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MBEMBE, Achille. Crítica da Razão Negra.

Tradução de Marta Lança. Lisboa: Antígona,


2014.
• Achille Mbembe – filósofo camaronês;
referência no estudo do pós-colonialismo;
• Leitor de Frantz Fannon e Michel Foucault e
pensador de grandes questões da História e da
Política africanas;
• Lecionou em universidades dos Estados Unidos
e África do Sul;
• Crítica da Razão Negra apresenta uma
reflexão do mundo contemporâneo a partir da
experiência negra; apresenta a tese de que a
visão do negro no mundo contemporâneo foi
construída pelo sistema escravista nos
primórdios do colonialismo; a definição de
negro é uma categoria social que se confunde
com os conceitos de escravo e de raça.
Introdução: O devir-negro do mundo
• Para Mbembe, o grande acontecimento, a
experiência fundamental de nossa época é que a
Europa deixou de ser o centro de gravidade do
mundo;
• O pensamento europeu sempre teve a tendência
para abordar a identidade não em termos de
pertença mútua (co-pertença) a um mesmo
mundo, mas antes na relação do mesmo ao
mesmo, de surgimento do ser e da sua
manifestação no seu ser primeiro ou, ainda no
seu próprio espelho;
• Como consequência direta dessa lógica de autoficção,
de autocontemplação e, sobretudo, de
enclausuramento, o Negro e a raça têm significado,
para o imaginário das sociedades europeias, a mesma
coisa;
• Designações primárias, pesadas, perturbadoras e
desequilibradas, símbolos de intensidade crua e de
repulsa, sua aparição no saber e no discurso moderno
sobre o homem (e, por conseguinte, sobre o
Humanismo e a Humanidade) foi, se não simultâneo,
pelo menos paralelo; e, desde o século XVIII,
constituiu, no conjunto, o subsolo (inconfessado e
muitas vezes negado), ou melhor, o núcleo complexo a
partir do qual o projeto moderno de conhecimento –
mas também de governança – se difundiu;
• Portanto, para Mbembe, o Negro e a raça são
duas figuras gêmeas do delírio que a
modernidade produziu;
• A que se deve esse delírio, e quais as suas
manifestações mais elementares?
• Primeiro: o fato de o Negro ser aquele que
vemos quando nada se vê, quando nada
compreendemos e, sobretudo, quando nada
queremos compreender; em qualquer lado onde
apareça, o Negro liberta dinâmicas passionais e
provoca uma exuberância irracional que tem
abalado o próprio sistema racional;
• Em seguida: o fato de que ninguém – nem
aqueles que o inventaram nem os que foram
englobados nesse nome – desejaria ser um negro
ou, na prática, ser tratado como tal;
• Gilles Deleuze: “há sempre um negro, um judeu,
um chinês, um mongol, um ariano no delírio”,
pois aquilo que faz fermentar o delírio são, entre
outras coisas, as raças;
• Ao reduzir o corpo e o ser vivo a uma questão de
aparência, de pele ou de cor, outorgando à pele e
à cor o estatuto de uma ficção de cariz biológico,
os mundos euro-americanos em particular
fizeram o Negro e a raça duas versões de uma
única e mesma figura, a da loucura codificada.
• Funcionando simultaneamente como categoria
originária, material e fantasmagórica, a raça tem
estado, no decorrer dos século precedentes, na
origem de inúmeras catástrofes, e terá sido a
causa de devastações físicas inauditas e de
incalculáveis crimes e carnificinas;
• Três momentos decisivos:
• O primeiro foi a espoliação organizada quando,
em proveito do tráfico atlântico (sec. XV ao XIX),
homens e mulheres originários de África foram
transformados em homens-objeto, homens-
mercadoria e homens-moeda;
• Aprisionados no calabouço das aparências,
passaram a pertencer a outros, que se
puseram hostilmente a seu cargo, deixando
assim de ter nome e língua própria;
• Apesar de a sua vida e o seu trabalho serem a
partir de então a vida e o trabalho dos outros,
com quem estavam condenados a viver, mas
com quem era interdito ter relações co-
humanas, eles não deixariam de ser sujeitos
ativos;
• O segundo momento corresponde ao acesso à
escrita e tem início no final do século XVIII,
quando, pelos seus traços, os Negros, esses
seres-capturados-pelos-outros, conseguiram
articular uma linguagem para si, reivindicando o
estatuto de sujeitos completos do mundo vivo;
• Tal período, pontuado por inúmeras revoltas
escravos, pela independência do Haiti em 1804,
por combates pela abolição do tráfico de
escravos, pelas descolonizações africanas e lutas
pelos direitos cívicos nos Estados Unidos, viria a
completar-se com o desmantelamento do
apartheid nos últimos anos do século XX;
• O terceiro momento (início do século XXI) refere-
se à globalização dos mercados, à privatização do
mundo sob a égide do neoliberalismo e do
intrincado crescimento da economia financeira,
do complexo militar pós-imperial e das
tecnologias eletrônicas e digitais;
• Mbembe define o neoliberalismo como uma fase
da história da Humanidade dominada pelas
indústrias do Silício (parte Sul da Baía de São
Francisco, onde estão localizadas as principais
empresas de start-ups e empresas globais de
tecnologia, como Apple, Facebook, Google) e
pelas tecnologias digitais;
• O neoliberalismo é a época ao longo do qual o
tempo (curto) se presta a ser convertido em força
reprodutiva da forma-dinheiro;
• O neoliberalismo baseia-se na visão segundo a
qual todos os acontecimentos e todas as
situações do mundo vivo podem deter um valor
de mercado;
• Esse movimento também se caracteriza pela
produção da indiferença, a codificação paranóica
da vida social em normas, categorias e números,
assim como numerosas operações de abstração
que pretendem racionalizar o mundo a partir de
lógicas empresariais;
• Assombrado por seu duplo funesto, o capital,
designadamente o financeiro, define-se agora
como ilimitado, tanto do ponto de vista dos
seus fins como de seus meios;
• Já não dita seu próprio regime de tempo; uma
vez que se encarregou da fabricação de todas
as relações de filiação, procura multiplica-se
por si mesmo numa infinita série de dívidas
estruturalmente insolúveis;
• Já não existe trabalhadores propriamente
ditos; já só existem nômadas (plural de
nômada, sem trabalho fixo, itinerante) do
trabalho;
• Se, ontem, o drama do sujeito era ser
explorado pelo capital, hoje, a tragédia da
multidão é já não poder ser explorado de
todo, é ser objeto de humilhação numa
humanidade supérflua, entregue ao
abandono, que já nem é útil ao
funcionamento do capital;
• Tem emergido uma forma inédita de vida
psíquica apoiada na memória artificial e
numérica e em modelos cognitivos provindos
das neurociências e da neuroeconomia;
• Com isso, se origina a ficção de um novo ser
humano, “empresário de si mesmo”, plástico e
convocado a reconfigurar-se
permanentemente em função dos artefatos
que a época oferece;
• Este novo homem, sujeito do mercado e da
dívida, é uma “espécie abstrata sempre
pronta” (Hegel), capaz de se vestir de todos os
conteúdos, é um produto da civilização da
imagem e das novas relações que se
estabelece entre os fatos e as ficções;
• Apenas um entre outros animais, este ser não
possui nenhuma essência própria a proteger
ou salvaguardar;
• Não tem, a priori, nenhum limite para a
modificação de sua estrutura biológica e
genética;
• Distingue-se, em vários aspectos, do sujeito
trágico e alienado da primeira
industrialização;
• Em primeiro lugar, é um indivíduo aprisionado
em seu desejo; a sua felicidade consiste quase
inteiramente da capacidade de construir
publicamente sua vida íntima e de oferecê-la
num mercado como produto de troca;
• Sujeito neuroeconômico absorvido pela dupla
inquietação exclusiva de sua animalidade (a
reprodução biológica de sua vida) e da sua
coisificação (usufruir dos bens desse mundo),
este homem-coisa, este homem-máquina, este
homem-código, este homem-fluxo, procura
regular a sua conduta em função das normas
de mercado, sem hesitar em se auto-
instrumentalizar e instrumentalizar outros
para otimizar sua quota-parte de felicidade;
• Condenado à aprendizagem para toda a vida, à
flexibilidade, ao reino do curto prazo, abraça a
sua condição de sujeito solúvel e descartável para
responder a injunção que lhe é constantemente
feita – tornar-se outro;
• Enquanto construção social, negro é um conceito
que designa a imagem de uma existência
subalterna e de uma humanidade castrada;
• Essa percepção econômica da questão racial tem
início na fase mercantilista do capitalismo
(quando o negro é transformado em mercadoria)
e perdura no neoliberalismo. O termo “negro” foi
inventado para significar exclusão e em momento
algum esteve dissociado da categoria de escravo;
• Para Mbembe, uma vez que raça não existe enquanto
fato natural físico, antropológico ou genético, seria, na
verdade, a redução do corpo e do ser vivo a uma
questão de aparência, de pele ou de cor,
desempenhando, assim, um papel fundamental no
movimento que transforma a pessoa humana em
coisa, objeto ou mercadoria;
• Contraditório em sua essência, o conceito de raça
apazigua odiando, mantendo o terror e praticando
aquilo que Mbembe chamou de alterocídio – a
constituição do outro não como semelhante a si
mesmo, mas como objeto intrinsecamente ameaçador,
do qual é preciso proteger-se, desfazer-se, ou destruir
(quando não se pode controlar).
A raça no futuro
• Sendo o Negro e a raça duas figuras centrais
(ainda que negadas) do discurso euro-
americano sobre o “homem”, será possível
pensar que a desclassificação da europa e a
sua consequente inscrição como simples
província do mundo representaria o fim do
racismo?
• Ou o racismo vai se reconfigurar numa nova
linguagem acerca da “espécie”?
• O nome Negro libertou, durante muito tempo,
uma extraordinária energia, ora como veículo de
instintos inferiores e forças caóticas, ora como
signo luminoso da possibilidade de redenção do
mundo e da vida num dia de transfiguração;
• O Negro assinalava uma multiplicidade de
experiências históricas desoladoras, a realidade
de uma vida vazia; o assombramento, para
milhões de pessoas apanhadas nas redes de
dominação da raça, de verem funcionar seus
corpos e pensamentos a partir de fora, e de
terem sido transformadas em telespectadores de
qualquer coisa que era e não era a sua própria
vida;
• Produto de uma máquina social e técnica
indissolúvel do capitalismo, da sua
emergência e globalização, o nome Negro foi
inventado para designar exclusão,
embrutecimento e degradação, ou seja, um
limite sempre conjurado e abominado;
• Humilhado e profundamente desonrado, o
Negro é, na ordem da modernidade, o único
de todos os humanos cuja carne foi
transformada em coisa, e o espírito, em
mercadoria – a cripta viva do capitalismo;
• Mas – e essa é a dualidade vista por Mbembe – o
Negro, numa reviravolta espetacular, se tornou o
símbolo de um desejo consciente de vida, força
pujante, flutuante e plástica, plenamente
engajada no ato de criação e até de viver em
vários tempos e várias histórias ao mesmo
tempo;
• Alguns não hesitariam em ver no negro o lado da
terra, o nervo de vida através do qual o sonho de
uma Humanidade reconciliada com a natureza,
ou mesmo com a totalidade do existente,
encontraria novo rosto, voz e movimento;
Questão do livro

• Se o Negro conseguir sobreviver àqueles que o


inventaram, e se, numa reviravolta que a
história guarda segredo, toda humanidade
subalterna se tornar negra, que riscos
acarretaria um devir negro no mundo a
respeito da universal promessa de liberdade e
de igualdade de que o nome Negro terá sido o
signo manifesto no decorrer do período
moderno?
Cap. 1: A questão da raça
• Crítica à razão negra: por este termo, se
designa coisas como: “imagens do saber”;
“um modelo de exploração e depredação”;
“um paradigma da submissão e das
modalidades de sua superação”; “um
complexo psiconírico” (isto é, um adjetivo que
faz referência aos sonhos, às fantasias e ao
que não pertence ao mundo real; óneiros, na
etimologia grega, significa sonho).
• A razão negra – “uma espécie de enorme
jaula”, que abriga uma complexa rede de
desdobramentos, de incertezas e de
equívocos – tem a raça como enquadramento;
• A raça será um complexo perverso, gerador
de medos e de tormentos, de problemas do
pensamento e de terror, mas, sobretudo, de
infinitos sofrimentos e, eventualmente, de
catástrofes;
• A raça é o que se apazigua odiando, mantendo
o terror, praticando o alterocídio, isto é, a
constituição do Outro não como semelhante a
si mesmo, mas como objeto intrinsecamente
ameaçador, do qual é preciso proteger-se,
desfazer-se, ou que, simplesmente, é preciso
destruir, devido a não conseguir manter o seu
controle total;
• A raça também é, nas palavras de Frantz Fanon, o
nome que deve dar-se ao ressentimento amargo,
ao irrepreensível desejo de vingança, isto é, à
raiva daqueles que lutaram contra a sujeição e
foram, não raramente, obrigados a sofrer um
sem-fim de injúrias, todos os tipos de violações e
humilhações e inúmeras ofensas;
• A raça não existe como fato natural físico,
antropológico ou genético; a raça não passa de
uma ficcão útil, de uma construção fantasiosa ou
de uma projeção ideológica cuja função é desviar
a atenção de conflitos antigamente entendidos
como mais verossímeis: a luta de classes ou a luta
de sexos, por exemplo.
• A raça aparece como a redução do corpo e do
ser vivo a uma questão de aparência, de pele
ou de cor, desempenhando, assim, um papel
fundamental no movimento que transforma a
pessoa humana em coisa, objeto ou
mercadoria;
• Na sua ávida necessidade de mitos destinados
a fundamentar o seu poder – por exemplo, o
mito da superioridade racial –, o hemisfério
Ocidental considerava-se o centro do globo, o
país natal da razão, da vida universal e da
verdade da Humanidade;
• Sendo o bairro mais civilizado do mundo, só o
Ocidente inventou o “direito das gentes”; só
ele conseguiu edificar uma sociedade civil das
nações, compreendida como um espaço
público de superioridade de direitos; só ele
deu ideia de ser humano com direitos com
direitos civis e políticos, permitindo-lhe
desenvolver os poderes privados e públicos
como pessoa, como pessoa que pertence ao
gênero humano e, enquanto tal, com tudo o
que é humano;
• O Ocidente – só ele – codificou um rol de
costumes, aceites por diferentes povos, que
abrangem os rituais diplomáticos, as leis da
guerra, os direitos de conquista, a moral pública e
as boas maneiras, as técnicas de comércio, de
religião e de governo;
• O Resto – figura, se o for, do dissemelhante, da
diferença e do puro negativo – constituía a
manifestação por excelência da “existência
objetal”; a África, de modo geral, e o Negro, de
modo particular, eram apresentados como os
símbolos acabados desta vida vegetal e limitada;
• O Negro era o exemplo total deste ser-outro,
fortemente trabalhado pelo vazio, e cujo
negativo acabava por penetrar todos os
momentos da existência;
• Hegel dizia, a propósito de tais figuras (os
Negros), que elas eram estátuas sem
linguagem nem consciência de si, entidades
humanas incapazes de se despir de vez da
linguagem animal com que estavam
misturadas; no fundo, era de sua natureza
albergar o que já estava morto;
• Essas figuras eram as marcas dos povos
isolados e não sociáveis, que combatiam
odiosamente até à morte, se desfaziam e se
destruíam como animais – uma espécie de
humanidade com vida vacilante e que, ao
confundir tornar-se humano com tornar-se
animal, tem para si uma consciência, afinal,
“desprovida de universalidade”;
• Outros, mais bondosos, admitiam que estas
entidades não eram totalmente desprovidas
de toda humanidade;
• Vivendo adormecida, esta humanidade não se
tinha ainda engajado na aventura da “lonjura
sem regresso”; era, no entanto, possível elevá-
la até nós, sem com isso termos o direito de
abusar de sua inferioridade;
• Pelo contrário, deixávamo-nos guiar por um
dever – o de guiá-la e protegê-la; assim se
justificava a empresa colonial como obra
fundamentalmente “civilizadora” e
“humanitária”, cuja violência, seu corolário,
era apenas moral;
• Na maneira de pensar, imaginar e classificar os
mundos distantes, o discurso europeu, tanto o
erudito quanto o popular, foi recorrendo a
processos de efabulação;
• ao apresentar como reais, certos ou exatos,
fatos muitas vezes inventados, foi-lhe
escapando a coisa que tentava apreender,
mantendo com esta uma relação
fundamentalmente imaginária, mesmo
quando a sua pretensão era apenas
desenvolver um conhecimento a dá-la a
conhecer objetivamente;
• Porém, as características principais dessa relação
imaginária estão ainda bem longe de serem
esclarecidas; mas os processos graças aos quais o
trabalho de efabulação se avolumou, assim como
as consequências de sua violência, são,
atualmente, bem conhecidas: a África e o Negro;
• Se existe objeto e lugar onde essa relação
imaginária e a economia ficcional que a sustenta
são dadas a ver de um modo mais brutal, distinto
e manifesto, é exatamente esse signo ao qual se
chama Negro e o não-lugar a que chamamos
África e cuja característica é não ser um nome
comum, e muito menos um nome próprio, mas o
indício de uma ausência de obra;
• A transnacionalização da condição negra
(comércio de escravos para trabalharem na
agricultura, venda de escravos etc.) é,
portanto, um momento constitutivo da
modernidade, sendo o Atlântico seu lugar de
incubação;
• Entre 1776 e 1825, a Europa perde grande
parte de suas colônias americanas, devido a
uma série de revoluções, movimentos de
independência e rebeliões;
• Com a ruína das estruturas imperiais do
mundo atlântico, e a sua consequente
substituição pelos Estados-nações, as relações
entre as colônias e as metrópoles sofreriam
alterações; uma nova classe de crioulos vai ser
implantada;
• as noções de heterogeneidade, diferença e
liberdade são ressuscitadas, enquanto as
novas elites se apropriam da ideologia da
mestiçagem para negar e desvalorizar a
questão racial;
• A contribuição dos Afro-latinos e dos escravos
negros para o desenvolvimento da América do
Sul será apagada ou severamente ocultada;
• Sobre a classificação das raças:
• A primeira delas, levada a cabo por Georges-
Louis Buffon (naturalista e matemático
francês), se deu num ambiente cuja linguagem
acerca do mundo dos outros era construída a
partir dos preconceitos mais ingênuos e
sensualistas, e formas de vida muito
complexas são trazidas à pura simplicidade –
momento gregário do pensamento Ocidental;
• Nele, o Negro é representado como o
protótipo de uma figura pré-humana incapaz
de superar sua animalidade, de se
autoproduzir e de se erguer à altura de seu
deus;
• Fechado em suas sensações, têm dificuldade
de quebrar a cadeia de suas necessidades
biológicas, razão pela qual não chega a moldar
o seu mundo e a conceber a si mesmo uma
forma verdadeiramente humana;
• O momento gregário do pensamento Ocidental
será aquele ao longo do qual, ajudado pelo
instinto imperialista, o ato de captar e de
apreender ir-se-á progressivamente desligando
de qualquer tentativa de conhecer a fundo aquilo
que se fala;
• A Razão na História, de Hegel, representa o ponto
culminante desse momento gregário; durante
vários séculos, o conceito de raça, que sabemos
advir, de início, da esfera animal, foi útil, antes de
mais nada, para nomear as humanidades não
europeias;
• O que nós chamamos de “estado de raça”
corresponde a um estado de degradação da
natureza ontológica, na medida em que a
noção de raça permite que se representem as
humanidades não europeias como sendo um
ser menor, um reflexo pobre do homem ideal
de que estavam separadas por um intervalo
de tempo intransponível, uma diferença
praticamente insuperável;
• O Negro, por sua vez, não existe enquanto tal;
ele é produzido constantemente: produzir o
Negro é antes produzir um vínculo social de
submissão e um corpo de exploração, isto é,
um corpo inteiramente exposto à vontade de
um senhor, e do qual nos esforçamos para
obter o máximo de rendimento;
• O Negro é também nome de injúria, o símbolo
do homem que enfrenta o chicote e o
sofrimento num campo de batalha em que se
opõem sociorracialmente segmentadas;

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