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EDITORIAL

A vocação da Igreja
SUMÁRIO
OUTUBRO 2009/08

O
Evangelho de Marcos, primeiro texto catequético da
comunidade primitiva, foi escrito com a finalidade de res-
ponder à pergunta: “quem é Jesus”? Pedro faz a solene
declaração “Tu és o Messias” (Mc 8, 29). Essa profissão
de fé sintetiza quem Jesus é e faz: mestre, profeta, reve-
lador, ungido pelo Espírito de Deus. Depois dessa primeira
resposta o Evangelho nos ajuda a entender que tipo de Messias é 1. Um novo olhar
Jesus. Enviado pelo Pai, Ele anuncia a Boa Notícia do Reino. E foi só para uma nova Missão.
começar sua Missão que encontrou muita resistência por parte dos Arte: Cleber Pires
anciãos (latifundiários), dos sumos sacerdotes (políticos) e doutores
2 - 12ª Romaria a Pé em São Paulo.
da Lei (donos da verdade, do poder ideológico), todos membros do Foto: Jaime C. Patias
Sinédrio, o tribunal supremo daquele tempo. Sua vida neste mundo
é marcada pelo conflito com os poderes e estruturas que rejeitam a
 Mural-----------------------------------------------------04
novidade do Evangelho. O Messias (Cristo, em grego) sabe que será Cartas
morto e fala disso abertamente. Mas as instituições de morte não
terão a última palavra. Por sua fidelidade ao plano de Deus, Jesus é  OPINIÃO--------------------------------------------------05
Frei Tito 35 anos depois
duplamente julgado pelos fariseus e romanos. É torturado, zombado Júlio César Caldeira
e pregado numa cruz, mas ressuscita vencendo a morte, garantindo
 África----------------------------------------------------06
a vida eterna para todos. Ressuscitado, Jesus envia seus discípulos A Missão como reconciliação
para dar continuidade à sua Missão em toda a terra. Michael Mutinda
Tendo passado mais de dois mil anos, o envio de discípulos e
 PRÓ-VOCAÇÕES----------------------------------------07
discípulas é extremamente atual. A Igreja existe para evangelizar e A vocação revela a nobreza do ser humano
nos recorda que somos “Enviados para anunciar a Boa Nova” (Lc Rosa Clara Franzoi
4, 18). Essa é a ideia central da Campanha Missionária, realizada  VOLTA AO MUNDO-------------------------------------08
durante o mês de outubro em todo Notícias do Mundo
Pedro Facci

mundo, que tem seu ponto mais alto Agência Ecclesia / Fides / ZENIT
no Dia Mundial das Missões, penúltimo  ESPIRITUALIDADE----------------------------------------10
domingo do mês (este ano, dia 18). Aprendendo com Maria
A responsabilidade pelas Missões é Patrick Gomes Silva
de todos os batizados convocados a  TESTEMUNHO-------------------------------------------12
participar com orações, contribuições Discípulos missionários de Jesus
para projetos missionários em várias Fátima Elisa dos Santos e Luís Baseggio
frentes ou colocando-se à disposição  FÉ E POLÍTICA -------------------------------------------14
para dar testemunho de Jesus além de O tempo da política
Humberto Dantas
suas fronteiras geográficas, culturais
e eclesiais. O objetivo é iluminar todos  FORMAÇÃO MISSIONÁRIA ---------------------------15
os povos com a luz do Evangelho. Fonte e critério da Missão
Criança em Bangladesh. Luiz Augusto Ramos Viera
E não se trata de dar coisas, mas
Aquele que temos, a razão da nossa fé: Jesus Cristo.  Juventude missionária ----------------------------19
Mas, o que significa ser discípulo missionário de Jesus? A Personagens em EducAção
Vanessa Ramos
resposta a essa pergunta nos é dada pelo próprio Mestre, em três
condições: renunciar a si mesmo, tomar a cruz e segui-Lo (Cf Mc 8,  DESTAQUE DO MÊS -----------------------------------20
Campanha Missionária 2009
34). Quem estiver disposto a renunciar a si mesmo estará livre para Vitor Agnaldo de Menezes
a Missão. Generosidade, disponibilidade e gratuidade são valores
fundamentais na vida dos discípulos e discípulas. Tomar a cruz é  especial -------------------------------------------------22
A Mãe Consoladora. Mais vida em Jaguarari.
aceitar ser perseguido, e se necessário, “perder a vida” por causa do Cristina Ribeiro Silva
Reino. Seguir Jesus é aceitar ir com Ele até o fim, enfrentando todas
as hostilidades da sociedade. Deveríamos fugir sempre da tentação  IGREJA ----------------------------------------------------23
As religiões a serviço da paz
de fazer com que o Messias se torne alguém segundo nossa imagem Mário de Carli
e semelhança, para nos tornarmos à imagem e semelhança Dele.
 infância missionária ------------------------------24
Esta edição traz artigos, testemunhos, reflexões e informações para É Missão de todos nós! Deus chama!
ajudar a viver a nossa vocação missionária muito além do Mês das Roseane de Araújo Silva
Missões, lembrando que evangelizar constitui a missão essencial
 ENTREVISTA FRANCIS NJOROGE --------------------26
da Igreja. A Conferência de Aparecida evidenciou essa vocação da Identidade e inclusão
Igreja. As matérias aqui publicadas, retratam a Missão no plural vista Karla Maria
como testemunho de vida, primeiro anúncio (Ad Gentes), diálogo  ATUALIDADE----------------------------------------------28
inter-religioso, nova evangelização, reevangelização, justiça, paz e Vamos caminhar, Povo de Deus!
integridade da criação, promoção humana, com especial chamada Jaime Carlos Patias
para a Missão além-fronteiras com um olhar de discípulo.   volta ao brasil---------------------------------------30
CNBB / CPT / Notícias do Planalto / revista Missões

- Outubro 2009 3
Mural do Leitor
Ano XXXVI - Nº 08 Outubro 2009 Revista Missões (não-Yanomamis): membros da equipe
A revista Missões traz em seu conteúdo e assessoras. Os participantes foram
Diretor: Jaime Carlos Patias uma grande ajuda para nós, animadores acolhidos com pinturas corporais, cantos
das CEBs, mantendo-nos informados. Sou e danças. Após a apresentação, foram
Editor: Maria Emerenciana Raia imensamente grata por ter conhecido e organizados em sete grupos, cada um com
ajudado a divulgar a revista para os ani- um secretário-responsável e um napëpë.
Equipe de Redação: Patrick Gomes madores de nossa diocese. Nela há muitas Definido o horário e as responsabilidades,
Silva, Rosa Clara Franzoi, Júlio César coisas belas e instrutivas, fotos e artigos os grupos dedicaram-se a recuperar a
Caldeira, Karla Maria, Mário de Carli e que são usados em muitas comunidades memória do curso de 2008, através da
e paróquias na preparação da liturgia. Na cartilha então produzida. Durante a noite,
Michael Mutinda
edição de setembro amei o texto “CEBs diversas lideranças tomaram a palavra e
e o Grito da Amazônia” e a entrevista trataram de assuntos ligados ao tema dos
Colaboradores: Vitor Hugo Gerhard,
que o padre Jaime Patias fez com a irmã direitos, em especial dos Povos Indígenas,
Roseane de Araújo Silva, Humberto
Julieta Amaral. O texto sobre o encontro lembrando também os anos de luta que
Dantas, Dirceu Benincá, Gianfranco
das CEBs foi muito esclarecedor para antecederam a homologação de suas
Graziola, Ricardo Castro e Cecília
nós que não fomos ao Intereclesial. Um terras. Os resultados eram apresentados
Soares de Paiva
grande abraço! em plenários. Foram destacados aspectos
da Constituição Federal, direitos e deve-
Agências: Adital, Adista, CIMI,
Bernadete Oliveira Mota, Comunicação das CEBs res, a organização do Estado brasileiro
CNBB, Fides, IPS, MISNA, Radioagência Diocese de São José dos Campos, SP. e dados sobre os Povos Indígenas no
Notícias do Planalto e Vaticano Brasil. Alguns grupos abordaram o tema
Formação para a Missão dos conflitos em curso nas terras indíge-
Diagramação e Arte: Cleber P. Pires Entre as atividades da Casa de Forma- nas. Na sequência foram colocadas seis
ção IMC de Santa Luzia, em Manaus, AM, perguntas para aprofundar a discussão:
Jornalista responsável: destacamos o encontro e a convivência Qual a história da demarcação? Como é
Maria Emerenciana Raia (MTB 17532) com rostos novos enviados para a mis-
são. O padre Bernard Dennis, imc, recém

Laurindo Lazzaretti
Administração: Luiz Andriolo chegado de Uganda, esteve conosco por
alguns meses, trazendo contribuições
Sociedade responsável: que nos animaram. Agora ele se encon-
Instituto Missões Consolata tra em Brasília participando do curso
(CNPJ 60.915.477/0001-29) de formação e inculturação missionária
no CCM – Centro Cultural Missionário.
Impressão: Edições Loyola Passaram também os padres Fernando
Fone: (11) 2914.1922 Rocha, Afonso Amane, Sérgio Weber e
Mário Campos. Este partilhou seu trabalho
Colaboração anual: R$ 50,00 na missão de Maturuca, área da Raposa
BRADESCO - AG: 545-2 CC: 38163-2 Serra do Sol. Foi um momento especial
Instituto Missões Consolata para todos nós, celebrado com a partilha
(a publicação anual de Missões é de 10 números) de nossos compromissos assumidos como
nova maneira de viver.
Missões é produzida pelos
Missionários e Missionárias da Consolata Antonio José Araújo da Luz, seminarista imc Yanomami em estudo sobre direitos indígenas.
Fone: (11) 2256.7599 - São Paulo/SP Manaus, AM.
(11) 2231.0500 - São Paulo/SP a organização interna dos Yanomamis?
(95) 3224.4109 - Boa Vista/RR Direitos dos Indígenas Quais as leis dos Yanomamis? Quais
A equipe missionária da Missão Ca- suas lideranças? Como os Yanomamis
Membro da PREMLA (Federação de Imprensa trimani, juntamente com as assessoras resolvem os problemas? Quais são os
Missionária Latino-Americana) e da UCBC Helaine e Judite, advogadas, acompanhou principais problemas das comunidades?
(União Cristã Brasileira de Comunicação Social) a segunda etapa do Curso de Direitos, A participação nos trabalhos de grupo
realizada no Catrimani entre os dias 22 foi muito boa com destaque para as con-
Redação e 27 de agosto. Participaram cerca de 65 tribuições dos patapës (lideranças mais
Rua Dom Domingos de Silos, 110 Yanomamis, entre lideranças, professores, experientes) que fizeram memória da
02526-030 - São Paulo agentes de saúde, microscopistas e alunos história da demarcação e dos aspectos
Fone/Fax: (11) 2256.8820 das diferentes comunidades da Região. Na da vida dos Yanomamis.
Site: www.revistamissoes.org.br maloca de Waroma, no dia 21 já tinham
E-mail: redacao@revistamissoes.org.br chegado os Yanomamis das diferentes co- Diácono Corrado Dalmonego, imc
munidades. Chegaram também os napëpës Missão Catrimani, AM.

4 Outubro 2009 -
OPINIÃO
Frei Tito “Ninguém tem maior amor
do que aquele que dá a vida

35 anos depois
por seus amigos”. (Jo 15,13)
Frei Betto, Aloysio Nunes Ferreira, frei Oswaldo Rezende e
frei Vicente Micallef, durante homenagem a Frei Tito.

texto e foto de Júlio César Caldeira e psicologicamente pelo delegado Fleury e seus subordinados
durante três dias, no DOPS (Departamento da Ordem Política e

"Q
Social). Tentaram forçá-lo a admitir que os dominicanos haviam
uando falo em memória eu não penso simplesmente pegado em armas (o que não aconteceu!) e a entregar os demais
em fazer com que uma pessoa sofredora permaneça na “guerrilheiros”. As torturas foram fortíssimas... Na prisão, escreveu
memória do povo. Penso muito mais. Comparo muito sobre elas num texto que percorreu o mundo, ganhando desta-
a vida de Tito com a de Jesus. Jesus quando morre, que nos principais jornais internacionais, inclusive o prêmio de
deixa um memorial, a eucaristia é uma memória per- “reportagem do ano” (1970) da revista Look (EUA), tornando-se
manente de sua mensagem. Ele subverteu os valores um símbolo da luta pelos direitos humanos.
de seu tempo. E ele não foi morto como um simples Foi banido do país em 1971, passando pelo Chile, Itália e
ladrão. Ele foi morto na cruz, que era a pena concedida aos recebendo asilo na França, onde continuou sendo perseguido
subversivos. Então é essa memória subversiva que eu acredito pelos traumas das torturas que sofreu, conforme nos lembra frei
que existe nesse ideal de frei Tito”. Com estas palavras de frei Fernando: “escapou do sofrimento físico, mas jamais conseguiu
Fernando de Brito, dominicano, companheiro de prisão de frei livrar-se do sofrimento psicológico”. Aos 28 anos, no dia 10 de
Tito, queremos recordar os 35 anos da morte deste “mártir da agosto de 1974, sucumbiu em terras estrangeiras, consumido
luta pelos direitos humanos” no Brasil, que não é só a história pela dor e pelas lembranças sombrias do passado. Sobre sua
de uma vida, mas parte da história do próprio país. morte trágica, frei Fernando afirma que “quando Tito se mata,
mata os torturadores e liberta os torturados”, pois “é melhor morrer
Vida a serviço do Reino do que perder a vida”, como havia dito o próprio Tito.
Tito de Alencar Lima, cearense de Fortaleza, nascido no dia 14 Somente em 1983 o governo brasileiro autorizou o retorno de
de setembro de 1945, era o filho caçula de uma família simples, seu corpo para São Paulo. Na época, o cardeal Paulo Evaristo Arns
unida e religiosamente forte. Tito sempre revelou um espírito de frisou que Tito afinal encontrara do outro lado da vida, a unidade
liderança a partir de um compromisso político-evangélico. Em perdida. Atualmente seus restos repousam em Fortaleza.
1963 foi eleito dirigente regional da Juventude Estudantil Católica
(JEC) do Nordeste, um dos braços da Ação Católica no Brasil, Frei Tito hoje
procurando articular iniciativas a partir do Evangelho na busca Recordar frei Tito, como afirma a irmã dominicana Maria
por mudanças na sociedade. Aparecida Ribeiro, “é reacender a certeza do seguimento de
Aos 20 anos decide entrar na ordem dos dominicanos, onde Jesus, arriscando a própria vida: ele foi um lutador em nome do
teve como companheiros os freis Betto, Fernando de Brito, Yves Evangelho. Da mesma forma, é relembrar a energia e lucidez
do Amaral, entre outros. Depois de fazer o Noviciado em Belo da juventude, que acredita no poder da mobilização para mudar
Horizonte começou, em 1968, a estudar Filosofia em São Paulo os rumos do país, tendo a esperança de que um mundo novo,
e a fazer cursos complementares na USP, onde conheceu os e diferente, é possível”.
movimentos de resistência ao regime militar e tornou-se um dos Para conhecer mais sobre frei Tito acesse os sites www.
organizadores do famoso Congresso de Ibiúna, da UNE. Lá foi adital.com.br (Agência de Informação Frei Tito para América
preso, pela primeira vez, com vários jovens, sendo fichado e Latina - Adital), www.teologiaop.com.br (Escola Dominicana de
tornando-se alvo de perseguições da repressão militar. Foi solto, Teologia - EDT) e o livro Batismo de Sangue, de frei Betto. 
mas voltou a ser preso em 4 de novembro de 1969 pela acusação
anterior e por seu suposto envolvimento com o “guerrilheiro” Júlio César Caldeira, imc, é seminarista e estudante de teologia na Escola Dominicana de
Carlos Marighela. Nos porões da ditadura foi torturado física Teologia – EDT, em São Paulo.

- Outubro 2009 5
A Missão
como reconciliação
A Rodésia do Norte tornou-se

Divulgação
independente com o nome
de Zâmbia sob a presidência
de Kenetth Kaunda, em 1964.
O país localiza-se no Centro
Sudeste da África e faz
fronteira com o Congo, Malauí
e Tanzânia. A população total
é de aproximadamente 12
milhões, cuja maioria é Bantu.
A língua oficial é o inglês e sua
Jovens na Zâmbia preservam dança tradicional.
capital é Lusaka.
de Michael Mutinda

O
território da Rodésia do Norte, hoje Zâmbia, foi ad- te, sem rodeios, na transmissão dos valores do Evangelho e
ministrado pelas colônias britânicas da África do Sul no seu ensino social. Reconciliação, entendida como símbolo
desde 1891, até ser assumido pelo Reino Unido em fundamental de viver como filhos e filhas de Deus, exige a
1923. Durante a década de 20 do século passado, os vivência do perdão e do entendimento, o compromisso com a
avanços na mineração estimularam o desenvolvimento união, justiça e paz. Nessa linha de pensamento, a Igreja da
e a imigração. O cristianismo é a maior religião no país Zâmbia, e a África como um todo, necessita uma reconciliação
com 75% de fiéis, seguido pelo islamismo, hinduísmo em cinco níveis: com o indivíduo, com o outro, com os ances-
e as religiões tradicionais, que dividem os 25% restantes da trais, com a terra e com Deus.
população. O clima na Zâmbia é moderado, com temperaturas Neste momento histórico, a Igreja na Zâmbia está empe-
que variam de 16º a 21ºC. A economia é fraca, sendo que o nhada em promover a justiça que abrange relações pessoais
desemprego é espantoso e a maioria do povo depende da e estruturais, que respeita a dignidade humana, e leva em
agricultura. Outros setores que sustentam economicamente o consideração o desenvolvimento da sociedade inteira. A Igreja
país são o turismo e a mineração de cobre. também trabalha para promover a paz entendida não apenas
como ausência de conflitos armados, mas como a real presença
Obstáculos e otimismo da justiça. Nesse campo o país tem o desafio de superar os obs-
De 4 a 25 de outubro será realizado em Roma o segundo táculos e ser mais otimista com relação a uma reconciliação que
Sínodo dos Bispos da África, com o tema, “A Igreja da África no abranja: uma política democrática, um governo sem corrupção,
serviço de reconciliação, justiça e paz: vós sois o sal da terra... uma economia sem exploração, uma sociedade sem opressão
vós sois a luz do mundo” (Mt 5, 13-14). O tema foi escolhido dos pobres, uma ecologia sem ameaça à criação, uma cultura
para destacar a importância de se consolidar a estabilidade conservando os valores, e uma Igreja com credibilidade e ponto
e a paz no continente. Nesse contexto, a Igreja na Zâmbia se de referência.
encontra num momento sério da missão Ad Intra (interna, em Diante dos obstáculos e oportunidades, a comunidade cristã
casa) como reconciliação. Embora a Igreja não tenha todos está otimista de que a reconciliação com toda a criação é possível.
os meios para resolver os conflitos, deve, no entanto, ser um Eis o desafio, o privilégio, a oração e a missão Ad Intra. 
agente de justiça, perdão e reconciliação nas várias dimensões
da vida neste país. Como uma voz profética deve estar vigilan- Michael Mutinda, imc, é seminarista queniano, estudante de Teologia no ITESP, São Paulo.

6 Outubro 2009 -
pró-vocações
José Altevir da Silva
A vocação revela a nobreza
do ser humano
de Rosa Clara Franzoi nós, com defeitos e virtudes. Só que eles ouviram o convite do
Senhor a configurar-se com ele, vivendo como ele viveu e fazendo

A
o que ele fez. Esforçaram-se no exercício do bem, na prática das
o criar o homem e a mulher, Deus os quis diferentes boas obras, evitando o mal. Acolhendo e praticando o chamado
dos demais seres criados e por isso, conferiu-lhes de Deus, viveram santamente. Portanto, ser santo significa amar
capacidades que os distinguem substancialmente. a Deus e deixar-se guiar por Ele na prática dos mandamentos
Brindou-os com inteligência, vontade e liberdade. Com que, de dez, foram resumidos por Jesus em dois: “Amar a Deus
estas importantes qualidades, unidas a muitas outras sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”. Neste
inerentes à própria pessoa humana, homem e mulher sentido, podemos ter a certeza de que existem muitos santos
tornaram-se aptos a organizarem a sua própria existência, de em nosso meio; pessoas que procuram viver como Jesus vi-
modo a conseguirem o objetivo principal pelo qual foram coloca- veu, fazendo o bem a todos; pessoas que esquecendo-se de si
dos neste mundo, revelando assim uma nobreza toda particular. mesmas vão ao encontro dos mais necessitados, sem esperar
Deus constantemente adapta-se à pedagogia humana. Leva a algo em troca e fazem isto, simplesmente porque aprenderam a
pessoa, desde criança, a gostar do que faz e a descobrir, aos lição de Jesus, que no Evangelho diz: “Quem fizer o bem a um
poucos, as suas tendências. Lentamente a impulsiona a escolher destes pequeninos é a mim que o está fazendo”(Mt 25, 40b).
o seu tipo de vida. Deus incentiva, na pessoa, a sua parte inata: “Não tenhamos medo de ser santos” (José Allamano).
tendências, qualidades, experiências afetivas e, dentro delas,
lança seus convites, seus apelos para determinadas funções, Retorno ao sagrado
missões, que chamamos de “vocações”. Nestes últimos tempos percebe-se um forte despertar desta
vocação, que de certa forma, coincide com o retorno ao sagrado.
Uma vocação para todos Há em todo lado, também fora do ambiente religioso, uma grande
No Antigo Testamento, no livro do Levítico encontramos busca do transcendente, um desejo profundo do encontro com
este convite de Deus: “Sede santos porque eu, vosso Deus, sou o Absoluto, visto como aquele que dá pleno sentido à existência
santo (Lv 19, 2)”. Portanto, o chamado à santidade é universal, é humana. E um fenômeno, que o Concílio Vaticano II denomina “sinal
comum a todos. A verdade é que o termo santidade, no mais das dos tempos”. E não é difícil entender este fenômeno. Não obstante
vezes, assusta. Provavelmente é porque não conhecemos o seu todos os avanços das tecnologias, de todas as descobertas, as
verdadeiro sentido. Pensamos que santos e santas são apenas pessoas percebem que tudo aquilo não consegue preencher o
os que veneramos nas igrejas; e não sabemos que aqueles ou vazio que experimentam e que não as deixa satisfeitas. Quantos
aquelas, reconhecidos pela Igreja como tais, foram pessoas como movimentos, quantas filosofias de vida apregoam a prática do
bem como caminho para conseguir a harmonia e a paz interior e
o bem estar. Mesmo fora do âmbito da fé, e de maneira indireta,
esta pessoas reconhecem que existe alguém, acima de tudo e
Quer ser um missionário/a? de todos, que vem ao encontro do ser humano e o orienta ao seu
fim principal nesta terra: ser feliz e realizado. 
Irmãs Missionárias da Consolata - Ir. Dinalva Moratelli
Av. Parada Pinto, 3002 - Mandaqui - 02611-001 - São Paulo - SP
Rosa Clara Franzoi, MC, é animadora vocacional.
Tel. (11) 2231-0500 - E-mail: rebra@uol.com.br

Centro Missionário “José Allamano” - padre Patrick Gomes Silva


Rua Itá, 381 - Pedra Branca - 02636-030 - São Paulo - SP
Para refletir:
Para continuar a reflexão, ler o texto bíblico
Tel. (11) 2232-2383 - E-mail: secretariamissao@imconsolata.org.br
Lv 19, 1-4 e responder:
Missionários da Consolata - padre César Avellaneda 1. A imagem que temos de Deus influencia muito o nosso ser e
Rua da Igreja, 70-A - CXP 3253 - 69072-970 - Manaus - AM o nosso agir. Qual é a imagem de Deus que alimentamos?
Tel. (92) 3624-3044 - E-mail: amimc@ibest.com.br
2. Temos consciência de ser pessoas vocacionadas, chamadas a
dar a nossa resposta? Que ideia nós fazemos da santidade?

- Outubro 2009 7
ger seus cidadãos” sem discriminações por questões
étnicas nem por nenhum outro tipo de afiliação e
“permitir a assistência humanitária ininterrupta para
alcançar toda a população que sofre em Darfur”. Tam-
bém chama o governo do Sudão a cumprir com todas
as declarações e acordos que firmou, sendo o mais
importante o Acordo de Paz e Entendimento, firmado
com o Movimento Exército de Libertação do Povo do
Sudão, em 2005. A declaração expressa seu reconhe-
cimento pela assistência proporcionada pelas forças de
paz das Nações Unidas e a União Africana - UNAMID
em Darfur. Também agradece o “rol significativo das
Igrejas do Sudão empenhadas em promover o diálogo
inter-religioso e trabalhar pela paz, a justiça, a reconci-
liação e o respeito à dignidade e o bem-estar de todos
os habitantes do país”. Finaliza alentando os cristãos
de todo o mundo a orar “pelo fim das hostilidades em
Estados Unidos Darfur e uma paz duradoura no Sudão”.
VOLTA AO MUNDO

Caritas pede fim da corrupção


Países ricos e Estados mais pobres, todos têm o Roma
dever de acabar com a corrupção. Este foi o apelo lan- Sínodo da África
çado pela Caritas Internacionalis a 50 líderes religiosos A África pode se converter em um exemplo para
e diretores de diversas agências humanitárias numa o resto do mundo com relação à convivência pacífica
carta enviada ao secretário-geral das Nações Unidas, e o diálogo entre as religiões, especialmente com o
Ban Ki-moon, pedindo a multiplicação de esforços Islã. Assim explicou, em uma entrevista publicada
contra esta praga. A carta frisa que a corrupção tira a pelo L'Osservatore Romano em sua edição de 28 de
“oportunidade e a esperança”, sendo a maior causa agosto, dom Chidi Denis Isizoh, membro do Conselho
de pobreza nos países em vias de desenvolvimento. Pontifício para o Diálogo Inter-religioso, em referência
Por isso, acabar com a corrupção é “um imperativo aos temas que serão tratados no Sínodo Especial para
moral” para remover uma “barreira intransponível” a África, previsto para este mês de outubro. Dom Isizoh,
que impede, sobretudo, a população mais pobre, de originário da Nigéria, explicou que a experiência de
ascender a uma formação de qualidade e ter assistên- diálogo entre as religiões é vivida na África cotidiana-
cia sanitária. A dispersão de fundos públicos, a perda mente, em todos os âmbitos e níveis, e que somente
do investimento e a redução das receitas geradas em alguns países existem conflitos. Segundo o bispo,
pelos impostos afetam principalmente os pobres. “A na maior parte dos lugares, cristãos em geral, animis-
transparência e a participação da sociedade civil” são tas e muçulmanos vivem e trabalham juntos, apesar
fundamentais para “criar um consistente e crível pro- da centralidade que a religião ocupa em sua vida. A
cesso de revisão”. Uma mudança fundamentada nestes religião na África, explicou, “não é algo separado das
princípios, aponta o documento, será um “claro sinal” demais atividades da existência: é estilo de vida”. Este
dado a todos quantos têm responsabilidades políticas diálogo se baseia “na vida e na cooperação, em que
“de por um fim ao flagelo da corrupção. A honestidade e cada pessoa expressa os ideais de sua religião: ser
integridade são valores morais” que estão subjacentes bons vizinhos, honestos, ajudar quem tem dificuldades,
a qualquer tentativa de lidar com práticas corruptas. O colocar o dinheiro e as capacidades à disposição do
empenho da sociedade civil e dos grupos religiosos é bem comum do povo, participar das decisões e lutar
uma importante contribuição para a promoção de uma contra o crime”. Concretamente, no caso do Islã, dom
mudança e para a implementação da Convenção da Isizoh destacou que a relação é boa na maior parte dos
ONU de 2003 contra a corrupção, o primeiro tratado países e que o conflito, em geral, é a exceção. “Esta
global para harmonizar os esforços contra o fenômeno, é uma boa notícia que a mídia frequentemente não
lembra a Caritas. divulga”, comentou. Mais ainda, nos casos de confli-
to, muitas vezes os líderes políticos e alguns grupos
Sudão com interesses “manipulam os sentimentos religiosos
Conflito em Darfur para alcançar seus próprios objetivos”. Com relação
O comitê central do Conselho Mundial das Igre- ao tema do Sínodo: “A Igreja na África a serviço da
jas - CMI, voltou a discutir o problema da violência reconciliação, da justiça e da paz”, dom Isizoh comentou
no Sudão durante sua reunião em Genebra. Desde que um dos maiores obstáculos que a paz encontra
2003, “o conflito em Darfur desatou uma descontrolada hoje no continente é a herança do colonialismo. “Em
onda de violência que teve como resultado a morte de sua maior parte, os países africanos sofrem as con-
milhares de civis e uma imensa crise humanitária”, diz sequências da fusão inadequada e forçosa de povos
uma “Declaração sobre a crise de Darfur no contexto diferentes - que a mídia define frequentemente como
do Sudão”, do CMI. A declaração adotada pelo comitê grupos tribais - realizada pelo colonialismo”. 
central “condena as atrocidades massivas cometidas
contra civis inocentes em Darfur”. Intima o governo do
Sudão a “assumir a responsabilidade plena de prote- Fontes: Agência Ecclesia, Fides, ZENIT.
8 Outubro 2009 -
Cecília Soares de Paiva

Intenção Missionária
Para que o Povo de Deus, que recebeu
de Cristo o mandamento de ir pregar o
evangelho a todas as criaturas, assuma com
empenho a responsabilidade missionária e a
considere como o maior serviço que pode
prestar à humanidade.

tima pois, ou a Igreja é missionária pela sua própria natureza e


constituição, ou ela está fora da finalidade pela qual foi criada.
Assim que, se quisermos ver essa intenção missionária
tornar-se uma realidade permanente entre os cristãos, algumas
providências são necessárias e urgentes, a saber:
- Incluir imediatamente a teologia da missão nos currículos
de teologia dos seminários e nas casas de formação para a vida
consagrada. Uma Igreja que não reflete os fundamentos da sua
própria origem, acaba se desviando de seus propósitos;
- Incluir o tema missão nos cursos de formação dos leigos,
Infância e Adolescência Missionárias no Encontro do comire Sul1, Nazaré Paulista.
ministros e na formação permanente do clero. Uma Igreja que
não atualiza seus fundamentos, acaba por deixá-los nos porões
da sua história e vira tema de arqueologia;
de Vitor Hugo Gerhard - Incluir tarefas na linha da missão na catequese, na liturgia
semanal e nos movimentos apostólicos, pois a palavra, o rito e

J
a mística, sem perspectiva missionária, perde seu sabor e sua
á é uma longa tradição que o mês de outubro seja fisionomia se desfigura.
dedicado ao tema das Missões, o assim chamado mês Dom Pedro Casaldáliga já nos lembrava, faz um bom tempo,
missionário. No decorrer de seus 31 dias, procuramos que cada cristão deveria, periodicamente, retornar à sua pia
rezar, refletir e cooperar com a obra missionária da batismal para, nela, reavivar o espírito missionário recebido no
Igreja em todos os quadrantes do mundo. E isso é batismo. Mesmo quando a pia batismal foi apenas uma bacia de
muito bom. plástico e uma jarra de suco. Quando se vulgariza o batismo, se
Entretanto, se considerarmos isso de um outro ponto de vista, mata a Missão. 
é pena que a Igreja tenha a necessidade de estabelecer um mês
missionário, pois isso atesta que, nos demais meses, a missão Vitor Hugo Gerhard é sacerdote diocesano de Novo Hamburgo e trabalha na Paróquia Nossa
não é o epicentro da vida dela. O que não deixa de ser uma lás- Senhora de Lourdes, em Canela, RS.

Índia realiza Congresso Missionário


“O Congresso Missionário Indiano é, por um lado, a cele- por equipes em todas as dioceses, que se empenharam em fazer
bração dos dois mil anos de cristianismo na Índia, mas também reflexões, sugestões, projetos a serem incluídos no documento
um chamado atualíssimo para renovar a nossa fé”, é o que preparatório, que delineará os desafios e as propostas para a
afirma o cardeal Oswald Gracias, presidente da Conferência missão na vasta nação indiana. O evento foi estabelecido na
Episcopal da Índia, falando dos trabalhos do Congresso, que esteira do Congresso Missionário Asiático e pretende atualizar
será realizado em Mumbai de 14 a 18 de outubro. Já foi apre- e contextualizar as indicações e os desafios surgidos no grande
sentado o novo site www.indianmissioncongress.com onde será evento celebrado pelas Igrejas do continente asiático na Tailândia
possível acompanhar constantemente os trabalhos do evento em 2006. “A evangelização não é uma das tarefas da Igreja,
e obter informações. A finalidade do Congresso é “aprofundar é a única tarefa”, afirmam os organizadores, destacando que
a fé de cada fiel, reconhecer o próprio direito-dever na obra o Congresso poderá aumentar a sensibilidade missionária na
missionária, sensibilizar o povo de Deus sobre as necessidades Igreja indiana. Serão reunidos bispos, delegados e teólogos
das missões e sobre a necessidade de proclamar Cristo ao das dioceses dos três ritos presentes na Índia: latino, siro-
mundo inteiro”. O Congresso foi preparado nos últimos meses malabarês e siro-malankares. Fonte: Fides

- Outubro 2009 9
espiritualidade

Aprendendo
com Maria
Todo brasileiro tem em Nossa Senhora Aparecida uma mãe especial, sempre
pronta a ouvir as suas preces e a levá-las Àquele que tudo pode.
de Patrick Gomes Silva elemento indispensável nas “bodas”,

José Altevir da Silva


C
é símbolo do amor entre o esposo e a
elebrar a festa de Nossa Se- esposa (cf. Cântico dos Cânticos 1, 2; 4,
nhora Aparecida, no dia 12 de 10; 7, 10; 8, 2). Constata-se, portanto,
outubro, é uma ocasião especial a realidade da antiga “aliança”: tornou-
para todo o povo brasileiro. Cada se uma relação seca, sem alegria, sem
um manifesta à sua maneira o amor e sem festa, que já não propicia o
seu carinho e a sua devoção encontro amoroso entre Israel e o seu
pela Mãe de Deus e nossa. A Ela são Deus. Esta realidade de uma “aliança”
levadas as preces de tanta gente que estéril e falida é representada pelas
se encontra em momentos de aflição “seis talhas de pedra destinadas à pu-
e também os louvores pelos pedidos rificação dos judeus”. O número seis
atendidos. Aproveitando esta festa, nada evoca a imperfeição, o incompleto; a
melhor que olhar para Maria e aprender “pedra” evoca as tábuas de pedra da
dela os ensinamentos, as atitudes para Lei do Sinai e os corações de pedra de
ser discípulo e discípula de Jesus. que falava o profeta Ezequiel (cf. Ez 36,
O texto das bodas de Caná, que 26); a referência à “purificação” evoca
o Evangelho de João nos apresenta é os ritos e exigências da antiga Lei que
ótimo para dar início a esta “lição” (João revelavam um Deus susceptível, zeloso,
2, 1-12). impositivo, que guarda distância: ora,
um Deus assim pode-se temer, mas não
Introdução amar. As talhas estão “vazias”, porque
O episódio está inserido na parte todo este aparato era inútil e ineficaz:
introdutória do quarto Evangelho (que vai não servia para aproximar a pessoa de
de 1, 19 a 3, 36). Nesta introdução, João Deus, mas sim para afastar.
apresenta um conjunto de cenas, com Detenhamo-nos, agora, nas persona-
contínuas entradas e saídas de persona- gens apresentadas. Em primeiro lugar, a
gens, como se estivéssemos no palco de “mãe”: ela “estava lá”, como se perten-
um teatro, destinadas a apresentar Jesus cesse às bodas; por outro lado, é ela que
e o seu programa. João explicitamente se dá conta do intolerável da situação
afirma (cf. Jo 2, 11) que o episódio per- (“não têm vinho”): representa o Israel
tence à categoria dos “sinais” (semeiôn, fiel, que tinha consciência da realidade e
em grego): trata-se de ações simbólicas, que esperava que o Messias resolvesse
de sinais indicadores, que convidam a a situação. Temos, depois, o “chefe de
procurar, para além do episódio concreto, mesa”: representa os dirigentes judeus,
uma realidade mais profunda para a qual instalados comodamente, que não se
aponta o fato narrado. apercebem – ou não estão interessados
alusão ao livro de Gênesis, assim este em entender – que a antiga “aliança”
Leitura seria o sétimo dia da semana inaugural, caducou. Os “serventes” são os que
O cenário de fundo do episódio é o símbolo da nova Criação. colaboram com o Messias e que estão
das bodas, ou seja, de um casamento que A imagem do casamento era frequen- dispostos a fazer tudo “o que Ele disser”
acontece no terceiro dia (2, 1); uma leitura temente usada para refletir a relação de (cf. Ex 19, 8) para que a “aliança” seja
atenta ao primeiro capítulo nos levará a amor entre Deus e o seu povo. Em outras revitalizada. Temos, finalmente, Jesus,
entender que se trata do terceiro dia após palavras, estamos no contexto da “aliança” aquele que irá fazer com que a festa re-
o convite feito à Felipe para seguir Jesus. entre Israel e seu Deus. Nesta “aliança” comece ao transformar a água em vinho,
No entanto, trata-se do sétimo dia, numa a certa altura, falta o vinho. O “vinho”, desta forma, uma nova vida nasce.

10 Outubro 2009 -
Maria mulher atenta lugar, notamos o diálogo entre Maria e Jesus: e o Novo Testamento, dá um “empurrão”
É interessante notar aqui o papel que “não têm vinho”. A resposta de Jesus é um a Jesus para que comece a sua “hora”.
Maria tem neste episódio. Em primeiro tanto assustadora: “Mulher, o que isso tem Se o diálogo entre Jesus e Maria parecia
lugar, é ela que nota que está faltando o a ver comigo? Ainda não chegou a minha não levar a nenhuma solução, a atitude
essencial da festa, o vinho! Mais ninguém hora”. Que filho é este que trata a mãe por de Maria após o seu término é surpreen-
parece notar este elemento fundamental. “mulher” e que se mostra insensível ao dente: “fazei o que Ele vos disser”. Total
Ao contrário, Maria, qual mulher perspicaz problema? Ora, a palavra “mulher” aqui se confiança no seu Filho, dessa confiança
e atenta, vê com olhos de mãe as neces- reveste de grande importância, pois como nasce a “salvação”.
sidades daqueles dois que se uniram em estamos no sétimo dia da nova Criação,
matrimônio. De imediato age, não faz “mulher” evoca que Maria é a nova Eva, O “salvador” da festa
milagres, mas leva o “problema” Àquele aquela que dará à luz uma nova vida. Maria É a Jesus que o Israel fiel (a “mulher”/
que pode solucioná-lo: Jesus. Em segundo é aquela que faz a transição entre o Antigo mãe = Maria) se dirige no sentido de dar
nova vida a essa “aliança” caduca; mas
o Messias anuncia que é preciso deixar
cair essa “aliança” onde falta o vinho do

Passos da Leitura Orante da Palavra amor. A obra de Jesus não será preservar
as instituições antigas, mas apresentar
uma radical novidade… Isso acontecerá
quando chegar a “Hora” (a “Hora” é, em
Disposição: é importante criar um ambiente adequado que favoreça o
João, o momento da morte na cruz, quando
recolhimento e a escuta da Palavra de Deus. Jesus derramar sobre a humanidade essa
lição do amor total de Deus).
1. Invocação ao Espírito Santo O episódio das bodas de Caná anun-
Peça o auxílio do Espírito Santo para acolher a Palavra. Você não vai “estudar” cia, portanto, o programa de Jesus: trazer
a Palavra, vai escutar o que Deus tem a lhe dizer. Repita: “Envia, Senhor, à relação entre Deus e os homens o vi-
o teu Espírito”. nho da alegria, do amor e da festa. Este
programa realizar-se-á em plenitude no
2. Leitura (o que a Palavra diz em si) momento da “Hora” – da doação total
Objetivo: Conhecer bem o texto (Jo 2, 1-12) por amor.
• Ler devagar e sem pressa!
• Sublinhar o que achar importante Meditação
Com qual das personagens que parti-
• Ler os comentários presentes na Bíblia
cipam das bodas nos identificamos: com
• Transcrever algumas frases ou palavras, se achar útil
o chefe de mesa, comodamente instalado
Algumas perguntas podem ajudar: numa religião estéril, vazia e hipócrita,
Quais são as personagens? Onde decorre a ação? com a “mulher”/mãe que pede a Jesus que
Quando acontece? O que fazem as personagens? resolva a situação, ou com os “serventes”
que vão fazer “tudo o que Ele disser” e
3. Meditação (o que a Palavra diz hoje a mim) colaborar com Jesus no estabelecimento
Reler o texto em primeira pessoa, colocando-se na pele da personagem! da nova realidade?
Encontrar a afirmação central, depois: Repetir - Memorizar Maria foi perspicaz e atenta ao proble-
Confrontar a sua vida atual com a Palavra escutada: ma dos noivos, notou a falta do elemento
a. Sua vida com Deus fundamental da festa: o “vinho”. Somos
b. Sua vida com os outros pessoas atentas às necessidades dos
c. Sua vida consigo mesmo outros ou sempre fechadas em nós mes-
mas e nas nossas necessidades? Será
que somos capazes de ver que falta o
4. Oração (o que a Palavra me faz dizer) “vinho” na festa dos outros?
Responder à Palavra escutada através da oração. Fazer isto em três etapas:
Quando a relação com Deus assenta
1. Pedindo perdão pela Palavra não vivida apenas em ritos externos, de regras e de
2. Agradecendo e louvando pelas maravilhas que Deus operou e opera obrigações que é preciso cumprir, a religião
em sua vida torna-se um pesadelo insuportável que
3. Fazendo seus pedidos a Deus, de modo especial, pedindo o dom do tiraniza e oprime. Ora, Jesus veio revelar-
Espírito Santo. nos Deus como um Pai bondoso e terno,
que fica feliz quando pode amar os seus
5. Contemplação (a Palavra me leva ao Coração de Deus) filhos. É esse o “vinho” que Jesus veio
Sinta a presença de Deus, não é tempo de palavras, mas apenas de silêncio. trazer para alegrar a “aliança”: o “vinho”
Permita que Deus fale no silêncio, lugar privilegiado de Sua presença. do amor de Deus, que produz alegria e
que nos leva à festa do encontro com o
6. Missão e Ação (a Palavra me leva aos outros) Pai e com os irmãos. A nossa “religião”
é isto mesmo – o encontro com o Jesus
A Palavra não nos pode deixar indiferentes, depois de escutar o que Deus
que nos dá o vinho do amor? 
tem a dizer, é tempo de descer da montanha e ir ao encontro dos irmãos e
irmãs e de se colocar em ação/missão: “Faça-se em mim segundo a tua Palavra”. Patrick Gomes Silva, imc, é diretor do Centro Missionário José
Allamano, em São Paulo.

- Outubro 2009 11
Discípulos missionár
testemunho

Casal de leigos faz

Jaime C. Patias
experiência missionária
no sertão baiano.
de Fátima Elisa dos Santos e Luís Baseggio

P
elo batismo e sendo Leigos Mis-
sionários da Consolata - LMC, por
opção, nos sentimos chamados
a viver o Carisma missionário
Ad Gentes, seguindo a espiritu-

l
Pessoa
alidade dos missionários e mis-
sionárias da Consolata, família formada

Arquivo
por padres, irmãos, irmãs e leigos(as). O
fundador, sacerdote da diocese de Turim,
Itália, o Bem-aventurado José Allamano
colocou sua obra sob a proteção especial
de Nossa Senhora, de cujo santuário ele era
reitor. Consolata é um nome italiano, que
significa Consoladora ou da Consolação.
Maria é consolada por Deus e no misté-
rio da salvação tornou-se a Consoladora
da humanidade. Allamano foi beatificado pequeno foi uma pessoa franzina e se LMC acompanhados pelos missionários e
pelo papa João Paulo II, em 7 de outubro partisse, não teria tido forças suficientes missionárias da Consolata em São Paulo,
de 1990. Um grande ardor missionário para enfrentar as dificuldades da missão. Rio de Janeiro e Paraná.
caracterizava este sacerdote, desde o Então, já que ele não podia ir, depois de
tempo de seminário; também porque ele muitas peripécias, realizou a fundação de Envio Missionário
viveu numa época em que as missões duas congregações: em 1901, dos padres e Todos os membros do nosso grupo
estavam em seu pleno desenvolvimento, irmãos e em 1910, a das irmãs. Hoje seus atuam nas diferentes pastorais, nas comuni-
especialmente no continente africano. missionários e missionárias atuam em 26 dades que frequentamos. Mas, o Carisma,
E ele teria sido um desses missionários países de quatro continentes. nos impulsiona a fazer algo mais, a ir um
que deixam tudo e partem para outras pouco mais longe. Foi assim, que em abril
terras, se não fosse o item saúde. Desde "Se algum bem pudemos de 2009, durante a celebração do Lava-
Pés, na quinta-feira santa, o padre Marcos
fazer, foi muito maior o Augusto Monte nos abençoou e nos enviou
Jaime C. Patias

em missão, em nome da Paróquia de São


que recebemos, que nos João Batista de Joanopólis, a 100 km de
São Paulo, onde moramos atualmente.
ajudará em nossa vida". Nosso destino era a Paróquia São João
Batista de Jaguarari – BA, onde trabalham
os padres e as irmãs da Consolata. Aque-
Leigos Missionários - LMC le foi um momento muito especial para
Já o Concílio Vaticano II dizia que o nós. Estávamos respondendo ao apelo
Carisma das congregações religiosas não de Deus para alguns dias de missão, além
deveria ser exclusivo delas e as convida- da nossa paróquia, da nossa família e do
va a condividi-lo com quem se sentisse nosso Estado.
chamado. Assim, a partir de 1993, um
grupo de leigos e leigas, em São Paulo, A vida no sertão
começou a fazer parte da Família da Con- Partimos para o sertão baiano, na
solata, refletindo e vivendo, na prática, a região do semi-árido, rumo a Jaguarari
espiritualidade do Carisma Missionário do e Monte Santo, cidades distantes 2.068
padre José Allamano, a espiritualidade da km de São Paulo. Lá, em companhia dos
A luta pela água em Jaguarari, BA. consolação. Existem hoje vários grupos de padres e irmãs da Consolata, visitamos

12 Outubro 2009 -
rios de Jesus
de perfuração de poços; Projeto “Mãos
Unidas”, que constrói Centros Comunitários
para a formação de lideranças; o Centro
de Atendimento Psíquico Social- CAPS;
a Cabritas, que financia projetos para o
atendimento às crianças e adolescentes no
reforço escolar, fornecendo a merenda e
possibilitando trabalhos manuais, e os pro-
jetos que visam a formação da mulher.
as comunidades rurais, distantes 30 e 40 Consolar é uma grande missão, porque

José Roberto Garcia


quilômetros da cidade. As estradas são de significa estar perto dessas pessoas que
difícil acesso, até mesmo de jipe. A paróquia lutam pela sobrevivência, e os missioná-
de Jaguarari é formada por 80 comunidades rios e missionárias fazem isso de muitas
e a de Monte Santo, por 150. Vimos de fato maneiras, visivelmente.
que “a messe é grande e poucos são os
operários”. Imaginem tantas comunidades As lições da Missão
para serem atendidas e acompanhadas, e Durante os 20 dias que lá passamos
apenas sete missionários e missionárias. tivemos a graça de saborear um pouco
A maior parte do trabalho é feito pelas da missão e muitas coisas nos chamaram
lideranças leigas. Em todas as nossas a atenção. A simplicidade das pessoas,
visitas pudemos sentir as dificuldades que que apesar dos poucos recursos de que
o povo enfrenta, como o desemprego e o dispõem não perdem a dignidade; lutam
duro trabalho da roça, que só é possível incansavelmente e se mantém firmes na
quando chove. Sabemos que no sertão fé. É impressionante ver o sertanejo que
quase não chove. Em algumas comunidades levanta suas mãos calejadas para o céu
encontramos apenas mulheres, crianças e com grande fé implora a chuva, quando
e idosos, porque os homens vão para as vê tudo se acabando ao seu redor.
cidades vizinhas em busca de algo para Nas comunidades, a acolhida festiva
fazer e poderem trazer um dinheirinho para que faziam quando chegávamos e a alegria
o sustento da família. Alguns retornam que demonstravam quando aceitávamos
nos finais de semana; outros ficam meses Crianças de Monte Santo apoiam Projeto Água. entrar em suas casas. Dividiam conosco
sem verem a família. Muitos migram para o pouco que tinham, com confiança e
as grandes cidades como São Paulo, Rio Missão-Consolação simplicidade, iam contando a sua história,
de Janeiro ou Belo Horizonte. Devido à Em meio a este duro cenário, aparecem de onde vieram, como viviam, falavam
escassez de água, muitos são obrigados sinais de esperança, ou seja, os vários dos filhos, do trabalho, das lutas e dificul-
a caminhar quilômetros em busca de algo Projetos Sociais de promoção: a Pastoral dades... Ouvindo essas histórias de vida,
para cozinhar, lavar roupa, tomar banho... da Criança; a Escola Família Agrícola do descobrimos que quase todas as famílias
O índice de analfabetismo é ainda grande Sertão - EFASE; o Projeto das cabras, que que vivem no sertão já moraram ou tem
entre os adultos. As crianças chegam a beneficia mais de 40 famílias; o Projeto “Tive algum parente em São Paulo; e isso faz
viajar horas e horas no transporte escolar Fome e me destes de comer” – que atende com que a aproximação e a simpatia se-
para chegarem à escola mais próxima. as famílias mais pobres com cestas básicas; jam imediatas. O sorriso sempre aberto, o
Sentimos na pele como é difícil a vida dos o Projeto de Construção de cisternas; o abraço apertado, o convite para voltarmos,
nossos irmãos e irmãs sertanejos. Projeto de Captação da água da chuva; os votos de boa viagem, tudo fazia com
que nos sentíssemos em casa.
Luigi Cazon

Experiência abençoada
Partimos de Joanópolis levando no
coração o grande desejo de encontrar e
estar perto daqueles irmãos e irmãs, ser
uma presença de paz e de solidariedade.
Voltamos para a nossa cidade, comunidade
e família, aquecidos e enriquecidos por
esta experiência missionária. Se algum
bem pudemos fazer, foi muito maior o
que recebemos e que muito nos ajudará
no dia a dia da nossa vida. Somos muito
agradecidos a Deus, que nos proporcio-
nou esta oportunidade. “O caminho se faz
caminhando”, queremos ser “discípulos
missionários” de Jesus, cada vez mais
comprometidos com a construção do seu
Reino. 

Fátima Elisa dos Santos e Luís Baseggio, LMC, leigos missionários


População reunida na Praça da Matriz, Monte Santo, BA. da Consolata de Joanópolis, São Paulo.

- Outubro 2009 13
fé e política

O tempo da política

Karla Maria
tempo depois do trauma, lá estamos nós de novo, enroscados.
E quando tomamos o milésimo safanão, por vezes ainda insis-
timos em voltar, mesmo porque parece que temos memória de
peixe – lembrando o desenho Procurando Nemo de Walt Disney
em que o peixe não se lembrava sequer do nome.
Fôssemos nós cidadãos educados politicamente, e atentos
aos efeitos que as decisões da classe política causam em nosso
cotidiano, a história da humanidade seria diferente. Sobretudo
as realidades de países que sofrem com tantas desigualdades
e barbaridades como o nosso. Mas como a história não nos
reservou muita lucidez, nos deparamos com a manipulação do
tempo da política sobre nosso cotidiano. E magicamente votamos
naqueles que às vésperas das eleições parecem ter resolvido
todos os problemas do mundo. Lembremos que nunca um pre-
sidente deixou de ser reeleito no Brasil – FHC e Lula venceram
a recondução. E que em 2008 a taxa de reeleição dos prefeitos
foi superior a dois terços. Seriam todos assim tão bons? Ou o
tempo da política é capaz de marcar nossas escolhas eleitorais
de forma mais instantânea que os quatro, oito, doze anos das
trajetórias dos postulantes?

Sentido da democracia
No tempo da política verificamos, para piorar de vez esse qua-
dro medonho, decisões sendo tomadas sem grande rigor técnico.
O pré-sal, por exemplo. Visto por muitos como o passaporte do
Brasil no desenvolvimento econômico, sua exploração tem sido
encaminhada com a urgência eleitoral de quem pretende colher
resultados para seus indicados. Lula pede 90 dias para que o
Congresso tome uma das decisões mais estratégicas da história
desse país. Uma determinação que pode marcar o sucesso ou o
Jardim Damasceno, Região Brasilândia, São Paulo. fracasso de uma era. O The Economist, conceituado periódico,
afiança que tudo pode ser perdido pela maldita mania latina de
gastar sem ter, de comemorar antes de ganhar. Mas Lula não
Magicamente votamos naqueles está sozinho. Serra avança com o metrô e o rodoanel em São
Paulo numa velocidade coincidente com o pleito de 2010, como
que às vésperas das eleições se tudo não passasse de uma tremenda conspiração cósmica.

parecem ter resolvido todos os As ilustrações atingem praticamente toda classe política.
Diante desses exemplos todos precisamos ficar atentos para

problemas do mundo. o tempo da política. Cidadãos mais lúcidos serão capazes de


perceber que todo instante é tempo de política, todo momento é
momento para sermos brindados com boas obras, bons serviços
de Humberto Dantas e ótimos governantes. Cidadãos mais maduros serão capazes, no
entanto, de reconhecer que nem só de pétalas vive a espinhosa
tarefa de governarmos um país, um estado e um município. Essa

D
izem os especialistas que a política tem um tempo, maturidade é absolutamente capaz de nos mostrar que precisamos
um momento, digamos assim: um ritmo apropriado. E compreender o sentido da democracia, que inclui dificuldades
esse instante é, normalmente, pautado pelas eleições. e notícias ruins – que devem ser analisadas de forma sábia e
Assim, é bastante aceito na política que os represen- racional. E mais do que nunca, ao contrário do que apregoam
tantes realizam suas ações com olhares bem fixados alguns dos nossos mais relevantes políticos, não precisamos de
nos votos. Boas ações próximas das eleições, ações um pai no governo ou amor no poder. Precisamos de técnica,
mais difíceis em momento distante. E é isso que temos objetividade e racionalidade. A política pode ser repleta de paixão
assistido. A máxima diz: políticos pautam seus comportamentos e suas subjetividades, mas definitivamente o que precisamos é de
na capacidade de transformar ações em resultados positivos nas clareza, previsibilidade e equilíbrio. Pelo menos é isso que dizem
urnas. Os políticos agem assim por um motivo muito simples: nós as teorias acerca da democracia. 
nos comportamos quase de maneira irracional. Como animais
pouco afeitos à política que somos, recebemos um carinho e Humberto Dantas é cientista político, coordenador de cursos na Assembleia Legislativa de São
nos enroscamos, somos chutados e criamos repulsas. Pouco Paulo e apresentador do programa Despertar da Cidadania na rede Canção Nova de Rádio.

14 Outubro 2009 -
FORMAÇÃO mISSIONÁRIA

Fonte e critério
da Missão
Texto e fotos de Luiz Augusto Ramos Viera
Amor e compaixão amor de um Deus que primeiro “amou
o mundo, de tal maneira que deu o seu

P
ara ser missionário, não bas- são habilidades Filho Unigênito, para que todo o que
nele crê não pereça, mas tenha a vida
ta somente ter boa vontade
para seguir a vocação. Sim, o
necessárias para a eterna” (Jo 3, 16).
Consequentemente, todo batizado-
desejo é pré-requisito funda-
mental, todavia, precisamos
ação missionária. discípulo do Senhor, torna-se enviado
por Ele a continuar a Sua missão entre
ser formados na escola de todos os povos da terra: “E disse-lhes:
Jesus para sermos, efetivamente, bons concretos deste amor. Esse foi o obje- Ide por todo o mundo, pregai o Evange-
missionários e missionárias. Isso vale tivo do Seminário sobre Pastoral Skills lho a toda criatura” (Mc 16, 15).
ainda mais para quem parte em Missão realizado em Dhaka no ultimo mês de O missionário, portanto, é aquele
Ad Gentes, isto é, para quem vai ao maio para missionários e missionárias homem ou mulher que, encontrando-se
encontro daqueles que nunca ouviram que atuam em Bangladesh. com Jesus, sente-se amado pelo Amor,
falar que Jesus veio para salvar todos os O acolhe na própria vida, e, como res-
povos. Portanto, formação missionária Missão e missionário posta a esse Amor, torna-se discípulo-
é importante para que saibamos como Etimologicamente, a palavra missão missionário. Assim, aquele que vive a
testemunhar eficazmente o amor de origina-se da língua latina e significa experiência do Amor misericordioso de
Deus encarnado em Jesus Cristo, sobre- envio. Ninguém se auto-envia. Mesmo Deus na própria vida, não pode agir
tudo em países cuja religião dominante Cristo foi enviado pelo Pai, e recebeu diferentemente senão tornar-se um
não é o cristianismo. O mundo precisa a importante missão de anunciar ao convicto anunciador desse encontro
de amor, portanto, de missionários e mundo o amor de Deus. Assim, pode-se com Cristo, seja aos que estão perto,
missionárias que saibam ser sinais afirmar que toda missão tem origem no ou longe de si. E isso acontece quando

Padre Luiz Augusto com fiéis do vilarejo


Isol Bari, Bangladesh, após celebração.

- Outubro 2009 15
Almoço comunitário na paróquia de Baniarchor, administrada pelos missionários xaverianos, Natal de 2008.

o sujeito amado tem a capacidade e a Assim, torna-se necessário aprender a a do ambiente em que atuam e, deste
humildade de reconhecer a grandeza língua da região onde trabalham, conhe- modo, conseguir realmente comunicar-
do Criador e a efemeridade da criatura, cer as expressões mais significativas da se com ele, assumindo um estilo de
relativizando assim todo o resto: a si sua cultura, descobrindo os seus valores vida que seja sinal de testemunho
mesmo, a pátria, a cultura, o afeto de evangélico e de solidariedade com o
seus familiares e parentes, os amigos
etc. Amar não custa pouco, e Jesus
O objeto da missão é povo” (RM 53).

sabia bem disso. O amor dele chegou


ao extremo da dor, mas paradoxalmente,
anunciar o Reino de Objeto da missão
Precisamos saber como fazer a
como diz Madre Tereza de Calcutá, “se Deus a todos os povos. missão acontecer. Aprender é uma ação
você ama até doer, não poderá haver que envolve todo o ser de uma pessoa
mais dor, mas somente amor...” e por por experiência direta. Eles só poderão e requer alguns elementos básicos para
essa razão disse aos seus seguidores levar aos povos, de maneira crível e que o aprendizado se realize: vontade
que quem não consegue amar assim, frutuosa, o conhecimento do mistério e determinação, abertura e acolhi-
não é digno de ser Seu discípulo- escondido (cf. Rm 16, 25- 27; Ef 3, 5), da, humildade e perseverança. Estas
missionário (cfr. Mt 10, 37-39), isto é através daquela aprendizagem. Não se atitudes são ainda mais necessárias
quem não consegue colocar Jesus e trata, por certo, de renegar a própria quando alguém se sente chamado a
os valores do Reino de Deus como identidade cultural, mas de compreen- doar generosamente sua vida a serviço
prioridade absoluta em sua vida não der, estimar, promover e evangelizar da Missão Universal da Igreja para
pode ser discípulo d’Ele. anunciar o Amor de Deus revelado em
Exemplificando, São Paulo somente Cristo Jesus, missionário do Pai.
tornou-se o grande missionário entre O processo de aculturação-incultu-
os não-cristãos porque experimentou ração, no qual se encontra um missioná-
esse Amor de Deus manifestado em rio recém-chegado em terra estrangeira,
Jesus Cristo, ponto crucial de toda é árduo e exige atitudes de abertura ao
sua proclamação: “e a vida que agora novo, de liberdade em relação a todo
vivo na carne, vivo-a na fé do Filho de e qualquer tipo de preconceito, uma
Deus, o qual me amou, e se entregou “super” dose de perseverança, além
a si mesmo por mim” (Gal 2, 20). de uma fé madura e equilibrada. Ele
também deveria considerar o fato de
Aculturação e inculturação que, em sua atividade pastoral, está
Na Encíclica Redemptoris Missio constantemente em contato com pes-
(1990) o papa João Paulo II, afirma que soas, e, no caso do Bangladesh, não
“os missionários provenientes de outras somente com cristãos, mas, também
igrejas e países, devem inserir-se no com muçulmanos, hindus, budistas
mundo sociocultural daqueles a quem e animistas, enfim com gente cuja
são enviados, superando os condiciona- bagagem sociocultural e religiosa é
lismos do próprio ambiente de origem. Primeira Eucaristia em Baniarchor, Bangladesh. diferente da sua.

16 Outubro 2009 -
FORMAÇÃO mISSIONÁRIA
Isso, certamente, não é uma tarefa
tão fácil de se realizar, mas não de Para escutar o próximo, Zaqueu e de Mateus junto ao posto de
coleta das taxas, da samaritana junto
todo impossível se há a convicção
de que Deus opera e ama através do o missionário deveria ao poço; podemos olhar também para
a imagem de Deus que aparece nas
missionário que, normalmente, está
em relação com seres humanos e seus
estar livre de todo parábolas de Jesus em Lucas, de modo
particular a do Pai Misericordioso, que
respectivos dramas. Portanto, seus
gestos e atitudes deveriam ser sinais
preconceito. esperava o filho com os braços aber-
tos e cuja boca não proferiu nenhum
concretos do amor e da compaixão julgamento porque quando se julga o
de Deus para com o povo. Esta foi a outro se perde o tempo que se tem para
modalidade absoluta com a qual Jesus amar! Contrariamente, a Sua acolhida
agiu e realizou o seu ministério missio- foi traduzida em gestos concretos que
nário durante toda a sua vida pública. demonstraram muito amor e perdão!
Agindo assim o missionário estará Da mesma forma com que se diz
certamente iniciando um processo de ser difícil anunciar o amor de Deus
evangelização coerente. somente através de palavras, assim
também dificilmente se poderá since-
O gesto-terapia do Amor ramente acolher alguém unicamente
Lemos ainda na Redemptoris Misso: com palavras. Para escutar o próximo,
“na perspectiva de Jesus, as curas são antes de mais nada, o missionário
também sinal da salvação espiritual, isto deveria estar livre de todo e qualquer
é, da libertação do pecado. Realizando tipo de preconceito. A ação pastoral
gestos de cura, Jesus convida à fé, à missionária exige, portanto, uma postura
conversão, ao desejo do perdão (cf. de envolvimento! Isso não é tarefa fácil
Lc 5, 24). Recebida a fé, a cura impele porque, além de disposição e energia,
a ir mais longe: introduz na salvação requer do missionário, sobretudo, sen-
(cf. Lc 18, 42-43). Os gestos de liber- sibilidade. Enfim, deveríamos amar
tação da possessão do demônio, mal com o coração de Deus cujo tempo
supremo e símbolo do pecado e da é gasto para amar. O Seu é um amor
rebelião contra Deus, são sinais de Habitante de Koligram. que nunca se cansa!
que o ‘Reino de Deus chegou até vós’
(Mt 12, 28)” (RM14). Respeito e testemunho Esvaziar-se para encher-se
A atividade pastoral missionária “Não se pode testemunhar Cristo Esvaziar-se de si mesmo para poder
Ad Gentes existe em função de auxi- sem espelhar a Sua imagem”. Poder-se- fazer-se presente para o povo e com o
liar e assistir pessoas que ainda não ia dizer que respeito é acolher a pessoa povo, não somente em corpo, mas, tam-
conhecem Jesus Cristo. Dever-se- assim como a mim ela se apresenta. bém em espírito. Jesus Cristo, quando
ia escutar e experimentar a própria E tal acolhida envolve não somente a foi enviado ao mundo, “esvaziou-se a
dignidade delas que, muitas vezes, é linguagem falada, mas, também toda si mesmo, tomando a forma de servo,
desconhecida por elas mesmas. Não uma postura corporal com a qual se fazendo-se semelhante aos homens”
somente para dizer-lhes o que, como realiza a comunicação. O missionário (Fl 2, 7) para poder viver com os seres
e quando fazer. pode e deve utilizar a linguagem oral na humanos, para poder sentir e pensar
Quando o missionário coloca-se à sua pregação, porém, algumas vezes como pessoa humana e assim com­
disposição para escutar as pessoas, certas atitudes não-verbais podem preender a humanidade e seus proble-
pode fazer a experiência do valor delas contradizer-lhe. Linguagem verbal e mas. Se o missionário chega cheio de
como gente, filhos e filhas amados por não-verbal deveriam ser dois trilhos teorias, esquemas, preconceitos vários,
Deus Pai, especialmente quando esses sobre os quais o anúncio do Reino pode-se entravar uma certa falência já
valores são obscurecidos por inúmeras escorre. no ponto de partida.
e profundas feridas sociais como a Como poderia ter Jesus falado do Não é muito difícil encontrar este-
destruição e a guerra; a miséria e a Amor de Deus sem ter concretamente reótipos de missionários durões, reco-
fome; o sistema opressor de castas; demonstrado respeito, compreensão, bertos por uma certa couraça, visando,
a injustiça e o trabalho escravo de amor e compaixão pelo povo? Ou seja, quem sabe, inconscientemente, não
mulheres e crianças... sem ter sido reflexo da imagem do Pai? demonstrar seus sentimentos e emo-
Como missionário no cenário benga- Isto significa estar em comunhão com ções; ou, contrariamente, fazendo-se
lês, experimento quase cotidianamente o Pai, “Eu e o Pai somos um”. Para um “super-homem” dotado de uma
que, antes de falar do Amor de Deus, poder agir assim, o missionário precisa inteligência superior, de uma cultura
é importante mostrar concretamente ler e interpretar a realidade em que se superior.
esse Amor e para tal necessita-se de encontra com os olhos e o coração de Não é a cultura brasileira, congolesa,
certas habilidades que, às vezes, não Deus. Jesus sempre respeitou e aco- italiana ou bengalesa que salva o mundo.
são levadas em consideração como lheu as pessoas no contexto em que Não é o conhecimento ou inteligência
deveriam ser. Uma delas é saber como estavam e na situação em que viviam. que o missionário ou missionária possui
ganhar a confiança das pessoas, porque Olhemos para o exemplo dos quatro que salva a humanidade. Mas é Jesus,
essa deve ser conquistada! primeiros discípulos pescadores, de Missionário do Pai, que nunca se en-

- Outubro 2009 17
FORMAÇÃO mISSIONÁRIA
vergonhou de revelar sua humanidade.
É o amor de Deus revelado em Cristo
que salva o gênero humano.

Faculdade do Reino
Quando Jesus escolheu seus
discípulos não exigiu deles nenhuma
qualificação universitária, bacharelado,
mestrado ou doutorado. Os primeiros
discípulos eram pessoas simples, pes-
cadores, alguns analfabetos! Todavia,
receberam especial formação direta-
mente do Mestre de Nazaré, que não
exigiu deles nada, senão que permane-
cessem com Ele e aprendessem d’Ele
Padre Luiz Augusto com irmãs da Sociedade de Maria Rainha dos Apóstolos, durante o curso em Dhaka.
como amar gratuitamente.
Antes da partida dos discípulos, de Deus fosse demonstrado. Jesus ocorre. Quantos filhos e filhas de Deus
Jesus lhes dá algumas instruções acer- sempre amou e curou gratuitamente a necessitados que diariamente encon-
ca da metodologia a ser utilizada para todos os que Lhe procuravam. Todavia, tramos, sem saber onde ir nem a quem
realizar a missão. A fim de que tivessem a fé era exigência básica para que recorrer, dirigem-se aos missionários...
o coração livre em função do bom êxito a salvação efetivamente ocorresse. Se por um lado é mais fácil “dar coisas”,
da missão, confiando plenamente na Muitos obtiveram cura física, mas nem por outro, neste complexo contexto, é
sua presença junto a eles, convida-os todos eles foram salvos, isto é, não necessário anunciar a Boa Nova da sal-
especialmente à pobreza, à simpli- reconheceram nos gestos amorosos vação trazida ao mundo por Cristo.
cidade, ao despojamento dos bens de Jesus a presença viva de um Deus “Deus Caritas est”. Com esse tema,
materiais e dos interesses pessoais e que estava buscando salvá-los. Dentre o papa Bento XVI inaugurou o seu
subjetivos (cfr. Mt 10,9-15). os 10 leprosos fisicamente curados, pontificado com a encíclica de mesmo
Depois de formá-los, Jesus envia-os somente um voltou para agradecer e nome, cuja publicação ocorreu em de-
em missão. Ele continua ainda hoje a louvar, reconhecendo assim, em Jesus, zembro de 2005. Procurando dar uma
chamar gente simples, gente ordinária a presença salvadora de Deus (cfr. Lc definição de Deus, o papa aproveitou
para realizar uma missão extraordinária. 17,17). Outros saciaram-se de pão a temática do amor, para falar da ação
Essa missão, prolongamento da Sua abundantemente, mas não acolheram social da Igreja, mostrando através da
própria missão, consiste em anunciar o o “Pão vivo descido do céu”. história, as ações de caridade como
Reino e em lutar objetivamente contra principal meio pelo qual ela tem atuado
tudo aquilo que escraviza o homem e
a mulher, que subtrai-lhes a dignidade
"Preocupados em no mundo.
Se Deus é amor e o missionário é
de filhos e filhas de Deus, impedindo-
os de viver a plenitude da vida em
dar coisas materiais, a pessoa de Deus, logo é bem verdade
a afirmação de que “o missionário é
abundância a qual foram chamados,
isto é, a felicidade.
podemos nos esquecer a pessoa da caridade...” (RM 89,9),
contudo, esse conceito nunca deve
de dar Aquele que ser confundido com assistencialismo.
Dar Aquele que temos Então o missionário, que experimentou
“E disse Pedro: Não tenho prata temos: Jesus Cristo". a caridade de Deus, gastará sua vida
nem ouro; mas o que tenho, isso te dou. para anunciar esse mesmo amor, por-
Em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, Viver a missão em um contexto que compreende que todos os povos
levanta-te e anda” (Atos 3, 6). sociorreligioso como em Bangladesh, têm o direito de conhecer esse amor
Muitas vezes, nós, missionários, cuja miséria assusta mesmo aqueles que salvador.
somos tentados a dar coisas! “Não com ela já têm uma certa “familiaridade”, Nós missionários e missionárias,
nos sintamos satisfeitos apenas dando permanece sempre um grande desa- não deveríamos esquecer que somos
dinheiro. O dinheiro pode ser obtido, fio. Do ponto de vista social, uma das chamados a dar, sobretudo, Aquele com
mas, eles precisam de seu coração para grandes “ciladas” em que o missionário quem nos encontramos e por quem
amá-los. Portanto, espalhe o amor por pode cair, é tornar-se “assistente-social”, nos apaixonamos. Jamais deveríamos
onde quer que vá”. A realidade triste de isto é, dar somente “coisas”. nos esquecer de que a mais terrível
carência material e miséria com que às É verdade que muitos procuravam e desgraçada pobreza é a solidão
vezes o missionário se depara diante de aproximar-se de Jesus não por causa e o sentimento de não ser acolhido,
seus olhos, força-o a dar coisas. Ate aí, de sua pessoa, ou porque a priori acre- respeitado e amado e que, conforme
tudo bem. Jesus também deu “coisas ditavam que Ele fosse Filho de Deus. mostrava Madre Tereza de Calcutá:
materiais”. O problema é quando se Nem por isso Jesus deixou de acolhê-las “no mundo existe mais fome de amor
chega a esquecer, involuntariamente, em suas necessidades ou de curá-las, e de apreciação do que de pão”. 
de dar Aquele que possuímos, isto é, todavia, exigiu algo mais.
o Cristo e Seu Evangelho. A fé não Assim como na época de Jesus, Luiz Augusto Ramos Viera é missionário
era condição exigida para que o amor também aqui e em outros lugares isso xaveriano em Bangladesh.

18 Outubro 2009 -
Roteiro de Encontro
Tema do mês: Personagens em EducAção
a) Acolhida
b) Oração do Pai Nosso de Vanessa Ramos
c) Dinâmica
d) Apresentação do tema, questionamentos e debates

N
e) Divididos em grupos: cada grupo assume um dos perso-
nagens e traça seu perfil, seus objetivos e sua visão de o meio de turbilhões “de gentes” que brotam sabe-se lá de onde,
Educação e imagina quais seriam os comportamentos personagens quase anônimos cruzam ruas e vielas, apertam-se
desse personagem no cotidiano da vida nas calçadas, trens, ônibus e barracos, tentando sobreviver. Nosso
f ) Apresentação de propostas, a partir dos grupos olhar, às vezes tão desatento ignora rostos e histórias. Mas é ne-
g) Debate e reflexão conclusiva cessário ver e reparar com cuidado a realidade. É preciso despertar
h) Oração final e despedida a nossa consciência crítica. Essa consciência, porém, nasce de quê?
A interpretação que fazemos da realidade não é um fenômeno espon-
Foto: Divulgação
tâneo, mas sim fruto de uma construção histórica. A partir dela surgem os
avanços e progressos que tornam mais justa e igualitária a vida, mas ao
mesmo tempo os preconceitos, violências e algemas que tolhem a liber-

Personagens
dade dos seres humanos. Abaixo, falas de personagens ouvidas nas ruas,
trechos de textos presentes em jornais e revistas de grande circulação, e
cartilhas de organizações que atuam na sociedade, provocam essa reflexão.
A Educação, tida como direito de todos em nossa Constituição, não é vista
da mesma forma por todos. Ela é um ato político através do qual se pode
oferecer elementos para a libertação ou aprisionamento humano.

Na periferia

em EducAção
“A gente para pra ouvir a televisão, o rádio e outros meios de comunicação
que despertam nossa atenção. Ouvir a família, os amigos, a TV no ônibus
e no metrô, todos os lugares onde já chegou a energia elétrica. Letreiros
luminosos, placas na estrada, frases em banheiros públicos, instruções
nas máquinas que a gente opera. Mas a gente não sabe ler e não tem
educação de sala de aula porque apesar de jovens, temos que trocar o
banco da escola por trabalho para garantir o sustento da família”.

Empresários
“Nosso objetivo é ‘garimpar’ talentos nas periferias. Somos um grupo
de empresários dispostos a investir de modo concreto e massivo na
educação privada para jovens. Selecionamos alguns jovens a partir
de critérios que estabelecemos como corretos e viáveis. Acreditamos
que suprimos parte da falha da educação pública no Brasil. Estamos
investindo para a qualidade da mão de obra no país”.

Na mídia
“Jovens reclamam que não querem ir à escola porque perderam
o estímulo. É cada vez mais comum a evasão escolar no Brasil.
Resultados mostram que faltam atrativos na escola. Para os go-
vernos estadual e federal, o ensino público está bem. É preciso
valorizar as escolas privadas que selecionam adolescentes e
jovens que se destacam em escolas públicas, oferecendo-lhes
bolsas de estudo, o que estaria lhes permitindo o desenvolvimento
de suas capacidades intelectuais através destas oportunidades,
melhorando a qualidade da educação no país”.

Organizações Não Governamentais


“Oferecemos capacitação, numa perspectiva global e cidadã,
ao jovem em situação de risco. Trabalhamos com educação,
oferecendo ensino supletivo e técnico em empreendedorismo,
para que não se perca tempo. Acreditamos na força de jovens
protagonistas e no desenvolvimento de negócios sólidos com a
marca da sustentabilidade integral. Aceitamos contribuições”.

Estado
“O Programa de Desenvolvimento da Educação, o PAC da
Para refletir: Educação irá investir bilhões de reais, para garantir a qualidade
1. O que se percebe nas diferentes personagens? da educação pública e o acesso de todos”. 
2. Que sentido se dá para a palavra educação nos diferentes
contextos? Vanessa Ramos é do Cimi-SP e colaboradora das revistas Missões,
Mundo e Missão, dos jornais Brasil de Fato e Porantim.

- Outubro 2009 19
Destaque do mês

Campanha Missionária
de Vítor Agnaldo de Menezes vários subsídios: a mensagem do papa A Coleta

A
Bento XVI; santinhos com a Oração Mis- A Coleta feita no Brasil, no Dia Mundial
Campanha Missionária é pro- sionária anual, folhetos informativos e das Missões, através do envelope enviado
movida em todo o mundo pelas complementares para as celebrações do- a cada comunidade é destinada ao Fundo
Pontifícias Obras Missionárias - minicais, cartazes de divulgação e livretos Mundial de Solidariedade Missionária. Com
POM e realizada todos os anos com sugestões, textos e reflexões. Além estes recursos são financiados projetos
em outubro, culminando no Dia disto, para a animação missionária em para catequese, evangelização, formação
Mundial das Missões, no penúlti- geral, são realizadas visitas, assessorias de agentes de pastoral, construção de
mo domingo do mês (18 de outubro, neste e participações em encontros pelo Diretor igrejas, capelas, seminários, formação de
ano). Neste dia todo católico é animado a Nacional e Secretários Nacionais de cada seminaristas e religiosos(as). Boa parte da
dar a sua oferta material para as Missões. uma das obras missionárias pontifícias, a Coleta feita no Brasil retorna ao país para
Quiséramos que esta oferta fosse feita saber: Propagação da Fé, Infância Missio- subsidiar cerca de 150 projetos anuais
mensalmente, durante o ano todo, mas, nária e Adolescência Missionária (ou Santa para as nossas dioceses e paróquias,
infelizmente, a consciência missionária da Infância), São Pedro Apóstolo e União seminários e casas de formação. Nos
Igreja no Brasil ainda é inexpressiva, apesar Missionária, especialmente dedicadas a últimos anos, graças ao crescimento da
de todos os esforços. A responsabilidade animar as comunidades para a missão. coleta e generosidade do nosso povo, os
pelas Missões é de todos os batizados.
Ninguém tem o direito de se furtar a esta
obrigação: “Anunciar o Evangelho não é
para mim um título de glória, é uma obriga-
ção que me foi imposta. Ai de mim, se eu
não evangelizar” (1Cor 9,16). A esta oferta
está associada a formação e vivência da
Espiritualidade Missionária, por meio de
orações e de sacrifícios, como também
da entrega pessoal por um determinado
período ou Ad Vitam (por toda a vida) às
Missões, como serviço à humanidade.
Todo ano crescem as necessidades
da Igreja Católica no mundo: constituição
de novas dioceses; abertura de novos
seminários, devido ao crescimento do
número de jovens que acolhem o chamado
de Cristo a segui-Lo como sacerdotes; re­
giões destruídas por guerras ou fenômenos
naturais, que devem ser reconstruídas;
regiões por longo tempo fechadas à evan-
gelização, e que agora se abrem para ouvir
a mensagem de Cristo. É por isto que a
cooperação dos católicos é necessária.
Cerca de 1.100 dioceses no mundo rece-
bem regularmente ajuda financeira anual
das doações dos fiéis. Estas dioceses
apresentam à Congregação para a Evan-
gelização dos Povos (Vaticano) pedidos
de ajuda, entre outras necessidades, para
catequese, evangelização, seminários, tra-
balhos das comunidades religiosas, meios
de comunicação e transporte, construção
de capelas, igrejas, orfanatos e escolas.
Estas necessidades são providas com as
doações arrecadadas todo ano.

No Brasil
Anualmente as Pontifícias Obras Mis-
sionárias enviam a todas as dioceses do
Brasil, para animar o mês das Missões,

20 Outubro 2009 -
2009
recursos financeiros do Dia Mundial das

Divulgação
Missões celebrado no Brasil têm ajuda-
do projetos em outros países, dentre os
quais, Índia, Ruanda, Angola, Moçam-
bique, Guiné-Bissau, Guiné-Equatorial,
República Democrática do Congo, Malauí,
Mensagem do Papa Etiópia, Indonésia, Timor Leste, Filipinas e
Equador: sinal e gesto concreto de nossa
para o Dia Mundial solidariedade universal.
A Coleta, fruto da generosidade dos bra-
das Missões sileiros, tem crescido cada ano, mas pode
ser mais generosa: muito já recebemos,
“As nações caminharão à sua luz” ­­(Ap 21, 24). podemos agora “dar de nossa pobreza”
O objetivo da missão da Igreja é iluminar com (Puebla, 368). Para isto é necessário
a luz do Evangelho todos os povos em seu organizar a Campanha e fazer chegar a
caminhar na história rumo a Deus, pois Nele todos o apelo de solidariedade mundial.
encontramos a sua plena realização. (...) A Igreja O relatório da Coleta é apresentado todos
não age para ampliar o seu poder ou reforçar os anos no boletim das POM (SIM) e dis-
o seu domínio, mas para levar a todos Cristo, salvação do mundo. Pedimos ponibilizado no seu site: www.pom.org.br.
somente nos colocar a serviço da humanidade, sobretudo daquela sofredora As ofertas mundiais em 2008 alcançaram
e marginalizada (...) a cifra de US$ 163.007.478,80. No Brasil
arrecadamos R$ 4.035.997,28. É muito
1. Todos os povos são chamados à salvação pouca a nossa oferta, se considerarmos
Na verdade, a humanidade inteira tem a vocação radical de voltar à sua o número de católicos.
origem, que é Deus, somente no qual ela encontrará a sua plenitude por meio

Ivo Freijsen
da restauração de todas as coisas em Cristo. A dispersão, a multiplicidade, o
conflito, a inimizade serão repacificadas e reconciliadas através do sangue
da Cruz e reconduzidas à unidade. (...) A missão da Igreja é "contagiar" de
esperança todos os povos. Por isto, Cristo chama, justifica, santifica e envia os
seus discípulos para anunciar o Reino de Deus, a fim de que todas as nações
se tornem Povo de Deus. (...)

2. Igreja peregrina
A Igreja Universal, sem confins e sem fronteiras, se sente responsável por
anunciar o Evangelho a todos os povos (cfr. EN 53). Ela, germe de esperança
por vocação, deve continuar o serviço de Cristo no mundo. A sua missão e o
seu serviço não se limitam às necessidades materiais ou mesmo espirituais que
se exaurem no âmbito da existência temporal, mas na salvação transcendente
que se realiza no Reino de Deus (cfr. EN, 27). (...)
Campo de refugiados no Sudão.
3. Missão Ad Gentes
A missão da Igreja é chamar todos os povos à salvação realizada por Deus “A messe é grande, mas os trabalha-
em seu Filho encarnado. É necessário, portanto, renovar o compromisso de dores são poucos. Rogai, portanto, ao
anunciar o Evangelho, fermento de liberdade e progresso, fraternidade, união e Senhor da messe que mande operários
paz (cfr. AG, 8). Desejo "novamente confirmar que a tarefa de evangelizar todos para a Sua messe.” Estas palavras de
os homens constitui a missão essencial da Igreja" (EN, 14), tarefa e missão Jesus em Lucas 10, 1ss continuam válidas.
que as vastas e profundas mudanças da sociedade atual tornam ainda mais No que se refere ao envio de missioná-
urgentes. (...) Toda a Igreja deve se empenhar na missão Ad Gentes, enquanto rios e missionárias, padres, religiosos,
a soberania salvífica de Cristo não está plenamente realizada: "Agora, porém, religiosas, leigos e leigas, depois de
ainda não vemos que tudo lhe esteja submisso" (Hb 2,8). dois mil anos, a messe continua gran-
de. O Brasil tem apenas cerca de 1.800
4. Evangelizar por meio do martírio missionários(as) além-fronteiras. Há o
Neste dia dedicado às missões, recordo na oração aqueles que fizeram de clamor insistente de milhares de pessoas
suas vidas uma exclusiva consagração ao trabalho de evangelização. Menciono que querem conhecer Jesus, mas falta
em particular as Igrejas locais, os missionários e missionárias que testemunham quem O anuncie. A colaboração material
e propagam o Reino de Deus em situações de perseguição, com formas de de cada cristão católico para as Missões
opressão que vão desde a discriminação social até a prisão, a tortura e a morte. possibilita o envio cada vez maior de
(...) Ao mesmo tempo, convido todos a darem um sinal crível da comunhão missionários Ad Gentes. É indispensável
entre as Igrejas, com uma ajuda econômica, especialmente neste período de a oração insistente: “Rogate, ergo!” Nisto
crise que a humanidade está vivendo, a fim de colocar as jovens Igrejas em consiste o objetivo maior da Campanha
condições de iluminar as pessoas com o Evangelho da caridade. (...) Missionária do mês de outubro: despertar
para a Missão todos os que dormem. 
A todos, a minha bênção.
Papa Bento XVI Vítor Agnaldo de Menezes é sacerdote e secretário nacional da
Pontifícia Obra da Propagação da Fé.

- Outubro 2009 21
A Mãe Consoladora
Mais vida e esperança em Jaguarari.
de Cristina Ribeiro Silva

A
s missionárias da Consolata trabalham em Jaguarari, culto. A celebração foi encerrada com o testemunho missionário
BA, há 21 anos. A Paróquia São João Batista está sob da irmã Marilda Navarini, que convidou todos a participarem da
responsabilidade dos missionários da Consolata e aco- caminhada semanal nas comunidades do entorno. No domingo,
lheu a visita do quadro de Nossa Senhora Consolata que um ônibus lotado de fiéis partiu acompanhando o quadro pe-
chegou, no dia 14 de setembro de 2008, acompanhado regrino. Crianças, adultos e, sobretudo mães com seus bebês
pelas irmãs e fiéis de Monte Santo. Na BR 407, entrada no colo, acorreram de perto e de longe. A coordenadora local
da cidade, ele foi recebido pela comunidade. Padre Adriano Prado, orientou a celebração. Todos rezaram com o fervor de quem
imc, e o povo aguardavam-no com bandeirinhas brancas, fogos e confia e espera da Mãe Consoladora forças, luzes, harmonia e
muita alegria. “Baianas” o aspergiram com “água de cheiro” para paz. Nossa Senhora olhou com ternura para o seu povo.
em seguida fazer uma procissão até a Matriz. Na igreja, a missa
continuou a partir da Liturgia da Palavra. É admirável o respeito Conforto aos doentes
do povo na sua expressão religiosa e cultural. Uma fé mostrada Na capela do bairro Populares os fiéis confiantes tocaram e
em gestos simples, criatividade e poesia. O sertanejo esqueceu beijaram o quadro “milagroso”. Com olhar expressivo, as mãos
a agrura da seca e se deixou banhar pelo acalento materno da estendidas se recolheram ao peito num abraço de gratidão e fé. O
Mãe de Jesus e nossa. dia terminou com muito louvor. No dia seguinte, Maria passou nas
famílias visitando doentes acamados, paralíticos e desanimados.
A marca dos passos À noite veio a despedida e o caminhar para outra comunidade.
A programação previa visitas às famílias, novenas, procissões, No trajeto, os doentes foram colocados diante das casas para
rezas e louvações. Nas comunidades maiores a visita encerrava- verem o “quadro” passar. O cortejo parou. Em silêncio mãe e
se com a celebração eucarística. As “pegadas” da Mãe peregrina filho se entreolharam e se entenderam. Idosos sem condições
pelos caminhos empoeirados do sertão marcaram corações. Na de acompanhar também ficaram à espera da procissão.
saudade permaneceu gravado o recado pessoal a cada filho(a) Moradores da Capela Santo Antônio vieram ao encontro com
que se deixou cativar. Foram dias de intensa felicidade. Com o carro de som, anjinhos e muita gente na certeza de que alguém
importante estava chegando. A coordenadora
Arquivo MC

Ana Lúcia Barbosa saudou a visitante: “Mãe


Consolata, seja bem-vinda! Venha ser a nossa
consolação, a nossa intercessora! Abençoa e
ilumina a cada um de nós!” Na capela as crian-
ças prestaram sua homenagem. Seguiu-se a
celebração da Palavra e a bênção. Novamente
em procissão, o quadro voltou à Matriz no lombo
de um “jegue” que teve seu momento de glória
carregando a Mãe de Jesus. O cortejo lembrou
a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém.
Na comunidade Nossa Senhora Apareci-
da, adolescentes encenaram a aparição do
quadro da Consolata. Apareceu a figura do
Bem-aventurado José Allamano enviando os
primeiros missionários ao Quênia. A encenação
mostrou também a vinda das irmãs à América
como celeiro de novas vocações missionárias.
A visita da Consolata peregrina a Jaguarari foi
encerrada no dia 23 de novembro de 2008, na
Matriz, durante a ordenação diaconal do semi-
narista queniano Bernardo Berna Mwagi, imc,
que fazia pastoral na paróquia. De Jaguarari o
Comunidade da paróquia São João Batista, Jaguarari, BA.
quadro seguiu para São Paulo. A peregrinação
acenar das mãos calejadas e o adeus da despedida, a queima de marcou a preparação do centenário de fundação do Instituto das
fogos que subiu aos céus foi o último louvor ecoando esperança Irmãs Missionárias da Consolata que será comemorado dia 29
de mais vida para todos! de janeiro de 2010. 
A visitação na cidade iniciou com uma procissão da casa das
irmãs até a Matriz, onde a pastoral do terço dos homens liderou o Cristina Ribeiro Silva, MC, é educadora em Brasília, DF.

22 Outubro 2009 -
As religiões

Mangiwau
a serviço da paz
de Mário de Carli

U
m olhar mais atento sobre a Ásia nos revela novas fa-
cetas e paradigmas diante de um mundo em constante
mutação. O maior e mais populoso continente procura
responder de uma maneira original aos desafios nos
mais variados setores. No campo das religiões, o Sri
Lanka, por exemplo, onde no passado houve grandes
atrocidades, este ano acolheu mais de 600.000 pessoas de
várias confissões religiosas entre cristãos, hindus e budistas no
Santuário da Virgem. Na ocasião, o novo arcebispo de Colombo
dom Malcom Ranjiith, fez um apelo para acabar com as divisões
e o ódio. “Comecemos a amar-nos uns aos outros e construamos
uma sociedade mais justa, passando das palavras aos atos”,
afirmou. No passado, as religiões tiveram como objetivo construir
fronteiras, mas hoje são chamadas a construir pontes.

Convivência entre as religiões


A convivência pacífica das religiões é um dos milagres em
Taiwan. Pode suceder que membros da mesma família vene-
rem divindades diferentes, mas isso não constitui motivos de
contrastes ou desentendimentos que gerem conflitos sociais. A
Igreja de Taiwan preocupa-se em esclarecer e harmonizar as
diferentes necessidades do diálogo ecumênico e inter-religioso
e coordenar as iniciativas dos vários grupos religiosos mantendo
boas relações com os líderes das religiões tradicionais. Ao passo
que em Jacarta, na Indonésia, a principal tarefa é desenvolver “Haverá paz no mundo quando
houver paz e diálogo entre as
uma melhor compreensão das diversas tradições religiosas e
culturais, privilegiando algumas áreas, entre elas, os direitos
humanos.
“Quando olhamos as Tradições Religiosas elas trazem em
seu seio o germe do diálogo”, afirma Yusuf Daud, muçulmano religiões” (Hans Küng).
indonésio vivendo em Jacarta, “e se espera do Islã um testemunho
prático do amor que se encontra no Alcorão: ‘não faças aos outros de nossos mundos religiosos, e como Povo de Deus, nossas
aquilo que não queres que te façam a ti’, e nos pede que ‘nos diferenças e semelhanças, mas sobretudo a nossa unicidade
tornemos uma coisa só com os outros’, de ‘viver com os outros’. nas tradições abertas ao outro.
Este jeito nos interroga para que não olhemos simplesmente sob As religiões sempre tiveram um papel preponderante nas
o ponto de vista da gentileza, abertura e estima, mas também de sociedades. Hoje são chamadas a construir pontes e aproximarem
um esvaziamento de si mesmo para se tornar um com os outros, umas às outras pelo conhecimento, tolerância e diálogo. Hans
isto é, de entrar na pele do outro”, considera Yusuf. Küng afirmou com objetividade: “Haverá paz no mundo quando
houver paz e diálogo entre as religiões”. De nossa parte, por mais
Para onde caminham as religiões? contradições que tenham existido, o cristianismo não deixa de
Estas novas dimensões nos fazem entender mais profun- encantar quem o conhece, pois ao carregar dentro de si o germe
damente o que significa para o outro ser cristão, muçulmano, da novidade projeta o indivíduo à liberdade e à responsabilidade,
hindu, budista. O efeito é duplo, isto é, temos cada um de nós tal qual, é a sua própria essência: um movimento imprevisível.
a saída dos limites de nossa própria cultura e o conhecimento Assim poderá novamente criar pontes entre as pessoas, pois
da religião e da linguagem do outro, e predispomo-nos à escu- hoje devemos modestamente reconhecer onde há convergências
ta mútua, que por sua vez gera a disposição de dialogar sem e onde há divergências para que a paz e o diálogo aconteçam
receios. Podemos sentir que as tradições religiosas caminham e se concretizem no seio das religiões. 
olhando muito mais sobre o diálogo inter-religioso, a caridade
e os trabalhos sociais, do que sobre a obediência às suas leis Mário de Carli, imc, é vigário paroquial na Paróquia Nossa Senhora da Penha,
e dogmas. Tudo isto para crescer na recíproca compreensão Jardim Peri, São Paulo.

- Outubro 2009 23
“É missão de todos nós!
Infância
Missionária
Deus chama!”
de Roseane de Araújo Silva

N
este mês missionário celebramos inicialmente Santa
Teresinha do Menino Jesus, a Padroeira das Missões.
Ela morreu precocemente com problemas de saúde,
deixando o exemplo de fidelidade à Santíssima Trindade
e dedicação ao Reino pela oração. Ao lembrar Santa
Teresinha, recordamos também que o missionário se
caracteriza como aquele ou aquela que em sua oração, mantém
o olhar na realidade, na vida concreta do seu próximo. Com isso,
quero falar de uma data também significativa: o dia 17 de outubro,

Pedro Facci
instituído pela Organização das Nações Unidas – ONU como o Dia
Internacional de Erradicação da Pobreza. Essa data surgiu a partir
da Campanha Mundial de Ação contra a Pobreza assumida por
diferentes movimentos da sociedade civil, organizações religiosas,
grupos de jovens, organizações não governamentais e diferentes
associações. Desde 2002 esta Campanha vem acontecendo em
diferentes países, como forma de pressionar estados e governos “Para não ter medo que esse tempo
vai passar, não se desespere não,
Sugestão para o grupo nem pare de sonhar!”
Acolhida (destacar nesse mês o continente africano, com ima- (Gonzaguinha)
gens de crianças em festa, preparar o ambiente com os símbolos
missionários, as cores dos continentes e a Bíblia). Menino de Bangladesh.
Motivação (objetivo): refletir com o grupo a grave situação de
pobreza e fome que sofrem crianças e adolescentes em várias a intensificarem as políticas públicas de combate à pobreza e à
partes do mundo. fome.
Oração espontânea pelas crianças e adolescentes em situação
Estudos comprovam que são as crianças, os adolescentes e as
de pobreza e fome, principalmente na África.
Partilha dos compromissos semanais mulheres os mais afetados pela pobreza. A ONU aponta avanços
Leitura da Palavra de Deus (sugestões para os 4 encontros): importantes na luta contra a pobreza, porém, seus dados indicam
Realidade Missionária: Mc 3, 1-6 Jesus mostra que a lei do que haverá em torno de 70 milhões de pessoas, a mais, vivendo
sábado deve ser interpretada como libertação e vida para o ser na pobreza extrema, do que se previra antes da crise. O Relatório
humano. As leis e normas são importantes em qualquer socieda- da ONU faz referência à necessidade de maiores investimentos
de, mas as leis são necessárias para eliminar as desigualdades para melhorar a saúde materna, a alimentação infantil, o acesso de
sociais e não para reforçar as diferenças.
todas as crianças à escola, sobretudo, nas comunidades rurais e
Espiritualidade Missionária: Lc 6, 17-26 Jesus veio anunciar o
Reino do Pai, ou seja, produzir uma sociedade justa e fraterna. oportunidades de emprego para mulheres, que em muitos países
Para isso acontecer é necessário por fim à pobreza e também ao continuam sendo extremamente reduzidas. Os que mais sofrem
que gera a pobreza. Não é possível libertar o pobre da pobreza estão em algumas regiões da Ásia e da África, além dos países em
sem denunciar o rico para libertá-lo da riqueza. desenvolvimento. Bem próximo de nossas casas ou em lugares
Compromisso missionário: Mt 9, 35-38 No Evangelho de Ma- distantes, muitas crianças e adolescentes clamam por ajuda, alguns
teus, Jesus nos mostra que a missão nasce da realidade e que já perderam até a esperança.
há muito trabalho a fazer. Ele necessita de pessoas dispostas a
continuar a sua obra e levar a Boa Notícia do Reino ao mundo
Como amigos de Jesus que somos, precisamos abraçar esta causa,
inteiro. Neste mês faremos o sacrifício pelas crianças africanas entendendo que esta é uma luta de todos nós para defender a vida.
em campos de refugiados. O nosso Deus é o Deus da Vida e nos enviou Jesus Cristo, como
Vida de Grupo: Mt 25, 31-40 Jesus nos desafia a enxergá-lo no bem nos lembrou Maria em seu cântico Magnificat: “o Todo-Poderoso
pobre e marginalizado. Ter fé significa reconhecimento e compro- realizou grandes obras [...] derruba do trono os poderosos e eleva
misso com a pessoa concreta de Jesus. Também é agir em favor os humildes; aos famintos enche de bens” (Lc 1, 46-56). Jesus
da justiça e da verdade. Em nossa comunidade ou paróquia, também nos ensinou a defender a vida por meio do serviço aos
existem grupos que defendem a vida e a justiça? Conhecemos
algum desses grupos? Procurar informações e marcar uma visita
irmãos (Lc 13, 1-17). Dessa maneira, ser missionário hoje é estar
ao grupo na comunidade ou paróquia. Organizar um mural com atento aos clamores do mundo e ao serviço aos irmãos e, ainda,
material informativo (jornais, panfletos) para tornar conhecido o “colocar-se à disposição de todos com alegria” (2º Compromisso
trabalho visitado. de Vida da IAM). Somos chamados a defender a vida. De todas
Momento de agradecimento (fazer preces espontâneas a partir as crianças do mundo – sempre amigas! 
do tema e do Evangelho).
Canto e despedida.
Roseane de Araújo Silva é missionária leiga e pedagoga da Rede Pública do Paraná.

24 Outubro 2009 -
- Outubro 2009 25
Entrevista

A Pastoral Afro precisa


ganhar espaços sem
pressa e sem pausa!

Identidade

Jaime C. Patias
e Inclusão de Karla Maria entre os afrodescendentes em Barlovento,
na costa venezuelana onde permaneceu
colocar na liturgia romana alguma sim-
bologia ou canto próprio de outra cultura;
inculturar a liturgia significa produzir uma
nova “ritualidade” que aplique os valores
culturais autênticos, a linguagem e os

A
até outubro de 2008. Neste ano sacerdotal símbolos próprios de cada cultura.
Pastoral Afro é opção missionária o padre Francis está celebrando o seu 10º
que vai além das paróquias, sendo aniversário de ordenação e se encontra no Em que o carisma da missão Ad
uma das causas assumidas pelo Seminário Teológico Padre João Batista Gentes no IMC pode contribuir na Pas-
Instituto Missões Consolata - IMC, Bísio, em São Paulo, acompanhando a toral Afro?
na América Latina e no Brasil. formação numa comunidade internacional Eu faria uma dupla pergunta: qual seria
Entre os dias 3 e 10 de agosto, de 20 seminaristas. a contribuição das culturas Afro ao carisma
os padres quenianos atuando no Brasil, do IMC, e em que o nosso carisma fortale-
Joakim Kamau, Stephen Murungi e Francis Padre Francis, como você avalia o ceria a Pastoral Afro? Ou seja, que estilo
Njoroge, participaram do XI EPA - Encontro processo de inculturação do Evangelho de missão pede a realidade do povo Afro?
da Pastoral Afro-Americana e do II EPA na Igreja? Os mesmos destinatários são os que con-
em nível do IMC e Leigos Missionários da A inculturação é um processo longo, tribuem para enriquecer o carisma, desde
Consolata - LMC, realizado na Cidade de lento e com muitos desafios. Não há uma suas culturas, processos históricos e seus
Panamá, no Panamá. cultura normativa para o Evangelho, como contextos atuais. A Congregação nasceu
Padre Francis nasceu em Kiambu, não existe uma cultura pura ou melhor do no norte da Itália, numa cultura da região
­Quênia, em 21 de setembro de 1966, op- que outra. Cada uma tem algo de verdade do Piemonte, mas se espalhou pelo mundo
tando pela vida missionária no carisma do e beleza para contribuir. As culturas não e hoje tem membros de vários países e
IMC, em 1991, quando deixou sua carreira precisam do Evangelho, pois sempre existi- culturas trabalhando em quatro continentes,
de professor e começou seus estudos para ram. É o Evangelho que precisa das culturas em diversas realidades culturais. Tornou-
a missão. Durante sua formação passou para se transformar em Boa Notícia e as se internacional e pluricultural. Isso é uma
por Nairóbi e Londres, sendo ordenado em convocar à conversão. O Evangelho e a riqueza se for bem trabalhada num diálogo
sua terra natal, em 7 de agosto de 1999. pastoral precisam ser concretos, sensíveis de interculturalidade. Cada qual na sua
De sorriso largo e acolhedor, o missionário e relevantes ao povo. Às vezes se começa diferença pode enriquecer o carisma que
lembra que sua primeira missão foi na pe- a inculturação pela liturgia, quando ela por sua vez, pode contribuir na promoção
riferia da Venezuela, na favela de Carapita, deveria ser o último passo de um caminho humana integral, unido à evangelização
em Caracas. Em seguida passou a trabalhar mais abrangente. Inculturar não significa para promover a consolação-libertação

26 Outubro 2009 -
integral no amor: libertação sociocultural, bispos para que se sintam desafiados. e a globalização. Foi um momento de graça
econômica e político-religiosa com uma Enfim, necessitamos ganhar espaços sem nos reunirmos para partilhar experiências
verdadeira consciência de solidarieda- pressa e sem pausa! e caminhos. Chegamos à conclusão de
de e de pertença responsável na Igreja. que precisamos efetivar o diálogo inter-
Consolação entendida como libertação, Qual a missão da Pastoral Afro e religioso e que, para isso é preciso co-
justiça, paz e cuidado da criação. Somos seus maiores desafios? nhecer melhor a religiosidade afro. Nós
chamados por Jesus para estar com Ele A Pastoral Afro tem por missão ajudar o somos semianalfabetos quando se trata
e sermos enviados a partilhar a verdadei- povo a viver sua fé, sem deixar de ser Afro. da religiosidade afro. Este tema contribui
ra consolação, Jesus Cristo. Podemos Reafirmar à sociedade que as diferenças para o diálogo na sociedade e estimula
contribuir para sensibilizar a Igreja local a dos povos, das suas culturas, suas religiões a tolerância, o reconhecimento mútuo e
fazer uma evangelização desde a cultura não são contrárias ao Reino de Deus, mas, proporciona um recíproco enriquecimento.
Afro, investindo na formação de agentes de manifestações da riqueza, das maravilhas Durante o encontro aproveitamos da rique-
Pastoral com uma espiritualidade inspirada da sua obra criadora. A Pastoral deve ajudar za cultural dos participantes, do valor de
no nosso carisma. Em resumo, temos que a aprofundar a inculturação que acontece crescer na solidariedade e espiritualidade
ler o nosso carisma IMC à luz da realidade no contexto de cada cultura, contribuindo própria. Discutimos a situação da mulher e
Afro, e vice versa. para a superação de todos os preconceitos da juventude e concluímos que este tema
e discriminações, reconhecendo os valores deve ser prioritário na Pastoral Afro. Ao
A Pastoral Afro é uma das opções religiosos da cultura Afro. Os Afros são uma término do XI EPA, nós, os missionários
do IMC na Região do Brasil? Quais as grande massa de excluídos. Os desafios e missionárias da Consolata, realizamos
perspectivas para o futuro? grandes estão na superação da pobreza ainda um encontro, com a participação de
Na Venezuela, a Pastoral Afro sempre econômica e educacional, em ajudá-los a alguns leigos, para avaliar e viabilizar um
enfrentou dificuldades, os bispos nem conhecer suas origens e história e elevar sua projeto continental (Brasil, Venezuela e
sempre apoiavam. Na Colômbia há projetos autoestima. A Pastoral Afro precisa superar Colômbia) para a Pastoral Afro. Este foi o
que caminham, a Igreja se dedica muito a institucionalização e sacramentalização segundo encontro entre os missionários e
a esse trabalho. Aqui no Brasil, o Instituto que ignora a expressão cultural do povo. missionárias da Consolata que trabalham
Missões Consolata demonstra disposição Há outros desafios como: elaborar projetos com os afrodescendentes no continente.
para apoiar e acompanhar. Existem algumas articulados com outros movimentos e redes
iniciativas em Salvador, Bahia e no Jardim sociais, a presença de grupos fundamen- Como é, para um africano, trabalhar
Peri e Heliópolis, em São Paulo. Estamos talistas que deturpam a missão, a pouca entre a população afrodescendente da
dando os primeiros passos, mas, preci- sensibilidade por parte dos missionários no América Latina, como foi no caso da
samos de missionários que acreditem na diálogo com as religiões afro-americanas, Venezuela?
Pastoral e é necessário formar uma equipe diálogo inter-religioso, e ainda uma mudança O que faz alguém ser Afro? Acredito
que trabalhe a tempo pleno. Isso requer excessiva dos evangelizadores impedindo que é a consciência e não a cor da pele. O
preparação e formação dos missionários a continuidade no processo de incultura- que é que dá a uma pessoa a identidade
destinados a trabalhar nessa causa e mais ção e de encarnação do Evangelho nas Afro? Alguns não se consideram como
estabilidade no território. Trabalhar em rede, diferentes situações humanas. negros! Existe uma baixa autoestima, por
em comunhão com outras forças atuando causa das experiências desumanas de
na área. Favorecer mais a comunicação e Quais as contribuições do XI EPA na escravidão e exploração e as imagens
promover o estudo e as pesquisas sobre a inclusão e no diálogo inter-religioso? distorcidas da terra mãe, a África e do povo
realidade Afro. Olhando para o futuro, mo- O XI EPA refletiu sobre Globalizar negro em geral. Eu me descobri negro so-
tivar processos formativos nos seminários a Solidariedade, a Espiritualidade Afro- mente quando cheguei a Londres e entrei
e com os leigos também. Nas dioceses Americana e suas expressões religiosas, a em contato com outras raças. Antes não
onde atuamos precisamos envolver os exclusão da pobreza dos afrodescendentes percebia. Eu me orgulho de ser africano.
Na Venezuela eu descobri que apesar de
ser negro, havia muitas diferenças entre
Arquivo Pessoal

eu e o povo Afro-Venezuelano. Tive que


recorrer à inculturação com muita paciência,
abertura e amor como uma ferramenta
indispensável para meu trabalho. Percebi
que o poder do missionário está também
na diferença. Na Venezuela começamos o
estudo da história do povo de Barlovento e
percebemos que a maioria não a conhecia.
Através do estudo da história promovíamos
os valores do povo Afro-Venezuelano e a
sua autoaceitação. Enfim, o meu sonho é
que, todos nós, à luz do Evangelho e da
proposta de Jesus, possamos construir
uma sociedade onde tenhamos oportuni-
dades iguais de trabalho e participação na
sociedade e na Igreja e assim viveremos
de forma justa, igualitária e fraterna como
irmãs e irmãos de Cristo Jesus. 

Participantes do XI EPA - Encontro de Pastoral Afro-Americana, Panamá. Karla Maria, LMC, é estudante de jornalismo.

- Outubro 2009 27
Vamos caminhar,
Atualidade

Fotos: Karla Maria


Povo de Deus!

“Vida em primeiro lugar. A força da transformação está na


organização popular”. No roteiro de apro-
participação quando houver decisão na
sua comunidade. Defender com alegria
lugar. A força da ximadamente 25 quilômetros, mais de 60
ruas e avenidas com 15 paradas, onde os
o tema cidadania”. Nas paradas para
descanso aconteciam celebrações, ter-
transformação está na romeiros eram recebidos com lanches,
sucos e muita animação. Aparecida da
ços, dinâmicas educativas e partilha. A
primeira noite o grupo se abrigou numa
organização popular”. Silva, 76, participa da comunidade Santo
Expedito no bairro Vista Alegre. “Tudo
escola da Vila Souza onde as irmãs da
Congregação do Padre Mazza mantêm
isso é muito especial, uma bênção para um projeto que atende mais de cem
nós”, dizia satisfeita, explicando que crianças. No centro de São Paulo, a
de Jaime Carlos Patias muitas famílias haviam contribuído com Romaria passou pelo Largo do Paissandu
a acolhida. Após o momento de descanso e almoçou no salão São Francisco dos
o líder anunciava: “vamos caminhar, povo Frades Franciscanos, que alimenta o

"N
de Deus, com muita fé e esperança”. povo em situação de rua.
ós caminhamos porque temos Era o grito de ordem que se misturava Na segunda noite, os romeiros foram
fé e acreditamos que é póssível com o barulho dos carros, o latido dos acolhidos na Casa de Oração do Povo de
construir um outro Brasil com cães, vozes de crianças e a música do Rua, construída em 1997, por dom Paulo
cidadania". Sob esta motivação, carro de som. Evaristo Arns, na região da Luz. Neste
a Região Episcopal Brasilândia Os organizadores se revezavam ao local, os romeiros destacaram os pontos
da arquidiocese de São Paulo microfone para explicar à população o fortes da caminhada e a participação da
e a diocese de Santo André, realizaram, significado da ação. “Queremos uma pátria juventude, em especial de Ricardo Pa-
de 5 a 7 de setembro, a 12ª Romaria a livre, justa, onde o povo seja respeitado dilha de Oliveira, 30, que é paraplégico.
Pé, em sintonia com o Grito dos Excluí- e ouvido”, disse Fred Santos, educador “Agradeço a Deus pela coragem desses
dos. Cerca de 60 pessoas caminharam no Centro Pastoral Santa Fé, em São jovens em trazer um deficiente físico junto
do Recanto dos Humildes, em Perus, Paulo, que também atua na defesa dos com eles, mesmo debaixo de chuva forte”,
passando pelos bairros Jaraguá, Tai- direitos humanos. Por todo lado, há muito disse dona Ana Rosa, mãe de Ricardo,
pas, Rincão, Jardim Damasceno, Vista trabalho social sendo desenvolvido nos “isso é sinal da graça de Deus”, concluiu.
Alegre, Vila Souza, Jardim Peri, Vila dos bairros, paróquias, associações e enti- Após o jantar, feito pelos moradores de
Ferroviários e Barra Funda, seguindo dades religiosas. A pedagoga Olívia Luiz rua, frei Alamiro Andrade Silva presidiu
até o centro da cidade de São Paulo. de Souza, coordenadora de obras sociais a eucaristia.
Além do necessário para os três dias, os no bairro Vista Alegre recitou uma poesia Em meio aos inúmeros contrastes,
romeiros levavam a imagem de Nossa sobre cidadania: “todo mundo tem direito os romeiros refletiam sobre a vida dos
Senhora Aparecida, a cruz e uma faixa à saúde e moradia, ao esporte e ao res- povos indígenas, dos afrodescenden-
com o tema do Grito: “Vida em primeiro peito. O pão, lazer e alegria. Sempre ter tes, das crianças e jovens, dos idosos

28 Outubro 2009 -
e aposentados. Falaram da situação da O povo tem fé dos Excluídos, em São Paulo. Presidida
saúde, educação, moradia, transportes, Um dos idealizadores da Romaria a pelo cardeal arcebispo, dom Odilo Pedro
saneamento básico, lixo, meio ambiente e Pé, padre José Aécio Cordeiro da Silva, Scherer, a missa foi marcada por símbolos
economia. Ao ver a imagem da Mãe Apa- adiantou que “o ano que vem ela será que recordavam os diversos gritos do povo
recida, muitas pessoas demonstravam sua melhor. Sabemos que muitas pessoas brasileiro. Concelebraram dom Angéli-
devoção. Na Avenida Inajar de Sousa, três estão excluídas e até lá vamos nos orga- co Sândalo, dom Pedro Luiz Stringhini,
ciganas vindas de Aracaju se mostraram nizar para sair, quem sabe, de Pirapora bispo auxiliar de São Paulo e presidente
interessadas no que estava acontecendo. do Bom Jesus, a 54 quilômetros do centro da Comissão Pastoral de Justiça e Paz
Detiva dos Santos, Briolange da Gan e de São Paulo. A sujeira da cidade vai da CNBB, diversos padres e diáconos.
Normélia Santos Santana disseram que parar em Pirapora pelo Rio Tietê. Iremos “O grito que sobe ao Senhor é fonte de
sempre rezam para que Nossa Senhora lá para dizer que precisamos mudar isso. esperança para o povo que se une aos
faça milagres em favor das pessoas que Quando se recupera um rio, recupera-se trabalhadores e à Romaria de Aparecida”,
pedem uma graça. um Estado, uma Nação”, justificou o padre afirmou dom Pedro fazendo memória dos
Na Vila Palmeiras, encontra-se o Centro que atua na paróquia Nossa Senhora 30 anos do assassinato do líder operário,
Comunitário dos Moradores da Inajar de das Graças, Morro Doce e coordena a Santo Dias. O bispo convidou o povo a
Souza. Dona Benedita dos Santos, 75, Pastoral Carcerária Padre Macedo, na intensificar a coleta de assinaturas para
mostrou a capelinha de Nossa Senhora Região Brasilândia. Perguntado sobre a Campanha Ficha Limpa, que propõe a
que ela mesma construiu e cuida há mais o valor do gesto, padre Aécio explicou: inelegibilidade de candidatos em débito
de 30 anos. “Não sei se estou fazendo bem “Deus é quem criou tudo e não tem como com a justiça.
ou mal, mas, sou evangélica e cuido da separar a fé da vida. O Estado é laico, mas Na homilia, dom Odilo recordou a
capelinha porque fui eu quem fiz quando o povo brasileiro tem muita fé. Temos que última Encíclica de Bento XVI, Caritas in
era católica. Deus é quem sabe. Se ela respeitar os que não têm fé, mas, temos Veritate, sobre o desenvolvimento humano
sabe que eu estou fazendo o bem, ela de respeitar também os que acreditam”, integral na caridade e na verdade. “Além de
também ajuda”, lembrou Benedita. buscar soluções locais, precisamos buscar
Dom Angélico Sândalo, bispo emérito soluções globais. Com tanta tecnologia,
de Blumenau, SC, que mora na Região como é possível existir tanta gente pas-
Brasilândia foi dar seu apoio aos romeiros sando fome, com falta de moradia e sem
na comunidade Nossa Senhora Apareci- trabalho?”, questionou o cardeal. “É preciso
da, nas proximidades da Avenida Inajar globalizar a solidariedade, muito mais do
de Souza. Antônieta Felix da Silva que que pensar no confronto de interesses, é
trabalha na Pastoral da Criança e cuida preciso somar os esforços para uma nova
da capela, partilhou com os romeiros cultura de colaboração, na qual se olhe
as lutas e atividades da comunidade. mais para aqueles que estão excluídos.
Dom Angélico distribuiu um punhado de Isso se realiza na comunidade humana
crucifixos e abençoou os peregrinos. “A universal como numa família”, disse o
exemplo de Moisés, permaneçam firmes arcebispo.
que a libertação vai acontecer. Essa crise Após a missa, liderados por um trio
que está aí acaba pisando na garganta elétrico, empunhando bandeiras, o povo
do trabalhador. Quem caminha com vo- fez a tradicional caminhada da Sé até o
cês é o próprio Jesus. Ele é nosso líder Parque da Independência, no bairro do
e o Espírito Santo se manifesta, não na Ipiranga. A fraca participação dos parti-
gritaria, mas quando o povo se organiza dos políticos e dos grandes sindicatos
para que a dignidade aconteça em cada como a CUT e a Força Sindical nas lutas
pessoa. Deus vos abençoe na caminhada”, dos movimentos sociais foi avaliada pelo
concluiu, animando os romeiros. deputado federal Ivan Valente, do PSOL,
Tudo começou em 1995, numa conver- como um retrocesso. O que falta, segundo
sa na casa de dona Benedita Ferreira. Célia o deputado, “é o povo na rua para fazer
Leme, Maria do Carmo, Eduardo Moreira, as mudanças. Precisamos do povo orga-
Nice Rocha, Orlando Barbe, Sebastião nizado em sindicatos, em associações,
Silva de Souza, Sebastião Gonçalves, em movimentos populares”, argumentou.
Romeiros cruzam o bairro Perus, SP.
Ivo Vescara, padres José Aécio Cordeiro, No Parque da Independência as últimas
José Renato, Jorge Ferreira, Luiz Carlos argumentou. Padre Neil Charles Crombie, lideranças que representavam entidades
Toffanelli e a irmã Elena Conforto, são SPS, vigário episcopal da Região Brasi- organizadoras do Grito em São Paulo
alguns que caminham todos os anos. lândia acolheu os romeiros na catedral. fizeram uso da palavra para expor suas
Segundo Célia Leme, que é teóloga e “Esta romaria é uma lembrança de que reivindicações. Um caixão foi colocado
atua nas CEBs “caminhar faz parte da nem todo mundo ganhou a independência, diante do Monumento da Independên-
vocação da Igreja com raízes bíblicas é um grito pelo povo mais sofrido e pobre cia, simbolizando a necessidade de se
desde a caminhada do povo no deserto. de nossa sociedade”, afirmou. enterrar a corrupção na política brasileira.
A Romaria mostra uma característica das Enquanto isso, em Brasília, o presidente
comunidades como Igreja de base que Grito dos Excluídos Lula anunciava a compra de 36 aviões
sai para anunciar e denunciar, sempre A última etapa levou os romeiros da de caça, 50 helicópteros e 5 submarinos,
comprometida com os mais pobres. Uma região da Luz até a Catedral da Sé, onde operação no valor de R$ 30 bilhões. 
Romaria a Pé tem um grande significado o grupo se uniu às outras pastorais e
para a nossa vida pessoal e para a nossa movimentos populares, para a missa Jaime Carlos Patias, IMC, é diretor da revista Missões, com
organização”, disse. dentro das manifestações do 15º Grito colaboração de Karla Maria, LMC.

- Outubro 2009 29
Amazônia Violência no campo
Semana Missionária em outubro A Comissão Pastoral da Terra, CPT, divulgou no
Pela primeira vez a Igreja do Brasil realiza uma dia 3 de setembro, um balanço da violência no campo
Semana Missionária para a Igreja Católica na Amazô- nos seis primeiros meses do ano. Segundo o levan-
nia. No último dia 28 de agosto, a Comissão Episcopal tamento, de janeiro a junho, o número de conflitos no
para Amazônia, da Conferência Nacional dos Bispos do campo no país apresentou queda de 46%, em relação
Brasil, CNBB, enviou para todas as dioceses do país à igual período de 2008. No Brasil, foram registrados
o material necessário para divulgar a Semana: texto- de janeiro a junho 366 conflitos, envolvendo mais de
base, folders e cartazes. Este ano ela acontece entre 193 mil pessoas, com 12 assassinatos, 44 tentativas
os dias 25 e 31 de outubro, com abertura na catedral de assassinato, 22 ameaças de morte, seis pessoas
da Sé, em Belém, PA. “Queremos que esta iniciativa torturadas e 90 presas. No mesmo período de 2008,
seja uma oportunidade para que todo o povo de Deus foram contabilizados 678 conflitos, com envolvimento
possa engajar-se cada vez mais na ação evangelizadora de mais 301 pessoas e 13 mortes. O levantamento
da Igreja no Brasil”, afirmou o presidente da Comissão aponta, no entanto, crescimento no número de ten-
para a Amazônia, dom Jayme Henrique Chemello tativas de assassinato, de 32, em 2008, para 44, em
sobre as intenções do evento. Segundo a assessora 2009. A média de pessoas envolvidas nos conflitos
da Comissão, irmã Maria Irene Lopes dos Santos, a é maior em 2009. A média nacional, em 2008, era de
Semana pretende envolver a Igreja do Brasil de diversas 445 pessoas envolvidas a cada conflito. Em 2009,
formas. “O projeto visa envolver a Igreja fazendo com este número saltou para 528. O levantamento também
que os leigos entendam a importância da Amazônia sinalizou para 265 casos no Paraná em que famílias
para o Brasil e para o mundo. Aspectos ecológicos, foram submetidas à ação de pistoleiros. Em números
ambientais, econômicos, políticos e, sobretudo, os de pistolagem, o estado só fica atrás da Bahia, que
VOLTA AO BRASIL

voltados para a evangelização”. Ainda de acordo com registrou 744 casos, e Ceará, com 900 casos. Em todo
irmã Irene, a principal meta do projeto é fazer conhecer o país, foram registrados 2.915 casos de pistolagem de
a realidade amazônica. “Queremos fazer conhecer janeiro a junho. No ano passado, o número de casos
e também responder às grandes transformações e no Paraná (855) só foi inferior diante dos registros do
desafios da Amazônia. Com a participação de toda a Pará (2.311) e do Maranhão (944). O presidente da
Igreja vamos enfrentar conjuntamente os desafios da CPT no Paraná, dom Ladislau Biernaski, confirma
evangelização na Amazônia”. O projeto da Semana que os números da violência no campo vêm caindo
Missionária para a Amazônia foi aprovado na última no estado, porém continuam apresentando índices
Assembleia Geral da CNBB que aconteceu em abril, preocupantes. Segundo dom Ladislau, o número de
em Itaici, Indaiatuba, SP. assassinatos cai à medida que se efetivam os assen-
tamentos. “No Paraná já percebemos uma melhora
Brasília – DF no volume de assentamentos, apesar de eles ainda
Estatuto da Igualdade Racial serem em número pequeno”, afirma.
Após quase dez anos de tramitação, a Câmara
aprovou, no dia 9 de setembro, o Estatuto da Igual- Nazaré Paulista – SP
dade Racial. No entanto, foi preciso fazer um acordo Encontro Missionário Regional
com a bancada ruralista da Casa. Para destravar a Com o tema “A Espiritualidade na Vida do
proposta, o deputado Antônio Roberto do PV de Mi- Discípulo(a)”, o Conselho Missionário Regional -
nas Gerais, relator do projeto, aceitou excluir o artigo COMIRE Sul 1 da CNBB, realizou de 28 a 30 de
sobre a regularização de terras quilombolas. Apesar agosto, na Casa de Retiros Mambré Tainá em Nazaré
disso, o movimento negro avaliou como importante o Paulista, diocese de Bragança Paulista, o 29º Encon-
passo dado pela Câmara. A coordenadora do Centro tro Missionário Estadual. O evento foi assessorado
Nacional de Africanidade e Resistência Afro-Brasileira, pela irmã Antônia Mendes Gomes, NDC, da Confe-
Cenarab, Macota Gonçalves, comentou o significado rência dos Religiosos do Brasil – CRB e contou com
da aprovação. “É o Estado brasileiro reconhecendo as participação de 160 representantes das dioceses,
consequências da escravidão, da exploração do povo assessores(as) e coordenadores(as) de Conselhos
negro, do não acesso do povo negro à educação, à Missionários Diocesanos - COMIDIS, da Infância e
saúde”. Pelas regras do Estatuto Racial, os partidos Adolescência Missionárias - IAM, religiosas, padres e
serão obrigados a destinar aos negros 10% de suas seminaristas. Segundo Robson Ferreira, coordenador
vagas para candidaturas nas eleições proporcionais. do COMIRE, Regional Sul 1, o Encontro esteve em
Também, passa a ser obrigatória a inclusão, no currículo sintonia com os últimos congressos missionários, no
do ensino fundamental, de aulas sobre história geral espírito da Conferência de Aparecida. “Queríamos
da África e do negro no Brasil. Na área da saúde, o ressaltar a importância da espiritualidade para, diante
estatuto passa a exigir do sistema público, especiali- dos desafios, não cairmos no ativismo. Penso que
zação no tratamento de doenças mais características atingimos esse objetivo”, disse. Para dom José Maria
dos negros, como a anemia falciforme. Outro ponto é o Pinheiro, bispo de Bragança Paulista e presidente
incentivo fiscal do governo, que poderá ser concedido do COMIRE, o evento foi “uma grande bênção para
para empresas com mais de 20 pessoas ao contratarem a diocese e a cidade de Nazaré Paulista e para o
pelo menos 20% de funcionários negros. A bancada Regional”, destacou. 
ruralista aceitou apoiar a votação do Estatuto em ca-
ráter terminativo. Ou seja, a proposta poderá seguir
diretamente para o Senado, sem ser submetida à
aprovação do plenário da Câmara. Fontes: CNBB, CPT, Notícias do Planalto, revista Missões.
30 Outubro 2009 -
Subsídios Missionários
O Brasil na Missão Continental

O
SIM MISSÕES
s subsídios produzidos Missionários(as)
Pontifícias Obras
pela Comissão respon-
sável pelo Projeto “O Missionárias da Consolata
Brasil na Missão Con- Cx. Postal, 03670 Rua Dom Domingos
tinental”, encontram-se 70084-970 de Silos, 110
disponíveis para download em pági- Brasília - DF 02526-030
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Pe. Jaime C. Patias


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