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ECCLESIA (E) – O que é que está em causa, quando ouvimos hoje falar tanto na
necessidade de defender a liberdade de educação?
Nuno Crato (NC) - Há muitas versões da liberdade de educação. Há a liberdade de
educação no sentido completamente libertário, e que cada um escolha a maneira de
fazer a educação dos seus filhos, há modelos mistos, mas o princípio geral é que é o
princípio correcto: o de as famílias não estarem obrigadas a que a educação dos seus
filhos seja toda feita sobre um modelo estrito, dirigido centralmente.
Claro que tem que haver uma série de directrizes gerais por parte do Estado, e eu julgo
que, em Portugal, as directrizes gerais se transformaram nas directrizes mais específicas
que existem. Em Portugal há muito pouca liberdade de educação, porque o Estado,
centralmente, e os Governos, dirigem a Educação nos seus ínfimos pormenores, no
pormenor da duração das aulas, por exemplo. Eu acho espantoso que esteja
regulamentado por Decreto-lei qual é a duração das aulas. Deveria estar regulamentada
qualquer uma mais geral, no sentido que as crianças deveriam ter um tanto número de
horas de matemática mínimo por semana, um tanto número de horas mínimo de
português, esse tipo de coisas regulamentadas, e isso não está regulamentado, essas
coisas desse ponto de vista estão regulamentadas no pormenor.
O nosso Estado, em relação à Educação, como em relação com outras áreas, substitui o
princípio de avaliar bem e dar liberdade de processos pelo princípio de controlar o
processo e avaliar mal. As escolas não são bem avaliadas, os estudantes não são bem
avaliados, os resultados são pouco avaliados. E, em contrapartida, o que o Estado e os
Governos fazem – todos eles gostam de fazer isso, todos os partidos em Portugal – é
controlar ao mais ínfimo pormenor os processos da escola.
E – Isso exigia a tão falada autonomia das escolas. Há muitos professores e sindicatos
que também não estão muito adeptos desta questão.
NC – Há uma série de pessoas que não estão adeptas mas a autonomia é uma coisa
fundamental. Toda a gente fala de autonomia, toda a gente defende autonomia, mas
depois o que se faz é o contrário da autonomia. Como é que se pode promover a
autonomia das escolas se nem sequer há a autonomia dos horários? Isto é
completamente absurdo. É como se houvesse um ministério central de jornalistas, que
dissesse a que horas é que os jornalistas trabalham, a que horas é que fazem entrevistas,
e que regulasse tudo sobre os jornalistas. Esse é um problema, dei o exemplo da
autonomia nos horários, que é o mais absurdo. Depois há uma série de outras coisas: os
professores são colocados centralmente, pelo Ministério da Educação – imagine o que
se passava no jornalismo, que houvesse um ministério central do jornalismo que
dissesse: este jornalista agora vai para o Diário de Notícias, este vai para a televisão,
este vai para a Antena 2. Isto é absurdo, mas é o que se passa no Ensino: há um
ministério que controla a colocação dos professores.
E – O sistema, tal como existe hoje, a continuar assim, tem tendência a chegar à
ruptura?
NC – Em Portugal, as rupturas são difíceis. Enquanto o pau vai e vem, folgam as costas.
É sempre possível estar pior. Nós estamos muito piores do que estávamos há 10 ou 20
anos, mas também não tenho dados para mostrar isso, porque o Ministério
sistematicamente não dá dados às pessoas, recusa-se a fazer avaliações objectivas dos
alunos e das escolas e, portanto, isto é tudo muito difícil de discutir.
Nos Estados Unidos, desde 1929 que há um exame de saída das escolas secundárias
para entrar nas universidades que é comparável, feito por uma empresa privada. E em
Portugal não, isso não é feito, nós não podemos dizer se os alunos estão melhores ou
piores, ou em que áreas é que estão melhores ou piores.
E - Portanto, para si, é ponto assente que é preciso mais avaliação e mais
transparência?
NC – Mais transparência e mais liberdade às escolas para se organizarem da maneira
que acharem melhor. Criar resultados e não controlar os processos; o que o Ministério
da Educação tem feito é exactamente o contrário.
PRE/JCP/OC