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Vida sintética
Desde Von Neumann, afirma-se, sem nenhuma resistência, que organismos, da
bactéria aos seres humanos, podem ser vistos como sistemas computacionalmente
possíveis. Retomando as teorias acima expostas, a simulação dos sistemas vivos
ocorre em processos conceituais que geram informação no espaço virtual do
computador e afirmam a existência de uma ciência do artificial pela capacidade de
processar informação em moldes genéticos. Nessa direção, Herbert Simon, cientista da
computação laureado com Prêmio Nobel, em seu livro The Sciences of the Artificial,
considera a presença do computador como modelo de raciocínio para a humanidade.
Sendo um dos cientistas pioneiros da inteligência artificial, encontra no computador
uma forma de se experimentar a idéia de complexidade de sistemas artificiais. Ele
assim se manifesta sobre essas questões: “The computer is a member of an important
family of artifacts called symbol systems” (apud Ullman, 2002:61). Para ele, de um lado
está o mundo natural com a existência de leis que possuem a autoridade de determinar
o que a vida deve ser. Do outro, está o mundo artificial que, ao contrário, é projetado ou
composto sob a premissa do que pode ou não ser. Esta afirmação converge para o
interesse da criatividade do artista em verificar como tipos de vida em sistemas
artificiais podem ser regidos por probabilidades da imaginação, utilizando tipos de
programação que geram mundos possíveis.
Comportamento do ambiente
O conceito de sistemas vivos tem como ponto chave o comportamento desse
sistema. Para as teorias científicas contemporâneas, na vida, a entropia e a desordem
não são sistemas de exclusão, mas de interação biológica de seus elementos em auto-
organização. A noção de entropia foi colocada por Norbert Wiener, o pai da cibernética,
professor do MIT, que via o diálogo do homem com as máquinas como um grande
mecanismo de feedback. Para o cientista, as respostas de uma máquina para os
animais são mecanismos de aprendizagem. As relações da comunicação estão sujeitas
à entropia, como uma força subversiva que impede a contínua troca da vida,
provocando a falência de um sistema e de seu controle na transmissão das
informações. Mas as concepções mecânicas da máquina que imita as ações humanas
se modificam pela revolução da informática. Quando a noção de auto-controle surge
com os avanços da informática e nos traz os sistemas que se auto-organizam, o
conceito de coisas vivas e a hibridização de biologia e tecnologia é uma realidade. Um
comportamento que evolui é propiciado pelos circuitos eletrônicos e pela computação
paralela feita por milhares de processadores lincados, regidos por programas que não
seguem lógicas lineares. Na segunda cibernética e com os comportamentos evolutivos,
a definição de auto-organização de um ambiente está ligada à noção de autopoiesis,
como comportamentos de um sistema que se auto-regenera. Surgem na teoria de
Prigogine os conceitos de negantropria e extropia que se tornam fundamentais como
qualidades próprias dos sistemas auto-reguladores que geram vida. Negantropia são
ordens contrárias que repõe a vida no sistema. Para o cientista, extropia é o limiar em
que um sistema complexo, definido como uma rede de muitas interações de elementos,
exibe o comportamento de auto-organização e realmente cria uma estrutura supra-
hierárquica maior do que a soma individual das partes que agem num sistema. Uma
das coisas notadas é que a entropia, conforme a teoria do caos e a segunda lei da
termodinâmica, se manifesta como ativa e energética. Assim a entropia tem um looping
contínuo (endless) e não pode ser vista como a fria morte no espaço. A extropia, por
seu turno, consiste na forca que causa num sistema entrópico a possibilidade de
emergir outros estados internos de vida.
reprodução dos indivíduos melhor adaptados. O ser vivo é um sistema aberto que troca
energia com seu ambiente e sua estabilidade está baseada na proliferação das células
que o constituem. Para o geneticista Gregor Mendel, com as leis da hereditariedade,
uma população ou um indivíduo sofrem variações na espécie. Logo, a reprodução e a
variação são próprias da evolução. Uma mutação é um acidente aleatório acontecido
no momento de uma reprodução. Esse crescimento organizacional é obtido em muitos
softwares com propriedades de auto-organização. Entre outros estão Game of life, as
redes neurais com sua aprendizagem artificial e capacidade adaptativa, os algoritmos
genéticos que simulam evolução em vida artificial, o comportamento de agentes em
sistemas de inteligência artificial, os fractais, todos programas computacionais com
qualidades evolutivas.
Kevin Kelly, editor da Wired, fala dessas interações como uma “neo-biologia”
(2002:216), faz relações da tecnologia com ecologia e enfatiza a noção de botton-up e
de comportamento emergente, como possibilidade de elementos de um sistema
desenvolverem seu próprio comportamento em nível de complexidade em que cada
organismo atua e atinge um ponto onde colônias podem emergir de uma simples
categoria, dotando o sistema de comportamentos. Nessa direção, as noções de modelo
genético são usadas para criar vida artificial no ciberespaço, como comportamentos de
gens que evoluem fazendo aparecer uma “fitness landscape” em programas
computacionais e pondo em discussão a dicotomia artificial e real.
Karl Sims é tido como o pioneiro das interações entre o público e o computador
em ambientes artificiais. Seu Genetic Images, inclui captadores que registram os sinais
e permitem escolher as imagens que vão evoluir como pequenas criaturas que fazem
parte de um ecossistema sintético. Outro artista pioneiro em vida artificial é o francês
Louis Bec que cria um sistema “hypozoologico” em que se interage com um papel de
“zoosistemicista”. O teórico e artista combina sua formação em zoologia, filosofia e arte
para produzir suas obras. Como exemplo, faz pesquisas que captam a eletricidade de
peixes enviada para o computador criando um outro ecossistema, em morfogêneses,
modelagem bio-digital, zoohologramas como potencial gerativo da imaginação. São
sistemas de tecnobiodiversidade em convergências da vida natural e sinais vivos.
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***
1
NOTAS:
Engenheira de software com pesquisas nas fronteiras do humano e das tecnologias, autora de vários textos
sobre o assunto.
2
Vejam-se Publicações que traçam a história do ciberespaço com destaque SPILLER (2000) e RANDAL &
JORDAN 2001.
3
O matemático Von Neumann pretendia uma duplicação das máquinas com um exemplar próximo de seu
original, considerando-a como uma espécie “viva”. Construiu um modelo abstrato sob a forma de um tabuleiro
de plano infinito em que cada estado era caracterizado por quatro estados vizinhos, estabeleceu regras de
transição de um estado para outro e mostrou que algumas configurações são capazes de se reproduzirem.
4
http://www.hip.atr.co.jp/-ray/tierra/tierra.html e ainda uma outra versão em VRML em
http://www.construct.net/tierra/
5
Para consulta, visite na rede: www.biota.org
6
Veja-se a teoria de Couchot, Tramus e Bret (2003), em texto específico sobre o assunto ou ainda em
Domingues 2002: 83, que expandem essas questões da evolução de vida por tipos de interatividade em
ambientes sintéticos.
7
Veja-se capítulo específico sobre a vida artificial na rede em DAMER (1998)
8
Sobre o modelo de interação para sincronização, reconhecimento da mão, sensor dos batimentos cardíacos,
configuração do software no texto específico da autora (Tosa, 2003:247).
9
Grupo de Pesquisa Integrada ARTECNO: Novas Tecnologias nas Artes Visuais / UCS / CNPq / FAPERGS.
Equipe 2004: Coordenadora: Prof. Dra. Diana Domingues; Programador: Gelson Cardoso Reinaldo – UCS;
Gustavo Brandalise Lazzarotto – IC CNPq; Artes e Comunicação: Eleandra Gabriela Cavalli – BIC FAPERGS;
Elisabete Bianchi – UCS; Maurício Vazquez – PIBIC CNPq; Solange Rossa Baldisserotto – AT CNPq; Junius
Kurtz – BIC UCS; Ciência da Computação: Maurício dos Passos - PIBIC CNPq; Matemática: Patrícia Rigon – IC
CNPq. Apoios: Universidade de Caxias do Sul - UCS, CNPq e FAPERGS.