álcool (Kaplan & Sadock, 2007). quando criados longe dos pais biológicos.
Um fato interessante é que, ao contrário do pa- Está muito claro para a ciência que a predis-
drão para drogas ilícitas, quanto mais alto o nível posição genética está intimamente ligada ao quão
educacional, mais provável é o uso de álcool. Cerca prazeroso o hábito de beber pode ser, mas como ci-
de 70°/í daqueles com diplomas universitários be- tado anteriormente, esse envolve muitos outros me-
bem álcool, em comparação, apenas 407» das pessoas canismos, como reforços feitos por grupos sociais. É
com formação abaixo do ensino médio. Entretanto, comum de nossa espécie buscar o convívio, intera-
o uso compulsivo de álcool é menor entre aqueles gir com outras pessoas. Nesse sentido, o álcool entra
como um facilitador, como um fator de ligação entre
o indivíduo e o grupo. Algo um pouco parecido com
o que acontece hoje com o uso das redes sociais,
quando aproximam pessoas que por alguma difi-
culdade não teriam tal contato. As redes sociais são
utilizadas por pessoas mais tímidas ou com transtor-
no de ansiedade sociafpor exemplo, como portas de
acesso ao contato interpessoal. O álcool, desde muito
antes da invenção das redes sociais, já era usado
para esse propósito. Ter uma conta no Facebook faz
você se sentir pertencente ao grupo social em que
está inserido, sensação que muitas vezes é conse-
guida em festas, como dito, ao segurar um copo e
não parecer um "careta". Algumas doses de álcool,
muitas vezes, geram uma sensação de poder, de for-
ça, que também sentimos atrás do celular, quando
postamos mensagens ou comentários, muitas vezes
inadequados, os quais jamais exporíamos ao vivo.
Acabamos fazendo isso talvez devido à sensação de
estarmos "blindados" dentro do mundo virtual. Em
algumas festas e reuniões, também precisamos nos
blindar e nos expormos de dentro de um copo bem
reforçado de uísque.
Essas semelhanças entre o uso de álcool e re-
des sociais geram outros questionamentos: o que
"Um fato interessante é que, ao contrário do padrão estamos tentando alcançar ou aliviar quando "in-
para drogas ilícitas, quanto mais alto o nível educa- gerimos" o álcool ou mesmo quando buscamos esse
cional, mais provável é o uso de álcool." contato um tanto mais distante via mecanismos digi-
tais. O álcool, por ser uma substância que estimula o Quando ingerimos tal dose, em média, Vòl do
centro do prazer e que proporciona sensação de re- álcool consumido é absorvido no estômago e o res-
laxamento, por si só, gera sim, sensações agradáveis. tante no intestino delgado. A velocidade do seu efeito
Infelizmente, o álcool é uma droga lícita em nos- depende de a pessoa ter bebido com o estômago va-
so país e consumir bebidas que contenham álcool é zio (que aumenta a absorção) ou cheio (que retarda
considerado hábito comum e aceitável em boa parte a absorção). Sabemos também que beber rapidamen-
do mundo. Dados americanos revelam que em torno te reduz o tempo para o início do efeito do álcool, por
de 9 0 7 . de seus habitantes já tomaram pelo menos gerar reflexos que evitam que o álcool saia do estô-
uma bebida que contivesse álcool, e cerca de 5 1 1 de mago. Entretanto, tal reflexo, também pode resultar
todos os adultos são usuários, sendo que cerveja re- em náusea e vómito.
presenta a metade de todo o consumo; os destilados, Quando absorvido pela corrente sanguínea, ê
um terço, e o vinho, um sexto (Kaplan & Sadock, 2 0 0 7 ) . distribuído para todos os tecidos do corpo. Os efeitos
No Brasil, dados do Centro Brasileiro de Infor- psíquicos surgem quando o álcool alcança o cérebro
mações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID), refe- e são maiores quando a concentração no sangue
rentes aos dois levantamentos domiciliares sobre está subindo do que quando está caindo. E ele cai
o uso de drogas psicotrópicas realizados no país, exatamente por que é metabolizado no fígado ( 9 0 7 . )
mostram que a dependência do álcool aumentou de ou excretado pelos rins e pulmões. Uma dose gera o
11,27o em 2 0 0 1 para 1 2 , 3 / í em 2 0 0 5 . (Laranjeira, R et ali, nível de álcool no sangue de um homem de 7 0 kg em
2 0 1 0 ) . Moralidades à parte, se não fossem substân- 15 a 2 0 mg/dl, que é a concentração metabolizada em
cias que gerassem algum prazer, não seriam consu- uma hora (Kaplan & Sadock, 2 0 0 7 ) .
midas nessas proporções. Durante todo esse trajeto feito pelo álcool em
Considera-se que uma dose individual conte- nosso organismo, experimentamos as mais variadas
nha cerca de 1 2 g de álcool, que é o conteúdo de 3 5 0 sensações corporais e emocionais. Como resultado
ml de cerveja, uma taça de 1 2 0 ml de vinho ou de 3 0 das atividades moleculares, o álcool funciona como
a 4 5 ml de destilado (por exemplo, uísque ou gim) depressivo. Em nível de 0 , 0 5 7 „ de álcool no sangue, o
(Kaplan & Sadock, 2 0 0 7 ) . raciocínio, o julgamento e a censura são afrouxados
"Infelizmente, o álcool ê uma droga licita em nosso país e consumir bebidas que contenham álcool
ê considerado hábito comum e aceitável em boa parte do mundo."
SOCIABILIDADE - A FORÇA DO ÁLCOOL
passa muitas vezes uma sensação de poder, quando Muitas vezes, além do fenómeno de tolerância,
se comparam aos demais bebedores, aos vê-los so- é frequente que os indivíduos consumam a substân-
frendo com os efeitos de intoxicação com doses me- cia em quantidades maiores ou por períodos mais
nores que a sua. Nessas situações de glamorização longos do que o pretendido, que sintam desejo per-
e de autoengrandecimento, além de predisposições sistente de uso ou que façam esforços mal sucedidos
específicas que tais indivíduos podem ter, podem es- no sentido de reduzir e controlar o uso. Acabam gas-
tar ocorrendo, muito provavelmente, o que chama- tando muito tempo em atividades necessárias para
mos de fenómeno de tolerância, que ocorre quando a obtenção de álcool, na utilização de álcool ou na
é preciso utilizar doses maiores para se atingir um recuperação de seus efeitos e, quando não podem
mesmo efeito dessa substância ou quando um efeito utilizar a substância, passam a apresentar fissura
acentuadamente reduzido é obtido após o consumo (craving no inglês). O craving, resumindo, é um forte
da dose habitual. Esse fenómeno varia de um indiví- desejo ou necessidade de usar álcool.
duo para outro e também varia de uma substância Com o tempo e o uso recorrente de álcool, aca-
para outra, sendo tão importante que faz um dos bam apresentando certo fracasso em desempenhar
critérios utilizados no diagnóstico de Transtornos papéis importantes no trabalho, na escola ou em
Relacionados a Substâncias Químicas. casa. Os problemas interpessoais começam a surgir
Segundo o DSM-5, existem diversos tipos de e acabam abandonando ou reduzindo as atividades
transtornos que são induzidos pelo uso de âlcoof sociais, profissionais ou recreacionais. Podem negli-
os chamados Transtornos por Uso de Álcool. Óbvio genciar os cuidados com os filhos ou com os afaze-
que nem todas as pessoas cjue usam álcool possuem res domésticos, bem como colocarem a si mesmos e
um transtorno por Uso de Álcool, pois, para que seja aos outros em situações de risco.
considerado transtorno, deve haver comprometi- Outro fato importante é que tais sujeitos, mes-
mento ou sofrimento clinicamente significativo, per- mo após perceberem os prejuízos físicos e psicológi-
cebido pelo próprio indivíduo ou pelas pessoas pró- cos, permanecem com o uso, muitas vezes a fim de
ximas, e esses devem ocorrer durante um período evitar quadros de abstinência, que são quadros com
mínimo de 12 meses. sintomas desconfortáveis que surgem após a parada
abrupta ou redução no uso de álcool (DSM-5, 2007).
Nas grandes cidades, percebemos que as taxas
são elevadas entre os semteto, talvez refletindo a
queda vertiginosa no funcionamento social e profis-
sional, embora a maioria dos indivíduos com trans-
torno por uso de álcool continue a viver com suas
famílias e a trabalhar.
Começamos a perceber que alguns indivíduos
que buscam um maior convívio social e um alívio de
dores e transtornos através do álcool, na maioria
das vezes, acabam alcançando exatamente o oposto.
As complicações médicas da intoxicação i n -
cluem as que resultam de quedas, como hematomas
intracranianos e fraturas. Em climas frios, pode ha-
ver hipotermia e morte quando a pessoa é exposta às
intempéries. Essa condição também pode predispor a
infecções secundárias à supressão do sistema imu-
nológico. Logo a intoxicação, em algumas situações,
não é uma condição trivial, "apenas um porre", e
geram tremores, instabilidade no caminhar, insónia,
disfunção erétil, quadros de hipoglicemia e pode le-
var a coma, depressão respiratória e morte causada
por parada respiratória ou por aspiração de vómito.
O tratamento dos casos graves exige, muitas vezes,
ventilação mecânica em unidade de tratamento in
tensivo (Kaplan & Sadock, 2007).
Do ponto de vista psiquiátrico, uma alteração
relatada em episódios de uso agudo de álcool é a cha-
mada intoxicação idiossincrática. Ela é uma síndrome
comportamental grave que se desenvolve logo após a
pessoa consumir pequena quantidade de álcool, que
teria efeitos comportamentais mínimos sobre a maio-
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SOCIABILIDADE - A FORÇA DO ÁLCOOL
que é um sinal clássico da síndrome, associado a ou- é importante informar que o uso prolongado de ál-
tros sintomas como aumento da frequência cardíaca, cool pode gerar quadros irreversíveis, como ocorre
sudorese, náuseas, vómitos, ansiedade, irritabilidade, no transtorno amnéstico persistente induzido pelo
vermelhidão no rosto, edema, boca seca, midríase álcool. Esse quadro também é chamado de Síndrome
(que é a dilatação da pupila), aumento leve da pres- de Wernicke-Korsakoff e geralmente inicia por um
são, agitação e insónia. Em 8 a 12 horas podem surgir quadro de alteração na marcha, tonturas, desequi-
quadros psicóticos com alucinações e, em 24 horas, líbrio, confusão e uma variedade de anormalidades
podem ocorrer convulsões e delirium tremens. na motilidade ocular. Se não tratada em fase inicial,
No delirium tremens, que é uma emergência pode evoluir para uma condição crónica, onde so-
médica com risco de mortalidade de 20 1, as pessoas mente 20% dos pacientes se recuperam. Ambas são
acometidas constituem risco para si mesmo e para os causadas pela deficiência de tiamina (um subtipo de
outros. Nessa síndrome, além de sintomas graves de vitamina envolvida na transmissão de informações
abstinência, os indivíduos podem apresentar febre, entre os neurónios) e são geradas por hábitos nu-
níveis oscilantes de atividade psicomotora, variando tricionais inadequados ou problemas de absorção.
de quadros em que não param de se movimentar Com tantas informações desanimadoras, po-
a quadros em que não saem da cama. Cerca de SI demos ter a impressão de que os transtornos por
das pessoas com transtornos relacionados ao álcool uso de álcool são condições intratáveis. Entretanto,
e que são hospitalizadas têm delirium tremens. Os esses casos mais graves representam apenas uma
episódios geralmente começam após 5 a 15 anos de pequena parcela, sendo que o paciente típico tem um
consumo pesado, as doenças físicas (por exemplo, prognóstico muito mais promissor.
hepatite ou pancreatite), quadros prévios de absti- Quanto mais precoce o diagnóstico e o
nência e uso de sedativos predispõem à síndrome. tratamento, melhores são as chances de resul-
Quadros graves de abstinência, portanto, mui- tados satisfatórios.
tas vezes necessitam de internações psiquiátricas Durante vários anos, as intervenções terapêu-
em hospitais gerais ou em hospitais psiquiátricos ticas para o alcoolismo ficaram limitadas ao período
que contenham bom suporte clínico. de desintoxicação, ao alívio de sinais e sintomas da
Fora as situações de gravidade acima, também síndrome de abstinência do álcool, com o uso de ben-
zodiazepínicos e reposição vitamínica, associadas ã
aplicação de diversas abordagens psicossociais.
Dentro das abordagens não farmacológicas,
somos obrigados a mencionar a importância de téc-
nicas psicoterápicas, principalmente da terapia cog-
nitivo comportamental (TCC) para o tratamento de
todas as fases do transtorno por uso de álcooL
À medida que aumentam as evidências científi-
cas do uso de uma combinação medicamentosa junto
com uma intervenção psicológica breve no tratamen-
to do alcoolismo, aumentam também as possibilida-
des de adequação do tratamento dessa patologia em
ambientes de atenção primária (Laranjeira, R et aU,
2010). Com essa boa associação, esses transtornos
podem ser tratados em sua maioria fora do ambien-
te hospitalar. Mesmo em quadros graves em que há
necessidade de internação, a TCC tem se mostrado
de fundamental importância, pois traz técnicas espe-
cíficas para cada um dos estágios em que o paciente
pode estar em relação ao transtorno. Muitas vezes, é
necessário psicoeducar e motivar o paciente para a
mudança, principalmente em estágios iniciais. Outras
vezes precisamos ensinar técnicas para o manejo da
fissura, fazer reestruturação cognitiva de crenças
disfuncionais ou mesmo utilizar técnicas de preven-
ção de recaída. Resumindo, essa abordagem psicote-
rápica parece ter ótimas ferramentas, auxiliando no
tratamento dessa patologia, independentemente do
"Quadrosgraves de abstinência, portanto, muitas
vezes necessitam de internações psiquiátricas em estágio da doença e do local onde será tratada.
hospitais gerais ou em hospitais psiquiátricos que Nos últimos 10 anos, tem sido observado um
contenham bom suporte clínico." significativo aumento no uso de intervenções te-
rapêuticas farmacológicas para o tratamento do
alcoolismo devido aos avanços nos conhecimentos
da neurociência. Temse observado um interesse
crescente pelo desenvolvimento de fármacos que
possam auxiliar na prevenção das recaídas e no
manejo da fissura {craving) pelo álcool. Para que
seja eficaz, um fármaco deve ser tomado com regu-
laridade. A não adesão medicamentosa é um pro-
blema muito comum na prática médica, não ficando
restrita a pacientes com dependência de substân-
cias psicoativas. As razões para a não adesão ao
tratamento incluem negação da doença, efeitos
colaterais desagradáveis e falsas crenças sobre a
medicação (em geral, relacionadas à impotência se-
xual, dependência, ficar "chapado", "babando" ou
engordar). (Laranjeira, R et ali, 2010). Crenças na
sua maior parte distorcidas, pois há uma probabi-
lidade maior do uso de álcool gerar tais situações
do que o uso de medicações para o seu tratamento.
Dentre tais medicações, destaca-se o uso "Para auxiliar os pacientes a manter a abstinência, po-
dos benzodiazepínicos em quadros agudos, bem demos utilizar várias outras medicações. O dissulfiram
como reposição de vitaminas e tratamento espe- é uma delas. Ele foi o primeiro medicamento aprovado
cífico para outras doenças clínicas e psiquiátri- para o tratamento do transtorno por uso de álcool."
cas comórbidas.
Para auxiliar os pacientes a manter a abs- e outras substâncias pode ser perigosa e até fa-
tinência, podemos utilizar várias outras medica- tal, geralmente por insuficiência respiratória. Os
ções. O dissulfiram é uma delas. Ele foi o primei- efeitos do álcool e de outros depressivos no sis-
ro medicamento aprovado para o tratamento do tema nervoso central (SNC) costumam ser sinér-
transtorno por uso de álcool. Esse medicamento gicos. Sedativos, hipnóticos e medicamentos que
age no metabolismo hepático e, quando o álcool é aliviam a dor, o enjoo, os resfriados e os sintomas
ingerido, ocasiona um acúmulo de uma substância de alergia devem ser usados com cuidado por
chamada acetaldeído, causando uma reação co- pessoas com transtornos relacionados ao álcool.
nhecida como efeito antabuse, que se caracteriza Por isso, nunca tome medicações sem avaliação
por rubor facial cefaleia, aumento da frequência médica prévia.
cardíaca, dor no peito, náuseas, vómitos, sudo- Por fim, é importante lembrarmos que esse
reses e cansaço. Quando a quantidade de álcool problema tem tratamento e que, apesar de ser
ingerida é grande, a reação pode progredir para impossível prever se um indivíduo irá atingir a
visão borrada, vertigem, confusão mental, pressão abstinência, sabemos que quando o paciente per-
baixa, rebaixamento do nível de consciência e, nos manece por um período de um ano ou mais sem
casos mais graves, coma e morte. O dissulfiram uso de álcool passa a ter uma chance maior de se
age, portanto, como um "freio externo", com base manter longe da substância. Outros fatos que cer-
no conhecimento prévio do aparecimento de rea- tamente contribuem para a melhora são os níveis
ções desagradáveis consequentes do ato de beber. de motivação do paciente (em querer parar com a
Entretanto, mostra pouco efeito na fissura (La- substância), a qualidade do sistema de apoio social
ranjeira, R et ali, 2010). No uso do dissulfiram, o do paciente e a disponibilidade de tratamento ade-
paciente deve saber que mesmo pequenas doses quado para outros transtornos clínicos e psiquiá-
de álcool podem gerar reação adversa. Portanto, tricos concomitantes.
deve evitar contato com alguns desodorantes, per- Depois de colocarmos todas essas informa-
fumes, álcool vinagre e produtos de limpeza. ções em uma balança, concluímos que utilizar o
Como o dissulfiram não apresenta boa respos- álcool não parece a melhor das estratégias de en-
ta na fissura e nas recaídas, é importante sabermos frentamento. Seja para obtermos a aproximação de
que ultimamente temos à disposição drogas com po- outras pessoas, seja na formação de redes sociais.
tencial de diminuir tanto esses sintomas quanto com Também não parece eficaz na busca da sensação
a função de prevenir outros sintomas de abstinên- de liberdade. Nesse caso, as consequências a longo
cia. Naltrexona, Nalmefene, Acamprosato são alguns prazo de um uso adequado do Facebook, tendem a
entre muitos tratamentos propostos para esse fim. ser bem menos desastrosas.
Já que o tópico é sobre medicações, cabe
sempre lembrar que a interação entre o álcool * Daniel Nascimento Daliavalle é médico psiquiatra.
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G R A N D E S T E M A S DO C O N H E C I M E N T O •
TRATAMENTO
E APOIO FAMILIAR
O alcoólatra precisa de constante
apoio dos amigos e parentes paraj
evitar a recaída, pois ele nunca?
. . . . . ^ ^ serijm adictrf
COMO TUDO
COMEÇA
Entender as origens do
problema ajuda a evitar que ele
se agrave e também auxilia na
busca por um caminho de
recuperação e reabilitação