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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS

INSTITUTO DE FILOSOFIA, CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS - IFCHS


DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
LICENCIATURA EM HISTÓRIA

COISAS POLICIAES – relações, moralidade e transgressão em Manaus de 1937.

ALLAN DIEGO CARNEIRO

Manaus – AM
Junho – 2018
ALLAN DIEGO CARNEIRO

COISAS POLICIAES – relações, moralidade e transgressão em Manaus de 1937.

Monografia de Graduação apresentada ao Instituto de


Filosofia, Ciências Humanas e Sociais da Universidade
Federal do Amazonas como requisito parcial para a
obtenção do grau de Licenciatura em História.
.

Orientador(a)
Dr ͣ Ana Lúcia Vieira

Universidade Federal do Amazonas – UFAM


Instituto de Filosofia, Ciências Humanas e Sociais - IFCHS

Manaus-AM
Junho - 2018
SUMÁRIO

1 – AGREDECIMENTOS.........................................................................................................5

2 – RESUMO.............................................................................................................................6

3 – INTRODUÇÃO...................................................................................................................7

4 – CAPITULO UM - UM OLHAR TEÓRICO-METODOLÓGICO DE CRIMINALIDADE


E DAS RELAÇÕES DOS SUJEITOS....................................................................................9

5 – CAPÍTULO DOIS - MANAUS E SUAS “COISAS POLICIAES”..................................19

6 – CAPÍTULO TRÊS - UM OLHAR SOCIAL DAS FONTES NA ESCRITA DA


HISTÓRIA................................................................................................................................29

6.1 - UM BREVE HISTÓRICO DAS FONTES...............................................................36

7 – CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................39

8 – FONTES.............................................................................................................................41

9 – BIBLIOGRAFIA................................................................................................................41
AGRADECIMENTOS

Este trabalho em sua maioria foi solitário igual à tartaruga George (risos). Brincadeira
a parte, sem o envolvimento e ajuda de algumas pessoas, esse exercício de pesquisa histórica
seria inviável. Em primeiro lugar quero
Dedicoagradecer ao Cosmo
este trabalho por suaKaio
a Annabelle, ordenação no Saulo
Vinicius, mundo
natural, na racionalidade da existência
Pietro,deTavinho
princípios e leis com
e Saori, que regem, organizam
muito amor nossa
e imenso
realidade. carinho.
A Laís Lorrane, meu amor, pelo companheirismo, compreensão e paciência de
sempre, me aturando esses últimos meses, os quais foram tempos difíceis, mas que fomos
agraciados com a alegria e imenso amor do nascimento de Saori, florescendo sorrisos em
nosso dia-a-dia.
A minha mãe Flora Maria pela ajuda de sempre, minhas irmãs pelo carinho e minha
família pela afetividade e incentivos nessa caminhada.
A minha orientadora/professora Ana Lúcia pelo incentivo e auxílio nessa pesquisa,
onde foi fundamental nesse processo de formalização, nas conversas descontraídas, nas
sugestões e correções, sempre disposta em ajudar e tirar dúvidas.
Ao meu grande amigo, irmão e praticamente meu coorientador, o Historiador João
Rozendo, pelo companheirismo de sempre, me incentivando e dando forças nos momentos
difíceis de pensamentos negativos, assim como nos ótimos debates historiográficos e
concepções da realidade social, sempre regados a um ótimo cálice de cerveja ou em nossos
descontraídos treinos de jiu-jítsu.
A um nobre amigo do Rio de Janeiro, Fred Oliveira, que com sua iniciativa me
proporcionou mergulhar inteiramente no universo da criminalidade, me ajudando em leituras
e sugestões.
Aos meus companheiros de treinos da BP Team e Aníbal Jiu-Jitsu, pelos momentos de
descarregar o stress acumulado dos dias difíceis, e no coletivismo que a prática do BJJ
proporciona.
Aos professores do departamento da Universidade Federal do Amazonas pelos
ensinamentos e construção do conhecimento, sendo fundamentais em nossa formação
acadêmica no ensino de História.
Aos meus amigos e colegas que a História me proporcionou, obrigado pelas
experiências no espaço acadêmico e discussão das particularidades históricas.
Por fim agradecer a todos que de alguma forma, direta ou indireta contribuíram para a
concretização deste trabalho. O meu muito obrigado!
RESUMO

Este trabalho monográfico se propõe em fazer uma leitura e analisar as múltiplas relações de
moral pública e seus agentes transgressores em Manaus no ano de 1937, historicizando e
discutindo essas relações com a realidade local e suas contravenções, destacando o papel
vigilante da Polícia e seu discurso, onde é a instituição que representa o Estado, monitorando
e enquadrando esses indivíduos “inimigos” da moralidade pública, perturbadores da ordem e
do sossego público no espaço urbano.

Palavras-chave: Relações; moral pública; polícia; transgressores; discurso.


ABSTRACT

This monographic work proposes to read and analyze the multiple relations of public morality
and its transgressing agents in Manaus in the year 1937, historicizing and discussing these
relations with local reality and its contraventions, highlighting the vigilant role of the Police
and its discourse, where it is the institution that represents the State, monitoring and framing
those individuals who are "enemies" of public morality, disrupting order and public
tranquility in urban space.

Keywords: Relationships; public morality; police; transgressors; speech.

INTRODUÇÃO

Em um contexto singular, nasce à ideia de uma discussão da análise em torno do jogo


de relações entre sujeitos, sociedade e meio legais de ação do Estado, na qual estabelecem
cotidianamente o uso e desuso de discursos de controle ou desobediência.

No que compreendemos dessas relações de sujeitos e a legalidade das normatizações e


os códigos de posturas que mantem a ordem e a moral pública em uma sociedade, ficamos
cientes das ações distintas desse jogo social, onde nesse cotidiano de transgressões é
pertinente e antagônico aos símbolos que legitimam as ações do Estado. E como representante
do Estado, a Polícia é a instituição que monitora e enquadra esses indivíduos “inimigos” da
ordem pública, sendo vigilante dos mesmos na conduta urbana.

E pensando em uma análise mais densa do cotidiano dessas transgressões na cidade de


Manaus no ano de 1937, refletiremos sobre a construção dessa vida de homens e mulheres,
estabelecendo relações entre a moral pública e seus transgressores. Elementos que se cruzam
com os ocorridos do dia-a-dia numa teia de relações estabelecidas pela vida em seu devido
contexto social, discutidos no decorrer deste trabalho divido em três capítulos.

No primeiro capítulo buscamos a discussão com nosso arcabouço teórico-


metodológico, nos direcionando em leituras bibliográficas que foram fundamentais para a
construção de ideias e compreensão dessas relações de sujeitos no contato com esse campo
social da criminalidade, encorpando o processo de escrita a partir das leituras das fontes.

O segundo foi no amago da nossa proposta, pois é nele que traçamos nosso percurso
nos meandros desse jogo de relações, onde sujeitos são protagonistas em defesa da
moralidade pública, exercendo ações coercitivas sobre o antagonismo transgressor,
apresentando as atividades policiais na administração e estabelecimento dessa ordem urbana,
combatendo posturas que conduziriam, segundo essa lógica de ordenação, à desordem e
perturbação da tranquilidade pública.

Em nosso terceiro capítulo estabelecemos um diálogo com nossas fontes,


problematizando sua produção, seu lugar social, seus consumidores, assim como seus
idealizadores e benfeitores ligados a determinados seguimentos e instituições que
fomentavam sua circulação, caracterizando elementos contínuos em processos de rupturas
sociais, sendo arautos desses desdobramentos de nossas peculiares históricas.

De forma geral, este trabalho se propõe analisar questões relativas à moralidade


pública e seus transgressores, em um jogo cotidiano de relações e discursos. No
exercício/ofício da prática histórica, identificando os agentes transgressores, assim como os
que se fazem cumprir a lei, buscando um diálogo com a imprensa local daquela temporalidade
e a repercussão dos casos no espaço urbano, na divulgação dessas violações da moral pública.

Focalizando sua produção histórica, buscamos demonstrar a relevância deste trabalho,


na perspectiva de uma contribuição social, iluminando aspectos de nossa historiografia, sem
buscar por origens, mas sim, exercitar o ofício que muitas vezes esquecemos por vaidades
pessoais.

Para tal, estaremos utilizando periódicos da época como fonte fundamental de análise,
pois esses periódicos nos chamam a atenção por atos, suas peculiaridades e narrativa formal
através de manchetes em jornais, apresentando e revelando esses agentes que transgrediram a
lei e a moral.

CAPITULO 1 – UM OLHAR TEÓRICO-METODOLÓGICO DE CRIMINALIDADE E


DAS RELAÇÕES DOS SUJEITOS.

Aqui buscamos uma construção historiográfica das múltiplas relações entre moral
pública e seus agentes transgressores e como elas se estabeleciam no espaço urbano da
Manaus dos últimos anos de 1930, trazendo um olhar sob essa teia de relações que
transformam em um jogo de discursos (exemplo: Posturas Municipais 1, agentes da lei, agentes

1
Ato n°44, de 29 de julho de 1938 – Outorga o novo código de posturas do Município de Manaus.
transgressores, imprensa local2) o cotidiano e a manutenção da ordem pública. E esse contexto
que discutimos é um momento que se destaca, em proporções nacionais, a política do Estado
Novo, golpe instaurado em novembro de 1937, implantando o regime autoritário de Getúlio
Vargas como ratifica a historiadora Dulce Pandolfi 3. Política de mudanças significativas nas
ações de controle social e ordem urbana, refletidos no cenário sociocultural manauara.

Estabelecendo um papel no quadro comparativo no que diz respeito à proposta desse


estudo, é compreensivo um olhar para um embasamento teórico-metodológico, tangendo os
estudos e uma visão estrutural da criminalidade e a construção do discurso, tecendo suas
relações de moral pública e conduta no meio social, condicionando suas práticas, agentes e
códigos.

Partindo de uma concepção geral, mas que de grande significado no esboço desse
trabalho, Crime e cotidiano: criminalidade em São Paulo (1880-1924), do historiador Boris
Fausto, nos conduz a uma viagem inteligível por esse universo da criminalidade, acentuando e
aprofundando nossa compreensão nesse cotidiano de distintas relações, demonstrando um
diagnóstico social e muitas vezes cultural da criminalidade, junto a seu crescimento
populacional e econômico da cidade paulista entre os anos de 1880 a 1924. Pensando e
examinando a criminalidade como fenômeno social, em uma fase de mudanças significativas
no contexto social do lugar, o historiador se preocupa em não limitar somente a criminalidade
envolvendo aqueles que estão à margem dessas transformações, mas tenta entender o código
de ética social/moral da época, a ideologia que move a sociedade para a condenação ou
absolvição desses agentes da criminalidade que transgrediram esse código, como homicidas,
prostitutas, assaltantes e criminosos sexuais 4. Ajudando a refletir um olhar sobre a
criminalidade, seus agentes e seus códigos de conduta social, sinalizamos dois elementos que
se diferenciam nos aspectos cognitivos de visão geral da criminalidade, no qual o autor
descrimina como a criminalidade real e a atividade policial, correspondente ao universo da
criminalidade e a seu fenômeno social.

A criminalidade real, entendida na sua acepção simples de infração às normas do


Código Penal, e a atividade policial, que vai muito além da prisão de eventuais
criminosos, exercendo uma atividade de amplo controle social 5.

2
Jornal do Commercio (fundado em 1904) e A Tarde (fundado em 1937).
3
PANDOLFI, Dulce. Repensando o Estado Novo. Organizadora: Rio de Janeiro: Ed. Fundação Getúlio Vargas,
1999. 345 p. 6.
4
FAUSTO, Boris. Crime e cotidiano: A criminalidade em São Paulo (1880-1924). Editora brasiliense, São Paulo
– Brasil. 1984, p. 92.
5
Idem, p. 30.
Nas pesquisas iniciais desse trabalho, os respectivos aspectos são presentes nas
fontes analisadas, e assim tende a uma via dupla de historicização dos fatos, confirmando a
assertiva de Boris Fausto, criminalidade real, pois existem fatos de transgressão do código
penal, assim como transgressão da ordem pública, exercendo a atividade policial no controle
social. Exemplificando isso, destacamos dois casos: o primeiro é o “assassinato de José Peres”
6
, casado com Anizia Peres, pai de dois filhos: Walter e Gloria, ocorrido numa quarta-feira,
dia 10 de novembro de 1937 nesta cidade de Manaus, nas proximidades da Rua Instalação,
sendo vitimado por Waldemar Area Ramos, 19, com um tiro pelas costas. O epílogo fatal, foi
fruto de um relacionamento extraconjugal que a vítima mantinha com Marina Ramos, irmã do
assassino, que sabendo de seu envolvimento com José Peres e defloramento pelo mesmo,
perpetrou o crime com desfecho trágico. Logo após o crime se entregou a polícia em porte da
arma usada, um Colt calibre 38. Sabendo do ocorrido, a polícia destinou ao local, o
investigador Cavalcante, o comissário Souza e o médico legista Angelo D’urso, que
procederam com a remoção do cadáver, que em seguida foi enviado para o necrotério da
Santa Casa de Misericórdia. A manchete nos revela uma clara e grave transgressão do código
penal7 que é o homicídio, definitivamente a ação humana mais caracterizada como crime em
diferentes sociedades, segundo Boris Fausto. O segundo caso caracteriza uma ação
reguladora transgredida. A nota do dia 11 de novembro de 1937, “vendedores de zoológicos”
8
na qual a polícia apreendeu oito cambistas que insistiam no malabarismo inveterado de
venda dos vinte e cinco animais da sorte (ou azar), cuja ação era combatida pelos agentes de
repressão do bicho, e pelo então chefe de polícia, Dr. Ruy Araújo 9, que tomou medidas
preventivas e coercitivas, no sentido de combater sua proliferação como maior incidência no
meio social10. Tratava-se de um costume arraigado em todas as populações brasileiras, e a
cidade de Manaus não era diferente desse cenário nacional, merecendo uma atenção maior do
chefe da segurança pública. Os teimosos cambistas eram Roque Moreira Cabral, José Toscano

6
Jornal “A TARDE”, Manaus, 10 de novembro de 1937, Anno I, n° 225, folha quatro.
7
DECRETO Nº 847, DE 11 DE OUTUBRO DE 1890.
8
Jornal do Commercio, “Coisas Policiaes”, Manaus, 11 de novembro de 1937, Anno XXXIV, n° 11327,
primeira folha.
9
Rui Araújo (1900-1969) - Em 1935 foi nomeado pelo governo federal promotor do Instituto de Aposentadoria e
Pensões dos Comerciários (IAPC), cargo no qual mais tarde se aposentaria. Empossado, ainda em fevereiro de
1935, o novo governador constitucional, Álvaro Botelho Maia, foi novamente designado chefe de polícia. Com a
decretação do Estado Novo em novembro de 1937 e a confirmação de Álvaro Botelho à frente do Executivo
amazonense na condição de interventor federal, foi nomeado secretário-geral do estado, condição em que, em
diversas oportunidades, exerceu interinamente o governo. FONTES: BITTENCOURT, A. Dic.; CÂM. DEP.
Deputados; CÂM. DEP. Relação dos dep.; CISNEIROS, A. Parlamentares; ROQUE, C. Grande; TRIB. SUP.
ELEIT. Dados (2, 3 e 4).
10
Jornal “A TARDE”, Manaus, 19 de Fevereiro de 1937, folha sete. Discurso ao Dr. Ruy Araújo, secretário de
segurança pública.
Sobrinho, Ricardo Alves da Silva, Francisco Paulino de Andrade, Elias Alencar, Azize Bittar,
Anastacio Mendes, e Modesto Nunes, sendo agravante esse último indivíduo que se intitulava
auxiliar de polícia. Os mesmos sofreram a penalidade de pagamento de multas estabelecidas.
Assim confirmando outro elemento apresentado por Fausto (1984), a atividade policial,
determinando os meios legais de como a polícia exercia legalmente a característica de uma
mantenedora da ordem pública, do controle social, de vigilante das transgressões e dos
agentes transgressores da conduta social/moral. Esses dois casos são relevantes no espaço
urbano, pois, sua repercussão se destacava nas páginas dos jornais e o aparato policial que
elas fomentavam, onde sabemos que se trata de dois casos totalmente distintos, afinal uma
violação do código criminal e uma simples contravenção, mas no cenário sócio-político ao
qual analisamos repercute com outras sonoridades. Mas aqui identificamos e deixamos claro
nesse trabalho nosso interesse pelas atividades policiais e seus meandros, onde serão
discutidos no decorrer da construção textual e histórica dessas relações.

Nesse primeiro exercício, Boris Fausto nos dá a dimensão da criminalidade no seu


contexto sociocultural, a reboque a compreensão de como ela é constituída e exercida por
diferentes grupos que estão conectados nesse jogo de relações que estabelecem o cotidiano
local. E, além disso, traçar um perfil de História Social, - para quê e para quem?
Compreendendo a construção histórica revelada pelo autor.

Aprofundando essa reflexão, Michel Foucault, nos faz refletir sobre um


endereçamento dessa criminalidade, no seio mais popular, nessas camadas menos favorecidas,
11
onde uma suposta gênesis é estabelecida. E sua obra “Vigiar e Punir” , foi como um
catalizador de ideias, estabelecendo uma construtiva reflexão do modus operantes da
sociedade em paralelo a criminalidade, sendo tributária de seu status quo. Segundo Foucault:

De modo que a criminalidade se fundamentava numa ilegalidade mais vasta, à


qual as camadas populares estavam ligadas como as condições de existência; e
inversamente, essa ilegalidade era um fator perpétuo de aumento da
criminalidade.

De uma forma “predestinada”, esses indivíduos são condicionados a essas concepções


de ilegalidade como bem destaca o autor, demonstrando práticas antagônicas dos sujeitos com
a ilegalidade, cotidianamente enraizados na vida social, política, econômica e cultural da
sociedade. De fato, as observações de Foucault estabelecem uma dimensão complexa do
sujeito em seu meio social e os mecanismos legais de ação e presença do Estado na vigilância

11
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes, 2004, p. 103,104.
dos mesmos, produzindo relações e o jogo de discursos desses agentes sociais, evidenciando a
transformação desses agentes, práticas e os mecanismos produzidos no lugar social (leis,
códigos, polícia e etc.).

Atestando essa linha de raciocínio, demonstrada pelo autor, a vida cotidiana na capital
amazonense expressava essa ilegalidade, o índice de criminalidade aumentando, essas atitudes
buliçosas, como furto de um chapéu de palha ou certa quantidade de madeira que sumiu da
praia do São Vicente, tinha destaque na imprensa local, assim como os deveres policiais
sempre de prontidão na vigilância de discussões ou brigas em via pública e em cortiços nas
proximidades da Joaquim Sarmento, devido ao excesso de cachaça Janauacá 12. Agentes de
repressão do bicho no combate aos transgressores do jogo proibido dos bichinhos 13. O hábito
cotidiano dessas violações da conduta ou ordem urbana fundamentava uma relação intrínseca
dos discursos de controle e desobediência, pois enquanto a um cabe o exercício da vigilância
e punição, ao outro a transgressão e manutenção dos mecanismos que controlam o bem estar
social.

Aprofundando suas próprias reflexões, Foucault em “A ordem do discurso” 14, naquilo


onde se entende seu epicentro discursivo, no qual ainda nos traz concepções do mundo e sua
dinâmica social, nesse jogo interminável das relações de poder, onde controlando os discursos
as instituições mantêm o poder. Assim, há diversas formas de controle ou de exclusão do
discurso. São excluídos aqueles que vão contra a ordem vigente. Sendo assim analisando a
realidade pretendida, buscamos a construção de um olhar de como essas relações entre
indivíduos e meios leais que normatizam os códigos civis se constituíam no cenário histórico-
social, onde um discurso formaliza outro. Partindo das análises de discursos que legitimam
tais ações, assim me debruço na assertiva foucaultiana, de que o discurso:

Quer seja, portanto, em uma filosofia do sujeito fundante, quer em uma filosofia
da experiência originária ou em uma filosofia da mediação universal, o discurso
nada mais é do que um jogo, de escritura, no primeiro caso, de leitura, no
segundo, de troca, no terceiro, e essa troca, essa leitura e essa escritura jamais
põem em jogo senão os signos. O discurso se anula, assim, em sua realidade,
inscrevendo-se na ordem do significante15.

12
Cachaça produzida na colônia do Lago Janauacá, onde Eduardo Ribeiro providenciou o estabelecimento de
engenhos de moer cana, engenhos que viveram até o advento da revolução de outubro de 1930 (e até mais tarde),
quando o caudilho Getúlio Vargas mandou acabar com os engenhos produtores de álcool, cachaça e açúcar
mascavo.
13
Jornal do Commercio, “os buliçosos”, “Coisas Policiaes”, Manaus, 06 de Fevereiro de 1938, Anno XXXV, n°
11402, primeira folha.
14
FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. – 11a ed. – São Paulo: Edições Loyola, 2004.
15
Idem, pg. 49.
Ao nos depararmos com as múltiplas relações de poderes que o discurso produz, temos
a dimensão de sua “unanime” ação no meio social, onde mecanismos caraterísticos e surgidos
de órgãos legisladores das leis e moral pública, conferem sua garantia. Assim observo, sem
ser pretensioso, que toda sociedade se enquadra em padrões discursivos, modos de
normatizações que “bitolam” os sujeitos, na vigilância de suas ações. Foucault demonstra sua
leitura das relações dos agentes sociais, jogo de discurso e os símbolos que são produzidos.

Direcionando o olhar para a cidade de Manaus, assim ratificando muito das análises de
Foucault, na articulação com essa produção de relações e normas que a demanda social
requer, no controle de uma sociedade e suas posturas na conduta pública, até propriamente
suas querelas administrativas, estão intrinsecamente associadas. Sendo isso um instrumento
indissociável nesse trabalho, pois fundamenta e atesta todo um processo oficial de ação legal
do Estado e seus representantes, códigos são postulados, sendo arquétipos de um incentivo à
produção de “posturas municipais” (códigos de postura) legalmente formalizadas no seio da
16
administração pública. Um tipo de “cartilhas para civilizar” , gestadas nas câmaras
municipais, conforme o decretado no Artigo 169 da Constituição Política do Império do
Brasil, de 25 de março de 1824. Assim, como a partir de 1934, esses códigos eram analisados
e homologados pelas Assembleias Legislativas Provinciais, sob premissa das propostas das
câmaras municipais. Legislando a amplo cenário social e suas dimensões de convívio na
ordem urbana, no que destaca Sampaio:

Era uma legislação de amplo espectro buscando dar conta de diferentes


dimensões do viver e do estar no espaço urbano. Assim, posturas disciplinaram
questões relativas aos prédios urbanos (ocupação do solo, calçamentos e
ordenamentos das ruas e casas), abastecimento de alimentos (vendedores
ambulantes, mercados, feiras, tabernas e outros estabelecimentos comerciais,
controle de preços, pesos e medidas), questões sanitárias (salubridade da cidade,
destino das águas servidas, limpeza das ruas, circulação de animais, restrições à
circulação de doentes, vacinas), questões referentes aos comportamentos (uso de
determinadas vestimentas, hábitos de higiene, restrição de horários de circulação
nas ruas da cidade, proibição de quaisquer atividades ou atitudes individuais que
comprometessem o “sossego público”) 17.

Essas posturas vão mais além de disciplinar o indivíduo ou isso ou aquilo, elas
exerciam um papel de controle e vigilância nesse espaço de múltiplas relações, sendo um
discurso significativo na tutela social, cabendo punições aos que transgrediam tais códigos,
pois sua aplicação e manutenção eram da ordem vigente. Para, além disso, esses códigos
revelam uma construção histórica em série de normas/códigos, e sua ação no espaço e tempo
16
SAMPAIO, Patrícia Melo (org.). Posturas Municipais Amazonas (1838-1967). – Manaus: EDUA, 2016.
17
Idem, pg. 10.
em que são produzidas, de forma sistêmica e pragmática na conduta social/moral do espaço
urbano.

Manaus tem um longo histórico de associação com as posturas e seu uso e desuso na
localidade, exemplo do código de Posturas Policiais de Manaus de 1838, provavelmente
nosso primeiro conjunto de posturas. Em um trabalho de recuperação de iniciativa pioneira, o
etnógrafo Geraldo de Macedo Pinheiro, em 1949 disponibilizou o código de 1838 18, no qual a
historiadora Patrícia Sampaio fundamentou um trabalho de organização e transcrição de
outras posturas municipais, totalizando 14 códigos de Postura 19 produzidos nesta localidade,
iluminando uma documentação de grandíssima importância para o trabalho de pesquisadores
de várias áreas do conhecimento, além da História, mesmo essa metodologia de análise dessas
fontes não sendo inovadora em nossa historiografia, pois desde os anos de 1930 até nosso
presente, historiadores20 já faziam e fazem uso desses documentos.

A reboque dessa discussão, o que vem a nos interessar nessa narrativa histórica de
relações e discursos, está conectado a essas posturas, mais precisamente com a Lei n° 1059,
de 22 de outubro de 1920, que promulga o Código de Posturas do Município de Manaus,
capitulo XX – Polícia e Segurança, e o Ato n° 44, de 29 de julho de 1938, outorgando o novo
código de posturas do Município de Manaus, capitulo IV – Polícia e Segurança. Partindo para
a leitura desses códigos, buscamos o confronto com os periódicos que esse trabalho se propõe
a discutir, assim, funcionando como um indicativo desse real jogo de relações que o meio
produz, pois, esse conjunto de normas representa a ação do Estado, a ordem vigente, em
antagonismo os agentes sociais dessa totalidade que transgrediram essas posturas da moral
pública demonstrando a ação de um discurso e sua relação com o sujeito, seu meio de
produção e seu público alvo. Os desdobramentos de ambas as relações refletem no âmbito do
cotidiano dos mecanismos que legislam e fazem se cumprir as posturas que o código perpetua,
sendo comum sua ação diária, assim como sua transgressão. Esse instrumento de apoio, ou
como se disse antes, uma “cartilha para civilizar”, demanda múltiplas ações políticas de
intervenção pública, cabendo aqui apenas sua utilização para uma apresentação, deixando

18
Idem, pg. 11.
19
Posturas Policiais da Câmara Municipal (1838); Código de Posturas Municipais (1848); Lei n° 196, de 26 de
maio de 1869 (1869); Lei n° 247, de 1 de junho de 1872 (1872); Lei n° 336, de 20 de maio de 1875 (1875); Lei
n° 534, de 3 de junho de 1881 (1881); Decreto n° 5, de 10 de Janeiro de 1890 (1890); Lei n° 23, de 6 de maio de
1893 (1893); Código de Posturas n° 49, de 24 de novembro de 1896 (1896); Lei n° 41, de 23 de agosto de 1901
(1901); Lei n° 639, de 13 de setembro de 1910 (1910); Lei n° 1059, de 22 de outubro de 1920 (1920); Ato n° 44,
de 29 de julho de 1938 (1938); Lei Ordinária de Manaus-AM, n° 988, de 17 de novembro de 1967 (1967).
20
Arthur Cézar Ferreira Reis (1930), Mário Ypiranga de Monteiro (1960-1970), Edinea Mascarenhas (1980),
Maria Luiza Ugarte Pinheiro (2000), Francisca Deusa Sena da Costa (2000), Hideraldo Lima da Costa (2000),
Otoni Moreira Mesquita (2000), entre outros.
claro sua real finalidade no espaço urbano e muitas vezes no campo das ideias, confirmando
que tais posturas eram violadas pelos sujeitos sociais, assim os mesmos repreendidos pelos
agentes legalmente empossados. Concentrando nosso esforço acadêmico nas relações entre
discurso legítimo de controle e nos sujeitos que violam a moral na ordem pública. Pois, como
as fontes mostram e respondem nossos questionamentos, essas transgressões eram diárias na
sociedade manauara, revelando uma intensa atividade policial, enquadrando os sujeitos que
ameaçam a ordem e o sossego público. O exemplo disso, podemos relatar um caso no dia 31
de agosto de 1935, no qual é nominado “Promoveu sarilho” 21, que diz:

A mundana Eulalia Rodrigues da Silva, freguesa da pensão de grades da rua


Marechal Deodoro, fez basurura na zona estragada da ruaLobo d’Almada. Ahi
pintou o sete, escandalisando os transeuntes, que tiveram de assistir o triste
espectaculo que a canninha obrigara essa mariposa a fazer. Um guarda de
segurança deu-lhe ordem de marcha para a cafua, onde passou a noite entre as
muquianas. (Coisas Policiaes, 31 de agosto de 1935, fl. 01).

Os fatos noticiados nas manchetes dos periódicos que são nossas fontes primárias nos
esclarecem o jogo cotidiano de ordem e desordem. A manchete aqui exposta é uma clara
evidência de perturbação da ordem urbana, projetando a relação intrínseca de transgressores
da moral pública, espaços urbanos e agentes da lei. Enquadrando esse fato no capitulo VII –
Ofensas à moral pública, art. 10922, da Lei n° 23, de 6 de maio de 1893, o infrator pagaria
10$000 mil réis ou dois dias de prisão, se o caso fosse registro diurno, o registro noturno
dessa transgressão acarretaria o dobro dessa punição. Em sua contemporaneidade na qual
estava vigente a Lei n° 1059, de 22 de outubro de 1920, capitulo X – Polícia e segurança, art.
146, II ato23, multando em 50$000 mil réis o infrator dessa postura.

“Dissecando” a manchete, sendo um trabalho metodológico, caracterizamos um papel


fundamental de identificação dos sujeitos, do lugar e a infração. Mas, não desprezando o jogo
de discursos e as mentalidades, pois, como nos foi constatado, os discursos no campo das
ideias estão em constante transformação, e na realidade as práticas no cotidiano tendem a
permanecer abordando e dando importância a uma construção metodológica na compreensão
de como o discurso é altamente tributário das relações de poder. Ou seja, as relações sendo
21
Jornal do Commercio, “Coisas Policiaes”, Manaus, 31 de agosto de 1935, Anno XXXII, n° 10651, primeira
folha.
22
Art. 109. – É proibido nas ruas e praças e estradas dar gritos, pronunciar palavras obscenas, fazer alaridos,
vozerias, assuadas e correrias, sem ser para pedir socorro ou capturar algum criminoso. Sendo de dia o infrator
incorrera na multa de 10$000 réis ou dois dias de prisão, e sendo de noite no dobro dessa pena. Lei n° 23, de 6
de maio de 1893.
23
Art. 146. – É expressamente proibido, sob pena de multa de 50$000: II ato – Proferir ou escrever em lugar
público palavras obscenas, ou traçar figuras imorais pelas paredes, portas, muros, veículos, etc. Lei n° 1059, de
22 de outubro de 1920.
conturbadas ou amistosas, elas produzem o discurso, mesmo ele sendo de inclusão ou
exclusão. Compactuando no que diz o artigo “A história como jogo: contribuições de Michel
24
Foucault para o ensino da história” do historiador Luciano Rocha Pinto, com seguinte
ideia:

Relações, saberes e poderes moldam nosso modo de ser, ver, pensar, agir e
interagir. Cada época histórica tem seu jeito particular de produzir sujeitos e
reinventar o homem. O “como” experimentamos a realidade é uma produção. O
discurso inventa a realidade. Logo, o discurso é um instrumento de poder que
busca produzir efeitos, criar aquilo que fala 25.

Argumento esse que construímos a partir da análise dessa produção de discursos. Pois
é, nessas relações que os discursos são produzidos. Tangendo essa leitura, sigo e destaco a
relevância do trabalho “Sobre a Arte de Punir: Ensaio sobre o Código Criminal do Império
do Brasil” 26, também de Luciano Rocha Pinto, para a realização “tipológica dos crimes”,
como método de identificação dos crimes e seus sujeitos. No qual o autor observa no código
criminal do império o seguinte:

O Código Criminal classifica os crimes em três tipos: públicos, particulares e


policiais. O primeiro está voltado às questões administrativas e políticas,
principalmente relacionadas com a existência do Império e os direitos políticos
dos cidadãos. O segundo está direcionado aos atentados à segurança, liberdade e
propriedade. Por fim, o último se refere às desordens sociais, à moral e bons
costumes e abusos da Imprensa 27.

Considerando sua fala em que o Código criminal é, portanto, um acontecimento da


ordem do poder disciplinar28, instituindo o discurso do significante. É notável a preocupação
com uma classificação tipificando os crimes, no qual o autor destaca essas três esferas que se
diferenciam entre: público, particular e policial, esse último, nos afirmar a contínua ação e
preocupação dos códigos, e seu discurso de controle, no combate as desordens sociais, em
prol da moral e dos bons costumes. Sua construção no espaço e tempo, do Império à
República, caracteriza essa linha temporal que as posturas exercem e legislam na vida social
dos sujeitos, suas especificidades, continuidades e rupturas.

24
PINTO, Luciano Rocha. A história como jogo: contribuições de Michel Foucault para o ensino da história”,
2011.
25
Idem, pg. 154.
26
PINTO, Luciano Rocha. SOBRE A ARTE DE PUNIR: Ensaio sobre o Código Criminal do Império do Brasil.
27
Idem, pg. 71.
28
PINTO, Luciano Rocha. A formação da sociedade disciplinar e a construção da ordem no Código Criminal do
Império do Brasil. Rio de Janeiro: Paju, 2011.
Constituindo esse corpo social, os sujeitos são personagens fundamentais nessas
estruturas de relações, nesse jogo social. Ressaltando seu estreito convívio com os códigos de
postura da ordem vigente, fazendo um longo caminho por essas relações de poder na cidade
de Manaus deixando exemplificado a desnaturalização de pacífico. As lutas eram diárias. Até
entre seus próprios representantes legados. Quando não respeitavam a moral pública ou por
indisciplina, eram indesejáveis29 e expulsos da força policial, ou o exemplo também dos
vendedores de poules30, na qual a lei proibia terminantemente o jogo do bicho 31. Fazendo-nos
refletir, a historiadora Marina Carvalho em seu trabalho, “O chique em choque? Os
malabaristas da subsistência do pós-abolição carioca”, ajudou-me na compreensão dos
sujeitos que não se enquadravam nas normatizações estabelecidas na virada do século,
trazidas pela “modernidade”, onde muitos eram trabalhadores informais, mas que eram vistos
como transgressores da moral e dos bons costumes. Reforçando o discurso de “classes podres,
classes perigosas” pois, não tinham ofícios ou trabalhos formais e sem moradia fixa, vivendo
marginalizados em cortiços.

Nessa primeira abordagem, buscamos interagir nosso objeto com nossa base teórico-
metodológica, mostrando um quadro comparativo e reforçando nosso objetivo no grau de
instrução e discussão construindo um diálogo com nossas fontes numa compreensão e
fundamentação cabível com a narrativa analítica dos objetos e sujeitos.

29
Jornal do Commercio, “Coisas Policiaes”.
30
Materiais de trabalho do jogo do bicho.
31
Criado no ano de 1892, pelo diretor do Jardim Zoológico do Rio de Janeiro, o jogo do bicho passou anos um
pé na legalidade e outro na ilegalidade. Somente em 1941, Getúlio Vargas por meio do Decreto-lei n° 3.688,
oficializou a ilegalidade os jogos de azar assim como o jogo do bicho. (Art. 58 da Lei das Contravenções Penais
– Decreto Lei 3688/41).
CAPÍTULO 2 – MANAUS E SUAS “COISAS POLICIAES” 32.

Mecanismo imprescindivel de manutenção da ordem e preservação da sociedade,


a policia merece, dos governo e do pôvo, a todo tempo, as mais firmes provas de
apreço e solidariedade. Sem policia não ha respeito mutuo, não ha organização
social, não ha escalas hierarchicas. Sem policia tudo se resolveria ao calôr dos
instinctos desordenados, tudo seria, em sua nudez absoluta, como no tempo
incrível das competições tribárias. Dahi a grande importancia do organismo
policial, cujos efeitos garantem a lei e os individuos. 33

O trecho citado acima estampa a importância da polícia em seu meio social,


demonstrando a preocupação dos seus comandantes com a ordem pública, controlando e
preservando os sujeitos e as leis na manutenção da sociedade. Esse organismo institucional
que garante a moralidade pública desempenha papéis fundamentais em cenários de transições
32
O titulo da sessão policial do JORNAL do COMMERCIO, na qual foram modificadas seis vezes. “O Pessoal
de Arrelia “ (até junho de 1906); “Na polícia” (até maio de 1908); “Chronica Policial” (até julho de 1908);
“Gazetilha” (até agosto de 1911); “Chronica nas Ruas” (até junho de 1912); “Ocorrências Policiais” (até agosto
de 1914); “Coisas Policiaes”, no qual permanece no período estudado. Fonte: Paula Dantas.
33
Jornal “A TARDE”, Manaus, 19 de Fevereiro de 1937, Anno 1, n° 1, folha sete. Fragmento do discurso ao Dr.
Ruy Araújo, chefe de Policia (secretário de segurança pública).
políticas e sociais, no uso e desuso, proliferando o discurso da ordem vigente no controle das
massas.

E como característica das profundas mudanças que os anos de 1930 trouxeram, o ano
de 1937 correspondeu a essas transições, tanto no campo político, e assim em seu campo
social, distintamente em sua economia e cultura. Afinal, com o fim dos anos dourados da
economia da borracha veio àquelas mazelas deixadas pela saída do capital da seringa, mas que
consequentemente buscaram outros meios de uma dinâmica do comércio, impulsionando a
economia local, como é o caso da economia da Juta 34. Essa Manaus aqui exposta, uma cidade
com mais 90 mil habitantes35, que outrora se transformou de uma pequena cidade a um grande
centro econômico entre as últimas décadas do século XIX e primeiras do século XX, na qual
seu centro urbano e adjacências concentram a maior parte de sua população, em um cenário
social revelador, pintado em “uma época de fausto ilusório, luxo efêmero, de um progresso
inconstante”36, onde o passado histórico emoldurou para as futuras historicidades. Em vista
que os anos de 1930 carecem de muita pesquisa histórica, no que se trata de região
amazônica, muitas lacunas ainda são perpetuadas, ainda caminhamos a uma renovação
historiográfica no preenchimento destas.

Em 1937, Manaus tinha a frente no cargo máximo do executivo municipal o agrônomo


Antônio Botelho Maia37, irmão do então governador Álvaro Botelho Maia 38, que viria a ser
nomeado como interventor federal do Amazonas pelo presidente Getúlio Vargas, nos
desdobramentos seguintes ao evento de 10 de novembro desse mesmo ano. Nessas relações
políticas o governador tinha como cargo de confiança na chefia da Polícia o então Dr. Rui
Araújo, designado chefe de polícia que atuava desde 1935 39 na secretaria de segurança,
exercendo a função com maestria, adquirindo bastante prestígio junto ao governador e

34
O cultivo de juta na Amazônia começa em 1930, com a chagada de uma Missão Japonesa, chefiada por
Tsukasa Uyetsuka. [...]. Efetivamente o cultivo de juta no Amazonas se dá em 1934/35 a partir dos resultados
obtidos por Ryota Oyama em sua propriedade localizada na Ilha formosa no Paraná do Ramos no Município de
Parintins.
FERREIRA, Aldenor da Silva. Trabalhadores da malva: (re) produção material e simbólica da vida no Baixo rio
Solimões. – Manaus: UFAM, 2009, pg. 147-148.
35
IGBE - População absoluta e relativa do Brasil, das suas unidades federadas e dos municípios das respectivas
capitais calculadas para 31 de Dezembro – 1937-1939.

36
Dias, Edinea Mascarenhas. A ilusão do fausto: Manaus, 1890-1920. Manaus: Valer, 1999.
37
Antônio Botelho Maia (Seringal Goiabal, Humaitá, 1904 – Rio de Janeiro, 1993). Prefeito de Manaus (1936-
1941) nomeado por Álvaro Maia.
38
Álvaro Botelho Maia (Humaitá, 1893 – Manaus, 1969). Interventor – AM (1930-1931); constituinte (1934);
governador – AM (1935-1937); interventor – AM (1937-1945); constituinte (1946); senador – AM (1946-1951);
governador – AM (1951-1956); senador – AM (1967-1969), falecendo no exercício do mandato. Fonte:
FGV/CPDOC.
39
Em 1935, através da Lei n° 55 de 31 de dezembro foi restabelecida a Força Policial do Estado.
prefeito. Como autoridade máxima no comando da instituição policial, sua administração
frente à secretaria de segurança, deu iniciativas em melhorias nas condições de trabalho,
estruturando e equipando o corpo da força policial, onde se empenhou nos serviços de
organização da ordem pública, vigilância da cidade, repressão à vadiagem, combate aos jogos,
vigilância dos menores e na profilaxia social. Essas ações no decorrer dessa narrativa
demonstrarão esse jogo de relações entre esses agentes sociais e os discursos que elas
produzem. Mas seguindo o raciocínio, transcreveremos três aspectos que foram permanentes
no discurso do chefe da força policial em manter a ordem/moral pública. Segue abaixo:

SERVIÇOS DE SEGURANÇA – No sector da manutenção da tranquilidade


publica, não descuidou o Dr. Chefe de Policia, do necessario para sua eficiente
realização. Alem da aquisição de motocicletas simples, minudas de «side-cars»,
para os casos urgentes e fiscalização commoda nos «pontos» de estacionamento
dos guardas, augmentou S. Sa. Consideravelmente o numero de pontos,
policiamento nocturno, confiados a homens de sua inteira confiança, num corpo
de segurança criado por ele, contando quasi 60 pontos a mais, espalhados por
todos os quadrantes da cidade.
CAMPANHA CONTRA O JOGO – Faz parte do programa de S. Sa. Extinguir,
até o limite do possivel, todos os males causados aos maiores e sobretudo, á
adolescencia, pelo eterno inimigo social que é o jôgo. A jogatina desenfreiada,
apanagio precipuo de um grupo humano decadente e falido, tem em S. Sa. Um
contendor mortifero e um destruidor infatigavel. O jogo do bicho, tão arraigado
aos costumes de todas as populações do Brasil, mereceu do Dr. Ruy Araújo
medidas preventivas e coercitivas, no sentido de impedir-lhe, a cada vez maior
infiltração em nosso meio. Os arraiaes, os «jaburús» de praça publica, a rolêta
barata, o relancim, todas as manifestações de jogatina ao ar livre, foram e estão
sendo, tenazmente combatidos, como expressões de dissolução moral do povo e
escolas de vicio, para a juventude amazonense.
HYGIENE SOCIAL – A policia moderna não pode fugir ao seu papel de
hygienizadora dos nucleos sociaes onde exista. Prevevenir, pela prophilaxia, e
pela desinfecção moral, tal é, sobretudo, o principal objetivo do organismo de
repressão. Dentro desse prisma, criou o actual titular da Policia [...] novo
Departamento, a Delegacia de Segurança Politica e Social. Tal Departamento,
cuja actuação já se faz sentida entre nós, visa, sobre a preservação colectiva
contra os movimentos subversivos, as infiltrações comunistas, as convulsões
politicas, na incansavel vigilancia em tôrno dos menores delinquentes, futuros
tentadores do Codigo Penal, menores abandonados e vadios, a cargo de uma
secção privativa de menores, agregada ao organismo policial, sob directo
controle de S. Sa. 40

Os trechos acima nos dão uma dimensão da preocupação do aparato administrativo


policial e do seu chefe geral com a situação da conduta na ordem urbana dos seus agentes
sociais, visando o bem comum da segurança e a moralidade na sociedade manauara,
objetivando aspectos na atuação de elementos no combate aos sujeitos que transgrediram a
moral e a ordem social. E em uma ação mais radical a autoridade policial criou a Delegacia de
40
Jornal “A TARDE”, Manaus, 19 de Fevereiro de 1937, Anno 1, n° 1, folha sete. Fragmento do discurso ao Dr.
Ruy Araújo, chefe de Policia.
Segurança Política e Social41, demonstrando ações políticas e repressão no combate aos
agentes subversivos, comunistas ou a manifestações políticas que promovem perturbação da
ordem e segurança pública. Nesse jogo perpétuo de ordem e desordem, ratificamos essas
relações intrínsecas dos sujeitos que o meio social concretiza nessas constantes transgressões
das normatizações que o enclausuram como ser social. A relação de indivíduo e sociedade
reflete uma luta histórica em: continuar seus costumes, suas tradições, ou romper com esse
tradicionalismo e dá lugar ao novo e muitas vezes desconhecido, pois, o jogo cotidiano das
relações, dos discursos, das ações e das transgressões da ordem urbana é permanentemente
constante.

Assim partimos dessa assertiva, na qual transcreveremos alguns recortes de


manchetes, relatando o cotidiano usual construtivo dessas relações dos sujeitos, da
transgressão e a moral pública, revelando seus agentes e as ações dos que fazem cumprirem-
se a lei, caracterizando a massiva ação policial, no controle, na vigilância e manutenção da
ordem e sossego público. É pertinente o diário embate dos sujeitos, embora, deixamos claro
que não era uma terra sem lei ou um caos generalizado. Segue abaixo as manchetes de
periódicos nos dando alguns exemplos:

Figura 1: Jornal do Commercio, 1937. Figura 2: Jornal do Commercio, 1937.

41
Sendo um modelo espelhado na DESPS (Delegacia Especial de Segurança Política e Social), que foi criada em
10 de janeiro de 1933 pelo Decreto n° 22.232 – com objetivo de entrever e coibir comportamentos políticos
divergentes, considerados capazes de comprometer “a ordem e a segurança pública”. A famosa Polícia Política
de Vargas. Anos de incerteza (1930-1937) Polícia Política. Fonte: FGV – CPDOC.
Figura 3: Jornal do Commercio, 1937. Figura 4: Jornal do Commercio, 1937.

Figura 5: Jornal do Commercio, 1937. Figura 6: A Tarde, 1937.


Esses recortes42 de manchetes nos dão a clara referência de uma cultura de
contravenções (ou contraordenações), classificadas assim dessa forma, pois são consideradas
como “crime menor”, tais transgressões são punidas com prisão simples, multa ou ambas,
chamando-nos atenção a grande quantidade e diversidades dos casos, assim como suas
peculiaridades, demonstrando a agitação diária dos sujeitos perturbadores da ordem e a força
policial no cotidiano das relações sociais da capital amazonense, segundo Paula Dantas que
nos apresenta dados de uma análise quantitativa, formalizando uma tabela com os registros de
prisões por motivos (1906-1915), da criminalidade na Manaus da belle époque, afirma que:

Os dados apresentados nos levam a concluir que, de acordo com o que a


historiografia afirma sobre outras partes do país, a polícia manauara também
estava preocupada principalmente em manter a “ordem pública”. Aqui também o
papel da instituição era “reprimir, garantir e restaurar a ordem pública,
assumindo, ainda, a tarefa de vigilância das ruas, casas de diversão, da
moralidade, dos costumes, etc.”. 43

Figura 7: Tabela de registros policiais de Paula Dantas

42
Manchetes dos Jornais “a Tarde, 24 de fevereiro de 1937, anno I, n° 5, folha 4” e “Jornal do Commercio, 23 de
fevereiro de 1937, anno XXXIV, n° 11.103, folha 1”.
43
DANTAS, Paula. DESORDEM EM PROGRESSO: Crime e criminalidade em Manaus (1905-1915) – 2014,
pg. 64.
Dantas constrói seu argumento no recorte que vai de 1905 a 1915, ao qual busca
compreender a relação entre a criminalidade urbana e a instituição policial do Amazonas em
um momento de grande crescimento urbano, e como se constituíam no espaço citadino essa
relação dos sujeitos e polícia. No que tange esse trabalho, a tabela exposta resulta nesse amplo
trabalho de pesquisa, abrangendo a criminalidade em sua totalidade, analisando de uma
simples desordem a uma grave transgressão do código penal, como o homicídio, sendo
compreensivo seu esforço nessa construção historiográfica da criminalidade e suas relações
com os atores sociais, pois, o resultado é um belo trabalho dessa análise de crime e
criminalidade na cidade de Manaus. O exercício reflexivo que o trabalho dessa importância
nos refere é o papel fundamental que a polícia desempenha nesse longo histórico de
mantenedora da ordem pública no cotidiano manauara, exemplificando sua ação moralizadora
no meio urbano. Nesse diálogo, reforçamos a fala de Dantas:

a maior evidência dessa política moralizadora é a diferença numérica entre as


prisões por crimes contra os costumes, como desordens, ofensas a moral e
embriaguez, e as prisões por crimes contra o patrimônio, como furto, por
exemplo. 44.

E nesse empenho que nos esforçamos em formalizar essa análise dos sujeitos e a
moralidade, compreendendo as relações e os discursos que são produzidos, em um contexto
vinte e poucos anos depois, nos últimos anos de 1930, com outros aspectos econômicos,
políticos e sociais, mas ainda sim compartilhando dos mesmos processos empenhados pelas
forças policias no âmbito urbano em assegurar a tranquilidade da urbis, protegendo a moral e
os bons costumes, garantindo a lei, a sociedade e os indivíduos que ela compõe.

Nesse cotidiano de constante ameaça a ordem urbana, os sujeitos são potencialmente


os catalizadores do endurecimento das ações das autoridades policiais nesse intenso “pega-
pega” de polícia e infrator. A atividade policial recrudesceu sua política moralizadora e
buscou um aspecto mais politizado no ano de 1937, emitindo portarias com decretos no
combate aos jogos de azar, em especial o “jogo do bicho”, e como divisor de águas a criação
da polícia política, na vigilância de suspeitos, ou de subversivos, infiltrações comunistas e
manifestações com viés partidário, onde conferia ao chefe de polícia, no caso a civil,
subordinado da chefia do distrito federal, recomendar ao Delegado de Segurança Política e
Social que providenciasse e determinasse as portarias com decretos, demonstrando um

44
Idem, p.65.
comando indireto de Ruy Araújo, assim comandando a polícia “civil” e polícia política, dando
exemplo de sua ação política em Dezembro de 1937, quando recomendou a dissolução de
partidos políticos no Amazonas, radicalizando a política do Estado Novo e do interventor.
federal. Segue abaixo recortes dando exemplo dessas portarias45:

Figura 8: Portaria de extinção do jogo, dezembro de 1937.

45
Portaria de extinção jogo, baixada dia 21 de dezembro de 1937; portaria de dissolução dos partidos políticos,
baixada em de dezembro de 1937, ambas publicadas na revista “A selva”; portaria de vigilância de suspeitos,
baixada em 18 de outubro de 1937, publicada no periódico “Jornal do Commercio” no dia seguinte.
Figura 9: portaria de vigilância, outubro de 1937.

Figura 10: portaria de dissolução dos partidos políticos, dezembro de 1937.

É conveniente em um momento com significativas mudanças no espaço social e


políticos se desencadeiam atitudes mais cuidadosas ou bruscas do Estado, e como defensora
desse sistema, a polícia é sua maior aliada na competência em garantir todo seu discurso legal
de ordem e moral, assim tornando-o presente e não ausente. E a polícia demonstrou seu valor
em constituir uma instituição mais vigilante, controladora e agora politizada, diferenciando-se
em muito de suas outras configurações institucionais anteriores, seu processo doutrinário
tomou ares políticos, fomentando um sistema viciado da mesma velha política caudilhista,
onde a portaria acima caracteriza a ideia exposta, desvirtuando seus princípios originários.

O ano de 1937 comporta muitos desdobramentos em nossa história, e assim estão


entrelaçados nesse cotidiano multifacetado de relações, construindo nossa identidade no
espaço social urbano. A criminalidade e a polícia estão nesse eterno jogo de relações que
revelam o cotidiano e fatos peculiares de transgressão a ordem e moralidade de uma
sociedade, afinal ─ “não é a geografia, não é a arquitetura, não são os heróis nem as batalhas,
muito menos a crônica de costumes ou as imagens criadas pela fantasia dos poetas: o que
46
define uma cidade é a história dos seus crimes” . Isso corresponde muito com a
temporalidade que nos propomos em analisar, pois, a incidência de contravenções é
determinante do crescimento das ações policiais, ou seja, as relações são extremamente
ligadas, quase dependentes. Mesmo com a mudança política que o Estado Novo trouxe e o
recrudescimento da instituição policial ao qual falamos, não mudou a dinâmica social de
ordem e desordem, pois, as transgressões continuaram e sempre continuarão, exemplo esse
que daremos confirmando a partir de alguns relatos das manchetes. Observem:

OS 25 ZOOLÓGICOS – “Eugenio Rodrigues e Amarilo Ferreira querem


enriquecer a toda brida. De que maneira? Da maneira mais fácil possivel:
impingindo aos papalvos uma poule dos vinte cinco zoologicos. Neste officio,
porem, não levaram em conta o olho policial, que tude vê. A prova é que eles
foram hontem pegados com a boca na botija, sendo hospedados no xilindró”.
LUCTADORES DE FANCARIA – “Dois gajos quiseram hontem transformar a
via publica em arena de lucta romana. Chamam se Lauro Baptista e José
Fernandes. Ergueram os punhos, gingaram os quadris e entraram na pugna.
Começaram os pontapés, seguiram-se os bofetes e os transeuntes começaram
assistir a um espectaculo gratuito e edificante. Pareciam dois galos de briga,
engalfinhando-se. Afinal surgiu um guarda de segurança que deu ordem de
marcha aos luctadores para o xilindró da rua Marechal Deodoro onde passaram a
noite, às voltas com os bichinhos terriveis que lá existem para desespero dos
enclausurados.”
OS BULIÇOSOS – “Euphrasio Martins Pedrosa, esteve hontem na policia e
disse ao plantonista que, da caixa de ferramentas do comunicante, guardada em
uma casa sita à rua Henrique Martins, haviam roubado duas plainas, no valor de
duzentos mil reis. A autoridade tomando conhecimento da queixa, ágio sem
demora, capturando Jonas Bandeira, ajudante de pedreiro, em poder de quem
foram encontrados os objectos. O rapinante teve como castigo, a entrada no
xadrez.”

QUEIXAS DO POVO: RECLAMAÇÕES QUE NOS TRAZEM – “Recebemos


de pessoas, que residem à rua Costa Azêvedo, uma carta em que se mostram
desejosos de uma medida rigorosa e imediata da policia com o fito de pôr termo
às façanhas de meninos vadios que, durante o dia e parte da noite, alli vivem a
jogar pedras nas mangueiras, quebrando as vidraças das casas com seus projectis,
além de um vocabulario imoral que escandalisa a todo mundo.”47

É corriqueiro o cotidiano da perturbação do sossego público na cidade de Manaus,


esses são alguns dos muitos exemplos que confirmam nossa análise desse cenário social,
homens e mulheres, ordem e desordem, compõem esse emaranhado de relações. Nesse
universo das “coisas policiaes”, trazemos a reflexão de John Lewis Gaddis, em sua obra
48
“Paisagens da História – como os historiadores mapeiam o passado” , onde o autor a

46
MUSSA, Alberto. O senhor do lado esquerdo. – Rio de janeiro: Record, 2011. 288pg. Pg-4.
47
Jornal do Commercio, 12 de dezembro de 1937, anno XXXIV, n° 11.354, folha 01; Jornal do Commercio, 18
de dezembro de 1937, anno XXXIV, n° 11.359, folha 01.
48
GADDIS, John Lewis. Paisagens da História – Como os historiadores mapeiam o passado. Rio de Janeiro:
Campus, 2003. 211p.
princípio faz uma análise da pintura óleo sobre tela de Caspar David Friedrich, “O viajante
sobre o mar de névoa” 49, referente ao posicionamento do historiador quanto à relação ao seu
objeto, pois, assim como o historiador, o personagem do quadro observa os fatos e processos
com o distanciamento que espaço e tempo exigem, uma vez que o passado é inacessível,
sendo somente possível sua representação pelos artefatos sobreviventes. A metáfora aqui
exposta canaliza o oficio empreendido pelo historiador em suas múltiplas interpretações da
história. E sendo essa a busca pela narrativa de interpretar a história que compreendemos
como paisagem fundamental da nossa historicidade ─ a cidade Manaus.

CAPITULO 3 – UM OLHAR SOCIAL DAS FONTES NA ESCRITA DA HISTÓRIA

Toda pesquisa historiográfica se articula com um lugar de produção


socioeconômico, político e cultural. Implica um meio de elaboração circunscrito
por determinações próprias: uma profissão liberal, um posto de observação ou de
ensino, uma categoria de letrados, etc. Ela está, pois, submetida a imposições,
ligada a privilégios, enraizada em uma particularidade. É em função deste lugar
que se instauram os métodos, que se delineia uma topografia de interesses, que
os documentos e as questões, que lhes serão propostas, se organizam 50.

Como papel fundamental dessa pesquisa, as fontes iluminam o diálogo com o


cotidiano social, e é nela que concepções históricas se delineiam dando voz às relações que o
lugar social produz, sendo um item indispensável na construção do conhecimento histórico.

E na busca dessa construção e fundamentação desse trabalho monográfico que tivemos


acesso aos periódicos do “Jornal do Commercio”, “A Tarde” e a revista mensal “A Selva”. O

49
Também conhecida como “caminhante sobre o mar de névoa”, é uma pintura a óleo de 1818 do artista alemão
Caspar David Friedrich (1774-1840), a obra está no acervo da Kunsthalle de Hamburgo desde 1970. Dimensão
98.4 x 74.8.
50
CERTEAU, Michel de. A operação historiográfica. In: ______. A escrita da história. 3. ed. Tradução de
Maria de Lourdes Menezes. Revisão técnica de Arno Vogel. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011, p. 47.
primeiro foi fundado em Manaus no dia 2 de janeiro de 1904, por Joaquim Rocha dos Santos 51
e ainda está em atividade, sendo o mais antigo jornal em circulação no Amazonas. Em uma
formatação de quatro folhas, seu caderno editorial divide-se em colunas, sempre seguindo um
único sentido das informações ali contidas, sendo que sua impressão era muita “sofisticada”
para aquela época. Suas manchetes traziam um olhar da política e economia, e outros aspectos
do cotidiano local e nacional. Mas o que nos interessou eram os anos de 1930, e assim nos
vimos debruçados sobre essas fontes, até porque o redator-chefe desse periódico naquele
momento era um dos maiores historiadores clássicos da Amazônia, Arthur César Ferreira
Reis52, filho bem-nascido de Vicente Reis, diretor e dono do jornal. Então, na primeira página,
algo nos chamou a atenção, matérias peculiares intituladas “coisas policiaes”, “os buliçosos”
e “queixas do povo”, trazendo um olhar de controle e vigilância, embutido em práticas sociais
enquadradas em códigos de posturas e portarias com decretos que eram expedidas pela polícia
a fim de manter a ordem e moral pública. Esses casos eram cotidianamente denunciados na
localidade. O segundo periódico, o jornal “A tarde” do jornalista Aristophano Antony53, foi
fundado em 19 de fevereiro de 1937, em um formato menor e mais sofisticado por conter um
acabamento gráfico das imagens melhor do que o “Jornal do Commercio”, até por existir uma
diferença temporal, mas o caderno editorial dava o mesmo exemplo de organização das
colunas e número de páginas, em algumas edições variavam para oito páginas e em edições
comemorativas chegavam a sessenta e quatro páginas 54, possuía um viés politizado,
globalizando as notícias, tanto local, nacional e internacional estendendo seu papel
informativo na política, economia, sociedade e cultura, fazia um trabalho comum da imprensa
social. Junto a isso trazemos a luz uma seção dentro desse jornal chamada “Nos bastidores da
Polícia”55, que diferente das seções citadas acima do jornal do Commercio, que ocupavam
primeira página, essa apenas ocupava as últimas páginas, sem muita importância dada pelo

51
Joaquim Rocha dos Santos (1851-1905), major da Guarda Nacional, fundou o Jornal do Commercio.
52
Arthur César Ferreira Reis (1906-1993), historiador e político amazonense, foi governador do Amazonas
(1964-1967), eleito pela assembleia por indicação direta do presidente Humberto Castelo Branco, assim como
um grande historiador clássico da Amazônia, publicou inúmeras obras de grande expressão histórica e intelectual
usadas até nossos dias como referências fundamentais de nossa história, como “História do Amazonas (1931)”,”
A expansão portuguesa na Amazônia nos séculos XVII e XVIII (1959),” Amazônia e o mundo atual (1967)”,
entre outras obras. Fonte: FGV/CPDOC.
53
Aristophano Antony (1903-1968), jornalista por vocação, trabalhou no Jornal do Commercio, O Dia, O Jornal
e A tarde, no qual foi o seu fundador, anos depois com o desaparecimento do vespertino, A tarde, colaborou com
A Crítica. Foi presidente do Atlético Rio Negro Clube, ingressou na Academia Amazonense de Letras (1947),
membro do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas e Academia Acreana de Letras, fundou a Associação
Amazonense de Imprensa, sendo presidente ate sua morte. Fonte: Blog do Coronel Roberto.
54
Edição do dia 19 de fevereiro de 1938, comemorativa de um ano do periódico, exemplar n° 307, anno II,
vespertino A Tarde.
55
Titulo da seção policial do periódico A tarde, em nossas pesquisas apareceu pela primeira vez no exemplar n°
4 do dia 23 de fevereiro de 1937, folha quatro.
periódico, mas que relatavam o cotidiano das transgressões e ações da força policial no
combate a criminalidade, na manutenção da tranquilidade pública. Nossa terceira fonte ajudou
a confirmar nossa suspeita sobre a ação da polícia, assim como seu papel político, tanto na
estabilidade, como na instabilidade, reveladas em algumas de suas matérias. Trata-se da
revista mensal “A selva”, iniciada em setembro de 1937, do jornalista Clóvis Barbosa 56,
veiculando informações sobre política, cultura, economia e os mais diversos aspectos da
sociedade no contexto social, abrangendo e disseminando seu lema “Atualidades, Política,
Letras, Problemas Sociais”, onde a cada mês seus números de páginas variavam entre mais de
vinte e mais de trinta. Afirmava-se como “Detentora de algumas características importantes,
como a preocupação por revelar a Amazônia e seus valores intelectuais, pela qualidade dos
textos e das colaborações nelas inseridas, pela própria qualidade editorial e gráfica,
ressalvados os limites de época”.

Esses exemplos de fontes submetidos a análise caracteriza o ofício de investigação do


historiador e o seu papel na construção do conhecimento histórico. E tanto os periódicos como
as revistas tinham um lugar social específico, pois, eram produtos de um meio letrado,
produzidos para uma parcela letrada da sociedade, ou seja, aqueles que sabiam ler, afinal de
contas, nem todos tinham acesso ao aprendizado. A circulação de ambos se diferenciava, o
Jornal do Commercio e A tarde tinham tiragens diárias, com distribuição em outros
municípios do Amazonas a partir da compra de assinaturas mensais ou anuais, mas claro que
a maioria dos exemplares ficava em Manaus, porém A Selva era um mensário de distribuição
local, apenas em Manaus. O que observamos em cada fonte analisada correspondeu com
nossa busca, e com certo destaque as seções policias contribuíram para o diálogo fomentando
nossa escrita, destacando os fatos que deram voz as fontes. Abaixo o exemplo de recortes e
representações de sujeitos e lugares dos periódicos e revista. Segue abaixo:

56
Clóvis Barbosa (1904-1989), jornalista e intelectual paraibano, entre os anos de 1924 e 1938, idealizou,
organizou e dirigiu as revistas amazonenses, “Redempção (1924), Equador (1929) e A Selva (1937)”. Fonte:
Entre as décadas de 1920-1930: três momentos da imprensa no Amazonas com Redempção, Equador e A Selva.
Fonte: Artigo de Narciso Júlio Freire Lobo. 13p.
Figura 11 e 12: Dois momentos gráficos do cabeçalho do jornal do Commercio (1905 e 1937).

Figura 13: Fachada de seu prédio localizavam-se na Avenida Eduardo Ribeiro n° 11, centro
de Manaus, onde funcionavam sua redação e oficinas, em edifício próprio.
Figura 14 e 15: Identificando o Jornal do Commercio como a folha de maior circulação no Amazonas e
a outra informando o Redactor-Chefe Dr. Arthur Cezar Ferreira Reis e o gerente Julio Vianna.

Figura 16, 17 e 18: Projetos gráficos das seções que traziam informações da ordem e da moralidade
pública, intituladas “coisas policiaes, os buliçosos e queixas do povo”.
Figura 19: Dr. Arthur César Ferreira Reis, redator-chefe e filho de Vicente
Torres da Silva Reis, diretor-proprietário do Jornal do Commercio.

Figura 20: Cabeçalho do jornal A tarde, no destaque sua chamada “UM VESPERTINO QUE
SERA’ SEMPRE O ARAUTO DAS ASPIRAÇÕES POPULARES”, sob direção e propriedades de
Aristophano Antony (19 de fevereiro de 1937).
Figura 21: titulo da seção policial “Nos bastidores da Polícia”.

Figura 22: Aristophano Antony, jornalista


proprietário e diretor do “A tarde”.

Figura 23: Cabeçalho da revista “A selva” de propriedade de Clóvis Barbosa,


setembro de 1937.
Figura 24: Clóvis Barbosa, proprietário da revista
mensal A selva.

Figura 25: expediente da revista “A


selva”.

UMA BREVE HISTÓRICO57 DAS FONTES

Jornal do Commercio58

O Jornal do Commercio, o mais antigo de Manaus em atividade até hoje, foi fundado
por Joaquim Rocha dos Santos em dois de janeiro de 1904, ano em que circulavam na capital
amazonense dezoito jornais. O slogan do JC nos primeiros anos era Constans, fidelis, fortis,
cedo nulli (Constante, fiel, forte, eu me rendo a ninguém). A empresa mantinha
correspondentes em Portugal e nas principais cidades do interior do Amazonas.

Rocha dos Santos veio a falecer em 9 de dezembro de 1905, e seus herdeiros


assumiram o controle do matutino até 1906, quando Adolpho Lisboa comprou o jornal e
nomeou Alcides Bahia como diretor (1906-1907). Em seguida, o cargo foi assumido por
Henrique Rubim, e, logo depois, por Francisco Tavares da Cunha Melo.

Com a ajuda financeira do sogro – Cosme Ferreira –, que lhe emprestou o dinheiro
para o negócio, Vicente Torres da Silva Reis (pai do historiador e ex-governador Arthur Cezar
Ferreira Reis) se tornou o novo dono do JC, em abril de 1907. Em sua gestão, ele modernizou
57
Textos transcritos integralmente de bibliografias de consulta no auxilio deste trabalho.
58
Texto retirado do Livro· “A Imprensa Amazonense: chantagem, politicagem e lama” de Durango Duarte, p.
17-18.
o parque gráfico do periódico, substituindo as máquinas tipográficas pelas linotipos alemãs (o
JC foi o primeiro no Brasil e o terceiro na América do Sul a ter esse equipamento).

Vicente Reis dedicou-se ao Jornal do Commercio até 1943 quando o vendeu para os
Diários Associados, conglomerado midiático pertencente ao paraibano Francisco de Assis
Chateaubriand Bandeira de Mello. Para dirigir o jornal (e a Rádio Baré) em Manaus,
Chateaubriand chamou um dos seus funcionários que residia no Rio de Janeiro e estava
trabalhando na redação do Diário da Noite: Josué Cláudio de Souza (que criou a Rádio
Difusora do Amazonas, em 1948).

Nas quatro décadas seguintes, o Jornal do Commercio foi dirigido por João Calmon
(1943-1946), Frederico Barata (1947-1961), João Calmon novamente (1962-1966) e
Epaminondas Barahuna (1959-1984), sendo que foi na administração deste último que o JC
foi o pioneiro no Brasil a ter off-set, nos anos 1960.

Mesmo com a morte de Assis Chateaubriand em 1968, nenhuma empresa foi vendida.
Até que em 4 de dezembro de 1984, o matutino foi adquirido pelo amazonense Guilherme
Aluízio de Oliveira Silva – que também comprou a Rádio Baré –, e permanece sob seu
comando até os dias atuais.

A Tarde59

O jornal A Tarde, cujo lema era: “Um vespertino que será sempre o arauto das
aspirações populares”, foi fundado em 19 de fevereiro de 1937 pelo jornalista Aristophano
Antony, membro de uma das famílias mais tradicionais de Manaus. Sua sede funcionava no
prédio da Rua Henrique Martins, n. 65. Em comemoração ao seu aniversário de um ano de
existência, publicou uma importante edição especial com 64 páginas, fazendo um breve
histórico dos municípios do Amazonas, juntamente com seus dados corográficos e com os
aspectos do desenvolvimento econômico de cada um. Por alguns anos, o A Tarde bateu de
frente com os governos trabalhistas de Plínio Coelho e Gilberto Mestrinho, principalmente em
períodos de campanhas eleitorais. Em 22 de junho de 1961, Antony vendeu seu jornal para
Carlos Sebastião Henrique Gonçalves, mas manteve uma coluna com destaque até 26 de
agosto de 1961. No ano seguinte, o jornal fechou suas portas.

Revista “A selva” 60

59
Idem, p.19-20.
60
Texto retirado do artigo “Entre as décadas de 1920-1930: três momentos da imprensa no Amazonas com
Redempção, Equador e A Selva” de Narciso Júlio Freire Lobo, p. 7.
Clóvis Barbosa que outrora lançava Redempção (1924) e Equador (1929) se lançou
em novo projeto editorial: A Selva, mensário em formato tabloide (42,5x 31,5) destinado a
veicular “Atualidades, Política, Letras, Problemas Sociais”, que circulou entre setembro de
1937 até final de 1938, transitando, por suas páginas, intelectuais como Mário de Andrade,
Gastão Cruls, Jorge Amado, Gilberto Osório de Andrade, Francisco Galvão, Jorge Andrade,
Tristão de Athayde, Cândido Mendes de Almeida, Viana Moog, Dalcídio Jurandir, Nunes
Pereira, Mauro Mota, Raul Bopp e Abguar Bastos, além de intelectuais da região que se
tornaram conhecidos posteriormente, como Francisco Pereira da Silva, Alvaro Maia,
Raymundo Moraes, Agnelo Bittencourt, Violeta Branca, Ramayana de Chevallier, André
Araújo, Araújo Lima, Benjamin Lima, dentre outros.

A Selva, como o próprio nome sugere, veio como homenagem ao romance homônimo do
escritor português Ferreira de Castro, sua principal obra, que narra a vivência de um jovem
português, Alberto, seu alter ego, em seringal do Amazonas. No número 6 da revista, saída a
30 de janeiro de 1938, é publicada, na primeira página, com destaque, carta de Ferreira de
Castro a Clóvis Barbosa:

Recebi o seu cartão, carta de Jorge Amado e A Selva. Fiquei muito sensibilizado
com a intenção que o título representa. Além disso, o jornal está bem colaborado,
tem uma grande variedade de assuntos e uma boa apresentação gráfica. Felicito-
o e aos demais camaradas amazonenses que nele escrevem. Eu avalio o esforço e
a tenacidade que A Selva traduz. Creia-me seu novo amigo, que o saúda
afetuosamente.

As publicações de Clóvis Barbosa, refletindo momento de grande efervescência


cultural e política em diversas outras regiões do Brasil, são contemporâneas de revistas como
Verde, de Cataguazes, que circulou entre 1927 e 1929; Revista de Antropofagia (1928-1929) e
O Homem do Povo (1931, dirigida por Oswald e Pagu).

Posteriormente, já no Rio de Janeiro, Clóvis Barbosa atuou editando cadernos com


ensaios de intérpretes da Amazônia, junto ao serviço de documentação da Superintendência
do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA), durante o governo Juscelino
Kubitscheck (1956-1961) encerrando, assim, sua trajetória de jornalista e editor, voltado
obsessivamente para a divulgação da Amazônia, com estilo muito vigoroso e acurado sentido
estético.

Este é o perfil, suscito, da vida e obra deste grande jornalista.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa se propôs, como objetivo geral, analisar as múltiplas dimensões sobre a
relação de moral pública e seus transgressores, historicizando e discutindo essas relações no
cotidiano social manauara, caracterizando a realidade local e suas contravenções através da
análise dos discursos da imprensa e de decretos expedidos pela instituição policial.

São de uma necessidade histórica a discussão no âmbito acadêmico dessas relações da


moral pública na conduta urbana e seus transgressores refletindo sobre os códigos civis que
regem essa determinada localidade e suas características específicas, regulamentando a vida
de seu quadro social, com apoio e representação maior das querelas da Polícia. E com essa
finalidade buscamos exercitar a perspectiva histórica, na construção de uma narrativa dos
sujeitos sociais da localidade e seus específicos atos de perturbação da ordem e moralidade
urbana, esboçando a criminalidade e as atividades policiais.

A moralidade pública é uma extensão da sociedade que busca nivelar seus indivíduos
no cotidiano social e junto a isso as relações são construídas e constituídas, tangendo o
discurso de dominação e desobediência. Essa hipótese foi correspondida na prática
metodológica pelas leituras e análises das fontes, pois nessas relações existiam discursos de
dominação, exercendo um papel de vigilante e controlador da conduta dos sujeitos na ordem
urbana, assim como existiu o antagonismo dos sujeitos, exacerbando a desordem com suas
ações contraventoras. Sem perder o fio condutor de nossos específicos objetivos, trabalhamos
na identificação dos sujeitos dessas relações com o dialogo da imprensa e como ela se
posicionava, uma vez que ela era a detentora de veicular os fatos, destacando massivamente a
ação da polícia no combate aos transgressores, e a repercussão dessas transgressões no espaço
urbano, onde obtivemos respostas aos nossos questionamentos.

Nesse passo a passo construímos nossa analise, no qual acreditamos que fomos felizes
em concretizar esse trabalho monográfico, ressaltando alguns aspectos para aprofundarmos e
corrigirmos em uma possível futura dissertação, pois, nossa historiografia local dos anos de
1930 carece de uma inovação e renovação de suas bases teóricas, mas não deixando de dar
crédito ao trabalho primoroso de Paula Dantas, pois seu trabalho fez germinar uma concepção
histórica fundamental neste trabalho, alicerçando muito mais nossa base bibliográfica, que
teve ajuda de Boris Fausto e o olhar social sobre a criminalidade, e com a análise dos
discursos nesse jogo interminável das relações, Michel Foucault foi ao âmago de nossa base
teórico-metodológica, assim como seus experimentadores, Luciano Rocha e Marina Carvalho
com propostas distintas do uso de Foucault na construção metodológica da História como
ciência, idealizando seu papel transformador no campo social.

Esse exercício de pesquisa e principalmente de escrita, amadureceu da ideia do qual


foi esboçado no projeto inicial, que apresentamos aqui para uma compreensão analítica de um
fenômeno singular, onde nos requereu tempo e muitas leituras, em alguns momentos tivemos
dificuldades, mas que foram contornadas, amadurecendo nossa escrita e análise das fontes,
correspondendo a nossa proposta inicial. A satisfação da conclusão desse ensaio é imensa
como o universo.
FONTES

- JORNAL DO COMMERCIO, edições de 1937.

- Jornal “A TARDE”, edições de 1937.

- Revista “A SELVA”, edições de setembro, outubro, novembro e dezembro de 1937.

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