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Universidade Federal de Pernambuco

Centro de Filosofia e Ciências Humanas


Bacharelado em Arqueologia
Arqueologia Histórica
Docente: Scott Allen
Discente: Jhonatta Jeremias

CHARQUEADA E ESCRAVIDÃO EM RIO GRANDE

Beatriz Valladão Thiesen


Claudia Daiane Molet
Marcia Naomi Kuniochi

Recife, junho de 2017


Sumário
• Introdução
• Arqueologia da escravidão
• Metodologia de pesquisa
• A Charqueada do Carreiros
• Considerações finais
• Referências Bibliográficas
Introdução

• Rio Grande abriga o último porto brasileiro, antes da fronteira meridional do Brasil e da entrada do Rio
da Prata. Em função de sua posição geográfica, o comércio e a segurança militar estão na origem de
seu povoamento, sendo possível afirmar que desde a sua fundação, em 1737, a movimentação
portuária e comercial fora uma constante, recebendo inúmeras embarcações e com elas marítimos e
também mercadorias.

Figura 01. Localização de Rio Grande no Rio Grande do Sul


• A partir do final do século XVIII, com a disseminação da indústria do charque, no Rio Grande do Sul, a
economia da região foi consolidaada, dando origem a unidades produtivas escravistas nos moldes
daqueles que caracterizavam a sociedade colonial brasileira: latifúndio, monocultura e mão de obra
escrava. Nesse contexto, a região de Pelotas foi se destacando, tornando-se o centro da produção
charqueadora.

• O produtor de charque necessitava de um maior contingente de escravos para as atividades dessa


indústria. Desse modo, tal pesquisa possibilitará a compreensão do espaço do trabalho bem como as
condições dos escravos, em Rio Grande, local que ainda carece de estudos para o período.
Importante ressaltar que a historiografia considera que o trabalho nas charqueadas foi um dos mais
insalubres.
Arqueologia da escravidão

• Se, por um lado, as pesquisas históricas relacionadas à escravidão possuem larga tradição, por outro,
as investigações arqueológicas neste campo são muito recentes, mesmo considerando o amplo
território americano, no Brasil, o primeiro estudo arqueológico de senzalas, foi publicado somente em
1993.

• Após os anos de 1980 os estudos alteraram esta perspectiva e passaram a focalizar aspectos como o
estudo da produção e comércio de cerâmica artesanal, questões relativas a distinções entre a cultura
material de pessoas escravizadas e não-escravizadas e entre escravos, demarcando identidades
culturais, resistência, e a relação entre etnia, gênero e diferença cultural.

• A importância da arqueologia nos estudos de escravidão está na possibilidade de acrescentar novos


dados que não podem ser vistos nos registros escritos e, portanto, na perspectiva de abrir novas
práticas interpretativas.
Metodologia de pesquisa

• A pesquisa incluiu a realização de um levantamento e pesquisa em documentos históricos, bem como o


estudo das evidências arqueológicas existentes sobre o solo. A coleta de informações orais é
fundamental no sentido de aproximar-se da história do prédio existente e da área ao seu entorno, suas
utilizações, alterações e demais intervenções que possam ter influído nas condições de conservação do
sítio.

• A metodologia empregada para a localização de vestígios materiais sobre o terreno utilizou tanto o
método oportunístico, quanto o método probabilístico (Neves, 1984). A técnica básica é a “tática
pedestre” ou “caminhamento”: a inspeção sistemática da superfície, através de linhas de caminhamento
controladas, de uma unidade de prospecção por uma equipe de pesquisadores. Todos os trabalhos
foram acompanhados de exaustiva documentação, como a elaboração de diários de campo,
documentação gráfica e fotográfica, além de plotagem em carta adequada.
A Charqueada do Carreiros

• Relatos de moradores levaram-nos à “chácara da charqueada”, localizada nas imediações da


Universidade Federal do Rio Grande, no Bairro Carreiros. Uma visita ao sítio, em novembro de 2010,
ofereceu a ocasião de uma inspeção visual da superfície do solo. Este estudo superficial permitiu
registrar alguns indícios de estruturas já suprimidas da paisagem, bem como estruturas ainda
presentes, como é o caso da unidade residencial existente.

• Com a ocupação espanhola, foi impedida a permanência de portugueses no centro da vila, ou nas
proximidades do canal, e o esquema de segurança adotado pelos espanhóis determinou o
assentamento de quatro núcleos de colonos nas suas imediações.
• núcleo da Torotama, que já existira anteriormente, recebeu a maior parte das famílias portuguesas,
formando o Povo Novo.
• núcleo dos paulistas, ao longo do caminho que vai da Vila ao arroio do Taim, O nome do local é
anterior à invasão, e origina-se do principal colono que aí se estabelecera.
• núcleo do Saco da Mangueira, nas proximidades deste local.
• núcleo dos Carreiros, a uma légua da vila.

• A pesquisa na documentação escrita trouxe à tona o inventário de Antônio Martins Freitas,com data
de 1864, onde aparece a descrição de uma charqueada localizada nos Carreiros.
• Não há dúvidas da existência de uma charqueada na área que é alvo desta pesquisa. O espaço
ocupado por ela corresponde ao padrão encontrado por Gutierrez para a instalação das charqueadas:
“A localização seguia dois critérios, a proximidade dos rebanhos de gado e a dos cursos de água
navegáveis, com acesso ao Atlântico, favorecendo, consequentemente, a exportação”.
• Nesta primeira etapa do trabalho arqueológico, nosso objetivo foi procurar localizar as diversas
estruturas que, com a casa principal, comporiam a Charqueada dos Carreiros: galpões, senzala,
graxeira, varal, currais, curra, horta, pomar, cercados.

• A pesquisa foi altamente prejudicada pela existência de grande quantidade de lixo acumulado sobre
o terreno, que inviabilizou a observação direta do solo. Ao mesmo tempo, a atual densidade de
construções, também impediu, um caminhamento mais amplo.
• O inventário contém a lista de escravos a serem
partilhados e a ocupação de cada um, conforme se
pode observar na tabela abaixo:
Esta listagem é altamente significativa, no que tange aos
parâmetros apresentados por
Gutierrez. Segundo ela, a media de escravos por
proprietário era de 84 cativos.

No nosso caso, temos um total de 69 escravos, sendo


que 62,3% são especializados na
produção do charque: 18 carneadores, 7 salgadores. 2
descarnadores, 11 chimangos e 5 graxeiros.

Apesar de não citar o sul do Brasil, dentre as regiões


produtoras, da mesma forma, a
implantação das charqueadas no Rio Grande do Sul, a
partir de 1780, é característico da expansão
da fronteira agrícola, no caso, de derivados de gado.
Considerações finais

• As evidências observadas nos trabalhos de prospecção arqueológica e comparadas com as


informações da documentação encontrada não deixaram dúvidas de que a Charqueada dos Carreiros
enquadra-se no sistema produtivo de produção de charque, conforme consta na literatura sobre o
assunto.

• Todas as evidências apontam para o fato de que parte da elite riograndina compartilhava de modus
operandi semelhante àqueles empregados pelos grandes proprietários das charqueadas pelotenses
no trato escravista com vistas à produção em larga escala. Não restam dúvidas que o trabalho escravo
é parte integrante da formação da sociedade local.

• Tudo isso vem a reforçar a importância da continuidade dos estudos sobre o objeto de pesquisa,
tanto por meio da coleta de relatos de antigos e atuais moradores do entorno, assim como com a
realização escavação estratigráfica
Referências Bibliográficas

• Agostini, C., 1998a, Resistência cultural e reconstrucão de identidades: Um olhar sobre a cultura material dos escravos do século
XIX. Revista de História Regional 3(2):115–137.

• Allen, S.J., 2001, ‘‘Zumbi Nunca Vai Morrer’’: History, the Practice ofArchaeology, and Race Politics in Brazil. Ph.D. dissertation,
Brown University. University Microfilms, Ann Arbor, Michgan. Alvarez Estevez, R., 2001

• Funari, P.P.A, 1995a, The Archaeology of Palmares and Its Contribution to the Understanding of the History of African-American
Culture. Historical Archaeology in Latin America 7:1–41.

• Funari, P.P.A., 1996a, A arqueologia de Palmares e sua contribuição para o conhecimento da história da cultura afro-americana. In
Liberdade por um fio. História dos Quilombos no Brasil, edited by J.J. Reis and F.S. Gomes, pp. 26–51. Companhia das Letras, São
Paulo.

• Funari, P.P.A., 1997, O estudo arqueológico de Palmares e a sociedade brasileira.Africa – Revista do Centro de Estudos Africanos
20/21:93–103.

• Funari, P.P.A., 1998, A arqueologia de Palmares. Sua contribuição para o conhecimento da história da cultura afro-americana.
Studia Africana 9:175–188.

• Gutierrez, Ester J. B. – Negros, charqueadas e olarias: um estudo sobre o espaço pelotense. Pelotas: Ed. Universitária/UFPel, 2001

• Singleton, T. e Souza, M. A. T. Archaeologies of the African Diaspora: Brazil, Cuba, and the United States in: T. Majewski, D.
Gaimster (eds.), International Handbook of Historical Archaeology, Springer ScienceþBusiness Media, 2009. pp. 449 -69

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