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É impossível ser feliz sozinho

O isolamento social pode causar sérios distúrbios.


Saiba qual é o limite da introspecção e a importância de
se relacionar
Simone Cunha, especial para o iG | 07/04/2011 08:19


Interagir com outras pessoas é essencial para o bem-estar, segundo
especialistas

“A dor da solidão é uma ferida profundamente perturbadora”, afirma o


pesquisador John Cacioppo, professor de psicologia da Universidade de
Chicago e um dos mais renomados pesquisadores sobre solidão dos
Estados Unidos. A afirmação consta no livro Solidão, recém lançado pela
Editora Record, que traz um amplo estudo sobre um ‘estado’ que causa
temor em muita gente: ‘o sentir-se sozinho’. “A solidão remete à angústia
da separação e faz parte do ser humano temer o desamparo”, comenta a
psicóloga do Hospital Samaritano de São Paulo, Luana Viscardi.

Segundo o livro, o isolamento social tem um impacto na saúde


comparável ao efeito da pressão sanguínea alta, da falta de exercícios,
da obesidade e do cigarro. O estudo que deu origem ao livro utilizou
exames de ressonância magnética para estudar as conexões entre
isolamento social e atividade cerebral. E o resultado é que, em pessoas
mais sociáveis, uma região do cérebro conhecida como estriato ventral
ficou muito mais ativa quando elas observavam imagens de pessoas em
situações agradáveis. O mesmo não ocorreu nos cérebros de pessoas
solitárias. Vale destacar que o estriato ventral é uma região importante
para o cérebro, em especial para o aprendizado, ativada por estímulos
que os especialistas chamam de recompensas primárias (como a
comida) e recompensas secundárias (como o dinheiro). A convivência
social e o amor também podem ativar a região.

A dor da solidão é psíquica


Exagero? Que nada! Para Margareth dos Reis, Doutora em Ciências pela
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e psicóloga
do Instituto H. Ellis, de São Paulo, a sensação de vazio provocada pela
solidão pode desenvolver sintomas sérios. “Depressão, compulsão por
comida e alcoolismo podem entrar nessa lista”, confirma Margareth. Já
Luana explica que a dor da solidão não é física, e sim psíquica. “Mas, ao
se sentir sozinha, a pessoa pode ser levada à angústia e daí ter reações
físicas como tontura, sudorese e coração acelerado”, completa. 

Leia também:
 Estilo de vida atual leva à solidão
 A obrigação de ser a pessoa mais feliz do mundo
 Ser gentil faz diferença
Para tratar o problema, em casos mais amenos, o acompanhamento
psicológico pode ajudar. Se o individuo já estiver em um nível mais
crônico, apresentando um quadro depressivo, por exemplo, pode
necessitar de medicamentos. Isso porque, de acordo com a pesquisa
apresentada no livro, os seres humanos são muito mais entrelaçados e
interdependentes – em termos fisiológicos e psicológicos – do que se
supõe. “O ser humano precisa do contato social, pois isso é benéfico
para ele perceber seu potencial, aprender, crescer e trocar experiências”,
diz Margareth. 

Dificuldade de interagir
No entanto, cada vez mais a conectividade está sob risco. “Há uma
enorme oferta de atividades, porém existe uma superficialidade nos
relacionamentos”, alerta Margareth. Para ela, quem vive nas grandes
metrópoles sofre ainda mais com isso. “As pessoas não conseguem se
identificar com as outras, estão sempre reclamando de falta de tempo,
vivem na correria e usam isso para justificar a dificuldade de interagir”,
acrescenta a psicóloga. Além disso, segundo ela, existem as redes
sociais na Internet que conquistam cada vez mais seguidores e, muitas
vezes, criam uma ilusão. “Há pessoas que têm uma rede de contato
extensa, mas não têm intimidade com ninguém. Se quiser uma
companhia para ir ao cinema, por exemplo, não consegue contar com
alguém desta lista virtual”, condena Margareth. 

Em contrapartida, Luana defende que não dá apenas para enxergar os


contatos virtuais de forma negativa. “Tudo depende da forma como cada
um utiliza essa ferramenta. Enquanto alguns se fecham neste mundo
ilusório, outros usam isso para ampliar trocas e reencontrar verdadeiras
amizades.” A superficialidade também está fora do virtual. “Nas grandes
cidades, por exemplo, estão todos centrados no trabalho e, após o
expediente, nem sempre ocorre esta troca”, destaca Luana. 

A versão positiva
John Cacioppo explica em seu estudo que, para um ser da nossa
espécie, a saúde e o bem-estar requerem que o indivíduo esteja
satisfeito e seguro em seus laços com outras pessoas. Seria uma forma
de ‘não se sentir só’. E Margareth acrescenta que um indivíduo solitário
não pode se deixar cair nessa rotina empobrecida, de isolamento e
confinamento de vida. “Se não reagir logo, a pessoa pode ficar
depressiva e indisposta para reverter o caso”, avalia. “Nada substitui a
presença de alguém, o contato”, afirma Margareth.

Embora a solidão esteja sempre atrelada a um sentimento negativo, ela


também apresenta sua versão positiva. Pelo menos é o que defendem os
especialistas. “Se fechar para balanço ou ter um momento de
recolhimento é muito positivo para qualquer pessoa”, diz Margareth. Para
Luana, este pode até ser um processo doloroso, porém de enorme
importância para o crescimento pessoal. “Isso apenas não pode se tornar
constante”, lembra Margareth. Segundo a obra, “quase todos sentem as
pontadas da solidão em algum momento”. E este sentimento pode ser
algo breve e superficial, como ser o último escolhido para uma
brincadeira – ou algo agudo e severo -, como a perda de um ente
querido. “Este tipo de solidão faz parte da vida de qualquer pessoa”,
avalia Margareth. 
 
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