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KARINGANA

UA
KARINGANA
JOSÉ
CRAVEIRINHA
BIBLIOGRAFIA
JOSÉ JOÃO CRAVEIRINHA NASCEU NO DIA 22 DE MAIO DE 1922,
EM LOURENÇO MARQUES (ATUAL MAPUTO), MOÇAMBIQUE.
CONSIDERADO O MAIOR POETA MOÇAMBICANO DA HISTÓRIA,
TORNOU-SE O PRIMEIRO AUTOR AFRICANO A GANHAR O
PRÊMIO CAMÕES, O MAIS IMPORTANTE PRÊMIO LITERÁRIO DA
LÍNGUA PORTUGUESA, NO ANO DE 1991.

AUTODIDATA, SEGUNDO O PRÓPRIO POETA, ESCREVER


POEMAS ERA UM REFÚGIO, UMA NECESSIDADE ANGUSTIOSA E
URGENTE DE SER CIDADÃO EM SEU PAÍS. PUBLICOU UMA
VASTA OBRA E GRANDE PARTE DA SUA POESIA AINDA SE
MANTÉM DISPERSA NA IMPRENSA, NÃO TENDO SIDO INCLUÍDA
NOS LIVROS QUE PUBLICOU ATÉ À DATA.
FERRENHO OPOSITOR AO REGIME POLÍTICO VIGENTE EM SEU PAÍS, ESTEVE PRESO PELA PIDE (POLÍCIA
INTERNACIONAL E DE DEFESA DO ESTADO) DURANTE 5 ANOS (DE 1965 A 1969). DEVIDO ÀS SUAS POSIÇÕES,
PRECISOU UTILIZAR DIVERSOS PSEUDÔNIMOS PARA DRIBLAR A REPRESSÃO : MARIO VIEIRA, J. CRAVO,
JESUINO CRAVO E ABILIO COSSA, FORAM ALGUNS DOS MAIS FAMOSOS PERSONAGENS CRIADOS PELO
AUTOR.
ALÉM DO CAMÕES, JOSÉ CRAVEIRINHA RECEBEU OUTROS PRÊMIOS INTERNACIONAIS, COMO O
“ALEXANDRE DÁSKALOS”, O “PRÊMIO NACIONAL”, NA ITÁLIA, E O “PRÊMIO LÓTUS”, DA ASSOCIAÇÃO
AFRO-ASIÁTICA DE ESCRITORES. EM SUA HOMENAGEM, A ASSOCIAÇÃO DOS ESCRITORES
MOÇAMBICANOS (AEMO), EM PARCERIA COM A HCB (HIDROELÉCTRICA DE CAHORA BASSA), INSTITUIU
EM 2003, O PRÊMIO JOSÉ CRAVEIRINHA DE LITERATURA.
JOSÉ CRAVEIRINHA FALECEU NO 6 DE FEVEREIRO DE 2003, EM JOANESBURGO, ÁFRICA DO SUL.
KARINGANA UA KARINGANA
KARINGANA UA KARINGANA É A SEGUNDA OBRA DO

ESCRITOR MOÇAMBICANO, JOSÉ CRAVEIRINHA, DATADA

DE 1963 E EDITADA PELA PRIMEIRA VEZ EM 1974.

A OBRA PRETENDEU, NAS PALAVRAS DO AUTOR,

TRANSMITIR POETICAMENTE O DIA A DIA DOS

MOÇAMBICANOS, NUMA ÉPOCA MARCADA PELA LUTA

CONTRA A OCUPAÇÃO COLONIAL


KARINGANA UA KARINGANA

Este jeito
de contar as coisas
à maneira simples das profecias
_ Karingana ua Karingana
é que faz a arte sentir
o pássaro da poesia.

E nem
de outra forma se inventa
o que é dos poetas
nem se transforma
a visão do impossível
em sonho do que pode ser.
_ Karingana!
MÃE

Minha Mãe: de tombasana de pés descalços?

Trago a resina das velhas árvores

da floresta nas minhas veias Sabes ou não sabes, Mãe

e a sina de nascença a resina das velhas árvores plantadas pelos espiritos

no meio das baladas à volta da fogueira as blasfémias do mar salgando as raízes virgens

tu sabes como é sempre uma dor nova e as grandes luas de ansiedade esticando

sabes ou não sabes, minha Mãe? as peles dos tambores enraivecidos

Sabes ou não sabes e dando às folhas verdes das palmeiras

o mistério de olhos inflamados de macho o brilho incandescente das catanas nuas?

que um dia encontraste no teu caminho


DADIVA DO CEU

Minha guerra

será contra os pára-quedistas E será minha glória

suspensos entre céu e terra. as mães contando aos filhos

a verdadeira história do primeiro vestido de seda

Morrerei na minha guerra dádiva do céu.

ou levarei nos braços de guerrilheiro

para as crianças da minha terra

as sedas lançadas do bojo do bombardeiro.


KARINGANA UA KARINGANA
De hora a hora bacilarmente
e minuto a minuto cresce imperceptivelmente
cresce devagarinho a semente na terra escura. desabrochando os profilácticos
E a vida curva-nos mais ao ritmo fantástico férteis sudoriperos cereais em maturação.
do nosso chicomo relampejante áscua de chanfuta
subafricano amadurecendo as jejuadas manhãs E depois...
ao velho calor dos braçais intensos de capulanas e tangas supersticiosa a vida
na lavra das lavras de uma lua vai espiando no céu os indecifráveis agoiros
esfarrapada no meio do chão. que hão-de rebentar a nhimba da missava culimada
e na mórbida vigília dos ouvidos ao – Karingana
E a semente de milho cresce
cresce na povoação que a semeou com ternura
desidratada à preto nos sovacos da machamba
e a estrada passando ao lado vai-se abrindo
como uma mulher vai-se abrindo quente e comprida
aos beijos das rodas duplas da Wenela de cus
e dorsos a germinar os pesadelos dos mochos
CANÇÃO NEGREIRA
Amo-te, Maria das minhas órbitas violentadas

com as raízes de uma canção negreira despertam as raízes do tempo antigo...

na madrugada dos meus olhos pardos. mulher de olhos fadados de amor verde-claro

ventre macio de veludo

E derrotas de fome lábios de mampsincha madura

nas minhas mãos de bronze e soluços de espasmo latejando no quarto

florescem languidamente na velha enche de beijos os gritos do meu sangue

e nervosa cadência marinheira que meninos das mesmas raízes

do cais donde os meus avós negros e das mesmas dolorosas madrugadas

embarcaram para hemisférios de escravidão. esperam a sua vez.

Mas se as madrugadas
SEMENTEIRA
Cresce a semente E a vida curva as suas milhentas mãos

Lentamente geme e chora na sina

debaixo da terra escura de plantar nosso ouro branco

Cresce a semente enquanto a estrada passa ao lado

enquanto a vida se curva no chicomo aberta e poeirenta

e o grande sol de África camionizada e comprida

vem amadurecer tudo

com o seu calor enorme de revelação Depois

Cresce a semente de tanga e capulana a vida espera

que a povoação plantou curvada espiando no céu os agoiros que vão

e a estrada passa ao lado rebentar sobre as campinas de África

macadamizada quente e comprida a povoação toda junta no eucalipto grande

e a semente germina nos corações a mamba da ansiedade

lentamente no matope Oh, dia da colheita vai começar

imperceptível como caju em maturação na terra ardente


BIBLIOGRAFIA
CRAVEIRINHA, José. Karingana ua Karingana. Lourenço Marques: Edição da
Acadêmica LDA, 1974.

BOSI, Alfredo. Literatura e resistência. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.

LEITE, Ana Mafalda. Oralidade & escrita nas literaturas africanas. Lisboa:
Colibri, 1998.
Perguntas e Respostas

OBRIGADA!!!

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