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A ordem das disciplinas 20 anos depois

UFRGS – FACED – PPG-Educação - Seminário Especial – 2016-2


Cronograma: 25/8 - 8/9 - 15/9 - 22/9 - 29/9 1 crédito
Horário: 16:00 18:45

Objetivos:
Criar um espaço acadêmico para discutir o processo de elaboração de uma
dissertação e de uma tese, tomando A ordem das disciplinas para uma análise
crítica, de modo a apontar seus pontos fortes e fracos. Ao mesmo tempo, apresentar
e discutir questões educacionais envolvidas com as disciplinas.

Súmula/ementa:
Dissertação de Mestrado e Tese de Doutorado. Análise crítica de A ordem das
disciplinas. O movimento pela interdisciplinaridade no Brasil. Genealogia da
disciplinaridade. Escola moderna. Disciplina e controle.

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A ordem das disciplinas 20 anos depois

Programa:
 Dissertação de Mestrado e Tese de Doutorado em Educação: diferenças,
modalidades, formatos, abrangências, focos.
 Análise crítica de A ordem das disciplinas: um rio e suas margens; entre a seca e a
enchente; transbordamentos.
 O movimento pela interdisciplinaridade no Brasil: transposição cultural e
pedagógica, limites.
 Genealogia da disciplinaridade.
 Escola moderna; sujeito.
 Disciplina, controle (para além do lugar-comum). Dispositivos de segurança.

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A ordem das disciplinas 20 anos depois

Procedimentos e/ou critérios de avaliação:


Participação ao longo do Seminário e/ou apresentação de uma pequena
monografia sobre questão tratada durante o Seminário.

Bibliografia:
BEAUD, Michel. A arte da tese. São Paulo: Bestbolso, 2014.
ECO, Humberto. Como se faz uma tese? São Paulo: Perspectiva, 2014.
VEIGA-NETO, Alfredo. A ordem das disciplinas. Porto Alegre: PPG-Educação/UFRGS,
1996.
VEIGA-NETO, Alfredo. Mais dicas... In: VEIGA-NETO, Alfredo et al. Pesquisas em
Educação: experimentando outros modos investigativos (Coleção Cadernos
Pedagógicos da EaD). Rio Grande: FURG, 2013. p. 25-40.

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Dissertação e tese em Educação


Não há um critério único a partir do qual se possa traçar uma distinção
segura entre dissertação e tese. Mesmo assim, pode-se dizer que uma
tese é um documento de fôlego e perfil mais amplos do que uma
dissertação; em geral, tem extensão maior. Quase como regra: na
dissertação, o autor deve mostrar sua capacidade em pesquisa; na tese,
além disso, o autor deve estabelecer ou propor um ou mais problemas,
traçar hipótese(s) e tratar de comprová-la(s).

Na tese e na dissertação, deve-se seguir as 4 regras óbvias de Eco:


1. O tema deve ser do interesse do autor.
2. As fontes (empíricas e de consulta) devem ser acessíveis.
3. As fontes devem ser compreensíveis para o autor.
4. A janela teórico-metodológica deve estar ao alcance do autor.
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Dissertação e tese em Educação


Dadas as semelhanças entre dissertações e teses, a partir daqui as
discussões tratarão de teses.

“Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa”

Assim, uma coisa é uma Tese em Ciências Naturais e outra coisa é uma
Tese em Ciências Humanas. As diferenças se dão na circunscrição do
tema, problemas, metodologia utilizada, abrangência dos resultados
etc.

Por quê?

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Perspectivas e desafios da pesquisa em Educação

A pesquisa nas duas “culturas” . . .


Ciências Naturais hard-sciences
Matemática

Ciências Humanas soft-sciences


Filosofia

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Perspectivas e desafios da pesquisa em Educação

“Efeitos” das diferenças


Como as Ciências Naturais e boa parte da Matemática são forte e
facilmente paradigmáticas, a pesquisa se dá como uma montagem
de quebra-cabeça (Thomas Kuhn). Assim, basta anunciar o
paradigma em que se insere uma pesquisa, para que os iniciados
logo saibam onde ela se situa, conheçam seus pressupostos, seus
problemas, seus métodos principais etc. As comunicações,
publicações, teses e dissertações podem ser mais sintéticas e curtas.

Como as Ciências Humanas e a Filosofia são fracamente (ou não


são) paradigmáticas, cada pesquisa tem características muito
próprias, em termos de teorias às quais se vincula, pressupostos,
problemas a resolver, métodos etc. Por isso, as comunicações,
publicações, teses e dissertações são, em geral, mais detalhadas,
longas, analíticas, “explicadinhas” etc.
Perspectivas e desafios da pesquisa em Educação

“Efeitos” das diferenças


A guerra das duas culturas
A guerra das duas culturas se dá tanto nos planos epistemológico e
simbólico, quanto nos planos práticos e materiais.

Assim, entre ambas culturas há fortes diferenciais nos prestígios


conferidos, verbas distribuídas, prêmios outorgados, composição
dos conselhos diretivos, imposição de sentidos (sobre o que é
Ciência, o papel social da Ciência e do cientista etc.).

Qualquer avaliação e discussão sobre a Educação (ou outra área do


conhecimento e da atividade humana) tem de levar em conta tais
diferenças. Infelizmente, isso dificilmente é assim . . .
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Perspectivas e desafios da pesquisa em Educação

Um “infelizmente” interno
O campo da pesquisa educacional ainda está amplamente ligado ao
megaparadigma das Filosofias da Consciência. Trata-se de uma ligação
que trava o pensamento.
Para compreender tal ligação, é preciso examinar as origens da
Pedagogia Moderna.

A Pedagogia Moderna nasceu, no séc. XVII a partir de duas tradições:


- neoplatônica (via Renascimento)
- judaico-cristã (via cristianismos tradicional e reformado)

Ambas tradições estão fundadas nas Filosofias da Consciência.

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Perspectivas e desafios da pesquisa em Educação

Os dois megaparadigmas
 Filosofias da Consciência
Necessitaristas – Contingência como função da necessidade
Representacionais – o ideal e as cópias do ideal
Dualistas, metafísicas – dois mundos: ideal e sensível

 Filosofias da Prática
Contingentes – o único a priori é histórico
Não-representacionais – tudo é representação, tudo é cópia
Monistas, pós-metafísicas – tudo é deste mundo, tudo está aqui
Perspectivas e desafios da pesquisa em Educação

Os 3 anti das Filosofias da Prática


 
 Representacionismo (como manifestação do Realismo)

 Essencialismo

 Fundacionismo
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Evitar as confusões conceituais


Tese tese

erudição falta de clareza


Humanidade humanidade
de modo algum de algum modo

veemência arrogância
humildade coitadismo

representação representação (as palavras não falam por si)


material corpus objeto
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Virada linguística, virada epistemológica; diferença e repetição

Materialidade Realidade
O fato de que o sentido seja dado pela linguagem não implica que a
realidade se reduza à linguagem.

Realidade = materialidade com sentido (“linguageiro”)


Assim, há uma materialidade cuja relação com a linguagem é
imanente; desse modo, a própria linguagem é também da ordem da
materialidade. O discurso não é uma abstração exterior à realidade;
ele tem materialidade.

Tudo é diferença. A repetição é construída.


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A questão da realidade
nem materialismo tosco, nem idealismo tosco
mas . . .
sentido (pela linguagem)

Relação

de realidade
imanência

materialidade
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Virada linguística, virada epistemológica; verdade e relativismo


“Não basta aprender o que tem de se dizer em todos os casos sobre um
objeto, mas também como devemos falar dele. Temos sempre de
começar por aprender o método de o abordar”.
(Wittgenstein)

“A maior inimiga da verdade não é a mentira, mas a convicção”. “As


verdades são mitos que se esqueceram que o são” (Nietzsche).
“A verdade é deste mundo” (Foucault).
A noção bachelardiana de “regionalidade da epistemologia” e o
princípio kuhniano da “inseparabilidade entre método e teoria”
desuniversalizaram os conceitos de método e teoria, na medida em
que, respectivamente, método e teoria são sempre referentes a um
campo de saberes ou estão sempre circunscritos a algum paradigma.
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Tipologia
• Quanto ao foco, há 3 “tipos” de teses:
monográficas/pontuais
panorâmicas
mistas

• Em relação à empiria , há 2 “tipos” de teses:


exclusivamente teóricas (não empíricas)
acentuadamente empíricas (sempre com teoria subjacente)

logo . . .

• Não há tese – assim como não há pesquisa – que não tenha uma ou
mais teorias subjacentes, explícitas ou não. E é absolutamente
necessário sempre explicitá-la(s).
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Um rio e suas margens; entre a seca e a enchente;


transbordamentos
• “Tese sulco” ou “Tese espraiamento”?
ou ambos?

• Entre o “enxuto” e o “encharcado”


no texto e nas abordagens/discussões
cuidado com a literatice e o esnobismo

• Transbordamentos: que são? onde? quando? o quanto?


cuidado com o eruditismo

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Pontos de partida e dicas


- Começar pelo título?
- Esboçar um esquema geral e tomá-lo como bússola, mas sempre
aberto a “correções de rota”; se for preciso, rejeitar o esquema.
- Não esperar por “momentos de inspiração”.
- Evitar sempre o “deixar para amanhã”.
- Tudo dá trabalho, tudo é difícil, tudo toma tempo.
- À medida que vai escrevendo, colocar as referências de modo
completo.
- Anotar anotar tudo o que vem à cabeça; anotar as sugestões do
orientador e de terceiros; anotar sempre!
- Não desprezar trechos já escritos mas que não serão incorporados.
Criar uma pasta de “rejeitos”; eles poderão ser úteis no futuro, ou
para a versão final da Tese ou para outras publicações. (Lavoisier)
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Precauções genéricas
O quanto antes, deixar claro qual é a tese principal da Tese.
Estar sempre atento para a questão do “quem fala?”. Eu é diferente de
minha bibliografia, de meu leitor, de meus dados empíricos, de meu
orientador etc. Assim, nunca assumir a autoria daquilo de que não se é
autor e, principalmente, daquilo com o que não se concorda. Fora isso,
sempre assumir a autoria!
Tudo o que chamamos de realidade resulta da combinação entre uma
materialidade externa e os sentidos e representações que conferimos a
tal materialidade. E os sentidos e as representações são sempre
produzidos na combinação entre a memória e um intrincado e imenso
conjunto de símbolos e códigos que aprendemos pela educação; eles
compõem a cultura na qual estamos imersos. Por que isso é
importante?
Porque tais códigos se organizam segundo uma “gramática profunda”,
cuja emersão se faz pela linguagem que, por sua vez, vem “à tona” na
forma de um discurso cujo conjunto de normas, regras gramaticais e
princípios enunciativos obedecem a uma ordem.
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Fontes, citações e rodapés


fontes: - primárias
- secundárias – literatura crítica

- primeira mão
- segunda mão – apud

citações: - diretas, literais, ou ipsis littĕris


- indiretas ou comentadas

rodapés: - pequenas explicações, dicas e sugestões


- cuidar para não adquirirem “vida própria”, constituindo um
segundo documento
(ver Umberto Eco, p. 161)
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Armadilhas
• Quem fala? Quem disse?
• Não citar as fontes para conhecimentos triviais.
• Evitar tanto a falsa modéstia quanto a arrogância.
• Manter a coerência interna é mais importante do que seguir as
normas externas.
• O tempo é nosso inimigo.
• Trate bem seu equipamento (textos, computador, anotações).
• Na dúvida, não ultrapasse, seja sóbrio, temperado e contido. Afinal,
quase sempre, o menos é mais.
• Trabalhar 3 horas por dia durante 5 dias é muito melhor do que
trabalhar 15 horas num único dia.
• O ótimo é inimigo do bom.
Dicas
a. A apresentação não é uma aula. Principalmente numa defesa de Tese,
deve-se abandonar pretensões pedagógicas (querer ensinar o público).
b. A apresentação pode ser lida ou de improviso (improviso mesmo não
existe, pois todos sempre se programam antes...). No caso de ler um texto,
faça uma leitura calma, em voz alta, bem postada, ritmada, procurando
(sempre que possível) olhar para o público. Tomar água, na metade do
caminho, ajuda muito.
c. A banca já leu o trabalho. Logo, a apresentação não é para a banca, mas
principalmente para o público. A apresentação pode ser vista muito menos
como uma festa e muito mais como uma prestação pública de contas dos
recursos e esforços investidos na pesquisa.
d. Pode-se aproveitar a oportunidade e fazer algumas explicações
complementares e correções para a banca. Depois de tudo impresso,
sempre surgem correções, acréscimos etc. Esse é um trabalho infinito.
e. Na apresentação, deve-se usar no máximo 30 minutos; o público começa a
cansar e a desviar a atenção depois de 20 minutos. E a banca já conhece seu
trabalho.
f. A apresentação deve ser sóbria, técnica, cordial e leve: evitar palavrório
derramado demais, frases longas demais, agradecimentos demais.
g. Sempre é bom avisar os “não-habituados” a tais sessões: não se deve
aplaudir a apresentação! Aplausos (se houver...), só ao término da sessão.
Mas se algum desavisado “puxar as palmas”, paciência...
h. Se a apresentação for lida, a preparação do texto deve obedecer aos
seguintes parâmetros: cada página A4, com margens de 2,5 cm, espaço 1,5,
fonte TimesNew Roman 12, leva 3 minutos para ser lida. Cada página tem de
30 a 33 linhas; demora-se 1 minuto para ler cada 10 linhas. Logo, 10 páginas
demoram 30 minutos para serem lidas, num ritmo cadenciado e numa voz
clara. Use tais medidas na preparação do texto; depois, para lê-lo, imprima
na fonte e tamanho que quiser. Sempre é bom numerar as páginas e
grampeá-las, pois páginas soltas ganham vida e se deslocam sozinhas, fogem
da mesa, se escondem em locais misteriosos.
i. Na preparação/ensaio: se for cronometrar a leitura, não leia em voz
baixa!!! A diferença de tempo entre uma leitura em voz baixa e uma leitura
em voz alta é grande.
j. Se usar power-point, seja muito parcimonioso: os slides servem de apoio e
não devem, sob nenhuma hipótese, concorrer com o discurso ao vivo. Em
geral, o menos é mais...
k. Se um slide contém material que não vai ser referido, explicado ou lido, ele
é completamente dispensável. Em geral, o menos é mais...
l. Slides com muita informação não servem para nada. Em geral, o menos é
mais...
m. Mais de 6 slides em 30 minutos, em geral é sinal de perigo à vista. Claro
que isso dependerá do caráter do trabalho (se ele trata da análise de
imagens, se há fotos, tabelas e gráficos necessários ao entendimento etc.).
Em geral, o menos é mais...
n. Os slides não devem ser feios, mas também não devem ser rebuscados,
animados demais, enfeitados demais, coloridos demais. Em geral, o menos é
mais...
o. Escolha sempre fontes legíveis e cores contrastantes. Fontes sem serife
são mais garantidas; não use script. Gótica? Nem pensar! Letras verdes sobre
fundo roxo (ou vice-versa) dá sempre errado! Lembre-se daqueles contratos
comerciais que, para nos enrolar, usam letras minúsculas cor-de-rosa sobre
fundo verde; fica tudo dançando... Letras brancas sobre fundo preto (ou vice-
versa) dá sempre certo! E não esqueça que projetores com lâmpadas
cansadas mudam tragicamente as cores dos nossos slides...
p. Cortam-se antes os excessos de qualquer natureza (para não ter de cortar
no dia...).
q. Em caso de dúvida, seja minimalista. Em geral, o menos é mais...
r. Em caso de ensaios, NÃO seja minimalista, pois ensaios nunca são em
excesso. Nos ensaios, o muito é sempre pouco e o mais é sempre menos.
s. Chorar não ajuda; só atrapalha.
t. Regra de ouro: frente ao público, quase sempre o menos é mais...
u. Regra de platina: Evite o ridículo!
Primeira
Murphy: (e
puder dar1977, — magnífica...)
“Se
errado, alguma Lei
coisa
dará” (Bloch, de
p. 21).
Leis (muito)
trabalho”.
Corolário 1: —gerais:
“O “Tudo
que — é “Tudo dá
difícil”.
parece fácil
será difícil;
Corolário o que parece
dificílimo”.
2: “Desista difícil
do que será
parece dificílimo”.
 — “Tudo
Corolário: toma tempo”.
inimigo”. é nosso
“O tempo
— “Nada
parece”
Corolário: é tão
(Bloch,
Tudo fácil
1977, quanto
p. 21).
não teméde fácil para quem
fazer.
— “Por quê?(Fernandes,
pretensão” É435).
filosofia. Porque
1994, é
p.
Corolário:do
Corolário “Pergunte
corolário:
sempre”. sempre”.
“Duvide
Corolário
“Duvide
Corolário do
do corolário
até de você
corolário do
do corolário:
mesmo”.
corolário
do corolário:
deste livro, desta Tese”.texto,
“Duvide deste
— “Não há nada mais equivocado do que a certeza”.

— “A verdade é filha do tempo e obra do Homem” (Stein, 1981, p. 47)


Corolário 1: “A verdade existe”.
Corolário 2: “A verdade é deste mundo” (Foucault, 2001, p. 112).
Corolário 3: “A verdade é inseparável do processo que a estabelece”.
Corolário 4: “Tenha muito cuidado com a verdade”.

— “A maior inimiga da verdade não é a mentira, mas a convicção”


(Nietzsche).

— “Em muitos ambientes acadêmicos e na high society, mais vale 1


grama de aparência do que 1 quilo de desempenho”.
Corolário do corolário: “Na Sociedade do Espetáculo, sempre vence o
maior e mais descarado marqueteiro”.
— “Convite para enterro não deve ser feito por e-mail”.
Escólio: “O morto não espera”.
— “Entre chegar atrasado ou sair mais cedo, prefira a segunda alternativa”.
Escólio: “Os franceses inventaram a saída à francesa, mas ninguém ainda
inventou um modo elegante de chegar atrasado”.
— “Qualquer reunião tem seu timing próprio”.
Corolário 1: “O bom coordenador de uma reunião sabe, entre outras coisas,
que precisa ter MUITA paciência”.
Corolário 2: “Numa reunião de 120 minutos, 80% dos assuntos importantes
são tratados nos 10 minutos finais”.
— O dicionário é o único lugar em que o sucesso vem antes do trabalho.
— “É incrível. Quanto mais trabalho, mais sorte tenho”.
— “Todo fio cortado no tamanho indicado será curto demais”.
— “Todo fio deixado cuidadosamente enroladinho numa gaveta, no dia
seguinte estará completamente cheio de nós e enleado em si mesmo”.
— “Tenha mais dúvidas e menos certezas”
Projetos de pesquisa
— “Se um projeto de pesquisa não vale a pena, não vale a pena ser bem
feito”.

— “Qualquer projeto que termine com 60% realizado é um milagre”.

— “O ótimo é inimigo do bom” (Adágio popular).


Corolário: “Um bom plano hoje é melhor do que um plano perfeito amanhã”.

— “A montanha fica mais íngreme à medida que você avança na escalada”.


Corolário: “O cume sempre parece mais próximo do que realmente está”.

— “Nenhuma experiência é um fracasso completo — ela sempre pode servir


como um exemplo negativo”
Contraponto: “Mesmo assim, prefira sempre os exemplos positivos”.

— “Um quilo de aplicação vale uma tonelada de meditação”.


Corolário: “Não fique parado, pensando que ‘ficar pensando’ é grande coisa.
Vá logo trabalhar!”.
Projetos de pesquisa
— “Um projeto não deve começar pela escolha das ferramentas”.
Corolário1: “Não é a sofisticação da ferramenta que determina se ela é
adequada à tarefa que você tem pela frente”.
Corolário 2: “Antes de pegar um alicate, examine se a tarefa não é apenas
pregar um prego”.
Contraponto: “De qualquer maneira, teorização, ferramentas e problemas
caminham e se definem juntos”.

— “Os problemas de pesquisa não estão vagando por aí, soltos no mundo e à
nossa espera; eles têm de ser construídos, alimentados, tecidos, cultivados”.

— “Um projeto de pesquisa só vale a pena se for de RIR:


Relevante, Inédito e Realizável”.
Corolário: “Se faltar uma dessas letras, abandone a empreitada”.
Contraponto: “A relevância, o ineditismo e a realizabilidade não são
evidentes por si e não valem igualmente para qualquer campo; devem ser
estudados e discutidos com quem já tem experiência no campo”.
Foco

— “Alguém com um relógio sabe que horas são. Alguém com dois
relógios nunca tem certeza”.

— “Se, como técnico, você quer mesmo ganhar as Olimpíadas, leve


um atleta que pula cinco metros e não cinco atletas que pulam um
metro cada um”.

— “Um erudito sabe tudo. Um sábio sabe o essencial”.

— “Há tuas tragédias na vida: uma é não obter o que o seu coração
deseja; a outra é obter”.

— “Acerca daquilo de que não se pode falar, tem que se ficar em


silêncio”.
Corolário (venezuelano): “Por que não te calas?”.
Ferramentas
— “A teoria como caixa de ferramentas quer dizer: a) que se trata de construir não
um sistema, mas um instrumento: uma lógica própria às relações de poder e às
lutas que se engajam em torno delas; b) que essa pesquisa só pode se fazer aos
poucos, a partir de uma reflexão (neces-sariamente histórica em algumas de suas
dimensões) sobre situações dadas”.
— “Todos os meus livros são pequenas caixas de ferramentas”.
— “Quanto mais funções uma ferramenta pode executar, pior ela executará tais
funções”.
Corolário: “Escolha sempre a ferramenta certa”.
Contraponto: “Nunca é fácil escolher a ferramenta certa”.
— “Ferramentas incrementadas não funcionam”.
— “Os computadores não merecem confiança; mas os seres humanos merecem
ainda menos”.
— “Se você não entende determinada palavra em um artigo técnico, deixe-a de
lado; o artigo ficará melhor sem ela”
Empulhações
— “Qualquer ideia, por mais simples que seja, pode ser expressa nos termos
mais complicados. E vice-versa”
— “O território por trás da retórica está sempre minado de equívocos”.
— “Tudo é possível dizer se você não sabe do que está falando”.
— “Para saber se o interlocutor sabe aquilo que diz, peça para ele dizer de
outra maneira”.
— “Com frases curtas e palavras simples, é mais difícil enrolar”.
Corolário: “Afaste-se dos textos ricos em palavrórios vazios, circunlóquios
rebuscados, erudição empolada, metáforas obscuras, construções
pretenciosas. Em geral, eles são produzidos por mentes indigentes, muito
indigentes”.
— “Todo excesso de palavras proparoxítonas é um forte sinal de
empulhação”.
— “Desconfie dos textos em que há mais palavras entre aspas do que
palavras sem aspas”.
— “Nunca confunda literatura com literatice”.
Revisores, avaliadores e pareceristas
— “Ao sorrir, um avaliador pode estar satisfeito porque você está se
saindo bem ou porque você está sofrendo”.
Corolário: “Procure sempre avaliar se o sorriso do seu avaliador é sinal
de solidariedade ou de sadismo”.
Escólio: “Assim como são as pessoas, são as criaturas” (Adágio popular;
vazio, mas impressiona).
— “Quando alguém, que você admira e respeita muito, parece
mergulhado em profundos pensamentos, em geral está pensando no
próprio almoço”.
— “Sempre haverá erros impossíveis de encontrar”. Afinal, “o diabo
mora na tipografia”.
Corolário: — “Os erros mais importantes sempre passarão sem ser
notados até o livro estar impresso”
— “Encontrando um erro, a revisão se justifica e não se procura mais”.
— “O maior erro é enviar um original sem erros, para um revisor que
vive disso”.
— “Nada é impossível para quem não tem que fazer o trabalho ele
mesmo”.
— “Não importa quanto você faça; nunca terá feito o bastante”.
— “Para muitos, o que você não fez é muito mais importante do que tudo
que você fez, independentemente do volume e da qualidade do que você
tenha feito”.
— “Nenhuma proposta é julgada pelos outros com a mesma proposição de
quem propôs”.
Corolário 1: “Se você explica a proposta tão claro que ninguém pode deixar
de entender, alguém deixará”.
Corolário 2: “ Se você faz uma coisa que tem certeza de ser aprovada por
todos, alguém não aprovará”.
— “Quem avalia é também avaliado”.
— “Num parecer, você sempre deverá dizer alguma coisa inteligente (ou que
pareça inteligente). Adote um dos 3 níveis seguintes (em ordem crescente
quanto à “maldade” que quiser fazer): sugerir, recomendar e exigir.”
— “Os maiores desentendimentos se dão entre os entendidos”.
— Quanto pior for uma Tese, Dissertação ou monografia qualquer, mais
difícil e mais trabalhoso será avaliá-la ou, pelo menos, mais “sofrido”.
Prazos
— “Tudo leva mais tempo do que se pensa”.
— “Toda solução cria novos problemas”.
— “Se não interessa, não interessa”.
— Não importa o quanto corra... Você sempre estará atrasado e devendo
alguma coisa (a alguém ou a você mesmo).
— “Depois de acrescentar duas semanas ao cronograma para atrasos
imprevisíveis, acrescente mais duas para imprevistos imprevisíveis”.
— “Para calcular o tempo necessário para realizar um trabalho, tome o
tempo que você acha realmente necessário, multiplique por 2 e eleve o
resultado à quarta potência. Verificaremos que, em média, deve-se destinar
2 dias para o trabalho de 1 hora”.
— “Nada jamais foi executado dentro do prazo ou do orçamento”.
— “O dicionário explica que prazo significa ‘tempo em que algo deve ser
feito’. Mas, cuidado: não confunda deve ser feito com pode ser feito”.
Corolário: “Assim como uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa,
dever é uma coisa e poder é outra coisa”.
Redação, texto, discurso
— “Não confunda rigor com exatidão. Aquele é sempre desejável; essa
simplesmente não existe.”
— “Nunca use as palavras nunca, sempre, todos e nenhum.”
Observação: “Para acalmar os lógicos ortodoxos, talvez seja melhor
dizer: só use a palavra nunca uma vez na vida — para dizer que nunca
ela deve ser usada”...
— “Tenha o maior cuidado com as palavras verdade, verdadeiro,
natural, natureza, humano, Humanidade. Se sozinhas elas são
problemáticas, quando combinadas — como em: a natureza humana,
a verdadeira natureza humana, as verdades naturais etc. —, o
desastre é certo.”
— “Não se constranja em usar a expressão parece que”.
— “No fundo, eu não gosto de escrever; trata-se de uma atividade
muito difícil de realizar”. (Foucault)
— “A citação mais valiosa será sempre aquela da qual você não
consegue determinar a fonte”.
Corolário 1: “Imediatamente após transcrever uma citação, registre a
fonte por extenso”.
Corolário 2: “Se você não tiver acesso à fonte, descarte a citação”.
Restos
— “Primeira regra do desmontador de relógios: guarde todas as
peças”.
 

— “Mais vale um passarinho na mão do que dois voando” (Adágio


popular).
 

— “De nada adianta guardar se, mais tarde, você não lembrar que
guardou. Idem, se você não lembrar o que guardou. Ibidem, se você
não lembrar onde guardou”.
Corolário 1: Etiquetas, índices e listagens nunca estão em excesso.
Corolário 2: Ponha a etiqueta na hora; quanto mais tarde, mais
perdido você ficará.
Corolário 3: Escreva sempre.
Inteligência (e falta de...)
— “Deus errou: limitou a inteligência, mas deixou a burrice infinita”.
— “Os cientistas dizem que o Universo e a inteligência têm limites. Sobre o
Universo, eu não tenho certeza”. 
— “O problema do mundo de hoje é que as pessoas inteligentes estão cheias
de dúvidas, e as pessoas idiotas estão cheias de certeza”.
— “O mundo é bem maior e mais complicado do que os simples sim ou não,
isso ou aquilo, certo ou errado, bom ou ruim”.
— “O Positivismo odeia a polissemia”.
— “Se algo é indecidível é porque está fora do pensável”.
— “O cérebro é um órgão maravilhoso. Começa a funcionar assim que você
se acorda de manhã e só para de funcionar quando você se senta à mesa
para escrever”.
— A quantidade de inteligência no Universo é uma constante. A população
está crescendo.
— Nunca discuta com um tolo, pois os outros não verão a diferença.
A ordem das disciplinas
SUMÁRIO RESUMO ABSTRACT APRESENTAÇÃO
PRIMEIRA PARTE – Olhares
SEGUNDA PARTE – A questão disciplinar

Capítulo 1 – PRELIMINARES
Um cenário discursivo
Palavras, linguagem, discursos
Dek e Arkhé

Capítulo 2 – DUAS FAMÍLIAS


Parentescos
A primeira família
A segunda família
Topoi

Capítulo 3 – DESCOMPASSOS E CONTRAPONTOS

Capítulo 4 – DISSONÂNCIAS
TERCEIRA PARTE – Foucault

Capítulo 5 – POR QUE FOUCAULT?


Uma perspectiva
Um edificador

Capítulo 6 – OS TRÊS DOMÍNIOS


O primeiro domínio: o “ser –saber”
O segundo domínio: o “ser-poder”
Terceiro domínio: o “ser-si”

Capítulo 7 – UMA QUESTÃO DE METODOLOGIA?

Capítulo 8 – UMA FIDELIDADE INFIEL: Foucault & Cia.


QUARTA PARTE – Retomando a questão
Capítulo 9 – GARIMPANDO
Por que o garimpo?
O filão
A virada disciplinar

Capítulo 10 – NEXOS
As dobradiças
A maquinaria
O objeto-de-si-mesmo
Governamentalizar

Capítulo 11 – APRISIONADOS

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ÍNDICE REMISSIVO
A ordem das disciplinas
Apresentação
• O caminho seguido na determinação/construção de um problema
de pesquisa deve guardar correlação com as experiências do autor.
• Quanto menor e mais sóbria for a autonarrativa, melhor será.
• O quanto antes se anunciar o escopo – problema, foco(s),
objetivo(s), perspectiva teórica –, melhor será.
• “A disciplina é um campo de estudo e um sistema de controle”. (p. 4)
• Disciplina + dade = disciplinaridade.
• Análise foucaultiana do movimento contradisciplinar, em suas
manifestações discursivas.
• É preciso ir às raízes ou origens daquilo que se problematiza. Em
termos foucaultianos, para isso é importante recorrer à genealogia.
• É preciso anunciar a estrutura da Tese.
A ordem das disciplinas
Primeira Parte - Olhares
• Toda investigação se apoia num processo progressivo de
diferenciação. Para Montaigne, “distinguo é o elemento mais
universal da minha lógica”.
• Cuidado com as “promessas”: em primeiro lugar..., em segundo...
• 1 - O caráter interacionista e linguageiro do que se chama a
realidade. Afinal, os fatos não falam por si; não há fatos, mas
apenas versões.
• 2 - “Não existe nada parecido com um ponto de partida meramente
dado, ou simplesmente disponível”. (E. Said)
• 3 – A caminhada não é errática nem determinada previamente.
Assim...
• “Uma análise pós-estruturalista dos discursos começa pelo
reconhecimento de que os objetos dessa análise são constituídos
pela própria análise”. (James Ladwig)
A ordem das disciplinas
Primeira Parte
• Vale a pena marcar as diferenças entre o que se vai fazer e o que
não se vai fazer. Assim, explicar sucintamente as diferenças
(epistemológicas, teóricas) entre a perspectiva adotada e outras
perspectivas e o(s) objeto problematizado(s) e outros objetos.
• No caso da Tese, não interessam:
Reflexão epistemológica, marcando fronteiras
Hermenêutica
Análise semântica e lógica
Estudo sociológico
Análise pedagógica (sucessos ou não das disciplinas)

• Transbordamentos:
olhar – Pós-modernidade – marxismo
A ordem das disciplinas
Segunda Parte – A questão disciplinar
Capítulo 1 - preliminares
• Um cenário discursivo (sobre as Ciências)
discursos laudatórios X discursos críticos
simplórios mal-humorados/persecutórios
conspiratórios

• Palavras, linguagens, discursos


exercícios etimológicos (valor, limites)
transbordamentos (ex.: U. Eco, nota 26)

• Dek e arkhé
Segunda Parte
Capítulo 2 – duas famílias
• Parentescos (entre discursos)
determinar os topoi e as regularidades/repetições
não aderir ao representacionismo, mas ater-se ao dictum

• A primeira família
transposição França Brasil
acento filosófico, essencialista e teleológico
caráter taxonômico/classificatório (multi, pluri, inter, trans)

• A segunda família
inspiração na primeira família
acento pedagógico, prescritivista, idealista
caráter psicológico-comportamental-atitudinal
A saturação como recurso para mostrar a repetição e monotonia.
• Topoi
mitos judaico-cristãos
A ordem das disciplinas 20 anos depois

Os mitos, as pragas
fundamentalismo
cunho filosófico transcendentalismo
finalismo
catastrofismo
 
denuncismo
cunho militante prometeísmo
salvacionismo
redentorismo
 
prescritivismo
cunho operacional metodologismo
reducionismo
messianismo
Segunda Parte
Capítulo 3 – descompassos e contrapontos
Há discordâncias intrafamiliares e interfamiliares, mas semelhanças
suficientes para que os discursos sejam reconhecidos como
pertencentes a uma das duas famílias.
Semelhanças de família (Wittgenstein) e não hierarquização por tipos

Capítulo 4 – dissonâncias
Colocam-se na contramão das duas famílias principais, pois não são
nostálgicos (de um suposto paraíso perdido) e reconhecem as
limitações da educação como instrumento de transformação do
mundo. Estão fora do movimento pela interdisciplinaridade. Mesmo
assim, mantêm a totalidade como um datum (natural e transcendente).
Na sua expressiva maioria, fazem uma leitura marxista da
(inter)disciplinaridade. Afinal, a totalidade talvez seja a principal
metanarrativa a sustentar o marxismo...
A ordem das disciplinas 20 anos depois

Terceira Parte - Foucault


Esta parte é um divisor de águas
A importância de Foucault e o “uso” em pedaços.

Capítulo 5 – por que Foucault?


• Uma perspectiva
Um alerta: “não basta aprender o que tem de se dizer em todos os
casos sobre um objeto, mas também como dele devemos falar. Temos
sempre de começar por aprender o método de o abordar”. (Witt.)
• Um edificador
Richard Rorty sistemáticos
edificantes
Foucault é um edificante moderno, um kantiano paradoxal.
A ordem das disciplinas 20 anos depois

Capítulo 6 – os três domínios

• O primeiro domínio: o “ser-saber”


Arqueologia como “método”

• O segundo domínio: o “ser-poder”


A genealogia como “método”
O que importa não é fazer perguntas diretas sobre o conteúdo de
verdade de alguma proposição, mas sim sobre as condições que
possibilitaram – ou que levaram a – tal proposição.

• O terceiro domínio: o “ser-si” (o “ser consigo mesmo”)


A arqueogenealogia como “método”
As tecnologias do eu
A ordem das disciplinas 20 anos depois

Capítulo 7 – uma questão de metodologia?

Há método em Foucault?
A grande pergunta: “que é método?”

Capítulo 8 – uma fidelidade infiel: Foucault & Cia.

Foucault & Elias – aproximações e distanciamentos


Michel Foucault Norbert Elias
sociedade disciplinar & processo civilizatório
forma de vida desbarbarização
injunções ex/internas coações externas
Homo docĭlis Homo clausus
A ordem das disciplinas 20 anos depois

Quarta Parte – Retomando a questão


Capítulo 9 – garimpando
• Por que o garimpo?
A metáfora do garimpo
Não interessa um fragmento em si (a coisa em si mesma – das Ding an sich, o
noumenon em Kant), mas o fragmento em relação a tudo que o cerca e,
até mesmo, as representações que fazemos dele.
Não interessa a Ursprung (origem estrita), mas a Herkunft
(proveniência) e a Entestehung (emergência).
• O filão
Os necessários recuos da disciplina: nossa tradição ocidental, a
Antiguidade, a Idade Média, Elias (novamente), a laicização da
disciplina.
A ordem das disciplinas 20 anos depois

• A virada disciplinar
Juan Vives: De disciplinis (1531)
Estabelecimento de uma nova ordem no e para o mundo.
Conexões: Nova Ciência; expansão europeia; novas paisagens;
laicização; descentralização do conhecimento; mais prática e menos
retórica; representação (e não a identidade ou a semelhança) como conexão
entre o Homem e a Natureza; o signo deixa de ser e passa a mediar.
Ex.: Lineu como ser no e do tempo.
O nome representa a coisa e suas relações com as outras coisas.
A nomenclatura binominal estabelece um regime de verdade, qual um
retículo ou grade de inteligibilidade.
As disciplinas foram imanentes à episteme da ordem e representação.
A virada disciplinar não aconteceu no século XVII, nem de uma só vez
(como pensou Foucault), mas “aos poucos” e na primeira metade do
século XVI.
A ordem das disciplinas 20 anos depois

Capítulo 10 – nexos (último capítulo???)


• As dobradiças
Recapitulação rápida
2 eixos: disciplina-saber – disciplina-corpo
A conexão entre os 2 eixos se dá no ponto em que a disciplina-saber
cria as condições de possibilidade para que um pensamento
topologizado entenda como naturais os muros que lhe são impostos
ao corpo ou aos quais esse corpo está submetido.
corpo

saberes

Ao mesmo tempo, a disciplina corpo


cria as condições de possibilidade
para a disciplina-saber...
A ordem das disciplinas 20 anos depois

Já no fim da Idade Média estavam estabelecidos os 2 eixos disciplinares.


De um lado, a disciplina-corpo que dava seus primeiros passos no
sentido de fabricar um novo indivíduo: o sujeito burguês. De outro lado,
a disciplina-saber que – tendo se libertado da rigidez taxonômoca
medieval do trívio e do quadrívio e tendo assumido novas configurações
e novo caráter – se colocava à disposição da Nova Ciência.
Examinar as conexões entre a invenção da infância – como uma nova
representação sobre a criança –, a escolarização, a alfabetização, a indi-
vidualização, a expansão geográfica etc., na Europa, significa examinar
as relações entre as forças que se colocam em jogo no estabelecimento
de uma “revolução copernicana” na Weltanschauung de uma época.
A totalidade constituiu-se, talvez, como o principal topos dessa
Weltanschauung. É esse topos que dará, ao longo da Modernidade,
uma forte sustentação racional para um imenso conjunto de práticas
políticas, econômicas, culturais e religiosas: colonização, escravidão,
elitização burguesa, regicídio, democratização, falocentrismo, racismos
de Estado, evangelização forçada, liberalismo, capitalismo,
governamentalização.
A ordem das disciplinas 20 anos depois

• A maquinaria
Não pensar as disciplinas num registro apenas natural, epistemológico
ou psicológico, mas sim histórico (genealógico). A visão disciplinar é a
visão (Weltanschauung) que na Modernidade se tem no e sobre o
mundo (Lenoir) e que, ao mesmo tempo, institui o “estar no mundo”
segundo uma determinada “forma de vida” (Lebensform) (Wittgenstein).
A escola constituiu-se na principal maquinaria (conjunto de máquinas)
a construir tais Weltanschauung e Lebensform.
Duas questões cruciais: - o que a máquina produz?
- como a máquina produz?

– O que ela produz depende de: a serviço de que e de quem ela fun-
ciona? Para compreender melhor, é preciso abandonar a causalidade
eficiente e pensar em termos da causalidade imanente (Deleuze).
– Como ela produz? Fazendo da disciplinaridade “o ponto central da
estruturação da moderna pedagogia”. (Narodowski)
A ordem das disciplinas 20 anos depois

A disciplinaridade se alimenta e se reforça . . .


- rigor dos Reformadores (Lutero, Calvino, Zuinglio, Hus, Ramus...)
- livre arbítrio alfabetismo
- escrita alfabética (atomizada, analítica, topologizante)

sujeito que conhece coisa conhecida


Contra-Reforma (Ratio studiorum, 1599)

- E funciona como condição de possibilidade para o deslocamento da


soberania (poder do soberano) governamentalidade (poder do
Estado)
A ordem das disciplinas 20 anos depois
• O objeto de si mesmo
- As disciplinas operam uma dupla divisão: dividem interiormente os
indivíduos e os dividem entre si. Assim, cada um se torna objeto de
um tipo de poder, que Foucault chamou de poder disciplinar.
- O poder disciplinar internaliza-se de modo a tornar impensável um
comportamento não-disciplinar (transgressivo)

- Que têm a ver disciplinaridade e Modernidade?


Na lógica da soberania, a individualização é ascendente; o poder tem o
nome do dono. Na lógica da governamentalidade, por obra das
disciplinas, a individualização é descendente; o poder se torna
anônimo e microfísico. Passa-se da . . .
Celebração dos grandes feitos, proezas e culto ao individual (nome)

Observação minuciosa, controles, culto ao coletivo (estatísticas)


A ordem das disciplinas 20 anos depois

A Modernidade
• A Modernidade é essa forma de vida (lebensform) em que os
mecanismos histórico-rituais de formação da individualidade se
deslocam para mecanismos científico-disciplinares; em que o
normal toma o lugar do ancestral; em que o homem memorável é
substituído pelo homem calculável.
• Cada um é pastor e ovelha ao mesmo tempo. Talvez se possa falar
em autopastorado . . .
• “O sujeito moderno é esse indivíduo dividido no seu interior e
dividido dos outros, num processo que faz dele um objeto”.
• Produtividade do poder disciplinar:
a) menos custoso (sem resistência, quase invisível, pouca despesa)
b) intenso, amplo, geral (“democrático”)
c) eficiente (alto ganho) e eficaz (produz muito)
• O poder disciplinar aumenta a força economicamente e dispensa a
força política.
• O poder se sustenta na verdade
A ordem das disciplinas 20 anos depois

• Governamentalizar
- Disciplinaridade e Estado Moderno
- O Estado Moderno substitui o Estado Soberano.
- A democracia, no Estado Moderno, depende da maioridade dos
sujeitos, ou seja, da capacidade de cada um se autogovernar
(disciplinadamente) e saber fazer as escolhas do que é melhor para si e
para o grupo a que pertence.
- A soberania tinha os seus próprios códigos. Os códigos do Estado
Moderno se baseiam nos códigos de normalização. Assim, é preciso
compreender as normas numa perspectiva histórica e funcional (ver o
curso Os anormais).
- A governamentalidade designa uma forma de governar em que as
tecnologias do eu se cruzam com as tecnologias de dominação sobre os
outros.
- O Iluminismo (Aufklärung) é o coroamento, no plano teórico-político-
cultural, da governamentalidade.
A ordem das disciplinas 20 anos depois

Capítulo 11 – aprisionados
Recapitulação panorâmica
- virada disciplinar – séc. XVI
- explosão disciplinar – séc. XIX
- a Ciência toma para si a disciplinaridade
- apropriações da interdisciplinaridade (pela esquerda e pela direita)
- a construção artificial dos opostos (“vícios de pensamento”, Witt.)
- alegorias: Em Alice..., ao condenar o Valete, o Rei não era mau; era só burro . . .
- campo discursivo pode ser melhor do que contexto (Popkewitz)
- o jogo-de-espelhos, os avessos dos avessos (Veloso)
- a mosca na garrafa (Wittgenstein) e a impossibilidade de um lugar de
todos os lugares, de uma teoria das teorias, de uma teoria do tudo.
A ordem das disciplinas 20 anos depois

Pequenas recapitulações cruciais


• material corpus objeto

• O quanto antes, deixar claro qual é a tese principal da Tese.


Estar sempre atento para a questão do “quem fala?”. Eu é diferente de minha
bibliografia, de meu leitor, de meus dados empíricos, de meu orientador, de meu
grupo etc. Assim, nunca assumir a autoria daquilo de que não se é autor e, princi-
palmente, daquilo com o que não se concorda. Fora isso, sempre assumir a autoria!
E nunca tomar como seu, aquilo que não é seu . . . “Dar a César o que é de César”.

• Não confundir humildade com coitadismo, nem ênfase com


certeza e arrogância, nem erudição com enrolação!
• Escrever, escrever sempre!
• Problematizar, problematizar sempre!

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