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Olympio Barbanti
Federal University of ABC, São Bernardo do Campo, Brazil
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SETEMBRO DE 2017
Introdução 5
Bibliografia 26
Olympio Barbanti Jr. | MUDANÇAS CLIMÁTICAS, AGRICULTURA E SEGURANÇA ALIMENTAR
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Olympio Barbanti Jr. | MUDANÇAS CLIMÁTICAS, AGRICULTURA E SEGURANÇA ALIMENTAR
longo do período de 1880-2012. Medições ção entre cientistas da área sobre o consenso
climáticas necessitam de informações coleta- existente no tema – uma abordagem de co-
das durante grandes períodos de tempo, para munidades epistêmicas.
reduzir a influência das alterações climáticas
de curto prazo. A precisão das medidas de É por meio desse método que os cientistas,
mudanças varia significativamente e, por que estudam as mudanças climáticas, se
isso, o IPCC (2014) trabalha com graus de contrapõem àqueles que negam a existência
confiança, esclarecendo qual é a confiança e de tais mudanças. Dessa forma, o grau de
o consenso que existem para diferentes afir- certeza em cada um dos principais achados
mações a respeito das alterações no clima. da avaliação baseia-se no tipo, quantidade,
qualidade e consistência das evidências (por
Os efeitos das mudanças climáticas são vá- exemplo: dados, compreensão mecanicista,
rios: aquecimento do ar, dos solos e das águas, teoria, modelos, julgamento de especialistas)
além de aumento da variabilidade climática e o grau de concordância sobre elas.
interanual (por exemplo, períodos secos nos
quais deveria ocorrer chuva ou o contrário) e Os termos utilizados para exprimir evidência
aumento na severidade dos efeitos climáticos dos achados são: limitado, médio ou robus-
(p.ex. chuvas e ventos mais fortes). É parti- to. Para os graus de acordo sobre cada tema,
cularmente importante o efeito no aqueci- adota-se baixo, médio e alto. Desta forma,
mento e acidificação das águas dos oceanos geram-se níveis de confiança nas informa-
e mares. Sabe-se, com bastante confiança, ções, que são classificadas em muito baixo,
que os lençóis de gelo da Groenlândia e da médio, alto e muito alto. Por convenção, es-
Antártida perderam massa, e que as geleiras ses níveis de confiança são escritos em letra
de todo o mundo estão diminuindo, assim itálica.
como a cobertura de neve da primavera no
hemisfério norte. A probabilidade de ocorrência é definida em
categorias: praticamente certo (99-100% de
O conjunto de alterações devido ao clima probabilidade); extremamente provável (95-
é bastante grande. Mais adiante são men- 100%); muito provável (90-100%); prova-
cionadas as principais alterações globais e, velmente (66-100%); mais provável do que
posteriormente, avaliadas aquelas relativas à não (50-100%); tão provável quanto não
agricultura e aos sistemas agrícolas. (33-66%); improvável (0-33%); muito im-
provável (0-10%); extremamente improvável
Uma questão central é a acuidade do conhe- (0-5%) e excepcionalmente improvável (0-
cimento sobre mudanças climáticas. Talvez 1%). As probabilidades também são escritas
seja mais fácil enviar um homem ao espaço em itálico (IPCC, 2014).
do que prever as alterações que ocorrerão no
clima. Como método para reduzir incerte- Embora existam níveis variados de incertezas
zas, o IPCC (2014) definiu alguns critérios. sobre impactos específicos, o IPCC (2014)
Cada constatação feita é submetida a uma considera ser inequívoco o aquecimento do
avaliação das evidências, que dão suporte à sistema climático e que, desde a década de
conclusão que se chegou, e se faz uma avalia- 1950, ocorrem alterações que não têm pre-
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cedentes e que irão gerar impactos ao longo milhões de anos e/ou registros da existência
de décadas para milênios. de fauna e flora, registros de níveis oceânicos
do passado e outras fontes de informação.
Para a Organização das Nações Unidas para
a Alimentação e a Agricultura (FAO, 2015), Aqueles que não acreditam que existam mu-
as mudanças climáticas são a expressão cla- danças climáticas, ou aqueles que imaginam
ra do problema da sustentabilidade: como que elas não são um reflexo do modo de pro-
fazer os atores sociais alterarem seus com- dução capitalista, apegam-se às mudanças
portamentos atuais, em função do altruísmo ocorridas ao longo da história da Terra. Afir-
necessário para pensar nas gerações futuras? mam que o clima da Terra sempre apresentou
Existem ganhos financeiros imediatos em variações e que não há certeza de que as atuais
práticas de uso não sustentável dos recursos mudanças são induzidas pela ação humana.
naturais. E, mais importante, há uma cla- De outro lado, uma grande comunidade de
ra ligação entre as condições estruturais do cientistas de todo o mundo, reunidos no
modo de produção capitalista e as mudanças IPCC, afirma que a influência humana no
climáticas, posto que o processo de acumu- sistema climático é clara. Defende que as re-
lação de capital depende do consumo cons- centes emissões de gases de efeito estufa são as
tante e crescente de bens e serviços. mais altas da história, com impactos generali-
zados nos sistemas humanos e naturais.
Um ponto de discórdia reside na culpabili-
dade do capitalismo, afinal o clima da Ter- A principal argumentação, que sustenta a
ra variou bastante ao logo do tempo, antes ocorrência de tais mudanças (chamadas de
mesmo da Revolução Industrial. Ocorreram antropogênicas, ou seja, causadas pela ação
eras glaciares que gelaram o planeta. Já se humana), reside no fato de que existe uma
sabe que existiram palmeiras tropicais onde correlação bastante estreita entre o aqueci-
hoje é a Groenlândia. Essa variação climática mento do clima e a emissão dos chamados
parece ter relação com algumas causas natu- gases de efeito estufa (GEE ou greenhouse
rais, como alterações na órbita terrestre em gases, em Inglês): dióxido de carbono, me-
torno do Sol, variações na intensidade solar tano, óxido nitroso e vários gases fluorados.
e na atividade de vulcões, por exemplo. Esses gases permanecem na atmosfera, di-
ficultando a dispersão no espaço do calor
Toda ciência possui algum grau de impreci- que a Terra recebe do Sol. Os cientistas do
são e, na ciência do clima, o grau de impreci- clima afirmam que estamos entrando uma
são sobre o que ocorreu na Terra ao longo de nova era geológica, cujo ponto de início é
milhões de anos e sobre o que virá no futu- impreciso, talvez no final do século XVIII,
ro depende de modelos interpretativos. Tais talvez em um período anterior ou posterior
modelos possuem graus variados de confian- a isso – mas, certamente, influenciado pela
ça em suas conclusões, que têm sido refina- Revolução Industrial e o início da produção
das, ao longo do tempo, pela acumulação de intensiva sob o modo de produção capitalis-
informações geradas a partir de registros cli- ta, baseado fortemente no uso de fontes de
máticos do passado – por exemplo, o ar que energia provenientes do carbono existente
ficou armazenado em geleiras profundas por em estoques na Terra.
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Eles reconhecem a ocorrência de fatores na- culation Models) – têm apontado de forma
turais que aumentam a temperatura (ativi- consistente para a correlação entre a emis-
dade de vulcões, por exemplo), mas parece são de gases de efeito estufa e a mudança
claro que, após a Segunda Guerra Mundial, no aquecimento da terra e nos regimes de
ocorreu uma grande aceleração nas mudan- chuva. No entanto, os modelos atuais ainda
ças. Essa nova era geológica é chamada de não logram distinguir a variabilidade regio-
Antropoceno ou o período mais recente da nal e as mudanças nos padrões sazonais de
história do planeta Terra. temperatura e precipitação. Os modelos tipo
GCMs apresentam resultados diferentes
A existência de alterações ao clima induzi- para cenários de emissão de GEE idênticos,
das pela emissão de GEE, resultantes da ação por exemplo.
humana, é bastante antiga e foi realizada
pelo cientista sueco Arrhenius. Em 1896, ele Apesar de divergências sobre consequências
demonstrou que a queima de combustíveis em uma escala mais aproximada, todos os
fósseis iria causar aquecimento global. Suas modelos apresentam, como resultado das
predições têm sido testadas por modelos cli- mudanças climáticas, a ocorrência de tem-
máticos, que se tornaram extremamente so- peraturas mais elevadas e mais precipitação
fisticados, mas que, ainda assim, apresentam para o globo. Segundo duas agências norte-
divergências significativas em relação aos -americanas – a Agência Espacial Americana
seus prognósticos. (NASA) e a National Oceanic and Atmos-
feric Administration (NOAA) – em 2015,
Tais modelos podem ser mais globais e teó- ocorreram fortes anomalias em relação ao
ricos ou mais descritivos de condições locais, padrão de clima observado entre os anos
baseados em observações. Os modelos glo- de 1951 e 1980. O ano de 2015 foi o mais
bais são baseados na análise matemática de quente no registro de temperatura da NASA/
um grande número de variáveis, enquanto NOAA, que teve início em 1880. (NASA/
os locais agregam dados empíricos de cam- NOAA, 2016). No entanto, não se conhece,
po. São escalas diferentes, com custos e be- atualmente, a variabilidade do clima em es-
nefícios específicos. Modelos, que têm por cala regional, como também há bastante in-
base dados de campo (field-based), possuem certeza sobre mudanças nos padrões sazonais
qualidade elevada das informações que são e qual será a magnitude de tais mudanças.
introduzidas para análise, porém apenas al-
guns países possuem informação com essa Existe um consenso elevado sobre alguns
qualidade e, muitas vezes, tais informações impactos que as mudanças climáticas devem
não cobrem todo o território. A vantagem causar. Devem ocorrer impactos negativos
desses modelos é a capacidades de estudar mais severos nas regiões de baixa latitude
variações locais e sazonais. Mais adiante será (mais próximas à linha do Equador). Es-
discutido o modelo brasileiro. ses impactos devem ser bastante negativos,
mesmo que ocorram apenas níveis baixos de
Os modelos de escala global – chamados de aquecimento. Os impactos nas latitudes mé-
modelos de circulação global atmosférico dias a altas devem ser mais híbridos, especial-
(GCMs, sigla em Inglês para General Cir- mente se ocorrer um nível menos elevado de
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mercados a esses eventos extremos, entre (confiança alta) – A mudança climática glo-
outros fatores (média confiança). bal natural, em taxas mais lentas do que a
mudança climática antropogênica atual, re-
Mudanças climáticas trazem riscos que exa- sultou em alterações significativas nos ecos-
cerbam outros estressores, apresentando, sistemas e na extinção de espécies durante os
muitas vezes, resultados negativos para os últimos milhões de anos (alta confiança). As
meios de vida, especialmente para as pes- mudanças climáticas atuais estão levando à
soas que vivem em situação de pobreza (alta extinção de algumas espécies (alta confian-
confiança) – Riscos relacionados ao clima ça).
afetam diretamente a vida das pessoas po-
bres, por meio de impactos nas condições Mudanças climáticas contribuem para alte-
de subsistência e nos meios de vida, como rações na vulnerabilidade e diferenças na ex-
nas reduções de colheitas ou pela destruição posição, que são mais diretamente relacio-
de casas; e, indiretamente, por meio de, por nadas a desigualdades multidimensionais
exemplo, aumento dos preços dos alimentos advindas de processos de desenvolvimento
e insegurança alimentar. Ocorrem poucos desigual (confiança muito alta) – Os indi-
efeitos positivos para os pobres e, muitas ve- víduos, que são excluídos em uma ou mais
zes, esses efeitos são indiretos e incluem, por das dimensões econômica, social, cultural,
exemplo, a diversificação das redes sociais e política e institucional ou outras dimensões,
das práticas agrícolas. são especialmente vulneráveis às alterações
climáticas e, também, a algumas respostas
Eventos climáticos extremos revelam a sig- de adaptação e mitigação (evidência média,
nificativa vulnerabilidade e a exposição de alta concordância). No entanto, essa vulne-
alguns ecossistemas (confiança muito alta) rabilidade elevada está ligada, normalmente,
– Ondas de calor, secas, inundações, ciclones a mais de uma causa. Ela é produto da inter-
e incêndios florestais, dentre outros even- seção de processos de desenvolvimento, que
tos climáticos extremos causam impactos a resultam em desigualdades no status socioe-
ecossistemas e sistemas humanos, tais como conômico e de renda, bem como na exposi-
alteração dos ecossistemas, interrupção da ção e que incluem, entre outros, processos
produção de alimentos e do abastecimento sociais tais como a discriminação de gênero,
de água, danos a infraestruturas e assenta- classe, etnia, idade ou alguma deficiência fí-
mentos, morbidade e mortalidade e conse- sica.
quências para a saúde mental e bem-estar
humano. Esses impactos atingem países em Mudanças climáticas trazem pequenos efei-
todos os níveis de desenvolvimento e estão tos à saúde humana, se comparados aos
relacionados a uma significativa falta de pre- efeitos de outros fatores de estresse (média
paro para a variabilidade climática atual. confiança) – Embora não tenha sido clara-
mente quantificado, as mudanças na saúde
Mudança na distribuição geográfica, ati- humana no contexto das mudanças climá-
vidades sazonais, padrões de migração, ticas parecem pequenas. Porém, tem havido
abundância e interações intraespecíficas um aumento da mortalidade relacionada
de espécies terrestres, aquáticas e marinhas ao calor e diminuição da mortalidade rela-
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cionada ao frio em algumas regiões, como É certo que, se todo lançamento de gases de
resultado do aquecimento (média confian- efeito estufa fosse paralisado hoje, suas con-
ça). Também ocorrem mudanças de doenças sequências continuariam a ser sentidas por
transmitidas pela água e vetores de doenças, séculos adiante. Como as condições sistêmi-
em função de alterações locais de temperatu- cas, que determinam o modelo de produção
ra e precipitação (média confiança). capitalista vigente, dificilmente podem ser
alteradas no curto prazo, dificilmente have-
Conflitos violentos aumentam a vulnera- rá melhoras em relação aos efeitos danosos
bilidade às mudanças climáticas (evidên- previstos como consequência das mudanças
cia média, alta concordância) – Conflitos climáticas.
violentos em grande escala prejudicam ati-
vos que facilitam a adaptação, incluindo in- Modelos climáticos estimam o grau no qual
fraestrutura, instituições, recursos naturais e as atividades serão afetadas. Foram criados
oportunidades de subsistência. quatro cenários chamados de RCP (Repre-
sentative Concentration Pathways), ou Cami-
Mudança de precipitação ou derretimen- nhos de Concentração Representativa. Estes
to de neve e gelo (confiança média) – Em são cenários utilizados para fazer projeções
muitas regiões do globo, essas mudanças com base nos fatores considerados e que des-
alteram os sistemas hidrológicos e afetam a crevem diferentes possibilidades de emissões
quantidade e a qualidade dos recursos hí- de GEE, concentrações na atmosfera, emis-
dricos (confiança média). Haverá encolhi- sões de poluição do ar e uso do solo no sé-
mento contínuo de geleiras em quase todo o culo XXI.
mundo (confiança alta), o que deverá afetar
o escoamento de volumes de água a jusan- O clima afeta diretamente a produção
te (confiança média). O permafrost (solo agrícola, mas a agricultura também inter-
congelado de regiões polares e de altitudes fere no clima. Segundo o IPCC (2014),
elevadas) está se aquecendo e descongelando os setores que mais emitem gases de efeito
(confiança alta). estufa são produção de eletricidade e ca-
lor (25%), vindo a agricultura e a silvi-
Esses impactos possuem uma elevada corre- cultura e outros usos da terra com 24%
lação com as mudanças de uso do solo, tanto . Por sua vez, a indústria responde por 21%;
para fins industriais e urbanos, como para o transporte por 14%; edifícios e casas so-
fins agrícolas. mam 6%; e outras fontes de energia, 10%.
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presença de luz solar, garante a fotossíntese sível criar uma compensação financeira pelos
das plantas. Se a concentração de carbono e prejuízos causados pelas mudanças climáti-
o calor aumentam, as plantas tendem a fazer cas, sem que qualquer medida de adaptação
mais fotossíntese e a se desenvolver melhor – seja tomada.
pelo menos até um determinado liminar que
não se conhece completamente. A amplitude, o caráter sistêmico e os “efei-
tos cascata” das mudanças climáticas fazem
Tal possibilidade de obter benefícios pelas com que mitigação e adaptação sejam com-
mudanças climáticas, porém, pode não se plexas, envolvam diversas ações simultâneas
realizar. Regiões terrestres, como a China, e coadunadas, demandando invariavelmen-
que detêm poucos recursos hídricos e que te a ação de políticas públicas dispendiosas.
dependem em alguma escala das águas de Como adendo de complexidade, a política
desgelo, podem aumentar a competição pela pública deverá ser capaz de atender às pe-
água entre usos humanos, atividades indus- culiaridades de impactos diferenciados por
triais, geração de energia, produção agrícola, regiões, como forma de produzir resultados
e dessedentação de animais. justos.
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Mas essa foi uma mudança paulatina. O que de dos recursos genéticos. As variedades
se vê, hoje, é uma mudança abrupta das con- endêmicas são menos capazes de se mover
dições climáticas, com a qual a natureza tem e sobreviver à medida que as condições
muito mais dificuldade de lidar do que os ele- agroecológicas mudam. Cerca de 20% dos
mentos construídos – como a infraestrutura e parentes selvagens de culturas de três gran-
os bens industriais. Algumas regiões de maior des culturas (amendoim, feijão e batata)
vulnerabilidade ambiental correm maior ris- devem sofrer ameaça de extinção até 2050
co, como as regiões rurais sensíveis à seca, (JARVIS ET AL., 2008). Sete dos 25 luga-
aquelas de solo frágil e de declividade elevada. res mais críticos com altas concentrações de
espécies endêmicas estão na América Latina
O RCP8.5 mostra um cenário que pode ser e estas áreas estão passando por perda de
catastrófico para a agricultura. Tal aumento habitat (JARVIS ET AL., 2011). Essa di-
de temperatura, combinado com o aumen- mensão é especialmente importante para o
to da demanda por alimentos, representaria Brasil, por ser um dos países de maior bio-
grandes riscos para a segurança alimentar, diversidade no mundo.
globalmente. Considere-se que a população
mundial em 2017 deve ser de aproximada- As áreas rurais, avalia o IPCC (2014), devem
mente 7,5 bilhões e deverá chegar a 11,2 bi- experimentar grandes impactos na disponi-
lhões em 2100. bilidade e oferta de água, segurança alimen-
tar, infraestrutura e renda agrícola, incluindo
Há que, portanto, avaliar riscos. E tal aná- mudanças nas áreas de produção de alimen-
lise precisa considerar que as mudanças cli- tos e culturas não alimentares em todo o
máticas colocam em movimento alterações mundo. O Painel de Mudanças Climáticas
no ambiente natural, que não se estabilizam considera existir alta confiança de que todos
com a mesma rapidez dos elementos causais: os aspectos da segurança alimentar em todo
é possível parar de usar motores a combustão o mundo são potencialmente afetados pelas
e trocá-los pelos elétricos, mas o carbono já mudanças climáticas, incluindo a produção
emitido passará anos afetando a atmosfera. de alimentos, o acesso e o uso, bem como a
Ademais, a estabilização da temperatura mé- estabilidade de preços.
dia global da superfície da Terra não implica
estabilização para todos os aspectos do siste- A segurança alimentar, conforme compreen-
ma climático. Mudanças nos biomas, no car- dida pela FAO (2008), refere-se ao estado no
bono do solo, nas camadas de gelo, nas tem- qual todas as pessoas tenham acesso físico e
peraturas do oceano e no aumento do nível econômico, de forma contínua e estável, a
do mar têm dinâmicas e prazos próprios. Es- uma alimentação que seja suficiente, segura e
sas mudanças, que já estão em andamento, nutritiva, e que atenda às necessidades nutri-
deverão ocorrer por centenas a milhares de cionais e preferências alimentares, de modo
anos, após ocorrer a estabilização da tempe- a propiciar uma vida ativa e saudável. Mais
ratura da superfície global. amplo é o conceito de soberania alimentar,
que coloca as práticas, os conhecimentos tra-
Um caso de risco com consequências des- dicionais e os sistemas locais de produção no
conhecidas é o impacto sobre a diversida- centro do debate – e compreendem que a
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comida não deve ser vista, prioritariamente, lheita e causa pressão de espécies invasoras,
como uma mercadoria. pragas e doenças, além de serem afetadas, da
mesma forma, a capacidade de manejo do
Os conceitos de soberania e segurança ali- solo, a infraestrutura e o transporte.
mentar não são excludentes; mas a ideia de
soberania é mais ampla, e agrega a capacida- Os impactos não serão uniformes nas regiões
de dos povos de escolher sua alimentação à e entre os produtores rurais. Os pequenos
luz das consequências que a produção de ali- produtores devem ter mais dificuldades para
mentos possui para o conjunto das socieda- encontrar alternativas econômicas e tecno-
des, o que traz à tona, de um lado, o aspecto lógicas, e acessar políticas destinadas à mi-
nutricional e, de outro, a compreensão da tigação e adaptação, que, adicionalmente,
alimentação (e da saúde) como um direito podem ter custos proibitivos. Em regiões
das pessoas e uma necessidade de preserva- nas quais a mortalidade diminuiu, como na
ção ambiental (DE SCHUTTER E COR- África rural, o aumento da pressão pelo uso
DES, 2011). da terra e da demanda por comida nas cida-
des aumenta também os conflitos, que atin-
Algumas práticas agrícolas modernas preju- gem os pequenos produtores rurais.
dicam a qualidade do solo através da erosão,
compactação, acidificação e salinização e Dado que os padrões históricos de clima e
reduzem a atividade biológica como resulta- precipitação vão deixar de servir como refe-
do de aplicações de pesticidas e herbicidas, rência, os custos de informação para a gestão
fertilização excessiva e perda de matéria or- da produção rural devem subir e tornar-se
gânica. Além de contribuírem fortemente (ainda mais) proibitivos ao pequeno produ-
para as mudanças climáticas, também cau- tor. Também deve subir o custo de uso da
sam impactos afetando de modo negativo água, que se tornará mais escassa.
os padrões de exclusão social no campo e na
relação campo-cidade, afetam a qualidade da As contribuições do setor agrícola para as
comida, o tipo de dieta, e o direito dos po- mudanças climáticas são estimadas pela
vos de manterem suas tradições alimentares FAO (2014) em nove setores da agricultura
(BELLO, 2012). e quatro de usos florestais e outros setores.
Os relativos à agricultura, apontados pela
Esse tipo de agricultura das corporações agência, são os seguintes:
privadas, que solapa a segurança e a sobe- Fermentação entérica – o sistema digestivo
rania alimentar, é responsável pelo consumo de ruminantes gera gás metano (CH4); uma
de cerca de 70% da água doce existente no contribuição menor é feita por não rumi-
mundo, em rios e aquíferos. Considerando nantes.
que 20% dessa água é compartilhada por
Estrume – O uso de estrume emite nitro-
ao menos dois países, deverá haver aumento gênio (N).
nas disputas internacionais e conflitos pelo
recurso (DE STEFANO ET AL., 2017). Be- Cultivo de arroz – Geram gás metano
ddington et al. (2012) destacam que a alte- (CH4).
ração climática afeta também perdas pós-co- Fertilizantes sintéticos, resíduos de culturas
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Uso de energia na agricultura – As emissões Cada vez mais, busca-se o consumo de pro-
provenientes do consumo de energia consis- teína animal e o crescimento de pastagens
tem em gases de dióxido de carbono, meta- para rebanho bovino, com forte impacto em
no e óxido nitroso associados à combustão desmatamento e na concentração fundiária.
direta de combustível e geração de eletricida- De outro lado, a demanda por cereais deve
de para agricultura, incluindo pescas, como aumentar em 70% até 2050 e duplicará em
também estimativas de energia utilizada em muitos países de baixa renda, o que pressio-
máquinas, irrigação elétrica e embarcações nará pelo aumento de grandes áreas de mo-
de pesca. nocultura (OXFAM, 2016).
Esse modelo agroalimentar resultou, atual- Esse modelo traz diversos problemas rela-
mente, em cerca de um bilhão de pessoas cionados a cadeias de alimentos, incluindo
no mundo que passam fome. São vítimas o fato de que diversos países produzem para
de um sistema agroalimentar que destina exportar ou para produzir agrocombustíveis
recursos e conhecimentos ligados a finan- destinados a abastecer carros e não para o
ciamento, tecnologia, assistência técnica e consumo de sua própria população (HOU-
extensão rural (Ater) e infraestrutura para a TART, 2010). A pesquisa e o desenvolvi-
agricultura corporativa vinculada às cadeias mento na agricultura, feitos principalmente
regionais e globais do agronegócio. Produz por empresas privadas e por alguns gover-
alimentos industrializados, processados e ul- nos, estão direcionados à grande agricultura
traprocessados, com baixo valor nutricional e às empresas agroalimentares.
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De Schutter e Cordes (2011) notam que, modelo foi apresentado por diversas organi-
cada vez mais, as regiões produtoras locali- zações camponesas internacionais reunidas
zam-se distantes dos consumidores, aumen- no Fórum Internacional de Soberania Ali-
tando o custo do transporte e a perda. Há, mentar, realizado no Mali, em 2007, cha-
também, elevado desperdício no consumo e, mado de fórum de Nyéléni, em homenagem
muitas vezes, na produção. Como a necessi- a uma camponesa. As resoluções do fórum
dade de alimentos aumenta em um mundo estão registradas no documento Forum for
onde a desigualdade social persiste e o con- Food Sovereignty - Nyéléni 2007 (NYÉLÉ-
sumo de proteína animal ainda é baixo, será NI, 2007) e estabelecem os seis pilares da
difícil conter as emissões de GEE da agro- soberania alimentar.
pecuária, a não ser pela redução do desma-
tamento e queima de florestas, de forma a De forma resumida, esses pilares podem ser
aumentar a locação dos pastos (quantidade interpretados como: colocar as pessoas no
de cabeças por hectare). centro das políticas de alimentos; respeitar,
valorizar e garantir a sobrevivência dos cam-
Nesse modelo, entende-se que a segurança poneses e pequenos agricultores familiares;
alimentar é propiciada pelos mercados. Ou aproximar os fornecedores de alimentos e
seja, mesmo que não exista produção local, os consumidores; propiciar o controle local,
a segurança alimentar seria garantida pelos os valores e direitos das populações locais
produtos disponíveis para compra. Obvia- nos sistemas agroalimentares; fazer uso dos
mente, os custos de transporte e as emissões
conhecimentos e habilidades locais, trans-
de GEE associadas não são consideradas nes-
mitindo esse conhecimento para as futuras
sa equação. O processamento e a refrigera-
gerações.
ção constituem fontes adicionais de emissões
de GEE.
Trata-se de uma visão que compreende a
Segundo Bebbington et al. (2011), entre agricultura como um sistema de produção
1961 e 2003, o comércio mundial de alimen- associado a formas de vida, a valores, e à
tos aumentou de 1500 Gkcal/dia para mais integração dos sistemas produtivos com sa-
de 7000 Gkcal/dia. Os países da América beres tradicionais que formam a base de
Latina e os da Organização de Cooperação e um modelo produtivo, que se realiza com
Desenvolvimento Econômicos (OCDE) são a natureza e não apesar da natureza – como
exportadores líquidos de calorias alimenta- ocorre no atual modelo agroalimentar cor-
res, enquanto a Ásia, a África e o Oriente porativo, no qual a produção de alimentos
Médio são regiões importadoras líquidas. segue padrões de lucro e rentabilidade das
corporações, que se remuneram pela ven-
De outro lado está o modelo que entende a da de alimentos e de produtos e serviços a
alimentação como uma forma de viver e de eles associados, incluindo serviços financei-
produzir com sustentabilidade. De fato, para ros (De PAULA, SANTOS E PEREIRA,
aprofundar a ideia de segurança alimentar e 2015), de tal forma que a comida, em si, é
enquadrá-la na perspectiva de autodetermi- apenas um elemento em uma ampla cadeia
nação dos povos e soberania das nações, tal de formação de renda.
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chuva em porções da Mata Atlântica do Sul deverá ter, de uma maneira geral em todo seu
e do Sudeste. Esse aumento é positivo em território, mais dias com chuva consecutivos
termos de disponibilidade de água, mas deve e mais dias com seca consecutivos (Nobre,
gerar inundações e deslizamentos, requeren- 2017). Ou seja, deverá haver aumento na
do grandes investimentos em infraestrutura. severidade das condições climáticas, poden-
O aumento do nível dos oceanos deve atin- do ocorrer tanto inundações, como falta de
gir a maior parte das capitais do Brasil locali- água, ambos com impactos significativos na
zadas no litoral, além de várias cidades. infraestrutura e na geração de eletricidade.
Note-se que a infraestrutura das zonas rurais
A figura 2 apresenta a variação de tempera- descampadas possui maior vulnerabilidade
tura, com aumento em praticamente todo o aos impactos climáticos, em especial pela
país: em 2100 a temperatura deverá ser de ocorrência de ventos fortes.
3ºC a 6ºC mais elevada do que no final do
século XX. A região leste de Minas Gerais e Para lidar com o cenário de mudanças climá-
o sul da Bahia serão os mais afetados pelo ticas, o Brasil instituiu, por meio da Lei nº
calor. Também haverá aumento de tempera- 12.187 de 2009, a Política Nacional sobre a
tura em toda a região amazônica, especial- Mudança do Clima (PNMC). Ela estabelece
mente nos estados do Pará e Mato Grosso, o compromisso nacional voluntário de ado-
bem como no meio-sul da Bahia. ção de ações de mitigação, com o objetivo de
reduzir as emissões de gases de efeito estufa
Talvez a implicação mais significativa das des- (GEE) do país entre 36,1% e 38,9% em re-
cobertas, até o momento, seja de que o país lação às emissões projetadas até 2020.
BESM2.3.1 2050 pmax CHANGE exp: CMP045 BESM2.3.1 2050 tmax CHANGE exp: CMP045
EQ 70 EQ
60
5S 5S 6
50
5
40
10S 10S 4
30
3
20
15S 15S 2
10
1
-10
20S 20S
-1
-20
-2
25S -30 25S
-40
30S 30S
75W 70W 65W 60W 55W 50W 45W 40W 35W 75W 70W 65W 60W 55W 50W 45W 40W 35W
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tência humana e possui relação direta com das plantas às mudanças climáticas, man-
a configuração socioeconômica, cultural e tendo ou ampliando a capacidade produtiva
política das sociedades e seu uso do territó- por meio de um rol de ações, dentre as quais
rio. É certo que a atividade agrícola possui aquelas sugeridas pela Embrapa/Unicamp
inter-relações fortes com o clima: ao mesmo (2008) servem de exemplo: integração pas-
tempo que causa mudanças climáticas, por tagem-lavoura; sistemas florestais; plantio
elas é afetada. Mas essas inter-relações preci- direto; arborização de cafezais; convivên-
sam ser compreendidas para além de aspec- cia com a seca; e melhoramento genético e
tos técnicos e devem levar em consideração transgenia.
que o modelo de agricultura, que de fato
impacta o clima, é o da agricultura capitalis- Essas opções representam alternativas que
ta, intensiva no uso de capital e de recursos vão de um perfil mais ecológico (como a inte-
naturais. Ela traz consigo enormes impactos gração pastagem-lavoura e o plantio direto),
para as sociedades. até a aplicação de novas técnicas de trans-
genia – o que parece ser a rota preferida do
As mudanças climáticas parecem ser um gri- agronegócio. Por meio do desenvolvimento
to de alerta dos ecossistemas terrestres pela de estudos de transgênicos de segunda gera-
violência que sofrem no modo de explora- ção, essa rota busca adaptar soja, milho, fei-
ção do capitalismo contemporâneo. O pa- jão, café, mandioca e algumas frutas a altas
drão monopolista desse desenvolvimento ca- temperaturas e ao déficit hídrico.
pitalista traz implicações severas para o uso
do solo e de todos os recursos naturais. O A estratégia da transgenia para as mudanças
uso de químicos, o desmatamento e as die- climáticas, segundo pesquisas da Empresa
tas, baseadas em larga escala no consumo de Brasileira de Pesquisa Agropecuária, a Em-
proteína animal, levam à emissão de GEE, brapa, é a de identificar plantas naturais da
formando um ciclo autodestrutivo. flora brasileira que têm elevada resistência
ao clima seco e quente, delas retirar genes
Diante desse cenário, a agricultura capita- para inseri-los nas espécies produtivas, tor-
lista, atendendo às demandas corporativas, nando-as mais resistentes às mudanças cli-
propõe como “solução” uma receita que é máticas. Exemplo de espécies já identificadas
“mais do mesmo”: no lugar de recuperar as são pau-terra da folha grande, pau-terra da
condições naturais e fazer um novo modelo folha miúda, pacari, faveiro e sucupira preta
de agricultura, propõe-se a adaptar a natu- (IICA, 2008).
reza às mudanças que foram impostas a ela.
Em outra dimensão e escala, encontra-se a
Essa é a narrativa e o caminho da adequação proposta de alterar o conteúdo, o modelo
tecnológica e do uso de transgênicos, um ca- e as práticas da agricultura. Por essa visão,
minho que visa manter a estrutura do mode- a resposta adequada às mudanças climáti-
lo agrícola existente, mas sem modificar suas cas ocorreria pelo retorno a um modelo de
bases de funcionamento. Busca-se encontrar agricultura, que respeite as dinâmicas ecos-
novas tecnologias, que alterem a resistência sistêmicas naturais e se aproveite delas. Seria
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uma agricultura com a natureza, e não uma cologia e Produção Orgânica (Planapo,
agricultura apesar da natureza. 2016-2019), que compreende que as ações
destinadas à disseminação de tecnologias
Nesse campo, os modelos de agricultura or- sustentáveis de manejo da água, do solo e
gânica e de sistemas agroecológicos repre- das florestas, aliadas a práticas de produção
sentam duas alternativas compatíveis com primária e à regularização ambiental, são al-
formas de produção, que possuem baixa ternativas sustentáveis de adaptação às mu-
emissão de GEE e que produzem produtos danças climáticas (MDS, 2016).
in natura ou processados isentos de conta-
minantes. Eles são obtidos em sistemas or- Infelizmente, os recursos financeiros oficiais
gânicos de produção agropecuária ou prove- e as ações públicas de assistência técnica e
nientes de processo extrativista sustentável extensão rural são escassos e deficientes. Re-
e não prejudicial ao ecossistema local, com fletem a baixa prioridade que um modelo de
atenção à reciclagem e às boas práticas de agricultura chamado de “alternativo” recebe
manuseio e processamento. dos órgãos oficiais. Um desafio é fazer com
que os sistemas produtivos agroecológicos
Nos dois casos são permitidos alguns insu- e orgânicos encontrem escala de produção.
mos químicos, chamados de produtos fitos- Existem experiências bem-sucedidas, reali-
sanitários ou químicos de baixo impacto, zadas por agricultores vinculados ao Movi-
definidos pelo Mapa como “produtos fitos-
mento dos Trabalhadores Rurais sem Terra
sanitários com uso aprovado para a agricul-
(MST) em diversas regiões do pais. No Sul,
tura orgânica”. De preferência, buscam uti-
em Minas Gerais e em São Paulo, existem
lizar apenas produtos naturais. O fato é que,
sistemas produtivos agroindustrializados,
em sistemas produtivos nos quais procura-se
com experiência de grande escala. O MST é
preservar a diversidade biológica dos ecossis-
hoje o maior produtor de arroz orgânico da
temas naturais, bem como na recomposição
América Latina. Também existe a experiên-
ou incremento da diversidade biológica dos
cia de produção agroecológica em um mo-
ecossistemas modificados, não apenas ocorre
delo empresarial capitalista, como o desen-
menor emissão de GEE, mas a qualidade dos
volvido na Fazenda da Toca, em São Paulo.
solos e das águas é mantida ou melhorada.
No entanto, o contexto que informa a pro-
A agricultura agroecológica busca, além de
dução agrícola capitalista também informa
uma produção verdadeiramente sustentável,
a indústria, o sistema financeiro e os modos
modificar as relações sociais de produção nas
de vida. Mesmo que houvesse uma mudan-
quais se assenta. Há preocupação com as re-
lações de trabalho, que devem ser baseadas ça no modo de produção agrícola em todo
em parâmetros claros de justiça, dignidade o mundo, optando-se pela agroecologia em
e equidade, independentemente das formas sistemas produtivos locais, por exemplo, di-
de contrato de trabalho. ficilmente haveria alteração rápida na traje-
tória das mudanças climáticas; para isso é
O governo brasileiro está implementando necessário alterar o modo de produção do
a segunda fase do Plano Nacional de Agroe- capitalismo. No ponto em que estamos, esse
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Autores Responsável
Friedrich-Ebert-Stiftung (FES)
A Fundação Friedrich Ebert é uma instituição alemã sem fins lucrativos, fundada em 1925. Leva o
nome de Friedrich Ebert, primeiro presidente democraticamente eleito da Alemanha, e está com-
prometida com o ideário da Democracia Social. No Brasil a FES atua desde 1976. Os objetivos de
sua atuação são a consolidação e o aprofundamento da democracia, o fomento de uma economia
ambientalmente e socialmente sustentável, o fortalecimento de políticas orientadas na inclusão e
justiça social e o apoio de políticas de paz e segurança democrática.