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27 de março de 2024
15 min de leitura
Cray XT-6, o supercomputador do Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais,
será substituído até 2026
Não fosse pelo nome do protagonista, a frase poderia perfeitamente estar
na manchete de uma página de negócios. Entretanto, em vez da entidade
mitológica tupi-guarani, estamos falando do Cray XT-6,
o supercomputador do Centro de Previsão de Tempo e Estudos
Climáticos (CPTEC), órgão do Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais
(INPE). Desde 2010, ele é o responsável pela previsão do tempo em
nosso país.
No início de suas
operações, Tupã (como
foi batizado) era um dos
supercomputadores
mais poderosos do
mundo. De acordo com
o site Top500.org, o
equipamento ocupava a
29ª posição na lista e
era o terceiro mais
potente do
mundo dedicado à
previsão do tempo. Sua capacidade era tão grande – 205 TFlops – que,
segundo estimativa do professor Plinio Thomaz Aquino Junior,
coordenador do curso de Ciências da Computação do Centro Universitário
FEI, um minuto de seu processamento seria equivalente a uma semana
em um bom laptop atual (equipado com processador i7, memória de 8 GB
e armazenamento em disco SSD).
Instalado em Cachoeira Paulista, no interior de São Paulo, quase ao lado
da Rodovia Presidente Dutra, Tupã se espalha por uma área de 100 m 2 e,
quando estava em plena operação, consumia cerca de R$ 5 milhões anuais
em energia elétrica entre processamento e refrigeração.
A importância do seu processamento de dados é mostrada pela lista de
entidades que recebem informações geradas por ele: Ministério de Minas
e Energia, Ministério da Agricultura, Operador Nacional do Sistema
Elétrico (ONS), Agência Nacional de Águas (ANA), Centro Nacional de
Desastres Naturais (CENAD), Centro Nacional de Monitoramento e
Alertas de Desastres Naturais (CEMADEN), Diretoria de Hidrografia e
Navegação da Marinha (DHN) e Departamento de Controle do Espaço
Aéreo da Aeronáutica (DECEA), além de vários centros estaduais de
meteorologia.
O jeitinho brasileiro
Uma das características mais marcantes desse tipo de máquina é sua vida
útil bastante curta, estimada entre 4 e 6 anos, ainda mais considerando
seu custo, cerca de R$ 50 milhões à época (equivalentes a R$ 110
milhões atuais). Ou seja, era fato conhecido que ele precisaria ser
substituído em meados da década de 2010. O contrato original de
manutenção com o fabricante era de cinco anos, mas foi possível negociar
uma extensão por mais dois anos. Ao final desse período, em 2017, o INPE
propôs a compra de uma nova máquina com capacidade de
processamento 30 vezes maior do que o Tupã, por US$ 150 milhões. A
proposta não foi aprovada.
Sem orçamento para comprar um novo supercomputador (lembrando
que sua substituição não era um fato inesperado), entrou em cena o
famoso jeitinho brasileiro. Em 2018, por US$ 9,6 milhões (pouco mais de
US$ 12 milhões atualizados, cerca de 10% do custo atualizado do
supercomputador), foi comprado um computador auxiliar, um Cray CX-
50, com capacidade de processamento até um pouco superior ao do Tupã:
303 TFlops. Ele foi acoplado à máquina original, permitindo a divisão dos
trabalhos entre os dois equipamentos.
Por US$ 729 mil (menos de 10% do custo dos Crays!), ele previa o
fornecimento de um equipamento complementar que pudesse realizar
algumas das tarefas que ainda eram feitas pelo supercomputador
original. Seu custo mostra que foi uma solução paliativa. Esse
equipamento chegou em meados de 2021 e ajudou a reduzir um pouco o
trabalho do sobrecarregado Tupã.
• atmosfera;
• oceano e gelo continental e marítimo;
• superfície e solos continentais;
• clima espacial;
• hidrologia de superfície e subsuperfície.
Um modelo nacional
A importância do desenvolvimento de um modelo matemático
nacional fica evidente quando se consideram alguns poucos fatores
críticos: o tamanho do Brasil, com suas dimensões continentais, e a
variedade e a especificidade de sua geografia e de seus biomas.
Por exemplo, o cerrado e o Pantanal são biomas tipicamente brasileiros. O
primeiro apresenta uma grande variabilidade de coberturas vegetais, que
vão desde as pastagens até algo muito parecido com uma floresta tropical.
Nos modelos desenvolvidos por outros países, ele é representado
uniformemente como uma savana africana. Quanto ao Pantanal, não há
nada parecido no mundo e, consequentemente, em nenhum modelo
climático desenvolvido em outros países.
Outro fator tipicamente brasileiro que influencia desfavoravelmente o
clima é o desmatamento. Ele altera de maneira importante
as características geomórficas das áreas que, originalmente, tinham
cobertura vegetal. Como explica o professor Paulo Artaxo, do Instituto de
Física da USP, uma das principais consequências é a redução do efeito
resfriador natural realizado pelas florestas por meio dos compostos
orgânicos voláteis biogênicos, que são emitidos naturalmente pelos
vegetais durante seu metabolismo.
Uma das formas mais comuns de se desmatar no Brasil são as queimadas.
Além do calor, elas geram grande quantidade de material particulado
(black carbon) que dificulta os movimentos verticais das massas de ar
(convecção), conforme descreve o Professor Alexandre Correia, também
do Instituto de Física da USP. Esse fenômeno prejudica o congelamento da
água nas nuvens e afeta desfavoravelmente a formação das chuvas.
Também são geradas grandes quantidades de CO2 e de metano, além da
alteração no albedo de superfície (parte da radiação refletida de volta ao
espaço).
A necessidade de um supercomputador
Além da criticidade das previsões em si, um supercomputador acelera o
desenvolvimento do próprio modelo matemático de previsão do tempo.
Isso porque as simulações podem ser feitas mais rapidamente,
possibilitando uma comparação mais eficaz com os fenômenos reais e
permitindo ajustes e novos testes mais rapidamente.
Um final feliz?
É o que todos esperamos: que esse conjunto hardware-software
recapacite o Brasil do ponto de vista de previsões e estudo climáticos,
mantendo o protagonismo que o país conquistou por meio do esforço
conjunto de muitos pesquisadores e cientistas. Um de seus pontos altos
aconteceu em 2014, quando o Modelo Brasileiro do Sistema Terrestre
(BESM), também desenvolvido pelo INPE, foi incluído no 5º Relatório do
Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC).
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Lattes
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