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P rojeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriam)
APRESENTAQÁO
DA EDIpÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que elevemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanga a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos


conta da nossa esperanga e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenga católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


Responderemos propoe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortalega
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabalho assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.

A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaga


depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
FJLOtOHA

UCMCIA c

50UTQINA

MOfUIL

INO XIII — N? 148 ABRIL DE 1


Indiice

Pág.

QUEM DIRÍA? 145

DIÁLOGO DO SERVICO 147

Falam estudiosos :

"JESÚS .ERA FILHO DE SOLDADO ROMANO!" 148

Urna revista e dols livros:


REENCARNACAO E MUNDO EXTRA-SENSORIAL 159

Cada vez mais em voga :

OBJECAO DE CONSCIÉNCIA: SIM OU NAO? 171

As esperanzas do momenlo présenle:

JOVENS E IGREJA ENTENDEM-SE ? 184

RESENHA DE LIVKOS 169


e 192

COM APROVACAO ECLESIÁSTICA


QUEM DIRÍA?

Tomou-se famoso o líder marxiste francés Roger Garaudy,


que teve a coragem de protestar contra a invasáo da Tchecos-
lováquia por parte das tropas da Rússia Soviética. Esse pensa
dor foi urna vez colocado por um repórter da revista «Évangile
aujourd'hui» diante da questáo : «Para vocé, quem é Jesús
Cristo ?» • A tal pergunta Garaudy respondeu com as palavras
abaixo, dignas da atengáo de cristáos e nao cristáos:

"Mais ou menos sob o governo de Tiberio, ninguém sabe


exatamente onde nem quando, alguém cujo nome nos é conhe-
cido, dilatou os horizontes dos homens...
Por certo, Jesús nao foi nem um filósofo nem um tribuno,
mas viveu de tal modo que toda a sua vida teve um signifi
cado. .. Para proclamar até o fim a Boa-Nova, era preciso que
Ele mesmo, mediante a sua ressurreicao, anunciasse que todos
os limites, mesmo o limite supremo, a morte, foram vencidos.
Este ou aquele erudito poderá contestar todos os feitos
da existencia de Cristo; mas isto nao altera a certeza de que
Ele mudou a vida. Acendeu-se um braseiro. Esta é a prova de
que havia urna centelha ou urna chama que fez surgir esse
braseiro.
Todas as filosofías até Cristo meditavam sobre o destino
e as torcas cegas que regem o homem. Jesús Cristo mostrou
a loucura dessas filosofías. Ele, que foi o contrario do destino.
Ele, que foi a liberdade, a críagáo, a vida. Ele que removeu
o fatalismo da historia.
Jesús Cristo realizou as ¡promessas dos heróis e dos
mártires que lutaram pelo grande despertar da liberdade. Ele
cumpriu nao apenas as esperanzas do profeta Isaías ou as
iras de Ezequíel. Jesús libertou Prometeu das suas cadeias e
Antígono dos muros de seu cárcere. Essas cadeias e esses
muros eram imagens mitológicas do destino; elas cairam
diante de Cristo e se pulverizaram. Todos os deuses morreram
entáo e o homem comegou a viver. Deu-se como que um novo
nascimento do homem. Olho para a cruz que é o símbolo disso
tudo, e pensó em todos aqueles que alargaram os bragas da
cruz. Pensó em Sao Joáo da Cruz, que, pelo fato mesmo de

1 Évangile aujourd'hui. L'Homme de Nazareth. Quatriéme semestre 1969,


11-12.

— 145 —
nada possuir, nos ensina a descobrir o tu do. Pensó em Cari
Marx, que nos mostrou como se pode transformar o mundo.
Pensó em Van Gogn e em toaos aqueles que nos tizeram
tomar consciencia de que o nomem é granae demais para
bastar a sí mesmo.

Vos, homens da Igreja, que guardáis escondida a grande


esperanca que Constantino nos roubou, devolvei-nos essa es
peranza ! A vida e a morte de Cristo pertencem também a
nos, a todos aqueles para quem elas tém sentido. Pertencem
a nos, que aprendemos de Cristo que o homem foi criado
criador..."

As palavras de Garaudy, densas como sao, por certo desper-


tam múltiplos ecos no leitor, talvez surpreso por encontrar tal
depoimento sob a pena de um marxista. — Numa breve refle-
xáo complementar, podem-se nelás salientar dois tópicos im
portantes :

1) A exaltagáo do papel único e inconfundivel de Jesús


Cristo na historia dos séculos. Cristo mudou a vida dos homens;
foi mais forte do que a morte- Está vivo i? presente á humani-
dade (em que sentido terá Garaudy entendido a mssurreigáo
de Jesús ?). Se Garaudy nao reconhece Jesús como Deus, atri-
bui-lhe agáo e influencia singulares: Jesús veio revelar o homem
ao homem (cf. Vaticano II, Const. «Gaudium et Spes» n» 22a);
veio libertar o homem das cadeias da ignorancia, da idolatría,
dos mitos, para despertar as mais profundas energías da natu-
reza humana. Veio dizer ao homem que este é grande demais
para contentar-se consigo mesmo. A capacidade de infinito
que o homem traz em si, só encontra resposta no Infinito.

2) Aos cristáos dirige-se Garaudy num apelo veemente


a que nao privem o mundo da mensagem que Cristo trouxe a
todos os homens. Proclamem-na nao somente por palavras,
mas também com o testemunho de urna vida lúcida e coerente.
— Estranho fenómeno: enquanto dentro da Igreja, existe quem
se interrogue sobre es valores de sua fé, fora da Igreja há os
que descobrem com entusiasmo, e quase com santa inveja, as
grandes linhas da Boa-Nova crista... «Ó, se soubesses o dom
de Deus...», dizia Jesús a. mulher samaritana que o abordava
(cf. Jo 4,10).

Garaudy apresenta-se assim como arauto do mundo nao


cristáo que vem despertar as consciéncias e a responsabilidade
do povo de Deus. Embora nao o parega, o mundo de hoje
áspera o auténtico tcstemunho da palavra e da vida dos discí
pulos de Cristo.
E. B.
— 146 —
DIÁLOGO DO SERVIDO

Alguém te pede unía coisa.


Se vires nele o homem, darás o que podes.
Se vires nele o Cristo, o amor fará o que nao podes dar.

Procura servir.
Se te agradecerem, olha para os céus.
Se te esqueeerem, lembra-te do que aínda eleves a Deus.

Deus nao precisa de nada.


Mas Ele quer que sirvas, para que nao falte nada a
ninguém de tudo o que Ele fez para todos.

Servir nao quer dizer satisfazer a todos.


Significa fazer a todos tudo o que satisfaz a Deus.

Só serve como Cristo aquele que, além de dar, se dá.

Nao escolhas o lugar para servir. Serve onde estás.

Ha[a horario para o trabalho. Mas, para servir, nunca.

Servir significa mais do que trabalhar.


Quem trabadla visa ao lucro; quem serve visa ao
homem.
Quem trabalha, faz o progresso do mundo. Quem
serve, faz o homem progredir.

Se te dispóes a servir, va¡ e nao esperes que os outros


venham pedir.

Todos podem servir. Todos, sem exce$áo.


Se tuas maos nao se mexem e se teus pés nao cami-
ríham, aínda podes servir a todos com um simples oihar de
amor para o Cristo.

Amar é bom. Amar servindo é melhor. Amar e servir


é que é ótímo.
Sé humano. Sé cristao. Sé o que Deus foi para os
homens.
P. Orlando Gambi C.ss. R.

— 147 —
«PERdUNTE E RESPONDEREMOS»
Ano XIII — N* 148 — Abril de 1972

Falam estudiosos:

«Jesús era filho de soldado romano!»

Em sintese: Os dizeres dos rabinos, coletados no chamado Talmud,


referem entre outras coisas que Jesús era filho do soldado romano Panthera
ou Pandera. Este, achando-se em servlco na Palestina, vlolou María, a per
fumista, dando-lhe como filho Jesús. Jesús, portanto, terá sido bastardo e,
mals aínda, mago, feitlcelro e sedutor.

Na verdade, os críticos, nem mesmo os autores israelitas modernos,


nao reconhecem valor histórico a tais noticias; sSo evidentemente tenden
ciosas. Há mesmo incoeréncia ou falta de nexo entre os poucos dados que
o Talmud consigna com referencia a Jesús. O que pode Interessar, no caso
asslnalado, é o nome "Panthera" ou "Pandera"; julga-se que seja a de-
formacSo de "Parthénos" ou "Parthénou" (vlrgem, em grego). Jesús, filho
de Panthera ou Pandora, seria talvez a versSo errónea de "Jesús, filho da
Parthénos (virgem)". Caso esta hlpótese soja válida, a tenda rablnica aínda
seria um testemunho da consciéncia que já os primeiros cristSos tlnham,
de que María fora m8e virginal.

Esta proposicSo da fé tem suscitado dúvldas ao homem moderno, visto


supor um milagre. — Note-se, porém : nSo é de crer que os crlstáos hajam
recebido tal proposlcáo da mitología pagS, pois nos mitos os deuses que
tornam as vlrgens fecundas, sao sexuados, ao passo que o Deus de Israel
transcende as categorías da corporeldade. Ademáis os cristSos eram closos
da integrldade de sua fé a ponto mesmo de morrerem ou padecerem per-
segulcao antes que tolerar quaiquer IntrusSo de paganismo dentro das
concepcSes e práticas cristas. — É na Escritura Sagrada do Antlgo Testa
mento que se encontram os precedentes da afirmacSo da vlrglndade fecunda
de María: Sara, a mae de Sansao, Ana, Elisabete foram mies contra toda
expectativa humana ou por via portentosa. O texto de Is 7,14, traduzido do*
hebraico para o grego nos séc. Ill/ll a. C, atesta a crenca dos judeus na
virgindade da Máe do Emanuel (a palavra hebraica 'almah, jovem mulher,
fol traduzlda pelo vocábulo grego parthénos).

— 148 —
JESÚS, FILHO DE SOLDADO ROMANO? 5

A vlrglndade fecunda de Maria é um fato físico (que a Igreja pede aos


estudiosos, nao comentem curiosamente), fato físico prenhe de significado
teológico: proclama a gratuidade da salvacSo e a surpreendente novldade
do segundo Adáo, que veto criar de novo o género humano.

Comentario: Quem percorre a literatura nao crista dos


primeiros sáculos, encontra ai algumas noticias concernentes a
Jesús, de índole greco-romana e judaica.

O filósofo grego Celso, de mente eclética, escreveu em


177/178 aproximadamente uma obra de ataque ao Cristianismo
nascente chamada «Discurso verdadeiro» (Alcthés Lógos).
Desse escrito, só nos restam fragmentos citados por Orígenes
de Alexandria, que refutou' Celso na volumosa apología intitu
lada «Contra Celso». Em um de seus trechos diz Celso o
seguinte :

José Pandara (ou Panthera), o soldado romano de uma


legiáo da Calabria que se achava na Judéia, abusou de Maria
de Belém, uma jovem israelita, e tornou-se o pai de Jesús»
(«Contra Celso» I 28).

Esta noticia difere radicalmente da que a tradigáo católica


transmite sobre a origem de Jesús: este foi filho de Maria Vir-
gem. Contudo, já que a virgindade fecunda constituí um por
tento que ultrapassa as categorías da razáo, há quem pergunte,
aínda em nosscs días, se a noticia transmitida por Celso nao
é a auténtica versáo dos fatos. Daí o interesse em se examinar,
ñas páginas que se seguem, a verossimilhanga de quanto refere
o filósofo: Jesús foi filho do soldado romano Panthera (ou
Pandera). Visto que Celso recebeu tal noticia dos judeus ou
dos dizeres dos rabinos do século II, é necessário, antes do mais,
examinarmos o teor e a veracidade dessas fontes judaicas. Essa
investigagáo sugerirá ulteriores reflexóes.

1. O ambiente judaico antigo e Jesús

1. Como se sabe, Jesús Cristo, já durante a sua vida


mortal, foi duramente contraditado pelos mestres de Israel.
Estes certa vez atribuiram ao Maligno os feitos grandiosos de

— 149 —
6 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

Jesús (cf. Me 3,22); finalmente, obtiveram das autoridades


romanas a condenagáo á morte do Rabino da Galiléia.

A aversáo dos chefe.» de Israel a Jesús continuou a se


manifestar depois da morte do Salvador: subornaram as guar
das do sepulcro para que dissessem que os discípulos de Cristo
haviam raptado o cadáver do Mestre enquanto dormiam os
guardas (cf. Mt 28,11-15). Ao consignar tal artimanha, observa
o Evangelista : «Recebendo o dinheiro, os guardas fizeram
como lhes fóra ensinado. E esta mentira divulgou-se entre os
judeus até o día de hoje» (Mt 28,15).

A onda de hostilidad^ dos judeus aos cristáos tendía a


avolumar-se, pois a comunidade dos cristáos parecía originar-se
do povo de Abraáo, mas com índole subversiva e apóstata. Após
a ruina de Jerusalém em 70 d- C, foram-se criando entre os
judeus versdes referentes a Jesús que exprimiam mágoa e odio.
Os próprios judeus convertidos ao Cristianismo eram, por seus
antigos correligionarios, chamados Minim (= dissidentes, secta
rios, herejes). As palavras e os ecos da hostilidade de Israel a
Cristo encontram-se no chamado Talmud (palavra que em
aramaico quer dizer ensinam«ntt>).

Talmud, em sentido ampio, vem a ser a colegao da dizeres


dos rabinos da Palestina e da Babilonia. Esses dizeres, profe
ridos nos primeiros sáculos da era crista, foram compilados em
diversas etapas juntamente com varias tradigóes de Israel;
finalmente, nos séc. V/VI estavam completas as colegóes do
Talmud da Palestina e do Talmud da Babilonia. Os judeus
tinham memoria tenaz; valendo-se de procesaos mnemotécni-
cos, eram capazes de transmitir fielmente tradigóes que podiam
remontar a épocas muito remotas. É o que nos faz crer que
o Talmud refira com exatidáo o modo de pensar dos israelitas
dos primeiros sáculos.

2. Ñas páginas do Talmud é mencionado Jesús através


de designagóes pouco honrosas: chamam-no «Balaáo, filho de
Daor, o falso profeta que seduziu Israel», ou também «um
certo», «o bastardo», «o filho de Stada (bsn Stada)», «o filho
de Pandera (ben Pandera, ben Panthera)». Mais precisamente,
o Talmud refere que Jesús nao era o filho do marido de sua
máe, Pappos ben Juda, mas, sim, o filho de Panthera ou Pan
dera; este terá sido um soldado romano que na Palestina se
apaixonou pela perfumista (ou também cabeleireira de mulhe-
res) Myriam; Jesús seria o filho do adulterio assim cometido.

— 150 —
JESÚS, FILHO DE SOLDADO ROMANO ?

Dizem mais: o padrasto efe Jesús — Josué ben Perahia — levou


o jovem para o Egito, onde aprendeu as artes máginas (o Egito
era a térra clássica dos magos). Ao voltar para a Palestina com
seu padrasto, Jesús foi rejeitado por este em conseqüéncia de
palavras pouco oportunas. Foi entáo que Jesús comegou a
exercer prodigios feiticeiros que lhe valeram o nome de «falso
profeta Balaáo». Finalmente foi excomungado pelos chefes de
Israel, pois proferia heresias e cometía injurias contra os maio-
rais do povo, dizendo ser Deus. Submetido a julgamento como
mago e fomentador de apestasia, Jesús foi exposto ao público
em pelourinho durante quarenta dias; entrementes um arauto
clamava: «Este homem deve ser apedrejado porque praticou a
magia e seduziu -Israel. Quem saiba algo que o possa justificar,
aproxime-se e faga valer o seu testemunho!» Nao houve, porém,
quem falasse em seu favor; por ?sto penduraram-no ao lenho
no dia da preparacáo de Páscoa. Outros textos de rabinos
dizem: «apedrejaram-no» 1. Ele tinha entáo 33 anos e Pilatos
tomou parte na sua execugáo. É reprobo, punido no inferno
pelo suplicio do lixo candente.

Estas narrativas referentes a Jesús, complementadas por


outras posteriores, deram lugar no inicio da Idade Media ao
panfleto dito «Toledoth Jeschu» (Geragóes ou Historia de
Jesús). Este escrito encontrou grande crédito ñas comunidades
israelitas através dos sáculos. Foi utilizado por Voltaire e outros
adversarios da Igreja.

3. Pergunta-se agora: que valor histórico tém as narra


tivas rabinicas concementes a Jesús ?

Os críticos, em geral, as consideram como lendárias e ten


denciosas ; sao expressáo de sarcasmo, fanatismo e fantasía.
Renán, por exemplo, por mais cético que fosse em relagáo ao
Cristianismo, nao hesitou em classificá-las como «lenda bur
lesca e obscena». A «Enciclopedia Judaica» (The Jewish En-
cyclopedia), publicada em Nova Iorque a partir de 1904, num
total de 12 volumes, consagra um artigo a Jesús de Nazaré
(Jesús «f NaraTeth), vol. VII, cois. 160-178. Esse artigo divi-
de-se em tres partes: «Jesús na historia» e «Jesús na teología»,
ambas fundadas sobre fontes cristas livremente manipuladas;

■A lapIdacSo, seguida de enforcamento no patíbulo, era a pena que a


Leí de Israel previa para os blasfemos; por Isto é que as tradic5es dos rabi
nos referem.um pretenso apedrejamento de Jesús... Jesús tinha que cum-
prir a pena dos blasfemos.

— 151 —
8 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

a terceira parte, com o titulo «Jesús na lenda judaica», expóe


o conteúdo das fontes rabínicas. Semelhante distincáo é obser
vada pelos próprios autores judaicos quando escrevem sobre
Jesús de Nazaré; consideram como lendárias as noticias con
signadas no Talmud.

Em particular, o caráter ficticio de tais noticias pode ser


averiguado se se leva em conta o que dizem os textos rabínicos
sobre a filiacáo de Jesús. Há os que apontam, como esposo de
Maria, Pappos ben Juda, isto é, um contemporáneo do rabino
Aqiba, falecido em 135 d. C. aproximadamente. Mas um pre
tenso padrasto de Jesús, Josué ben Perahia, tara vivido nos
tempos de AÍexandre Janeu, que foi rei em Jerusalém no pe
ríodo de 104 a 78 a. C. Mais: a alusáo a Maria «perfumista»
ou «cabeleireira ó? mulheres» provém de confusáo entre a máe
de Jesús (chamada María) e Maria de Magdala, visto que
Magdala pode significar «cabeleireiro». Quanto ao nome de
Fanthera ou Pandera, é, muito provávelmente, o resultado cte
urna adaptacáo judaica do nome grego «Parthénos»; Jesús era
dito «filho da Virgem» (Paxthénou, em grego);1 da palavra
«Parthénou» os judeus teráo feito Panthtíra ou Pandera.
— Note-se que, se esta explicagáo é válida, ela fornece um tes-
temunho importante e muito claro de quanto é antiga e arrai
gada entre os cristáos a crenga na virgindade fecunda de Maria.

Resta, pois, de pé a noticia transmitida pelos Evangelhos:


Jesús foi filho de Maria, qua estava unida em casamento ao car-
pinteiro José, da casa de Davi. Todavía a conceigáo e o nasci-
mento de Jesús deram-se por via singular, sem o consorcio de
José — o que está longe de implicar adulterio. A tradigáo da
Igreja, desde os primeiros tempos, e a fé crista afirmam que
María concebeu virginalmente por obra do Espirito Santo, como
afirma o texto bíblico em Mt 1, 18-25 ; Le 1, 26-38.

Póe-se entáo a pergunta: que significado pode ter a vir


gindade fecunda de Maria ? Nao constituí um desafio á sá
razáo ?

1 Parthénos é nominativo (caso do sujelto). Parthénou é genitivo (caso


do possessor).

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JESÚS, FILHO DE SOLDADO ROMANO ? 9

2. Marta, Virgem e Mae: ob¡e;oes

Em se falando da «Virgem e Máe», fácilmente podem ocor-


rer ao leitor algumas dificuldades, que assim tentaremos re-
produzir:
— a idéia de «Virgem-Máe» parece derivar-se de mitos
pagaos;
— conceigáo virginal, sem intervengáo do sémiai masculino,
nao se coaduna com os conhecimentos biológicos modernos;
— «virgindade de María» deve ser forma literaria dos
antigos para exprimir a graciosidade da conceigáo de Jesús.
Percorramos cada qual dessas objegóes:

2.1. EmprésHmo de mitología

Antes do mais, note-se que entre as narragóes do Novo


Testamento e as da mitología subsistem profundas diferengas,
apesar das aparentes semelhancas.

Com efiaito. Quando a mitología refere a intervengáo de


uma divindade no nascimento de algum heroi da antigüidade,
ela supóe sempre intercambio carnal entre o «deus» e a virgem
por ele fecundada.

É o que es dá, por exemplo, no caso dos irmáos Rñmulo


e Remo: eram filhos do deus Marte, que surpreendeu e vio-
lentou a vestal Rea Silvia, filha de Numitor, rei de Alba, du
rante o sonó (a vestal era uma virgem dedicada ao servigo da
deusa Vesta no respectivo templo). Os dois gémeos nascidos
dease consorcio «divino-humano» foram colocados em uma cesta
e atirados ao rio Tibre. O rio, transbordando, langou a cesta
diante da gruta Lupercal, sob a figueira Luminal; uma loba
foi amamantar os meninos, que depois o pastor Fáustulo e suá
esposa Acá Lourenga recolheram e criaram.

No romance de Alexandre Magno, Imperador da Mace-


dónia (f 323 a.C), lé-se o seguinte: um grande mago esta-
beleceu-se como astrólogo em Pella na Macedónia. Foi entáo
consultá-lo Olimpia, esposa do rei Filipe da Macedónia, que
nao tinha filhos. O mago prometeu a Olimpia que Zeus Amon
(Júpiter) a visitaría sob a forma de um dragáo e a tornaría
máe. Eis, porém, que o próprio astrólogo se disfarcou em dra
gáo e teve consorcio marital com a rainha Olimpia, da qual
veio a nascer Alexandre. O rei Filipe ficou conturbado por tal

— 153 —
10 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

nascimento; todavía o dragáo apareceu-lhe em tempo opor


tuno e tranqüilizou-o, assegurando-lhe a origem divina de seu
filho Alexandre!

Ora os textos bíblicos do Novo Testamento sao totalmente


alheios a tais nogóes : apresentam Deus como o Único, o Trans
cendental, Inefável, Espirito sem corpo; jamáis se poderia com
parar a agáo de Deus á de uma divindade paga. Deve-se mesmo
dizer que os mitos pagaos e a narragáo bíblica concernente a
María supóem dois mundos radicalmente diversos um do outro:
ñas Escrituras Sagradas tem-se o conceito de um Deus que
ama a criatura e a ela se inclina com respeito e dedicacáo
(respeito e dedicacáo que encontram pálida analogía na atitude
de um esposo para com sua esposa). Os Evangelistas sao extre
mamente sobrios ao descrever os acontecimentos relativos ao
nasciiriento de Jesús: a Virgem-Máe pouco fala; José reve
rencia a intervencáo de Deus ; José e María se véem obrigados
a se recensear em Belém ; a viagem terá sido penosa ; todavía
nenhuma intervencáo do céu se dá para amenizá-la ou para
finalmente proporcionar ao Menino necém-nascido uma digna
hospedagem. Quando a criánga nasce, a térra nao estremece,
como estremece na quarta Écloga de Virgilio ou por ocasiáo
da natividade de Alexandre Magno. Enfim, pureza, delicadeza
e simplicidade caracterizam os relatos evangélicos. — Muito di
ferente é o tom dos mitos. Nestes predominan! as paixóes dos
deuses e forte erotismo ; a imaginacáo constrói figuras mirabo-
lantes, marcadas pelo portentoso e o fantástico.

Alias, os precedentes literarios e doutrinários da materni-


dade virginal de Maria encontram-se no próprio judaismo. Na
verdade, as narragóes do Evangelho sobre a infancia de Jesús
(Le 1-2 e Mt 1-2) tém colorido palestinense muito marcante, e
referem-se freqüentemente a textos do Antigo Testamento. Isto
significa que se originaram na Palestina mesma, a partir de
dados locáis e nao estranhos. — A própria Escritura narra o
caso de mulheres santas, mas esteréis, as nuais Deus quis dar
a graca da maternidade fora das circunstancias naturais; roí
o que ocorreru a Sara, esposa de Abraáo ícf. Gen 18,9-15), a
máe de Sansáo (cf. Jz 13,1-24), a Ana, máe de Samuel (cf. 1
Sam 1,1-28), a Elisabete, máe de Joáo Batista (cf. Le 1,5-25).

Mais aínda. O texto de Is 7,14, escrito talvez no século VHI


a. C, predizia: «Eis que uma donzela Calmah, em hebraico)
concebe e dá á luz um filho». Esse texto foi traduzido para o
grego nos séc. rn/n a. C.; entáo os tradutores, exprimindo o

— 154 —
JESÚS, FILHO DE SOLDADO ROMANO ? 11

pensamento vigente em Israel, verteram 'almah por parthcnos


(=virgem). O Evangelista Mateus, depois, citou o texto de
Isaías nao em seu teor hebraico, mas em sua forma grega, ilus
trando corn ele o nascimento de Jesús (cf. Mt 1,23). — Este
fato mostra como no próprio povo de Israel se esperava o nas
cimento virginal do Emanuel (=Deus conosco). A virgindade,
no caso, significaría, sim, benevolencia e amor gratuito da
parte de Deus (como nos casos de Sara, Ana, Elisabete e da
máe de Sansáo), mas nao seria mera metáfora ou figura lite
raria; correspondería, antes, a urna realidade física, como física
era a esterilidade de Sara, Ana, Elisabete...

Por último deve-se ponderar que tanto os judeus como os


cristáos eram ciosos da integridade de seu patrimonio religioso,
e fortemente intensos a qualquer mesclagem de paganismo ;
preferiam morrer a pactuar com crencas ou práticas da mito-
logia; é o que se depreende principalmente da historia dos pri-
meiros decenios e sáculos cristáos, quando numerosos discípulos
de Cristo deram a vida para nao perverter ou trair a fé. Ora
julga-se que tais pessoas nao estavam em condigóes psicológicas
de professar a virgindade de María (como de fato a professa-
ram os cristáos desde os primordios da Igreja), se essa crenca
nao se derivasse auténticamente das fontes oráis e escritas do
Cristianismo. Com outras palavras: os primeiros cristáos eram
freqüentemente pagaos convertidos ao Cristianismo. Conside-
ravam a sua convcrsáo como ruptura decisiva com o politeísmo
e o paganismo; nao é de crer que em tais condigóes de mente
voltassem a adotar estórias ou lendas da mitologia; a distincáo
entre «ser cristáo» e «ser cultor idos deuses» era demasiado
nítida nos tres primeiros séculos da Igreja, séculos de luta entre
o Imperio pagáo e o Cristianismo.

2.2. Desafio á biología

Inegavelmente, a virgindade fecunda de María é portento


biológico, que nao deve ser equiparado aos casos de parteno-
gene.se dos quais nos falam as ciencias naturais.
Todavia note-se que esse portento também nao é um
absurdo ou algo de contraditório (como «círculo quadrado»
seria contraditório). Deus, que é o Autor da natureza, pode
nela intervir de diversas maneiras. Com efeito; observemos que
Deus age sempre que a criatura se póe em acáo ; a criatura
nunca é ou age intíependentemente do Criador (é o que se de
riva do conceito mesmo de «criatura») ; em todo e qualquer
acontecimento, Deus é a causa remota e mvisível de tudo que

— 155 —
12 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

nesse acontecimento é positivo e bom. A criatura é sempre


«con-causa» com Deus. — Ora, em certos casos, que nos cha
mamos «milagre», Deus age de tal modo que Elle dispensa a
acáo normal ou a «concausalidade» da criatura; Deus produz
¡mediatamente e por si só todo o efeito a ser realizado.

Aplicando estes principios a María, dir-se-á: o que o varáo


(sob a agáo remota de Deus) nela teria produzido mediante
consorcio carnal, Deus o quis produzir diretamente e por si;
no seio da Virgem originou-se assim urna vida nova, sem ruptura
da integridade física de María. Essa vida, formada no seio da
Virgem durante nove meses, foi finalmente dada ao mundo por
semelhante intervengáo de Deus.

A Tradigáo crista e o magisterio da Igreja sempre profes-


saram tal verdade. Contudo nos último.? decenios, em vista ele
teorías demasiado «curiosas» que se iam propalando nesse setor,
o magisterio pediu aos estudiosos que se abstivessem de dsseer
a comentarios e tentativas de explicagáo biológica ou filosófica
da virgindade fecunda de Mana.

2.3. Figura literaria

Colocada no seu contexto bíblico, verifica-se que a virgin


dade fecunda de María está longe de ser mera forga de expres-
sáo lingüística ou literaria. Nao seria reto procurar interpretar
tal proposicáo bíblica á luz de um contexto estranho ou nao
bíblico. Donde se segué que a virgindade de María supóe urna
realidade física, a qual, sem dúvida, vem a ser sinal ou símbolo
de ulterior realidade, realidade espiritual e religiosa.

É esse significado ulterior que passamos a considerar.

3. Virgindade de Marta : que significa ?

1. Antes do mais, é importante ter-s* presente que a


crenga na virgindade de María nao significa menosprezo do
matrimonio e do legítimo consorcio marital. Deus é o Autor
dos sexos e das respectivas diferengas; foi Ele também quem
instituiu o matrimonio para atender á complementagáo mutua
de homem e mulher. Nao sería, pois, cristáo julgar que o con
sorcio matrimonial era indigno de se tornar para os homens
a via de nascimento do Salvador.

— 156 —
JESÚS, FILHO DE SOLDADO ROMANO? 13

2. Contudq Deus Pai quis que o Salvador ou Messias


fosse dado ao mundo por natividade virginal. Esse designio de
virgindade fecunda deve ser entendido como designio de pro
porcionar aos homens um sinal ou símbolo.

Sinal ou símbolo... de qué ?

a) A salvacáo do genero humano é algo de totalmente


gratuito; ela nao se deve nem «á vontade da carne nem á von-
tade do homem», mas á livre e soberana iniciativa de Deus
(cf. Jo 1, 13).

b) Com Jesús, comega algo de novo na historia do mundo


e dos homens. Entrando no curso dos tempos, Deus recriou o
homem; depois de haver assumido a dor e a morte da criatura,
apresentou ao mundo o novo homem, o segundo Adáo, que é
o Cristo Jesús Ressuscitado. Nascimento virginal e ressurreicáo
corporal estáo intimamente associados entre si como etapas
da novidade que Cristo trouxe na plenitude dos tempos. Essa
grande novidade vai-se comunicando ás geracóes sucesivas
da historia e estará consumada no fim dos tempos.

c) Jesús no Evangelho diz que, após a ressurreicáo dos


mortos, na realidade definitiva, já nao haverá consorcio marital
(cf. Mt 22,30)... Ora a conceicáo virginal de Jesús é um re-
flexo antecipado desse estado de coisas definitivo.

d) Na virgindade de Maria torna-se claro o fato de que


Deus pode assumir totalmente alguém para o seu servico, pe-
dindo-lhe renuncia a bens lícitos, sem por isto tirar fecundidade
a essa criatura, mas, ao contrario, dando-lhe mais rica fecun
didade e o gozo de inédito prazer.

A virgindade física de Maria é o sinal de sua total entrega


de espirito a Deus. Sem essa entrega interior, a virgindade
biológica nao teria sentido para Maria.

Vé-se, pois, que a virgindade de Maña, na S. Escritura, é


um fato, ... e nm fato prenhe de mensagem. Sem mensagem
para nos, o fato apenas da virgindade seria brutal ou antina
tural. Sem o fato da virgindade física, a mensagem seria abs-
trata, teórica ou mesmo vazia. O fato da virgindade e o signi
ficado ou o simbolismo da mesma sao inseparáveis um do outro.

— 157 —
14 ^PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

Para reconhecé-lo, o estudioso é convidado a renunciar a pes


quisas ou conjeturas biológicas (que seráo sempre vas), e
ouvir na fé a Palavra de Deus através da Escritura e de todo
o ensinamento dos sáculos cristáos.

Bibliografía:

Daniel-Rops, "Jesús no seu tempo". Porto 1950.

L de Grandmaison, "Jésus Christ. Sa personne, son message, ses


preuves", 2 vols., París 1931.

M. Schmaus, "Der Glaube der Kirche", 2 vols., München 1969.

J. Mlchl, "Le probléme de Jésus. De Jésus de l'hlstoire au Christ de la


foi". Mulhouse 196S.

K. Prümm, "Der chrlstllche Glaube und dle altheldnlsche Welt", 2 vols.,


Leipzig 1935.

ídem, "Das Christentum ais Neuheitserlebnis". Leipzig 1939.

PR 7/1957, pp. 23-27.

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— 158 —
Urna revista e dois livros:

reencarnado e mundo extra sensorial

Em sintese: SSo comentados abaixo dois livros que abordam fenóme


nos psíquicos: o de Hans Holzer ("A verdade sobre a reencarnacáo" da
Editora Record) julga ver nesses fenómenos testemunhos de auténtica reen-
carnacao dos esplritos. O outro estudo é de Hans Lerlin: "O mundo extra-
-sensorial", Editora Record Igualmente: mostra como a "psyché" humana é
rica em virtualidades, podando assumir atitudes duplas ou múltiplas; estas,
na verdade, podem ser entendidas como expressóes de Idólas e conhecl-
mentos adquiridos pelo Individuo no decorrer mesmo da vida presente. O
recurso á expllcacfio reencarnaclonlsta nfio ó exigido pela ciencia; depende
da fé ou da credlbllidade que alguém Ihe queira atribuir; para qualquer
fenómeno dito "de reencamacflo", há sempre urna exptlcacfio nao reencar-
nacionlsta. Eis por que se torna particularmente útil, no momento presente,
a leüura de estudos e compendios de parapsicología e percepcáo extra-
•sensorial.

Sí *

Comentario: Em novembro de 1971, urna de nossas


revistas ilustradas publicou os resultados de indagacSes reali
zadas no Rio de Janeiro e em Sao Paulo sobre fenómenos me-
diúnicos e reencarnagáo. Entre outras conclusóes, lia-se a se-
guinte: «A Igreja nao admite a reencarnacáo ; 49 % dos
católicos entrevistados a aceitam» («Realidades, novembru
1971, p. 3).

Ao mesmo tempo, existem em nosso mercado de livros


duas publicagóes, entre muitas outras, que abordam o assunto:
Hans Holzer, em «A verdade sobre a reencarnacáo» (Distri
buidora Record), julga poder apontar as provas da reencarna-
cao, ao passo que Hans Lerlin, em «O mundo extra-sensorial»

— 159 —
1<; -PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

(Distribuidora Recond), fornece material que leva a repensar


as conclusóes formuladas por Holzer. Ambos os livros oferecem
casos concretos com fenomenología rara e original, suscetível de
suscitar debatías e interpretagóes diversas. Em vista do inte-
resse que o assunto desperta, vamos abaixo tecer algumas re-
flexóes sobre um e outro desees livros.

1. «A verckxde sobre a reencarnagáo»

1. Hans Holzer propóe suas experiencias e sua tesa no


livro de origem norte-americana «Born again — The truth
about reincarnation». É perito em hipnose; praticando-a em
diversas pessoas sensíveis, fé-las nagredir em idade até os pri-
meiros dias de sua existencia no seio materno. A seguir, suge-
riu-lhes transpusessem o limiar da vida presente, recuando
para a existencia anteror, cinqüsnta ou cem anos antes do
nascimento. Tais pessoas comecaram entáo a falar como se já
tivessem vivido encarnadas outrora na térra.

Essas experiencias e os diálogos entáo travados entre o


hipnotizador e seus pacientes a respeito de existencia anterior
se acham consignados no livro de Holzer. O autor se moátra
partidario da tese da reencarnagáo, como se depreende do final
de sua Intradugáo ao livro : «Minha tarefa neste livro é sim-
plesmente apontar as provas da reencarnagáo e apresentá-las
da melhor maneira que me for possível. Espero que os meus
leitores examinem as suas vidas e me comuniquen! algumas das
suas experiencias de reencamagáo, ss assim o desejarem, de
modo que possamos ter em nosso arquivo o maior número pos-
sivel de casos» (p. 16).

Holzer pretende distinguir casos auténticos e casos espurios


de reencamagáo; sabe que «há charlatáes e sonhadores entre
os que falam da reencamagáo, apresentando-se as vezes mate
rial que é claramente fraudulento ou, na melhor das hipóteses,
fantasioso» (p. 55). Deixados de parte os casos que se expli-
quem como reagóes meramente subjetivas ou parapsicológicas,
Holzer julga poder recensear ao menos cinco outros casos em
que a regressáo de idade levou o (a) paciente a descrever alguma
«encarnagáo» anterior: os relatos sao extremamente minucio
sos, referindo com vivacidade os diálogos entre o hipnotizador
e a pessoa hipnotizada.

— 160 —
REENCARNACAO E PARAPSICOLOGÍA 17

2. Á guisa de espécimen, seja citado o seguinte trecho


do depoimento da Sra. Ruth MacGuire (norte-americana):

«Tenho urna estranha lembranca da Inglaterra no secuto pas-


sado, e isso me vem obcecando desde a infancia. Embora meus ante-
passados sejam ingleses, irlandeses e dinamarqueses, noto que, sem-
pre que estou muilo cansada, escrevo certas palavras á moda inglesa.
Isso nao acontece quando tenho consciéncia do que estou escrevendo,
mas só quando estou extremamente cansada».

Perguntou depois o hipnotizador Hons Holzer :

«Falou em alguma formo de lembrancas de reencarnacáo. . .


Pode dar-me alguns detalhes dessas vidas passadas ?

— Sempre vivo como urna mulher. Urna vez ma afoguei. Sei o


que é sentir a agua sufocante cobrir o rosto e mergulhar-se na es-
cu ridáo. Sei também o que é estar deitada num caixao aberto e
escutar comentarios ou tentar «rguer o braco para dizer ás pessoas
em torno que se está consciente e achar o braco completamente
imóvel, como se fosse de ferro. A consciéncia desses fatos, do afo-
gamento e da mor te, ms chegou num sonho vivido quando eu tinha
nove anos.

Ora devo rcconhecer que tenho urna memoria fenomenal, que


recua até quando eu tinha um ano de vida. Minha lia e minha mae
coslumavam dizer : 'Mas vocé nao pode lembrar-se disse. Vocé tinha
apenas um ano e meio de idade ! Entretanto eu descrevia um qui
mono de minha tia ou os globos de luz no apartamento onde morá-
vamos e tudo era absolutamente correto.

Tinha também urna imaginacño muito viva e é essa urna das


razóes pelas quais me procuro controlar» (pp. 102-104).

Estes tópicos sao .suficientes para tecermos algumas refle'


xóes. — Como se vé, a Sra. Ruth MacGuire era altamente sen-
sivel, dotada de memoria prodigiosa e imaginacáo muito fértil!
Pois bem. Nao é fora de propósito notar que foi justamente
essa pessoa quem narrou um dos enredos de reencarnacáo no
livro em foco...

3. Holzer se apoia também em fenómenos de dupla per-


sonalidade: a segunda personalidade, manifestada em estado
de sonó hipnótico, correspondería a urna encarnacáo anterior
á atual. Leve-se, por exemplo, em conta o ocorrido com a Sra.

— 161 —
18 tPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

June Volpe, casada com o industrial italiano Sam Volpe, e


oriunda da Pensilvánia. Foi procurar o Sr. Hans Holzer para
submeter-se a hipnose. Tivera sonhos estranhos, que a haviam
impressionado a ponto de ser levada a urna clínica de psiquia
tría. Sofria também do coracáo, quando um belo dia assistiu
a um programa de televisáo em que o Sr. Hans Holzer disser-
tava sobre psicología. Muito interessada e — mais — estimu
lada por seu médico pessoal e seu psiquiatra, resolveu procurar
a hipnose. O hipnotizador, tendo-a ouvido em mais de urna
sessáo de sonó hipnótico, escreve :

«Estova em lempo de fazer June sair do seu estado hipnótico.


Quando acordou, sentia-se bem e eslava pronta para voltar para a
sua cidadezinha no Oeste da Pensilvánia. Alguns dias depois, tive
de novo noticias déla. Dizia-me que nao tinha de fato nada de espe
cial a comunicar, salvo urna certa inquietacáo que nao a abandonava
e a acentuacáo da mudanca de personalidade que comecaram nela
depois da viagem á Florida (onde tivera o seu primeiro sonho ¡m-
pressionante). Além disso, fazia ou dizia coisas que estavam em
completo desacordó com a sua personalidade habitual. Até os país
déla notavam isso na ocasiáo em que se reumam.

June, isto é, a velha June, era um pouco tímida e incapaz de


dizer alguma coisa sem primeiro refletir cuidadosamente. A nova per
sonalidade era «xatamente o contrario — tinha tato, mas era as
vezes agressivamente franca e, se nao gostavam do que ela dizia,
tanto pior. Muitas discussóes de familia tinham surgido em conse-
qüéncia de opinioes expressas pela 'nova' personalidade de June.

Pouco a pouco, porém, Sam se habituou as transformacoes ocur


ridas na mulher porque sinceramente a ama. Há coisas que ele nao
compreende, nem quer compreender. Aceita-as e aprendeu a confor-
mar-se com elas.

Embora a velha June vívesse simplesmente dedicada as suas


tarefas domésticas, a nova personalidad: demonstrou de repente
interesse pelas artes — música, teatro amador, etc. Todas essas coisas
passaram a fazer parte de seus novos ¡nteresses e, apesar de June
viver numa cidade pequeña, bem afastada dos centros de atividade
cultural, ela procura ler ludo o que Ihe cai ñas maos e acompanhar
o mundo mais sofisticado que existe no exterior. O marido acho que
tudo isso está bem, aínda que nao partilhe desJas ambicóes.

Com o correr do tempo, a personalidade da suposta Sra. Simms


e da 'velha' June comecaram a fundir-se numa personalidade nova
na qual, porém, o espirito esquivo da viúva dominava ou se tornava

— 162 —
REENCARNACAO E PARAPSICOLOGÍA 19

cada vez mais dominante. É claro que June nao ¡ncentivava, nem
procurava esso transformacáo, mas, ao contrario, achava-a pertur
badora. A fim de atenuar-lhe os receios, disse-lhe que suspeitava
de urna lembranca efetiva de reencarnacáo e, sem aludir a quaisquer
verificacoes, aprésente! o assunto como simples hipótese. Assegurei-
-Ihe também que nao havia perigo e que, se ela desejasse suprimir
por completo de sua vida o personolidade da Sra. Simms, podio con
seguir isso pedindo-me que o sugerisse numa de nossas próximas
sessoes com hipnose.

Isso June nao quis fazer. Sentía de algum modo que era seu
destino viver com sua tembranca pré-natal e tirar disso o melhor
proveito possível. Depois, isso muito a intrigava e, numa vida plácida
c comum como a déla, qualquer forma de interesse era bsm recebida.
Com todas as suas tragedias, a vida da Sra. Simms pareció muito mais
interessante do que a tranquila vida de June, a dona de casa do
Oeste da Pensilvonla. Se ela podía ter o melhor de dois mundos,
tanto melhor» (pp. 151s).

As reflexóes sobra este caso seráo sugeridas pela conside-


raqáo do livro de Herlin, a ser apresentado á p. 21 (165) deste
fascículo.

4. Explanando suas idéias, Holzer refere-se á Biblia Sa


grada e ao Cristianismo. Tenha-se em vista, por exemplo, a
seguinte passagem:

t em dio o Cristianismo nao dita mais o que se deve crer,


mas há muitos homens de Igreja que insistem em que a Biblia nao
faz referencia á reencarnacao. Entretanto, Salomao acreditava que
havia vivido anteriormente na térra, e assim o diz nos Proverbios. Je-
remias afirmou que Deus Ihe dissera que ele ¡á havia estado na
térra em outro corpo. Acreditava-se que Sao Joáo Batista era urna
reencarnacao do profeta Elias e Jesús disse a Nicodemos : "Ninguém
subiu ao céu sem ter descido do céu'» (p. 53).

Infelizmente o autor nao cita os textos bíblicos dos quais


ricprcendc as suas afirmagóes. Ora quem procura no livro dos
Proverbios nao encontra urna só passagem em que Salomao
insinué haver vivido anteriormente sobre a tetra (quem achar
algo nesse sentido, queira comunicá-lo á Redagáo de PR).
Quanto ao profeta Jeremías, o que se pode aduzir de mais su
gestivo, é o texto seguinte :

— 163 —
20 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

«Foi-me dirigida a palavra do Senhor neites termos :

'Antes que fosses formado no ventre de tua máe, Eu já te


conhecia.

Antes que saísses do seio materno, Eu te consagre!

E te constituí profeta entre as nocoes'».


(Jer l,4s)

Pode-se deduzir desta passagem a reencarnagáo de Jere


mías ? — Na verdade, isto saña gratuito. O que o texto bíblico
quer dizer é que, antes da conceigáo, Jeremías (como, alias,
toda criatura humana) já era conhecido por Deus. Com efeito,
Deus conhece desde toda a eternidade toda e qualquer criatura;
Deus nao comega «alguma vez» a conhecer, pois em Deus nada
tem inicio (nao há passado, nem presente, nem futuro, mas o
instante sempre presente da eternidade). Deus vé cada criatura
em seu modelo ou ideal antes que ela se torne realidade histó
rica na sua única existencia terrestre.

A respeito da reencarnacáo de Elias em Joáo Batista, dis-


sipam-se todas as dúvidas desde que se leve em conta a decla-
racáo do próprio Batista :

«Quem és entao ? perguntaram-lhe. Es Elias ? — Nao sou, res-


pondeu ele» (Jo 1,21).

Os demais textos bíblicos referentes a Elias e Joáo Batista


já foram explanados em PR 3/1957, pp. 15s; 145/1972, pp. 26s.

Por último, as palavras que Holzer atribuí a Jesús: «Nin-


guém subiu ao céu sem ter descido do céu» nao corresponden!
ao que se encontra no Evangelho, onde se Ié: «Ninguém subiu
ao céu a nao ser Aquele que desceu do céu, o Filho do homem,
que está no céu» (Jo 3,13). Como se vé, elas se referem a
Cristo, que, como Deus, é onipresente ou simultáneamente pre
sente no céu e na térra; estáo longe de qualquer insinuacáo de
reencarnacáo.

Nao é raro que autores espacializados em determinado


ramo do saber se mostrem totalmente ineptos ou superficiais
ao citar a Biblia, que, nao obstante, eles pretendem canalizar
para as suas teses. Tal método desabona as credenciais mtelec-
tuais do respectivo autor. Alias, o cap. II do livro de Holzer,
tecendo urna historia da doutrina da reencarnacáo, se mostra,

— 164 —
REENCARNACAO E PARAPSICOLOGÍA 21

nao raro, tendencioso; certos fatos, como a conversáo do Im


perador Constantino (t 336) ao Cristianismo, sao entendidos
a partir de pnsconceitos (cf. p. 48).

Será oportuno agora passar brevemente em revista o livro


de Hans Herlin :

2. «O mundo extra-sensorial»

1. O livro se abre com interessante capitulo sobre o In


consciente '. Esta realidade é de importancia fundamental, nao
podendo ser ignorada por quem deseje diagnosticar científica
mente fenómenos psíquicos extraordinarios ou portentosos. Eis
as observacóes do autor :

«Sabemos na realidade muito mais do que pensamos. E o sa


bemos gratas a forca .que chamamos de subconsciente, em oposicáo
ao consciente. A nossa época decidu-se, por fim, a por em evidencia
os segredos do subconsciente. ... O subconsciente ¿ um segundo eu,
um eu oculto. Determina a maior parte da nossa vida diaria, e possui
forcas e capacidades misteriosas de cuja existencia o consciente nem
sequer tem conhecimento. Pode ser a razáo de atos aparentemente
¡lógicos, inteiramente improprios á nossa conduta. E também inlervir
em nossa vida de formo prática, isro é, avisando-nos quando necessi-
lamos de advertencia.

Aquele que pretende obrir caminho nos segredos do ocultismo,


deve ler primeiro as folhas do nosso segundo eu. Os psicólogos mo
dernos descrevem da forma seguinte as {acuidades do subconsciente:

Desconhece a fadiga.
Percebe numerosas coisas.
Nada Ihe escapa.
Reage com maior sensibilidade as ¡mpressoes exteriores.
Julgo muito acertadamente.
O subconsciente influí sobre o nosso corpo das maneíras mais
diversas» {pp. 17s).

*Há quem prefira falar de subconsciente. Alias, o próprio Herlin adota


indiferentemente um e outro vocábulo.

— 165
22 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

Se tais sao os poderes do subconsciente e do inconsciente,


verifica-se que nao se deve apelar sem mais para intervengóes
do Além e fatores transcendentais, quando nos encontramos
diante de fenómenos estranhos ou portentosos do comporta-
mentó humano. Aínda é H. Herlin quem observa:

«Neni tudo há de ser sobrenatural pelo falo de nao consoguír-


mos achar urna explicacáo das coisas. Antes de quaüficar um fenó
meno como sobrenatural, é preciso comprovar se nao existe talvez
urna explicacáo perfeitamente natural. Numerosos casos quo nos
parecem absolutamente mágicos, sao explicados dessa manoira»
(p. 16).

2. A seguir, nos onze capítulos do seu livro, o autor passa


em revista diversos fenómenos psicológicos e parapsicológicos:
sonó e sonhos, hipnose, telepatía, clarividencia, profecía, disso-
ciacáo da psrsonalidade, materializagóes, duplos, fantasmas...
Mostra como, sob o efeito de determinadas condigóes psíquicas,
se dáo acontecimentos portentosos, que muitas vezes sao atri
buidos a espirites do Além ou á reencarnacáo, mas, na yerdade,
nada mais sao do que manifestag&as do psiquismo do próprio
sujeito.

3. Especialmente digno de nota é o que escreve Hans


Herlin a respeito de dissociacáo da personalidade. O mesmo
assunto é abordado por Hans Holzer como se fosss síntoma de
reencamacáo. Com efeito, no seu cap. VI, intitulado a «A Se-
nhora de Atlanta», Holzer apresenta o caso da senhora June
Volpe: esta em sucessivos transes hipnóticos assumiu os tragos
e o comportamento característicos de outra personalidade que
se dizia «a Sra. Simms». Ao despertar do sonó hipnótico, June
conservava as tendencias típicas da Sra. Simms, como vimos
as pp. 18-19 deste fascículo.

É muito interessante confrontar com o relato de Holzer


as ponderagóes de Hans Herlin em seu capitulo sobre «Disso
ciacáo da personalidade» :

«Houve casos complicados em que os médicos trataram de doen-


tes qu* temporariamente se dissociavam em varías personalidades,
cada urna délas completamente diferente e oposta as domáis. Existe
um caso psiquiátrico histárico que demonstra de maneira especial a
esséncia da dissociacáo da personalidade : a doente era urna enfer
mera que trabalhava num hospital de Bostón, e o médico que a
tratou, urna das autoridades mais ilustres no campo da dissociacáo
da personalidade, o Dr. Morton Prince.

— 166 —
REENCARNACAO E PARAPSICOLOGÍA 23

A enfermeira, Miss Beauchamp, mostrava de vez em quando


um eu que mudava de forma radical. Hoje urna pessoa, transformava-se
¡mediatamente em outra completamente diferente, que ignorava por
completo a existencia da primeira. Era, realmente, como se vivessem
'duas almas em seu peito'. O Dr. Prince designou as duas persona
lidades de B1 e B4.

A parte anímica B' era tímida, reservada, seria, bondosa, reli


giosa, amante das enancas e dos velhos. A B4 tendia a encolerizar-se
súbitamente, era intolerante, atéia e manifestava odio contra enancas
e andaos. A parte B4 condenava a maioria das coisas que a B'
amava. Nenhuma délas tinha conhecimento da outra.

Junto a B1 e B4, porém, existia urna terceira personalidade, B3,


na famosa 'Sally'. Nem B1 nem B4 conheciam a existencia de B3, mas
Sally conhecia os pensamentos das outras e gostava de lutar contra
as duas personalidades que aspiravam a apoderar-se do seu corpo.
Logo que B1, a organizada, arrumava o quarto, Sally tomava posse
do corpo e desmanehava tudo. Sally ia para longe, para o campo,
para urna regiSo desconhecida e fazia com que B1 acordasse ali,
sem dinheiro, desamparada... O Dr. Prince cu ron finalmente a en
fermeira, somando as diversas personalidades numa especie de per
sonalidade media.

Os médicos nao estáo totalmente de acordó sobre as causas


que conduzem á dissociacáo da personalidade, ainda que predomine
a opiniáo de que o fator principal contribuinte para o fenómeno
seja o que chamamos de sugestáo : a personalidade muda sob a
influencia de urna forte sugestáo, de um forte choque emocional ou,
excepcionalmente, físico. Os médicos chegam ao ponto de afirmar
que apenas o desojo de ser outra pessoa é suficiente para que brotem
os sintomas de urna dissociacáo da personalidade. E, assim, a psico
logía moderna tende a encontrar na dissociacáo a explicacáo de
todos os fenómenos mediúnícos. O Dr. Tischener escreve a propósito:
'Quem quer que queíra ver pode verificar que o fato de um espirito
falar através de um médium nao constituí demonstracáo alguma de
que exista realmente um espirito independente que se manifesté
através dele. As personalidades que apareoem na hipnose ou em
quaisquer outras dissociacoes, nao sao em absoluto mais indepen-
dentes do que as surgidas ñas sessoes espiritas'. Em outras palavras:
os 'espíritos* nao sao para a psicología outra coisa que manifestó-
c5es de dissociacáo da personalidade, ou seja, dos médiuns»
tp.p. 156s).

— 167 —
24 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

As reflexóes de Hans Herlin assim propostas levam o estu


dioso a ver que os casos ditos «de resncarnagáo» (inclusive o
da Sra. June Volpe) nao causam estranheza ao parapsicólogo,
mas se enquadram bem nos processos de dissociacáo da per-
sonalidade, processos dos quais se conhecem as mais variadas
modalidades.

4. No final do ssu livro, o autor Hans Herlin abstém-se


de assumir posigáo filosófica definida diante do grande número
de episodios que ele descreve no decorrer dos seus capítulos.
Observa textualmente:

«Da mesma forma que ocorre com os restantes fenómenos de


que vimos falando, a ciencia nao consegue tampouco chegar a acordó
sobre este- (isto é, aparicóes de defuntos aos vivos). Há certos falos
que nao podem ser provados. . .

Em última instancia, lalvez seja conveniente que algo tao ma-


ravilhoso nos escape das maos. Quicá nao seja esta urna questao
científica, mas únicamente religiosa; nao urna questao de prova,
mas de fé...

Este livro pretende únicamente mostrar o que existe realmente


na batalha pro e contra tais fenómenos; a decisdo cabe o cada um»
(p. 205).

Esta conclusáo de Hans Herlin, embora nao proponha


urna atitude determinada (e justamente por nao a propor), é
altamente positiva. Dá-nos a ver o seguinte: por mais que se
queiram multiplicar os pretensos casos de reencarnaeáo, quem
adota a tese da reencarnagáo, nao a adota por motivos cientí
ficos, mas, sim, por razóes de fé. Para todo fenómeno dito «de
reencarnacáo», há sempre urna explicacáo psicológica ou para-
psicológica; em caso algum, o estudioso é científicamente obri-
gado a recorrer á explicacáo reencarnacionista. Até hoje se
pode dizer que, quando alguém em estado de transe ou hipnose,
narra a sua vida «pregressa» (vivida em anterior encarnagáo),
nao faz senáo descrever vivencias ou impressóes adquiridas na
vida presente; descreve-as livremente associadas, de modo a
formar um enredo estranho que parece diferente das vivencias
que o sujeito já experimentou, mas que na verdade é o resul
tado de leituras, conversas, filmes, pecas de teatro e outras
experiencias que tenham afetado o individuo na presente exis
tencia. Nunca se pederá esquecer que temos em nosso nivel
consciente apenas 1/8 (ou menos ainda) dos conhecimentos que

— 168 —
REENCARNACAO E PARAPSICOLOGÍA 25

adquirimos desde a infancia ; o mundo psíquico e consciente


dentro do qual nos movemos, é exiguo em relacáo áquete que
desde os primeiros meses na vida presente vamos construindo
dentro de nos e que pode vir ¿baila desde que percamos o
controle consciente sobre o nosso psiquismo. Urna vez dissolvido
tal controle, projetamos em livre associagáo algo (muito ou
pouco) dos 7/8 de nocóes adquiridas e conservadas em nosso
íntimo desde os primeiros passos de nossa existencia terrestre.
Tais nocóes nos poderáo parecer o enredo de urna vida pre-
gressa, se nos sugestionamos ou se formos sugestionados neste
sentido.

Eis por que se torna extremamente útil a leitura dos tra


tados de parapsicología e peroepgáo extra-sensorial. Ajudam o
leitor a nao se admirar diante de fenómenos psíquicos portento
sos, pois mostram a génese de tais fenómenos: génese subjetiva,
contida dentro dos limites do tempo e do espago de urna vida
terrestre.

Juventudes em crise ou Sociedade em crise? Introducáo ao Estado


de Problemas Braslleiros (ciclo colegial), por Irene Tavares de Sá.
— Editora Renes, em convenio com o Instituto Nacional do Livro
(M.E.C.), Rio de Janeiro 1972, 60x230min, 23S pp.

Quando se fala de problemas brasileiros em programa colegial, é


necessário íazer selecáo dos mesmos. Irene Tavares de Sá, cujas obras
literarias e educacionais já sao conhecidas, apresenta um temario
muito concatenado, em que alude á realidade brasileira e internacional
de hoje com dados concretos e variegados: projeto Rondón, FA6,
BEMFAM, SUDAM, assim como o cinema e o teatro servem de motivo
para reflexáo. — Textos de autores famosos, interpelagóes diretas ao
estudante em estilo vivo e fluente tornam o livro especialmente valioso
e digno de recomendacáo a mestres e alunos. «Nao será urna sociedade
totalitaria ou permissiva que resolverá o problema da íome e da guerra.
É VOCE e tantos outros jovens e adultos que continuarao a recons
truir o Mundo, com os remendos das geracñes passadas e o idealismo
de tantos homens e mulheres de hoje e de ontem, dignos de nossa
admiracüo !> (p. 78). Boa bibliografía e ampia documentacao ilustram
o manual, que poderá ser francamente útil as nossas escolas.

E. B.

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.. ."Deb rucado sobre urna materia que
Ilie resiste, o trabalhador imprime-Uie o seu
cunlto, enquanlo para si adqnire tenacidade,
engenho e espirito de invenido. Mais aitida,
lívido em conium, na esperanza, no sofri-
mentó, na aspirando e na alegría partilha-
da, o trabalho une. as vontades, aproxima os
espirito* e sóida os coracoes: realízando-o, os
horneas descobrem que sao irmaos."

PAULO VI
(Carta Encíclica Populorum Progressio)

marco - 1967

OO ENGERJ5Á
Ética- Seguranca- Pioneirismo
Cada vez mais em voga:

objecáo de consciéncia: sim oulnáo?

Em sinteae: "Objecéo de consciéncia" ó a atltuda de resistencia oposta


por um cldadfio ás lels do Estado (principalmente no tocante a partlcipacfio
em guerra e 6 prestacfio de servlco militar) por motivos de índole religiosa,
moral ou humanitaria.

Nos tres prime) ros séculos, os crlstSos praticavam tal atitude frente á
milicia do Imperador Romano, na qual servlco á patria e servlco aos [dolos
estavam freqüentemente assoclados entre si. Urna vez feito cristSo o Imperio
Romano (séc. IV), perdeu-se o clima para objecSo de consciéncia. Durante
a Idade Media até o sáculo XX, conslderava-se a resistencia ¿s leis patrias
(mesmo ¿s de origem militar) como crlme passlvo de pena.

Principalmente com a segunda Guerra Mundial (1939-1945) fol-se modifi


cando o julzo sobre o assunto entre os católicos. Genocidios e males hor
rendos contra a humanldade cometidos em nome da obediencia aos gover-
nantes patrios deram ocasifio a que se perguntasse se nfio é legitimo — ou
mesmo obligatorio — resistir a quem asslm comanda. Ho]e em día, mor-
mente após o Concilio do Vaticano II, a doutrina católica aceita a legltlml-
dade da objecáo de consciéncia, desde que esteja baseada em motivos
respeitávels e nfio prejudique o bem comum. A quem recuse prestar servico
militar, asslnale-se servico civil e pacifico em prol da nacáo.

* *

Comentario : Fala^se cada vez mais de «objecáo de cons


ciéncia», principalmente nos países em que as ideologías sao
fortes e a violencia deixou suas marcas. O noticiario interna
cional tem referido casos de «objetares de consciéncia», que
polarizam a opiniáo pública na Europa e nos Estados Unidos
(a guerra do Vietnam é motivo freqüente ¿te tal tipo de pro
testo). Todavía o assunto nem eempre é claro, prestando-se

— 171 —
28 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

mesmo a equívocos de vulto. Merecerá, pois, nossa atengáo ñas


páginas que se seguem, páginas ñas quais examinaremos o que
é objecáo de consciéncia, qual o seu histórico e como a julgar
hoje em día, do ponto de vista cristáo.

1. Objec.So de consciéncia : que é ?

Estritamente falando, «objegáo de consciéncia» é a ati-


tude pela qual um cidadáo recusa obediencia á autoridade
pública que o convoca para o servico militar ou para urna mobi-
lizacáo em caso de guerra. Os motivos alegados por tal cidadáo
derivam-se da sua consciéncia pessoal, podendo ser de Índole
religiosa, moral ou humanitaria.

Em sentido mais ampio, «objegáo de consciéncia» designa


qualquer tipo de resistencia á autoridade pública por motivos
íntimos, ou seja, por julgar o cidadáo que as determinacóes da
autoridade sao iníquas e, por isto, indignas da aquiescencia dos
respectivos súditos.

Vejamos algo do histórico da objecáo de consciéncia.

2. Breve percurso histórico

1. Até o inicio do sáculo IV encontram-se na literatura


crista testemunhos infensos a prestagáo de servico militar. Isto
se compreende, em parte, pelo fato de que a vida militar no
Imperio Romano era marcada por sinais religiosos de inspira-
cao paga; o soldado cristáo nao se furtaria a participar de
ritos e cultos politeístas, contrariando de certo modo a sua
consciéncia. Também se explica por urna interpretagáo estrita
do quinto preceito do decálogo: «Nao matarás!» A guerra e
tudo que com ela se relacionasse, era, por conseguinte, tido
como ilícito aos olhos dos primeiros cristáos.

Sao Justillo mártir, por exemplo, escrevia por volta de 155:


«Nos, que antes matávamos uns aos outros, agora nao sonriente
nao fazemos guerra aos nossos inimigos, mas — ¡á que nao nos é
lícito mentir e engañar os nossos ¡uízes — de bom grado morreemos
professando Cristo» (1 Apol. 39).

«Nos, que éramos réus de guerras, de mutuos estragos e de todo


tipo de maldade no mundo inteiro, mudamos as nossas armas de
guerra. . . trocando as espadas em arados e as langas em instrumen
tos agrícolas» («Diálogo com Trifáo» n° 110).

— 172 —
OBJECAO DE CONSCIéNCIA 29

Clemente de Alexandria, mestre de famosa escola teológica,


tido como o pai do humanismo cristáo, considerava a comuni-
dade dos cristáos no Imperio Romano como «um exército que
nao mata» («Protréptico» Di 116). Acrescentava: «Para a
paz, e nao para a guerra, é que fomos tremados» («Pedagogo»
1,12). Mais: «Se tu te inscreves como membro do povo de Deus,
o céu é tua patria, e Deus o teu legislador. E quais sao as suas
leis ? — Nao matarás... Amarás o próximo como a ti mi?smo.
A quem te esbofeteia numa face, apresenta a outra» («Pro
tréptico» X).

Em 295, segundo as «Atas dos Mártires» («Acta Sancto-


rum»), deu-se o caso de um jovem de 21 anos — Maximiliano —
que, convocado para a milicia imperial, respondeu ao procónsul
romano no Norte da África : «Nao serei um soldado deste
mundo, porque sou soldado de Cristo». O procónsul recordou-
-lhe entáo que outros cristáos estavam servindo ao exército; ao
que Maximiliano replicou: «O problema é deles. Sou cristáo, e
nao posso servir». Condenado á morte, Maximiliano exclamou:
«Deus viví? !»

2. Aos poucos, porém, os cristáos foram reconsiderando


o .seu modo de ver o servico ñas mü'cias do Imperador. O fato
de aue, a partir de 313, o Imperio deixou ña professar os cultos
pasaos, favorecendo mesmo a expansáo do Evangelho, contri-
buiu para que os cristáos já nao idantificassem «milicia impe
rial» e «culto dos ídolos». Em 314, o Concilio regional de Arles
reconheceu a legitimidade do servico militar. Os grandes dou-
tores da Igreja S. Ambrosio (f 397) e S. Agostinho (t 430),
embora acentuassem o primado do amor na vida crista, julga-
ram admissível que os cristáos participasgam da defesa do bem
cormim, inclusive com o derramamento do seu sangue. Apenas
exigiam que a guerra fosse justa.

3. Na Idade Media foi-se afirmando cada vez mais, entro


os cristáos, a confidencia de que a (juerra pode ser justa.
S. Tomas (t 1274). em sua síntese teológica, estipulou algumas
condigóes indispensávels para se poder falar de «guerra justa»:
— fosse declarada por urna autoridade legítima, em vista
de justos motivos ;
— recorresse únicamente a meios justos, e meios que nao
fossem mais opressivos do que o mal que quisesse combater ;
— tivesse razoável probabilidade de éxito,... e de éxito
apto a compensar os sacrificios efetuados ;

— 173 —
30 ^PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

— a vida dos inocentes e dos náo-combatentes deveria


ser deixada incólume;

— o clero nao deveria tomar parte na luta armada.

Como expressáo da consciéncia medieval de que urna guerra


pode ser justa, citam-se as Cruzadas. Estas foram apregoadas
por santos, em nome da fé, como expressáo da vontade de
Deus («Deus lo volt»); infelizmente motivos políticos as desvir-
tuaram posteriormente, mas inegavelmente a inspiracáo inicial
dos cruzados era religiosa.

Em plena época de Cruzadas, porém, Sao Francisco de


Assis (f 1226) reagiu contra a violencia das guerras, incluindo
na sua «Regra para a Ondem Terceira» a seguinte cláusula :
«É preciso nao se ocupar com armas mortíferas nem trazé-las
ñas vestes contra quem quer que seja» (c. 5). Urna bula pon
tificia confirmou esta admoestacáo do Santo. Note-se, porém,
que mediante tal exortacáo Sao Francisco nao pretendía opor-se
á guerra tida como justa.

4. No sáculo XVI, a objegáo de consciéncia, que desde o


século IV perderá atualidade entre os cristáos, tomou-se de
novo um fato... e um fato cada vez mais vultoso e delicado-
Para tanto contribuiu o surto de algumas seitas protestantes,
que passaram a interpretar rigidamiente a norma do Evangelho:
«Nao oponhais resistencia ao maligno» (Mt 5,39); em conse-
qüéncia, declararam ilícito todo recurso á violencia e estipula-
ram como dever religioso a desobediencia «s leis do recruta-
mento militar, mormente em caso de guerra; tal foi a atitude
dos Menonitas, Dunkers, Schvenkenfelders, Quakers e, mais
recentemente, das Testemunhas de Jeová.

5. No século XX, as duas guerras mundiais deram ampia


ocasiáo a que se levantasse freqüentemente a objecáo de cons
ciéncia. É principalmente da parte de protestantes e de mem-
bros de seitas derivadas do protestantismo que procede a con-
testacáo. Eis o que apontam algumas estatisticas :

De 1914 a 1915 foram julgados na Suíga 350 objetores de


consciéncia, dos quáis 206 apelaram para motivos religiosos,
77 para razóes moráis, e 67 para conceptees políticas ; quase
todos, porém, eram de crenca protestante. Durante a segunda
guerra mundial (1939-1945) contaram-se nos EE.UU. da Amé
rica 30.000 objetores, a maioria dos quais era de confissáo
menonita e quakeriana.

— 174 —
OBJECAO DE CONSCIENCIA __3i

Nos últimos anos, além das seitas protestantes, certas cor-


rentes pacificistas e humanitarias tém desenvolvido intensa
campanha contra a guerra, em prol da paz, suscitando assim
novos arautos da objecáo de consciéncia, até mesmo em países
onde esta nao era praticada. Na Italia, por exemplo, de 1948
a 1971 foram proferidas 157 sentencas condenatorias contra
objetares de consciéncia; algumas foram mesmo repetidamente
infligidas ao mesmo individuo (G. Timocini foi processado seis
vezes). Dessas condenacóes, tres recairam sobre cidadáos cató
licos, tres sobre pacificistas religiosamente indiferentes e as
outras sobre Testemunhas de Jeová.

Pergunta-se agora: diante do fenómeno novo e cada vez


mais vultoso que assim se vai impondo,

2. Qual a posi;áo dos pensadores católicos ?

1. Desde os séculos IV/VI até os primeiros decenios do


século XX, pode-se dizer que a teología católica repelía a obje
cáo de consciéncia.' Após a segunda guerra mundial, porém,
suscitou ou ao menos incrementou novo modo de pensar: as
atrocidades, as perseguigóes, os genocidios e outros males de-
sencadeados por governos beligerantes tornaram-se motivo para
se julgar que nem sempre a obediencia á autoridade civil é o
caminho certo, mas, ao contrario, pode haver circunstancias
em que a resistencia (se nao armada, ao menos passiva e tácita)
vem a ser o alvitre mais condizente com a reta consciéncia.

«Cada ser humano, desde que adulto c sadio, é responsável


pelos atos que pratica». Este principio foi-se tornando cada vez
mais evidente entre os cristáos dos últimos decenios. Nao se
pode preconizar a obediencia cega (como outrora talvez se fi-
zesse), ou seja, a obediencia de quem se limita a seguir a cons
ciéncia alheia sem aplicar a sua consciéncia pessoal a julgar
as ordens de quem manda. É preciso que o subalterno avalie
o que Ihe é ordenado e o assuma conscientemente, de modo a
responder pessoalmente por seu compartamento. Em conse-
qüéncia, nao é lícito a alguém cometer erros objetivos e evi
dentes sob a alegacáo de que os cometeu para cumprir ordens
ou obedecer; quem assim procede, nao se julgue úsento de res-
ponsabilidde (a menos que seja um alienado).

Após a segunda guerra mundial, quando em Nürenberg se


processaram os líderes nazistas, tais verdades vieram mais de

— 175 —
32_ «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

urna vez á baila. O carrasco alemáo Adolf Eichmann, conside


rado autor da «solugáo final» de muitos dramas de judeus, polo
neses e religiosos, desculpava-se perante os tribunais com as
seguintes palavras : «Nao era eu que perseguía os judeus. Era
o Governo... Acuso os govemantes de haver abusado da minha
obediencia. A obediencia sempre foi elogiada como urna virtude.
Por conseguinte, permiti-me que requeira a consideragáo deste
fato !■» Como se sabe, a alegacáo de Eichmann nao foi aceita
pelos juízes.

A responsabilidade pessoal foi também o tema de urna


intervengáo do bispo de Estocolmo, D. John Taylor, na terceira
sessáo do Concilio do Vaticano II (1964) :

«Consideren os crimes monstruosos cometidos em guerra pelas


partes beligerantes; pensai que os cristáos estiveram envolvidos nes-
ses crimes pslo fato de se terem submetido á autoridade sem discus-
soes. Ho¡e em día os cristáos, colocados diante da possibilidade de
crimes ainda mais horrendos, nao podem deixar que somente as auto
ridades civis profiram um ¡uízo moral sobre as guerras. Cabe-lhes a
rerponsabilidade de examinar, segundo a justica e o carídade, as
ordens da autoridade e dar testemunho, segundo a sua conseténcia,
a paz de Cristo e ao caráter sagrado da vida humana».

Finalmente, o Concilio do Vaticano em 1965 promulgou a


sua Constituigáo sobre a Igreja no mundo de hoje, em que faz
eco as ponderagóes anteriores de D. Taylor e outros bispos :

«A dignidade do homem exige que possa agir de acordó com


urna opeáo consciente e livre, isto é, movido e levado por conviccao
pessoal e nao por forca de um impulso interno cegó ou debaíxo de
mera coacao externa» (n° 17).

2. Em conseqüéncia de tais consideraqóes, tem tomado


vulto na teología católica a sentenga favorável á objegáo de
consciéncia em circunstancias determinadas.

E quais seriam os argumentos em que se baseia o parecer


afirmativo ?

1) A consciéncia moral é a norma imediata do compor-


tamento humano. Todo individuo tem o dever e, por isto, tam
bém o direito de seguir a sua consciéncia, pois, em última
análise, é por esta que Deus fala ao homem. Como se com-
preende, á consciéncia compete a obrigagáo de se formar se-

— 176 —
OBJECAO DE CONSCIfiNCIA 33

gundo principios objetivos, levando em conta as leis vigentes c


a situagáo concreta em que deve agir (pois é pelas leis naturais
e positivas assim como pelas circunstancias ida vida que Deus
fala a cada homem). O ditame que a consciéncia moral pro-
fere («é preciso fazer», «é necessário evitar») deve ser res-
peitado pelos demais homens. A consciéncia é algo de indevas-
sável; nao pode ser violentada nem constrangida por algum
individuo ou alguma sociedade, sem que com isto se conculque
a dignidade humana. Em vista disto, o Concilio ido Vaticano II
considera a consciéncia como «o santuario do homem, em que
a sos ele ouve a voz de Deus» :

«Na ¡ntimidade do consciéncia, o homem descobre urna lei. Ele


nao a dá a si mesmo. Mas a ela deve obedecer. Chamando-o sempre
a amar e fazer o bem e evitar o mal, no momento oportuno a voz
desta lei Ihe soa nos ouvidos do coracáo : faze isto, evita aquilo.
De fato, o homem tem urna lei escrita por Deus em seu coracao.
Obedecer a ela é a própria dignidade do homem, que será ¡ulgado
de acordó com essa lei. A consciéncia é o núcleo secretíssimo e o
sacrário do homem, onde ele está sozinho com Deus e onde ressoa
o voz de Deus» (Const. «Gaudium et Spes» n° ló).

2) Ora a guerra, principalmente a guerra moderna, é fe


nómeno ambiguo.

Há quem ncguc p^remptoriamente haver guerras justas,


julgando que em toda guerra o odio, as paixóes sectarias e os
interesses particulares inspiram as partes beligerantes, mesmo
quando afirmam ser movidas por idealismo e humanitarismo.

Outros reconhecem a legitimidade de certas guerras, exi


gidas pela defesa do bem comum, mas estáo conscientes de que,
mesmo nos casos de guerra justa, os males sao tantos e tais
que lhes repugna em consciéncia participar de tal empreendi-
mento que eles reputam praticamente iníquo; com efeito, dizem,
toda guerra, além de punir culpados, atinge também d Moro
samente os inocentes, destruindo casas, aldeias e cidades, de
vastando campos e lavouras, provocando bombardeios «em
tapete» e ou «de represalia», etc. Sao numerosos os que em
conseqüéncia da guerra se lornam mutilados em seu físico ou
neuróticos de guerra, prejudicados para o resto da vida. As
novas armas bélicas, os recursos de estrategia moderna sao tais
que se podem prever ruinas imensas, se nao o exterminio de
nagóes inteiras ou, quicá, da própria humanidade, em' decor-
réncia de urna guerra a ss desencadear nos nossos tempes.

— 177 —
34 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

Por isto há quem conclua que urna guerra em nossos días é


algo de injustificado ou mesmo inconcebível; em vez de re
correr as armas, os povos e governantes em litígio deveriam
procurar resolver suas pendencias segundo meios mais huma
nos e dignos. A propósito há quem cite as palavras do Papa
Joáo XXm :

«Nesta nossa época que se gloria da sua energía atómica, nao


é razoável crer que a guerra seja aínda un meio apto a tirar vinganca
da vlolacao de direitos» (ene. «Pacem in tenis» n' 127).

O Concilio do Vaticano II, por sua vez, observa sabiamente:

«Nao nos engañe a falsa esperanza. Pois sem abandonar as


inimizades e os odios e sem concluir no futuro pactos firmes e hones
tos de paz universal, a humanidade, que ¡á se encontró em situacao
multo crítica, apesar de ser dotada de ciencia admirável, talvez fa
talmente seja levada ao momento em que outra paz nao «xperimente
senao a horrenda paz da morte» (Const. «Gaudíum et Spes> n* 82).

3) Se, pois, a guerra vem a ser um mal — e um mal fre-


qüentemente mais vultoso do que os bens que ela pretende atin
gir ou defender —, a partidpacáo em campanha bélica poderá
ser tida como cooperagáo com o mal. O mesmo se diga a res-
peito da prestacáo de servigo militar: é cooperagáo remota e
¡ndireta com a guerra, pois só se justifica como preparativo
para campanhas bélicas.

Em conseqüéncia, os objetores de consciéncia alegam nao


poder responder — em todo e qualquer caso ou, ao menos, em
certas casos — á convocagáo que a autoridade pública lhes faga
para integrar o exército em guerra ou para prestar servico
militar.

4) Em nao poucas psssoas a objegáo de consciéncia se


baseia também no repudio a todo e qualquer tipo de morticinio.
Judeus e cristáos apelam para o quinto preceito do Decálogo :
«Nao matarás». Os cristáos acrescentam as palavras do Senhor
Jesús no sermáo sobre a montanha, que recomenda nao resis
tir violentamente ao homem mau, mas usar de brandura e amor
para com os semelhantes (cf. Mt 5-7). Os hinduístas, brámanes
e budistas encontram em suas crengas religiosas (na lei da
reencarnacáo, principalmente) o motivo para nao pactuar se-
quer com o morticinio de um animal.

— 178 —
OBJECAO DE CONSCIÉNCIA 35

Os protestos nao violentos, como os empreenderam o


Mahatma Gandhi e o pastor Martín Luther King, seriam a
forma ideal de resposta ás injusticas. As figuras de Sao Fran
cisco de Assis e do Papa Joáo XXm sao freqüentemente evo
cadas por tais pacifistas. O tipo de vida dos «hippies», que pro-
curam nao pactuar com a sociedade, colocando-se á margem
da mesma, recorrendo a trajes, cabeleiras e ornamentos exó
ticos, assumindo atitudes descontraídas ou mesmo acintosar,
seria a manifestacáo de urna objecáo de consciéncia contra as
instituicóes da sociedade de consumo. — É notorio, alias, o
fato de que os «hippies» evocam com simpatía os exemplos de
S. Francisco de Assis, Jesús Cristo, Buda, etc.

Eis como se vai esbozando, tanto dentro como fora do


Catolicismo, o reconhecimento da objecáo de consciéncia como
atitude merecedora ,de atengáo por parta da sociedade contem
poránea.

Poder-se-ia perguntar com especial interesse: e o Concilio


do Vaticano II que posicjio tomou diante do problema assim
colocado ?

É o que vamos considerar sob o título abaixo.

3. E o Concilio do Vaticano II ?

Os ensinamentos do Concilio podem delinear-se do se-


modo :

1) A guerra, nao é, serapre c necessarianrente, algo de


¡ajusto. Nao há dúvida, os povos devem tender a viver em
clima de paz e harmonía internacional. Todavía aínda há in-
fratores da ordem nacional e internacional, faccoes ou nacóes
prepotentes, que violam direitos alheios; daí poder-se compreen-
der a legitimidade da guerra que vise a defender o bem comum
rontra seus adversarios e abrir perspectivas de justica e cola-
boracáo entre os homens.

Sao palavras da Constituigño '¡Gaudium ot Spes» :

«De qualquer maneira, o .guerra nao foi desarraigada da vida


humana. Enquanto, porém, houver perigo de guerra, sem que exisla
uma auloridade internacional competente o dotada de fo reas sufi
cientes, e esgotados todos os meios de nogociaeño pacifica, nao se

— 179 —
36 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

poderá negar aos governos o direito de legítima defesa. Os chefes


de Estado e os outros magistrados que participam da responsabili-
dade dos interesses públicos, tém o dever de salvaguardar os povos
que Ihes sao confiados, dirigindo com grande ponderacao assuntos
tao serios.

Todavia uma coisa é cuidar de assuntos militares com o fim de


defender com justica os povos, outra coisa é querer subjugar outras
nacóes. A forca bélica nao legitima todo e qualquer uso seu, para
fins militares ou políticos. Nem, quando por infelicidade a guerra ¡á
se iniciou, se torna tudo lícito entre as partes inimigas» (n° 79).

Verdade é que nao se pode com facilidade determinar


quando realmente a guerra vem a ser justa. As proposigóes
mesmas do texto ácima insinuam que nem sempre a autoridade
ordena segundo a justiga ou dentro dos limites da respectiva
competencia. Daí nova afirmativa :

2) Diante de abusos do poder (injusticas ou exorbitancias


da autoridade pública), é licito resistir as ordens de quem
manda.

Eis os dizeres da Constituigño «Gaudium et Spes» :

«Quando sao oprimidos pela autoridade pública, que excede a


sua competencia, os cidadaos nao recusem aqueta eolaboracáo obje
tivamente exigida pelo bem comum; contudo é-lhe» lícito defender
os seus direitos e os de seus concidadaos contra o abuso da autori
dade, desde que se observen) os limites trocados pela lei natural e
pelo Evangelho» (n° 74).

MaLs adiante a Constituigáo leva em consideragáo direta-


mente os crimes associados á violencia e á guerra:

«Sao criminosas as acoes deliberadamente opostas ao direito


natural dos povos e aos seus principios universais; criminosas tam-
bém sao as ordens que impoem tais acoes. Nem a obediencia ccga
é capaz de desculpar aqueles que as aceitam. Entre tais acdes, figu
ran», antes do mais, as que t6m por fim o sistemático e metódico ex
terminio de todo um povo, nacáo ou minoría étnica; estas acoes devem
ser condenadas como crimes horrendos, e isto com toda a veeméneia.
Merece elevada aprovacáo a coragem daqueles que nao tém medo
de opor resistencia aberta aos individuos que ordenam tais crimes»
<n» 79».

— 180 —
OBJECAO DE CONSCIfiNCIA 37

Como ss vé, o texto alude diretamente á obediencia cega


e irresponsável, denunciando a ilegitimidade da mesma, pois em
seu nome se cometeram graves crimes nos últimos decenios. É
certo que, para resistir as ordens iníquas de determinado poder
govemamental, se requerem virilidade firme e aceitagáo dos
incómodos e riscos que a resistencia pode acarretar. Todavía
a nobreza de caráter de um homem ide brío e, mais, a integri-
dade do nome de cristáo jcodem exigir, por parte de um cida-
dáo, a aceitagáo de tais perigos.

Sao numerosos os casos de resistencia registrados durante


a guerra de 1939-45. Entre outros, refere-se o do camponés
austríaco Franz Jaegerstaetter, pai de familia, que se recubou
a prestar juramento militar e, por isto, foi condenado a morte
pelos nacional-socialistas.

É em conseqüéncia destas proposigóes que ss compreende


urna nova afirmativa :

3) A objesáo de consciéncia podo aeír legitima e merecer


respeito da parte tanto da opiniáo pública em geral como das
autoridades governamentais.

Assim reza a Constituicáo «Gaudium et Spes» :

«Parece ser justo .que as leís contemplem humanamente o caso


daqueles que, por motivos de consciéncia, recusam pegar em armas
desde que aceitem outra maneira de servir á comunidade humana»
(n' 79).

A elaboragáo deste texto durante as deliberagóes concilia


res foi ardua, pois a questáo parecía delicada. A maioria dos
padres conciliares desejava que a objegáo de consciéncia fosse
apresentada ao mundo como atitude legal a ser reconhecida,
ao passo que urna minoría julgava que o reconhecimento ofi
cial da objegáo de consciéncia por parte do Concilio acarretaria
problemas e dificuldades varias. Finalmente os redatores che-
garam & formulagáo definitiva, em que as expressóes «parece»
e «contemplem humanamente» mitigam a rigidez da afirma-
gáo : o Concilio nao sonriente nao condenou os objetores de
consciéncia, mas padiu para eles um estatuto positivo adequado,
estatuto que os governos civis lhes daráo ou nao, de acordó
com as circunstancias de cada nagáo.

— 181 —
38 'PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

Conclusóo

O significado da nova posicáo dos mestres católicos e das


declaragóes do Concilio do Vaticano II é o seguinte :

Na verdade, seráo sempre relativamente poucos os obje


tares de consciéncia na historia; mas o Concilio e os mestres
contemporáneos concoiTeram ao muios para despertar nos ci-
dadáos do mundo inteiro a consciéncia de que devem refletir
seriamente sobre a liceidade, ou nao, de sua colaboracáo com
empreendimentos bélicos (nao recaiam no que se deu sob o
nacional-socialismo de Adolf Hitler). Aos governantss tocará
também o dever de ponderar atentamente as suas decisóes
antes de as promulgar; caso encontrem resistencia por parte
de algum de seus súditos, nao o condenem sem mais como ini-
migo da prátria, mas antes examinem cuidadosamente os moti
vos por que resiste e, dado que sejam razoáveis, permitam-lhe
atender aos ditames de sua consciéncia ssm prejuiücar o bem
comum (antes contribuindo para o bem da coletividade por
vía que nao lhe acarrete confuto íntimo).

Em última análise, a todo Governo competirá sempre con


ciliar dois valores indiscutiveis:
— a defesa da patria e os meios necessários a este objetivo
(entre os quals está a prestacáo do servico militar);
— a liberdade de consciéncia, que as Constituicdes demo
cráticas garantem aos cidadáos e que a mensagem crista pro
clama com firmeza.

O Estado poderá louvavelmente reconhecer a validado da


objecáo de consciéncia, desde que verifique que
— o cidadáo é sincero na apresentacáo dos seus motivos
de consciéncia,
— o atendimento a tais motivos nao é prejudicial ao bem
comum.

Para muitos cristáos, a objecáo de consciéncia pretende ser


um protesto contra as atuais condicSes da sociedade, em que
os homens matam e ensinam a matar; fabricam armas cada
vez mais aniquiladoras e propagam o seu uso; em conseqüéncia
disto, milhóes de jovens e adultos sao adestrados na arte de
destruir e matar. Aos legítimos objetores de consciéncia pre-
conizam os mestres seja assinalado um «Servico Civu iNacionaJ»,
o qual (se estiver localizado na Europa ou na América do

— 1S2 —
OBJECAO DE CONSCISNCIA 39

Norte) podcra prover também a servicos em favor dos povos


do Terceiro Mundo.

Na Italia, aos 27/7/1971 foi finalmente aprovada a lei que


reconhece a possível legitimidade da objecáo de consciéncia e
assinala as modalidades segundo as quais devem ser tratados
os objetores, a fim de ser respeitados em seus direitos pessoais
sem prejuizo para a patria. — O primeiro projeto de lei na
Italia em favor dos objetores de consciéncia foi apresentado
pelo deputado socialista Umberto Calosso em 1949 !

Passando as circunstancias concretas dos povos latino-ame


ricanos, pode-se crer que nao há serio perigo de serem os ci-
dadáos mobilizados para entrar em guerra contra alguma na-
cáo vizinha do mesmo continente. Um confuto armado entre
dois países da América Latina é pouco provável. Por isto há
entre nos menos ocasiáo para a objecáo de consciéncia do que
cm outros continentes. Esta poderá talvez ser praticada por
membros de seitas religiosas frente á convocacjío para o ser-
vico militar.

Bibliografía:

James H. Forest, "Obiezlone di cosclenza o caso di coscienza", em


'•II Regno", a. XVI. n«? 230. 15/X/71, pp. 336-339.

"Si sll'obiezione di coscienza, ma con processo ideológico", em "II


Regno", a. XVI, n? 228, 1/IX/71, pp. 393s.

a. de Roso, "Riconoscimento giuridlco dell'oblezione di coscienza", em


"La Civilta Catlolica", a. 122, n9 2910, 18/IX/71, pp. 524-528.

Varios autores, "A Igreja no mundo de hoja". Petrópolls 1967 (ver índice
remissivo).

A. Mes*¡nao, "Obiezione di cosclenza", em "Enciclopedia Cattolica" IX.


CiilA del Vaticano, cois. 17-20.

P. Lorson, "Un chrétien peut-ll étre ob|ecteur de conscience?" Paris 1950.

A. de Soras, "Service mlütalre et conscience cathollque". Paris 1S48.

Y. de la Brlére, "Le droit de juste guerre". París 1938.

Católico dos Intelectuals Franceses, "A violencia". Rio f'e Ja


neiro 1269.

Thorna?. Marión, "A Igreja e o Mundo sem Deus", Petrópolis 1970,


po. 55-70.

— 183 —
As esperanzas do momento presente:

jovens e igreja entendem-se?

Em sínlese: As páginas que se seguem, apresentam reflexfies de um


sacerdote francés sobre a juventude contemporánea. Embora algumas de
suas afirmacaes merecam reservas, o artigo, principalmente em sua parte
final, é multo positivo: mostra que a juventude de hoje é exigente, por nSo
se contentar com respostas bañáis ou superficlais; ela tem sede de valores.
Inclusive de oracfio e vida ascética, esperando receber dos mestres os ensl-
namentos respectivos. Aos sacerdotes e educadores compete procurar res
ponder aos jovens em linguagem clara e compreenslvel. A tarefa nño é fácil;
ela só poderá ser bem sucedida, se o educador tlver profunda vida espiritual,
pois esta Ihe abrirá o olho para os designios de Deus e Ihe permitirá dar
o testemunho de um Cristianismo vivo e convicto. Nao é acomodando ou
tralndo as proposlcdes da fé que se obtém frutos de apostolado, mas abrí-
Ihantando essas proposites com palavras e testemunhos de vida adequados.

Besposta: Nao é raro fazer-se a distincáo entre jovens e


Igreja como se fossem realidades radicalmente diversas urna
da outra. Na verdade, todo jovem batizado na Igreja Católica,
pelo fato mesmo de ser batizado, é Igreja. Esta só se encontra
concretamente em seus membros (adolescentes, jovens, adultos,
andaos...). Por isto nao é sempre adequado perguntar se
os jovens (em geral) e a Igreja se conciliam. O que própria-
mente cabe interrogar, é se os modos de pensar e as tendencias
que caracterizam os jovens de hoje, podem encontrar correspon
dencia na Igreja e vice-versa. Todo homem — jovem ou velho
— é feito para a verdade; ora Cristo é a Verdade, que subsiste
na S. Igreja Católica. Resta, porém, a pergunta: haverá possi-
bilidade de que os jovens descubram Cristo na S. Igreja? Tal in-
terrogacáo recebe as mais variadas respostas: ceticismo, con-
fianga, perplexidade, esperanga...

— 184 —
JOVENS E IGREJA 41

Transmitiremos, a seguir, as reflexóes de um pastor de al


mas sobre o assunto: o P.P. - A. Chassagneux, que durante vin-
te e um anas foi assistente espiritual do «Lycée Ampere» em
Liáo (Franga) e atualmente se dedica a grupos de adultos em
procura da fé. Embora o autor seja francés e se refira a am
bientes franceses, o que diz pareos ter valor fora de Franga.
As suas reflexóes, como notaremos, tém seus aspectos de crí
tica exagerada e fora de propósito, mas a leitura do conjunto
poderá ser útil a quem se interessa por problemas de juventude
hoje em dia.

OS JOVENS E A IGREJA

Se em 1930 eu tivesse feito a um jovem cristáo a pergunta: «Que


esperas da Igreja?», ele me teña respondido sem hesitar: «O céu, a
vida eterna».

A mesma pergunta um jovem cristáo de 1971 respondería: «Um


mundo melhor, urna vida mais fraterna, menos ¡njustica e mais amor».
As perspectivas mudaram profundamente!... Para muitos jovens, so-
mente a lgr«¡a é capaz de construir um mundo fraterno, desde que Ela
seja fiel ao Espirito de Cristo...

Mas de que ¡ovens se trata senao daqueles que conheco, com


quem vivo. . .? Jovens do ciclo secundario ou mais amadurecidos, dos
18 aos 25 anos, os quais deixaram .a lgre¡c ou nela se encontram
geralmente insatisfeitos. Foi a eles que interrogue!.

As recusas tíos jovens

a. é preciso viver familiarmente co meles para tomar conscién-


cia de quanto a Igreia oficial Ihes é estranha. Acompanham, como
os adultos, os acontecimentos da Igreja, mas com ironía desconcer
tante: viagsns do Papa, declaracóes dos bispos, manifestagóes reli
giosas de toda especie.. . Mas eles sabem que a vida nao consiste
nisso, que ela se desenrola alhures... De resto, a Igreja fica tao
distante para elesl... J. F. dizia-me um dia durante urna reunido:
«O bispo de Liáo, nao o conheco. Eu o vi de longe no día da minha
crisma; falou-me em latim, fez sobre mim alguns gestos mágicos. Gos-
taria de encontrar-me com ele urna noíte, com alguns companheiros,
para falar-lhe livremenre. Mas seria ele capaz de nos escutar, de nos
compreender?»

Nao obstante, J. F. gosta da sua Igreja. Por um certo tempo,


ele a deixou em favor do marxismo, mas nao a pode esquecer; ele

— 185 —
42 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

tem o estima da Igreja no coracao; é ele quem está organizando sis


temáticamente urna das nossas melhores comunidades «selvagens»
(assim chamadas porque esporádicas), que reúne dezessete estudantes
de 20 a 25 anos.

A autoridade que venha do alto com palavras platónicas, com


gestos paternais, a autoridade que eré que tudo sabe e que ¡amáis
se compromete..., urna tal autoridade nao existe para os jovens.
Na Universidade, na usina, eles procuram contatos humanos, autén
ticos, cotidianos; eles sabem que tém algo a revelar ao mundo...

b. Os jovens trazem no coracao urna outra recusa: a de urna


liturgia morra, esclerosada, que nao exprima a realidade da vida.
Sem dúvida, foram feitas reformas; elas representan! todas um esforco
de boa vontade, mas nao resolvem; sao «reformazinhas» que nao
atrairam á Igreja nenhum novo membro, ao passo que afastaram to
talmente alguns tradicionalistas.

.. . Batísmo por ocasiáo do nascimento, Crisma aos 9 anos, Co


mún han solene aos 12 anos. .. E pronto!... Mas que dizer da po
breza ¡nrelectual, da moral negativa de urna religiosidade de epopéia
ou de evasáo? Que lugar se dá á fé? ... Á pessoa de Jesús?

c. A terceira recusa dos ¡ovens é a de urna teologia bem estru-


turada demaís. ..

A religiao morreu no coracao dos ¡ovens, no de muí tos fiéis, a reli-


giño — digo — que nasce do médo, da necessidade de seguranca,
da procura de estabilídade burguesa. Talvez tenha chegado a hora
da fé? Ss a religiao é urna resposta ficticia as necessidades instinti
vas do homem, a fé, ao contrario, é urna livre adesáo, urna resposta
pessoal ao Deus interior que nos chama.

Para os ¡ovens que me ce rea m, a religiao morreu e sao inúteis


todos os esforcos destinados o fazé-la reviver. Esses esforcos podem
distrair agradavelmente, atrair alguns individuos, mas receio que nao
os levem ao Deus de Jesús. «Deixa a tua térra, a tua parentela, os
teus costantes e corre a aventura que eu te indicareis.

Tais sao, em poucas palavras, as tres recusas essenciais dos


¡ovens de 20 anos frente á Igreja e ao seu ensinamento.

E agora as suas necessidades

a. Perdidos num mundo sem alma, numa sociedade anónima,


eles precisam de amizade. Querem ser «chamados» por seu nome, ser

— 186 —
JOVENS E IGREJA 43

acolhidos na assembléia eucarística como amigos, encontrar-se fra


ternalmente com outros. Em nossas Missas, o Oficio cometa por um
intercambio amigo entre os participantes: trata-se de irmáos que vfio
compartilhar a refeicao semanal. Donde a necessidade de pequeñas
comunidades cristas.

A principio, ¡ludimo-nos, formando grupos de quinze a vinte ¡o-


vens, rapazes e mocas. Em breve, porém, passamos a constituir co
munidades de dez metnbros, com dois ou tres encontros mensais: esses
encontros constam de urna refeicao comum, distribuicáo de tarefas,
troca de idéias sobre a doutrina da fé e a moral, mas sempre sobre
pontos precisos, que cada um elabora em casa e debate previamente
com um sacerdote. No encerramento de tudo vem a Eucaristía... De
secamos constituir comunidades dinámicas, capazes de acolher o to
dos, capazes também de se abrir para outros grupos ou para as comu
nidades paroquiais...

Creio que temos de multiplicar esses ensaios de comunidades de


base. A funcáo do padre consistirá entao em viver, na amizade e
na confianca absoluta, com os animadores responsáveis. Estes devem
sentir-se plenamente adultos em suas decisóes e posso assegurar-vos
que eles sabem dar prova de maturidade que muitos adultos de qua-
renta anos poderiam invejar.

Ao lado dessas comunidades cristas de ¡ovens, nascem outros


grupos que chamo «selvagens», esporádicos, sem programa fixo. No
momento tenho sob as minhas vistas grupos desse tipo, reunidos cada
qual em torno de um ou dois cristaos seguros: estes ousaram procla
mar alegremente a sua fé em seu ambiente e assim colocaran) o pro
blema da Cristo para os colegas. Nesses grupos faz-se um trabalho
missionário maravilhoso. Cultiva-se neles a necessidade de amizade
mediante urna pequeña comunidade largamente «berta para a Igreja;
essa Igreja, eles tém que descobri-la aos poucos na sua integridade
atual e na sua historia passada.

b. Urna coisa pode surpreender os adultos que nao conhecam


os ¡ovens senáo através do folclore do seu comportamento ou da sua
linguagem: a necessidade muito profunda que eles tém de cultura e de
vida religiosa. Eles deixaram — ou deixam nossas ¡grejas — nao
porque se Ihe: ¡mponham exigencias demasiadas, mas porque nada se
Ihes comunica... Os grandes problemas ficam abertos na mente dos
jovens e pedem urna resposta atual: criacáo e evo luga o, imortalidade
do espirito, Deus-Amor, Cristo Filho do Homem ou Filho de Deus, Eu
caristía, como ler ho¡e o Evangelho, questoes de ¡ustica. . .

É preciso escutar os jovens longamente, com atencáo e respeito,


compreender a sua angustia metafísica diante do vazio de sua exis-

— 187 —
44 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

téncia e frente á pobreza de nossas respostas. .. A seguir, faz-se mis-


ter construir com eles, toteando, perscrufando por vezes: nao tenha-
mos respostas prontas, eles nao as admitem. Mas com eles procuramos,
construímos, sofremos, e nossas paiavras sao tao pobres em relacáo ao
absoluto e ao infinito do que desejaríamos exprimir! Neste ponto, a
nossa posicao é muito desconfortável: nada ceder da nossa fé para
agradar aos incrédulos e atrair os indiferentes, como também nada
guardar que nao esteja ligado ao essencial, ao fundamental. Ora
temos a impressáo de estar muito sozinhos nessa procura {do equili
brio) em que, afinal de coritas, comprometemos a Igreja inteira...
Ouso clamar: somente urna vida espiritual pessoal pode-nos <ajudar a
perseverar e a caminhar na noite. É bom termos também junto a nos
amigos — leigos ou padres, e principalmente teólogos — que possam
ao menos ocultamente apoiar-nos e esclarecer-nos. Neste setor, os
¡ovens sao muito exigentes; nao sao como nos, embarazados em fórmu
las ¡ó feitas. Eles sao juvenis, prontos a acolher o Cristo: é esta a
vantagem deles e é também a nossa difícil tarefa.

Resumo meu pensamento: outrora a fé nos era entregue s-em ade-


sao pessoal, caída de paraqueda, por via de autoridade. Hoje a fé
deve brotar, por dom do Espirito, no coracao mesmo do homem: ela
é a resposta pessoal ao Apelo.

c. Uve que interromper por duas horas este trabalhho, a fim


de conversar com tres ¡ovens de Liao, estudantes em grandes escolas
de París, que se acham em ferias: «Padre, ensine-nos a orar, a viver
urna vida exigente». O pedido deles, que eu resumo nestas paiavras,
coincide admiravelmente com o que eu quisera escrever em conciusSo
deste artigo.

Os jovens — e os adultos também — nos comunicam em alta


voz a sua necessidade de vida espiritual: a nossa Igreja, com as re
formas mais radicáis da liturgia, do clero, da fé, perderá sua chance
se Ela nao for capaz de nos dar o gosto da verdad eirá oracao, da
meditacáo. Nos nao podemos voltar atrás em nossas oracóes vocais,
restaurando a liturgia arcaica, que inegavelmente foi útil e santificante
para as geracóes precedentes. Suprimimos todas as formas exteriores
da vida crista; mas que colocamos em lugar délas? — Nada, na maio-
ría dos casos; daí a nossa atual pobreza religiosa. Tcnho por vezes a
impressáo de que estamos a construir um Cristianismo sem Cristo e,
por conseguinte, sem alma. Se assim é, estamos a perder o nosso tem-
po, pois vamos construindo nossa casa sobre areia movedica, e nao
sobre a rocha.

Em nossas comunidades de jovens, colocamos no primeiro plano


de nossas preocupacoes a vida com o Espirito Santo. «Deus é mais eu

— 188 —
JOVENS E IGREJA 45

mesmo do que eu mesmo:». Nossos ¡ovsns, mais conscientemente, pre-


cisam de urna fé pessoal, alimentada por Cristo e pela pessoa de
Cristo. Cuidamos dentáis de procurar métodos técnicos — certamente
úteis —, mas muito secundarios. «Para mim, a vida é o Cristo». Sao
Paulo é sempre atual.

E, guando falo de oracáo, de interioridade dos jovens, d-esejo


mencionar tambérn a sua necessidade de ascese. Fazer-se homem,
construir a sua vida, guardar fidelidade religiosa ou conjugal, is:o só é
dado as almas 'fortes. Ora «quem é fiel ñas coisas pequeñas, o será
também ñas grandes»: a palavra ds Jesús aínda é válida.

Que concluiremos? Urna grande esperanca: esta exigirá de todos


nos, leigos e padres, muito trabalho, muita santidade e veracidade.
Temos qu.3 assegurar urna transformando: a de urna religiosidade que
vai definhando, em urna fé crista viva, que quer encontrar de novo
o fervor das suas origens. Nao há dúvida, teremos de aceitar a con-
dicáo de sermos um pequeño número, e de vir a ser «sal, luz e fermen
to do mundo». Mas tenho confianca, pois o Espirito está agindo em
nossa Igreja e no cora cao de toda a humanidade. A nos toca ir ao en
contró do Espirito na paciencia e na fé.

As rcfloxóes do P. Chassagneux sugerem alguns comen


tarios.

1. Mensagem positiva

Sao principalmente os incisos fináis do artigo transcrito que


interessam ao educador. Neles encontram-se algumas observa-
Cóes importantes:

1.1. Juventude e sede de valores

Se existem jovens de atitudes vazias e sarcásticas, nao de-


vem fazer esquecer que outros muitos há que procuram con-
ceber e construir um ideal de vida. A juventude pode empol-
gar-se pelas grandes propostas. O mestre ou educador que ig
nora isto, procurará «facilitar» ou «adodcar» a vida crista
para os jovens; mas, assim procedendo, nao os atingirá plena
mente, antes arriscar-se-á a ser decepcionado.

De modo especial, a sede de valores nos jovens cristáos


traduz-se por

— sede de verdade. As grandes questóes interpelan! viva


mente a juventude : «Donde vimos ? Para onde caminhamos ?

— 189 —
46 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 148/1972

Quem é Deus ? Quem é Cristo ...» É necessário que os


mestres os ajudem com firmeza e clareza a encontrar
a resposta para tais interrogagóes. Nao receiem aborda-las,
desde que o facam com o devido preparo. No tocante a doutri-
na da fé, o P. Chassagneux lembra que nao deve ser adaptada
ou acomodaaa a fim de agradar a incrédulos ou indiferentes. Na
verdade, se um jovem descobre que seu mestre «ajeita» a dou-
trina traicoeiramente, fácilmente pode julgar que nem o mestre
eré no que professa. Tal mestre se desmoraliza e desautora, ao
passo que quem tem a coragem de dizer a verdade em sua in-
tegridade (embora seja dura), muito mais se recomenda ou
impóe aos «discípulos. Um tal mestre apresenta um Cristianis
mo acreditado e vivido — o que mais convence do que a apre-
sentagáo de um Cristianismo diluido.

— sede de vida coerento, ou seja, de conversáo, que sempre


implica renuncia á infidelidade e á traigáo, vivencia na amizade
ao próximo. É o que também se chama «autenticidades;

— sede de vida espiritual, que se concretiza fortemente na


oragáo. Sim; o encontró com Deus, seja em coloquio íntimo,
seja mima assembléia comunitaria, pode atrair os jovens. Para
que isto se d§, é preciso explicar-lhes o que é orar, como se des
cobre Deus e como se comega a «saborear» a presenga de Deus.
Os mestres da vida espiritual nao devem faltar junto aos jovens.

1.2. A esperanza de pastores e educadores

Por certo, nao é fácil lidar com a juventude de hoje, pois


sem cerimónias ela propóe perguntas fundamentáis e espera
respostas táo cabais quanto possível; «agua de rosas» nao a
contenta1. Daí a necessidade de preparo para a pastoral da
juventude. Este preparo implica alguns recursos humanos (de
psicologia, pedagogía, dinámica...), mas principalmente urna
sólida vida interior; quem vive profundamente com Deus, vai
adquirindo cada vez mais o senso de Deus ou as «antenas» opor
tunas para distinguir verdade e erro, virtude e vicio; habilita
re a compreender o plano do Senhor e a resposta que Ele pede
«hoje e aqui»; nao ministrará um Cristianismo sem alma, sem
entusiasmo, incapaz de satisfazer a urna alma jovem.

1É claro que esta aflrmacfio genérica sofre excecoes: exlstem, sem


dúvlda, jovens mediocres. Mas o que Importa ao educador, é saber que
mesmo nos jovens aparentemente mais descontrolados pode existir senslbl-
Ildade para as questOes básicas da vida. Essa sensibilidade chega por vezes
a surpreender o educador, desde que este a quelra provar e desenvolver.

— 190 —
JOVENS E IGREJA £7

2. Observares complementares

1. O artigo do P. Chassagneux apresenta, por vezes, um


forte contraste entre o passado da Igreja e a sua nova imagem:
liturgia, catequese, atitudes religiosas de outrora sao assim
criticadas.

Parece-nos que no setor das críticas é preciso sejamos cau


telosos; é fácil cair em exageros injustos, quando se julgam
as expressóes do Cristianismo de nossos país; estes nao deixa-
ram de ter seu zelo; procuraram acertar dentro das circunstan
cias de seu tempo, mesmo quando nos deixaram exemplos que
hoja nao entendemos ou nao ousaríamos reproduzir como tais.

2. Mesmo em relacáo á Igreja de hoje, pós-conciliar, deve-


-se recomendar respeito e reverencia: a crítica pode ser útil,
desde que bem pensada e oportunamente proposta a quem com
pete ouvi-la. É mister, porém, que nao se lance o descrédito
sobra as pessoas, as instituigSes e as normas .da Igreja. Esta
tem consciéncia de que vive tempos novos aos quais se deve
adaptar sem trair o Cristo; nao existem, porém, modelos de
adaptasáo pré-fabricados; é preciso descobri-los. Ao pastor e
educador compete, antes do mais, despertar nos jovens cristaos
a conviegáo de que eles sao Igreja, e de que, por conseguinte,
devem participar da vida da Igreja dando a esta a sua contn-
buigáo especifica, juvenil. De modo especial, tenha-se em conta
que a Liturgia, embora deva ser viva e significativa, nunca po-
derá ser «banal» ou nunca poderá ser táo cha que perca o seu
caráter simbolista e hierático.

3 O P Chassagneux distingue entre religiáo e fé. A dis-


tincáo tem sido mais e mais utilizada no vocabulario teológico.
ReMei&o significa, no caso, o relacionamento interesseiro e in
fantil do homem com Deus, relacionamento que fácilmente se
exterioriza em rituais exuberantes ou mágicos. Fe designa a
adesáo interior e madura do cristáo ao Senhor, adesao, porem,
que nao pode dispensar formas de expressáo visiveis e sacra
mentáis.
Possam os aspectos positivos do artigo do P. Chassagneux
despertar em todos os leitores profunda esperanga no futuro
da Igreja e da humanidade! A atual geragáo de católicos com
pete assumir a sua responsabilidade, vivendo coerentemente a
sua fé e transmitindo-a com clareza e conviegáo.

Esteváo Bettencourt O. S. B.

— 191 —
resenha de livros
A juventnde é urna parábola, pelo Pe. Zézinho SCJ. Colecto «Ali-
cerce» 2. — EdicSes Paulinas, Sao Paulo 1971, 120 x 195 mro, 109 pp.

Diga ao mundo que sou jovem, pelo Pe. Zézinho SCJ. Colecto «Ali
coree» 2. — EdicSes Paulinas, Sao Paulo 1972, 120x195 mm, 75 pp.

O Pe. José Fernandes de Oiveira SCJ (Pe. Zézinho) tem-se dedi


cado com grande éxito ao apostolado entre os jovens. Bom conhece-
dor dos interesses e dos problemas da mocidade, sabe abordar de
maneira agradável os temas que dizem respeito á formacáo religiosa
e moral dos seus leitores, conservando em tudo seguranca de doutrina
e íidelidade ás normas da fé.

O primeiro livro tem em mira grupos de reflexáo; através de es-


tórias e imagens muito íelizes ilustra o que sejam a vida espiritual,
a orac.Ho, a dignidade de caráter, a aceitacáo do próximo, a morte...
O segundo opúsculo reproduz as reflexóes de Roberto, estudante de
19 anos, sobre relaedes dos íilhos com os pais, com os amigos, com
o mundo, colocando sempre urna perspectiva auténticamente crista
em todas as questóes de que trata.

Já que nao é fácil encontrarem-se associadas a linguagem j


e a íidelidade á doutrina católica na literatura desse tipo, merece espe
cial elogio a obra do Pe. Zézinho.

Historia da Palestina, por Rolf Reichert. — Editora Herder com a


colaboracao da Universidade de Sao Paulo, Sao Paulo 1972, 140x210 mm,
411 pp.

Esta obra é pioneira no seu género em lingua portuguesa. Recor-


rendo a boa documentacáo, descreve de maneira interessante a historia
acidentada de Israel desde os tempos dos Patriarcas (séc. XIX a.C.)
até nosos dias, aludindo sumariamente ao periodo narrado pela Biblia.
Entre outras coisas, o autor pretende mostrar que judeus e árabes
muculmanos sao povos tradicionalmente amigos; só se tornaram
mutuamente hostis no séc. XX por intervengáo das potencias euro-
péias. O livro recomenda-se aos estudiosos, podendo ser especialmente
útil aos que se dedicam á historia bíblica e á da Igreja. Recoloca os
quadros do Antigo e do Novo Testamento no contexto da historia
universal.

A respeito do «Catecismo existencia!» de Carmen Mendonca recen-


seado em PR 146/1972, pp. 54s, desejamos acrescentar que em alguns
tópicos o livro merece pequeños retoques para se tornar mais claro.
Asslm a p. 58, quando íala da maneira como nos libertamos do pecado
original, alude apenas aos meios moráis (opcao voluntaria da crianca
e do adulto), sem mencionar o sacramento do Batismo (trata dos sa
cramentos alhures). Á p. 297, a frase «Nosso Senhor fica presente no
pao e no vinho» pode sugerir que após a consagracao da Missa Cristo,
o pao e o vinho estao simultáneamente presentes sobre o altar; na
verdade, a teología ensina a conversáo da substancia do pao e do
vinho no Corpo, no Sangue, na Alma e na Divindade de Cristo.

E. B.

— 192 —
NO PRÓXIMO NÚMERO :'

Cantestacao na Igreja (!)•

«Missa Leiga» no teatro

«Igreja Brasileira» (ICAB)

Pentecostais católicos

«PERGUNTE E RESPONDERÉ MOS »

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Número avulsc*. de .qualquer mes Cr$.'


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