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Cuidados Paliativos

para Não Paliativistas:


Equipe Multiprofissional
Unidade 1: Cuidados Paliativos: introdução
e principais conceitos
Unidade 1

Por que precisamos aprender sobre Cuidados Paliativos? Qual é a posição do


Brasil em relação ao contexto mundial?
Confira a resposta para estes e demais questionamentos nesta unidade.

Finalidade
Apresentar os conceitos de Cuidados Paliativos (CP), reconhecendo sua importância, prin-
cipais abordagens e impactos para pacientes, familiares, profissionais e sistema de saúde,
além de identificar seu contexto no Brasil e no mundo.

Objetivos pedagógicos
Ao final desta unidade, você estará apto a:

• descrever a situação brasileira dos Cuidados Paliativos frente ao contexto mundial;

• reconhecer o seu impacto no paciente, na família, nos profissionais e no sistema de saúde


como um todo;

• identificar os desafios da transdisciplinaridade para a construção de uma dinâmica de


equipe eficaz na abordagem dos Cuidados Paliativos com o paciente.

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Unidade 1

Por que falar de Cuidados Paliativos?


Cuidado Paliativo é uma área que atrai cada vez mais atenção, o que pode ser explicado, entre
outros fatores, pela crescente quantidade de evidências científicas que apontam sua eficácia.
Muitos estudos e artigos científicos, alguns em revistas de alto impacto, como New England
Journal of Medicine, Lancet e BMJ, têm sido publicados nos últimos anos. Veja no gráfico
abaixo as informações encontradas.

Gráfico 1. Artigos publicados sobre Cuidados Paliativos por ano

Nº artigos 14.869
4.500

4.000

3.500

3.000

2.500

2.000

1.500

1.000

500

0
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
2018

Fonte: Organizado pelos autores em pesquisa realizada no PUBMED.

Sintetizando esses achados, a meta-análise Association Between Palliative Care and Patient
and Caregiver outcomes – A Systematic Review and Meta-analysis, publicada pela JAMA em
2016, analisou 43 estudos randomizados, mostrando que, comparado ao grupo controle, o
grupo que recebeu uma intervenção específica de Cuidado Paliativo teve melhores resultados
– como é possível verificar na imagem página a seguir:

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Unidade 1

Melhor qualidade Melhor controle Menos uso de


de vida de sintomas recursos de saúde

Imagem esquemática da síntese de estudos sobre a intervenção dos Cuidados Paliativos.

Em economia, isso tem nome: valor. Nesse sentido, Cuidado Paliativo agrega valor a um siste-
ma de saúde que infelizmente está se tornando insustentável e que muitas vezes não oferece
o que precisamos.

É válido mencionar que, nos 43 estudos randomizados, o grupo Controle é, em geral, o Cui-
dado Paliativo feito com bom senso pela equipe de saúde. Já o grupo Intervenção é o Cuidado
Paliativo feito com técnica específica, que apresentaremos e desenvolveremos neste curso.

Com frequência, profissionais de saúde no Brasil se impressionam com a


dimensão das evidências sobre Cuidados Paliativos, que contrasta com uma
pergunta frequente: “Mas então por que eu nunca tinha ouvido falar disso
antes?”.
A resposta para essa pergunta se relaciona à raridade do Cuidado Paliativo feito
com técnica específica no país, infelizmente tornando essa competência pouco
acessível e pouco disponível no nosso sistema de saúde.

A Organização Mundial de Saúde publicou em 2014 uma avaliação sobre como está a acessi-
bilidade e a disponibilidade do Cuidado Paliativo ofertado ao redor do mundo. Confira a seguir
os dados encontrados.

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Unidade 1

A partir de 2017, o Brasil mudou sua classificação de 3a para 3b, o que identifica que houve
um aumento e maior organização dos serviços de acordo com a população.

Veja abaixo a classificação dos diferentes países quando ao nível:

Tabela 1. Nível de desenvolvimento dos cuidados paliativos em 2017: Grupo 3a

Grupo 3a
CP com escopo multifacetado e sem apoio adequado, com financiamento altamente dependente
de doações, disponibilidade limitada de morfina e pequeno número de hospices e de equipes
de Cuidado Paliativos em relação ao tamanho da população.

Argélia, Benin, Botsuana, Camarões, Congo, Etiópia, Gana, Guiné,


África Madagascar, Mauritânia, Maurício, Moçambique, Namíbia, Níger, Nigéria,
Ruanda, Senegal, Serra Leoa, Tanzânia, Togo

Bolívia, República Dominicana, Equador, Guatemala, Honduras, Jamaica,


Américas
Nicarágua, Paraguai, Peru, Trinidad e Tobago, Venezuela

Afeganistão, Barein, Egito, Irã, Kuwait, Líbano, Líbia, Marrocos, Paquistão,


Mediterrâneo Oriental
Palestina, Sudão, Tunísia

Armênia, Azerbaijão, Bósnia e Herzegovina, Croácia, Estônia, Grécia,


Europa
Quirguistão, Moldávia, Takiquistão, Turquia

Sudeste Asiático Bangladesh, Índia, Indonésia, Myanmar, Nepal, Sri Lanka

Pacífico Ocidental Camboja, Fiji, Malásia, Papua Nova Guiné, Filipinas, Vietnã

Fonte: Adaptada de Clark et al. Mapping Levels of Palliative Care


Development in 198 Countries: The Situation in 2017.

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Tabela 2. Nível de desenvolvimento dos cuidados paliativos em 2017: Grupo 3b

Grupo 3b
Desenvolvimento de CP com apoio local, múltiplas fontes de financiamento, disponibilidade de
morfina, hospices e equipes de CP independentes do sistema de saúde nacional e provisão de
poucas iniciativas educacionais.

África Gêmbia, Quênia, Zâmbia

Américas Belize, Brasil, Colômbia, El Salvador, Panamá

Mediterrâneo Oriental Jordânia, Omã, Catar, Arábia Saudita

Albânia, Belarus, Bulgária, Chipre, Finlândia, Luxemburgo, Macedônia,


Europa
Malta, Sérvia, Eslovênia

Sudeste Asiático -

Pacífico Ocidental -

Fonte: Adaptada de Clark et al. Mapping Levels of Palliative Care Development in 198 Countries: The Situation
in 2017.

Ainda neste estudo, estamos muito atrás da Argentina, Chile, Uruguai e alguns países da
África, como Uganda e Zimbábue, onde o Cuidado Paliativo já é uma política de saúde pública,
e assim conecta as ilhas – que, por sinal, também são em número maior em relação à popu-
lação. Veja as tabelas abaixo:

Tabela 3. Nível de desenvolvimento dos cuidados paliativos em 2017: Grupo 4a

Grupo 4a
Fase preliminar de integração com política de saúde nacional, disponibilidade de atendimento em
diversos níveis, disponibilidade de morfina e outras medicações analgésicas e disponibilidade de
cursos e educação.

África Costa do Marfim, África do Sul, Uganda, Zimbábue

Américas Argentina, Chile, México, Uruguai

Mediterrâneo Oriental -

Áustria, República Tcheca, Geórgia, Hungria, Cazaquistão, Letônia, Rússia,


Europa
Eslováquia, Suíça, Ucrânia

Sudeste Asiático Tailândia

Pacífico Ocidental China, Singapura

Fonte: Adaptada de Clark et al. Mapping Levels of Palliative Care Development in 198 Countries: The Situation
in 2017.

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Tabela 4. Nível de desenvolvimento dos cuidados paliativos em 2017: Grupo 4b

Grupo 4b
Fase avançada de integração com política de saúde nacional.

África Maláui, Essuatíni

Américas Barbados, Canadá, Costa Rica, Estados Unidos da América

Mediterrâneo Oriental -

Bélgica, Dinamarca, França, Alemanha, Islândia, Irlanda, Israel, Itália,


Europa Liechtenstein, Lituânia, Mongólia, Países Baixos, Noruega, Polônia,
Portugal, Romênia, Espanha, Suécia, Reino Unido

Sudeste Asiático -

Pacífico Ocidental Austrália, Japão, Nova Zelândia, Coreia do Sul, Taiwan

Fonte: Adaptada de Clark et al. Mapping Levels of Palliative Care Development in 198 Countries: The Situation
in 2017.

Outros estudos (com outras metodologias) apontaram na mesma direção. Nesse sentido, em
um dos levantamentos mundiais mais estruturados, um grupo patrocinado pelo International
Narcotics Control Board publicou em 2016, no Lancet, um estudo quantificando o consumo de
opioides em 214 países. Este levantamento mostrou que, mundialmente, há uma enorme de-
sigualdade no consumo de opioides, havendo excesso nos países desenvolvidos, enquanto há
carência nos demais. O estudo mostrou ainda que 10% da população mundial – concentrada
nos EUA, Canadá, Austrália e Europa – consomem 90% do opioide no mundo. Toda a América
Latina, América Central, África e Ásia são responsáveis por apenas 10% do consumo total de
opioides no mundo.

No Brasil, os dados demonstram que o consumo de opioides é incompatível quando se rela-


ciona a quantidade mínima prescrita para o controle de dor com o número de pessoas que
vivem e morrem com dor decorrente de doenças avançadas. Na tabela a seguir, são listados
os números do consumo de opioides, calculados em S-DDD (quantidade de opioide em equiva-
lente de morfina consumida em um ano no país/população do país/365 dias):

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Unidade 1

Tabela 5. Aliviando o abismo de acesso a cuidados paliativos e alívio da dor

País S-DDD 2011-2013

Moçambique 5

Etiópia 0

Zâmbia 32

África do Sul 338

Namíbia 119

Panamá 309

México 110

Canadá 22.941

EUA 43.879

Chile 747

Argentina 741

Brasil 342

Bolívia 32

Japão 1192

Coréia do Sul 2244

China 91

Índia 11

Israel 4.664

Turquia 706

Arábia Saudita 258

Rússia 106

Alemanha 23.352

Dinamarca 15.055

Espanha 9.090

França 7.042

Reino Unido 5.227

Itália 3.953

Portugal 2.302

Austrália 13.440

Nova Zelândia 5.505

Fonte: Adaptada de BELTERAME S et al. Utilisation and barriers to


accessing opioid analgesics: A country, regional, and global study.
Disponível em: www.thelancet.com Acesso em: 30 maio 2019. 8
Unidade 1

Embora esteja em curso uma epidemia do consumo em excesso de opioide nos EUA, é ne-
cessário avaliar os dados brasileiros e colocá-los em contexto. Por exemplo: nos EUA, se
prescreve 3.150% a mais do que o recomendado. No Reino Unido, a quantidade prescrita é
próxima à recomendada, enquanto no Brasil é muito abaixo.

Figura 1. Consumo de morfina por milhão de habitantes

Reino Unido Consumo de morfina


5.227 mg por milhão de habitantes

Estados Unidos Equivalente de morfina


55.000 mg por milhão de habitantes

Brasil Consumo de morfina


342 mg por milhão de habitantes

Legenda: Nos EUA se consome em torno de 55 mil mg de equivalente de morfina por milhão de habitantes,
enquanto no Brasil se consome 342 mg de morfina por milhão de habitantes, e no Reino Unido, 5.227. A
prescrição não precisa seguir um exagero brutal, como nos EUA, nem uma carência generalizada, como no
Brasil. É preciso buscar o equilíbrio, como o Reino Unido tem conseguido.
Fonte: Adaptada de Berterame et al. Lancet 2016; 387: 1644.

No Brasil, consumimos menos da metade de opioide por milhão de habitantes do que se con-
some na Argentina ou no Chile – que é em torno de 700 mg –, o que equivale a quase um terço
do que a OMS recomenda. A grande quantidade de pessoas com dor subtratada decorrente
de doenças avançadas em nosso país representa uma ótima oportunidade de melhoria e de-
senvolvimento do Cuidado Paliativo no Brasil.

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Unidade 1

Na tabela a seguir, você pode conferir na íntegra o consumo de opioides na América do Sul.

Tabela 6. Consumo de opioides na América do Sul

Uso de opioides por milhão de habitantes por dia

Mudança
2001-2003 2011-2013
absoluta

152 357
América do Sul 195
(102 to 201) (238 to 455)

Ilhas Malvinas 5.381 2.670 –2.711

Chile 216 747 531

Argentina 158 741 583

Brasil 193 342 149

Colômbia 84 329 245

Uruguai 604 311 –293

Venezuela 94 126 32

Guiana 27 123≠ 96

Peru 55 102 47

Equador 42 79 37

Bolívia 20 32 12

Paraguai 94 0 –94

Suriname 61 0 –61

Fonte: Adaptada de Berterame et al. Lancet 2016.

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Unidade 1

A própria OMS afirmou em unanimidade, em sua 67ª Assembleia Mundial, em 2014, que o
Cuidado Paliativo é uma urgência de política pública para os países do mundo.

Nesse sentido, o Brasil está dando passos significativos para mudar essa realidade. No final
do ano de 2018, foi publicado no Diário Oficial da União a Resolução Nº 41 da Comissão Inter-
gestores Tripartite, estabelecendo as diretrizes para a organização dos Cuidados Paliativos
no Sistema Único de Saúde (SUS).

“Os Cuidados Paliativos deverão fazer parte dos cuidados continuados integrados ofertados
no âmbito da Rede de Atenção a Saúde (RAS).”

Além disso, alinhada com as recomendações da Organização Mundial da Saúde, foi


estabelecido que:
Cuidados Paliativos consistem na assistência promovida por uma equipe
multidisciplinar, que objetiva a melhoria da qualidade de vida do paciente e seus
familiares, diante de uma doença que ameace a vida, por meio da prevenção e alívio
do sofrimento, da identificação precoce, avaliação impecável e tratamento de dor
e demais sintomas físicos, sociais, psicológicos e espirituais. Considera-se elegível
para Cuidados Paliativos toda pessoa afetada por uma doença que ameace a vida,
seja aguda ou crônica, a partir do diagnóstico desta condição.

Essa importante diretriz do Sistema Único de Saúde posicionou o Brasil alinhado às recomen-
dações da Organização Mundial da Saúde e às melhores evidências científicas disponíveis,
que mostram que técnicas de Cuidados Paliativos integradas aos tratamentos que buscam a
cura ou o controle de doenças são capazes de melhorar a qualidade de vida e o controle de
sintomas e reduzir o uso de recursos de saúde, levando a uma assistência de maior qualidade
e menor custo.

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Unidade 1

Para concluir
Como abordado nesta unidade, os Cuidados Paliativos são uma modalidade de assistência
promovida por uma equipe multidisciplinar, sendo indicada desde o momento de um diag-
nóstico de doença ameaçadora da vida, estendendo-se aos cuidados de fim de vida e suporte
ao processo de luto de pessoas que perdem alguém importante. Embora exista esta nova
diretriz do Sistema Único de Saúde aprovada no Brasil, ainda há muito o que ser construído e
trabalhado no âmbito dos Cuidados Paliativos – não apenas no Brasil, mas no mundo. Capa-
citar as equipes de saúde para integrarem em suas práticas a abordagem preconizada pelos
Cuidados Paliativos, instrumentalizando-as no controle de sintomas e sofrimentos, é uma
demanda emergente.

O reconhecimento da especialidade, a estruturação de diretrizes e protocolos claros para


manejo de sintomas e cuidados de conforto, do momento diagnóstico aos cuidados de fim de
vida, com uso de indicadores, bem como a instituição de serviços conforme recomendações
da Organização Mundial da Saúde, dando visibilidade ao cuidado e promovendo qualidade de
vida aos pacientes.

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Unidade 1

O que são Cuidados Paliativos?


Podemos entender melhor a definição atual do conceito de Cuidados Paliativos ao revisarmos
brevemente a história de seu desenvolvimento. Vamos, então, ver rapidamente o que a his-
tória nos ensina sobre Cuidados Paliativos.

A palavra paliar deriva do latim pallium, termo que nomeia o manto que os cavaleiros usavam
para se proteger das tempestades pelos caminhos que percorriam. Proteger é uma forma de
cuidado, que tem como objetivo amenizar a dor e o sofrimento, sejam eles de origem física,
psicológica, social ou espiritual. Esta é a ideia principal dessa filosofia: proteger, amparar,
cobrir e abrigar quando a cura de determinada doença não é mais possível.

Você sabia?
Alguns historiadores apontam que a filosofia paliativista começou na Antiguidade,
com as primeiras definições sobre o cuidar. Na Idade Média, durante as Cruzadas,
era comum achar hospices (hospedarias, em português) em monastérios, que
abrigavam não somente os doentes e moribundos, mas também os famintos,
mulheres em trabalho de parto, pobres, órfãos e leprosos. Esta forma de
hospitalidade, mais do que a busca pela cura, tinha como característica o
acolhimento, a proteção e o alívio do sofrimento.
No século XVII, um jovem padre francês chamado São Vicente de Paula fundou em
Paris a Ordem das Irmãs da Caridade e abriu várias casas para órfãos, pobres,
doentes e moribundos. Em 1900, cinco das Irmãs da Caridade, irlandesas,
fundaram o St. Josephs´s Convent, em Londres, e começaram a visitar os doentes
em suas casas. Em 1902, elas abriram o St. Joseph´s Hospice, que tinha trinta
camas para moribundos pobres.

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Unidade 1

O cuidado paliativo moderno começa no século XX, na Inglaterra, com Cicely Saunders, na dé-
cada de 1950. Esta brilhante mulher graduou-se em serviço social, enfermagem e medicina.
Com muita coragem, muita dedicação e muito trabalho em equipe, mudou a história.

Ela percebeu que, na Inglaterra do final da década de 1950 e início da década 1960, as pes-
soas estavam morrendo de forma penosa. As pessoas que estavam doentes morriam com
dor, em isolamento, sem ter sua dignidade respeitada e seu sofrimento cuidado.

A partir desse problema e da queixa de um paciente (“doutora, tudo em mim está errado”),
ela construiu o extremamente significativo conceito de dor total. Entenda, na imagem a se-
guir, o que é esse conceito.

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Unidade 1

Dor Total defende que a dor não é só física, mas também é:

Emocional

Social

Espiritual

Imagem esquemática dos fatores que podem aumentar ou diminuir a


resposta do paciente à dor.

O primeiro hospice moderno é o St . Christopher´s, que foi inaugurado em 1967 em Londres.


De lá para cá, o conceito de hospice desenvolveu-se enormemente nos EUA, Europa e Austrá-
lia, mas infelizmente não chegou em larga escala a países como o Brasil.

A ideia de Cicely Saunders de cuidar melhor de quem está morrendo foi ganhando o mundo,
a ponto de a própria OMS, na década de 1990, perceber que existia algo ali que precisava ser
abordado mais contundentemente.

Oferecer um cuidado total para a dor total de quem estava morrendo era o conceito inicial
do movimento hospice, iniciado por Cicely Saunders. Essa ideia se concretizou na década de
1960 na Inglaterra e depois ganhou o mundo.

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Unidade 1

Em 1990, a OMS definiu Cuidados Paliativos pela primeira vez, ampliando o conceito iniciado
por Cicely Saunders, que focava os seus cuidados aos pacientes que estavam morrendo. No
final do século XX, a OMS ampliou o conceito para os pacientes que não tinham mais cura,
definindo Cuidado Paliativo como um cuidado total e ativo de pacientes cuja doença não é
responsiva ao tratamento curativo e de seus familiares.

Além dos sintomas físicos, foi definido que o controle de outros sintomas, como psíquicos,
sociais e espirituais, também são importantes. Essa foi a primeira vez em que a palavra “es-
piritual” apareceu em uma definição da OMS, representando um enorme avanço para huma-
nização da assistência.

Na década de 1970, esse movimento começou a ter entrada na América do Norte através de
Elisabeth Kübler-Ross, psiquiatra suíça radicada nos Estados Unidos, que passou a ter co-
nhecimentos dos estudos e trabalhos de Cicely Saunders. Entre 1974 e 1975, foi fundado um
hospice na cidade de Connecticut (EUA) e, a partir daí, o movimento disseminou-se, passando
a integrar os cuidados a pacientes fora de possibilidade de cura.

Por outro lado, o conceito de Cuidados Paliativos definido pela OMS na década de 1990 trouxe
um novo e complexo problema: criou um modelo dicotômico – ou tudo, ou nada; ou curativo,
ou paliativo. Esta é uma compreensão reducionista e enviesada sobre cuidado paliativo, e que
vem sendo desconstruída, mas é importante entendermos as raízes desta confusão.

Quem são os pacientes indicados aos Cuidados Paliativos? Em que momento


eles se beneficiam desta abordagem?

Tratamento Tratamento
Curativo-restaurativo Paliativo

Início da Tempo Morte


doença Evolução da doença

Imagem esquemática do modelo dicotômico: cuidado curativo ou


Cuidados Paliativos.

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Unidade 1

Nem sempre é fácil trabalharmos com esta definição. É comum a afirmação de que o paciente
com câncer de pâncreas metastático, por exemplo, não tem uma doença passível de cura.
Esta pode ser uma compreensão alcançada pelos profissionais, mas discutir como e quais
são os objetivos de cuidado daquela pessoa pode ser desafiador e não tão claro em relação
à indicação da integração do cuidado paliativo naquele momento.

E então, tem início a seguinte discussão entre os profissionais que estão assistindo o pacien-
te: ele tem uma doença incurável (câncer de pâncreas) e deve receber cuidado paliativo? Se
este paciente apresentar uma complicação aguda, como uma pneumonia, deve ser encami-
nhado à UTI? Nesta discussão quem perde é o paciente.

Muitas vezes, em meio à discussão sobre o motivo da internação ser a pneumonia ou o cân-
cer, quem perde é o paciente, que acaba sendo deixado em segundo plano. Traçar essa linha
não é tão simples, e por esse motivo que os Cuidados Paliativos feitos de uma maneira dico-
tômica (ou sim, ou não, tudo ou nada) é muito abrupto e prejudicial para todos os envolvidos,
incluindo o profissional de saúde, que muitas vezes entende que os Cuidados Paliativos são
uma forma de desistir, uma forma de parar ou não fazer. E é pior para o paciente e sua fa-
mília, que se sentem desamparados e abandonados em um momento tão difícil da doença e
da vida.

Por todos esses motivos, em 2002, a OMS redefiniu o conceito de Cuidados


Paliativos. A questão de ser ou não curável tornou-se irrelevante. A definição
atual é de que os Cuidados Paliativos são indicados para pessoas, sejam adultas
ou crianças, que têm uma doença que ameace a vida, de modo que a abordagem
de Cuidados Paliativos foque no sofrimento relacionado a uma doença grave,
independentemente de a doença ser ou não curável.

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Unidade 1

Veja a seguir, a linha do tempo que resume como a OMS chegou a essa definição.

1967 1990 2002

Cicely Saunders A OMS amplia o A OMS expande o


começa a cuidar da dor conceito de dor total, conceito, redefinindo-o
total de quem estava aplicando-o para quem como uma abordagem
morrendo. não tem cura. para cuidar do
sofrimento de quem
tem uma doença grave.

Imagem esquemática da linha do tempo para a definição do conceito de Cuidados Paliativos.

Para ampliar o seu conhecimento, sugerimos a leitura da definição sobre Cuidados


Paliativos no site da OMS.
Link: www.who.int

Se tivéssemos que reduzir esse conceito inteiro a uma frase, afirmaríamos que “Cuidados
Paliativos são uma competência que o profissional de saúde desenvolve para cuidar do so-
frimento dos pacientes que enfrentam uma doença grave e que ameace a vida e de suas
famílias”.

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Unidade 1

Conceituado dessa maneira, podemos então entender por que Cuidados Paliativos podem e
devem ser oferecidos ao longo de todo o curso de uma doença grave:

Doença que ameace a vida

Doença incurável

Fim de vida

Imagem esquemática da evolução do conceito de


Cuidados Paliativos.

Didaticamente, agruparemos as competências essenciais para a assistência de Cuidados Pa-


liativos em três grupos:

Quadro 1. Competências essenciais para a assistência de Cuidados Paliativos na atualidade

1 Aprender a controlar sintomas como dor, dispneia, náuseas e outros.

Ajudar pacientes e familiares a cultivarem consciência de prognóstico


2
e capacidade de lidar com emoções fortes.

Discutir objetivos e planejamento de cuidados de forma compartilhada


3
e centrada na pessoa.

Fonte: Organizado pelos autores.

19
Unidade 1

Assim, podemos também entender que a discussão mais importante diante de um paciente
com doença grave é o recebimento ou não de Cuidados Paliativos. Podemos pensar de uma
maneira mais pragmática:

Paciente com Priorizar o tratamento da doença, minimizando o


doença grave sofrimento?

Ou

Quais são os Priorizar o cuidado ao sofrimento e tratar a doença,


tratamentos da doença? desde que este tratamento não cause ainda mais
Quais são os cuidados
sofrimento?
ao sofrimento?
Ou
Focar totalmente no cuidado ao sofrimento,
Qual é o objetivo da
promovendo a melhor qualidade de vida possível e
assistência neste
momento? permitindo a evolução da doença de forma mais
natural e menos sofrida até o momento do óbito? 

Mapa mental sobre decisões que devem ser consideradas na discussão diante de um paciente com
doença grave.
Fonte: Organizado pelos autores.

O grande objetivo deste curso é ensinar a incorporação de Cuidados Paliativos como técnicas
para cuidar efetiva e empaticamente do sofrimento – motivo pelo qual a OMS entende que os
Cuidados Paliativos não devem ser oferecidos somente por especialistas da área.

Para a OMS e para a Academia Nacional de Cuidado Paliativo, o CP geral pode ser
oferecido por profissionais que cuidem de pacientes graves e que tenham uma
formação básica em Cuidados Paliativos.

20
Unidade 1

Isso inclui profissionais da atenção primária e também da atenção especializada, como car-
diologistas, oncologistas, intensivistas, emergencistas, nefrologistas, entre muitos outros.
Naturalmente, a indicação de aprendizado em CP vai além de médicos, estendendo-se a todos
os profissionais da saúde, como enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, fisioterapeu-
tas, terapeutas ocupacionais, nutricionistas, farmacêuticos, fonoaudiólogos, entre outros.

Para ampliar o seu conhecimento, sugerimos o acesso ao site da Academia Nacional


de Cuidado Paliativo.
Link: https://paliativo.org.br/

Além dos Cuidados Paliativos gerais, existe o nível especializado, em que o CP é oferecido
por profissionais que se dedicam especificamente a essa área. São profissionais que pres-
tam assistência a casos mais complexos e têm também a função de matriciar e promover a
educação em CP para todos os profissionais da saúde. Somente assim, em rede e de forma
integrada, é que as necessidades de CP de todos os pacientes poderão ser atendidas de ma-
neira efetiva e oportuna.

21
Unidade 1

Figura 2. Níveis de atenção em Cuidados Paliativos segundo a OMS e a ANCP

Níveis de atenção em CP

Cuidados Paliativos Cuidados Paliativos Cuidados Paliativos


Ações e políticas que Gerais especializados
promovam os Cuidado Realizado por Realizado por uma
Paliativos. profissional com equipe com capacitação
capacitação básica. especializada.

Fonte: Adaptada de Análise Situacional e Recomendações para Estruturação de Programas de


Cuidados Paliativos no Brasil. Academia Nacional de Cuidados Paliativos, 2018.

Cuidados Paliativos no Brasil


No Brasil, os Cuidados Paliativos começaram a ganhar visibilidade no ano de 1990, tendo a
criação da primeira Associação Brasileira de Cuidado Paliativo (ABCP), em São Paulo, pela
psicóloga Ana Georgia Cavalcanti de Melo. O objetivo era a divulgação da prática com o intui-
to de padronização. Posteriormente, no ano de 2005, surge Academia Nacional de Cuidados
Paliativos (ANCP), com o intuito de ampliar a discussão científica, criando, no ano seguinte,
o Manual de Cuidados Paliativos, para a padronização e a implementação dos cuidados nos
estabelecimentos brasileiros.

No que diz respeito aos regimentos profissionais na equipe multidisciplinar, há duas resolu-
ções que discorrem sobre o tema de Cuidados Paliativos, pertencentes ao Conselho Federal
de Enfermagem (COFEN) e ao Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (CRE-
FITO), sendo elas:

RESOLUÇÃO COFEN Nº 564/2017 - CAPÍTULO II – DOS DEVERES


Art. 48 Prestar assistência de enfermagem promovendo a qualidade de vida à
pessoa e família no processo do nascer, viver, morrer e luto.
Parágrafo único. Nos casos de doenças graves incuráveis e terminais com risco
iminente de morte, em consonância com a equipe multiprofissional, oferecer todos
os cuidados paliativos disponíveis para assegurar o conforto físico, psíquico, social
e espiritual, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal.

22
Unidade 1

RESOLUÇÃO 429, DE 08 DE JULHO DE 2013


Reconhece e disciplina a especialidade de Terapia Ocupacional em Contextos
Hospitalares, define as áreas de atuação e as competências do terapeuta
ocupacional especialista em Contextos Hospitalares e da outras providências.
CONSIDERANDO o Código de Ética e Deontologia da Terapia Ocupacional, disposto na
Resolução COFFITO nº 425, de 03 de maio de 2013.
RESOLVE:
Art. 4º A formação profissional dessa especialidade, enquadrada na área requerida
– “Terapia Ocupacional em Contextos Hospitalares”, apresenta três áreas de
atuação: “Atenção intra-hospitalar”, “Atenção extra-hospitalar oferecida pelo
hospital” e “Atenção em Cuidados Paliativos”, como descrito a seguir:
III. A área de atuação de “Atenção em Cuidados Paliativos” compreende
o oferecimento de cuidados terapêuticos ocupacionais junto a equipes
multiprofissionais, a pacientes com condições crônico-degenerativas
potencialmente fatais (oncológicas e não-oncológicas) e que estão em tratamento
sem condições de modificação da doença; os Cuidados Paliativos podem ser
realizados tanto em contextos intra-hospitalares, como através de ações em
contextos extra-hospitalares oferecidas por equipe hospitalar, não se restringem
à fase de terminalidade da vida e são considerados cuidados preventivos, pois
previnem um grande sofrimento motivado por dores, sintomas e pelas múltiplas
perdas físicas, psicossociais e espirituais e podem reduzir o risco de luto
complicado.

23
Unidade 1

Para concluir
Nesta seção, pudemos ver os conceitos de Cuidados Paliativos, bem como a amplitude de
atuação que podemos oferecer ao integrarmos a abordagem paliativa desde o momento
diagnóstico.

Aprender e entender quem são aqueles pacientes que podem se beneficiar do acompanha-
mento com equipes de Cuidados Paliativos e que sua indicação está relacionada a doenças
que podem ameaçar e vida e causar sofrimento ao paciente e sua família é o grande dis-
parador desta seção, uma vez que é nosso papel multiplicar conhecimento e auxiliar para
que exista cada vez mais qualidade no cuidado aos pacientes com doenças que podem gerar
grande sofrimento.

24
Unidade 1

Trabalho em equipe: desafios da


transdisciplinaridade
A transdisciplinaridade envolve um modelo no qual o principal objetivo é favorecer um uma
abordagem centrada nas necessidades do paciente, a partir de uma compreensão global de
suas necessidades clínicas, psicossociais e espirituais. É um modelo que demanda maturi-
dade e flexibilidade e envolve variáveis institucionais, pessoais e do grupo, o que gera um
desafio, como discorreremos nesta Unidade.

Perceber um suporte
adequado, uma
comunicação fluida entre
os diferentes membros da
equipe e receber
orientações na mesma
direção fortalece o
sentimento de segurança e
cuidado dos pacientes e
familiares.

Imagem esquemática do vínculo profissional de confiança.

Existem diversas formas de se estabelecer uma dinâmica de equipe: a equipe pode ser multi-
disciplinar, interdisciplinar ou transdisciplinar.

Veja no quadro a seguir as características de cada uma delas:

25
Unidade 1

Quadro 2. Características de cada equipe

As especialidades estão lado a lado, visando conhecer melhor o paciente,


entretanto com objetivos específicos de cada área, que não necessariamente
Equipe são compartilhados, bem como as informações adquiridas por cada
multidisciplinar especialidade. O problema é uma visão limitada por áreas e a criação de
verdades regionais que não são representativas da vivência global do paciente
em seu processo de adoecimento.

Caracteriza-se pela criação de especialidades mistas e complexas, visando


o paciente em sua totalidade, e não mais fragmentado pelo olhar específico
Equipe
de cada área. Nesta dinâmica, está presente um diálogo em equipe para a
interdisciplinar
construção de um objetivo comum após o compartilhamento das informações.
Promove o enriquecimento e a transformação dos conhecimentos.

O termo transdisciplinar foi cunhado por Piaget na década de 1960 e


representa uma equipe que apresenta uma sintonia e conexão entre seus
membros significativas o bastante pata haver uma vivência singular do que é
Equipe
trabalhar em equipe. Há necessidade da sobreposição de muitos “saberes”,
transdisciplinar
possibilitando o uso de diversos instrumentais teóricos, conceituais e/
ou empíricos na ação conjunta. Os limites entre os campos de ação
(competências) ficam mais flexíveis, sem perder suas identidades (papéis).

Fonte: Organizado pelos autores.

Para conseguir que um verdadeiro trabalho em equipe seja realizado, alguns requisitos são
necessários. É preciso que os profissionais entendam que seu conhecimento é importante e
essencial, embora unilateral; portanto só estará completo quando todos profissionais envol-
vidos se dispuserem a ver, escutar, perceberem e compreenderem os outros conhecimentos.

A equipe perceberá que há um ser humano por trás do ser doente e assim como tratamos a
doença, cuidamos da pessoa que está doente em um sentido amplo da palavra.

26
Unidade 1

Atitudes de cuidado, portanto, são essenciais “na relação com o paciente” em


Cuidados Paliativos, assim como atitudes de respeito são imprescindíveis na
“relação com outros profissionais da saúde”. Só assim a equipe chegará a um
consenso. Isso implica relacionar-se uns com os outros em equipe de uma forma
envolvente, significante e responsável.

Veja no quadro abaixo alguns fatores facilitadores dessa transformação para o desenvolvi-
mento de um trabalho em equipe.

27
Unidade 1

Quadro 3. Fatores facilitadores para o trabalho em equipe

• A disponibilidade de pertença e a percepção de que sua contribuição


é parte essencial para o resultado.

• Capacidade de compartilhar, escutar e utilizar o próprio


conhecimento à luz do conhecimento do outro.

• Capacidade de dar apoio entre si (emocional, prático e informacional),


favorecendo mecanismos de suporte constantes e eficientes,
inclusive os decorrentes de luto por mortes e perdas.

• Capacidade de nutrir seus elementos por feedbacks pertinentes,


favorecendo sentimentos de “pertencimento”.

• Respeito às diferentes especialidades.

• Humildade para reconhecer medos, inseguranças, erros e limites.

Fonte: Organizado pelos autores.

Para além dos fatores facilitadores, existem ferramentas de um exercício diário de uma equi-
pe para uma dinâmica interdisciplinar e idealmente transdisciplinar. Veja no quadro a seguir.

Quadro 4. Ferramentas de um exercício diário de uma equipe para uma dinâmica interdisciplinar

Tanto para a discussão de casos quanto para a atualização científica, as


Reuniões reuniões de equipe são uma importante ferramenta, que através de uma
de equipe linguagem clara, pode fazer o saber circular livremente, tornando-o acessível
à todos os membros do grupo.

É uma fonte rápida de informações de diferentes áreas, embora não seja tão
Prontuário
suficiente e eficiente quanto o compartilhamento e discussão pessoal entre os
do paciente
profissionais envolvidos.

Atendimentos São um excelente exercício de interdisciplinaridade, uma vez que possibilita


em equipe ver in loco como o especialista de outra área atua durante o atendimento.

São uma oportunidade de aprendizado e de amparo para o profissional


Conferências
realizar uma comunicação com diferentes familiares, que, muito
familiares em equipe
provavelmente, apresentam enfrentamento e demandas distintas.

Fonte: Organizado pelos autores.

28
Unidade 1

A criação de uma equipe de Cuidados Paliativos depende de necessidades institucionais e


disponibilidade dos profissionais para uma formação em CP. Contempla a disponibilidade de
compartilhamento, incluindo a demanda de uma comunicação fluida e presente, intra e ex-
traequipe, para que a equipe se mantenha coesa.

A equipe “ideal” é aquela que corresponde às necessidades de cada paciente e


em paliativos, especificamente, paciente e família são membros da equipe quando
participam e se corresponsabilizam pela tomada de decisões.

Desafios institucionais envolvem desmistificar e explicitar o que são os Cuidados Paliativos e


disponibilizar recursos para que a equipe de Cuidados Paliativos trabalhe, por exemplo com-
preender que a consulta de um paliativista demanda um tempo razoável. Segundo Almeida
(2015), alguns elementos podem ser considerados facilitadores para o modelo de transdis-
ciplinaridade, veja na imagem esquemática a seguir.

• Valorização do trabalho em CP (demanda reconhecida);

• Disponibilização de recursos econômicos e de pessoal;

• Reconhecimento das características “diferenciadas” e


Alguns dos elementos
necessidades da equipe de CP;
facilitadores para o
modelo de
transdisciplinaridade • Disponibilização aos profissionais de flexibilidade de
são as instituições que: tempo, necessária para a execução das tarefas;

• Incentivo de encaminhamentos por parte das equipes


de saúde primárias;

• Investimento em educação, capacitação e pesquisa.

Imagem esquemática dos elementos facilitadores para o modelo de transdisciplinaridade.

29
Unidade 1

Para concluir
O modelo de atuação transdisciplinar permite o reconhecimento da complementaridade en-
tre os saberes e a percepção da impossibilidade de cada área dar conta do todo. É na riqueza
dos diferentes olhares que obtemos uma visão integral do paciente e da família e é por meio
do consenso que chegamos o mais próximo possível de uma atuação ideal em Cuidados Palia-
tivos, tendo como centro as necessidades do paciente.

Essas trocas permitem o compartilhamento das diferentes visões dos profissionais envolvi-
dos no cuidado e favorecem a coconstrução do plano de cuidados em equipe. Os limites entre
os campos de ação (competências) ficam mais flexíveis, mas sem perder suas identidades
(papéis). É algo que traz ganhos para todos os envolvidos, e que na prática demandará muita
maturidade da equipe, uma vez que a dinâmica relacional precede um funcionamento em que
a hierarquia é horizontal.

30
Unidade 1

Considerações finais
Mais do que uma filosofia de cuidado, Cuidados Paliativos também são uma competência de
cuidado fortemente baseada em evidência, com impacto em melhorar a qualidade de vida de
pacientes e em alocar melhor o uso de recursos de saúde. É uma recomendação até mesmo
da Organização Mundial de Saúde e, mais recentemente, do Sistema Único de Saúde. No en-
tanto, nosso país ainda está atrasado na disponibilidade do CP. Por isso é tão necessário que
profissionais com as mais diferentes formações e das mais diferentes regiões se capacitem
para oferecer o essencial de CP para todos aqueles pacientes e familiares que precisarem –
esse é o motivo pelo qual consideramos tão importante falar sobre CP e também o objetivo
maior deste curso.

Aprender a cuidar do sofrimento de quem tem uma doença grave não é somente algo intui-
tivo, que aprendemos por bom senso. Esse cuidado é também uma técnica, que pode ser
estudada, aprendida e aplicada ao cuidado das várias dimensões do sofrimento humano.
A clareza de que esses cuidados ao sofrimento podem e devem ser oferecidos ao longo do
curso da doença de forma integrada e feita em rede foi a grande mudança conceitual do CP
neste século XXI e o objetivo principal de aprendizado desta unidade.

31
Unidade 1

Referências
1. Análise situacional e recomendações para estruturação de programas de cuidados paliativos no
Brasil. Academia Nacional de Cuidados Paliativos, 2018.

2. Building Integrated Palliative Care Programs and Services. WHO Collaborating Centre Public
Health Palliative Care Programmes. 2017 by Xavier G.mez-Batiste & Stephen Connor.

3. Conselho Feredral de Medicina (Brasil). Resolução CFM nº 1995/2006.

4. Moritz RD, Deicas A, Capalbo M et al. II Forum of the “End of Life Study Group of the Southern
Cone of America”: palliative care definitions, recommendations and integrated actions for
intensive care and pediatric intensive care units. Rev Bras Ter. Intensiva. 2011; 23(1):24-29.

5. Kavalieratos D, et al. Association Between Palliative Care and Patient and Caregiver Outcomes A
Systematic Review and Meta-analysis. JAMA 2017.

6. Bernacki,R; Block, S. Communication About Serious Illness Care Goals: A Review and Synthesis of
Best Practices. JAMA Intern Med. doi:10.1001/jamainternmed. 2014.5271.

7. Temel, J. S. et al. Early palliative care for patients with metastatic non-small-cell lung cancer. N.
Engl. J. Med. 363, 733–742 (2010).

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