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EDUARDA FERREIRA DOS SANTOS

TECTÔNICA NA ARQUITETURA:
DIRETRIZES PARA O PROJETO DE EDIFICAÇÕES
UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
CAMPUS ARAPIRACA
CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO

EDUARDA FERREIRA DOS SANTOS

TECTÔNICA NA ARQUITETURA: DIRETRIZES PARA O PROJETO DE


EDIFICAÇÕES

ARAPIRACA
2018
EDUARDA FERREIRA DOS SANTOS

TECTÔNICA NA ARQUITETURA: DIRETRIZES PARA O PROJETO DE


EDIFICAÇÕES

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao


Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade
Federal de Alagoas – UFAL, Campus de Arapiraca,
como requisito parcial para obtenção do título de
graduação.

Orientador: Prof. Me. Edler Oliveira Santos

ARAPIRACA
2018
EDUARDA FERREIRA DOS SANTOS

TECTÔNICA NA ARQUITETURA:
DIRETRIZES PARA O PROJETO DE EDIFICAÇÕES

Trabalho de Conclusão de Curso submetido ao


Corpo Docente do Curso de Arquitetura e
Urbanismo, da Universidade Federal de Alagoas –
UFAL, Campus de Arapiraca.

Data de Aprovação: 29/10/2018

Banca Examinadora:

___________________________________________________________
Prof. Me. Edler Oliveira Santos
Universidade Federal de Alagoas – UFAL
Campus Arapiraca
Orientador

___________________________________________________________
Profª. Dra. Elisabeth de Albuquerque Cavalcanti Duarte Gonçalves
Universidade Federal de Alagoas – UFAL
Campus Arapiraca
Examinador Interno

___________________________________________________________
Profª. Dra. Simone Carnaúba Torres
Universidade Federal de Alagoas – UFAL
Campus Arapiraca
Examinador Interno

___________________________________________________________
Arqtª. Urb. Nívea Pereira Cavalcante Silva
Arquiteta e Urbanista
Examinador Externo
A Deus...

...por ter me dado força e persistência e não


me deixar desistir diante das dificuldades da
graduação.
AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus por ter me proporcionado a oportunidade de


conseguir ingressar em uma Universidade Federal, realizando um sonho que lutei
para conquistar. Aos meus pais pelo apoio ao longo da graduação, pela confiança
depositada em mim e pelo investimento em prol da minha formação, sempre
comentando com orgulho que a filha deles estuda na UFAL. Agradeço de coração ao
meu noivo pela paciência ao me transmitir tranquilidade nos momentos exaustivos em
todo percurso, me amparando nos dias angustiantes de entregas de projeto e quando
a conquista da graduação parecia estar tão distante. Gratidão aos professores que
sempre estiveram dispostos a transmitir experiências, em especial ao meu orientador
Edler Oliveira que despertou em mim o interesse pelo tema abordado nesse trabalho,
de maneira paciente e firme soube extrair de mim as melhores palavras e cada vez
mais instigou a minha curiosidade pelo tema. As minhas amigas Ailma Leanne e
Larissa Emily, por tornar esta caminhada e os dias de desespero mais leves e menos
angustiantes. Aos arquitetos José Martins do Bonfim Júnior, Ricardo Marcelino, Olga
Francino e Isabelle Oliveira pela oportunidade de estágio contribuindo de forma
significativa para minha formação e me oferecendo a oportunidade de adquirir novas
experiências através do contato com o dia-a-dia de um escritório profissional.
“Imponha-me um sistema estrutural e
naturalmente encontrarei as formas que
devem resultar. Mas, se você mudar a
estrutura, serei obrigado a mudar as formas.”

(Viollet – le – Duc)
RESUMO

Há algumas décadas, a tectônica na arquitetura se configura como um campo de


pesquisa que desperta o interesse de teóricos e projetistas, resultando em uma
produção crítica e projetual dispersa em diferentes momentos da história. Atualmente,
a discursão do tema se faz necessária devido à falta de conciliação entre a forma
arquitetônica e a estrutura dentro do projeto, problemática comum em obras
contemporâneas. Assim, esta pesquisa parte do pressuposto de que um projeto
resulta de uma relação de elementos, capazes de transmitir mensagens e sensações,
onde a estrutura pode contribuir de forma significativa para a valorização de obras
arquitetônicas, desde que não seja considerada apenas como o esqueleto que
sustenta qualquer espaço. Nesse sentido, este trabalho tem por objetivo investigar o
potencial do uso das estruturas na concepção e produção de espaços arquitetônicos.
Para isso, foi realizado um estudo sobre as origens e os desdobramentos do conceito
de tectônica em arquitetura ao longo do tempo. Em seguida, se fez necessário
compreender as possibilidades de interface entre forma arquitetônica e estrutura das
construções através de análises de obras nacionais com caráter tectônico. Por fim,
foram elaboradas diretrizes fundamentadas no conceito da tectônica em arquitetura a
fim de orientar concepção de edificações. Após esse percurso, foi possível elencar
pontos onde a tectônica se manifesta no espaço edificado, valorizando-o seja
internamente ou externamente, contribuindo para uma produção arquitetônica crítica
e qualificada em oposição à padronização observada atualmente.

Palavras-chave: Tectônica na arquitetura. Forma arquitetônica. Forma estrutural.


Diretrizes de projeto.
ABSTRACT

For some decades now, tectonics in architecture has become a field of research that
arouses the interest of theoreticians and architectural designers, resulting in a critical
and projectual production dispersed at different moments in history. Nowadays, the
discussion of the theme is necessary due to the lack of conciliation between the
architectural form and the structure within the project, a common problem in
contemporary works. Thus, this research starts from the assumption that a project
results from a relation of elements, capable of transmitting messages and sensations,
where the structure can significantly contribute to the recognition of the importance of
architectural works, since it is not considered only as the skeleton that supports any
space. In this sense, this work aims to investigate the potential of the use of structures
in the design and production of architectural spaces. For that, a study was carried out
on the origins and the unfolding of the concept of tectonics in architecture over time.
Then, it was necessary to understand the possibilities of interface between
architectural form and structure of buildings through analyzes of national works with
tectonic character. Finally, guidelines were developed based on the concept of
tectonics in architecture in order to guide the design of buildings. After this procedure,
it was possible to list points where tectonics manifests itself in the built space, enriching
it either internally or externally, contributing to a critical and qualified architectural
production as opposed to the standardization currently observed.

Keywords: Tectonics in architecture. Architectural form. Structural form. Project


guidelines.
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Estádio Millennium .................................................................................... 29


Figura 2 - Entrada ..................................................................................................... 29
Figura 3 - Universidade pública de Navarra, Espanha .............................................. 30
Figura 4 - Período Gótico - Igreja San Giorgio Maggiore, Itália ................................. 30
Figura 5 - Cidade da música, Paris ........................................................................... 30
Figura 6 - Centro The Dome...................................................................................... 30
Figura 7 - Museu de Arte Romana, Espanha ............................................................ 32
Figura 8 - Terminal 4 do aeroporto JFK, EUA ........................................................... 33
Figura 9 - Detalhe / Contraventamentos horizontais em V ........................................ 33
Figura 10 - Capela de São Benedito, Suíça .............................................................. 34
Figura 11 - Santuário Dom Bosco / Perspectiva interna ............................................ 35
Figura 12 - Santuário Dom Bosco / Fachadas........................................................... 35
Figura 13 - Diferentes leiautes estruturais afetando a forma do espaço ................... 36
Figura 14 - Aeroporto Internacional de San Francisco / Treliças espaciais ............... 38
Figura 15 - Biblioteca pública de Vancouver, Canadá ............................................... 39
Figura 16 - Biblioteca pública de Vancouver / Detalhe coberta ................................. 39
Figura 17 - Edifício na 88 Wood Street ..................................................................... 39
Figura 18 - Detalhes colunas..................................................................................... 39
Figura 19 - Palácio da justiça em Melun, França ...................................................... 40
Figura 20 - Gare do Oriente, Lisboa .......................................................................... 41
Figura 21 - Fachada principal .................................................................................... 41
Figura 22 - Gare do Oriente / Estrutura da coberta ................................................... 41
Figura 23 - Palacette do Esporte, Roma ................................................................... 43
Figura 24 - Projeto Eden, Inglaterra .......................................................................... 43
Figura 25 - Pavilhão no Japão................................................................................... 44
Figura 26 - Pavilhão de Portugal, Lisboa – Corte Lateral .......................................... 45
Figura 27 - Pavilhão de Portugal, Lisboa – Fachada poente ..................................... 46
Figura 28 - Estádio de Futebol Licorne, França – Vista superior............................... 47
Figura 29 - Estádio de Futebol Licorne - Estrutura interna ........................................ 47
Figura 30 - Fachada Casa Ludwig Erhard ................................................................. 49
Figura 31 - Vista superior Casa Ludwig Erhard ......................................................... 49
Figura 32 - O Grande Arco, Paris .............................................................................. 50
Figura 33 - Viga tipo Vierendeel ................................................................................ 51
Figura 34 - Residência para Ministro de Estado / João Filgueiras Lima (Lelé).......... 52
Figura 35 - Casa do fascismo, Itália .......................................................................... 53
Figura 36 - Banco de Hong Kong e Shanghai, China ................................................ 54
Figura 37 - Banco de Hong Kong e Shanghai / Detalhe estrutural ............................ 55
Figura 38 - Yerba Buenas Lofts, EUA ....................................................................... 56
Figura 39 - Aeroporto Internacional Dulles, EUA....................................................... 57
Figura 40 - Centro Pompidou, Paris .......................................................................... 58
Figura 41 - Hotel de las Artes .................................................................................... 59
Figura 42 - Detalhe treliças ....................................................................................... 59
Figura 43 - Arena castelão / Perspectiva superior ..................................................... 63
Figura 44 - Estrutura de perímetro ............................................................................ 63
Figura 45 - Arena Castelão / Entradas ...................................................................... 64
Figura 46 - Planta baixa 1º Pavimento. ..................................................................... 65
Figura 47 - Planta baixa 2º Pavimento ...................................................................... 65
Figura 48 – Planta baixa 3º Pavimento ..................................................................... 65
Figura 49 - Esqueleto estrutural / Pórticos externos.................................................. 65
Figura 50 - Esquema da cobertura ............................................................................ 65
Figura 51 - Estádio Beira Rio .................................................................................... 67
Figura 52 - Estádio Beira Rio / Entradas ................................................................... 67
Figura 53 - Estádio Beira Rio / Cobertura ................................................................. 68
Figura 54 - Estádio Beira Rio / Óculo central ............................................................ 68
Figura 55 - Planta livre .............................................................................................. 69
Figura 56 - Planta de coberta .................................................................................... 69
Figura 57 - Esqueleto estrutural ................................................................................ 69
Figura 58 - Estrutura de perímetro ............................................................................ 69
Figura 59 - Estádio Mané Garrincha ......................................................................... 71
Figura 60 - Planta baixa ............................................................................................ 72
Figura 61 - Esqueleto estrutural ................................................................................ 72
Figura 62 - Cobertura com óculo central ................................................................... 73
Figura 63 – Estrutura externa desprendida do corpo da edificação .......................... 73
Figura 64 - Raios de sol incidindo diretamente nos pilares ....................................... 74
Figura 65 - Pilares sendo refletidos internamente ..................................................... 74
Figura 66 – Catedral de Brasília / 1ª Fase da construção ......................................... 76
Figura 67 – Catedral de Brasília / 2ª Fase da construção ......................................... 76
Figura 68 – Esqueleto estrutural / Amarração dos pilares ......................................... 79
Figura 69 - Cintamento inferior/ Esforços de tração .................................................. 79
Figura 70 - Cintamento superior / esforços de compressão ...................................... 79
Figura 71 - Cintamento superior / Visão externa ...................................................... 80
Figura 72 - Cintamento superior / visão interna......................................................... 80
Figura 73 – Píer de Mauá antes da intervenção........................................................ 82
Figura 74 - Píer de Mauá após a revitalização .......................................................... 83
Figura 75 - Composição estrutural ............................................................................ 84
Figura 76 - Esquema de direcionamento da coberta ao longo do dia ....................... 84
Figura 77 – Cobertura metálica autoportante ............................................................ 85
Figura 78 - Museu Oscar Niemeyer .......................................................................... 87
Figura 79 - Museu do Olho / Fachada ....................................................................... 88
Figura 80 - Detalhe da pintura ................................................................................... 88
Figura 81 - Fachada principal .................................................................................... 89
Figura 82 - Casca / Corte .......................................................................................... 89
Figura 83 - Cubo / Corte ............................................................................................ 89
Figura 84 – Fachada: Textura ................................................................................... 89
Figura 85 - Detalhe.................................................................................................... 89
Figura 86 - Casa Gerassi / Fachada principal ........................................................... 91
Figura 87 - Planta baixa / térreo ................................................................................ 92
Figura 88 - Planta baixa / Pav. superior .................................................................... 93
Figura 89 - Instalações aparentes ............................................................................. 95
Figura 90 - Fachada .................................................................................................. 96
Figura 91 - Terraço com árvore de pequeno porte sobre a laje ................................ 96
Figura 92 - Parte térrea: Quartos e jardim interno ..................................................... 96
Figura 93 – Fachada ................................................................................................. 98
Figura 94 - Estrutura aparente de grandes dimensões. ............................................ 99
Figura 95 - Implantação ............................................................................................ 99
Figura 96 - Diferenciação de níveis ......................................................................... 100
Figura 97 - Jardim interno ....................................................................................... 100
LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Ficha técnica (Arena Castelão) ............................................................... 66


Quadro 2 - Ficha técnica (Estádio Beira Rio) ............................................................ 70
Quadro 3 - Ficha técnica (Estádio Mané Garrincha) ................................................. 75
Quadro 4 - Ficha técnica (Catedral de Brasília) ........................................................ 81
Quadro 5 - Ficha técnica (Museu do Amanhã) .......................................................... 86
Quadro 6 - Ficha técnica (Museu Oscar Niemeyer) .................................................. 90
Quadro 7 - Ficha técnica (Residência Gerassi) ......................................................... 94
Quadro 8 - Ficha técnica (Residência Mipibu)........................................................... 97
Quadro 9 - Ficha técnica (Residência LLM) ............................................................ 101
Quadro 10 - Diretrizes projetuais............................................................................. 106
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 14
1.1. Objetivos ............................................................................................................ 16
1.2. Procedimentos metodológicos ........................................................................... 16
1.3. Justificativa ......................................................................................................... 17
2 TECTÔNICA NA ARQUITETURA ......................................................................... 19
2.1 A estrutura aparente ............................................................................................ 26
2.2. Os diferentes papéis da estrutura ...................................................................... 28
2.3 Elementos expressivos da Tectônica .................................................................. 42
2.3.1 Cascas ............................................................................................................. 42
2.3.2 Membranas ...................................................................................................... 44
2.3.3 Catenárias ........................................................................................................ 45
2.3.4 Estruturas Nervuradas...................................................................................... 46
2.3.5 Arcos ................................................................................................................ 48
2.3.6 Pórticos ............................................................................................................ 50
2.3.7 Viga Vierendeel ................................................................................................ 51
2.3.8 Paredes ............................................................................................................ 52
2.4. Categorias da Tectônica..................................................................................... 53
2.4.1 Modulação ........................................................................................................ 56
2.4.2 Relevo e textura ............................................................................................... 57
2.4.3 Máscaras e filtros ............................................................................................. 58
2.4.4 Escala da estrutura .......................................................................................... 59
3 TECTÔNICA EXPRESSA EM OBRAS BRASILEIRAS......................................... 61
3.1 Grupo 1 – Escala macro ...................................................................................... 62
3.1.1 Arena Castelão ................................................................................................. 62
3.1.2 Estádio Beira Rio .............................................................................................. 67
3.1.3 Estádio Mané Garrincha ................................................................................... 71
3.2 Grupo 2 – Média escala ...................................................................................... 76
3.2.1 Catedral de Brasília .......................................................................................... 76
3.2.2 Museu do Amanhã ........................................................................................... 82
3.2.2 Museu Oscar Niemeyer (MON) ........................................................................ 87
3.3 Grupo 3 – Escala micro ....................................................................................... 91
3.3.1 Residência Gerassi .......................................................................................... 91
3.3.2 Residência Mipibu ............................................................................................ 95
3.3.2 Residência LLM ................................................................................................ 98
4 TECTÔNICA: ESTRATÉGIAS DE PROJETO ..................................................... 102
4.1 Planta livre......................................................................................................... 103
4.2 Estrutura de perímetro....................................................................................... 103
4.3 Luz e sombra..................................................................................................... 104
4.4 Estrutura aparente ............................................................................................. 104
4.5 Simbolismo ........................................................................................................ 105
4.6 Escala de estrutura ........................................................................................... 105
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 108
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 109
14

1 INTRODUÇÃO
15

1 INTRODUÇÃO

Arquitetura é a arte de projetar, que envolve uma série de processos que resultam
em um produto final que relacione conceito e técnica. O papel dos arquitetos e
engenheiros é integrar concepção e execução da melhor forma possível, podendo por
meio dessa aliança chegar a um resultado final satisfatório que cause impacto visual
e sensitivo a quem observe a edificação. Parece ser comum na literatura
especializada que consideram a estrutura como sendo a essência da arquitetura, o
fato de que é preciso conscientizar os arquitetos para que revejam suas posições e
que acabem com a tendência de resumir a arquitetura a pura estratégia de consumo,
sem a valorização dos seus aspectos técnicos e construtivos.
A necessidade de se pensar em um projeto a partir da inter-relação de diversos
subsistemas é uma tendência cada vez mais comum na arquitetura atual. A
sensibilidade em conceber projetos que transmitam mensagens e sensações requer
um processo de criação onde forma arquitetônica e forma estrutural são
desenvolvidas paralelamente, a fim de que a sua relação estabeleça uma coerência
interna, ou seja, que o involucro de uma construção e seu interior se complementem
e interajam de forma positiva (Charleson, 2009).
De modo geral, a padronização permeia a área da construção civil resultando na
tendência da arquitetura de caminhar para um lugar comum, onde há uma carência
na busca por novas técnicas e inovações que contribuam na qualidade dos processos
construtivos e dos produtos edificados. Isso acaba sendo um ponto negativo diante
das oportunidades perdidas de criar obras com maior riqueza de detalhes, que
despertem diferentes interpretações e promovam experiências únicas para seus
usuários.
De acordo com Gregotti (2006), a tectônica, através de suas estratégias, pode
transformar a arquitetura massiva e padronizada que temos hoje, uma vez que a
estrutura pode ser o detalhe que está fazendo falta na arquitetura atual. O que ele
chama de detalhe engloba tudo aquilo que possa impactar de alguma forma aqueles
que veem o espaço, que permitem que o arquiteto dê vida e sentido a qualquer lugar.
Em sua fala define que a arquitetura é a perfeita união entre a teoria e a prática e que
a arte de fazer arquitetura está nos detalhes, lamentando que os arquitetos
contemporâneos pareçam ter esquecido disso. De acordo com ele esse é o fator que
diferencia a arquitetura da construção propriamente dita.
16

Em sua fala define que a arquitetura é a perfeita união entre a teoria e a prática e
que a arte de fazer arquitetura está nos detalhes lamentando que os arquitetos
contemporâneos pareçam ter esquecido disso. De acordo com ele esse é o fator que
diferencia a arquitetura da construção propriamente dita.
Assim, a fim de investigar esses aspectos iniciais, este trabalho parte do
pressuposto de que as questões estruturais e construtivas podem ser a principal
motivação para a concepção projetual de edifícios, como resposta a tendência atual,
tal como aponta Gregotti, Frascari, Frampton (2008), à padronização excessiva da
arquitetura.
Inicialmente, o Capítulo 2 (Tectônica na arquitetura) aprofunda o conceito de
tectônica e as mudanças sofridas por ele ao longo do tempo, assim como aborda por
meio de exemplos nacionais e internacionais, elementos e categorias que expressam
a tectônica dentro de uma edificação. Em seguida o Capítulo 3 (Tectônica expressa
em obras brasileiras), analisa obras brasileiras, em escala macro, média e micro, a
partir das categorias e elementos expressivos da tectônica. Por fim, o Capítulo 4
(Tectônica: Estratégias de projeto) apresenta diretrizes projetuais fundamentadas
no conceito de tectônica, visando a integração entre forma e estrutura na concepção
de projetos.

1.1 Objetivos

O objetivo geral deste trabalho consiste em investigar o potencial do uso das


estruturas na concepção e produção de espaços arquitetônicos. Esse processo se
dará mediante aos seguintes objetivos específicos:
 Investigar as origens e os desdobramentos do conceito de tectônica em
arquitetura ao longo do tempo;
 Compreender possibilidades de interface entre forma arquitetônica e estruturas
das construções de diversas escalas;
 Elaborar diretrizes de projeto fundamentadas no conceito da tectônica em
arquitetura;

1.2 Procedimentos metodológicos

A etapa inicial consistiu em uma extensa pesquisa bibliográfica afim de entender o


conceito de tectônica e todas as teorias que o envolvem mediante as mudanças
17

sofridas ao longo do tempo. Ao concluir essa etapa, foram adotados os seguintes


procedimentos metodológicos:
1. Seleção de obras brasileiras de caráter tectônico, a fim de investigar as
possibilidades de interface entre forma e estrutura. Os critérios utilizados na
seleção foram escala e tipologia: o primeiro grupo foi formado por edificações
de escala macro com área útil acima de 100.000 m² e compreende três estádios
de futebol, que apesar de apresentarem a mesma tipologia são dotados de
soluções estruturais diferentes. O segundo grupo compreende edificações
institucionais de média escala com área útil entre 1200 m² e 15000 m². Por fim,
o terceiro grupo de escala micro é composto por residências com área útil até
1200 m². A separação em três grupos definidos por esses critérios permitirá
identificar estratégias de projeto em comum adotadas em edificações com
programas semelhantes, apesar da variação quanto às soluções arquitetônicas
e estruturais;
2. Após definidos os grupos de estudo, foi desenvolvida uma ficha técnica a partir
do estudo aprofundado de cada construção contendo informações relevantes
e destacando as categorias e elementos da tectônica presentes em cada uma
das obras selecionadas. Após concluir todas as fichas técnicas das edificações
selecionadas foi feito um comparativo com o objetivo de extrair o que de comum
essas construções apresentam do ponto de vista tectônico;
3. Diante das análises feitas, serão sistematizadas diretrizes, fundamentadas na
tectônica, que poderão ser utilizadas como estratégias durante o processo de
projeto, a fim de possibilitar que a estrutura assuma um papel central na
concepção de edifícios e se torne um elemento definidor e transformador de
espaços arquitetônicos.

1.3 Justificativa

Considera-se importante um aprofundamento desse tema em consequência da


carência bibliográfica e de pesquisas acadêmicas. Em decorrência disso, as
possibilidades de interface entre estética e estrutura ainda são pouco exploradas no
âmbito das pesquisas sobre projeto em arquitetura. Assim, este trabalho pode
enriquecer o conteúdo existente sobre tectônica no meio acadêmico, uma vez que
investiga obras brasileiras como forma de valorização da produção arquitetônica
18

nacional. Não obstante, esse fator se torna um diferencial tendo em vista que a maioria
das investigações sobre esse tema, compreendem obras internacionais. Nesse ponto,
o trabalho inova ao abordar que, apesar de bastante conhecidas, não foram
analisadas pelos seus aspectos tectônicos.
Além disso, o apontamento de diretrizes fundamentadas no conceito da
tectônica em arquitetura pode ser útil a estudantes e profissionais que se dedicam
diariamente ao projeto de edificações, contribuindo para produção arquitetônica crítica
e qualificada, que sinaliza para a superação da padronização observada atualmente.
19
19

2 TECTÔNICA NA ARQUITETURA
20

2 TECTÔNICA NA ARQUITETURA

Este capítulo dedica-se a definição do conceito de tectônica, sua origem e


mudanças ao longo do tempo. Para isso são comparadas definições de autores que
realizaram estudos acerca dos desdobramentos do tema. Como forma de melhor
compreensão da extensão do termo o capítulo foi subdividido em duas partes. A
primeira parte foca em elementos que são característicos do emprego do conceito em
edificações. Assim, são apresentadas análises de obras, elaboradas por
pesquisadores desse campo de pesquisa, a fim de demonstrar os elementos
aplicados em edifícios. Dando continuidade, a segunda parte demonstra as principais
categorias da tectônica que são fatores capazes de aliar forma arquitetônica,
estrutural e estética, especificamente o que objetiva o desenvolvimento da tectônica
em construções.
Ainda pouco conhecida no âmbito acadêmico, a palavra tectônica em um
primeiro momento nos remete apenas ao ramo geológico, porém, há teóricos e
pesquisadores que relacionam esse termo a elementos que componham a arquitetura.
Também conhecido como “poética da construção”, o termo não é algo recente e nem
exclusivo do estudo das placas continentais, justamente por isso o interesse por seu
significado dentro da arquitetura, sua origem e abrangência é algo crescente. Isso se
deu devido a proporção atingida pela obra Studies in Tectonic Culture de Kenneth
Frampton, responsável pelo notório crescimento do conceito de tectônica sobretudo a
partir dos anos 90. Referência na discussão sobre a história da arquitetura e sua
composição, Frampton (2008) buscou em seu livro desenvolver uma análise mais
poética da construção, sem desprender-se totalmente da materialidade do espaço
construído, mas, buscando a conciliação entre forma e sensação. O ponto chave
dessa conciliação está no fato de explorar técnicas construtivas e estruturais que por
necessidade já são utilizadas, porém muitas vezes negligenciadas. Utilizadas pois
toda e qualquer edificação necessita de um sistema estrutural que a sustente, e
negligenciadas quando muitas vezes esse sistema é camuflado de alguma forma,
devido ao fato de alguns projetistas não acreditarem no potencial enriquecedor da
estrutura nas construções.
A padronização, decorrente desse descrédito do papel da estrutura enquanto
definidora da forma e diferenciadora do espaço arquitetônico, surgiu no ramo da
construção a partir do Movimento Moderno num contexto histórico e econômico do
21

pós-guerra, no continente Europeu. Isto é, a padronização e estandardização foi


crucial na reconstrução das cidades devastadas pela guerra, onde o suprimento
acelerado de habitação se configurou como o aspecto crucial desse problema.
Dessa forma, Le Coubusier, arquiteto reconhecido mundialmente por lançar as
bases do movimento moderno na arquitetura e urbanismo, desenvolveu projetos de
habitações padronizadas que tinham como principal característica a produção em
série para que as cidades fossem construídas mais rapidamente.
Contudo, Barone (2002) afirma que essa estratégia eficiente para resolver o
caos criado pela guerra foi amplamente questionada por teóricos e arquitetos que
apontaram para o horizonte de uma produção arquitetônica mais crítica e contextual.
Em suma, o ponto principal desse questionamento corresponde a proposição de um
modelo de habitação que poderia ser replicada em qualquer lugar, baseada na ideia
de um indivíduo tipo, enfatizada por Le Corbusier desde o planejamento urbanístico
das cidades industriais (BARONE, 2002). Isso gerou certa incompatibilidade entre as
visões de duas gerações, onde a mais antiga focava em soluções universais e a
segunda, mais jovem e representada pelo grupo Team 101, promovia uma ideia de
não tornar as construções algo absoluto que funcionasse como regra universal.
Atualmente vivenciamos um contexto onde ainda é possível de se observar,
nas paisagens de nossas cidades, a construção de edificações em série a fim de
resolver, sobretudo, o problema do déficit habitacional. Nesse âmbito, a tectônica
pode ser citada como forma de adequação ambiental dos edifícios e como possível
solução para combater a repetição, sinalizando a possibilidade de inserção de novas
tecnologias na produção arquitetônica irrestrita à habitação (Charleson, 2009).
Gregotti, Frascari, Frampton (2008) revelam que o antídoto para combater a
padronização é utilizar essas técnicas e tecnologias para dar sentido ao local onde
edifícios são erguidos e extrair diferentes sensações de seus usuários e espectadores.
Sobre o motivo da abordagem do tema, Frampton diz, “escolhi tratar desse tema
porque me parece necessário que os arquitetos revejam suas posições, visto que a
tendência hoje predominante é reduzir toda a expressão arquitetônica a uma cultura
de consumo.“ (GREGOTTI, FRASCARI, FRAMPTON, 2008, p.560), por meio dessa
afirmação ele demonstra que a grande crise arquitetônica talvez se dê pelo fato de

1 Grupo de jovens arquitetos modernos que iniciaram uma crítica aos preceitos dos CIAM,
principalmente em relação ao urbanismo, ao contestar a famosa Carta de Atenas de Le Corbusier.
Fonte: Coisas da arquitetura, 2018.
22

que os arquitetos contemporâneos têm colocado detalhes decisivos dos projetos em


segundo plano, dando ênfase a um pensamento comum no que diz respeito à
idealização de edifícios.
Não existe uma definição geral que explique o que de fato é a tectônica e quais
são seus alcances quando aplicados na concepção de um projeto arquitetônico, o que
existe é a visão de autores que contribuíram para que cada vez mais o termo
ganhasse ênfase em livros e revistas, seja através de estudos ou análises de obras.
Assim, a melhor forma de compreender o termo é analisá-lo ao longo da história.
A mais antiga referência do termo data de décadas desde o surgimento da
palavra arquiteto, significando algo relativo a construção (AMARAL, 2009). A palavra
tectônica deriva da palavra grega tekton que significa artesão ou arte. Ao longo dos
anos, com as contribuições de teóricos, essa noção sofreu modificações. Existem
vestígios desse termo na poesia Veda2, que o relaciona com a carpintaria. Na tradição
grega o termo é definido por Homero como construção em geral, mas a conotação
poética veio um pouco depois em Safo (antiga poesia grega da ilha de Lesbos 3)
quando ao carpinteiro foi atribuído o papel de poeta. Em geral o termo refere-se a
qualquer artesão que venha a trabalhar com materiais rígidos. Ainda nessa linha do
tempo, posteriormente o termo sofre mais uma modificação, deixa de representar algo
mais técnico e concreto para expressar uma noção mais abstrata que envolve ideias
antes da própria criação. De uma forma ou de outra o termo sempre esteve
relacionado com a materialização dos sentimentos do homem através da arquitetura
(AMORIM, 2012).
A história que embasa a origem da tectônica não é algo continuo, o termo não
ganhou de fato uma definição que resuma toda a sua dimensão, ele foi adquirindo
características próprias através de estudos e análises feitas por grandes estudiosos,
tais como Marco Fascari, Semper, Vittorio Gregotti e, principalmente, Frampton, este
sendo atualmente o grande nome quando o assunto é tectônica e seus alcances. Em
sua obra ele se posiciona claramente contra a construção de obras sem planejamento
ou sentido de existir, é o que ele chama de “construir apenas imagens”, isso que a

2 São denominados vedas os vários tipos de textos todos datando aos tempos antigos e compostos por
um idioma chamado Sânscrito védico, de onde se originou posteriormente o sânscrito clássico. Os
Vedas formam a base do extenso sistema de escrituras sagradas do hinduísmo, que representam a
mais antiga literatura de qualquer língua indo-europeia. Fonte: vedantaonline.org, 2018.
3 Ilha grega localizada no nordeste do mar Egeu. É a terceira maior ilha grega e a sétima maior do

Mediterrâneo. Fonte: (AMARAL, 2009).


23

tectônica procura combater. Frampton ainda menciona ser um hábito essa forma de
conceber a arquitetura como uma mercadoria, escondendo o que a faz existir e a
sustenta. Em outras palavras, o invólucro das edificações ganha destaque sobre o
seu conteúdo construtivo. Sobre essa forma atual da arquitetura Frampton comenta:
Em vez de ficar repetindo os tropos vanguardistas, ou de aderir ao pastiche
historicista, ou ainda a supérflua multiplicação de projetos escultóricos, todos
contendo uma dimensão arbitrária por que não se baseiam nem na estrutura
nem na construção os arquitetos podem voltar a unidade estrutural como
essência irredutível da forma arquitetônica (GREGOTTI, FRASCARI,
FRAMPTON, 2008, p. 559, grifo nosso).

O que Frampton demonstra com isso é que a estrutura pode sim ser um
elemento determinante em espaços arquitetônicos. Através dessas palavras ele
contraria a arquitetura preconizada pelo movimento moderno, onde as construções
eram puristas e totalmente desvinculadas da influência emocional. Dessa forma ele
crítica o caminho que a arquitetura vem seguindo, onde muitas vezes arquitetos
projetam obras escultóricas e não sabem como executá-las. O que acontece segundo
ele, devido a individualização existente entre as profissões, onde engenheiros e
arquitetos não mantém um diálogo honesto e consequente sobre o projeto, gerando a
falta do entendimento do projeto como campo multidisciplinar. Assim, os profissionais
trabalham de forma isolada assim como as matérias pautadas nas universidades
também são vistas de forma isolada de um modo que não há uma conciliação entre
projeto, forma e técnica o que resulta posteriormente na ausência da exploração da
estrutura como estratégia de valorizar e compor a forma e espaço edificado.
As discussões sobre o potencial da tectônica vêm despertando interesse desde
a sua inserção na concepção do projeto até nas análises de obras já edificadas como
fez Andrew Charleson em sua obra intitulada “A estrutura Aparente", analisando
detalhes em edificações já existentes e que, mesmo com programas similares,
apresentam soluções totalmente diferentes umas das outras. Charleson (2009) diz
que o caráter tectônico das edificações não é uma regra, uma vez que existem obras
projetadas com um caráter atectônico e que também são capazes de despertar
sensações em seus usuários, segundo ele, tudo vai depender da intenção do
projetista na concepção da obra. Charleson (2009) ainda diz que a construção de
obras atectônicas não são um erro, se o projetista elabora seu conceito de modo que
a integração entre estética e estrutura é mascarada de alguma forma, e tem isso
justificado por alguma intenção explícita no projeto.
24

Os pesquisadores desse tema defendem ideias particulares em relação ao


termo, sua origem e significado. Gregotti, Frascari, Frampton (2008), por exemplo,
mencionam o detalhe como elemento que dá sentido à construção. Em sua visão,
cada detalhe representa um caminho percorrido pela construção até o resultado final.
Esses autores ainda destaca os detalhes construtivos como forma do arquiteto dar
vida e sentido ao espaço projetado e edificado, independente de sua extensão ou
localização.
Gregotti (2006) estende esta discussão incrementando os estudos com a
importância do espaço e do seu bom uso. De acordo com esse autor, seria preciso
pensar na construção como uma relação de elementos que transmite mensagens e
sensações desde que todos os projetos sejam pensados em paralelo. Através dessas
teorias esses dois autores confirmam a visão de Frampton (2008) de que a arquitetura
pode ser definida a partir dos aspectos estruturais e construtivos, os quais são
capazes de valorizar os edifícios, captar olhares e extrair sensações dos usuários.
Apesar de existirem obras publicadas há mais de uma década, as ideias desses
autores ainda sim são atuais, pois se enquadram perfeitamente como possíveis
soluções para os problemas de concepção de obras enfrentados pela arquitetura que
vivenciamos atualmente, onde há uma estratégia recorrente de esconder elementos
arquitetônicos com uma embalagem camuflando elementos primordiais que a fazem
existir. O que os autores, assim como Frampton, deixam de legado é a poética
estrutural como possível antídoto para confrontar a arquitetura padronizada comum
nos dias atuais.
Assim, torna-se evidente que a Tectônica busca a integração entre estética e
estrutura, sem desvalorizar a forma, fazendo com que os espaços e seus detalhes
transmitam sensações, reafirmando o que Frascari diz sobre o exercício do detalhe e
a fala de Gregotti quando define a importância do lugar4 e seu poder de despertar
sensações nos usuários.

4 Todo lugar deve estar ligado ao homem que usufruirá do espaço. A importância da relação direta
entre o lugar e o homem é o foco do pensamento de Gregotti. Valorização do lugar, da cidade e da
história na etapa de concepção projetual. A partir do momento que o homem finca uma pedra no chão
ele já está demarcando o lugar através da arquitetura e seu papel é chamar atenção para esse lugar.
Fonte: (GREGOTTI, 2008).
25

De acordo com Gregotti, Frascari, Frampton (2008) os detalhes agregam valor


estético, conferem identidade a uma edificação e justificam questões estruturais em
uma construção. Sobre isso ele afirma que:
Os arquitetos se deixaram levar pela ilusão de que a citação é um substituto
eficiente para o detalhe como um sistema de articulação na linguagem
arquitetônica, e que uma “concepção grandiosa” e global pode controlar e
automaticamente impregnar cada aspecto do projeto e de sua execução,
exceto a própria abstenção do detalhe, o que discutivelmente acentuou a falta
de influência das técnicas construtivas como um fator de expressão. A
consequência dessa ideia para a obra construída muitas vezes é a
desagradável sensação de uma maquete ampliada, de uma falta de
articulação das partes es diferentes escalas: paredes que parecem ser feitas
de papelão recortado, janelas e portas inacabadas; em suma, um
relaxamento geral da tensão entre o desenho e o edifício construído
(GREGOTTI, FRASCARI, FRAMPTON, 2008, p.537).

Essa falta de ousadia ele define como “crise da linguagem arquitetônica” e essa
crise de fato acontece por não haver, de modo geral, preocupação por parte dos
arquitetos de inovar nos projetos, valorizando-os por meio de detalhes técnicos e
construtivos que muitas vezes são desprezados por não serem considerados
elementos atrativos ou com grande potencial arquitetônico. Gregotti (2006) fala ainda
que o retorno nas aplicações tectônicas traz consigo um enriquecimento para a
arquitetura. Com essas teorias a estrutura ganha um papel de destaque dentro do
projeto acabando por incrementar ainda mais o visual da edificação, não apenas
sendo a responsável sustentá-la.
O foco na estrutura e nas sensações que esta poderia provocar sempre esteve
presente, mesmo que secundariamente, na história da arquitetura, desde os gregos
com suas obras grandiosas, cheias de detalhes onde existia manipulação de
materiais, encaixes perfeitos de vigas e colunas esculpidas artesanalmente, obras que
sempre despertarão diferentes sensações em quem as ver.
Tendo como um de seus fundamentos construir com apuro técnico e estético,
utilizando-se de métodos construtivos apropriados ao contexto onde a edificação será
inserida, a tectônica prima pela valorização de elementos e materiais locais a serem
utilizados como aliados nesse processo de construção. Isso implica na possibilidade
de diminuição dos gastos nas obras, colaborando também de forma positiva, além da
contribuição já mencionada nos demais aspectos técnicos e estéticos, nos
condicionantes de projeto relacionados aos recursos financeiros no âmbito da
arquitetura e construção civil (CHARLESON, 2009).
26

2.1 A estrutura aparente

Focando na preocupação com a carência do repertório estrutural conhecido por


arquitetos e estudantes de arquitetura, muito se pode extrair das ideias e análises de
Charleson Andrew em sua obra intitulada A Estrutura Aparente (2009), obra voltada
para a conciliação entre arquitetura e engenharia que tem por objetivo despertar nesse
público o interesse pela integração entre estética e estrutura na concepção de projetos
arquitetônicos.
Charleson (2009) enfatiza o valor que uma obra pode adquirir ao ser
evidenciada através da estrutura, tornando-se esta um elemento enriquecedor dentro
do projeto. O ponto chave de sua discussão consiste no fato de que essa preocupação
com a solução estrutural não é algo restrito da engenharia, arquitetos podem sim
projetar utilizando a estrutura como elemento definidor de espaços, assim como
engenheiros podem explorar a estrutura e seu potencial arquitetônico.
Ao longo de sua obra ele busca deixar claro a sua intenção de mostrar para
arquitetos que a estrutura pode desempenhar um papel mais significativo que mero
suporte ao edifício. Não obstante, projetar e ter noção de como tornar exequível
poderia ser entendido, nessa perspectiva, como premissa de projeto. A carência em
pensar a obra como um produto composto de vários processos que devem acontecer
de forma integrada, é o que gera a tão comum necessidade das compatibilizações
entre projetos complementares, assim como a correção de erros evidenciados após a
finalização do projeto. Se essa etapa de concepção fosse pensada de forma correta
e integrada com os projetos complementares, talvez a compatibilização fosse algo
natural desde o início do processo.
Sobre o uso consciente da estrutura, Charleson (2009) afirma que quando a
estrutura contribui arquitetonicamente, além de cumprir seu papel principal de
sustentação de cargas, ela agrega riqueza estética e funcional aos projetos. Ela
aumenta nosso interesse e prazer nas edificações, melhora seu uso e eleva os ânimos
dos usuários. Com isso é fácil entender a temática abordada pelo autor, seu desejo
de trazer de volta a discussão sobre a importância de se pensar a estrutura também
como elemento definidor de espaços, justamente o que Frampton (2008) diz sobre
tectônica.
Ao longo dos ordenamentos curriculares são vistas matérias isoladas que se
concentram na análise puramente técnica da estrutura e não em sua conciliação com
27

o projeto em si. O que posteriormente resulta em um ensino fragmentado que acaba


por não conciliar o projeto arquitetônico com os complementares desde o estudo
preliminar. Isso acontece segundo o autor pela carência de bibliografias direcionadas
a análises de obras sobre o ponto de vista estrutural, que muitas vezes fica limitada
apenas a cumprir o papel de sustentação do projeto. Poucos são os estudos que
exploram sua utilização de outras formas dentro do projeto (CHARLESON, 2009).
Sobre essa carência no repertório de estudantes de arquitetura ele cita:
Em grande parte do nosso ambiente construído, a estrutura é escondida ou
indistinta. Painéis de fachada opacos ou painéis de vidro espelhado
escondem estruturas localizadas no perímetro dos edifícios. Dentro deles,
forros suspensos ocultam vigas e elementos estruturais verticais, como
quando pilares, constraventamentos ou paredes portantes são fechados por
divisórias ou paredes internas ou não são visualmente indistintos
(CHARLESON, 2009, p.11).

Com isso surge um questionamento sobre as formas pelas quais a estrutura


pode contribuir para um projeto e Charleson (2009) comenta o fato de que a estrutura
é essencial a arquitetura, dando-lhe estabilidade, resistência e rigidez necessárias, o
que não implica que ela deva ser inexpressiva, a menos, é claro, que seus projetistas
tenham feito tal escolha. É justamente isso que ele buscará mostrar através de vários
exemplos de obras que falam por si só, ou seja, não precisam de muita explicação
para serem entendidas e transmitir ao usuário justamente o que foi pensado pelo
projetista na concepção dos edifícios.
Para entender como pode ocorrer essa fusão entre estética e estrutura,
primeiramente é necessário destrinchar e buscar entender o que de fato são os
conceitos que contribuem para que essa relação se dê de forma harmônica. Em
primeiro caso é necessário entender o que de fato é a forma arquitetônica e o que ela
abrange. Para Ching (1996) a forma arquitetônica refere-se a embalagem, a
volumetria desde que essa forma englobe de maneira organizada a estrutura.
Baseado nessa definição Charleson diz que a forma arquitetônica é o que fecha uma
edificação, a casca (CHARLESON, 2009).
Porém, diferente da definição de Ching (1996), Charleson diz que esta forma
pode estar totalmente desvinculada da estrutura e de sua organização tanto interna
quanto externa, limitando-se apenas a ser o que veste a edificação. O que temos como
definição de forma arquitetônica é justamente o que se faz nos dias atuais, onde a
pele dos edifícios esconde os demais subsistemas responsáveis pela sua existência,
nesse ponto a tectônica é, segundo autores, justamente uma das formas de superar
28

essa produção, evitando algo que é comum em concepção de projeto, em edifícios e


afins quando há um desprendimento da necessidade de conciliação entre forma
arquitetônica e estrutural.
Charleson (2009) enfatiza que a forma estrutural é o que determina a forma
arquitetônica e que ambas não podem caminhar separadas, pois se complementam.
Em síntese na definição de forma arquitetônica a estrutura é vista como “seguidora da
forma”, e na forma estrutural como “definidora da forma”. Sobre essa relação
Charleson cita em seu livro uma definição bastante apropriada sobre a influência que
a estrutura tem sob o projeto, para isso utiliza-se da fala do arquiteto Arthur Erickson
(1980), o qual afirma:
A estrutura é o elemento mais forte e marcante da forma, tanto que se ela
não for a última consideração em uma longa série de decisões que
determinam a forma, ela distorce ou modifica os outros determinantes de uma
edificação. Descobre-se, na verdade, que a estrutura ditou todos os demais
aspectos do projeto. Os moradores não devem se comportar como se os
pilares dessem ordem – sem dúvidas, o contrário deve ser o caso.... Nas
minhas edificações a estrutura não foi sequer considerada até que as
principais premissas de projeto – a configuração dos espaços e a forma da
edificação – tivessem sido determinadas. Assim, a estrutura não impediu,
mais seguiu a intenção do projeto. (ERICKSON,1980 apud CHARLESON,
2009)

Erickson trabalha de uma forma diferente do que Charleson menciona, porém


é citado em seu livro pela consciência sobre o impacto negativo que as negligências
das questões estruturais podem ter sobre as decisões de projeto. Apesar de ter uma
linha projetual inversa à de Charleson (2009), Erickson deixa o estrutural por último
na fase de estudo preliminar, e mesmo assim consegue trabalhar com a estrutura de
forma clara e racional, agindo dessa forma ele acredita que a conciliação entre
projetos complementares não trará mudanças alarmantes no edifício.
Seja pensado antes ou após o estudo preliminar, não há uma regra para dar
ênfase a estrutura dentro de um projeto. Apenas se deve considerá-la ao longo do
processo criativo do arquiteto como um condicionante que não se limita à sustentação
dos edifícios.

2.2 Os diferentes papéis da estrutura

A estrutura pode desempenhar um papel muito mais significativo que mera


sustentação dentro de um edifício. Nota-se através das imagens abaixo o papel
marcante da estrutura direcionando e delimitando fachadas, no caso do Estádio
29

Millennium, localizado no País de Gales, onde a entrada é fortemente marcada pela


presença de pilares metálicos presos por contraventamentos5 (fig. 1 e 2).
É possível ainda fazer um comparativo entre as edificações contemporâneas,
por meio da Universidade pública de Navarra, na Espanha (fig. 3) e da antiguidade
exemplificada com a Igreja San Giorgio Maggiore, na Itália (fig. 4) com foco na
marcação de diferentes fachadas através de elementos estruturais que muitas vezes
estão camuflados dentro dos projetos. Nessas obras em especial, esses componentes
são pontos de destaque. As duas últimas ilustrações contemporâneas, exemplificam
o poder do aço como delimitador de espaços, percebido na entrada do edifício Cidade
da Música em Paris (fig. 5), assim como, no Centro The Dome na Inglaterra (fig. 6),
as fachadas sendo valorizadas através dos seus elementos construtivos, onde a trama
metálica capta atenção e valoriza todo material utilizado para sustentar ambas as
edificações.
Figura 1 - Estádio Millennium Figura 2 - Entrada

Fonte: Pinterest, 2018 Fonte: Cardiffcoolcat, 2018

5 Sistema que protege a edificação contra ações como os ventos, de forma simples, são elementos que
travam a edificação para que ela não sofra com ações físicas. Fonte: metálica.com.br, 2018.
30

Figura 3 - Universidade pública de Figura 4 - Período Gótico - Igreja San


Navarra, Espanha Giorgio Maggiore, Itália

Fonte: Hisour, 2018 Fonte: Myveiling, 2018


Figura 5 - Cidade da música, Paris Figura 6 - Centro The Dome

Fonte: Dicas de Paris, 2018 Fonte: Alamy, 2018

A presença de elementos estruturais nas fachadas proporciona aos usuários a


experiência de caminhar por entre a estrutura e não sob ela. “Em um nível elementar,
a estrutura pode contribuir apenas dando o apoio para uma marquise sobre a entrada.
Já em outro prédio, a estrutura pode funcionar como o elemento arquitetônico que nos
transmite a sensação de entrada, marcando-a e festejando-a.” (CHARLESON, 2009,
p.71). Com isso é possível extrair diferentes sensações e visões ao longo do percurso,
além de que “a estrutura aparente enriquece as características visuais externas das
edificações” (CHARLESON, 2009, p.80).
A presença de elementos marcantes em fachadas é característica comum em
obras ao longo da história, onde contrafortes, pináculos, arcobotantes e abóbadas
enriqueceram a arquitetura feita ao longo do tempo, como exemplos, as catedrais
góticas e a arquitetura renascentista. Nessas construções havia uma preocupação
latente com o percurso dos esforços até o solo, porém esconder esse percurso não
era algo comum, pois muitas vezes os elementos estruturais estavam visíveis e até
mesmo eram o ponto chave da construção.
A estrutura externa contemporânea continua esta tradição de expressão, ao
comunicar uma ampla gama de ideias, características arquitetônicas e
esforços estruturais. A estrutura pode, até certo ponto, expressar qualquer
ideia arquitetônica. No entanto, a clareza com a qual tal ideia pode ser
31

transmitida é outro assunto. A clareza, sem dúvida, depende da habilidade


do arquiteto (CHARLESON, 2009, p.74)

A aplicação do conceito de tectônica está intimamente relacionada com a


funcionalidade das edificações. Charleson (2009, p.83) enfatiza a facilidade de haver
um planejamento funcional quando a estrutura está localizada no perímetro da
edificação, pois “um espaço desimpedido de estrutura interna pode ser ordenado por
outros elementos arquitetônicos, como paredes não portantes ou outros anteparos, se
necessários”. Com isso ele deixa claro que a estrutura locada externamente deixa o
projetista ou até mesmo o próprio usuário livre para locar paredes e divisórias onde
jugar necessário de acordo com o uso, porém “quando localizada no interior da
edificação, a estrutura reduz as áreas úteis, além de restringir o uso dos espaços
contíguos” (CHARLESON, 2008, p.83).
A estratégia mostrada pelo autor não é comum na maioria dos edifícios
contemporâneos, pois, muitas vezes, locar os elementos estruturais fora do
fechamento, acaba por aumentar as áreas de secção das estruturas, o que pode
interferir na fachada transmitindo um peso arquitetônico e elevar os custos.
Como solução para esse impacto estético e diminuição de custos, pode adotar-
se o uso da “planta livre”, possibilitando um alto grau de flexibilidade no planejamento
interno. “Espaços que no passado eram fechados por paredes portantes agora fluem
quase que completamente desimpedidos em volta de pilares que geralmente são
distribuídos sobre uma grelha ortogonal” (CHARLESON, 2009, p.83).
Com isso o autor afirma que a “Estrutura de perímetro”, localizada no entorno
da edificação como estratégia para obtenção de uma planta livre de elementos
estruturais que possam de alguma forma limitar a organização espacial interna dos
ambientes, é uma solução funcional eficaz, além de gerar imponência, flexibilizar
espaços e agregar interesse visual e personalidade a edificação. Em contrapartida,
Charleson (2009, p.84) deixa claro que essa solução deixa de agir positivamente
quando aplicada em edificações de mais de um pavimento:
Esta opção é mais adequada em construções de um pavimento do que
àquelas de pavimentos múltiplos por duas razões. Em primeiro lugar, a
estrutura no perímetro resulta obrigatoriamente em grandes vãos, os quais
necessitam de elementos estruturais horizontais relativamente altos e,
consequentemente, em lajes intermediárias ou de cobertura mais altas. Uma
estrutura de cobertura mais alta em edificação de um único pavimento não
costuma afetar gravemente a altura total do prédio, o que, no entanto,
ocorrem edificações cujos vários pavimentos têm lajes espessas. Em
segundo lugar, as coberturas costumam pesar muito menos do que os pisos
32

elevados, assim conseguem vencer vãos maiores sem dificuldades


(CHARLESON, 2009, p.84)

Assim como pode ter função de flexibilizar ambientes, a estrutura pode assumir
o papel de organizadora espacial e direcionadora de espaços, contribuindo nas
características arquitetônicas e personalidade de espaços internos. Isto é, “o sucesso
de qualquer estrutura na arquitetura deveria ser medido pelo grau em que ela realiza
um conceito de arquitetura, ou, em outras palavras, de que modo ela enriquece um
projeto” (CHARLESON, 2009, p.199).
Esses aspectos podem ser observados no Museu de Arte Romana (fig. 7),
localizado na Espanha e projeto do arquiteto Rafael Moneo, construído em 1986, no
qual não existe de fato uma divisão física que demarque vários ambientes além das
próprias paredes e arcos que delimitam, dentro de um volume único, diversos espaços
menores com funções similares. Nesse caso a estrutura trabalha de forma indireta na
subdivisão dos ambientes de modo que:
Nove paredes transversais subdividem horizontalmente o espaço principal,
formando várias galerias. Uma nave central, definida por aberturas em arco
que quase alcançam a cobertura e, que por si só, já configura uma galeria,
forma o espaço de circulação principal, com galerias menores em ambos os
lados. [...] um vocabulário estrutural limitado de paredes, arcos e lajes
transforma a pele, que poderia ser simplesmente oca, em uma série de
espaços especiais, facilitando a circulação e a exibição de artefatos. Além de
introduzir variedade espacial, a combinação entre paredes portantes com o
ritmo e a hierarquia de arcos com diferentes tamanhos, enriquece muito ou
mesmo se torna a própria arquitetura do interior (CHARLESON, 2009, p.88)

Figura 7 - Museu de Arte Romana, Espanha

Fonte: Pinterest, 2018


33

A estrutura também pode subdividir diretamente espaços com diferentes


funções, geralmente fazendo uso de espaços de circulação e áreas de espera, como
é o caso do Terminal 4 do Aeroporto JFK em Nova York (fig. 8). Nessa edificação um
grande espaço livre que funciona como uma extensa área de espera tem seus
ambientes divididos por contraventamentos em V que separam a ala de espera das
áreas de embarque e desembarque (fig. 9).

Figura 8 - Terminal 4 do aeroporto JFK, EUA

Fonte: Delta, 2018

Figura 9 - Detalhe / Contraventamentos horizontais em V

Fonte: Delta, 2018

A estrutura localizada internamente tem o poder de transformação em


ambientes até então com grande possibilidade de serem inexpressivos. O valor que
elementos estruturais agregam dentro de ambientes, sejam subdividindo espaços
maiores em menores com funções semelhantes, ou delimitando áreas de espera e
circulação, a fim de separar ambientes com diferentes funções, é algo enriquecedor
em qualquer edificação. Quando a estrutura interna é deixada a mostra e seu potencial
estético e estrutural é explorado ao máximo, delimitando ambientes e sustentando-os,
são denominadas estruturas de superfície ativa. Nesse âmbito, “qualquer estrutura
34

interna que está conectada ou posicionada imediatamente adjacente à pele da


edificação é considerada uma estrutura de superfície ativa“, capaz de se configurar
como a característica estética principal do edifício e ambiente onde se insere
(CHARLESON, 2009, p.105).
Esses aspectos podem ser observados na capela de São Benedito, localizada
na Suíça, projetada pelo arquiteto Peter Zumthor no ano de 1988, composta de
pilastras discretamente recuadas que compõem a pele confere identidade ao espaço
interior, acentuando o caráter de introspecção de ambientes sacros (fig. 10).
Dentro da capela, o suporte da cobertura se revela. Trinta e seis pilastras de
seção retangular, espaçadas regularmente, erguem-se na frente do
revestimento de madeira compensada. Cada uma se conecta delicadamente
à parede por três pinos de aço. O simples recuo das pilastras em relação a
uma localização convencional (dentro das paredes) e sua exposição afeta
incrivelmente o interior. Agindo como marcadores, elas modulam a superfície
da parede, mas também aumentam a definição das formas no espaço interno,
acentuando a sensação de enclausuramento, devido ao alinhamento
continuo com as nervuras da cobertura que elas sustentam (CHARLESON,
2009, p.106).

Figura 10 - Capela de São Benedito, Suíça

Fonte: Flickr, 2018

No Brasil é possível observar o valor que elementos de superfície ativa


agregam no interior de edificações fazendo analise do Santuário Dom Bosco (fig. 11)
que está localizado em Brasília e foi projetado pelo arquiteto Carlos Alberto Moraes.
35

Figura 11 - Santuário Dom Bosco / Perspectiva interna

Fonte: Santuário Dom Bosco, 2018

A riqueza interna desse espaço é consequência da composição entre os pilares


de concreto, que conferem um ritmo das fachadas e com os vitrais que conferem
textura e relevo as superfícies. A luz que adentra o ambiente reflete as várias nuances
de cores que compõem os vitrais posicionados de forma a criar uma modulação
interna que é reflexo da composição externa, como é possível perceber na figura 12.

Figura 12 - Santuário Dom Bosco / Fachadas

Fonte: Santuário Dom Bosco, 2018

No momento em que a estrutura gera um campo espacial interno, sendo um


elemento norteador para possíveis instalações de ambientes e criando oportunidades
para a implantação de novos espaços passa a ser denominada de estruturas de seção
ativa (fig. 13). Nesse sentido, quando a estrutura de seção ativa protagoniza a
arquitetura as modificações em seus elementos transformam a estética da edificação
que sustentam, modificando, por consequência, a percepção dos seus usuários. De
acordo com Charleson:
36

Dentro de um invólucro idêntico, diferentes leiautes estruturais, todos


exequíveis do ponto de vista da engenharia, resultam em características
espaciais muito distintas. Enquanto o volume interno é basicamente
percebido como um único espaço nas opções (a) e (b), (c) e (d) nos oferecem,
cada uma, duas zonas espaciais separadas e diferenciadas. A opção (e) nos
dá a oportunidade de criar uma relação mais íntima entre o interior e o exterior
(CHARLESON, 2009, p. 112-113)

Figura 13 - Diferentes leiautes estruturais afetando a forma do espaço

Fonte: Charleson (2009, p.113)

Diante dessas possibilidades, não é exagero afirmar que o potencial expressivo


de uma estrutura é ilimitado, uma vez que pode valorizar fachadas, enriquecer
ambientes, definir espaços internos além de delimitar e flexibilizar áreas. O potencial
expressivo presente no uso consciente da estrutura é caracterizado através de
detalhes estruturais que “podem transformar elementos estruturais puramente
utilitários em objetos de prazer estético, assim como comunicar ideias e conceito de
projetos” (CHARLESON, 2009, p.129).
Esses apontamentos reforçam a afirmação de Vitorio Gregotti de que o detalhe
construtivo tem relação direta na determinação da forma. Na visão desse autor, “os
arquitetos perderam a capacidade de usar o detalhe para dar sentido as mudanças
estruturais na arquitetura” (GREGOTTI, 2006, p.535), possivelmente por não
compreender que o detalhe construtivo tem relação direta na determinação da forma
e função arquitetônica, no desenho que engloba materialidade e construção, além dos
esforços estruturais e no acabamento, etapa que muitas vezes desvaloriza a estrutura
através da utilização de elementos que a escondem.
Sobre a gama de possibilidades de utilização dos acabamentos e seu potencial
de valorização dos elementos estruturais, Charleson (2009) aponta que podem ser
refinados ou utilitários, simples ou complexos, leves ou pesados e despojados ou
37

ornamentados. Tudo depende do conceito e das ideias que cada projetista deseja
transmitir através de seu projeto. De uma forma minuciosa Charleson descreve o
processo de desenvolvimento do detalhamento construtivo de uma edificação:
O detalhamento, como parte do processo projetual, compreende o desenho
de seções transversais, elevações e conexões dos elementos estruturais,
visando a atender os requisitos da engenharia, ou seja, estabilidade,
resistência e rigidez. O detalhamento começa após a escolha da forma
estrutural de um projeto determinado. Por exemplo, se os projetistas
decidirem, a princípio, adotar o sistema de colunas e lintéis com madeira
aparente [...] eles poderão selecionar muitas combinações possíveis de
detalhes para vigas, pilares, vínculos e acabamentos. [...] O conceito de
projeto deve instruir o detalhamento. Antes de se voltar para as questões
especificas de detalhamento das estruturas, o projetista deve rever seu
conceito de projeto e se questionar de que modo ele pode orientar as
decisões do detalhamento. Só então será possível chegar em uma arquitetura
na qual todos os elementos estruturais estão integrados a todos os demais
elementos arquitetônicos e trabalham em conjunto para alcançar o conceito
de projeto. Tal resultado dificilmente será obtido se o projetista permitir, de
forma pouco crítica, que as decisões do detalhamento sejam limitadas pela
prática convencional ou comum. Isso priva os clientes e usuários das
edificações de oportunidades de enriquecimento arquitetônico
(CHARLESON, 2009, p.130, grifo nosso).

A falta de aprofundamento nas características estéticas e construtivas de


elementos estruturais na etapa de concepção projetual segundo o autor, afeta
diretamente o usuário final no fato de receber um produto não tão completo e acabado,
tal como poderia ser, caso todos os detalhes fossem pensados seguindo uma ordem
projetual. Utilizando-se de palavras do arquiteto Louis Kahn, Charleson afirma:
Uma edificação é como um ser humano. O arquiteto tem a oportunidade de
dar vida. É como um ser humano – como sua mão. O modo como as juntas
e articulações combinam tornam cada mão interessante e bela. Em um
prédio, estes detalhes não devem ser cobertos por luvas e ficar escondidos.
Você deve tirar proveito máximo deles. O espaço se torna arquitetônico
quando as evidências de como ele foi feito são vistas e compreendidas
(KAHN, 1995 apud ANDREW, 2009, p.129 - 130).

A essência da tectônica está nas sensações transmitidas através do uso


consciente da estrutura para dar sentido e definir espaços. As sensações podem ser
as mais diferentes possíveis e muitas vezes estão presentes em um simples detalhe
como a forma de captar e refletir luz natural.
A estrutura pode assumir diversos papéis, podem funcionar como fontes de luz,
se o objetivo for a captação de luz, modificar a luz, se o objetivo for bloquear mesmo
que parcialmente a intensidade de luz e serem modificadas pela luz, se o objetivo, por
exemplo, for tornar os elementos estruturais mais leves e atrativas. “A combinação
entre estrutura e iluminação [...] pode ser usada para se obter efeitos estéticos
consideráveis tanto em situações de interior como de exterior“ (CHARLESON, 2009,
38

p.178). Nas palavras de Charleson, estrutura e iluminação são elementos que estão
ligados diretamente, “afinal a luz não apenas revela as estruturas, mas também
modifica as percepções que temos delas“ (CHARLESON, 2009, p.177).
No caso do Aeroporto Internacional de San Francisco, nos Estados Unidos (fig.
14) a luz natural que ilumina todo o espaço ingressa através de treliças espaciais que
funcionam como fonte principal de luz da área central. A presença de lonas
translúcidas se configura como um detalhe pensado com maestria no projeto para
evitar a insolação direta em dias muito ensolarados.

Figura 14 - Aeroporto Internacional de San Francisco / Treliças espaciais

Fonte: Na placa, 2018

Outro exemplo de uso consciente da luz aliado a elementos estruturais é o


prédio que abriga a biblioteca pública em Vancouver no Canadá, projeto do arquiteto
Moshe Safdie. A edificação apresenta estruturas em forma de membranas na
cobertura (fig. 15 e fig. 16) que amenizam, através do uso de materiais reflexivos, a
incidência de luz no interior da edificação. Charleson descreve a estratégia adotada:
As superfícies dos elementos estruturais também oferecem oportunidades
para reflexão da luz artificial. A Biblioteca pública de Vancouver, no Canadá,
é um exemplo típico das muitas edificações nas quais um nível confortável
de iluminação indireta é fornecido pelos sofitos de pisos atirantados. [...] as
membranas são conhecidas por refletirem e difundirem a luz. A cor
geralmente clara e as superfícies brilhantes (afinal, as lonas escuras tendem
a trazer problemas sérios de superaquecimento solar) garantem altos níveis
de refletância que respondem bem à iluminação ascendente. A capacidade
de difusão da luz pela lona fica mais evidente nos dias ensolarados
(CHARLESON, 2009, p.176-177).
39

Figura 15 - Biblioteca pública de Figura 16 - Biblioteca pública de


Vancouver, Canadá Vancouver / Detalhe coberta

Fonte: Viagem Digital, 2018 Fonte: Viagem Digital, 2018

O Edifício na 88 Wood Street (fig. 17 e fig. 18) localizado em Londres e projeto


do arquiteto Richard Rogers também retrata, assim como os exemplos anteriores, o
poder de valorização que a luz tem sobre a estrutura. Nesse edifício “as colunas
externas [...] são destacadas por uma iluminação descendente que, à noite, as
transforma em cilindros de luz“ (CHARLESON, 2009, p.178).

Figura 17 - Edifício na 88 Wood Street Figura 18 - Detalhes colunas

Fonte: Pinterest, 2018 Fonte: Architravel, 2018

Muitas vezes a ausência da exploração do potencial tectônico em uma


edificação é ocasionada pela falta do conhecimento do papel representativo dos
elementos estruturais dentro de um projeto. Desse modo, a representação e
simbolismo de uma edificação podem variar de acordo com as diversas possibilidades
40

de inserção desses elementos e sua interface como a forma arquitetônica. Sobre esse
fato Charleson menciona:
A estrutura aparente enriquece a arquitetura sempre que formas estruturais
e detalhes agregam significados em virtude de sua capacidade de
representação e simbolismo. A representação nas estruturas é entendida
como aquela situação em que a estrutura tipifica um objeto físico, como uma
árvore ou uma grua, enquanto as estruturas simbólicas são aquelas que nos
lembram uma ideia, qualidade ou condição. Assim como a beleza, o
simbolismo está nos olhos de quem o vê (CHARLESON, 2009, p.181).

Nas imagens a seguir, do Palácio da justiça em Melun, França, e da Gare do


Oriente, projeto do arquiteto Santiago Calatrava localizado em Lisboa, Portugal, pode-
se observar estruturas simbólicas inspiradas na natureza sendo representadas
através do uso de pilares em formato de árvores enquanto elementos estruturais
marcando a fachada e definindo um grande beiral, no caso da figura 19, sustentando
coberta e definindo um abrigo de grandes dimensões, no caso das figuras 20, 21 e
22.
Figura 19 - Palácio da justiça em Melun, França

Fonte: Architravel, 2018

A forma da Gare do Oriente, chama atenção pela leveza e fluidez transmitida


através do uso do aço em forma de galhos de árvores sustentando uma coberta (fig.
20) formada por curvas elegantes. A fachada (fig. 21) é marcada pelo uso da estrutura
que proporciona aos usuários sensações de imensidão ao caminhar por entre a
estrutura.
41

Figura 20 - Gare do Oriente, Lisboa Figura 21 - Fachada principal

Fonte: Portugal Visitor, 2018 Fonte: Portugal Visitor, 2018


Figura 22 - Gare do Oriente / Estrutura da coberta

Fonte: Portugal Visitor, 2018

Muitas vezes a representação e simbologia pensada pelo projetista pode


provocar diferentes interpretações em seus usuários. Essas diferentes interpretações
conferem a estrutura o poder de despertar nas pessoas as mais distintas leituras.
Diante desses exemplos é possível perceber a extensão que o uso da estrutura pode
atingir tanto externamente quando internamente em uma edificação.
Os impactos das estruturas naqueles que a vivenciam também são diversos.
Uma estrutura, transmitindo a sensação de tranquilidade, acalma nossos
sentidos. Outra deixa nossos nervos à flor da pel. Uma estrutura brutalista e
inóspita contrasta com outra, que nos recebe e confere a sensação de
proteção. [...] em especial, as estruturas também têm a capacidade de
transmitir uma enorme gama de significados aos transeuntes e usuários das
edificações (CHARLESON, 2009, p.200).

O papel desempenhado pela estrutura em arquitetura é reforçado através do


uso de diversos elementos ou pelo grau de expressão atingido pela adoção de
categorias tectônicas, ambos definidos por Charleson (2009) como formas
características da inserção da tectônica na arquitetura.
42

Elementos autoportantes, assim como elementos de superfície ativa,


configuram-se como categorias que expressam a tectônica pelo fato de conciliar as
duas principais características que a definem: fechamento e sustentação. Esses
elementos suportam grandes cargas e suas formas são determinantes para definir sua
resistência, quando adotados conferem ousadia projetual as edificações pela
facilidade de atingir grandes alturas, além do potencial que os elementos curvos e
fluidos tem para captar atenção dos observadores. Como a própria forma se
encarrega de distribuir os esforços internos e externos, as fundações para esse tipo
de elemento são simples e a facilidade e rapidez na execução da obra, por se tratar
de estruturas geralmente pré-moldadas, também vem a ser uma vantagem ao optar
pela adoção desse tipo de tecnologia.

2.3 Elementos expressivos da Tectônica

Segundo Charleson (2009), no projeto, a tectônica se expressa utilizando


alguns elementos característicos, tais como os sistemas estruturais formados por
cascas, membranas, catenárias, estruturas nervuradas, arcos, pórticos, vigas e
paredes. Baseado nisso, ele fundamenta os estudos das obras apresentadas a seguir.

2.3.1 Cascas

Considerada a forma mais exemplificadora do conceito de tectônica, as cascas


são elementos que melhor conseguem integrar estética e estrutura, pois seu uso
acaba por conceder à estrutura o papel de definidor do ambiente. Por sua atuação
ativa no que se refere aos aspectos estruturais de suporte, elas apresentam um
caráter estético composto pela leveza e fluidez que conseguem transmitir aos
usuários.
Nos exemplos a seguir é possível ver a atuação das cascas em duas situações
diferentes citadas por Charleson (2009). Na figura 23 percebe-se a existência da
casca como elemento modulador do espaço, se utilizando de contraventamentos
como auxiliadores na transferência das cargas atuantes na coberta para o solo.
43

Figura 23 - Palacette do Esporte, Roma

Fonte: Archdaily, 2018

O Palacette do Esporte dos arquitetos Pier Luigi Nervi e A. Vitellozzi, é citado


por Charleson (2009) como a perfeita aliança entre a função estrutural e fechamento,
sobre esse projeto ele discorre:
No Palacette do Esporte [Palazzetto dello Sport], em Roma, a superfície da
casca não chega diretamente nas fundações, mas termina nos níveis dos
beirais, onde contrafortes inclinados resistem aos empuxos para fora. Essa
casca também define a forma da cobertura, funcionando simultaneamente
como estrutura e fechamento. Suas superfícies internas não nervuradas. As
nervuras que se cruzam e evidenciam os segmentos de fôrmas de concreto
pré-moldado, tanto aumentam a estabilidade da casca como lhe conferem
uma textura estrutural admirável. (CHARLESON, 2009, p.30-31).

Na figura 24 a casca desempenha a função autoportante6, suportando cargas


e por serem elementos contínuos conseguem transferir de forma direta as cargas
atuantes para o solo utilizando-se da própria forma.

Figura 24 - Projeto Eden, Inglaterra

Fonte: Somos Verdes, 2018

6 Elementos que dispensam o uso de estruturas auxiliares no suporte e transferência de cargas.


44

Nessa obra intitulada Projeto Eden do escritório Nicholas Grimshaw & partners,
as cascas são formadas por estruturas hexagonais que vencem vãos gigantescos,
exemplificando outro tipo de atuação das cascas citado pelo autor:
As cascas também podem ser construídas com barras de aço ou madeira
como nas cúpulas geodésicas ou em outros domos estaiados. Embora,
nesses casos, inúmeras barras estruturais configurem a superfície estrutural
facetada que deve então ser fechada, ainda assim a estrutura define a forma
arquitetônica (CHARLESON, 2009, p.31).

As cascas são elementos que definem e modelam ambientes. Por


apresentarem formas contínuas conseguem desenvolver uma forte resistência, além
de possuir maior resistência no suporte e transferência de cargas ao solo. Quando
adotadas em uma edificação elevam o potencial estético, devido a características
marcantes das formas fluídas e curvas. Além disso, seu uso tem como resultado a
planta livre, contribuindo para uma integração entre os ambientes em consequência
dos grandes vãos livres de paredes ou divisórias internas.

2.3.2 Membranas

Enriquecendo a lista de elementos de superfície ativa, as membranas são


citadas por Charleson (2009) como estruturas que assim como as cascas dependem
da resistência existente na sua própria curvatura para suportar e transferir cargas.
Charleson (2009) enfatiza que, a forma da membrana, tanto quanto sua espessura e
resistência devem responder as cargas esperadas, e todas as superfícies devem estar
bem esticadas, evitando que a lona oscile com ventos fortes. Utilizando o Pavilhão no
Japão como exemplo ele afirma (fig. 25):
Estruturas em forma de tenda, representam outro tipo de estruturas de
superfície ativa. Estas estruturas, onde uma membrana tracionada resiste a
sua carga própria e a outras cargas, também dependem se suas curvaturas
tridimensionais para adequação estrutural (CHARLESON, 2009, p. 32)

Figura 25 - Pavilhão no Japão

Fonte: estruturas.arq.br, 2018


45

As membranas apresentam uma resistência que depende do grau de tensão


entre os pontos. Quanto mais esticadas estiverem as extremidades maior o grau de
resistência e a capacidade de suporte de cargas. A utilização desses elementos em
projetos resulta em vãos livres que tornam o espaço adaptável a qualquer uso, pela
não existência de paredes ou divisórias internas que possam de alguma forma limitar
o layout do ambiente. Por serem elementos de superfície ativa sustentam e vedam a
edificação de modo que são dispensados possíveis gastos com elementos de
fechamento.

2.3.3 Catenárias

Assim como as cascas e membranas, as catenárias também representam


elementos de superfície ativa que funcionam de forma similar em relação a
transferência de cargas. De forma simples, entende-se a atuação das catenárias como
uma superfície apoiada em dois pontos elevados. Dessa forma a própria cobertura
ganha uma posição de destaque, como é possível perceber no corte representado
abaixo (fig. 26), onde a cobertura é presa em dois corpos (marcados em vermelho)
que funcionam como apoio na transferência das cargas atuantes para o solo.

Figura 26 - Pavilhão de Portugal, Lisboa – Corte Lateral

Fonte: Pavilhão lusitano, 2018

De forma simplória Charleson (2009) define o elemento destaque do Pavilhão


de Portugal do arquiteto Álvaro Siza, da seguinte forma:
Essa cobertura já foi descrita como “véu” ou uma “tenda”, em virtude de sua
notável leveza e forma drapeada. Dois pórticos opostos e afastados atuam
como grandes blocos, resistindo a tração da catenária. Dentro de cada
pórtico, nove lâminas paralelas (ou contrafortes) resistem aos enormes
empuxos para dentro provocados pela laje pendente (CHARLESON, 2009,
p.33).
46

Figura 27 - Pavilhão de Portugal, Lisboa – Fachada poente

Fonte: Patrimônio Cultural, 2018

A adoção das catenárias em projetos proporciona a possibilidade de valorizar


alguns pontos na construção, no caso do Pavilhão de Portugal a adoção desse
elemento proporcionou dar ênfase a cobertura através da estrutura, por se tratar de
uma superfície apoiada em dois pontos resultando em uma curvatura que interliga
dois blocos. O formato curvo adquirido agregou valor estético e personalidade ao
edifício além de despertar sensações de amplidão por se tratar de um elemento de
grandes dimensões, por sua altura considerável a edificação é agradável
termicamente para os usuários.

2.3.4 Estruturas Nervuradas7

Essas estruturas, conjunto de barras interligadas e intercaladas com espaços


vazios o que proporciona maior leveza aliado com resistência, geralmente limitam o
projetista a optar por construções térreas formadas por um único pavimento. Embora
muitas vezes apresentem alturas consideráveis, sua utilização em mais de um
pavimento pode comprometer a funcionalidade das nervuras assim como sua
linguagem arquitetônica, uma vez que quando adicionadas a vários pavimentos, a
essas estruturas elas acabam por perder sua expressividade em consequência dos
vários pisos adicionados. Segundo Charleson (2009) no Estádio de Futebol Licorne
do escritório Chaix & Morel e associados, na França (fig. 28 e 29):

7 Conjunto de barras interligadas e intercaladas com espaços vazios o que proporciona maior leveza
aliado com a resistência. Fonte: metálica.com.br, 2018.
47

As estruturas nervuradas também podem ser sinônimo de fechamento


quando geram e definem a forma arquitetônica, embora o aspecto de
esqueleto frequentemente exija o uso de um sistema de fechamento à parte
(...) as estruturas nervuras geralmente fecham volumes únicos, e não
construções com vários pavimentos. Ao restringir a altura dessas estruturas
a um único pavimento, ainda que possam ser muito altas, os projetistas
evitam comprometer a linguagem arquitetônica pura das nervuras com a
inserção de outra estrutura interna portante. As nervuras que dominam
visualmente as quatro lâminas que fecham o Estádio de Futebol Licorne, em
Amiens, na França, são estruturalmente independentes. As nervuras, com
suas elegantes curvas e seções variáveis, protegem os expectadores e
acentuam a sensação de proteção. A combinação de nervuras bem
espaçadas com o fechamento transparente confere um grau extremamente
alto e incomum de transparência e abertura – a luz natural é enfatizada, assim
os espectadores têm uma noção mais clara de que a partida está sendo ao
ar livre e podem apreciar a paisagem urbana do entorno (CHARLESON,
2009, p.34 - 35).

Figura 28 - Estádio de Futebol Licorne, França – Vista superior

Fonte: Pinterest, 2018

Figura 29 - Estádio de Futebol Licorne - Estrutura interna

Fonte: Pinterest, 2018

As cobertas curvas formadas por nervuras conferem a esse estádio uma


estética singular, é possível de se observar através das imagens a cima, tanto do
48

exterior quanto do interior do edifício. Ao mesmo tempo em que apresenta uma


cobertura para proteger os usuários, o estádio transmite a sensação de ausência total
de cobertura devido a existência de uma vedação transparente. Esse tipo de vedação
é ótimo para o clima na França com temperaturas amenas e um inverno rigoroso.
As estruturas nervuradas são elementos que fecham volumes únicos, por isso,
não são recomendados para edificações com vários pavimentos. Geralmente são
utilizadas em conjunto com outros elementos de forma a valorizá-las. Em muitos casos
são adotados materiais transparentes para revestir essas estruturas, para que dessa
forma os ambientes fiquem protegidos, mas não escondidos.

2.3.5 Arcos

Arcos são elementos rígidos presos por duas bases fixas e que tem facilidade
de resistir a esforços de compressão. Geralmente são utilizados para cobrir vãos e
em alguns casos, suportar outros tipos de coberturas. As principais vantagens da
adoção dos arcos em edificações é sua leveza pelo fato de apresentar um pequeno
peso próprio, tendo em vista que todas as cargas atuantes estarão distribuídas ao
longo da estrutura e serão transferidas diretamente para o solo.
Elementos que apresentam uma estreita relação entre forma arquitetônica e
forma estrutural assim como as cascas. Nota-se através das análises de Charleson
(2009) que elementos curvos e fluidos empregados em edifícios tornam a obra mais
propícia a desenvolver uma linguagem que traduza a tectônica em sua essência,
como é o caso das cascas, membranas e arcos. Isso ocorre devido ao fato dessas
formas desempenharem duas funções simultaneamente, fechamento e sustentação,
como visto nas figuras 30 e 31. Sobre a Casa Ludwig Erhard localizado em Belim, e
projeto do escritório Nicholas Grimshaw e parceiros, Charleson (2009) enfatiza que é
um exemplo de uso de arcos bastante convencional, no qual os arcos são espaçados
regularmente e alinhados verticalmente.
49

Figura 30 - Fachada Casa Ludwig Erhard

Fonte: Weagoo, 2018

Figura 31 - Vista superior Casa Ludwig Erhard

Fonte: Footage.framepool.com, 2018

Arcos são elementos que distribuem as cargas atuantes ao longo de toda


armação devido ao seu formato curvo, característica que evita que as cargas se
concentrem em um único ponto. Quando adotados em um projeto aumentam a
resistência aos esforços, transferindo de forma direta as cargas para o solo. Além
disso, podem ser utilizados como elementos marcadores de fachada, de forma a
valorizá-la, podem ainda ser elementos direcionadores de ambientes onde ser quiser
delimitar espaços de circulação sem o uso de divisórias internas, ou seja, utilizando
apenas a estrutura para cumprir esses papéis.
50

2.3.6 Pórticos

Os pórticos, estruturas compostas por uma ligação rígida entre elementos


retilíneos (pilares e vigas), são tradicionalmente utilizados em edifícios em todo o
mundo, por sua característica de travamento e que facilita a construção de vários
pavimentos.
Apesar das formas curvas apresentarem uma maior facilidade de transmitir
simultaneamente, através do seu uso, as duas principais características que
demonstram a tectônica em edifícios impactantes, estética e estrutura, para Charleson
(2009) a síntese entre a forma arquitetônica e estrutural vai além das formas curvas.
Sobre a possibilidade de aplicar a tectônica em edifícios retilíneos comumente
encontrados em todo o mundo ele afirma:
O ubíquo edifício com múltiplos pavimentos, seja ele médio ou alto, é um
exemplo típico, mais ainda que exemplifique formas arquitetônica e estrutural
bem integradas, a arquitetura resultante nem sempre é louvável
(CHARLESON, 2009, p.37).

Com isso ele mostra o quão mais complicado é transformar uma linguagem já
tradicional na arquitetura, como é o caso de inúmeros edifícios retilíneos, compostos
por vários pavimentos, porém que não exploram a composição viga/pilar geralmente
adotadas nesse tipo de construção.
O grande arco em Paris, projetado pelo arquiteto Johan Otto von Spreckelsen
(fig. 32) é um exemplo da imponência que estruturas retilíneas em composição com
outros elementos, nesse caso a viga vierendeel, podem transmitir aos usuários e
observadores.
Figura 32 - O Grande Arco, Paris

Fonte: Fotografário, 2018


51

O autor cita esse edifício como um exemplo que demonstra a imponência que
elementos retos de grande escala podem adquirir, no qual a hierarquia de pórticos
serve de sustentação para uma cobertura que vence um vão de grandes dimensões.
Sobre isso ele diz:
A cobertura, que vence um vão enorme, e a enorme estrutura do plinto8 que,
por sua vez cobre inúmeros túneis subterrâneos, também são formados por
pórticos, neste caso, na forma de vigas Vierendeel9, com três pavimentos de
altura (CLARLESON, 2009, p.37).

Os pórticos são os elementos mais adequados para serem adotados em


edificações com vários pavimentos por sua característica de travamento. Quando
locados no perímetro da edificação, proporcionam grandes vãos livres de estrutura
interna, e seu uso confere ao edifício imponência estrutural.

2.3.7 Viga Vierendeel

A viga vierendeel é uma estrutura formada por um conjunto de barras que são
ligadas através de nós responsáveis por uma maior resistência entre a viga superior,
inferior e as barras. A união desses elementos faz diminuir a possibilidade de
deformações e aumentar a capacidade de vencer vãos maiores, além de dispensar a
utilização de elementos de vedação, pois a própria viga atua como esqueleto e
paredes. Além de serem elementos esteticamente impactantes são empregadas como
forma de vencer grandes vãos, assim sua grande vantagem está no fato de apresentar
o sistema estrutural integrado nas próprias paredes e fachadas (fig. 33).

Figura 33 - Viga tipo Vierendeel

Fonte: Wikimedia, 2018

8 Elemento que fica diretamente sob a base de um pilar, pedestal, estátua ou monumento. Fonte:
conhecimentogeral.inf.br, 2018.
9 Uma estrutura com maior consumo de material, mas, pela sua conformação, está sujeita a bem menos

esforços, o que permite a abertura de vãos ao longo de sua extensão. Fonte: comoprojetar.com.br,
2018.
52

Na Residência para Ministro de Estado projetada pelo arquiteto João Filgueiras


Lima (fig. 34), é possível notar a interface expressiva entre a forma arquitetônica e o
uso da viga Vierendeel em concreto, elemento que conferiu ao projeto uma forma
arrojada e tornou-se destaque estrutural, estético e plástico no edifício. Esse exemplar
arquitetônico evidencia a fusão entre forma e estrutura, pois a viga funciona como
elemento de suporte de cargas e confere também as características de vedação,
dispensando o uso de qualquer outro elemento para esse fim.

Figura 34 - Residência para Ministro de Estado / João Filgueiras Lima (Lelé)

Fonte: Pinterest, 2018

Esse tipo de viga é um painel de vedação que não bloqueia as visadas para o
ambiente externo além de possibilitar grandes vãos livres de estruturas internas e com
menores chances de deformações pelo fato do sistema estrutural está integrado nas
paredes resultando também na diminuição de gastos com elementos de vedação.

2.3.8 Paredes

Ao contrário do usualmente difundido no âmbito da arquitetura, as paredes,


elementos tão comuns em construções e muitas vezes pensados apenas como
elementos de fechamento, podem conciliar de modo expressivo, forma estrutural e
forma arquitetônica. Esses aspectos podem ser observados na casa do Fascismo,
projetada pelo arquiteto Giuseppe Terragni e edificada na Itália. Segundo Charleson:

Na casa do Fascismo, em Como, geralmente considerada a maior


contribuição italiana ao movimento moderno, as formas arquitetônicas e
estrutural se fundem. Pórticos ortogonais, completados por diversas paredes
que dão estabilidade lateral, ordenam e estruturam uma edificação de planta
53

quadrada e fachadas retilíneas. A expressão dos pórticos fica mais evidente


na elevação principal. Os pórticos (e as paredes também, mas em menor
grau) organizam espaços internos de uma forma menos rígida do que era de
se esperar (CHARLESON, 2009, p.39).

Figura 35 - Casa do fascismo, Itália

Fonte: ArquiTestando, 2018

Charleson (2009) destaca a qualidade plástica da edificação e enfatiza que


esse aspecto é consequência da união de elementos simples e usuais muitas vezes
não explorados ao limite. Nesse ponto ele foca a importância do projetista em saber
explorar as melhores características de cada elemento arquitetônico, a fim de que a
utilização da máxima expressão construtiva de elementos arquitetônicos possa
resultar em obras que despertem interesse aos seus usuários.
As paredes talvez sejam os elementos considerados mais simples e comuns
dentre todos que expressam a tectônica, pois são comumente utilizados nas
construções e muitas vezes desvalorizados pela não exploração de seu potencial
arquitetônico. Quando bem exploradas podem estar aliadas com outras categorias
como modulação, textura e relevo de forma a valorizá-las.

2.4 Categorias da Tectônica

A padronização dos centros urbanos, de acordo com o Charleson (2009), limita


possíveis criações de uma arquitetura que de fato componha positivamente o espaço.
Sobre isso ele menciona:

Em muitas localidades urbanas, os limites do terreno e os recuos obrigatórios


determinam a forma arquitetônica. Particularmente em edifícios altos ou
54

médios, questões econômicas e pragmáticas resultam em formas ortogonais


ubíquas que exigem outras abordagens arquitetônicas além da manipulação
da volumetria para que tais construções possam contribuir de forma positiva
ao tecido urbano (...) Em geral os elementos estruturais são expostos, antes
de tudo devido as vantagens funcionais proporcionadas pelas estruturas do
perímetro. Embora tal tipo de estrutura e padrão de fachada raramente reflita
o entorno construído e, portanto, costume resultar em arquitetura
inexpressiva, alguns arquitetos adotam uma postura mais proativa com a
estrutura. Eles têm consciência do seu potencial para enriquecer a arquitetura
da cidade (CHARLESON, 2009, p.55)

Charleson (2009) foca em sua obra nas possíveis contribuições que a ênfase
na estrutura pode trazer tanto no exterior como no interior de edifícios. Contudo,
muitas vezes a ênfase em elementos estruturais no interior se reflete no exterior e vice
e versa. Para exemplificar essa teoria o autor faz uma análise aprofundada do edifício
em que funciona o banco de Hong Kong e Shanghai na China do arquiteto Leoh Ming
Pei (fig. 36).

Figura 36 - Banco de Hong Kong e Shanghai, China

Fonte: Pinterest, 2018

O edifício chama atenção primeiramente por sua estrutura aparente exposta na


fachada (fig. 37), isso vem a ser um dos fatores que o diferencia dos outros edifícios
no entorno, algo impactante para observadores e usuários. Muitos projetistas optariam
por revesti-lo com uma capa, a fim de esconder a estrutura que dá suporte ao prédio.
Se isso de fato fosse colocado em prática, um dos edifícios mais famosos do mundo
se igualaria a muitos outros. É possível observar nesse prédio que a estrutura está à
55

frente do fechamento, como mostra a figura 37, ganhando, de fato, imponência e


definindo o conceito do edifício.

Figura 37 - Banco de Hong Kong e Shanghai / Detalhe estrutural

Fonte: Pinterest, 2018

Assim como existem elementos que retratam a tectônica quando pensados na


etapa de concepção de projeto, existem também elementos que podem ser
acrescentados como forma de representá-la mesmo que não sejam pensados nessa
etapa inicial, elementos denominados pelo autor como diferentes leituras para a
estrutura. Sobre o uso desses elementos Charleson introduz:
O caráter externo de uma edificação é muitas vezes determinado pelo modo
como a estrutura se relaciona com o fechamento. Os arquitetos
frequentemente exploram e tiram partido das relações espaciais entre esses
dois elementos, buscando expressar suas ideias arquitetônicas e enriquecer
seus projetos como um todo. A estrutura contribui de várias formas à
aparência de uma fachada, seja modulando-a, acrescentando relevo e textura
ou agindo como um anteparo ou filtro visual. Alguns destes papéis são vistos
no Banco Hong Kong and Shanghai (CHARLESON, 2009, p.57).

Os diferentes papéis adotados pela estrutura, a torna um diferencial dentro do


projeto, pois mesmo sendo repetida em várias construções, ela pode apresentar uma
leitura totalmente diferente, deixando cada edificação com características singulares.
“A estrutura modula superfícies e fornecem um meio de introduzir relevo e textura, tão
apreciados. A estrutura também pode agir como uma máscara ou anteparo visual e
filtrar a luz natural e as vistas. ” (CHARLESON, 2009, p.80).
56

2.4.1 Modulação

O ato de modular, pode se ser aplicado através do uso de diferentes elementos


em um projeto ou até mesmo na repetição de um mesmo elemento, seja em fachadas
ou internamente. A modulação pode se apresentar de várias formas, desde o uso de
diferentes nuances de cores em uma fachada, até, como foca Charleson (2009), na
união entre elementos estruturais como vigas e pilares, criando assim um padrão
retangular, justamente o que ele chama de “módulos estruturais”.
A modulação gera padrões que, em teoria, trazem variedade, ritmo e
hierarquia, geralmente aumentando o interesse visual. As estruturas
padronizadas ou texturizadas são, em geral, preferíveis àquelas planas e
lisas. No entanto, como se ver em muitas fachadas de edifícios e escritórios,
se a modulação for por demais repetitiva ela deixa de ser uma característica
arquitetônica positiva (CHARLESON, 2009, p.57)

No edifício Yerba Buenas Lofts projetado pelo escritório Natoma Architects (fig.
38), é possível enxergar com clareza os efeitos originados pelo o uso da modulação.
O prédio apresenta 10 pavimentos, porém o uso da modulação faz criar a ilusão que
são apenas 5 andares. Isso só é possível por que “os elementos estruturais principais
– paredes e lajes – são visualmente dominantes e desempenham duas funções
simultâneas: modular e ordenar a fachada e alterar nossa percepção da escala do
prédio” (CHARLESON, 2009, p.57).

Figura 38 - Yerba Buenas Lofts, EUA

Fonte: Pinterest, 2018

A estratégia de modulação pode ser adotada como forma de racionalizar a


distribuição interna dos espaços a partir da utilização de múltiplos e submúltiplos de
57

uma malha para dividir os espaços internamente, o que facilita no lançamento da


estrutura. Em fachadas ou superfícies internas essa categoria pode ser expressa
através do uso do ritmo e relevo tornando a superfície mais atrativa aos observadores.

2.4.2 Relevo e textura

A profundidade se caracteriza pelo fato de estar intimamente ligada a


modulação, pois ambas se complementam e sua união é de fundamental importância
para que de fato essas formas se concretizem. Apesar dos sistemas estruturais atuais
não demandarem profundidades para suas instalações, alguns arquitetos adotam
elementos que trabalham com esse jogo de volumes em fachadas, mesmo que
discretamente, por acreditarem que esses fatores agreguem valor estético ao edifício.
“A variação da profundidade de uma superfície atenua interesse e, em conjunto com
a iluminação natural ou artificial, cria oportunidades de se criar contrastes entre áreas
iluminadas e sombreadas, o que anima visualmente a fachada. ” (CHARLESON, 2009,
p.61). Exemplo disso é o Aeroporto Internacional Dulles (fig. 39), projetado pelo
escritório Eero Saarinen e Associados. A edificação apresenta uma estrutura externa
composta de uma sequência de pilares inclinados repetidos ao longo da fachada em
profundidade, característica que capta primeiramente a atenção dos usuários.

Figura 39 - Aeroporto Internacional Dulles, EUA

Fonte: Thousand Wonders, 2018

A estrutura marca a entrada do Aeroporto e traz consigo um ar de elegância e


imponência. A medida que nos afastamos tomamos mais conhecimento dos
gigantescos pilares inclinados que realçam a fachada. Talvez se não houvesse a
58

presença desses pilares robustos, a fachada seria algo comumente visto em prédios
por todo o mundo, onde há a existência de grandes planos de vidro, planos este que
nesse projeto são realçados devido à existência dos elementos estruturais expostos.
A adoção de textura ou relevo em superfícies tanto externas quanto internas de
uma edificação valoriza o espaço por meio da diferenciação de planos, da
profundidade e em alguns casos pela filtragem de luz natural, características que
tornam o espaço mais interessante visualmente.

2.4.3 Máscaras e filtros

A relação entre a estrutura e o fechamento pode se enquadrar no conceito de


máscaras e filtros, elementos aplicados na fachada, a fim de solucionar problemas
como insolação ou até mesmo solucionar problemas estruturais.
Dependendo de sua profundidade, densidade em planta baixa e elevação, e
de sua relação espacial com o fechamento da edificação, a estrutura externa
pode ser lida como máscara ou um filtro, contribuindo com mais um conjunto
de virtudes estéticas a uma fachada (CHARLESON, 2009, p.64).

Sobre a utilização de elementos estruturais como forma de enriquecer a


fachada, no Centro Pompidou (fig. 40) edificado no centro de Paris e projetado pelo
escritório Piano & Rogers, Charleson descreve:
A máscara consiste de finos perfis metálicos tubulares horizontais e verticais
e tirantes diagonais. A estrutura externa, que resiste principalmente as forças
de tração, é tão leve que pode ser confundida com andaimes. Embora
ineficientes como máscara ou filtro de luz natural, o grande número de
elementos e sua cor clara criam um fino véu que abranda o impacto visual
dos pilares à vista e do fechamento do prédio por trás. De uma perspectiva
funcional, a separação horizontal entre a máscara e o fechamento cria um
espaço de circulação ao longo da fachada principal e um espaço para as
instalações aparentes dos fundos (CHARLESON, 2009, p.65).

Figura 40 - Centro Pompidou, Paris

Fonte: Cometo Paris, 2018


59

As máscaras e filtros são elementos adotados em fachadas a fim de solucionar


problemas com adequação climática e enriquecendo superfícies através do uso da
estrutura. Por meio dessa categoria é possível perceber que o potencial do uso
evidente da estrutura pode ir além de questões estéticas, em muitas edificações a
estrutura vem a ser o detalhe que torna os espaços mais adequados termicamente e
sustentáveis.

2.4.4 Escala da estrutura

O impacto que essa característica exerce aos olhos dos usuários e


observadores faz dessa categoria uma das mais significantes dentro de todas que
envolvem a tectônica, pois pode ser observada no desempenho de qualquer um dos
papéis citados a cima e sua variação pode tornar mais ou menos atrativo quaisquer
desses elementos. Como aponta Charleson (2009, p.67), “a escala estrutural
influencia profundamente como a estrutura exterior contribui esteticamente para uma
fachada”.
Um exemplo claro do uso desse tipo de elemento é visto na fachada no Hotel
de las Artes em Barcelona (fig. 41), projetado pelo escritório Skidmore Owings &
Merrill. O prédio por si só já é um monumento esteticamente impactante e consegue
captar atenção de leigos para sua armação estrutural que funciona como uma espécie
de tela protetora (fig. 42).

Figura 41 - Hotel de las Artes Figura 42 - Detalhe treliças

Fonte: Structurae, 2018 Fonte: Structurae, 2018


60

De fato, a presença de toda essa estrutura aparente foi posicionada no


perímetro da edificação por algum motivo relevante, porém, de acordo com Charleson
(2009), a estrutura poderia exercer um papel muito mais significativo se o plano de
fundo fosse mais escuro, pois destacaria ainda mais a trama estrutural do edifício.
Entretanto, esse aspecto não desmerece a força expressiva da estrutura aparente.
Essa categoria vem a ser a que melhor enfatiza a tectônica em edificações,
pois, tem o poder de tornar mais ou menos atrativo qualquer uma das outras
categorias demonstradas acima: modulação, relevo e textura, máscaras e filtros. Seu
uso tem uma relação direta com o impacto visual que os observadores terão diante
da dimensão e escala que demonstra a importância da estrutura.
61
61

3 TECTÔNICA EXPRESSA EM
OBRAS BRASILEIRAS
62

3 TECTÔNICA EXPRESSA EM OBRAS BRASILEIRAS

Neste capítulo serão descritas e analisadas obras brasileiras escolhidas


segundo os critérios de escala e tipologia. Desse modo, foram definidos três grupos,
denominados macro, médio e micro, compostos por três edificações cada. Para cada
exemplar arquitetônico escolhido foi elaborada uma ficha técnica que se configura
como quadro síntese que contém a descrição das obras e os resultados da análise
projetual sob a ótica das categorias da tectônica. Assim, essas fichas sistematizam os
seguintes dados e informações: nome, escala, ano ou período de construção do
projeto, localização, arquiteto autor, estilo arquitetônico e tipologia projetual. Além
disso descreve os sistemas construtivos as edificações, desde a fundação até os
acabamentos.
No intuito de valorizar a produção arquitetônica nacional, vale ressaltar que
foram escolhidas obras edificadas em território brasileiro que em sua maioria ainda
não estão caracterizadas como obras tectônicas. Diante da extensão do termo, as
descrições e análises consideraram o potencial que os elementos construtivos tiveram
para gerar espaços arquitetônicos de qualidade. O fato das edificações serem tão
diferentes, apesar de algumas apresentarem homogeneidade entre os programas
arquitetônicos, já mostra a abrangência do termo e as várias possibilidades de
interface entre forma estrutural e forma arquitetônica.

3.1 Grupo 1 – Escala macro

O primeiro grupo é composto por edificações de grande porte com área útil
acima de 100.000 m². Foram selecionados três estádios de futebol que apresentam a
estrutura como elemento de destaque, definidora do espaço edificado. A adoção
dessa estratégia resultou em formas arrojadas, conferiu personalidade além de elevar
o potencial estético de cada construção.

3.1.1 Arena Castelão

Localizado na cidade de Fortaleza no Estado do Ceará, o Estádio Governador


Plácido Castelo Branco é um projeto do arquiteto Héctor Vigliecca. Popularmente
conhecido como Arena Castelão, a edificação chama atenção por sua composição
estrutural exposta, sendo representada pelos pórticos que estão desprendidos da
63

estrutura interna, possibilitando uma maior evidência desses elementos tectônicos


localizados no entorno da edificação. Nota-se a forte marcação estrutural
representada no perímetro da edificação (fig. 43).

Figura 43 - Arena castelão / Perspectiva superior

Fonte: Archdaily, 2018

Nota-se a forte marcação estrutural representada no perímetro da edificação,


onde os pilares são superdimensionados com a intenção de agregar valor estético a
obra sem desprezar o potencial estrutural do elemento. Os pórticos de aço, talvez por
sua grande dimensão, foram montados no local o que diminuiu o tempo de execução
da obra. Tais elementos estruturais se destacam dos demais por suas dimensões e,
ao mesmo tempo, sinaliza a categoria de escala da estrutura enfatizada por
Charleson (2009) enquanto estratégia de projeto. Assim, esses elementos marcam as
fachadas e os acessos dos usuários (fig. 44), proporcionado o prazer de caminhar por
entre a estrutura e não sob ela.

Figura 44 - Estrutura de perímetro

Fonte: Metálica, 2018


64

Figura 45 - Arena Castelão / Entradas

Fonte: R7.com, 2018

A forte presença da planta livre em edificações dessa escala e para fins


esportivos, como é o caso dos estádios de futebol é mantida nessa obra (fig.46, 47 e
48). Os pórticos no perímetro contribuem para vencer o grande vão que abriga todas
as arquibancadas, os ambientes sob elas e o campo. A luz natural adentra o espaço
através do óculo central e por entre as tramas metálicas revestidas com policarbonato.
A escolha desse material para revestir a cobertura foi pensada com o intuito de
proteger as arquibancadas das chuvas sem privar os usuários da luz natural, pois caso
outro material fosse adotado essa área do estádio ficaria escura, resultando em
maiores gastos com iluminação artificial.
Toda a estrutura do entorno sustenta através de cabos de aço a grande
cobertura com óculo central (fig.49), dessa forma o corpo do edifício torna-se um
complemento para a coberta criando esse aspecto estético mais orgânico (fig. 50). O
formato da coberta capta águas pluviais que são utilizadas para limpeza interna do
estádio, dessa forma a estrutura é utilizada não apenas esteticamente como também
para questões sustentáveis como o reaproveitamento das águas.
65

Figura 46 - Planta baixa 1º Figura 47 - Planta baixa 2º Figura 48 – Planta baixa


Pavimento. Pavimento 3º Pavimento

Fonte: Archdaily, 2018 Fonte: Archdaily, 2018 Fonte: Archdaily, 2018

Figura 49 - Esqueleto estrutural / Pórticos externos

Fonte: Archdaily, 2018


Figura 50 - Esquema da cobertura

Fonte: Archdaily, 2018

Nesse edifício, a estrutura aparente, relativa ao conjunto de elementos


mencionados, confere caráter arrojado à edificação e denota que os responsáveis
pela concepção do projeto optaram por não camuflar os elementos que a fazem existir.
66

Quadro 1 - Ficha técnica (Arena Castelão)


OBRA: Estádio Governador Plácido Castelo
Branco (Arena Castelão)
ESCALA: Macro
ANO: Última reforma (2010-2012)
LOCALIZAÇÃO: Fortaleza, Ceará
ARQUITETO: Héctor Vigliecca
ESTILO: Arquitetura Contemporânea
USO: Estádio de futebol
SISTEMAS CONSTRUTIVOS:
FUNDAÇÃO: Não encontrado.
ESTRUTURA: Mista (Concreto e aço).
VEDAÇÃO: Concreto, vidro e policarbonato.
COBERTA: Treliças e telhas de aço. Uso de lajes Steel Deck10
INSTALAÇÕES: Reuso das águas pluviais captadas pela coberta.
ESQUADRIAS: Vidro e alumínio.
DIVISÓRIAS INTERNAS: Não encontrado.
ACABAMENTOS: Alumínio, concreto e vidro.
CATEGORIAS DA TECTÔNICA:
PLANTA LIVRE:

Grandes vãos livres de pilares ou qualquer estrutura de


sustentação.
ESTRUTURA DE PERÍMETRO:
Os pórticos laterais modelam toda parte externa e interna do
estádio, assim como, a forma da coberta.
PÓRTICOS:

Locados no perímetro e servindo como sustentação para a


cobertura tensionada de policarbonato.
LUZ E SOMBRA:
Jogo de luz e sombra em consequência da luz natural que
adentra o recindo por entre as tramas metálicas e atravessa
as placas de policarbonato presente na coberta.
ESCALA DE ESTRUTURA:
Presente na diferenciação de altura entre os pórticos e a parte construída do
estádio.
ESTRUTURA APARENTE:
Estrutura exporta tanto internamente quanto externamente.
Fonte: Autora da pesquisa, 2018

10Laje composta por telhas de aço galvanizado e uma camada de concreto, esse tipo de laje concilia
aço e concreto de modo a explorar as vantagens de cada um desses elementos. Fonte: Portal metálica
construção civil, 2018.
67

3.1.2 Estádio Beira Rio

O Estádio Beira Rio é um projeto do escritório Hype Studio e passou por sua
última reforma em 2010 com a finalidade de se adequar aos padrões FIFA para copa
do mundo de 2014. O Estádio apresenta um arrojo estrutural caracterizados pelos
pórticos de aço locados no perímetro, desprendidos do corpo da edificação de forma
a tornar esses elementos estruturais o destaque da construção.

Figura 51 - Estádio Beira Rio

Fonte: Archdaily, 2018

Os pórticos laterais envolvem todo o corpo da edificação de forma a marcar as


fachadas e as entradas, proporcionando um maior contato dos usuários com a
estrutura. Além disso, a forma desses elementos ajuda na captação de águas pluviais
para reúso na limpeza interna do estádio, reforçando a ideia adotada na Arena
Castelão de que a estrutura pode ir além de apenas valorizar a forma.

Figura 52 - Estádio Beira Rio / Entradas

Fonte: Archdaily, 2018


68

Toda estrutura de perímetro é revestida por membranas opacas e


translúcidas intercaladas que filtram a luz natural de forma diferente resultando em um
jogo de luz e sombra internamente que confere equilíbrio de incidência de luz natural
nas arquibancadas (fig. 53), a utilização dessas membranas protege os usuários da
chuva e ao mesmo tempo não bloqueiam a luz natural, diminuindo possíveis gastos
com iluminação artificial.

Figura 53 - Estádio Beira Rio / Cobertura

Fonte: Galeria da arquitetura, 2018

Assim como na maioria dos centros esportivos, no Estádio Beira Rio a planta
livre também foi resultado da adoção da estrutura de perímetro que está totalmente
aparente internamente (fig. 55 e 58). A malha que compõe os pórticos se estende pela
cobertura em forma de folha resultando em um óculo central, dessa forma apenas o
gramado recebe luz natural sem nenhum tipo de filtração (fig. 54 e 56).

Figura 54 - Estádio Beira Rio / Óculo central

Fonte: Galeria da arquitetura, 2018


69

Figura 55 - Planta livre Figura 56 - Planta de coberta

Fonte: Archdaily, 2018 Fonte: Archdaily, 2018

Figura 57 - Esqueleto estrutural

Fonte: Archdaily, 2018

Figura 58 - Estrutura de perímetro

Fonte: Archdaily, 2018

Nesse edifício, assim como no exemplo anterior, a estrutura aparente,


formada pelo conjunto de elementos mencionados, associada à planta livre e a
escala da estrutura valorizada pelo jogo de luz e sombra sobre a forma edificada,
classificam esse objeto como uma obra de caráter tectônico.
70

Quadro 2 - Ficha técnica (Estádio Beira Rio)


OBRA: Estádio Beira Rio
ESCALA: Macro
ANO: 2010 - 2014
LOCALIZAÇÃO: Porto Alegre, RS
ARQUITETOS: Hype Studio
ESTILO: Arquitetura Moderna
USO: Estádio de futebol
SISTEMAS CONSTRUTIVOS:
FUNDAÇÃO: Não encontrado.
ESTRUTURA: Mista (Concreto e aço).
VEDAÇÃO: Concreto, vidro, aço e PTFE11.
COBERTA: Estrutura metálica de aço tubular desenvolvida em módulos com
formato de folhas e revestida por uma membrada de PTFE (politetrafluoretileno).
INSTALAÇÕES: Reaproveitamento das águas pluviais por meio da cobertura.
ESQUADRIAS: Vidro e alumínio.
DIVISÓRIAS INTERNAS: Divisórias internas em alvenaria.
ACABAMENTOS: PTFE (politetrafluoretileno), aço.
CATEGORIAS DA TECTÔNICA:
PLANTA LIVRE:
Grandes vãos livres de pilares ou qualquer estrutura de
sustentação.
ESTRUTURA DE PERÍMETRO/ESTRUTURA APARENTE:
Estrutura independente do corpo do edifício. Toda
estrutura do perímetro é visível tanto externamente
quanto internamente.
MEMBRANAS:
Presente na pele translucida que fecha o volume externo.
LUZ E SOMBRA:
Presente na variação de cores das membranas que
revestem a estrutura metálica da coberta. A estrutura é
revestida por membranas translúcidas que permitem a
entrada de luz natural de forma direta, outras são
revestidas por membranas opacas que filtram a luz.
FILTRO:
A luz solar é filtrada por meio das membranas que revestem as estruturas metálicas.
SIMBOLISMO:
A imponência dos elementos estruturais, que se assemelham a folhas., marcam
essa edificação.

Fonte: Autora da pesquisa, 2018

11
Politetrafluoretileno - Material sintético com diversas propriedades vantajosas para o uso na
construção civil. Fonte: infraestruturaurbana17.pini.com.br, 2018.
71

3.1.3 Estádio Mané Garrincha

O Estádio Mané Garrincha está localizado em Brasília e foi projetado pelos


arquitetos Eduardo De Castro Mello e Vicente de Castro Mello. A edificação tem como
destaque a sequência de pilares distribuídos por todo o perímetro do estádio. Esse
aspecto plástico foi inspirado nas obras de Oscar Niemeyer que apresentam fachadas
com elementos estruturais que delimitam grandes vãos, tais como os Palácios do
Planalto, da Alvorada, do Itamaraty e da Justiça, também localizados em Brasília. Os
arquitetos que idealizaram o edifício não queriam distanciar a arquitetura do estágio
do repertório arquitetônico de Niemeyer e do conjunto monumental de Brasília, o que
não impediu a busca pela inovação e criação de uma identidade.

Figura 59 - Estádio Mané Garrincha

Fonte: Au17.pini, 2018

A cobertura da edificação se assemelha a um grande chapéu e é sustentada


pelos pilares proporcionando um equilíbrio tanto estético como estrutural para a
construção. A união da cobertura com os pilares no entorno além de conferir a
edificação um arrojo estético e imponência estrutural também resultou na planta livre
de estruturas que pudessem de alguma forma limitar a organização espacial do
Estádio (fig. 61 e 62).
72

Figura 60 - Planta baixa

Fonte: Archdaily, 2018

Figura 61 - Esqueleto estrutural

Fonte: Archdaily, 2018


73

O óculo central assim como os dois estádios analisados anteriormente também


proporciona a entrada de luz natural diretamente no campo. O fato da cobertura
apresentar um revestimento de policarbonato em volta do grande óculo protege as
arquibancadas da incidência direta de luz e também das chuvas, porém sem
escurecer o espaço por se tratar de um material transparente (fig. 62).

Figura 62 - Cobertura com óculo central

Fonte: Galeria da arquitetura, 2018

Toda estrutura está desprendida do corpo o edifício e se encontra disposta de


maneira que existe uma livre circulação dos ventos, dessa forma o clima interno torna-
se mais agradável evitando gastos com algum tipo de climatização artificial (fig. 63).

Figura 63 – Estrutura externa desprendida do corpo da edificação

Fonte: Galeria da arquitetura, 2018


74

Vistos em perspectiva, esses anéis concêntricos formados pelos pilares


conferem textura e relevo a fachada, composta por elementos que, ao nível do
detalhe, narram a própria história de construção do objeto arquitetônico
(CHARLESON, 2009; GREGOTTI, 2006).

Figura 64 - Raios de sol incidindo Figura 65 - Pilares sendo refletidos


diretamente nos pilares internamente

Fonte: Galeria da arquitetura, 2018 Fonte: Galeria da arquitetura, 2018

Além de ser deixada a mostra externamente, toda a estrutura é refletida no


interior do estádio através da incidência de luz natural que adentra o local pelas
laterais, lançando a projeção de todos os pilares do entorno e fazendo alusão aos
raios de sol (fig. 64 e 65).
75

Quadro 3 - Ficha técnica (Estádio Mané Garrincha)


OBRA: Estádio Nacional de Brasília (Estádio
Mané Garrincha)
ESCALA: Macro
ANO: 2008 - 2013
LOCALIZAÇÃO: Brasília
ARQUITETOS: Eduardo De Castro Mello,
Vicente de Castro Mello
ESTILO: Arquitetura modernista
USO: Estádio de futebol
SISTEMAS CONSTRUTIVOS:
FUNDAÇÃO: Não encontrado.
ESTRUTURA: Mista (Concreto e aço).
VEDAÇÃO: Concreto, aço e policarbonato.
COBERTA: Trama metálica coberta com policarbonato. Lajes Steel Deck na
cobertura dos demais pavimentos.
INSTALAÇÕES: Reaproveitamento das águas pluviais através da coberta para reúso
interno.
ESQUADRIAS: Vidro e alumínio.
DIVISÓRIAS INTERNAS: Não encontrado.
ACABAMENTOS: Aço, concreto e vidro.
CATEGORIAS DA TECTÔNICA:
PLANTA LIVRE:

Grandes vãos livres de pilares ou qualquer estrutura de


sustentação.
ESTRUTURA DE PERÍMETRO:
Estrutura de sustentação desprendida do edifício
conferindo um arrojo estrutural a forma.

PILARES:

“Floresta de pilares” - servindo como sustentação para um


grande anel que forma a cobertura.

LUZ E SOMBRA:
Jogo de luz e sombra proporcionado pela locação dos 288
pilares no entorno do estádio que faz alusão aos raios
solares.
ESTRUTURA APARENTE:
Toda estrutura que envolve a edificação está exposta tanto internamente quanto
externamente. Através do jogo de luz e sombra a estrutura se faz presente no
interior do estádio.
Fonte: Autora da pesquisa, 2018
76

3.2 Grupo 2 – Média escala

O segundo grupo é formado por edificações com área entre 1200 m² e 15000
m², sendo uma religiosa e duas culturais. Nesse grupo, assim como no grupo anterior
de escala macro, é comum a adoção da planta livre como forma de tornar o espaço
adaptável para atender um grande volume de pessoas.

3.2.1 Catedral de Brasília

A Catedral Metropolitana de Nossa Senhora Aparecida, comumente conhecida


como a Catedral de Brasília, é um marco na arquitetura de Oscar Niemeyer. Foi
construída no período de 1959 a 1970 e devido a sua complexa monumentalidade foi
executada em duas fases, a primeira fase (fig. 66) compreendeu o período de 1959 a
1960 onde foi erguida a estrutura da nave principal. A segunda fase (fig. 67) aconteceu
de 1969 a 1970 e compreendeu toda a parte de esquadrias com vitrais fixos e
acabamentos com mármore. Símbolo da arquitetura e da engenharia brasileira, a
Catedral de Brasília possui uma estrutura imponente e merecedora de destaque no
acervo das construções de Niemeyer.

Figura 66 – Catedral de Brasília / 1ª Figura 67 – Catedral de Brasília / 2ª


Fase da construção Fase da construção

Fonte: Blog da arquitetura, 2018 Fonte: Archdaily, 2018

Essa edificação é referência na utilização da estrutura aparente como


elemento definidor do espaço arquitetônico e dos limites entre o interior e o exterior
representa algo novo para época, a utilização de cálculos estruturais complexos como
forma de conceber obras monumentais limpas e de formas inusitadas que se
destacam pela leveza na paisagem onde se inserem. A sensação que se tem ao olhar
77

para a edificação finalizada é de que provavelmente esses pilares, onde o uso do


concreto armado foi explorado ao seu limite de resistências aos esforços atuantes, só
seriam possíveis se fossem metálicos.
A Catedral de Brasília é sua obra paradigmática, onde a concepção
arquitetônica é reduzida ao mínimo, à sua estrutura, ao mesmo tempo que a
concepção estrutural é levada ao máximo de suas possibilidades. Como disse
o próprio arquiteto: “quando a estrutura está feita, o edifício está pronto”
(ARCHDAILY, grifo nosso)12

A estrutura nessa edificação, por si só, molda e caracteriza o espaço. Por se


tratar da adoção da planta livre, ao adentrar na catedral o usuário tem várias
possibilidades de visão, uma vez que não encontra barreiras estruturais tais como
paredes portantes ou colunas que possam de alguma forma interferir no campo de
visão. A adoção desse tipo de planta é algo comum em edificações religiosas, pela
facilidade de layout e também pela necessidade de grandes áreas livres para atender
a um público extenso. Desse modo, pode-se afirmar que a planta livre, na Catedral de
Brasília, se configurou como uma estratégia determinante na criação de uma
estrutura de perímetro que concilia, coerentemente, forma arquitetônica e forma
estrutural.
Esse exemplar arquitetônico também reforça os apontamentos de Charleson
(2009), de que a estrutura de perímetro possui maior coerência e expressividade
quando suporta uma edificação com um pavimento, independentemente de sua
escala. A partir do momento que é adicionado outro pavimento a uma estrutura
contínua, como é o caso da Catedral de Brasília, pode haver um comprometimento
com o funcionamento da estrutura tanto no suporte como na transferência de cargas
ao solo.
A fundação da Catedral é composta por 16 tubulões, que são perfurações
profundas moldadas “in loco” amarradas por um cintamento, adotadas como solução
para construções que receberão cargas elevadas sobre um solo é instável. No caso
da obra de Niemeyer foi adotada uma profundidade de 28 metros de fundação para
suportar o peso de cada um dos 16 pilares de concreto com 40 metros de altura.
Na medida em que vão se aproximando da coroa, localizada no topo da
edificação, os pilares funcionam como elementos norteadores que focam a visão no

12 Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/01-14553/classicos-da-arquitetura-catedral-de-


brasilia-oscar-niemeyer> Acesso em 23 jun, 2018.
78

centro da Catedral que funciona como uma espécie de óculo. São 16 pilares de
concreto moldados “in loco” presos por duas cintas (fig. 68), a primeira junto ao solo
assumindo papel primordial na fundação e a segunda amarrando o topo dos pilares
como forma de não haver um desmembramento na medida em que a estrutura fosse
ganhando altura (PESSOA; CLÍMACO, 2002).
Outro aspecto que chama atenção é o fato dessa amarração não ser camuflada
pelo arquiteto, ao contrário, ele aproveita esse elemento e compõe a coberta como
uma forma de coroa tornando a estrutura algo mais orgânico. Assim como visto
externamente (fig. 69), como algo que amarra o topo dos pilares, internamente (fig.70)
também é possível de se observar essa amarração.
Tomando partido dessa característica, o arquiteto encontrou uma forma de
incorporar ainda mais luz a Catedral, através de aberturas no topo da coroa, a luz
adentra no recinto, incorporando um jogo de luz e sombra que encanta os visitantes.
O diferencial encontrado na Catedral consiste, justamente, na perfeita
integração da planta livre com fatores como o jogo de luz e sombra, que através da
luz natural que ultrapassa os vitrais possibilita ao usuário impressões que variam ao
longo do dia. Isto é, a cada momento a luz incide nos vitrais de uma forma diferente,
refletindo internamente toda a estrutura dos pilares em forma de bumerangue. A
modulação existente nas fachadas, que também é perceptível internamente, faz com
que tudo o que existe na parte externa da Catedral de alguma forma reflita no espaço
interno.
79

Figura 68 – Esqueleto estrutural / Amarração dos pilares

Fonte: Blog da arquitetura, 2018

Figura 69 - Cintamento inferior/ Esforços Figura 70 - Cintamento superior /


de tração esforços de compressão

Fonte: Educacional, 2018 Fonte: Educacional, 2018

Muito se fala a respeito do significado da coroa, elemento simbólico que


arremata a edificação. Há relatos de inspirações góticas, assim como também uma
alusão a coroa usada por Cristo, proporcionando ao visitante sua própria interpretação
do monumento. A estrutura define a Catedral de Brasília, mas ela vai muito além de
ser apenas um esqueleto definidor do espaço, ela mescla luz natural, elementos de
vedação e todo um conceito que ao final torna a Catedral uma referência da
arquitetura brasileira.
80

Figura 71 - Cintamento superior / Figura 72 - Cintamento superior / visão


Visão externa interna

Fonte: Blog da arquitetura, 2018 Fonte: Blog da arquitetura, 2018

A solução estrutural e global adotada por Niemeyer impressiona pelo equilíbrio


e é caracterizada como uma estrutura de superfície ativa, pois todo o esqueleto
estrutural que compõe o edifício é deixado a mostra e constituindo, acompanhado do
sistema de vedações, o invólucro do edifício que resume e evidencia seu caráter
tectônico, enquanto expressão máxima do potencial construtivo.
81

Quadro 4 - Ficha técnica (Catedral de Brasília)


OBRA: Catedral Metropolitana de Nossa Senhora
Aparecida (Catedral de Brasília)
ESCALA: Média
ANO: 1959 - 1970
LOCALIZAÇÃO: Esplanada dos ministérios, Brasília - DF
ARQUITETO: Oscar Niemeyer
ESTILO: Arquitetura moderna e futurista
USO: Institucional - Religiosa
SISTEMAS CONSTRUTIVOS:
FUNDAÇÃO: 16 Tubulões presos por cintamento.
ESTRUTURA: Concreto armado.
VEDAÇÃO: Concreto e vidro.
COBERTA: Amarração de 16 pilares por meio de uma laje em forma de coroa.
INSTALAÇÕES: Convencionais embutidas.
ESQUADRIAS: Vitrais fixos.
DIVISÓRIAS INTERNAS: Planta livre sem divisórias internas.
ACABAMENTOS: Mármore.
CATEGORIAS DA TECTÔNICA:
LUZ E SOMBRA:
Presente no interior da edificação através da composição
entre os pilares e os vitrais em conjunto com a luz
natural.
ESTRUTURA DE PERÍMETRO:

Característica que possibilita vencer grandes vãos livres


de pilares ou qualquer elemento estrutural internamente.
MODULAÇÃO:
Presente na fachada e é caracterizada pela repetição de
16 pilares intercalados com planos de vidro, perceptíveis
tanto internamente como externamente.
PLANTA LIVRE:
Resultado da utilização da estrutura de perímetro, permitindo maior flexibilização
de espaços.
ESTRUTURA DE SUPERFÍCIE ATIVA:
Estrutura definindo e sendo exposta por todo espaço.
SIMBOLISMO:
Diferentes interpretações: Alusão a Coroa de Cristo e Alusão a duas mãos com os
dedos abertos.
RELEVO:
Presente na composição dos pilares em conjunto com os planos de vidro.
ESCALA DE ESTRUTURA:
Pilares esbeltos de altura elevada como estratégia para moldar a forma
arquitetônica e definir o ambiente interno.
Fonte: Autora da pesquisa, 2018
82

3.2.2 Museu do Amanhã

O Museu do Amanhã faz parte do processo de revitalização da região portuária


do Rio de Janeiro. Localizado na praça de Mauá, mais precisamente sobre o píer de
Mauá, é considerado a principal edificação e símbolo do processo de revitalização (fig.
73). O Museu tem um apelo estético comum entre os projetos concebidos por Santiago
Calatrava, arquiteto responsável pelo projeto.
A parte de concepção de projeto aconteceu em 2009, porém as obras foram
iniciadas apenas no ano seguinte (2010), passando por várias etapas, sendo
concluído em dezembro de 2015. Representando um símbolo nas Olimpíadas de 2016
no Rio de Janeiro, o monumento compreende algo semelhante a um centro de
exposições, sendo em sua maioria, exposições intimistas que tem como foco
despertar diferentes sensações nos visitantes através de experiências
multissensoriais.
Figura 73 – Píer de Mauá antes da intervenção

Fonte: pet.ecv.ufsc.br, 2018

Em um primeiro momento foi pensado no reaproveitamento da fundação


existente do píer para sustentação da cobertura metálica, porém análises acusaram
patologias existentes nas estacas como fissuras e rompimentos levando a execução
de uma nova fundação tipo estaca com 2500 estacas, sendo 1500 metálicas com
profundidade entre 18 e 20 metros.
83

Autor de projetos onde a estrutura assume papel de protagonista na edificação,


Santiago Calatrava projetou o Museu do Amanhã fazendo uso de estruturas metálicas
escultóricas impactantes e arquitetonicamente expressivas. Sua obra não deixa
dúvida quanto as mensagens de contemporaneidade e imponência que desejou
transmitir aos visitantes (fig. 74).
A edificação é, de forma resumida, um bloco de concreto revestido por uma
cobertura metálica, configuração convencional que se destaca pela interface entre o
aço e o concreto, onde o aço mascara o concreto com uma coberta que funciona como
uma casca autoportante, que, por sua vez, sintetiza a forma do edifício (fig. 75).

Figura 74 - Píer de Mauá após a revitalização

Fonte: Passeio revestimentos, 2018

A edificação possui dois pavimentos e um subsolo. Em um primeiro momento


foi pensado em lajes protendidas no subsolo e no pavimento térreo para vencer os
grandes vãos. Porém, para acelerar a obra optou-se por abrir mão da protensão e
aumentar a espessura das lajes. A coberta metálica é formada por perfis tubulares e
foi desenvolvida através de recursos computacionais, marco na arquitetura arrojada
de Calatrava.
84

Figura 75 - Composição estrutural

Fonte: pet.ecv.ufsc, 2018

O museu apresenta características sustentáveis em várias frentes. A coberta


em perfis metálicos funciona como asas à medida que se movimentam durante todo
o dia de acordo com a incidência de radiação solar. Como está localizado na Baía de
Guanabara, faz reúso da água para resfriamento, climatização dos ambientes e
abastecimento dos espelhos d’água em todo entorno. A energia solar é captada
através de placas fotovoltaicas instaladas ao longo da coberta metálica que auxiliam
na movimentação da coberta dependendo da quantidade de insolação diária (fig. 76).

Figura 76 - Esquema de direcionamento da coberta ao longo do dia

Fonte: pet.ecv.ufsc, 2018


85

Apesar de sua monumentalidade o edifício chama atenção por parecer flutuar


sobre a Baía de Guanabara. As limitações durante a etapa de concepção projetual,
tais como altura máxima de 15 metros para não interferir na visão do porto, levou o
arquiteto a adotar elementos como as marquises que avançam em duas das fachadas
tornando a obra mais longilínea com balanços de grandes dimensões e que juntos
fazem alusão a proa invertida de um barco.

Figura 77 – Cobertura metálica autoportante

Fonte: Arcoweb, 2018

O museu apresenta várias categorias da tectônica integradas de uma forma tão


expressiva que nenhuma mascara a outra. Do detalhe mencionado por Frampton,
Gregotti, Frascari (2008) em seus estudos, visível na trama metálica da casca
autoportante (fig 77), resulta a textura da forma edificada que filtra a luz incidente. Da
expressividade dos materiais utilizados resulta um elemento de coberta dinâmico que
se movimenta ao longo do dia em resposta às mudanças no ambiente externo. O
movimento, tanto proporcionado pelo jogo de luz e sombra quanto pela rotação dos
elementos estruturais, pode ser considerado como algo atípico no âmbito do conjunto
e grupos de obras aqui analisadas.
86

Quadro 5 - Ficha técnica (Museu do Amanhã)


OBRA: Museu do Amanhã
ESCALA: Média
ANO: 2009 - 2015
LOCALIZAÇÃO: Praça Mauá, Rio de Janeiro
ARQUITETO: Santiago Calatrava
ESTILO: Arquitetura futurista
USO: Institucional - Cultural
SISTEMAS CONSTRUTIVOS:
FUNDAÇÃO: 2500 estacas, sendo 1500 metálicas com profundidade entre 20 e 80
metros.
ESTRUTURA: Concreto armado e aço.
VEDAÇÃO: Concreto armado.
COBERTA: Metálica.
INSTALAÇÕES: Embutidas no momento da concretagem. Sistema de reúso de água
do mar. Captação de energia solar através de placas fotovoltaicas.
ESQUADRIAS: Alumínio e vidro, retangulares e triangulares.
DIVISÓRIAS INTERNAS: Paredes de concreto.
ACABAMENTOS: Uso de materiais de acordo com critérios ambientais com foco na
sustentabilidade. Acabamentos compostos por materiais reciclados, produzidos
próximos ao local da obra. Piso permeável para facilitar a drenagem do solo.
CATEGORIAS DA TECTÔNICA:
LUZ E SOMBRA:
A luz incide no interior do museu por meio das tramas
metálicas que compõem a cobertura. A incidência de luz
varia quando a cobertura, semelhante a asas, se
movimenta ao longo do dia.
CASCA:
Sendo representada na cobertura metálica composta de
perfis aço tubular.
SIMBOLISMO:
O museu tem a exploração de sentimentos, sensações e
sentidos como algumas das principais características de
seu conceito. Traz o elemento da coberta fazendo alusão
a asas que se movimentam como símbolo do futuro.
ESTRUTURA AUTOPORTANTE:
Característica do uso da casca metálica na cobertura,
sendo esta, um elemento definidor do espaço,
caracterizando-se como uma estrutura de superfície ativa.
CONCEITO:
A edificação impõe aos visitantes seu conceito futurista e de organicidade.
MÁSCARA/FILTRO:
A casca é composta por uma trama metálica e funciona como um filtro de luz
natural, tornando o interior ainda mais interessante devido ao fato da luz adentar
por entre estes perfis metálicos. Essa característica tornou a edificação porosa que
possibilitando a visualização da Baia de Guanabara de dentro do Museu.
Fonte: Autora da pesquisa, 2018
87

3.2.2 Museu Oscar Niemeyer (MON)

Conhecido popularmente como “Museu do Olho” e sendo apontado como um


dos mais importantes pontos turísticos da cidade de Curitiba, esse edifício é
considerado um dos maiores complexos expositivos do Brasil, e por anos foi
caracterizado como a edificação com maior vão livre do país. O projeto, também de
autoria de Niemeyer, foi desenvolvido em 2001 a partir de uma construção já existente
no local que havia sido inaugurada em 1978. A transformação da escola em Museu
aconteceu devido a uma proposta do governo do Estado de Curitiba para reutilização
do espaço pela comunidade em geral. Devido a isso, muitas instalações e a própria
fundação já existente foi reaproveitada e em 2002 foi inaugurado o anexo frontal em
forma de olho (fig. 78).

Figura 78 - Museu Oscar Niemeyer

Fonte: Archdaily, 2018

O Museu representa a mais direta relação entre arquitetura, arte e estrutura. A


linguagem adotada pelo arquiteto ao projetar o museu exemplifica mais uma vez o
estilo integrador de Niemeyer, preocupado em sempre tornar a estrutura um ponto
focal em seus projetos. Dessa vez, ele utilizou uma forma parabólica no estilo de casca
para fazer alusão as curvas da mulher brasileira, enfatizando o movimento dos
quadris. A forma tem ligação direta com os movimentos das mulheres e as curvas
delineadas pelos movimentos corporais (fig.80).
Na área amarela que é a base da construção do edifício nos espelhos d´agua
há a prova da inspiração da forma deste anexo. O desenho é uma moça
fazendo um movimento da ginástica rítmica com fita. A forma do anexo do
museu é exatamente o espaço vazio que há entre os braços abertos e a fita.
A arte amarela da construção é o corpo da mulher usado como base deste
88

movimento, criando uma estrutura magnífica a partir de um conceito muito


interessante e quase desconhecido pelo público (PATRÍCIA, 2018).

O edifício é composto por elementos definidores de espaço e que buscam dar


sentido ao lugar, tais como pilotis (fig.81), iluminação zenital, os vãos livres e os
grandes balanços (fig. 82). O desenho presente no cubo que sustenta o grande “olho”
reforça o conceito do arquiteto.

Figura 79 - Museu do Olho / Fachada Figura 80 - Detalhe da pintura

Fonte: Mondomoda, 2018 Fonte: Mondomoda, 2018

O uso da planta livre também merece destaque dentro da análise do Museu


Oscar Niemeyer, onde esse tipo de planta foi possível devido ao uso da casca, que
por sua característica autoportante molda e sustenta o espaço, resultando assim em
um vão livre, ideal para edifícios institucionais e possibilitando vários usos, devido à
falta de limitação e barreiras internas. A evidência dada pelo arquiteto ao cubo que
sustenta o grande “olho” (fig. 83), de modo a equilibrar aquilo que seria o corpo da
mulher com a cabeça, potencializa a escala da estrutura (CHARLESON, 2009).
89

Figura 81 - Fachada principal

Fonte: Niemeyer, 2018


Figura 82 - Casca / Corte Figura 83 - Cubo / Corte

Fonte: Niemeyer, 2018 Fonte: Niemeyer, 2018

Nesse museu a casca novamente aparece como detalhe construtivo definidor


do projeto, detalhe aspecto enfatizado por Gregotti (2008), dessa vez ele está aliado
a textura da trama de vidro encontrada na fachada principal (fig. 84), onde a partir do
interior proporciona um amplo campo de visão aos usuários.

Figura 84 – Fachada: Textura Figura 85 - Detalhe

Fonte: Constructalia, 2018 Fonte: Constructalia, 2018

Dessa trama que confere textura e transparência (fig. 85) em consequência do


uso do vidro, decorre o jogo de luz e sombra característico de obras tectônico.
90

Quadro 6 - Ficha técnica (Museu Oscar Niemeyer)


OBRA: Museu Oscar Niemeyer (MON)
ESCALA: Média
ANO: Primeiro prédio (1967 – 1978) /
Transformação (2001 – 2002)
LOCALIZAÇÃO: Curitiba, PR
ARQUITETO: Oscar Niemeyer
ESTILO: Arquitetura moderna
USO: Institucional - Cultural
SISTEMAS CONSTRUTIVOS:
FUNDAÇÃO: Não encontrado.
ESTRUTURA: Concreto armado moldado “in loco”.
VEDAÇÃO: Concreto armado e vidro.
COBERTA: Cobertura em concreto protendido, convexa no térreo e côncava no
primeiro pavimento, ganhando a forma de um “olho”, sendo popularmente
conhecido como Museu do Olho.
INSTALAÇÕES: Embutidas e reaproveitadas de uma construção já existente.
ESQUADRIAS: Vidro e alumínio.
DIVISÓRIAS INTERNAS: Planta livre sem divisórias internas.
ACABAMENTOS: Vidro e cerâmica.
CATEGORIAS DA TECTÔNICA:
LUZ E SOMBRA:
A composição adotada nas esquadrias proporciona um
interessante jogo de luz e sombra no interior da edificação.

RELEVO E TEXTURA:
Presente na trama da fachada principal, fazendo alusão a
íris do olho.
CASCA:
Adquirindo um aspecto de fluidez e organicidade, a
edificação apresenta duas cascas, a cobertura do térreo,
convexa e a cobertura do primeiro pavimento côncava.
SIMBOLISMO:
A facilidade de Niemeyer em aliar conceito e estrutura está
evidenciada nesse projeto. As curvas presentes no museu têm
relação com as curvas femininas e seus movimentos, curvas
demonstradas na pintura presente na fachada. Nota-se
nesse monumento a estrutura sendo elevada a um grau
poético.
PLANTA LIVRE:
Por anos considerada a edificação com maior vão livre da arquitetura brasileira,
característica proporcionada pelo uso da casca.
ESCALA DE ESTRUTURA:
Dimensão exagerada do cubo que serve como suporte para o grande olho como
estratégia de equilibrar o edifício esteticamente.
Fonte: Autora da pesquisa, 2018
91

3.3 Grupo 3 – Escala micro

O terceiro grupo, formado por edificações com até 1200 m², compõem-se de
três residências, configurando-se como o grupo atípico, se comparado aos anteriores,
uma vez que é incomum, no âmbito da produção arquitetônica residencial, a presença
da estrutura aparente enquanto componente que une forma estrutural e forma
arquitetônica.

3.3.1 Residência Gerassi

A residência Gerassi, projetada pelo arquiteto Paulo Mendes da Rocha, foi


referenciada pelo emprego de materiais em sua aparência natural, apresentando um
aspecto rústico e despido até então pouco explorado em construções residenciais (fig.
86). Essa casa ilustra o que Semper dizia sobre relação de causa e efeito, onde a
escolha dos materiais adequados feita de maneira correta influencia diretamente na
qualidade estética e construtiva do produto final (AMARAL, 2009).

Figura 86 - Casa Gerassi / Fachada principal

Fonte: Archdaily, 2018

Através de seu estilo de conciliar arquitetura e estrutura por meio do uso de


materiais muitas vezes não explorados por outros arquitetos, por serem considerados
pouco atrativos, Paulo Mendes da Rocha consegue desenvolver projetos com
soluções estruturais simples, porém arrojados. A estratégia do arquiteto foi empregar
o uso do material pré-fabricado de concreto protendido em uma residência para
92

atender a família de um engenheiro, gerando diminuição dos custos, praticidade e


agilidade na construção.
Com essa residência o arquiteto quebra paradigmas em relação ao uso de
estruturas pré-fabricas em casas de médio e alto padrão. Uma vez que há uma
tendência em restringir o uso desse material a construções de escala macro devido
ao uso de grandes estruturas que se destacam na medida em que crescem em
dimensão. Assim como em construções de residências públicas, pela padronização
empregada em conjuntos habitacionais que optam pelo material pré-moldado por sua
rapidez na execução, como forma de facilitar a produção em série, o que diminuiria o
tempo de obra e também alguns custos.
De modo geral, a casa possui simplicidade no arranjo estrutural e na
organização espacial que é norteada pelos espaços criados pelo encaixe dos pilares,
vigas e lajes. Todo esqueleto estrutural está locado nas extremidades e no teto,
possibilitando a criação de espaços internos amplos articulados de modo a eliminar
corredores e divisões internas (fig. 87 e fig. 88).

Figura 87 - Planta baixa / térreo

Caixa de escada

Piscina

Área de lazer

Fonte: Archdaily, 2018


93

Figura 88 - Planta baixa / Pav. superior

Fonte: Archdaily, 2018

Como pode ser observado nas plantas da residência, a modulação utilizada


na disposição dos elementos estruturais – pilares e vigas formando pórticos – não
possui uma correspondência direta com a divisão dos ambientes internos. Nesse
sentido, a estrutura de perímetro conferiu liberdade projetual ao arquiteto na medida
em possibilitou a configuração em planta livre e fachada livre da interferência de
barreiras arquitetônicas, compondo uma pele transparente que ilumina e ventila o
interior, e ao mesmo tempo, permite uma continuidade visual com o exterior. Assim
obteve-se uma forma cúbica que poderia abrigar diversas possibilidades de
articulação entre os seus espaços, as quais não implicariam no caráter plástico que
expõem a totalidade de seus elementos construtivos.
94

Quadro 7 - Ficha técnica (Residência Gerassi)


OBRA: Casa Gerassi
ESCALA: Micro
ANO: 1988 - 1991
LOCALIZAÇÃO: São Paulo
ARQUITETO: Paulo Mendes da Rocha
ESTILO: Arquitetura modernista
USO: Residencial
SISTEMAS CONSTRUTIVOS:
FUNDAÇÃO: Sapata isolada.
ESTRUTURA: Concreto armado - Estrutura convencional (Pilar, viga e laje).
VEDAÇÃO: Concreto e vidro.
COBERTA: Lajes nervuradas.
INSTALAÇÕES: Expostas pelo fato de serem elementos pré-moldados, além do
próprio conceito da residência.
ESQUADRIAS: Vidro e alumínio.
DIVISÓRIAS INTERNAS: Alvenaria.
ACABAMENTOS: Concreto, ladrilhos hidráulicos e vidro.
CATEGORIAS DA TECTÔNICA:
PLANTA LIVRE:
Através da locação dos pilares nas extremidades da
edificação, o pavimento térreo se configura como um
grande vão livre, apresentando apenas a escada em sua
composição e áreas funcionais demarcadas (exceto
quartos, banheiros).
ESTRUTURA DE PERÍMETRO:
Representada nos 6 pilares nas laterais do edifício. Todo
exoesqueleto da residência é levado em consideração no
momento da divisão dos ambientes. A estrutura nesse
projeto define a funcionalidade do espaço. Na casa há
uma Imponência do sistema estrutural, assim como dos
materiais construtivos.
PÓRTICOS:
Os pilares opostos são unidos através de vigas dando
origem ao piso do primeiro pavimento, assim como ao
grande vão livre presente no térreo.

LUZ E SOMBRA:
Presente no uso de uma clara bóia centralizada na sala de
estar, dessa forma nos diferentes horários do dia a
insolação incide no interior da residência de diferentes
formas.

SIMBOLISMO:
Integração: construção – natureza. O paisagismo e o recurso da claraboia
permitem uma maior ligação entre o meio externo e o meio interno.
Fonte: Autora da pesquisa, 2018
95

3.3.2 Residência Mipibu

Projeto do escritório Terra e Tuma arquitetos associados, talvez seja a


residência com maior caráter tectônico dentre as três analisadas, pois, ao contrário
das outras residências, nesse projeto todos os componentes construtivos, desde a
estrutura até as instalações, são aparentes em todos os ambientes domésticos. A
residência toma como premissa a união entre a estética dos materiais expostos à
economia de recursos, aspecto visível nas paredes construídas com bloco de concreto
sem revestimento sobre as quais foram executadas as instalações prediais (fig. 89).

Figura 89 - Instalações aparentes

Fonte: Archdaily, 2018

A forma da casa é definida por duas paredes extensas, que se configuram como
planos horizontais que estabelecem os limites laterais da edificação, e pela fachada
ortogonal arrematada por lâminas horizontais que conectam as paredes laterais e
estabelecem um limite tênue entre o público e o privado. Esses elementos horizontais
de fachada, que antecedem o jardim que dá acesso à casa criam relevo
(CHARLESON, 2009) e filtram a luz que invade o edifício (fig. 91). Toda parte aparente
em concreto é amenizada através do uso das plantas e do espelho d’água, elementos
que proporcionam um equilíbrio estético interno e leveza interna maior do que se
observa na parte externa (fig. 91 e 92).
96

Figura 90 - Fachada

Fonte: Archdaily, 2018

Figura 91 - Terraço com árvore de Figura 92 - Parte térrea: Quartos e


pequeno porte sobre a laje jardim interno

Fonte: Archdaily, 2018 Fonte: Archdaily, 2018

Outro aspecto que confere identidade ao edifício, dentre os aspectos já citados,


refere-se à organização interna dos espaços, uma vez que se contraria a tradicional
divisão, quando há mais de um pavimento em residências, de utilizar a parte superior
para uso íntimo e a parte térrea para toda área social. Nessa residência em especial
os quartos estão localizados na parte térrea e a justificativa para isso foi evitar o
incômodo de possíveis barulhos externos que seriam barrados à medida que os
quartos permanecessem no térreo.
97

Quadro 8 - Ficha técnica (Residência Mipibu)


OBRA: Casa Mipibu
ESCALA: Micro
ANO: 2015 - 2016
LOCALIZAÇÃO: São Paulo
ARQUITETO: Terra e Tuma Arquitetos Associados
ESTILO: Arquitetura contemporânea
USO: Residencial
SISTEMAS CONSTRUTIVOS:
FUNDAÇÃO: Não encontrado.
ESTRUTURA: Concreto armado e aço.
VEDAÇÃO: Caixilhos de concreto e vidro.
COBERTA: Laje de concreto dimensionada para receber uma árvore no 1º pav.
INSTALAÇÕES: Aparentes.
ESQUADRIAS: Alumínio e vidro.
DIVISÓRIAS INTERNAS: Alvenaria e painéis de vidro.
ACABAMENTOS: Concreto, vidro e alumínio.
CATEGORIAS DA TECTÔNICA:
LUZ E SOMBRA:
Presente na residência através do uso de brises no terraço,
assim como, devido a implantação de uma árvore no piso do
pavimento superior.
SIMBOLISMO:
Aproveitamento de um terreno estreito e de difícil
organização espacial por meio da exploração de elementos
estruturais. Através da adoção da construção inversa a casa
rompe com a tradição do setor íntimo localizado sempre na
parte superior, por questões de incômodo referente aos
barulhos externos.

TEXTURA:
Evidenciada através do uso de caixilhos na parte interna.
Além disso, a adoção desse material diminuiu o custo com
acabamentos. A residência transmite uma sensação de
calmaria interna proporcionada pelo uso dos espelhos
d’agua em conjunto com toda parte paisagística. Por um
momento a casa não parece está localizada em São Paulo.
ESCALA DE ESTRUTURA:
Os arquitetos adotaram diferentes alturas nessa residência
ao inserir jardins internos com pé direito duplo e também na
instalação de bandejões com vegetação.

ESTRUTURA APARENTE:
Vigas e pilares estão visíveis enriquecendo ainda mais o conceito rústico e tectônico
da residência.

Fonte: Autora da pesquisa, 2018


98

3.3.2 Residência LLM

A residência LLM, localizada em São José dos Campos – SP e projetada em


2015 pelos arquitetos João Paulo Daolio e Thiago Natal Duarte, possui como
características principais a e a interface entre diversos materiais, tais como concreto,
madeira, alumínio, vidro e alvenaria. A exploração do vidro potencializa o contato
visual direto entre interior e exterior assim como a continuidade entre os ambientes
internos, uma vez que, apesar de localizados em ambientes distintos, os usuários
podem se comunicar visualmente. Esse aspecto também decorre da distribuição dos
espaços em torno do jardim vegetado que se apresenta como elemento de integração
entre forma arquitetônica e natureza (fig. 93).

Figura 93 – Fachada

Fonte: Archdaily, 2018

Apesar do uso expressivo do concreto, no sistema de vedação, e da alvenaria,


nas divisórias internas, a forma possui leveza, e ao mesmo tempo força, devido a
exploração da estrutura metálica aparente e ao uso do vidro compondo planos de
esquadrias de grandes dimensões. O sistema estrutural delimita o contorno dos
volumes que se erguem em diferentes alturas no terreno acidentado, por entre a
vegetação existente, conferindo a escala da estrutura (CHARLESON, 2009) o
protagonismo originado a partir das vigas e pilares de dimensões significativas no
conjunto edificado (fig. 94). Vale ressaltar o posicionamento dos quartos e toda área
intima, que estão locados em lugares estratégicos, todos os dormitórios ficam abaixo
99

da copa das árvores, que por serem de grande porte mantém sempre o ambiente com
um clima ameno, além de conferir um jogo de luz e sombra quando alguns raios
atravessam as folhas das árvores (fig. 94).

Figura 94 - Estrutura aparente de grandes dimensões.

Fonte: Archdaily, 2018

A topografia e a vegetação nativa determinaram o caminho da construção, cuja


implantação preservou a maior quantidade possível de árvores, uma vez que o
objetivo dos arquitetos era justamente usar esses elementos paisagísticos como um
elo entre o exterior e interior. Isto é, em nenhum momento houve uma tentativa dos
projetistas de aterramento e mudança nas características naturais do terreno (fig. 95
e 96).

Figura 95 - Implantação

Fonte: Archdaily, 2018


100

Figura 96 - Diferenciação de níveis

Fonte: Archdaily, 2018

A presença marcante da natureza atenua a divisão entre a parte externa e a


parte interna da residência e estabelece um contraste com a artificialidade dos
sistemas construtivos utilizados. Além disso, a luz é um fator presente em todos os
ambientes, na medida em que projeta a sombra da copa das árvores nas superfícies
da casa, proporcionando aos usuários, que ali adentram uma experiência sensorial de
liberdade (fig.97).

Figura 97 - Jardim interno

Fonte: Archdaily, 2018


101

Quadro 9 - Ficha técnica (Residência LLM)


OBRA: Casa LLM
ESCALA: Micro
ANO: 2011 - 2014
LOCALIZAÇÃO: São José dos Campos, São Paulo
ARQUITETO: João Paulo Daolio, Thiago Natal Duarte
ESTILO: Arquitetura modernista
USO: Residencial
SISTEMAS CONSTRUTIVOS:
FUNDAÇÃO: Muro de contenção em blocos foi considerado a melhor opção nessa
casa.
ESTRUTURA: Mista – Concreto e aço.
VEDAÇÃO: Concreto, aço, vidro e alumínio.
COBERTA: Estrutura metálica.
INSTALAÇÕES: Convencionais embutidas.
ESQUADRIAS: Vidro e alumínio.
DIVISÓRIAS INTERNAS: Ambientes íntimos apresentam paredes em alvenaria.
ACABAMENTOS: Concreto, madeira, vidro, aço e pedra.
CATEGORIAS DA TECTÔNICA:
PLANTA LIVRE:

A maioria dos ambientes ganharam forma através do


posicionamento da estrutura. Ambientes sociais da casa
são contemplados pela natureza e formados por grandes
vãos.
ESTRUTURA APARENTE:
O potencial estrutural e estético dos materiais foi
explorado pelos arquitetos, ao contrário do que se possa
imaginar a casa não apresenta uma arquitetura pesada
devido ao uso excessivo do concreto e do metal.

SIMBOLISMO:
O bucolismo se expressa nessa residência através da
natureza. A edificação parece brotar em meio a vegetação
e a integração entre natureza e arquitetura é ponto forte
na concepção da residência.
LUZ E SOMBRA:

O jogo de luz e sombra está presente em todo interior da


casa através das copas e sombras das árvores que estão
presentes em todo entorno da residência.

Fonte: Autora da pesquisa, 2018


102
102

4 TECTÔNICA: ESTRATÉGIAS DE PROJETO

4 TECTÔNICA: ESTRATÉGIAS
DE PROJETO
103

4 TECTÔNICA: ESTRATÉGIAS DE PROJETO

Neste capítulo serão apontadas diretrizes para projetos de escalas variadas


fundamentadas nas categorias da tectônica na arquitetura, tendo a tectônica como
base, a partir da síntese/resultado das descrições e análises feitas anteriormente no
capítulo 3 (Tectônica expressa em obras brasileiras). Diante do comparativo entre as
tabelas elaboradas das edificações analisadas foram identificadas características
comumente utilizadas em obras de caráter tectônico que são: planta livre, estrutura
de perímetro, luz e sombra, estrutura aparente, simbolismo e escala de estrutura.

4.1 Planta livre

A adoção da planta livre em projetos arquitetônicos é uma contribuição de Le


Corbusier para arquitetura e esse elemento faz parte dos cinco princípios que segundo
ele compõe a arquitetura moderna. A utilização da planta livre em edificações é
possível a partir do uso da estrutura independente, desprendida de qualquer função
pré-definida, o que possibilita a livre locação de paredes ou divisórias internas sem
função estrutural, além de proporcionar que o projetista tenha liberdade na
organização espacial do ambiente. Assim a planta livre torna o ambiente adaptável a
qualquer uso, por este motivo é muito utilizada em pavilhões, centros esportivos,
espaços religiosos, centros de exposições, entre outros tipos de edificação que
também recebem um grande volume de pessoas, podendo também ser adotada em
residências a fim de conferir continuidade e integração entre os ambientes. Qualquer
um desses usos só é possível a partir da utilização da estrutura de perímetro (fig. 87
e 88).

4.2 Estrutura de perímetro

Quando a estrutura é pensada para ser posicionada na parte externa ou nas


laterais de uma edificação ela resulta em uma maior área útil, além de conferir as
edificações um grande potencial estético e imponência estrutural, modulando e
criando texturas em fachadas se usada de forma consciente e com planejamento, a
estrutura perimetral liberta o interior de elementos estruturais que possam de alguma
forma limitar o uso do ambiente, criando ambientes mais flexíveis, proporcionando ao
usuário a liberdade de organizar seus espaços de acordo com suas necessidades.
104

4.3 Luz e sombra

Característica que tem função de valorizar todos os outros elementos


expressivos da tectônica. Em obras onde a estrutura define o espaço os projetistas
utilizam a luz para, de alguma forma, realçar elementos estruturais e construtivos que
muitas vezes poderiam ser negligenciados ou pouco evidenciados dentro do projeto.
Assim como no Estádio Mané Garrincha (ver item 3.1.3), a passagem da luz natural
por entre elementos estruturais pode realçar a estrutura de perímetro, conferindo
leveza, profundidade e dramaticidade aos planos de fachada dos edifícios. Quando
filtrada pela coberta, tal como no Museu do Amanhã (ver item 3.2.2), a luz pode invadir
os espaços internos, promovendo experiências sensoriais e modificando a percepção
dos usuários ao longo do dia. Quando direcionada por peles transparentes, assim
como na residência Gerassi (ver item 3.3.1), a luz proporciona a continuidade visual
entre o exterior e o exterior das edificações, potencializando o contraste entre dentro
e fora, cujos limites são estabelecidos, em obras tectônicas, pela estrutura e demais
componentes construtivos.

4.4 Estrutura aparente

O potencial estético e arquitetônico dos elementos construtivos e estruturais


são capazes de agregar riqueza ao projeto e ao edifício, podendo valorizá-lo além de
apenas sustentá-lo. Os diferentes papéis que a estrutura pode desempenhar
contribuem, significativamente, para o sucesso de uma edificação, na medida em que
muitas vezes a própria estrutura funciona como dispositivo de sombreamento de
fachadas, através das máscaras, captam águas pluviais para reúso interno, isolam o
edifico termicamente, colaboram para valorização de superfícies com relevos e
texturas. Devido a essa ampla gama de utilização, a estrutura aparente pode ser
considera como a premissa da tectônica na arquitetura, a característica mais basilar
dentre as demais, uma vez que catalisa o conjunto das categorias até aqui
mencionadas. Em suma, o ato de expor os materiais e sistemas construtivos que
compõem determinado ambiente confere plasticidade e identidade ao espaço
projetado e edificado.
105

4.5 Simbolismo

Obras de caráter tectônico demonstram uma finalidade para cada material e


cada elemento construtivo adotado, onde todos os componentes estão bem
relacionados dentro de um todo coeso. Não obstante, esse diálogo franco e
consequente entre todos os aspectos que concorrem para a produção do espaço
resultam em obras que possuem coerência tanto interna quanto externa. Concebidos
nessa perspectiva, todos os detalhes construtivos expõem e justificam a trajetória
construtiva da edificação de maneira explícita. Além disso, esses detalhes sinalizam
para a criação de mensagens e sensações na medida em que se configuram com
símbolos relacionados a um uso específico, tal como o uso religioso na Catedral de
Brasília, onde todos as partes construídas e interligadas metaforizam o Sagrado.

4.6 Escala de estrutura

A variação de dimensão da estrutura de uma edificação – em escala macro,


média e micro – pode valorizar ou desvalorizar um edifício, assim como destacar um
elemento dentre os demais, caso seja objetivo do projetista. Assim como a estrutura
aparente, a escala de estrutura pode potencializar as demais categorias, ampliando
o impacto visual de luzes e sombras, modulando fachadas, criando relevo e texturas
e símbolos, relacionando-se diretamente com impacto visual dos usuários diante de
obras que não dissociam a forma estrutural da forma arquitetônica.
A tabela a seguir apresenta uma sistematização das categorias que expressam
a tectônica diretamente no projeto, suas definições, principais características e
impactos da adoção dessas estratégias, tanto na organização espacial como no
processo construtivo de edifícios.
106

Quadro 10 - Diretrizes projetuais


Categorias Definição Características Impactos no projeto
Caracteriza-se como
espaços livres de Locação da Vãos livres.
qualquer elemento estrutura no Flexibilização de
estrutural que possa de perímetro da espaços.
PLANTA alguma forma limitar a edificação. Liberdade de
LIVRE organização espacial, planejamento
permitindo uma maior Estrutura como funcional.
fluidez entre ambientes e definidora de Integração entre os
reforçando as ideias de espaços. ambientes.
Charleson.

Caracteriza-se pelo Modela o espaço Arrojo estrutural


posicionamento da utilizando-se de Vãos livres
estrutura no perímetro da sua própria Funcionalidade
edificação, pois, quando resistência e espacial
localizada internamente forma.
ESTRUTURA reduz as áreas úteis e Aumento de áreas
Estrutura como
DE dificulta a organização do úteis internamente
elemento de
PERÍMETRO layout. Categoria que Agrega
destaque.
enfatiza as ideias de personalidade a
Charleson destacando a Categoria que edificação
estrutura dos demais resulta na criação Conciliação entre
elementos da edificação. de plantas livres. forma arquitetônica
e forma estrutural
Realça elementos que
podem de alguma forma Poder de enaltecer Contribui para
estarem mascarados ou elementos realçar a
não estar em posição de estruturais e expressividade dos
destaque dentro do construtivos. materiais.
LUZ E projeto. Categoria que Categoria que pode
SOMBRA reafirma a ideia de detalhe estar aliada com
narrativo que faz diferença Integração entre qualquer outra
dentro do projeto meio externo e categoria de forma a
defendida por Frascari. meio interno. valorizá-la

Variação de altura e Categoria que Arquitetura de


dimensão que impacta e realça a estrutura. impacto visual.
atrai atenção dos Diferenciação Jogo de volumes, de
ESCALA DE observadores reforçando entre elementos forma que um
ESTRUTURA o conceito de Gregotti de construtivos em elemento seja mais
que a estrutura pode ser o função da variação evidenciado que
detalhe que está fazendo de altura e outro.
falta na arquitetura atual. dimensão.

Evidência dos Diminuição de


Exploração do potencial elementos que gastos com
estético de cada elemento sustentam e acabamentos.
construtivo e do equilíbrio definem
dentro da construção por espacialmente Enriquecimento de
ESTRUTURA meio de combinações uma edificação. características
APARENTE entre materiais, Exploração do externas de uma
reafirmando as ideias de potencial estético edificação através
Semper em relação as e construtivo dos de elementos
escolhas coerentes de sistemas marcadores nas
materiais. estruturais. fachadas.
107

Edificações
projetadas sem Valorização do
O ponto chave que esconder o que a potencial estético
envolve a tectônica é aliar faz existir e a da edificação.
técnicas e conceitos. sustenta.
Cada material ou uso Cada elemento Surgimento de
dado a determinado construtivo construções
espaço deve ser escolhido tem o planejadas e
justificado dentro do poder de embasadas por um
projeto, pois ao chegar no enriquecer o conceito que alie
resultado final cada projeto. este definido na
SIMBOLISMO edificação apresenta uma Cada material etapa de concepção
trajetória construtiva, escolhido deve ser projetual.
categoria que exemplifica pensado como
o conceito de Frampton de forma de agregar Edificação
projetar com sentido de valor ao produto transmitindo ideias
ser e existir despertando final. e sensações aos
sensações nos usuários e Intenção do observadores,
observadores. projetista impactando de
justificada dentro alguma forma todos
do projeto. que a veem.

Fonte: Autora da pesquisa, 2018


108

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo enfatiza a necessidade de ampliar o campo de discussão de


teoria de projeto através da abordagem de um tema que não é muito explorado nos
ordenamentos curriculares, porém, útil para que os projetistas no desenvolvimento de
projetos que considerem a devida importância dos aspectos construtivos de uma
edificação.
A preocupação com a valorização de obras nacionais pelo viés da tectônica se
configura como um aspecto inovador desta pesquisa, pois há poucos registros de
obras brasileiras sendo analisadas pelo caráter de união entre forma e estrutura, com
enfoque no potencial dos elementos de construção na geração de espaços
arquitetônicos.
A ausência de referências suficientes para fundamentar e aprofundar o tema e
a escassez de análises de obras brasileiras sob o ponto de vista da tectônica foi um
grande desafio e limitação do trabalho. Porém essa dificuldade serviu como motivação
para que se buscasse exaustivamente, no exemplo de obras internacionais, o
conhecimento das principais categorias analíticas que, uma vez identificadas na
produção nacional, possibilitaram a criação de diretrizes para a concepção de
edifícios.
Por fim, a pesquisa sintetizou apontamentos que tem potencial para enriquecer
o conteúdo existente no meio acadêmico e profissional, a fim de que professores,
estudantes e arquitetos possam se familiarizar com as possibilidades de interface
entre projeto arquitetônico e estrutura das construções desde as etapas iniciais do
processo criativo.
O meio acadêmico até então se encontra carente de conteúdo que aborde as
vantagens da tectônica quando aplicada nas edificações desde a etapa de concepção
projetual. Assim, há também a possibilidade de uma continuidade da pesquisa através
da aplicação prática das diretrizes apontadas em exercícios de projeto.
109

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