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CAMPUS ARAPIRACA
CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO
ARAPIRACA
2022
IRIS SILVA DE OLIVEIRA
Arapiraca
2022
Universidade Federal de Alagoas – UFAL
Campus Arapiraca
Biblioteca Campus Arapiraca - BCA
CDU 72
Banca Examinadora
________________________________________________________
«Titulação_1» «Orientador»
Universidade Federal de Alagoas
Campus Arapiraca
(Orientador)
___________________________________________________________
«Titulação_3» Renata Torres Sarmento de Castro
Universidade Federal de Alagoas – UFAL
Campus Arapiraca
(Coorientadora)
Agradeço ao meu bom Deus, que me sustentou até aqui, dando paciência,
discernimento e forças para continuar quando pensei em desistir. Ele que é dono de
toda honra e toda glória, e que não desampara os seus, tocou sobre minhas fraquezas
e me guardou até aqui.
A minha família, que sempre esteve ao meu lado. Aos meus pais, João e Irene,
que nunca deixaram nos faltar nada, em especial a minha mãe, que fez de tudo para
dar uma educação de qualidade para mim e meus irmãos. Aos meus irmãos, Igor e
Yasmim, que me inspiram a ser uma pessoa melhor a cada dia. A minha prima-irmã
Simone, a dona dos melhores conselhos, sempre disponível para me ouvir e ajudar.
Ao meu marido Lucas, que me apoiou, acreditou que eu era capaz, foi paciente,
compreensivo, amoroso e esteve ao meu lado em todos os momentos, independente
das circunstâncias. Agradeço muito a Deus por ter me dado você como companheiro
de vida.
Aos meus sogros, Sr. Costa e Dona Rose, por sempre me incentivarem,
torcerem e orarem por mim. São uma grande inspiração.
Aos meus amigos da faculdade Carla, Isabel, Jaíres, Karine e Marcelo, o meu
grupo Coxinha. Obrigada pelas risadas, pelas conversas e por todos os momentos
partilhados juntos. Os dias na UFAL não seriam os mesmos sem vocês. Obrigada por
acreditarem em mim, mais do que eu mesma, sou muito feliz por poder contar com
vocês.
As minhas amigas do IFAL, Camila e Carol, por todo apoio e incentivo, sempre
me lembrando do quão longe posso chegar e me motivando a continuar. Já são longos
anos de amizade, e graças a Deus por isso.
A todos os meus professores, do ensino fundamental, do ensino médio e da
faculdade. Agradeço por todos os ensinamentos, os conselhos e momentos
partilhados. Todos, sem exceção, tiveram uma contribuição para que eu pudesse
chegar até aqui. E aos que um dia torceram por mim, essa conquista também é de
vocês.
Agradeço também ao Professor Edler e à Professora Simone Romão, por terem
dado início à orientação deste trabalho, obrigada pela paciência e disponibilidade.
Agradeço ao meu atual orientador Professor Marcelo Karloni e à minha coorientadora
Professora Renata Torres, por todas as correções, orientações e tempo
disponibilizado para me ajudar a finalizar com êxito este estudo. Sou grata também à
Paula Zacarias, do ONU-Habitat, e ao Allan Oliveira, da RENOVA, por todo tempo e
informações disponibilizadas.
Por último, agradeço à Dona C.M.C, moradora que recebeu o projeto de
melhoria habitacional, e sua família por estarem sempre dispostos a colaborar com o
que fosse preciso, por me receberem bem e aceitarem fazer parte deste trabalho.
“Deus está nos detalhes” (Ludwig Mies van der
Rohe)
RESUMO
Possuir uma moradia digna e adequada é um direito humano, mas ainda é uma
realidade distante para muitos brasileiros. Segundo uma pesquisa realizada pela
Fundação João Pinheiro (FJP), em 2019 o déficit habitacional qualitativo, que
corresponde à quantidade de famílias que vivem em casas que precisam passar por
reformas, foi de 24.894 milhões de moradias. Esse vasto número de habitações
inadequadas deve-se principalmente à produção de moradias a partir da
autoconstrução. O processo autoconstrutivo acontece quando o próprio morador
constrói ou reforma a sua casa, sem as orientações de um arquiteto e/ou engenheiro.
A Lei 11.888/08, ou Lei de assistência técnica para habitação de interesse social
(ATHIS), surge como forma de assessorar a autoconstrução e proporcionar
habitações de melhor qualidade, assim como também existem outras formas de
prestar serviços de arquitetura e urbanismo a pessoas que não podem pagar pelo
serviço. O objetivo geral deste trabalho é prestar assessoria técnica desenvolvendo
um projeto de reforma a nível de estudo preliminar para uma família da Comunidade
Frei Damião, localizada em Arapiraca – AL, que possua uma casa autoconstruída.
Dentro dos procedimentos metodológicos, realizou-se uma pesquisa bibliográfica
sobre projetos de arquitetos e engenheiros que prestassem assistência e assessoria
técnica a famílias de baixa renda, no intuito de compreender suas metodologias.
Depois, selecionou-se uma casa autoconstruída dentro da comunidade de estudo,
estabeleceu-se contato com a família e, assim, foram realizados levantamentos de
dados da casa escolhida, com anotações de todas medidas importantes e registros
fotográficos de todos os espaços, e uma entrevista com a líder da família escolhida, a
fim de obter-se as informações para elaborar um programa de necessidades que
atendesse às necessidades dos moradores de acordo com a realidade estudada. O
resultado obtido foi um projeto de melhorias habitacionais divido em etapas, com
soluções pontuais, possíveis de serem executadas e que venham a proporcionar
qualidade de vida a partir do ambiente construído. Também foram estudadas
estratégias que a família pode vir a adotar futuramente para possibilitar a execução
da obra. Assim, este trabalho espera evidenciar a importância da arquitetura social
para a sociedade e inspirar que estudos voltados ao tema sejam desenvolvidos em
outras comunidades da região. Democratizar o acesso à arquitetura e tornar a moradia
adequada um direito garantido, deve ser uma luta constante entre as classes de
arquitetos e engenheiros.
Having decent and adequate housing is a human right, but it is still a distant reality for
many Brazilians. According to a survey carried out by the João Pinheiro Foundation
(FJP), in 2019 the qualitative housing deficit, which corresponds to the number of
families living in houses that need to be renovated, was 24,894 million homes. This
vast number of inadequate housing is mainly due to the production of housing from
self-construction. The self-construction process happens when the resident himself
builds or renovates his house, without the guidance of an architect and/or engineer.
Law 11,888/08, or the Technical Assistance Law for Social Housing (ATHIS), appears
as a way of advising on self-construction and providing better quality housing, as well
as there are other ways of providing architecture and urban planning services to people
who cannot pay for the service. The general objective of this work is to provide
technical assistance to a family from the Frei Damião Community, located in Arapiraca
- AL, which has a self-built house, developing a renovation project at the preliminary
study level. Within the methodological procedures, architects and engineers who
provided assistance and technical advice to low-income families, in order to
understand their methodologies, carried out a bibliographic research on projects.
Afterwards, a self-built house was selected within the study community, contact was
established with the family and, thus, data surveys were carried out on the chosen
house, with notes of all important measurements and photographic records of all
spaces, and a interview with the leader of the chosen family, in order to obtain the
information to develop a needs program that would meet the needs of the residents
according to the reality studied. The result was a housing improvement project divided
into stages, with punctual solutions, possible to be executed and that will provide
quality of life from the built environment. Strategies that the family may adopt in the
future were also studied to enable the execution of the work. Thus, this work hopes to
highlight the importance of social architecture for society and inspire studies on the
subject to be developed in other communities in the region. Democratizing access to
architecture and making adequate housing a guaranteed right must be a constant
struggle between the classes of architects and engineers.
AT Assistência Técnica
ATHIS Assistência Técnica em Habitação de Interesse Social
ATME Assistência Técnica à Moradia Econômica
BNH Banco Nacional de Habitação
CAU Conselho de Arquitetura e Urbanismo
CODHAB Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito
Federal
CONCIDADES Conselho das Cidades
CREA/RS Conselho Regional de Engenharia e Agronomia
DUDH Declaração Universal dos Direitos Humanos
EMAU Escritório Modelo de Arquitetura e Urbanismo
FCP Fundação Casa Popular
FECOEP Fundo Estadual de Combate e Erradicação da Pobreza
FEJEA Federação de Empresas Juniores Alagoana
FENEA Federação Nacional dos Estudantes de Arquitetura e
Urbanismo do Brasil
FJP Fundação João Pinheiro
FNA Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas
FNHIS Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................. 20
4.2.3 Plano Diretor Participativo do município de Arapiraca, Lei 2.424/06 ... 126
1 INTRODUÇÃO
Viver em uma moradia digna e adequada ainda é uma realidade distante para
muitos brasileiros, mesmo sendo um direito que deve ser assegurado pelo Estado
(PACTO INTERNACIONAL DOS DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E
CULTURAIS - PIDESC, 1966). Segundo uma pesquisa realizada pela Fundação João
Pinheiro (FJP), em 2019 o déficit habitacional quantitativo brasileiro, quantidade de
famílias que precisam de uma casa nova, foi de 5.877 milhões de moradias. Já o déficit
habitacional qualitativo (inadequação de domicílios), que corresponde à quantidade
de famílias que vivem em casas que precisam passar por reformas, foi de 24.894
milhões de moradias. Analisando tais dados, nota-se que o número de pessoas
precisando de novas casas para morar é preocupante, mas que a quantidade de
famílias que vivem em moradias inadequadas é quatro vezes maior. São habitações
sem energia elétrica, abastecimento de água ou sem um banheiro exclusivo, por
exemplo. Entre as cinco regiões do País, o Nordeste é a que possui maior número de
domicílios inadequados. Filtrando esses dados em relação a Alagoas, são mais de
500 mil famílias morando em habitações com algum tipo de incoerência (FJP, 2021).
O problema das más condições habitacionais existe desde o período pós-
abolição, quando os negros não tinham condições de morar nos centros das cidades
e precisavam ocupar favelas, geralmente em áreas de risco físico ou sem
infraestrutura básica e adequada para se viver (BARRETO, 2021). Com a pandemia
da Covid-19 1 o tema foi resgatado para debate. Em meio a uma crise sanitária e
financeira, muitas pessoas tiveram que sair de onde estavam e ir morar na periferia
da cidade, onde o custo de vida é menor, mas também onde falta saneamento urbano,
água encanada, banheiro dentro de casa e, assim, onde a propagação do vírus ocorre
mais rapidamente (BARBOSA; NEIS, 2020).
1A COVID-19, doença infecciosa causada por um coronavírus recém-descoberto, teve início no Brasil
em fevereiro de 2020. Os principais sintomas são febre, tosse seca, cansaço, dores no corpo, dor de
garganta, diarreia, dor de cabeça e perda de paladar e/ou olfato. A doença afeta diferentes pessoas de
maneiras distintas, podendo ocorrer desde de forma assintomática até levar a óbito. A transmissão
pode ocorrer a partir do contato com gotículas geradas quando uma pessoa infectada tosse, espirra ou
exala. Até o dia 19 de agosto de 2021, foram registrados mais de 20,5 milhões de casos e mais de 572
mil mortes pela doença.
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São nas periferias das cidades onde prevalece a falta de infraestrutura urbana
e, geralmente, o adensamento de casas inadequadas. Esse vasto número de
habitações com alguma incoerência deve-se principalmente à produção de moradias
a partir da autoconstrução. O processo autoconstrutivo acontece quando o próprio
morador constrói ou reforma a sua casa, seja sozinho ou com ajuda de pedreiro e
familiares, geralmente levantadas em terrenos ilegais ou sem infraestrutura
(MARICATO, 1979). É a maneira que grande parte da população tem de conseguir
um lugar para morar.
mais pobres. Ainda é uma lei pouco conhecida por parte da população e dificilmente
implementada pelas prefeituras (CAU/BR, 2017). Mas, mesmo diante da ineficiente
atuação dos órgãos públicos e da falta de repasse de verbas, existem profissionais da
área de Arquitetura, Urbanismo e Engenharia Civil que atuam prestando esse tipo de
auxílio.
O ponto principal da discussão é o acesso à habitação de qualidade através da
assistência e assessoria técnica em casas autoconstruídas. Como atuar com
arquitetura social em meio à falta de recursos, em uma comunidade com famílias de
baixa renda, de forma a obter um resultado final possível, viável e satisfatório?
A motivação para a elaboração dessa pesquisa veio através da inquietação da
autora deste trabalho quanto às inúmeras habitações inadequadas que são
construídas sem a assessoria de um arquiteto, juntamente com o seu desejo de
analisar as possíveis formas de se atuar com arquitetura social. Com a disseminação
dessa temática, outros estudantes e/ou profissionais de Arquitetura e Urbanismo
poderão despertar interesse para trabalharem com o tema, ampliando a rede de
atuação em ATHIS e criando a possibilidade de outras comunidades carentes serem
beneficiadas com uma arquitetura acessível.
O objetivo geral deste trabalho é prestar assessoria técnica desenvolvendo um
projeto de reforma a nível de estudo preliminar para uma família da Comunidade Frei
Damião, localizada em Arapiraca – AL, que possua uma casa autoconstruída. Quanto
aos objetivos específicos que se espera alcançar, são:
a) Pesquisar conceitos e marcos históricos relacionados à arquitetura social, mais
precisamente à assessoria e assistência técnica em habitação de interesse
social (ATHIS);
b) Selecionar projetos de referência em atuação em assessoria e assistência
técnica em habitação de interesse social, de acordo com suas metodologias
utilizadas;
c) Relatar a realidade atual da Comunidade Frei Damião;
d) Desenvolver um projeto de reforma de uma casa autoconstruída para uma
família da Comunidade Frei Damião.
2 A ARQUITETURA SOCIAL
Ter um lugar digno onde morar é uma das necessidades básicas de todo ser
humano. O lar é símbolo de sobrevivência, de refúgio, de segurança, de resistência e
estabilidade. É ter onde se proteger das intempéries, onde comer, dormir, ter onde
aprender os primeiros valores e desenvolver suas principais habilidades. Ao possuir
uma moradia, dá-se início ao processo de integração social do indivíduo,
possibilitando-o sentir-se parte da sociedade em que habita.
É natural do homem possuir necessidades para obter qualidade de vida.
Algumas delas são fundamentais e imprescindíveis como a saúde, alimentação,
educação e a habitação também é uma delas. Ter uma casa para morar, com
condições habitáveis e uma infraestrutura básica, é o crucial para o indivíduo ter o
mínimo de dignidade humana. Esta última é um dever que Estado precisa garantir,
conforme o Artigo 1º da Constituição Federal:
Sociais e Culturais (PIDESC, 1996), o qual foi deliberado pelo Brasil através do
Decreto 591, de 06 de julho de 1992 (FREITAS, 2015). O Art. 11 do PIDESC, tratado
multilateral adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, afirma que também é
direito humano o acesso não só à moradia, mas a uma moradia adequada:
Assim sendo, a moradia não deve ser vista apenas como um local para se
abrigar, mas também como um lugar em que a família possa morar adequadamente
com dignidade. Segundo o Comentário nº 4 do Comitê sobre os Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais, uma moradia adequada pode ser definida de acordo com as
seguintes características (Quadro 1):
O acesso à moradia adequada mostra que além de ter um lugar para morar
que atenda às necessidades básicas da família, também é preciso ter condições para
se permanecer dignamente naquele local. Tal direito abrange estratégias para diminuir
o déficit habitacional quantitativo e qualitativo, focando nos grupos mais vulneráveis e
marginalizados, sem discriminação.
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A garantia desse direito deve partir de várias frentes. “Essas medidas exigem
a intervenção governamental em vários níveis: legislativo, administrativo [...] O
governo torna-se o facilitador das ações de todos os participantes na produção e na
melhoria das habitações” (BRASIL, 2013). O Estado tem o dever e responsabilidade
de desenvolver e colocar em prática políticas públicas habitacionais eficazes, que
atendam às reais necessidades das famílias mais vulneráveis de forma igualitária. Os
municípios, por sua vez, também devem assumir sua parcela de responsabilidade
quanto promover o direito à moradia, assim como o combate à pobreza e à
marginalização. Segundo o Artigo 23º da Constituição Federal, assim como a União,
o Estado e o Distrito Federal, os municípios também precisam estar envolvidos
ativamente nos planos de melhorias habitacionais:
sociais, juntar-se a grupos de mesmo interesse e reivindicar por cidades mais dignas,
com menos desigualdades sociais e cujo direito à moradia seja garantido.
Os profissionais da área da construção civil precisam assumir e exercer suas
funções sociais, mas nada impede que profissionais de outras áreas (geógrafos,
assistentes sociais, psicólogos, geólogos, entre outros) também contribuam com essa
luta. Reivindicar pelos direitos dos mais necessitados, buscar metodologias para
colocar em prática a legislação vigente e contribuir com seus conhecimentos
científicos, precisam ser exercícios a serem colocados em execução. Habitar é um
direito e uma necessidade.
Como ressalta o CAU/SC (2018, p. 28), “a moradia é um vetor de inclusão
social. Assim, é importante que a política habitacional dialogue com outras políticas
públicas, como a de saúde e de assistência social”. A saúde é um dos direitos sociais
também garantidos pela Constituição Federal e possui o Sistema Único de Saúde
(SUS) como estrutura para que esse direito seja assegurado. Por que que a moradia,
que revela em que condições de saúde a família está convivendo, não possui uma
política pública sólida para ser um direito social garantido? “Temos redes de saúde,
justiça e educação públicas para a população de baixa renda, mas quando o assunto
é habitação o direito parece não ter, ainda, a mesma lógica” (CUNHA; ARRUDA;
MEDEIROS, 2007, p. 22). Essa ideologia é a absorvida pela sociedade, a qual age
com conformidade diante da negligência do Estado quanto ao cumprimento do direito
à moradia digna. O arquiteto e urbanista Zezéu Ribeiro confirma que, “o acesso a uma
habitação digna vai reduzir os custos da saúde no Brasil. Uma população mais sadia,
com capacidade maior, com produtividade maior (RIBEIRO, 2007, p. 139 - 144).
Mesmo sendo comprovada por lei como imprescindível ao homem, o direito à
moradia é deixado, por vezes, em segunda instância. As políticas públicas estão
direcionadas, em sua maioria, aos interesses da classe dominante, desfavorecendo a
classe dominada. Nesse contexto, é possível enxergar traços da desigualdade social
no Brasil.
Em meio ao esquecimento do Governo diante das famílias que vivem em
situações de vulnerabilidade social, é a sociedade que se movimenta para colocar em
prática sua própria solução alternativa de moradia.
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ou ocupa o terreno, pensa como vai ser a construção, adquire material, contrata e
fiscaliza mão de obra (remunerada e/ ou gratuita) e edifica a casa durante as folgas
do trabalho (BONDUKI, 1994).
No Brasil, a autoconstrução surgiu em meados do século XIX. Com o processo
de industrialização de São Paulo, a densidade populacional dos centros urbanos
começou a crescer descontroladamente, aumentando o valor das terras urbanas.
Além disso, os operários recebiam salários muito baixos, fazendo com que não
tivessem acesso ao financiamento de casas e nem a compra de terrenos perto dos
centros. Com o valor que recebiam, compravam terrenos localizados nas periferias e
começavam a construir as próprias casas aos fins de semana e feriados, após
trabalharem durante toda a semana por doze horas por dia. Com o passar do tempo,
problemas relacionados a aspectos de higiene começaram a preocupar as
autoridades, que criaram normas legais e padrões de higiene estabelecidos para
residências. Porém, mesmo com tal fiscalização, os trabalhadores continuavam
construído suas casas de forma precária e sem atender às normas exigidas (LEMOS,
1976 apud WATRIN, 2003).
A falta de acesso a terras em lotes legalizados interfere diretamente no produto
final da moradia, pois essa poderá ser construída em encostas, com alta inclinação e
risco de deslizamentos, ou em terrenos sem infraestrutura básica. Em zonas
habitacionais declaradas por lei como de interesse social, tais parcelamento precisam
ter no mínimo: I - vias de circulação; II - escoamento das águas pluviais; III - rede para
o abastecimento de água potável; e IV - soluções para o esgotamento sanitário e para
a energia elétrica domiciliar (BRASIL, 1979). De acordo com o Art. 3º da Lei 6766/79,
não é permitido o parcelamento do solo para fins urbanos em zonas urbanas nas
seguintes situações:
Art. 3º [...]
Parágrafo único - Não será permitido o parcelamento do solo:
I - em terrenos alagadiços e sujeitos a inundações, antes de tomadas as
providências para assegurar o escoamento das águas;
Il - em terrenos que tenham sido aterrados com material nocivo à saúde
pública, sem que sejam previamente saneados;
III - em terrenos com declividade igual ou superior a 30% (trinta por cento),
salvo se atendidas exigências específicas das autoridades competentes;
IV - em terrenos onde as condições geológicas não aconselham a edificação;
V - em áreas de preservação ecológica ou naquelas onde a poluição impeça
condições sanitárias suportáveis, até a sua correção (BRASIL, 1979).
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Watrin (2003) afirma que, com a valorização da terra nos centros urbanos, a
população menos favorecida passou a adquirir terrenos nas periferias das cidades, os
quais possuíam menos infraestrutura e possibilitavam o pagamento do valor em várias
parcelas. Aliado a isso, o morador usou da autoconstrução para também conseguir
economizar com o pagamento de mão de obra e atender às suas necessidades
financeiras, espaciais e estéticas. Balthazar (2012) ainda salienta que:
Ainda sobre os dados qualitativos dessa pesquisa, pôde-se confirmar que dois
dos principais motivos para isso acontecer são: os problemas financeiros e o
desconhecimento de outras alternativas (CAU/BR, 2015). Outro fator que colabora
para o crescimento de casas irregulares e clandestinas são as inconsistências
contidas nos programas governamentais de produção de habitação de interesse
social. Isso ocorre devido a boa parte da população não possuir emprego formal; a
alguns moradores não concordarem com os valores e prazos de financiamento; assim
como, devido às casas concebidas pelo Governo não atenderem a critérios
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“Não fui porque a gente constrói no aperto. [...] Porque na prefeitura é assim,
quanto mais você vai atrás mais ela te cobra, então é melhor ficar quieto. Se
você vai eles vão cobrar planta de engenheiro, arquiteto. [...] Eu trabalho com
engenheiro, eu sei qual é o procedimento que eles vão ter, então eu não quis
comunicar. A maioria de nós, ninguém comunica” Fala do morador ‘I’
(BALTHAZAR, 2012, p. 125-126).
Figura 6 - Plantas baixas dos pavimentos térreo e superior da habitação ‘G’ depois de construída
Balthazar (2012) frisa que, a tese de Turner não está focada na execução do
imóvel em si, no construir pelas próprias mãos, mas na importância de o morador
controlar e participar de todas as etapas da obra. Durante todo o processo, os
moradores além de investirem dinheiro, dedicam responsabilidade, iniciativa, energia
muscular, entre outros recursos. A vantagem de todo esse envolvimento é que no final
tudo se transformam em sentimentos de satisfação, bem-estar, orgulho, competência
e tantos outros que se possa citar. A conquista da casa própria por meio da iniciativa
pessoal e da participação do usuário proporciona autonomia para tomada de
decisões, maior sentimento de pertencimento pelo imóvel, possibilidade de ampliação
ao longo dos anos, não endividamento a longo prazo, evita gastos com aluguel, entre
outros ganhos. Maricato (1979) afirma que o envolvimento do usuário é muito
importante para a apropriação do espaço, seja definindo as características da casa,
autoconstruindo, vistoriando a obra ou ocupando com seus mobiliários. Em sua
pesquisa, Balthazar (2012) ainda destaca a fala do morador ‘F’ sobre o processo
participativo, a qual diz: “Eu sempre tive esse espírito de João de Barro, sempre quis
construir minha própria casa, nunca tive a alternativa de financiar ou comprar uma
casa pronta. Eu acho que deixa mais com a minha cara”. Cordeiro (2005)
complementa afirmando que:
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6Estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas como a ausência de doença ou
enfermidade (OMS,1946).
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DESORDENS
PRINCIPAL FATOR ENFERMIDADES ENFERMIDADES NÃO
PSICOSOCIAI
DE RISCO TRANSMISSÍVEIS TRANSMISSÍVEIS
S
- Devido a insetos vetores;
- Devido a roedores; - Neurose;
- Geomintíase (verminose); - Violência;
- Induzidas por pó e
Defeitos na - Devido a excreções de - Delinquência
umidade;
construção da animais; e vandalismo;
- Feridas;
moradia - Devido a mordidas de - Abuso de
- Queimaduras.
animais; álcool e
- Relacionadas à drogas.
superiotação.
- Doenças hídricas fecais
Deficiências no orais;
- Doenças cardíacas;
abastecimento de - Doenças não fecais orais;
- Câncer.
água - Doenças relacionadas a
água e insetos vetores.
- Doenças perinatais;
- Doenças cardíacas;
Combustíveis
- Doenças crônicas do
inadequados e - Infecções respiratórias
pulmão;
ventilação agudas.
- Câncer de pulmão;
insuficiente
- Queimaduras devido a
incêndios.
Disposição e coleta
- Devido a insetos vetores; - Feridas;
deficiente de
- Devido a roedores. - Queimaduras.
resíduos sólidos
Preparação
- Doenças relacionadas a
deficiente de
excreções;
alimentos e
- Zoonoses;
armazenamento - Câncer.
- Doenças relacionadas a
inadequado dos
toxinas microbiológicas.
mesmos
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7 Bronquite é uma inflamação dos brônquios, canais que conduzem o ar inalado até os alvéolos
pulmonares. Ela se instala quando os minúsculos cílios que revestem o interior dos brônquios param
de eliminar o muco presente nas vias respiratórias. Esse acúmulo de secreção faz com que eles fiquem
permanentemente inflamados e contraídos, provocando, principalmente, tosse. A bronquite pode ser
aguda ou crônica. A bronquite aguda é causada geralmente por vírus, embora, em alguns casos, possa
ser resultado de uma infecção bacteriana. As crises também podem ser desencadeadas pelo contato
com poluentes ambientais e químicos (poeira, inseticidas, tintas, ácaros etc.) (DRAUZIO, s. d.).
8 Meningite é uma infecção que se instala principalmente quando uma bactéria ou vírus, por alguma
razão, consegue vencer as defesas do organismo e ataca as meninges, três membranas que envolvem
e protegem o encéfalo, a medula espinhal e outras partes do sistema nervoso central (DRAUZIO, s.
d.).
46
Figura 9 - Parede com infiltração e mofo Figura 10 - Laje com infiltração devido à má
impermeabilização
Além de doenças físicas, Pasternak (2016) cita que doenças mentais também
podem ser desencadeadas devido a problemas na habitação, como: ambientes sem
privacidade, desconforto estético, espaços apertados para descanso, presença de
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ruídos, entre outros. Em uma de suas falas em uma live organizada pelo CAU/BR, a
influenciadora Verônica Oliveira que morava em um cortiço, em São Paulo, de um
cômodo (com cozinha, banheiro e lavanderia compartilhados com mais 40 famílias)
pagando R$ 500 reais de aluguel (mais de 50% da sua renda mensal), relata:
O meu corpo decidiu que aquilo não era viável e eu comecei a ficar muito
doente, então eu tinha crises de choro, eu tinha ataques de pânico na rua e
tudo por conta da casa onde eu morava. Então, eu cheguei, em 2016, a tentar
suicídio por conta dessa situação e por que pensava: eu tenho dois filhos e
eles não merecem passar por isso e aí eu achava que a culpa era minha e
que se eu não estivesse mais aqui, eles teriam uma chance melhor. [...].
Todos nós mudamos de pessoas, depois de mudar de casa (CAU/BR,
2021b).
Figura 13 - Linha do tempo dos marcos históricos relacionados à assistência técnica em habitação de
interesse social (ATHIS)
1946
• Fundação Casa Popular (FCP)
1964
• Banco Nacional de Habitação (BNH)
1976
• Programa de Assistência Técnica à Moradia Econômica (ATME) no Rio Grande do
Sul (RS)
-
• Escritório Modelo de Arquitetura e Urbanismo (EMAU)
1999
• Lei Complementar Municipal nº 428/RS
2000
• Direito Social à Moradia (Constituição Federal)
• Projeto Moradia
2001
• Estatuto da Cidade
• Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social (PSH)
2002
• Projeto de Lei nº 6223
2003
• Projeto de Lei nº 889
• Ministério das Cidades
2004
• ConCidades
• Política Nacional de Habitação
• Programa Crédito Solidário
2005
• Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS) e Fundo Nacional de
Habitação de Interesse Social (FNHIS)
• Fórum Social Mundial
• I Seminário Nacional de Assistência Técnica
2006
• Projeto de Lei 6.981
• II Seminário Nacional de Assistência Técnica
-
• Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)
2008
• Plano Nacional de Habitação (PlanHab)
• Lei 11.888
2009
• Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV)
2020
• Programa Casa Verde e Amarela
9 Como déficit habitacional entende-se a noção mais imediata e intuitiva da necessidade de construção
de novas moradias para a solução de problemas sociais e específicos de habitação, detectados em
certo momento. [...]O conceito de déficit habitacional utilizado está ligado diretamente às deficiências
do estoque de moradias. Engloba aquelas sem condições de serem habitadas em razão da
precariedade das construções ou do desgaste da estrutura física e que por isso devem ser repostas.
Inclui ainda a necessidade de incremento do estoque, em função da coabitação familiar forçada
(famílias que pretendem constituir um domicilio unifamiliar), dos moradores de baixa renda com
dificuldades de pagar aluguel nas áreas urbanas e dos que vivem em casas e apartamentos alugados
com grande densidade. Inclui-se ainda nessa rubrica a moradia em imóveis e locais com fins não
residenciais (FJP, 2018, p. 18-20). Pode ser classificado como quantitativo, como citado, ou qualitativo,
quando se trata de moradias com algum tipo de inadequação.
51
equipes técnicas. Essa iniciativa fez com que outros estados também se motivassem
pela causa e conseguissem prestar assistência técnica já com financiamento público
(IAB, 2010). Aos poucos foram surgindo outras leis municipais voltadas à assistência
técnica para projeto e execução de moradias, como a Lei Orgânica do município de
Porto Alegre que em seu Art. 233 diz que “a execução de programas habitacionais
será de responsabilidade do Município, que: [...]; IV - instituíra programa de
assistência técnica gratuita no projeto e construção de moradias para famílias de baixa
renda” (PORTO ALEGRE, 1990).
Sem tardar, também foi o momento das universidades se expressarem
referente ao tema, dando início a projetos de extensão e incluindo nas grades
curriculares – ainda de forma bem simplória - matérias voltadas ao direito à habitação
e à cidade. No fim dos anos 90, a Federação Nacional dos Estudantes de Arquitetura
e Urbanismo do Brasil (FENEA) criou o Escritório Modelo de Arquitetura e Urbanismo
(EMAU), a fim de que a universidade pudesse se estender às comunidades mais
carentes (IAB, 2010). Segundo Cunha, Arruda e Medeiros (2007, p.27), nos escritórios
modelos “os acadêmicos do último ano de arquitetura têm a oportunidade de
desenvolver projetos arquitetônicos, orientados por profissionais, para a população de
baixa renda, como um arquiteto-residente”.
Em 1999, o arquiteto Clóvis Ilgenfritz – enquanto vereador da cidade de Porto
Alegre - aprova a Lei Complementar Municipal nº 428, que regulamenta o Art. 233,
inciso IV, da lei orgânica do município, “instituindo o programa de assistência técnica
ao projeto e construção de moradia econômica a pessoas de baixa renda, e dá outras
providências” (PORTO ALEGRE, 1999). Para Cunha, Arruda e Medeiros (2007):
Em 2000, como visto na seção 2.1, a moradia passou a ser considerada pela
Constituição Federal da República como um direito social, assim como saúde,
educação e outros já declarados. Ainda nesse ano, foi originado o Projeto Moradia
através do Instituto Cidadania, o qual tinha Luiz Inácio Lula da Silva como conselheiro.
53
Também nesse ano, foi criado o Ministério das Cidades pelo governo Lula, que
unificou as diferentes frentes políticas que tratavam de desenvolvimento urbano. Com
a Secretaria Nacional de Habitação do Ministério das Cidades, houve um aumento da
produção habitacional para a classe média e do crédito disponibilizado; uma melhoria
na renda populacional e uma maior participação do terceiro setor no processo de
produção de moradias (BRASIL, 2010).
No ano de 2004, criou-se o Conselho das Cidades (ConCidades), órgão
constituinte do Ministério das Cidades o qual tinha por objetivo regulamentar a Política
Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNDU) e fomentar debates relacionados à
política urbana. Também foi criada a nova Política Nacional de Habitação, com o
objetivo de “retomar o processo de planejamento do setor habitacional e garantir
novas condições institucionais para promover o acesso à moradia digna a todos os
segmentos da população” (BRASIL, 2004).
Ainda em 2004, surgiu o Programa Crédito Solidário. Foi criado para possibilitar
o financiamento habitacional para construção ou reforma, a famílias com renda bruta
mensal entre R$ 1.125,01 e R$ 1.900,00, que estivessem vinculadas a associações,
cooperativas, sindicatos ou entidade privada sem fins lucrativos, utilizando o Fundo
de Desenvolvimento Social (FDS) (BRASIL, 2010).
Em junho de 2005, é aprovada a Lei n° 11.124 que “dispõe sobre o Sistema
Nacional de Habitação de Interesse Social – SNHIS, cria o Fundo Nacional de
Habitação de Interesse Social – FNHIS e institui o Conselho Gestor do FNHIS”
(BRASIL, 2005), garantindo recursos à habitação e assistência técnica. O SNHIS
unificou todos os programas voltados à habitação de interesse social, tendo também
outros objetivos, conforme o Art. 2º da lei citada:
Art. 1º Esta Lei assegura o direito das famílias de baixa renda à assistência
técnica pública e gratuita para o projeto e a construção de habitação de
interesse social, como parte integrante do direito social à moradia previsto
pelo art. 6º da Constituição Federal, e consoante o especificado pelo art. 4º,
inciso V, alínea “r”, da Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, que “regulamenta
os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da
política urbana e dá outras providências”.
Art. 2º As famílias com renda mensal de até 3 (três) salários mínimos,
residentes em áreas urbanas ou rurais, têm o direito à assistência técnica
pública e gratuita para o projeto e a construção de habitação de interesse
social para sua própria moradia.
§ 1º O direito à assistência técnica previsto no caput abrange todos os
trabalhos de projeto, acompanhamento e execução da obra a cargo dos
profissionais das áreas de arquitetura, urbanismo e engenharia necessários
para a edificação, reforma, ampliação ou regularização fundiária da
habitação.
[...] (RIBEIRO, 2006).
[...] quando fui deputado federal, [...] junto com alguns colegas, formulamos e
registramos um projeto nesse sentido na Câmara Federal. Quando o colega
reassumiu o mandato, para sorte nossa – e isso eu faço questão de frisar -,
o arquiteto Zezéu Ribeiro, eleito pela Bahia, assumiu o nosso projeto. Durante
59
A Lei assegura o direito à AT gratuita a famílias com renda mensal de até três
salários mínimos, abrangendo “projeto, acompanhamento e execução da obra a cargo
dos profissionais das áreas de arquitetura, urbanismo e engenharia necessários para
a edificação, reforma, ampliação ou regularização fundiária da habitação” (BRASIL,
2008), conforme seu Art. 2º. Assim, busca atender desde aqueles que não possuem
um domicílio particular permanente 10 , até aos que possuam uma residência em
situação de vulnerabilidade e que precise de melhorias habitacionais, “visando reduzir
o déficit quantitativo (especialmente à coabitação) e o déficit qualitativo (adensamento
excessivo habitacional, condições de precariedade sanitária, ambiental etc.)” (IAB,
2010).
Outro ponto a ser destacado na Lei é que, conforme citado acima, a AT antes
mesmo de abranger o projeto ou a construção da obra, pode abranger a regularização
fundiária 11. Assim, efetiva o direito à moradia através da legalização da posse do
imóvel. A Lei de ATHIS é uma porta para tornar a arquitetura acessível a todos.
É claro que, há todo um processo cultural que precisa ser reestabelecido tanto
por parte da população – que precisa reconhecer a importância do trabalho do
arquiteto – como por parte do próprio profissional – que geralmente não foi preparado
durante a faculdade para lidar com o contexto de famílias de baixa renda. Na
10 Domicilio Particular Permanente: é um espaço próprio para servir de moradia. São domicílios
compostos por pelo menos um cômodo que constituem moradias permanentes ou duradouras. O local
em si não é uma adaptação de moradia, embora possa ter adaptações internas ou demonstrar
precariedade. Ou seja, também pode expressar vulnerabilidade, porém usualmente menor que no caso
do domicílio improvisado. Normalmente, tem acesso a serviços básicos de abastecimento de água,
energia elétrica, saneamento ou coleta de lixo (BRASIL, 2011).
11 Regularização fundiária é o processo de intervenção pública, sob os aspectos jurídico, físico e social,
Art. 2º [...]
§ 2o Além de assegurar o direito à moradia, a assistência técnica de que trata
este artigo objetiva:
I - otimizar e qualificar o uso e o aproveitamento racional do espaço edificado
e de seu entorno, bem como dos recursos humanos, técnicos e econômicos
empregados no projeto e na construção da habitação;
II - formalizar o processo de edificação, reforma ou ampliação da habitação
perante o poder público municipal e outros órgãos públicos;
III - evitar a ocupação de áreas de risco e de interesse ambiental;
IV - propiciar e qualificar a ocupação do sítio urbano em consonância com a
legislação urbanística e ambiental (BRASIL, 2008).
Art. 3º [...]
§ 1º A assistência técnica pode ser oferecida diretamente às famílias ou a
cooperativas, associações de moradores ou outros grupos organizados que
as representem.
§ 2º Os serviços de assistência técnica devem priorizar as iniciativas a serem
implantadas:
I - sob regime de mutirão;
II - em zonas habitacionais declaradas por lei como de interesse social
(BRASIL, 2008).
Logo, a prática da assistência técnica apresenta-se como uns dos meios mais
eficazes para o arquiteto e urbanista exercer sua função social. Com ela é possível
trabalhar por cidades mais justas e igualitárias, que atendam às reais necessidades
de seus habitantes. Mostra-se, assim, como uma excelente oportunidade de atuação
profissional, a qual possibilita uma aproximação maior entre o arquiteto e a população
carente. O mercado de AT é promissor, basta que a população seja conscientizada
dos seus direitos para que lute por eles, que os municípios tenham diligência para
cumprir com suas obrigações e que os recursos sejam devidamente repassados. O
IAB (2010) salienta que é um trabalho interdisciplinar que além de envolver arquitetos,
62
O IAB (2010) ainda enfatiza que, “ao promover uma relação direta entre o
profissional e o usuário final, tende a criar condições muito mais férteis para que sejam
atendidas as necessidades reais e suas intenções estéticas em relação à sua
moradia”. O processo participativo do morador durante a construção da sua casa
possibilita que o programa de necessidades seja criado com mais assertividade, assim
como a família irá possuir um maior sentimento de pertencimento pelo lar.
Ao ser aprovada, a Lei 11.888 alterou o Art. 11 da Lei no 11.124 – a qual
direcionou os recursos do FNHIS - acrescentando o seguinte parágrafo:
“Art. 11 (...)
§ 3º Na forma definida pelo Conselho Gestor, será assegurado que os
programas de habitação de interesse social beneficiados com recursos do
FNHIS envolvam a assistência técnica gratuita nas áreas de arquitetura,
urbanismo e engenharia, respeitadas as disponibilidades orçamentárias e
financeiras do FNHIS fixadas em cada exercício financeiro para a finalidade
a que se refere este parágrafo.” (BRASIL, 2008).
Brasil (2010) ainda complementa que o PMCMV também teve uma vertente
chamada de PMCMV Entidades, a qual era responsável pelos financiamentos a
famílias de baixa renda organizadas em cooperativas habitacionais, associações e
demais entidades privadas sem fins lucrativos. Nessa modalidade, que representou
0,5% do recurso total do PMCMV, ainda não ocorria a produção de melhorias
habitacionais, mas as construções das moradias já eram mais humanizadas.
Segundo Antunes (2019 apud PORANGABA, 2020), o PMCMV permaneceu
produzindo habitações de forma crescente até o ano de 2013, a partir daí a produção
65
Figura 15 - Planta de cobertura, planta baixa do pavimento térreo e planta do segundo pavimento
com ampliação do Projeto 2D +1D
Figura 16 - Capa do ‘Manual para Implantação da Assistência Técnica Pública e Gratuita a Famílias
de Baixa Renda para Projeto e Construção de Habitação de Interesse Social’
O manual propõe diretrizes para que a Lei 11.888/08 seja posta em prática,
assim como apresenta uma proposta de funcionamento (Figura 17) para a estrutura
de um projeto de ATHIS, contendo a relação entre todos os agentes responsáveis,
conforme pode ser visto abaixo:
PROPOSTA DE FUNCIONAMENTO
1º passo
A. O Município – Prefeitura Municipal – encaminha proposta ao Ministério das
Cidades e estabelece com esse um convênio ou termo de parceria para o
repasse de recursos federais para a Assistência Técnica (art. 3º). O agente
financeiro opera os recursos diretamente com o município e os usuários.
B. O Município, através de seus órgãos colegiados, como o Conselho
Municipal de Habitação, elabora um cadastro das famílias (com renda de até
3 SM) aptas a acederem à Assistência Técnica (art. 3º).
2º passo
C. As entidades profissionais firmam convênio ou termo de parceria com o
Município e com o agente financeiro para atuarem na seleção e contratação
de profissionais e para receberem recursos para a gestão da Assistência
Técnica. (art. 4º)
D. A entidade elabora cadastro de profissionais interessados em realizar os
serviços de Assistência Técnica previstos na Lei (art. 4º).
3º passo
E. A família selecionada vai até a entidade profissional e solicita um
profissional.
F. A entidade indica um profissional cadastrado.
G. O contrato é firmado entre as partes – família e profissional – e comunicado
aos demais agentes.
H. O profissional presta a primeira parte da assistência técnica: elabora o
projeto.
I. O conselho profissional – CREA ou CAU – fiscaliza o exercício profissional.
4º passo
70
própria sociedade a continuarem lutando pelo direito à ATHIS, para que se torne uma
Política de Estado permanente (CAU/SC, 2018).
12 Soluções Urbanas é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, composta por uma
equipe interdisciplinar (arquitetos, engenheiros, assistentes sociais, psicólogos, entre outros).
13 Disponível em: < https://www.facebook.com/solucoesurbanas>. Acesso em: 04 de julho de 2021.
75
14
Fala de Mariana Estevão no Minicurso Virtual de ATHIS para Melhorias Habitacionais em favelas:
melhorias habitacionais na prática, Soluções Urbanas, 2020.
76
se pretende fazer e possam opinar sobre os assuntos expostos, a fim de que haja
uma troca de saberes mútua (informação verbal)15.
15
Fala de Mariana Estevão no Minicurso Virtual de ATHIS para Melhorias Habitacionais em favelas:
melhorias habitacionais na prática, Soluções Urbanas, 2020.
78
16
Fala de Mariana Estevão no Minicurso Virtual de ATHIS para Melhorias Habitacionais em favelas:
melhorias habitacionais na prática, Soluções Urbanas, 2020.
79
Por mais que demore muito mais tempo para executar as intervenções de forma
separada, são muitos benefícios envolvidos. Como também, o perfil social das famílias
em vulnerabilidade social é muito volátil, um projeto feito hoje pode não servir da
mesma maneira daqui a uns anos. Assim, dividindo o projeto em etapas (intervenções
pontuais), só após acabar a construção e concluir o pagamento de todo o orçamento
de uma delas é que se pode avançar para começar outra. Contudo, caso necessário,
os projetos das intervenções podem ser reajustados ao longo do tempo. Uma janela
a ser colocada para circulação do ar, um revestimento no banheiro, uma
impermeabilização na parede para diminuir o mofo, são exemplos de pequenas
mudanças bastante significativas para o bem-estar da família. Aqui, vale destacar que
as alterações propostas pelas ações de ATHIS dão prioridade maior à funcionalidade
do que à estética.
Ao longo dos anos de experiência, catalogou-se as intervenções mais
recorrentes a fim de identificar mais rapidamente quais seriam as melhorias que
podiam ser realizadas para resolver ou amenizar o problema (Figura 26). Esse
80
17
Fala de Mariana Estevão no Minicurso Virtual de ATHIS para Melhorias Habitacionais em favelas:
melhorias habitacionais na prática, Soluções Urbanas, 2020.
81
Figura 32 - Reforma completa com recursos de subsídio e mão de obra contratada pela ONG
Figura 33 - Reforma de banheiro com recursos da Feira de Troca Solidária com mão de obra do
autoconstrutor
Figura 34 - Reforma de banheiro com recursos de subsídio e mão de obra por empreitada
comparada com a externa. Nessa obra (Figura 38), elevou-se o pé direito para fazer
um ático ventilado, fez-se um novo telhado com telha termoeficiente, alocou-se novas
janelas para ventilação cruzada, criou-se mais um quarto e assentou-se revestimentos
onde necessário (SOLUÇÕES URBANAS, 2020).
Em reformas como essa, que engloba toda a casa, o custo médio das obras é
de R$ 35 mil reais (fora os custos com ATHIS). Já em intervenções pontuais, como o
banheiro da Figura 39, o custo médio das obras é entre R$ 5 mil a R$ 10 mil reais
(fora os custos com a assessoria técnica). Na obra do banheiro abaixo, houve a
mudança do layout do ambiente, dos revestimentos, dos equipamentos sanitárias e a
inclusão de uma porta (substituído a cortina que fechava o banheiro e proporcionando
mais privacidade à família).
Se a gente for analisar bem, hoje, o nosso principal concorrente nos territórios
de favela é o pedreiro, né? Então, é o pedreiro que vai dar a palavra final, em
geral, [...]. Porque o pedreiro, certamente na ideia que a família traz, dá a
informação mais prática e barata, aquela que realmente vai servir para aquela
família. O quê que em geral as famílias entendem de um trabalho de um
arquiteto? Em geral, é que o trabalho de um arquiteto é direcionado às
classes mais ricas, que ele tem como foco a estética e então, a família
entende que o que o arquiteto tem a oferecer é muito pouco ou quase nada”
(informação verbal)20.
20
Fala de Mariana Estevão no Minicurso Virtual de ATHIS para Melhorias Habitacionais em favelas:
melhorias habitacionais na prática, Soluções Urbanas, 2020.
91
A equipe elaborou quatro opções de casa padrão para atender a vários perfis
sociais e socioeconômicos, se adequando a cada história familiar. A casa padrão
opção 1 (Figuras 44 e 45) possui 41m², pode abrigar até 8 pessoas e custa quase R$
48 mil reais (Figura 46). A casa padrão opção 2 também possui essas mesmas
características, a diferença está no layout da planta. A casa padrão opção 3 possui
31,8m², pode abrigar até 6 pessoas e custa quase R$ 43 mil reais. Já a casa padrão
94
opção 4 possui 23m² com apenas um dormitório, podendo abrigar até 4 pessoas e
custa quase R$ 36 mil reais.
Figura 50 - Cozinha da casa antiga do Sr. Figura 51 - Fachada posterior da casa antiga do
Nelson. Sr. Nelson.
Ela foi construída com módulos da casa padrão opção 1, adaptada ao terreno
e às condições climáticas, com uma fachada simples (Figura 53), corredor lateral
(Figura 54), cozinha (Figura 55), banheiro, área de serviço (Figura 56), living (Figuras
57 e 58), dormitório do casal (Figuras 59 e 60) e dormitório das filhas e neta (Figura
61 e 62).
98
99
Figura 52 - Fachada da casa do Sr. Nelson Figura 54 - Acesso principal a casa do Sr. Nelson
Figura 53 - Cozinha da casa do Sr. Nelson Figura 55 - Área de serviço da casa do Sr. Nelson
Figura 56 - Living da casa do Sr. Nelson Figura 57 - Living da casa do Sr. Nelson
Figura 58 - Dormitório de casal da casa do Sr. Figura 59 - Dormitório de casal da casa do Sr.
Nelson Nelson
Figura 60 - Dormitório das filhas e neta da casa Figura 61 -Dormitório das filhas e neta da casa do
do Sr. Nelson Sr. Nelson
Para ter acesso aos serviços, é necessário que as pessoas procurem os Postos
de Atendimento, distribuídos pelo Distrito. Até 2018, existiam 12 Postos conforme
pode ser visto na Figura 65.
Figura 71 - Kit Cozinha - antes da reforma Figura 72 - Kit Cozinha - reforma entregue
Figura 73 - Kit Lazer - durante a reforma Figura 74 - Kit Lazer - reforma entregue
O Programa Vida Nova nas Grotas (Figura 76) foi criado pelo Governo de
Alagoas em 2016, para atender a famílias que moram em assentamentos precários
nas grotas de Maceió (Figura 77). As grotas são fundos de vales “ocupados pela
população de baixa renda que vive em precárias condições de habitabilidade, com
acesso insuficiente ou inexistente ao saneamento básico e suscetível aos riscos de
deslizamentos e inundações” (CAU/BR, 2021c).
Logo quando foi criado o projeto tinha o nome de “Pequenas obras, grandes
mudanças”. Atualmente, conta com participação do CAU/AL e do Programa das
112
22Agência da ONU que trabalha com todos os temas relacionados à vida na cidade e ao
desenvolvimento urbano sustentável. É uma agência de cooperação técnica, trabalha na produção de
dados e informações e busca apoiar o Governo do Estado em suas políticas públicas (ZACARIAS,
2021).
113
divulgação dos benefícios que a arquitetura pode trazer à qualidade de vida das
pessoas e à organização das cidades” (BURIGO, 2015). Porém, Mariana Estevão
enfatiza que apenas garantir o direito à assistência técnica de profissionais não é o
bastante, como pode ser visto em uma de suas falas em uma live organizada pelo
CAU/BR sobre o tema Moradia Digna:
Quadro 6 - Diretrizes propostas pela NBR 15220-3 (Zona 8) e pelas metodologias de Givoni e
Mahoney Nebuloso para Arapiraca
Tal documento traz orientações que devem ser seguidas por todos os projetos
de obras e instalações. Entre os conceitos que a Lei aborda, está o de construção,
que é definido como uma “obra de edificação nova, autônoma, sem vínculo funcional
com outras edificações porventura existentes no lote” (ARAPIRACA, 2011). Em
relação à construção de habitações de interesse social, seus artigos 4º e 5º falam que:
Art. 50 – O uso misto residencial/ comercial ou residencial/ serviços será permitido somente
quando a natureza das atividades comerciais ou de serviços não venha a prejudicar a
segurança, o conforto e o bem-estar dos moradores. Os acessos necessitam ser
independentes e a partir do logradouro público.
Art. 77 – Deve ser assegurado nível de iluminação e qualidade acústica suficientes, nos
compartimentos.
125
Art 78 – Sempre que possível, a renovação de ar deverá ser garantida através do “efeito
chaminé” ou através da adoção da ventilação cruzada nos compartimentos, a fim de se
evitar zonas mortas de ar confinado (Anexo IV – Figura 2).
Art. 83 – Não poderá haver aberturas para iluminação e ventilação em paredes levantadas
sobre a divisa do terreno ou a menos de 1,50m de distância da mesma, salvo no caso de
testada de lote.
XIII – promover a regularização fundiária nas Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS)
e urbanização das áreas ocupadas por população de baixa renda, considerando aspectos
ambientais;
XIV – estabelecer diretrizes para políticas setoriais em:
a) Meio ambiente;
b) Regularização fundiária;
c) Habitação;
d) Saneamento básico;
e) Mobilidade e acessibilidade;
f) Desenvolvimento rural;
g) Desenvolvimento regional.
regional. ” (ARAPIRACA, 2004). Quanto aos seus objetivos específicos, estão citados
no Quadro 10.
LOCALIDADES
A1 Planalto / Quati
A4 Manoel Teles
A7 Zélia Barbosa
Entorno do riacho Piauí a 15 m de cada lado do eixo do seu curso e nos locais
A8 onde há terrenos vazios 30m para cada lado do seu eixo, conforme legislação
federal, CONAMA.
LOCALIDADES
LOCALIDADES
C1 Cavaco
C2 Baixa Grande
C4 Baixão
C5 Planalto
130
C6 Brasiliana
C7 Brasiliana
C8 Stª Edwirgens
habitam em moradias de interesse social. Porém, para que esses objetivos sejam
alcançados é preciso haver mobilização e iniciativa da gestão que atua sobre a cidade.
Arapiraca não possui setor específico para os assuntos inerentes a habitações
de interesse social, muito menos para ações de ATHIS. A Secretaria de
Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente, que tem por secretária a professora,
cedida pela UFAL, Simone Romão, é que elabora projetos voltados para a área. Um
dos programas relacionados à secretaria é o Viver Melhor, cujo objetivo é “adotar
políticas públicas efetivas para a construção de escolas, creches, unidades básicas
de saúde, obras de infraestrutura urbana, pavimentação, moradias, entre outras
intervenções, para melhorar a qualidade de vida dos arapiraquenses”23.
Atualmente, segundo informações dadas pela secretária no Seminário “Vida
bem pensada: o papel da Arquitetura e Urbanismo no desenvolvimento de pequenos
e médios municípios de Alagoas”, organizado pelo CAU/AL, estão sendo
desenvolvidas ações de regularização fundiária no Bairro Bom Sucesso (CAU/AL,
2021).
Conforme Santos (2017), o bairro está localizado no limite Sul da zona urbana
e possui cerca 6.637 habitantes, segundo o último censo do IBGE, e é um dos mais
antigos e de maior extensão da cidade. As famílias são atendidas pelo Centro de
Referência de Assistência Social (CRAS) Canafístula e pela Unidade Básica de Saúde
(UBS) – Canafístula.
A Comunidade Frei Damião está localizada na Av. Miguel Guimarães Silva,
entre a AL-115 e a R. Antônio Firmino. Está entre dois residenciais, de um lado casas
do Programa Minha Casa Minha Vida, de outro o Residencial Canafístula (Figura 85).
Como citado anteriormente, é considerada uma ZEIS, denominada de ZEIS A6, desde
que é uma área destinada à regularização fundiária. A comunidade Frei Damião foi
escolhida como estudo de caso pelo fato de que a Professora Simone Romão, que
orientava inicialmente este trabalho, já possuia comunicação com a presidente da
associação de moradores de lá, facilitando as visitas ao local e a troca de informações.
A escolha do objeto de estudo, a Comunidade Frei Damião, ocorreu devido a
essa ser composta, em sua maioria por casas autoconstruídas, assim como pelo fato
de que a professora Simone Romão, que já foi orientadora deste estudo, tinha contato
com a líder da Associação Comunitária do local, Dona C.M.C., o que facilitou a entrada
na Comunidade e o desenvolvimento do trabalho. O levantamento de campo foi feito
a partir de registros fotográficos de algumas ruas da Comunidade, a fim de observar
aspectos gerais do cotidiano dos moradores e da infraestrutura do lugar.
133
é onde o caminhão de lixo passa com os garis, isso faz com que animais rasguem as
sacolas e sujem as ruas (Figura 88), além de que alguns moradores aproveitam para
jogar entulhos que o caminhão do lixo não coleta, poluindo ainda mais a avenida
(Figura 89). O direcionamento das águas escuras, vindas dos vasos sanitários, vai
para fossas comunitárias, não há saneamento para as águas dos chuveiros e pias,
nem drenagem nas ruas, o que faz com que a água que sai das casas fique exposta
na rua (Figura 90), ou com que a água da chuva empoce ou cause erosões (Figura
91). As calçadas de algumas ruas são irregulares e também possuem objetos
obstruindo a passagem (Figuras 92 e 93). Na figura 94, pode-se observar a localização
dos principais problemas de infraestrutura dentro da comunidade.
Figura 87 - Lixo com comida espalhado na rua Figura 88 - Entulhos espalhados pela rua.
R$ 50 reais para ajudar na alimentação, mas na maior parte do mês ela sobrevive de
doações de conhecidos, amigos e familiares para sustentar os filhos. Os gastos
mensais da família por mês são com botijão de gás, energia e alimentação, os quais
são pagos com ajuda de familiares sempre que possível, ou ficam pendentes até surgir
algum recurso. Assim, pode-se afirmar que sua família vive em situação de extrema
vulnerabilidade.
No mesmo dia em que se realizou a entrevista com a família também foi feito o
levantamento de dados da casa, registrando todas larguras e comprimentos dos
cômodos, assim como pé direito, níveis, medidas de portas e janelas, posição da casa
em relação ao Norte, entre outras informações importantes. Foram tiradas fotos de
todos os ambientes. Esse foi feito com o auxílio de uma trena à laser, uma trena
manual de 8 metros, uma prancheta A4, folhas de ofício e uma caneta.
A casa em que a família mora é quitada, comprada quando seu ex-marido ainda
trabalhava no Clube do Sesi, porém possui apenas o documento de compra e venda.
A partir da planta de layout (Figura 96), pode-se observar a disposição dos ambientes
dentro terreno, a distribuição dos móveis e a posição em que foram tiradas as fotos
no levantamento (Figuras 97 a 123), as quais serão mostradas a seguir.
140
Como pôde ser visto na Figura 96, a cada possui oito cômodos. Possui um
muro externo e um poço artesiano na frente da casa (Figura 98). Seus ambientes
internos são: varanda (Figuras 97, 98 e 99), sala de estar (Figuras 100, 101 e 102),
sala de jantar (Figuras 103 e 104), quarto 1 (Figuras 105, 106 e 107), quarto 2 (Figuras
108, 109 e 110), cozinha (Figuras 111, 112 e 113) e banheiro (Figuras 114, 115 e
116). Na área externa, existe um espaço coberto, nos fundos da casa, onde fica o
tanque de lavar roupa, e também serve de despensa, e no corredor lateral há um
tanque de cimento usado como pia para lavar louça e também como apoio para lavar
roupa (Figuras 117, 118 e 119).
Figura 99 - Localização da Figura 100 - Sala de estar da Figura 101 - Sala de estar da casa
sala de estar casa da Dona C.M.C. da Dona C.M.C.
Figura 110 - Localização da Figura 111 - Cozinha da Figura 112 - Cozinha da casa da
cozinha casa da Dona C.M.C. Dona C.M.C.
Figura 113 - Localização do Figura 114 - Banheiro da Figura 115 - Banheiro da casa da
banheiro casa da Dona C.M.C. Dona C.M.C.
pontos de luz, no centro da casa (Figura 122) e outro entre o quarto 1 e a sala de estar
(Figura 123).
Figura 121 - Ponto de luz no centro da casa da Figura 122 - Ponto de luz entre o quarto 1 e a
Dona C.M.C. sala de estar
Dona C.M.C., ao ser questionada sobre o seu grau de satisfação por sua casa,
considerou-a pequena e entre suas metas de reforma, estão: aumentar a sala, cozinha
e banheiro; criar mais um quarto, consertar o telhado e colocar cerâmica no piso de
todos os ambientes. Outro anseio da líder comunitária é construir uma sede
temporária para a associação de moradores da própria comunidade, a qual é
presidente, no corredor lateral da sua casa. O local precisaria ter um espaço para
atender aos moradores e uma cozinha com pia, fogão de duas bocas e espaço para
freezer.
146
6.1 O PROJETO
A casa da Dona C.W.C e de sua família (Figura 124) possui muitas melhorias
habitacionais a serem feitas. Os cômodos são pequenos e não foram posicionados
pensando no conforto ambiental da casa. Para receber os ventos que vem do Sudeste
existem apenas duas aberturas, que são a porta da cozinha e o cobogó do banheiro,
a outra janela fica para o Oeste, isso faz com que haja pouca ventilação dentro da
residência, deixando-a quente. Com a presença de poucas esquadrias, também há
pouca iluminação natural entrando nos ambientes, propiciando o acúmulo de
umidade. Um dos quartos está posicionado para o poente, recebendo todo o sol da
tarde e ficando muito quente à noite.
O telhado, como já comentado, é o ponto mais crítico devido ao apodrecimento
das linhas que sustentam-o, podendo a qualquer momento desabar. O banheiro é
insalubre, desde que não possui revestimentos nem no piso, nem nas paredes, para
evitar infiltrações, além de não possuir água encanada. Toda a casa não possui
instalações hidráulicas, fazendo que o manejo da água ocorra com baldes que vão
direto ao poço. Isso faz com que haja a possibilidade de contaminação da água, que
é a mesma que a família utiliza para beber e cozinhar alimentos. Quanto à eletricidade
da casa, ocorre por meio de uma extensão que vem da casa da vizinha, havendo a
probabilidade de acontecer um curto-circuito.
Em relação ao estado das esquadrias existentes (Quadro 12), a porta da frente
da casa (P1) está com muito ferrugem e com alguns vidros faltando; as portas do
banheiro (P2) e da cozinha (P3) são de ripas de madeira, além de não serem seguras
ainda não possuem uma altura adequada. Assim, as únicas que serão aproveitadas
no projeto serão o portão do muro (P4) que está em bom estado, e a janela do quarto
(J1) que precisa apenas ser pintada.
147
Conversando com Dona C.M.C. sobre qual seria a ordem de prioridade nas
melhorias habitacionais a serem feitas em sua casa, a moradora afirmou que a
primeira mudança seria no telhado, logo após a construção da Associação de
moradores, depois a reforma do banheiro e por último a ampliação dos outros
cômodos. Essas informações foram levadas em consideração na divisão das etapas
do projeto de reforma e na ordem de prioridade de cada uma delas. As etapas foram
pensadas no intuito de dividir o projeto completo em partes menores, de forma que
seja mais fácil adquirir os recursos e que após uma etapa seja finalizada, não fique
obra inacabada desde que cada uma é independente da outra, desde que não seja
alterada a ordem de execução entre elas.
Na Figura 129, pode ser observado quais paredes precisarão ser construídas,
bem como na Figura 130 contém os cortes esquemáticos mostrando a altura das
alvenarias e a inclinação do telhado. Como, devido à legislação local, não é possível
abrir uma janela direcionada para a calçada, optou-se por inserir um cobogó em uma
das paredes da recepção, criado a partir de espaços entre alguns tijolos, possibilitando
152
que haja circulação de ar e iluminação natural, mas sem tirar a privacidade dos
moradores da casa (Figura 131). Nessa etapa, durante o desenvolvimento das
instalações hidráulicas da cozinha será necessário também criar uma encanação que
capte a água que sai do tanque em que a família usa para lavar louças e roupas e a
direcione para fora do lote.
Caso a Dona C.M.C deixe de ser presidente da Associação, o local poderá ser
um ponto comercial para a família empreender, ou um local para ser alugado ou um
quarto com cozinha para sua filha morar com seu neto.
154
Como pôde ser visto na Figura 131, ao lado do banheiro, embaixo da laje
construída, será alocada a área de serviço com tanquinho (já existente), tanque e
espaço para o botijão de gás. No interior da residência, será preciso demolir uma
parede para que a porta do banheiro seja realocada, como também será inserida uma
pia dentro da cozinha. Logo, nesta etapa, devem ser previstas as instalações
hidrossanitária e elétrica para o banheiro, área de serviço e cozinha. Todas as
mudanças que precisarão ser feitas nas paredes durante essa etapa podem ser vistas
na Figura 133, já figura 134 pode-se observar as alturas das alvenarias.
156
Nesta etapa, será necessário fazer algumas demolições, assim como construir
em alguns locais, para adequar os espaços de acordo com o novo layout. Será preciso
também adaptar as instalações elétricas dos novos ambientes. Na Figura 135 pode-
se observar todas as mudanças propostas para o novo layout e na Figura 136 constam
todas as paredes que precisam ser demolidas, assim como as esquadrias a serem
inseridas.
158
Foi proposto que o quarto 1 mudasse de lugar, para ficar em uma posição onde
o sol da tarde não o atingisse diretamente, deixando a sala de estar em seu lugar.
Assim, a porta de entrada também foi realocada, e no lugar da antiga foi colocada
uma janela. O quarto 2 ganhará uma janela, recebendo a ventilação sudeste. A porta
160
da cozinha será trocada por uma de alumínio com basculantes de vidro, possibilitando
entrada de ar e de luz natural. O layout aberto entre sala de estar, sala de jantar e
cozinha foi proposto para que houvesse a sensação de ambientes mais amplos, que
era um dos anseios da Dona C.M.C., mas também para que tais espaços obtivessem
ventilação cruzada e maior iluminação, tornando-se mais arejados e agradáveis
(Figuras 137). Uma nova janela também foi inserida na sala de jantar, a qual dá acesso
para um pergolado que a protege do poente. Em tal pergolado, pode ser colocada
uma rede para descanso. Como solução alternativa à construção de um novo quarto,
que não foi sugerida por falta de terreno e por não conhecer a situação da fundação
da casa para construção de um primeiro andar, foi proposto um sofá de paletes para
a sala, para que sua neta mais nova possa dormir. No quarto 1, dormiria Dona C.M.C
no colchão de solteiro e sua filha mais velha com seu neto dormiriam na cama de
solteirão. Todas as medidas a serem alteradas durante essa etapa podem ser vistas
na Figura 138. Na Figura 139 consta a planta baixa com todas as mudanças que foram
propostas e na Figura 140 está a planta de layout humanizada, que foi criada com a
intenção de facilitar o entendimento da proposta pela família.
Como afirma Mariana Estevão, entregar apenas o projeto para uma família que
não tem condições de executá-lo pode gerar um impacto negativo. Assim, este
subitem trará algumas estratégias de viabilidade econômica e de gestão de obra que
a Dona C.M.C. pode adotar futuramente para conseguir executar as melhorias
habitacionais propostas anteriormente.
6.2.2 Mutirão
6.2.3 Crowdfunding
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
ABIKO, Alex Kenya. Introdução à Gestão Habitacional. São Paulo, EPUSP, 1995.
(Texto técnico da Escola Politécnica da USP. Departamento de Engenharia de
Construção Civil, TT/PCC/12).
BRASIL. Lei Nº. 10.257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183
da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras
providências. 2001. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10257.htm. Acesso: 07 jun. 2021.
CAU/BR. Bem vindo ao site moradia digna do CAU Brasil. 2021a. Disponível em:
https://caubr.gov.br/moradiadigna/. Acesso em: 04 jul. 2021.
B: Começou em 2019 quando eu já estava saído (da UFAL) e a perspectiva era outra,
era sair para fazer o mestrado tanto que eu já fiz o TCC me projetando pra isso. Aí
veio aquele corte de bolsa, aquele monte de coisa, aí eu disse: Não, eu preciso fazer
alguma coisa. E comecei a pensar de que maneira eu poderia atuar: Ah, vou trabalhar
com design de interiores. Mas não eu não gosto muito, não é muito o meu perfil. Aí
comecei a estudar e pesquisar, foi quando eu encontrei o Vivenda, o Moradigna, o
pessoal de Recife, acho que foi a ABRA, e comecei a estudar realmente. Aí foi quando
eu pensei: É, aqui dá pra trabalhar com isso. Não é uma coisa de outro mundo, porque
é simplesmente um jeito de você meio que realocar os clientes, tipo, um cliente que
tá na mão de uma mão de obra informal poderia formalizar isso e dar um resultado
melhor para as construções. Porque eu sempre via no meu bairro, por exemplo,
sempre tem reforma, sempre tem alguma coisa assim e não tem ninguém por traz
disso, é só o pedreiro. Então a demanda que era muito grande, ainda é muito grande.
Aí foi quando eu olhei essa questão com o pessoal da Moradigna, conversei com o
Matheus e ele me explicou como funcionava lá e tal, e aí a gente foi trocando ideia e
eu disse: Não, eu vou montar! Aí foi quando eu comecei.
B: O que gente faz é uma assessoria, ela funciona de maneira que a gente vai levar
realmente essa assistência a pessoas que não tem condição. É um jeito que a gente
encontrou de atender a uma demanda que não era atendida e de chegar em bairros
que não tinha esse serviço. A gente sempre tem esse perfil de pensar assim: a gente
consegue fazer com o menos, com pouco. A ideia era essa, a gente conseguir fazer
uma reforma que fosse possível executar. A principal missão da gente é mostrar que
dá pra fazer. Porque o pessoal precisa ver que a sua função ali não é só deixar bonito,
não é só uma questão estética. A gente trabalha com melhorias habitacionais, que é
o que o ATHIS faz, né. É melhorar a qualidade de vida, tirar as pessoas de condições
179
B: Quando a gente começou 2021, a gente já tava com uma experiência legalzinha
de projeto de reforma e aí foi quando a Vivenda lançou o Instituto Vivenda, que a ideia
deles era abraçar mais negócios ao redor do Brasil que pudessem trabalhar na mesma
causa, então meio que funcionaria como um guarda-chuva que a gente ficaria
embaixo. Já havia alguns testes com negócios como o Moradigna e alguns outros que
já estavam fazendo esse teste de como funcionaria. E aí eles começaram a ver turmas
de negócios que passassem pelo treinamento deles e a partir desse treinamento
essas empresas passariam a ser acolhidas por um fundo de debêntures onde grandes
empresas investem, voltado para causa habitacional. Em junho a gente começa a
participar da turma desse treinamento. E aí a perspectiva mudou né de negócio,
porque a gente já tava se adequando ao modelo de negócio da RENOVA, onde a
gente faria consultoria e reformas que sempre foi o nosso foco. A gente tem um
analista que faz todas as análises do nosso negócio e dá um feedback semanal, a
gente tem um sistema de organização de projeto, de gestão de obra também. Então,
tudo isso contou bastante pra gente conseguir estruturar até chegar no ponto que é
hoje. Só agora a gente tem a possibilidade de a gente tá conseguindo executar o que
a gente esperava, porque a gente tem a possibilidade de ter um alcance maior, de ser
um negócio escalável no sentido de que a gente pode atender mais pessoas,
justamente pelo fato do financiamento, o subsídio financeiro.
B: A gente tem o Kit cozinha, o Kit banheiro ... que facilita na hora de executar a obra,
facilita na hora de financiar, porque a gente já sabe o valor médio que vai gastar em
cada um e facilita também para o cliente porque acaba sendo uma obra mais
organizada, uma obra mais limpa, não tem aquele quebra-quebra e aquela bagunça
generalizada. Então, os Kits de serviço são meio que uma forma de limitar o que pode
ser feito para não fugir muito do orçamento, porque isso acaba frustrando o cliente e
a gente também, é uma forma de limitar e também de organizar os processos de obra.
Tem casos que a gente pode pegar um Kit banheiro e um Kit cozinha, então a gente
faz um e depois faz o outro de maneira mais organizada. Então tem meio que uma
ordem, pra manter essa ordem de serviços e manter também o financiamento que,
hoje, é o nosso carro-chefe, a gente tem que tentar colocar as expectativas nessa
nossa realidade. A gente faz as visitas, prepara o estudo preliminar, faz o orçamento.
Fechou o orçamento a gente passa pro executivo, até porque o próprio sistema da
Vivenda ele pede que a gente coloque o projeto executivo junto com o escopo da obra.
Tudo o que a gente vai fazer e o que a gente não vai fazer tem que colocar ali, pra
poder dar uma segurança jurídica pro cliente e pra gente, né. E aí a gente vai trabalhar
com a mão de obra e com o gerenciamento, e tudo isso tá incluso no valor que vai ser
parcelado em até 30 vezes.
B: A gente tem uma meta de no máximo 60 dias para a entrega de uma obra, no
máximo, estourando.
B: O cliente é quem escolhe, mas a gente já conhece a faixa de preço que eles vão
querer. O que muda mais mesmo é a questão de revestimento e algumas peças, tipo
vaso de banheiro.
B: Então, é mais uma forma que a gente encontrou de explorar território, né. Ali é um
bairro com um potencial bom, que tá bem localizado. É uma forma que a gente tem
de chamar atenção do pessoal e também de captar clientes na loja, porque, por
exemplo, às vezes vai uma pessoa que se encaixa no perfil que a gente atende, que
vai comprar material e ele não sabe o que fazer e nem o que é necessário. Então a
181
gente acaba tendo essa experiência de passar pra eles uma consultoria a hora ou
garantir a reforma deles. E a gente pode explicar que a gente divide em até 30 vezes
o material, a mão de obra, o projeto. Aí a pessoa vai tá mais aberta ao que ela precisa
e o que a gente pode oferecer pra ela, e isso a gente atendendo no local. A gente usa
a loja como escritório e também dá esse auxílio pra qualificar a venda do pessoal que
vai lá, então é uma via de mão dupla, a gente ganha e eles ganham também.
B: A gente tem pedreiros colaboradores que estão disponíveis pra gente, a gente não
tem nem o capital e nem a quantidade de obras necessárias pra ter uma mão de obra
fixa 100%. Às vezes a gente também pega casos em que a pessoa quer fazer a
reforma, mas o pai é pedreiro, a pessoa mesmo é pedreiro, então a gente tem essa
possibilidade também e acaba reduzindo os custos da pessoa. A gente acaba
economizando com a mão de obra e o gerenciamento acaba sendo até mais próximo,
pelo fato de se tratar do próprio cliente. Então ele vai tá muito mais aberto do que um
pedreiro pra ouvir o que deve ser feito. Muitas vezes, quando o cliente prefere chamar
a gente é porque eles querem uma solução para alguns problemas que eles não estão
conseguindo resolver.
A: Vocês sentem que há um impacto social maior para as famílias agora com a
entrega da obra concluída, do que antes apenas com a entrega da consultoria
ou projeto?
B: Sim, sim! Porque muito do que a gente fazia às vezes nem era executado. Então
qual o real impacto de uma consultoria que não é executada, de um projeto que não
é executado? Não funciona. Quando a gente entrega uma obra pronta a gente sabe
que ali tem a qualidade, foi tudo planejado, que ali está dentro dos padrões que a
gente exige. O impacto é muito diferente. Quando você entrega a obra pronta você
não tá vendendo o projeto, você tá vendendo a obra.
A: No início, antes da parceria com a Vivenda, como vocês fizeram para captar
clientes e chamar a atenção dessa classe específica (C, D e E)?
e sobre reforma. Foi uma maneira de a gente mostrar pra eles que dá pra fazer e foi
uma parceria com a associação de moradores. Infelizmente, não deu certo porque na
época a gente não financiava, porque se financiasse a gente conseguiria atender
muita gente naquela época. E a gente conseguiu também encontrar um nicho
virtualmente que é do público que a gente queria atingir, que é de dona de casa, tanto
que 80% das pessoas que procuram a gente pra fazer são mulheres.
B: Primeiro pelo não direcionamento da faculdade, embora a gente tenha uma base
boa que era o Maloca, mas, assim, pra atuar no mercado a gente teve um choque
muito grande. Questão também de disciplinas de reforma, que a gente pudesse
conhecer um caso prático, porque assim, reforma é um caso complicado. A questão
também de orçamentação, que são experiências que a gente vai adquirindo na prática
mesmo. Não é uma crítica à faculdade e aos professores, mas é o modelo de ensino
que existe principalmente nas Universidades.
A: Pra você é possível conseguir trabalhar com essa classe social específica e
receber bem por isso, com e sem o parcelamento?
B: Sim, sim. Eu acho que dá. No começo a gente trabalhava com mais de um público,
trabalhava muito com consultoria e reforma também. Hoje a gente conseguiu definir
melhor, justamente por essa questão do financiamento, até porque é muita coisa que
a gente precisa fazer pra conseguir esse financiamento. Até pela questão do tempo a
gente focou mais nisso agora. Mas não diria que é impossível você fazer essas coisas
sem a ajuda de um financiamento, porque a demanda é muito grande, o público que
precisa disso é muito grande. Então, as coisas que você consegue atender com uma
consultoria ou até mesmo só com o acompanhamento da obra, porque às vezes a
pessoa já tá com os materiais comprados, já tem uma ideia do que fazer e você pode
oferecer a consultoria e o acompanhamento da obra. São muitas possibilidades. É
realmente muito trabalhoso, mas vale a pena. A gente consegue ganhar o que a gente
precisa, a gente consegue vender o nosso serviço e consegue também favorecer às
pessoas.
B: A principal meta até o fim do ano é fechar pelo menos umas 6 reformas. E a ideia
futura é de expansão mesmo, de conseguir atingir mais territórios. Aumentar equipe,
criar uma metodologia de análise, de levantamento e tudo mais, é inclusive algo que
a gente já vem trabalhando e se planejando pra começar ano que vem esse tipo de
trabalho.
B: Por lei já deveria ter um Escritório Público, que é uma lei de 2006, e até hoje não
se firmou. Na última gestão houve o boato de que ia acontecer e não aconteceu, nessa
também existe, mas até agora não foi concretizado nada. Não sei com essa
implementação desse Programa Viver Melhor o que é que vai rolar. O setor de
regularização fundiária de lá estava desmontado, a previsão é que voltasse a
funcionar agora.
184
pela própria secretaria, pela própria SEINFRA. Porque os recursos que o CAU/AL
dispõe não consegue abarcar toda a demanda de melhoria habitacional das grotas,
então ele consegue atender a um percentual específico e o restante dos projetos é
feito internamente pela SEINFRA. E nós, enquanto ONU-Habitat, apoiamos a
articulação desse processo envolvendo as três instituições.
B: A lei é uma normativa, é uma orientação, a lei sozinha não vai garantir a sua
efetivação. A lei vai ter que ser transformada em política pública, seja ela no nível
municipal, estadual ou federal, e aí sim dentro dessa política pública a prefeitura ou
governo pode criar programas que efetivem a implementação dessa lei, faça ela valer.
Até então, é uma normativa, uma diretriz, se ela vai ser colocada em prática ou não é
uma outra história. Hoje, no Governo do Estado e onde eu sei, em todas as prefeituras
de Alagoas não existe nenhuma lei estadual de assistência técnica que seja efetiva.
A: Para você, por que a Lei 11.888/08 ainda não é implementada em Alagoas?
B: Eu acho que falta uma maior sensibilização dos gestores, dos tomadores de
decisão em termos de política pública. De desconhecimento, apesar de a Lei não ser
recente, desde 2008. Eu acho que, no ponto de vista técnico, arquitetos, engenheiros,
estudantes, a academia de um modo geral, todo mundo já conhece e já é do senso
comum. Há uma mobilização muito grande das entidades de classe, sobretudo do
CAU, de difundir, organizar seminários, cursos, palestras que se discutam a
assistência técnica. Mas, ela ainda é muito desconhecida, por grande parte dos
186
B: Talvez a equipe SEINFRA seja o melhor grupo pra te responder o passo a passo
certinho, mas eu vou dar um panorama geral. A equipe social vai a campo, tendo
alguns critérios de famílias que serão atendidas. E depois vai a equipe de campo fazer
o levantamento, aí essa equipe ou são os arquitetos do CAU ou os arquitetos,
engenheiros e estagiários da SEINFRA.
B: Até dois salários mínimos, que não tenha problemas estruturais, que não seja
alugada, seja de alvenaria e que apresente pelo menos a necessidade de um serviço
187
prioritário. Ou que tenha algum morador com mobilidade reduzida, idoso, portador de
deficiência, alguém que tenha alguma vulnerabilidade.
B: Boa pergunta, não sei te dizer. Eu acredito que eles não entregam o projeto, eles
executam, dentro daqueles serviços que eu comentei que são prioritários ou
complementares.
B: Eu acho que há uma abertura para ouvir os moradores, mas ao mesmo tempo que
há essa abertura também há uma certa limitação de forma que atenda aos serviços a
serem priorizados. Tem uma metodologia, tem o recurso, mas infelizmente não tem
como atender ainda a todas as demandas, mas a medida do possível é conversado
com os moradores. Eles são escutados e tenta-se chegar em um consenso entre a
188
A: Quanto tempo leva desde a primeira entrevista com a família até a obra
concluída?
B: Completar esse ciclo, da entrada na grota até a obra ser realmente entregue. Acho
que isso poderia ser feito em um tempo mais reduzido, e para isso ser feito teria que
189
se pensar em alternativas que fogem, um pouco do que já é feito. Mas acho que esse
ciclo completo poderia ser revisto. Acho também que poderiam ser envolvidos outros
atores no processo. Ter um próprio programa do Governo do Estado para contratação
de profissionais que prestassem essa assistência técnica, aumentar o corpo técnico
do estado para atuar nessas áreas. Aumentar recursos humanos para dar mais
celeridade. Você esperar, às vezes, tanto tempo para ser atendido, pode potencializar
o risco que essa família enfrenta, seja nas suas condições de saúde, seja no seu bem-
estar. Acho que também poderia ser pensado em envolver empresas de pequeno,
além das de médio e grande porte, empresas menores que pensem em formas
alternativas de execução dessas melhorias, como mutirão, autoconstrução assistida.
Pensar em outras formas de dinamizar um pouco o Programa. Acho que um dos
principais desafios mesmo é pensar a assistência técnica como um programa de
estado. Se tem um programa estadual, com objetivos, com metas, com recursos
destinados exclusivamente para essa ação, isso ganha mais fôlego e permite que
mais famílias sejam atendidas e se diminua, ou tente-se diminuir, a inadequação
habitacional desses locais, e com isso ampliar o acesso à moradia.
B: Nesse relatório que eu vou te passar tem algumas fotos. Eu vou te mandar esse
material e você vê se é isso que você tá buscando.
B: Não sei te dizer se em Palmeira seria o caso. Eu sei que o estado já tem levado
para outros municípios, se eu não me engano, Barra de Santo Antônio, talvez
Palmeira, mas não tenho certeza. A ideia de urbanizar, de levar melhorias de
escadarias, toda essa parte de mobilidade e acessibilidade eles já estão iniciando em
outros municípios.
B: Não, ainda não. A gente tem dialogado com diversos atores de Arapiraca, tem um
diálogo recente com a Prefeitura, mas nada que tenha sido traduzido em uma coisa
mais concreta ou um setor mais específico.
B: Para criar uma estrutura que realmente funcione dentro da Prefeitura, o CAU/AL
provavelmente teria interesse, mas acho que não teria capacidade operacional para
isso e acho que foge um pouco do nosso papel enquanto Conselho. É mais um papel
de apoiar iniciativas, de conseguir executar algumas ações, mas acho que fazer parte
de uma estrutura oficial de um órgão público extrapolaria um pouco a nossa
capacidade institucional.
B: Eu vejo como uma forma positiva. É um número muito elevado, ainda, da sociedade
que não possui acesso a profissionais como eu, e como você vai ser futuramente,
então eu acho que há um nicho realmente de mercado, uma fatia considerável da
sociedade que não tem acesso a um profissional qualificado, quanto também uma
possibilidade de nós arquitetos cumprirmos a nossa responsabilidade social. A
autoconstrução é um fenômeno que existe e que a gente não tem como lutar contra
isso, existe e vai continuar existindo. Mas o grande problema é quando ela é feita sem
orientação técnica adequada, quando o morador faz por conta própria sem ter o
conhecimento, sem ter o projeto, sem ter uma orientação adequada. A gente sabe que
isso acaba resultando em situações inadequadas r, inclusive colocando em risco
aquela edificação e a saúde, sobretudo que é o mais importante, dos moradores.
Quando a autoconstrução pode ser feita com um apoio técnico, com uma orientação
191
9) Se faz, especifique.
10) De acordo com sua percepção quais as principais necessidades de sua
193
comunidade?
Um posto policial, uma creche e um posto de saúde.
11) Cite aspectos positivos na comunidade?
O povo, a vizinhança.
12) De acordo com sua percepção algo melhorou desde quando você veio
morar na comunidade?
O calçamento, a energia, a água.
“Que mãe é você? Que mãe é você? Seu filho no córrego. ” Aí eu disse: cês devem
tá confundindo meu filho com outra pessoa, meu filho não tava aqui. Praticamente
esculhambou comigo, com meu filho. Meu genro desceu pra lá, eles não deixaram
ninguém chegar perto. “Volte, volte, volte”. E ainda teve um policial que disse: nós não
têm medo de denúncia, de porra nenhuma não. Imprensando o menino. O outro
policial mandando o menino correr. Queria ele correr pra quê? Pra atirar no meu filho?
Aí ele disse: não, eu não vou correr não moço que eu não devo. Aí qual é a segurança
que a gente tá tendo desse jeito? Né.”
Qual?
A varanda, para destalar fumo.
31) Sente falta de algum ambiente na casa:
( x )Sim ( ) Não Qual?
Mais um quarto.
32) Quando chove, inunda a sua rua:
( )Sim ( x )Não
Mas na ponte, sim.
33) Quando chove, inunda a casa:
( )Sim ( x )Não
Mas goteja dentro de casa.
34) O que você acha da largura da sua rua:
( ) ótimo ( x ) bom ( ) péssimo.
35) Qual a forma de coleta de lixo:
( ) Caminhão de porta em porta ( ) Gari de porta em porta ( ) Conteiner mais próximo
( x ) Ponto de lixo mais próximo ( ) Outro:
36) Qual a frequência do caminhão de lixo na comunidade:
( ) diariamente ( ) 1x/semana
( x )Dias alternados, quais? Segunda, quarta e sexta
37) Sua rua tem iluminação pública:
( x )Sim, Qual? ( x )Equatorial ( )Prefeitura ( ) Comunidade ( )Não
38) Serviços comunitários e públicos utilizados (Local: fora ou dentro do
bairro):
Nº Item S N Onde: Qual?
Igreja Santa Isabel
( x ) Dentro
01 Igreja x
( ) Fora
( x ) Dentro
02 Campo/Quadra x
( ) Fora
( ) Dentro
03 Espaço CuIturaI X
( ) Fora
Escola de Ensino
(x) Dentro
04 Escola Municipal X Fundamental Domingos
( ) Fora
Lopes da Silva
( ) Dentro
05 Escola Estadual X
( ) Fora
( ) Dentro
06 Creche X
( ) Fora
196
01 Ponto de Táxi X
04 Lixeiras X
01 Placas de sinalização X
03 Rebaixamento da X
calçada
04 Telefone público X
acessível
Não.
Espaço para atender o pessoal. Uma cozinha com pia, fogão de duas bocas e espaço
para freezer.
Sim, a Loja do Seu Everaldo. Mas não conseguiria comprar parcelado sem ser no
cartão.
- Piso: contrapiso.
54) Fazer mapa riscos junto com a família (classificando os problemas que mais
incomodam a família em ‘curto prazo’, ‘médio prazo’ e ‘longo prazo’).