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PERCEPÇÕES E

ATITUDES DOS
INFORMANTES
TOCANTINENSES: A
IDENTIFICAÇÃO COM
O OUTRO
Ms. Juliana Moratto (PPGEL/UEL)
Dra. Greize Alves da Silva (UFTO)
Introdução
OBJETIVO: Esta apresentação tem como objetivo analisar as percepções e
atitudes linguísticas dos informantes do interior do estado do Tocantins diante das
variedades do português, a partir dos dados do Atlas Linguístico do Brasil (ALiB).
Abrange o estudo do corpus das Regiões Norte e Nordeste do Brasil.

JUSTIFICATIVA: Prosseguir com os trabalhos do ALiB, investigando duas


das seis Questões Metalinguísticas propostas pelo Comitê Nacional do ALiB para o
projeto: “4. Em outros lugares do Brasil, fala-se diferente daqui”? e “5. Poderia dar
um exemplo do modo como falam em outros lugares”?
O Tocantins é o estado mais novo da federação brasileira, cuja
formação linguístico-social e, consequentemente, identitária sempre
esteve coadunada à grupos não locais, principalmente dos estados
circunvizinhos.

Historicamente pertencente ao espaço de Goiás, a região onde hoje


se situa o Tocantins sempre foi tratada pela população como ‘região norte’
e distinguia culturalmente da porção sul goiana, que sempre esteve
vinculada aos estados de São Paulo e Minas Gerais.
Os intercâmbios dialetais no Tocantins foram suficientes
para criar uma comunidade de fala com sua própria
modalidade dialetal?
Fundamentos Teóricos

01 Psicologia Social (LAMBERT;


LAMBERT, 1968 [1966]);

Estudo da percepção linguística, segundo


02 a Dialetologia Perceptual (PRESTON,
1993);

Princípios teórico-metodológicos da
03 Sociolinguística Variacionista
(LABOV, 2008 [1972]).
Abordagem Metodológica
ALiB Idade –
Abordagem quali e
Faixa I – 18 a 30 anos;
quantitativa;
Faixa II – 50 a 65 anos;

Amostra: 4 Escolaridade - Ensino


informantes por Fundamental I
localidade; total de 8. completo ou não;

Rede de pontos:
Sexo - 50% Feminino e
Natividade (ponto x) e
50% Masculino
Pedro Afonso (ponto y).
Aspectos geolinguísticos do Tocantins

Estudos dialetológicos buscam atrelar o contexto


linguístico do estado aos movimentos migratórios,
principamente aos intermunicipais no Tocantins, entre os
anos de 1991 a 2000. As consequências impactaram
diretamente na identidade tocantinense.

Silva ( 2018, 2019, 2020) aponta para a


existência de uma identidade linguística tocantinense,
apesar da característica híbrida que carrega na fala, mas
com sentimento de pertencimento, o ser tocantinense e
não ser goiano.
DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Questão 4 – Você acha que em outros lugares do Brasil se fala diferente daqui?

Os dados apontam para 100% de reconhecimento de outras


variedades pelos informantes do interior do Tocantins.

Isso representa uma consciência linguística construída a partir da


história local, fruto de dissoluções e do contato com estados circunvizinhos,
além do intenso contato linguístico.
Questão 5 – Você poderia dar um exemplo do modo como falam em outros
lugares do Brasil?

PE = 11,5%

BA = 23%

GO = 11,5%

Por meio das respostas obtidas dos informantes do interior do Estado mais jovem do Brasil, o
Tocantins, foram identificadas as variedades: baiana (23%), goiana (11,5%) e pernambucana (11,5%) com maior
incidência. As demais, logo menos incidentes (6% para cada uma delas) são: alagoana, carioca, gaúcha,
maranhense, mato-grossense, mineira, paraense, paulista e sulista.
Análise Quantitativa
GRÁFICO 1 – Dialetos reconhecidos como diferentes pelos informantes
25%
23%

20%
baiana
goiana
pernambucana
alagoana
15%
carioca
11.50% 11.50% gaúcha
maranhense
10% mato-grossense
mineira
paraense
6% 6% 6% 6% 6% 6% 6% 6% 6%
paulista
5% sulista

0%
%

Fonte: Elaborado pelas autoras com os dados do ALiB.


Análise Qualitativa
Baiano
(1) INF.- Na Bahia, eles falam muito diferente, painho, mainha (Inf. 2/ 23).
(2) INF. - É uma língua muito doida lá...(risos) só que é português, mas é diferente (Inf.
2/24).
(3) INF. – Por exemplo, Bahia, Nordeste em si...o sotaque é outro (Inf. 3/ 24).
(4) INF.- Não, eu acho engraçado, por exemplo, baiano eu acho engraçado, fica
brigando naquelas áreas da feira (Inf. 3/23).
* excerto (1) expressões: ‘painho’ e ‘mainha’, usados em situações informais de fala e
considerados como característicos do dialeto baiano, fornecendo um certo tipo de
estereótipo.

* trecho (2), a expressão ‘uma língua muito doida lá’, empregada para designar uma
forma mais descontraída de fala, em que o significado de ‘doido’ se aproxima de
‘diferente’. Apresenta consciência que falam o português e confirma a existência da
diversidade linguística.

* excerto (3), o ‘sotaque’ é o elemento central para indicar as diferenças na fala.


* excerto (4), acha a variedade baiana ‘engraçada’. Fez observações às características
comportamentais dos falantes – o que pode ser entendido como um julgamento negativo
(indicando desagrado).
Análise Qualitativa
Goiano
(5) INF. - O sotaque do goiano e do mineiro é assim, mansão sabe? (Inf. 3/23).
(6) INF. – Falam, que eles puxam o erre, a gente não puxa (Inf. 2/24).

* excerto (5), avalia o sotaque goiano como ‘mansão’ (superlativo de manso),


referindo-se ao ritmo mais lento da fala, com pouca intensidade na pronúncia,
* excerto (6), aponta que a fala goiana ‘puxa’ o /R/, aludindo ao uso do retroflexo, ao
contrário do praticado em sua localidade, que faz uso da variante glotal (SILVA,
2018).
Análise Qualitativa
Pernambucano
(7) INF. - O pernambucano sabe, esse pessoal nordestino assim sabe, pessoal incisivo,
sabe o que falam (Inf. 3/23).
(8) INF.- Acho que fala, né! Aqui tem a gerente ali do banco, é engraçado para
conversar (Inf. 2/2?).
* excerto (7): afirma que o pernambucano e o nordestino em geral, são povos
‘incisivos’ porque ‘sabe o que falam, podemos considerar uma atitude de convicção,
segurança linguística, uma relação de pertencimento do falante.
* excerto (8): o falar pernambucano é avaliado como ‘engraçado’, divertido,
agradável. O conhecimento linguístico parte do contato com uma profissional
pernambucana que está na localidade a trabalho – um sinal das influências das
migrações internas do Brasil, movimentadas pelas necessidades do mercado de trabalho,
questão muito frequente no Tocantins (SILVA, 2018).
Conclusão
O presente trabalho analisou as perguntas de número 04 e 05 auferidas pelo ALiB
(COMITÊ NACIONAL DO PROJETO ALiB, 2001) nas cidades interioranas do
Tocantins: Pedro Afonso e Natividade. Os resultados apontam para a identificação em
100% dos informantes de variedades extra Tocantins, podendo indicar a consciência
linguística dos informantes e da formação de seu próprio espaço que estabelece
fronteira com outras seis estados brasileiros. Sobre a percepção de sotaques
(baiano/nordestino, goiano, mineiro e paraense), destacam-se predominantemente
aspectos fonéticos-fonológicos (maranhense, pernambucana, sulista e gaúcha),
semântico-lexical (baiana) e o uso de gírias (paraense, carioca).
Referências
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Agradecimentos

Muito obrigada!
Contato: juliana.moratto@uel.br

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