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A menina

Gotinha
de
Água
Autor:
Papiniano Carlos

Ilustradora:
Joana Quental
Era uma vez
Uma menina
Chamada
Gotinha de Água.

A menina
Gotinha de Água
Vivia
No mar sem fim.
E era linda,
Tão linda,
Vestida de esmeralda
E luar.
Ora no fundo,
Ora nas vagas
Coberta de espuma,
Ela brincava
Com suas irmãs.

Brincava
Com os peixinhos,
Dava-lhes beijinhos
E beliscões,
E fugia a rir
Por entre as algas,
E jogava
Às escondidas
Com as anémonas,
Que são as flores
De mil cores
Que há no mar.
Às vezes,
Vinha até à praia
E beijava
As pernas
E os cabelos
Dos meninos.
Depois,
A rir
E a cantar
Ia de novo
Para o mar,
Lá para o largo
Ver as baleias
E os navios.
E a menina
Gotinha de Água,
Vestida de esmeralda
E luar, Um dia,
E tão pequenina, A menina
A força que ela tinha Gotinha de Água,
De mãos dadas Vestida de esmeralda
Às suas irmãzinhas! E luar,
Todas juntas Estava a dormir,
Eram o Mar. A sonhar
À flor
Do mar.
Então,
O Sol
Beijou-a
Na face,
E logo ela
Como se voasse
Subiu no ar.
Como se sentia leve!
Subiu, subiu, subiu
Até que se viu
Numa nuvem
Cor-de-rosa.
Sorriu
De contente,
Olhou em volta
E viu milhões
De gotinhas como ela
Boiarem no ar.
- Cá estou eu nas nuvens!
- Disse a Gotinha de

Água.
Então o Sol
de contente
sorriu também
e ao beijá-la
nos cabelos
acendeu no céu
as sete cores
do arco-íris:
vermelho
alaranjado
amarelo
verde
azul
anil
e violeta.
Era tão lindo!
Tempos depois
vieram os ventos
e disseram
à nuvem:
- Vamos.

E começaram
a empurrar
aquela nuvem
e as outras nuvens
que boiavam
altas e rosadas
sobre o mar.
A princípio,
A Gotinha
Estremeceu
De medo.
Mas depois
Gostou
Da viagem.
E as nuvens
Viajaram.
Eram como grandes
Navios
De algodão em rama.

Andaram
Assim
Dias e dias
Sobre o Mar.
Até que uma tarde,
Estava o Sol
A espreitar,
Muito vermelho,
Lá tão longe
Que parecia quase atrás
Do Mar,
A menina
Gotinha de Água
Viu que voavam
Sobre a Terra.
Olha as praias
Lá em baixo!
E casas!
E meninos
A brincar! Depois
E estradas O vento parou.
E pontes A Gotinha
E automóveis Estremeceu
E comboios Quando viu
A passar! Dum lado a outro
Do céu
As nuvens escurecerem
Como breu.
Olhava
Para baixo e via…
…a terra seca,
Os campos secos,
Secas as fontes,
As flores
E as searas
Murchas,
E os homens
Tristes,
Muito tristes
Sem pão
Para darem
Aos meninos.
Então
A menina
Gotinha de Água
Que tinha
Nascido no mar
E usava
Um vestido de esmeralda
E luar,
Pensou:
E se eu fosse
Dar de beber
Às flores,
Aos campos,
Se eu fosse
Matar a sede
E a fome
Aos homens
E aos meninos?
E disse
Muito alto
Às suas irmãzinhas:
-Vamos.
E deixou-se cair.
Ia à frente
De milhões
De gotinhas
Todas vestidas
De esmeralda e luar
E sorriam,
Cantavam
E assobiavam
Enquanto caíam.
A menina
Gotinha de Água
pousou
mesmo na boca
duma flor
que sorrindo
feliz
lhe disse:
- Bendita!
Bendita sejas!

E logo
uma abelha,
que andava por ali
em busca de pólen
para fazer mel,
pousou numa pétala
da linda flor
e falou-lhe assim:
-Bom dia, meu amor.
Queres tu dar-me
Um pouquinho
Do teu pólen
Para os meus favos?
E a flor
De pétalas
De ouro
Abertas
E cobertas
De gotinhas de água,
Todas vestidas
De esmeralda
E luar,
Só lhe disse:
- Leva o pólen
Que quiseres
Para o teu mel!
O Sol
Brilhava agora
Cheio de alegria
E sacudia
A luz
Da sua imensa cabeleireira
Sobre o mundo.
E as searas
Que estavam a morrer
De sede
Encheram-se
De espigas
E as árvores
Abriram no ar
Os braços carregados
De frutos
Tão docinhos:
Ameixas
Figos
Maçãs, peras e uvas!
E os homens, Das plantas,
As mulheres Desceu
E os meninos Desceu
Agradeciam satisfeitos Desceu sempre
À chuva que viera Até que chegou
Livrá-los A um palácio
Da sede Maravilhoso
E da fome. De cristal
- Obrigado! E platina
Obrigado! Que havia
No seio
Então
Da terra.
A menina
Gotinha de Água, Quando acordou,
Vestida de esmeralda Que saudades
E luar, Sentiu
Desceu Do Mar!
Aos caminhos E disse:
Escondidos - São horas, irmãzinhas.
Da terra, E puseram-se
Passou A caminhar
Entre as raízes Lá nos caminhos…
…do fundo
- Que lindo!-
Da Terra.
Disse o pastorinho,
Caminharam.
E com uma folha
Caminharam.
De castanheiro
Fez uma bica
Até que um dia,
Por onde
Um pastorinho
A menina
Que levava
Gotinha de Água
As ovelhas
E as suas irmãzinhas,
Para o monte,
Todas vestidas
- quem no diria? -
De esmeralda
Viu que duma fraga
E luar,
Brotava
Saltaram
Uma fonte.
Alegres
A cantar.
Era
Um dia de Sol
Na Primavera,
Trinavam
Os passarinhos
Nos seus violinos,
Tocavam os grilos
E os grilões
Nos seus rabecões,
Assobiavam os melros
Nos seus flautins…
…e os sapos,
Os sapinhos
E os sapões, Duas rolas cantavam
À porta Ao desafio
Trru-trruu
Das suas casotas,
Trru-trruu
Estavam a ouvir
No alto dum pinheiro,
Contada E um pica-pau,
Pelo sapo Zé Manel Tau-tau
A história Tau-tau-tau
Dum menino Brincava
Que foi poeta e pastor De carpinteiro.
Da Primavera Satisfeitas
E que era E felizes,
Muito amigo As cigarras
Faziam versos
Dos sapos
Ao Sol
E sapinhos E à alegria
E sapões De viver:
E de todos Como é bom amar
Os que são Olaré, olaré,
(como os sapos) O que o Sol aquece
Humildes mas têm E sonhar, cantar
Bom coração. Olaré, olaré,
O que nos apetece.
E até
A senhora
Dona Formiga
Sempre atarefada
E consumida
Com a sua vida,
Pousou o fardo
Tão pesado
que levava
E estava
Feliz, esquecida
Ao Sol da manhã…
A menina
Gotinha de Água
Vestida de esmeralda
E luar,
Olhou o pastorinho,
Olhou as flores
E os bichinhos
Do monte
E disse-lhes:
- Bom dia, amiguinhos!
E pôs-se a saltar
De pedra em pedra,
A correr,
A saltar,
A cantar
Toda contente.
Atrás dela
Vinham
Suas irmãzinhas,
E todas vinham
Muito contentes
E felizes.
E tanto correram,
Tanto saltaram
Que em breve,
Eia!
Estavam
No ribeiro
Ao pé do moinho.
- Olá, senhor moleiro!
- Bom dia, meninas.

E as gotinhas
De água,
Vestidas de esmeralda
E luar,
Puseram-se
A empurrar
Com suas mãozinhas
A roda
Do moinho,
E o moleiro
Todo contente
Dizia:
- Obrigado!
Obrigado!
E seguiram
Saltavam
De penedo
Em penedo,
Corriam
A cantar
Entre os peixinhos
E as enguias
Esguias
Do ribeiro.

Caminharam.
Caminharam.
Por entre montes,
No meio de vales,
De aldeia em aldeia.

E eis
Chegaram um dia
À enorme represa,
Àquela albufeira
Ainda vazia.
E toca a enchê-la E
Enche que enche Todas vestidas de esmeralda
Que queriam vê-la E luar
A transbordar. Enquanto empurravam
Com quanta força tinham
Quantos dias passaram?
As pás da turbina
Estavam agora no topo
Felizes cantavam:
Da alta barragem.
Roda que roda
Então a menina Gotinha
Gira pião
De Água disse
Roda turbina
Às suas irmãzinhas:
Na nossa mão
Meninas, vamos agora
Canta rodízio
Pôr a girar o pião
O novo prodígio
Da eletricidade!
Bailemos de roda
Vamos! Vamos lá!
Gira dança pião
E lançaram-se
Ai roda que roda
A toda a velocidade
Na nossa mão.
Do alto da barragem.
Depois
Outros rios
Se vieram juntar
Tecendo os fios,
Os caminhos
A caminho do Mar.

Até que um dia...


Um dia
Eia!
Chegaram ao estuário
Do grande rio.

Eram
Agora
Milhões
E milhões
De gotinhas
De água
A correr,
A brincar,
A cantar
A caminho
Do Mar.
E havia
Barcos
No rio
E homens
A pescar
E pontes,
Vilas
E cidades
Debruçadas
Nas margens
A vê-las passar.

Uma tarde
A menina
Gotinha de Água
Estremeceu
De amor.
Uma gaivota
Roçou-lhe
De leve
Com a sua asa.

Era o Mar
Que estava perto!
O rio E uma toninha
Era cada vez Que subia
Maior, O rio
Mais largo,
Deu um salto
Mais fundo.
E havia Fora da água
Já grandes navios E disse:
E uma grande cidade - Ora viva
Cheia de casas e de gente. Quem é
Tão linda!
A menina
Gotinha de Água O céu
Pôs-se a correr
Estava cheio
Mais ligeira
E disse De gaivotas
Às irmãzinhas: Que brincavam
- Vamos, meninas, Com o fumo
Toca a andar Dos navios
Que estamos E gritavam
A chegar Alegremente
À nossa casa no Mar! Quando viam passar
Vestida de esmeralda
E luar
A menina
Gotinha de Água:
- Ora viva!
Ora viva!

Então,
A linda menina
Gotinha de Água,
Vestida de esmeralda
E luar,
Viu
Que chegara
Finalmente
Ao Mar.
E desatou
A cantar:
Eu sou
A menina
Gotinha de Água,
Gotinha azul
Do Mar
Que foi
Nuvem
No ar,
Chuva
Abençoada,
Fonte
A cantar,
Ribeiro
A saltar,
Rio
A correr,
E que volta
À sua casa
No Mar
Onde vai...
...descansar,
Dormir
E sonhar
Antes que
De novo
Torne a ser
Nuvem no ar,
Chuva
Abençoada,
Fonte
A brotar,
Ribeiro
A saltar,
Rio
A correr
E Mar
Uma vez mais.
FIM

Até à próxima viagem...

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