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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS - UFAL

CAMPUS DE ARAPIRACA
ARQUITETURA E URBANISMO - BACHARELADO

PEDRO HENRIQUE PEREIRA COSTA MOURA

BIOMIMÉTICA NA ARQUITETURA: ORIGEM, FUNDAMENTOS E EXPERIÊNCIAS


RECENTES

ARAPIRACA
2021
Pedro Henrique Pereira Costa Moura

Biomimética na arquitetura: origens, fundamentos e experiências recentes

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


como requisito avaliativo para a graduação de
bacharel em Arquitetura e Urbanismo.

Orientador: Prof. Me. Edler Oliveira Santos

Arapiraca
2021
Pedro Henrique Pereira Costa Moura

Biomimética na arquitetura: origens, fundamentos e experiências recentes

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


ao Curso de Arquitetura e Urbanismo, da
Universidade Federal de Alagoas/Campus
Arapiraca, como parte dos requisitos para
obtenção do Grau de Bacharel em Arquitetura
e Urbanismo.
Data de Aprovação: 15/12/2021.

Banca Examinadora

____________________________________________________

Prof. Me. Edler Oliveira Santos


Universidade Federal de Alagoas – UFAL
Campus Arapiraca
(Orientador)

__________________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Elisabeth de Albuquerque Cavalcanti Duarte Gonçalves


Universidade Federal de Alagoas – UFAL
Campus Arapiraca
(Examinadora)

Prof.ª Dr.ª Simone Carnaúba Torres


Universidade Federal de Alagoas – UFAL
Campus Arapiraca
(Examinadora)

__________________________________________________________

Prof.ª Ma. Nayane Laurentino da Silva


Faculdade Maurício de Nassau
Centro Universitário Mário Pontes Jucá - UMJ
(Examinadora)
AGRADECIMENTOS

Ao meu quarteto Clarissa, Clétia, Joseph e Lucas por me sustentarem nos


momentos mais tensos durante a graduação e por todo o apoio nesses anos de
amizade e cumplicidade que geraram o nosso querido Galpão, que nos guiará auma
longa jornada de amizade e arquitetura e urbanismo.
A todos os meus professores durante toda a graduação pelo aprendizado
dentro e fora da sala de aula, pela troca de experiências e ensinamentos.
Um agradecimento especial ao professor Odair Barbosa e o Maloca por terem
me possibilitado atuar em uma área da arquitetura na qual me ajudou a adquirir uma
sensibilidade e que possibilitou o meu crescimento tanto como estudante de
arquitetura e futuro arquiteto, como ser humano.
Ao meu orientador, Edler, por ter sido paciente e prestativo durante todo o
processo até chegar a este trabalho final, por ter me orientado e me feito entender o
que precisava ser feito para manter o objetivo de estudo.
Aos meus pais pelo suporte dado durante todo o meu tempo de estudo, pois
tive o privilégio de me dedicar exclusivamente a graduação graças ao apoio deles.
Agradecer aos demais amigos que estiveram comigo nestes últimos 6 anos
me apoiando e estendendo a mão nas adversidades, das menores as maiores, cada
um conseguiu deixar um momento marcado na minha memória pelos quais serei
eternamente grato. E pelas contribuições que me permitiram realizar este trabalho.
“E se, toda vez que eu começar a inventar
alguma coisa, eu perguntar: Como a
natureza resolveria isto?”

Janine Benyus
RESUMO

As áreas de desenvolvimento de projeto têm em comum a busca por soluções


inovadoras. Na arquitetura, na engenharia, no design de produto ou em qualquer
outra área que trabalhe com a concepção de projetos, pode-se observar que a
inovação, em alguns casos, está vinculada à busca de inspiração em formas ou
fenômenos naturais. Nesse âmbito, a Biomimética surge como campo de estudo e
experimentação em projeto, indicando possibilidades de aproximação entre homem
e natureza através do design – onde se encaixa a arquitetura. Assim, esta pesquisa
tem como objetivo compreender o discurso e a prática de projeto relacionado a
produção da arquitetura biomimética. Para isso, foi feita em primeiro momento uma
pesquisa de antecedentes arquitetônicos a fim de investigar a aproximação entre
arquitetura e natureza na produção anterior à difusão da Biomimética enquanto
campo de pesquisa e prática. Em seguida, foi realizada uma pesquisa sobre a
origem e difusão desse tema na área da arquitetura e sobre os fundamentos que
orientam o desenvolvimento de projetos de artefatos bioinspirados. Nessa etapa,
ganha destaque o Biomimicry Thinking, que, de modo geral, sistematiza o processo
de projeto biomimético. Por fim, foi realizada uma descrição e análise de dois
projetos contemporâneos que utilizam a Biomimética como referência para o seu
desenvolvimento, a fim de compreender as estratégias de projeto utilizadas na
prática recente. Como resultado, espera-se obter a compreensão dos avanços
trazidos pela Biomimética na aproximação entre arquitetura e natureza, presente ao
longo da história da arquitetura, assim como a definição inicial de um escopo que
possa estimular a ampliação do repertório de projeto de arquitetos e urbanistas.

Palavras-chave: teoria do projeto; arquitetura biomimética; natureza.


ABSTRACT

The project development areas have in common the search for innovative solutions.
In architecture, engineering, product design or any other area that works with the
design of projects, it can be seen that innovation, in some cases, is linked to the
search for inspiration in natural forms or phenomena. In this context, Biomimicry
emerges as a field of study and experimentation in design, indicating possibilities for
bringing man and nature through design – where architecture fits. Thus, this research
aims to understand the discourse and practice of design related to the production of
biomimetic architecture. For this, at first, a survey of architectural background was
carried out in order to investigate the approximation between architecture and nature
in the production prior to the diffusion of Biomimicry as a field of research and
practice. Then, a research was carried out on the origin and diffusion of this theme in
the field of architecture and on the fundamentals that guide the development of
bioinspired artifacts projects. At this stage, Biomimicry Thinking stands out, which, in
general, systematizes the biomimetic project process. Finally, a description and
analysis of two contemporary projects that use Biomimetics as a reference for their
development was carried out, in order to understand the project strategies used in
recent practice. As a result, it is expected to obtain an understanding of the advances
brought by Biomimetics in the approximation between architecture and nature,
present throughout the history of architecture, as well as the initial definition of a
scope that can stimulate the expansion of the project repertoire of architects and
urban planners.

Keywords: design theory; biomimicry architecture; nature.


LISTA DE FIGURAS

Figura 01 - Casa Milá, Barcelona. 16


Figura 02 - Casa Batló e Parque Güell, Barcelona. 17
Figura 03 - Maquetes funiculares - Gaudí. 18
Figura 04 - Sagrada Família, Barcelona. 19
Figura 05 - Dymaxion House. 22
Figura 06 - Modelos Tensegrity. 24
Figura 07 - Desenhos do registro da patente da cúpula geodésica de Fuller. 25
Figura 08 - Edifício sede Ford; Pavilhão dos EUA na EXPO 1967. 26
Figura 09 - Detalhe do módulo estrutural do Pavilhão da EXPO 1967. 27
Figura 10 - Estruturas feitas com películas de sabão. 30
Figura 11 - The Arctic City - 1971. 31
Figura 12 - Entrada da exposição do Jardim Federal, 1957. 32
Figura 13 - Pavilhão Alemão. 33
Figura 14 - Implantação e corte longitudinal Parque Olímpico de Munique. 34
Figura 15 - Parque Olímpico de Munique. 35
Figura 16 - Túneis do cão da pradaria. 37
Figura 17 - Efeitos do vento e da carga viva sobre a estrutura. 39
Figura 18 - Efeitos da carga viva sobre a estrutura. 40
Figura 19 - Casa dos pais de Eugene Tsui e Tardígrado. 41
Figura 20 - Tardígrado e Casa dos pais de Eugene Tsui. 42
Figura 21 - Estação Ferroviária, Reggio Emília, Parma; Estação Oriente, Lisboa;
Museu do Amanhã, Rio de Janeiro; Palácio das Artes Rainha Sofia, Valência. 44
Figura 22 - Estação de Transportes do World Trade Center, Nova York (acima) e
Estação Ferroviária do Aeroporto Saint Exupéry, Lyon (abaixo). 46
Figura 23 - L’Hemisfèric, Valência. 47
Figura 24 - Museu de Arte de Milwaukee, Milwaukee 48
Figura 25 - Biologia Integradora – a abordagem Biomimética. 56
Figura 26 - Elementos essenciais. 57
Figura 27 - Diagrama dos Princípios da Vida detalhado. 60
Figura 28 - Biomimicry Thinking - Diagrama. 67
Figura 29 - Biomimicry Thinking – Diagramas – Desafio para Biologia (esquerda) e
Biologia para Design (direita). 68
Figura 30 – Votu Hotel: Entrada e área de piscina/spa. 71
Figura 31 – Votu Hotel: planta de implantação e corte esquemático com a posição
dos edifícios. 72
Figura 32 – Cão da Pradaria 74
Figura 33 – Diagrama tocas do Cão-da-Pradaria e aplicação arquitetônica 75
Figura 34 – Diagrama otimização de ventilação e massa térmica, planta baixa e
cortes dos chalés. 76
Figura 35 – Mapa de calor cacto e diagrama de insolação e estratégia de auto-
sombreamento. 77
Figura 35 – Volumetria e ambiente interno dos chalés. 78
Figura 36 – Estratégia radiador térmico do tucano e aplicação arquitetônica. 79
Figura 37 – Palafita e fluxo de água. 79
Figura 38 – Setorização do programa planta e corte. 80
Figura 39 – Pavilhão LivMats. 83
Figura 40 – Auxílio de robótica na produção e detalhe fibra de linho na estrutura. 85
Figura 41 – Estrutura cactos. 87
Figura 42 – Vista interna do pavilhão e modelos de análise estrutural - redes. 88
Figura 43 – Desenho paramétrico com definição de padrões de enrolamento de
fibras naturais e visão geral da sequência de enrolamento final. 90
Figura 44 – Interação das fibras dentro da moldura do enrolamento – configuração
de fabricação robótica. 91
Figura 45 – Componente finalizado, vista superior e corte do pavilhão. 92
LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Convergências entre os arquitetos pesquisados 49


Quadro 2 – Convergências entre os arquitetos pesquisados e biomimética (cinza) e
avanços da biomimética (sem realce) 95
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 11
2 ANTECEDENTES ARQUITETÔNICOS: SÉCULOS XIX – XXI 15
2.1 O BIOMORFISMO DE ANTONI GAUDÍ 15
2.2 A CIÊNCIA DO DESIGN DE BUCKMINSTER FULLER 20
2.3 AS ANALOGIAS DO NATURAL DE FREI OTTO 27
2.4 OS PRINCÍPIOS EVOLUCIONÁRIOS DE EUGENE TSUI 36
2.5 AS FORMAS DA NATUREZA DE SANTIAGO CALATRAVA 43
2.6 SÍNTESE DOS ANTECEDENTES ARQUITETÔNICOS 49
3 BIOMIMÉTICA – ORIGEM E FUNDAMENTOS 51
3.1 ORIGEM E TERMINOLOGIA 51
3.2 FUNDAMENTOS 55
3.3 BIOMIMICRY THINKING 64
4 BIOMIMÉTICA: EXPERIÊNCIAS RECENTES 70
4.1 VOTU HOTEL – DO PROJETO PARA A BIOLOGIA 71
4.1.1 DEFINIÇÃO DO ESCOPO 71
4.1.2 DESCOBERTA 73
4.1.3 CRIAÇÃO 74
4.1.4 AVALIAÇÃO 81
4.1.5 TIPO DE PROCESSO 81
4.2 PAVILHÃO LIVMATS – DA BIOLOGIA PARA O PROJETO 82
4.2.1 DEFINIÇÃO DO ESCOPO 82
4.2.2 DESCOBERTA 86
4.2.3 CRIAÇÃO 88
4.2.4 AVALIAÇÃO 93
4.2.5 TIPO DE PROCESSO 93
4.3 CONVERGÊNCIAS: ANTECEDENTES ARQUITETÔNICOS E
BIOMIMÉTICA 94
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 97
REFERÊNCIAS 99
11

1 INTRODUÇÃO

As áreas de desenvolvimento de projeto têm em comum a busca por soluções


inovadoras. Na arquitetura, na engenharia, no design de produto ou em qualquer
outra área que trabalhe com a concepção de projetos, pode-se observar que a
inovação, em alguns casos, está vinculada à busca de inspiração em formas ou
fenômenos naturais. Seja por meio do uso de metáforas ou de traduções literais dos
elementos inertes ou vivos, os profissionais dessas áreas, que atuam com esse viés,
buscam, nos elementos e organismos da natureza, soluções para os problemas de
projeto em diversas escalas, desde mobiliário e elementos decorativos até edifícios.
Salgado (2013, apud VIANA, 2015) afirma que a observação da natureza é
responsável por grande parte dos desenvolvimentos científicos ao longo da história.
Vincent et al. (2006, apud CUNHA, 2015) falam que a humanidade busca inspiração
na natureza há mais de 3.000 anos e Kadri (2011, apud CUNHA, 2015) aponta que
o homem tem buscado soluções na natureza desde os primórdios da sua existência.
No campo da arquitetura, essas soluções foram buscadas de modos variados e a
partir de diversas abordagens ao longo da história, a partir dos valores culturais de
cada época.
Na Antiguidade, os elementos vegetais como as flores de palmeira, papiro e
lótus ornamentaram as bases e os capiteis das colunas dos templos egípcios
(PORTOGHESI, 2000, apud SANTOS, 2009), enquanto na Antiguidade Clássica as
proporções do corpo humano foram utilizadas como base para o desenho das
ordens dórica, jônica e coríntia na arquitetura greco-romana (JASON, 1998, apud
SANTOS, 2009). Na Idade Média, as nervuras dos arcos ogivais e abóbadas da
arquitetura gótica remetem às nervuras estruturantes existentes em muitas plantas
(PORTOGHESI, 2000, apud SANTOS, 2009). No Renascimento, a harmonia,
perfeição e simplicidade encontrada na natureza foram ideais traduzidos nas plantas
de edifícios públicos e numa estética fundamentada em regras de simetria,
alinhamento, proporção e regularidade (PINTO, 1998, apud SANTOS, 2009). O
movimento Art Nouveau, em países da Europa e nos Estados Unidos, incorporou as
formas orgânicas, biomórficas e fitomórficas em peças de mobiliário e guarda-corpo
de escadas até elementos de maior escala como as fachadas completas de edifícios
(BARILLI, 1991). Essa breve incursão não esgota o tema, mas denota que a relação
12

entre arquitetura e natureza impulsionou o desenvolvimento histórico de linguagens


arquitetônicas e abordagens projetuais através dos séculos.
Os impactos negativos da Revolução Industrial no final do século XIX e
começo do século XX, tais como o crescimento exponencial da população urbana e
os processos de urbanização acelerado, conduziram, nas décadas de 1950 e 1960,
às discussões iniciais sobre a sustentabilidade e a relação predatória entre homem e
meio ambiente (SANTOS, 2009). O tema da sustentabilidade1 foi supostamente o
que inaugurou formas de concepção arquitetônica que utilizam a natureza não
apenas como referência estética, mas como referência de desempenho energético a
um baixo consumo de recursos incorporado ao desenho de edifícios e cidades.
Rogers (2001, p. 24) aponta que “as próprias cidades devem ser vistas como
sistemas ecológicos e esta atitude traduz nosso pensamento no planejamento das
cidades e no gerenciamento do uso de seus recursos”. Hoje, podemos observar
diversas manifestações arquitetônicas, relacionadas ao tema em questão,
comumente denominadas de “arquitetura verde”, “arquitetura biofílica”,
“bioconstrução”, “edifício ecológico”, “infraestrutura verde”, “cidade sustentável”,
“arquitetura bioclimática”etc.
Há um campo de estudo e experimentação em projeto, de particular interesse
a esta pesquisa, que indica possibilidades de aproximação entre homem e natureza
por meio do design (onde se encaixa a arquitetura) – a Biomimética (Biomimicry em
inglês) – conceito criado pelo casal John Todd e Nancy Jack-Todd e difundido no
meio científico na década de 1970 pelo grupo chamado de The New Alchemy
Institute2. Duas décadas depois, em 1997, Janine Benyus lança o livro Biomimicry:
Innovation Inspired by Nature, que foi o primeiro livro sobre a Biomimética, fazendo
assim com que o estudo e o alcance desse tema fosse maximizado. Segundo
Benyus (2002, apud CUNHA, 2015, p. 21):

1 O desenvolvimento sustentável era inicialmente entendido como uso racional dos recursos naturais
em atendimento das necessidades do presente, sem comprometer o atendimento às necessidades
das gerações futuras (BRUNDTLAND, 1987, apud DUARTE; GONÇALVES, 2006). Atualmente, o
tema sustentabilidade é tratado de maneira mais abrangente e inclui desde aspectos ambientais até
socioeconômicos (DUARTE; GONÇALVES, 2006).
2 Instituto situado em Cape Cod, Massachusetts – EUA, que desenvolveu pesquisas em agricultura

orgânica, energia renovável, arquitetura sustentável, tratamento de resíduos, restauração de


ecossistemas e foram percussores em soluções de design ecológico. O instituto era formado por uma
equipe multidisciplinar que incluía arquitetos, engenheiros, biólogos que, em seu auge, chegou a ter
30 membros e centenas de auxiliares voluntários. Para mais informações, acesso disponível em:
https://www.theguardian.com/lifeandstyle/ng-interactive/2019/sep/29/the-new-alchemists-could-the-
past-hold-the-key-to-sustainable-living. Acesso em: 02 fev. 2021. E https://medium.com/age-of-
awareness/the-new-alchemy-institute-d0992ce33a68. Acesso em: 02 fev. 2021.
13

O biomimetismo é a emulação do gênio da natureza; inovação inspirada


pela natureza. O biomimetismo exige uma mudança de paradigma, uma
revolução. Ao contrário da revolução industrial, a revolução do
biomimetismo introduz uma era, não baseada no que se pode extrair da
natureza, mas no que se pode aprender com ela. (BENYUS, 2002, apud
CUNHA, 2015, p. 21)

De modo geral, a biomimética ou biomimetismo busca o entendimento do


comportamento de organismos biológicos e de como os processos naturais
relacionados a esses organismos podem ser introduzidos e replicados na produção
sustentável de artefatos já que, como afirma Drack (2002, apud SANTOS, 2009), os
sistemas biológicos são presumivelmente sustentáveis. Essa definição inicial sobre o
tema, aborda a premissa e a finalidade da teoria e da prática desenvolvida nesse
campo de estudos, mas não indica como esse conceito pode ser efetivamente
aplicado na produção de artefatos arquitetônicos. Do mesmo modo, indica a relação
com o conceito de sustentabilidade, mas não indica claramente quais estratégias 3
projetuais, dentre as já difundidas, podem ser utilizadas no biomimetismo. Assim,
desponta a seguinte dúvida que orientou o desenvolvimento desta pesquisa: existe
um método de projeto que fundamenta a produção da arquitetura biomimética?
Quais os avanços trazidos pela biomimética no âmbito da aproximação entre
arquitetura e natureza?
No âmbito científico, o estudo desse tema se justifica pela escassez de
publicações nacionais, apesar da sua difusão internacional desde a década de 1970.
Além disso, é um tema pouco abordado durante a formação do arquiteto e urbanista,
em atividades de ensino, pesquisa e extensão, apesar da sua relação direta com a
sustentabilidade4. No âmbito prático, a ampliação do debate sobre esse conceito
entre professores, estudantes, arquitetos pode ter como desdobramento a sua
utilização na concepção de edifícios e cidades.
Assim, o objetivo geral é compreender o discurso e a prática de projeto
relacionado à produção da arquitetura biomimética. Os objetivos específicos são:

3 Os selos para certificação de edifícios, por exemplo, tais como o LEED e o AQUA indicam várias
estratégias que podem ser incorporadas no desenvolvimento de projetos a fim de se obter soluções
sustentáveis. LEED significa Liderança em Energia e Design Ambiental, e possui 4 níveis de
certificação que variam de acordo com a pontuação adquirida pelos projetos em diversos requisitos;
AQUA significa Alta Qualidade Ambiental e é definida como um processo de gestão de projeto, no
qual avalia o desempenho ambiental de uma construção por sua natureza técnica e arquitetônica.
Para mais informações, consultar: disponível em https://www.arqsmartconstruction.com/artigos/leed-
aqua-e-selo-azul-certificaes-ambientais-de-edificaes. Acesso em: 13 ago. 2021.
4 Para mais informações, consultar Duarte e Gonçalves (2006).
14

• Apresentar discursos e práticas arquitetônicas relacionadas a natureza que


antecederam à difusão da Biomimética;
• Compreender, a origem e os fundamentos que orientam o desenvolvimento
de projetos de artefatos bioinspirados, na arquitetura e em áreas afins;
• Compreender as estratégias de projeto utilizadas na produção recente da
arquitetura biomimética.

Para atingir os dois primeiros objetivos, foi feita uma pesquisa bibliográfica –
apresentada no capítulo 1 – entre os anos de 2019 e 2021 em livros, artigos,
revistas nacionais e internacionais, complementada por palestras encontradas na
web a fim de investigar a aproximação entre arquitetura e natureza na produção
anterior à difusão da Biomimética enquanto campo de pesquisa e prática. Em
seguida, foi realizada uma pesquisa – apresentada no capítulo 2 – sobre a origem e
difusão desse tema na área da arquitetura e sobre os fundamentos que orientam o
desenvolvimento de projetos de artefatos bioinspirados. Nessa etapa, ganha
destaque o Biomimicry Thinking, que, de modo geral sistematiza o processo de
projeto biomimético. Em seguida – no capítulo 3 – foi realizada a descrição e análise
de dois projetos contemporâneos que utilizam a Biomimética como referência para o
desenvolvimento de soluções arquitetônicas inspiradas na natureza. Como
resultado, espera-se obter a compreensão dos avanços trazidos pela Biomimética
na aproximação entre arquitetura e natureza, presente ao longo da história da
arquitetura, assim como a definição inicial de um escopo que possa estimular a
ampliação do repertório de projeto de arquitetos e urbanistas.
15

2 ANTECEDENTES ARQUITETÔNICOS: SÉCULOS XIX – XXI

Este capítulo tem como objetivo apresentar discursos e práticas


arquitetônicas relacionadas à natureza, no período compreendido entre o final do
século XIX e início do século XXI, que antecederam à difusão da Biomimética e a
sua aplicação na produção de artefatos em diversas escalas. Para isso, serão
apresentados 5 arquitetos, escolhidos devido ao destaque dado aos seus trabalhos
tanto na teoria crítica da arquitetura quanto na mídia especializada: Antoni Gaudí,
Buckminster Fuller, Frei Otto, Eugene Tsui e Santiago Calatrava.
Partiu-se da premissa de que a compreensão do trabalho desses arquitetos
permitirá o reconhecimento de diversos modos e possibilidades de aproximação
entre arquitetura e natureza. Em segunda instância, supõe-se que a incursão nos
seus trabalhos permitirá o entendimento dos avanços trazidos pela biomimética no
âmbito dessa aproximação.
É importante destacar que a ordem cronológica de apresentação dos
arquitetos não significa, necessariamente, a evolução da abordagem da relação
entre arquitetura e natureza no discurso e projeto. Ao invés disso, a cronologia foi
utilizada para mostrar a mudança de enfoque dado pelos arquitetos ao longo do
tempo, influenciada por contextos de atuação distintos.

2.1 O BIOMORFISMO DE ANTONI GAUDÍ

Antoni Gaudí foi um arquiteto espanhol que obteve destaque no fim do século
XIX e início do século XX por sua arquitetura singular quando comparada com a
arquitetura classicista da época (CRUZ, 2012). Sua produção arquitetônica foi
influenciada pela natureza e se destacou das outras do mesmo período ao construir
uma linguagem única em relação as soluções estéticas, construtivas e de
organização espacial. As soluções estéticas se caracterizam, sobretudo, pelo uso
do ornamento, e das formas orgânicas, como as curvas e contracurvas.
Grillo (2007, p. 6) fala que em Gaudí “a inspiração na natureza se reflete em
uma multiplicidade de aspectos integrados em sua obra; uma obra que sintetiza com
maestria a estética, a tectônica5 e o simbólico.” Esse simbolismo se mostra de
maneira frequente através de analogias a elementos naturais como folhas, caules,

5 “Utilização da estrutura como elemento gerador do espaço arquitetônico e definidor da expressão


plástica” (SANTA CECÍLIA, 2005, p. 6).
16

raízes de plantas e flores usadas em vários elementos arquitetônicos como


mostrado nas figuras 1 e 2.

As varandas de La Pedrera (1906-1910), onde delicadas folhas servem de


guardas), os vários elementos biomorfos presente no Parque Güell (tais
como os répteis e/ou dragões), como o pináculo em forma de cogumelo ou
a cobertura da Casa Batló (coberta de “escamas”), são alguns dos
exemplos da reprodução ou inspiração de formas biológicas que se refletem
na sua obra (CRUZ, 2012, p. 32-33).

Figura 1 - Casa Milá, Barcelona.

Fonte: Ludwig, Jones e Jacqueline Poggi (2016)6.

Segundo Modesto (2014), a arquitetura de Gaudí representa a natureza,


dando vida às formas que se vê nela assim como as formas do desenvolvimento
delas. Isto é, além de estudar as formas dos elementos naturais e biomorfos, o
crescimento desses elementos biológicos também eram analisados e incorporados
em seus projetos, por isso, formas naturais helicoides e espirais são abundantes em

6 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/799966/classicos-da-arquitetura-casa-mila-antoni-


gaudi. Acesso em: 03 mar. 2021.
17

suas obras. Soares (2016, p. 41) fala que essas estruturas de crescimento
“presentes em tantos exemplos naturais, revela-se uma variante obsessiva no seu
trabalho, através das torres, colunas, pináculos7 ou escadarias em caracol, dentre
outros” (figura 3).

Figura 2 - Casa Batló e Parque Güell, Barcelona.

Fonte: Gill, Jacob, Morales (2012)8 e Ludwig (2016)9.

Grillo (2007) fala que a religiosidade de Gaudí foi extremamente importante


na sua interpretação da função da arte e arquitetura, estas vistas como continuidade
natural da obra divina perpetuada pelo homem, com a natureza como fonte sagrada
de inspiração e de referência. Sobre essa influência da religião e da natureza,
Carvalho (2016, p. 30) afirma:

Gaudí toma natureza como fundamento, fundação, origem da vida. Sua


religiosidade e espiritualidade encaminham seu pensamento em direção à
origem divina do mundo, da natureza e do homem, o que impele a imprimir
um “sentido cósmico” aos seus espaços, da lógica geral formal e estrutural
até os detalhes de materiais, figurações e inscrições.

Seus estudos, de caráter observatório e analítico, eram feitos por meio de


esboços, maquetes e ferramentas características como os cordões, utilizados em
modelos tridimensionais de análise estrutural. Alguns consideram que seu trabalho
foi inovador em sistemas estruturais avançados, devido a sua pesquisa sobre
estruturas naturais submetidas à gravidade a fim de se obter soluções máximas de
7 Ponto mais alto de um local: edifício, torre.
8 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/01-17007/classicos-da-arquitetura-casa-batllo-
antoni-gaudi. Acesso em: 03 mar. 2021.
9 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/784944/classicos-da-arquitetura-parque-guell-antoni-

gaudi. Acesso em: 03 mar. 2021.


18

funcionalidade (SANTOS, 2009). Nesse sentido, investigava formas estruturalmente


equilibradas e que fossem viáveis segundo os materiais da região e das técnicas
construtivas presentes na Catalunha. Para tal, usou em abundância estudos
geométricos aliados a modelos funiculares10 e estereostáticos para definir formas
com configurações para uma melhor distribuição de cargas (figuras 4 e 5).

Figura 3 - Maquetes funiculares - Gaudí.

Fonte: Almeida (2011) e Cruz (2012).

Como resultado desses estudos de desempenho e otimização estrutural,


Gaudí conseguiu traduzir em seus modelos tridimensionais e em suas obras a
eficácia e resistência que modelos naturais apresentam, materializando catenárias,
arcos, abóbadas, colunas inclinadas e pilares helicoidais, que originaram formas
complexas como a do templo Sagrada Família (SANTOS, 2009). Cruz (2012, p. 34-
35) aponta que:

Tal como surge na evolução biológica – onde a forma e função é apurada


diminuindo o gasto energético e aumentando a eficácia – Gaudí conseguiu
apurar a relação entre a estrutura e a forma de seus edifícios, numa eficácia
estrutural e formal nunca antes constatada no mundo da arquitetura. Nesta
matéria, revelou-se um visionário da forma arquitetônica, um verdadeiro “da
Vinci” da arquitetura moderna deixando um legado tão pessoal, peculiar e
inspirador.

10Sistema que se baseia na determinação da forma espacial das estruturas por meio de formas
geométricas de arcos parabólicos ou em catenária, obtidos por um modelo de cordas. (BERALDO;
MEIRELLES, 2016).
19

Figura 4 - Sagrada Família, Barcelona.

Fonte: Canaan, Lockton (2017)11.

Através de suas pesquisas, Gaudí foi capaz de compreender a relação entre


as formas e estruturas da natureza e transpor essa relação para a materialidade de
edifícios de diversos usos, desde residenciais até religiosos. Além da reprodução de
formas da natureza que possuem um bom desempenho estrutural, é também
evidente a reprodução de formas animais e vegetais que de caráter exclusivamente
figurativo. Esse aspecto pode ser observado pela profusão e excesso de
ornamentos e detalhes que tornam a sua arquitetura particular e irreplicável. Disso,
também resulta uma arquitetura que pode ser considerada antieconômica por não se
ater a economia de materiais e recursos, e, por consequência, de complexa
execução e finalização. Argumento que pode ser comprovado pelo exemplo da
Sagrada Família, edifício religioso que até hoje, quase 150 anos depois de iniciado,
ainda não se encontra concluído, além de ser incalculável o valor gasto até hoje
para sua construção. Apesar da ausência de economia de materiais e recursos,
Gaudí produziu uma obra inovadora ao criar livremente formas e estruturas que
expandiram os limites da linguagem e da produção arquitetônica da época.

11Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/01-56012/classicos-da-arquitetura-sagrada-familia-


antoni-gaudi?ad_medium=widget&ad_name=more-from-office-article-show. Acesso em: 03 mar.
2021.
20

2.2 A CIÊNCIA DO DESIGN DE BUCKMINSTER FULLER

Richard Buckminster Fuller foi um arquiteto, engenheiro, designer e professor


americano que se destacou pela atuação e formação interdisciplinar, pelas patentes
criadas e por suas preocupações ambientais. Grazziano (2018, p. 113) considera
que “Fuller é um dos arquitetos historicamente mais influentes na arquitetura
ambiental contemporânea” e um dos responsáveis por organizar elementos de
estética e projeto que a arquitetura de alta performance técnica emprega hoje. Sua
obra foi influenciada pela teoria dos sistemas, que de acordo com Farbiarz e Silva
(2016, p. 2000) é uma abordagem que:

Se contrapõe à visão mecanicista e fragmentada do universo, na tradição


cartesiana de se analisar cada elemento separadamente, a fim de se
compreender o todo. Em linhas gerais, a partir do século XIX, o estudo da
biologia dos organismos mostrou como cada elemento de um organismo
vivo existe apenas em relação aos outros, sendo o todo maior do que a
soma das partes. O campo da Ecologia veio revelar que cada organismo
existe sempre em relação aos demais organismos do sistema e a Física
einsteiniana derrubou a noção de um universo mecânico e analisável em
partes. Cada partícula existe apenas em relação às outras.

Esses estudos e novas ideias ligadas à ciência, que rompem com a visão
mecanicista e conduzem a uma visão sistêmica da natureza e seus fenômenos
mostraram a Fuller a necessidade de vermos o planeta como um todo de partes
inter-relacionadas, “Desta forma, no início dos anos 1950 cunhou o termo
‘Spaceship Earth’ (Nave espacial Terra) para descrever a natureza integral do
sistema vivo da Terra” (SIEDEN, 2000, apud SOARES, 2016, p. 156) e propor um
pensamento abrangente, levando em conta o universo como o “mais amplo dos
sistemas”, onde se inserem sistemas mais reduzidos (FARBIARZ; SILVA, 2016).
Essa maneira de enxergar o planeta, fez de Fuller um dos primeiros teóricos a
discutir sobre problemas relacionados à sustentabilidade e a preocupação ecológica.
Segundo Silva (2018) essa preocupação estaria ligada à arquitetura e ao design de
maneira intrínseca, e na procura da possibilidade de projetar produtos que
facilitassem as necessidades humanas, onde “as tecnologias e as soluções
antecipadas do design poderiam eliminar todas as barreiras expostas à expansão da
humanidade para um futuro positivo.” (FIELL, 2001, apud SILVA, 2018, p. 20-21).
Esse modo de projetar propagado por Fuller tem também respaldo na
chamada Ciência do Design Antecipatório Abrangente ou Ciência do Design,
21

desenvolvida por ele no começo do século XX, que possui as seguintes


características relacionadas ao processo de projeto em arquitetura, engenharia e
design (VERSCHLEISSER, 2008, p. 87-89):

a) Abrangente: por procurar um problema ou assunto subjacente a algo e tentar


resolver o caso geral ao invés de focar em questões específicas do problema.
Ex: um designer ou arquiteto tem a preocupação de entender por que existem
mais de 400 milhões de desabrigados no mundo todo e achar uma solução
para os desabrigados numa escala global e não se preocupar apenas com o
caso do indivíduo na sua rua ou cidade.
b) Antecipatória: porque o cientista de design procura compreender e
solucionar os problemas imediatos do contexto de projeto, mas também
busca prevê como estes problemas podem evoluir ao longo do tempo em
contato com o meio ambiente e, ao mesmo tempo, antecipar possíveis
soluções.
c) É design: em si mesmo, porque é o aspecto criativo da solução de
problemas. É o processo de analisar o “caso”; estudar outras áreas que
poderão fornecer tecnologias, recursos e ferramentas apropriadas para a
concepção do sistema e de suas partes. Muitas vezes este processo tem que
ser repetido, refinado e corrigido durante a busca de soluções.
d) É ciência: a Ciência do Design preza por uma abordagem científica,
aplicando medições de desempenho em vários aspectos (ambientais,
estruturais etc.) experimentando e testando sistematicamente a performance
das soluções criadas, para conseguir chegar aos melhores resultados válidos
para uma variedade de situações. Dessa forma, o designer pode chegar a
“novas soluções para problemas muito antigos e outras para problemas, até
agora desconhecidos ou não percebidos” (VERSCHLEISSER, 2008, p. 89).

Diante disso, é importante destacar a ênfase na eficiência e no desempenho


ambiental de seus projetos, obtido por meio de novos sistemas construtivos
racionalizados com capacidades adaptativas a diversos contextos de implantação
(FRAMPTON, 1997, apud GRAZZIANO, 2018, p. 115). Nesse aspecto, é possível
destacar o desenvolvimento da Casa 4D em 1928, também chamada de ‘Dymaxion
House’, uma casa de baixo custo idealizada para ser produzida em massa e que
22

poderia ser aero-transportada para qualquer lugar do mundo. Silva (1997, p. 87) fala
que as principais preocupações de Fuller para o desenvolvimento desse projeto
eram: “a redução do espaço do design das casas, estruturas portáveis que
pudessem ser instaladas em regiões inóspitas, e criação de projetos estruturais que
não dependessem do terreno onde fossem instaladas”. Assim, foi projetada e
construída com uma estrutura leve feita integralmente em alumínio, que tornava a
sua comercialização mais barata e acessível para as construções habitacionais da
época. Sobre o projeto Soares (2016, p. 154-155) fala que:

Representava uma inovação radical, uma casca de alumínio pendurada em


um pilar central em que no topo do mastro existiam lentes destinadas a
dirigir o calor e a luz solar para onde desejado; o banheiro era composto por
sistema modular onde era todo montado na fábrica, o que incluía as
tubulações, e posteriormente montado no local dentro da casa, o que deu
origem ao Dymaxion Bathroom, um banheiro modular compacto, pré-
fabricado, fácil de ser instalado. O piso era composto por duas camadas de
cabos tensionados tendo, entre eles, um colchão pneumático e, sobre eles,
placas sólidas que compunham o assoalho.

Figura 5 - Dymaxion House.

Fonte: Bettmann, Corbis e Daderot (2013)12.

O denominador comum para a sua obra e teoria é a inspiração na natureza e


a consciência de que é preciso observar para aprender com ela, já que, no mundo
natural, tudo se organiza da maneira mais eficiente possível. Alinhado com o seu
discurso sustentável, ele buscava aplicar essa máxima da eficiência encontrada na

12Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/01-130267/classicos-da-arquitetura-casa-dymaxion-


4d-slash-buckminster-fuller. Acesso em: 07 mar. 2021.
23

natureza em seu design, já que se preocupava muito com a longevidade do planeta


e com as suas reservas materiais e energéticas.

O nosso planeta, a “Espaçonave Terra”, não tem uma fonte inesgotável de


petróleo, madeira, água, ar limpo e outros recursos naturais... Na medida
em que vai se povoando mais e mais, é muito importante pensar como as
pessoas possam viver melhor com os mesmos recursos. Uma forma é
reduzir a quantidade de materiais desperdiçados, para que outra pessoa
possa aproveitar...você também pode melhorar a qualidade dos materiais e
encontrar melhores maneiras de usar cada grama de material, unidade de
energia e minuto de tempo (FULLER, 1968, apud SOARES, 2016, p. 13).

Fuller buscava entender as interações chamadas por ele de “metabólicas”


entre homem e natureza, as suas relações com o meio construído e o uso das
tecnologias para equilibrá-las (NASCIMENTO, 2014). Para isso, buscou inspiração
nos sistemas de organização existentes na natureza, pois entendia que o ser
humano existia ligado ao resto do mundo vivo. Essas inspirações junto aos estudos
sistêmicos realizados por ele, demonstraram que a visão do todo acabava por
permitir uma observação mais próxima do funcionamento das estruturas naturais
(FARBIARZ; SILVA, 2016). Ele também acreditava em um poder emancipatório da
técnica no sentido de controlar o uso de recursos naturais pela “invenção de novas
ferramentas, (...) pela flexibilidade e economia de materiais nas obras” afim de
mitigar “problemas sociais, de escassez de recursos, ou ambientais, [e] de
degradação da natureza” (GRAZZIANO, 2018, p. 115).
A partir do estudo dos padrões naturais, Fuller cunhou o termo “synergetics” –
contração das palavras “synergy” e “energetics” – sinergia e energética, que
corresponde a uma apropriação de um conceito usado primeiramente no campo da
química. Segundo Farbiarz e Silva (2016, p. 2002), “a sinergia ocorre quando a
interação entre elementos produz um resultado que não poderia ser previsto a partir
dos elementos individuais, onde o todo é sempre maior do que a soma das partes”.
Isso aponta uma abordagem holística característica da obra de Fuller. A partir desse
conceito é possível mostrar exemplos de sua obra que se destacaram nesse
sentido: as estruturas ‘Tensegrity’ e o domo geodésico.
‘Tensegrity’ foi o nome dado por Fuller a estruturas autotensionadas
compostas por barras rígidas e cabos submetidas a forças de tração e compressão,
que formam um todo integrado (FARBIARZ; SILVA, 2016). Esse conceito traduziria a
base estrutural da natureza na medida em que compõem uma estrutura forte com o
mínimo de elementos e economia de recursos.
24

Figura 6 - Modelos Tensegrity.

Fonte: Capper, Riether (2018)13.

Fox (1982) fala que esse tipo de estrutura encontra correspondência em


sistemas biológicos, e cita a conjunção mecânica entre forças de contração pelos
músculos e ligamentos em contraposição à resistência oferecida pelos ossos à
compressão, “de tal forma que a sinergia entre ambos propicia os movimentos e a
sustentação estrutural dos organismos” (apud ALLGAYER, 2009, p. 21). Já Frumar e
Zhou (2009, apud ALLGAYER, 2009, p. 21) dizem:

Estruturas em tensegridade têm grande potencial para aplicação em


arquitetura e engenharia, dada sua leveza e rapidez executiva,
apresentando altos graus de liberdade geométrica e potencialidades
formais. Ademais, a combinação de seus fundamentos estruturais dispensa
a necessidade de ancoragem a subsistemas, caracterizando-as como
estruturas autônomas com graus de flexibilidade e mobilidade superiores às
estruturas convencionais.

O maior exemplo desse tipo de estrutura são os domos geodésicos (figura 12)
desenvolvidos por Fuller na segunda metade do século XX, onde dedicou seus
estudos a geometria esférica por ter percebido as suas características de eficácia e
economia de recursos. A intenção de Fuller era propor um tipo de estrutura que
otimizasse a sustentação com uma quantidade reduzida de materiais e, dessa
forma, provar a eficiência estrutural com menor quantidade de recursos
(ALLGAYER, 2009). Sobre isso, Prenis (1973, apud ALLGAYER, 2009, p. 41) fala
que:

13 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/887543/estruturas-tensegrity-o-que-sao-e-o-que-


esperar-delas. Acesso em: 09 mar. 2021.
25

O formato geodésico emerge naturalmente a partir de sólidos regulares,


unificando os princípios de área mínima da esfera e agregando a forma
triangular. Esta, por sua vez, caracterizada como o arranjo bidimensional
geometricamente indeformável, resulta em uma configuração estrutural
robusta e estável.

Devido ao equilíbrio estrutural, Fuller conseguiu realizar experimentos com


essa estrutura com diversos materiais, entre eles sarrafo de madeira, madeira
dobrada, papel, plástico, fibras de poliéster (SILVA, 1997). Além da força estrutural e
economia de recursos, os domos geodésicos possuem as características de leveza,
segurança, facilidade e rapidez de montagem, alicerces mais simples, aplicabilidade
em diversos materiais, dentre outras. Depois de muitos estudos, em 1954 ele
conseguiu a patente de número 2.682.235 para a estrutura (figura 12), fazendo com
que a sua aplicação fosse bastante difundida, acabando por se tornar um ícone da
arquitetura moderna na década de 50 (SOARES et al., 2016).

Figura 7 - Desenhos do registro da patente da cúpula geodésica de Fuller.

Fonte: Soares et al. (2016).

Domos como o projetado e construído para cobrir o edifício sede da Ford nos
Estados Unidos e para o pavilhão dos Estados Unidos na feira internacional EXPO
26

1967 no Canadá são 2 dos maiores e mais conhecidos domos geodésicos


desenhados por Fuller e conhecidos internacionalmente (figuras 13 e 14). A
estrutura do domo da Ford foi feita de perfis de alumínio e fechada com lâminas de
fibra de vidro transparente instalados em pequenos painéis triangulares. Sieden
(2000, apud SOARES, 2016) fala que essa estrutura proposta por Fuller pesando
8,5 toneladas foi 20x mais leve que a estimativa da estrutura proposta por
engenheiros da Ford na época, além de ficar abaixo do orçamento proposto e ter
sido finalizada em menos tempo (figura 13).

Figura 8 - Edifício sede Ford; Pavilhão dos EUA na EXPO 1967.

Fonte: Soares (2016) e Abdallahh (2016)14.

Já o pavilhão possuía 82m de diâmetro e 61m de altura e foi projetado na


forma de ¾ de esfera. Foi concebido em um módulo estrutural composto em
triângulos na face externa e hexágonos na face interna (figura 15). Para o
fechamento da estrutura, painéis moldados de acrílico foram utilizados. Quase 40
anos após a sua construção, o Pavilhão projetado por Fuller se mostrou
extremamente durável e se transformou em um ícone da intenção de Fuller de unir a
natureza e a tecnologia através de seus princípios de design que se revelam dentre
outras formas, em seus domos geodésicos.

14 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/796023/classicos-da-arquitetura-biosfera-de-


montreal-buckminster-fuller. Acesso em: 09 mar. 2021.
27

Figura 9 - Detalhe do módulo estrutural do Pavilhão da EXPO 1967.

Fonte: Ehsan (2016)15.

O trabalho de Fuller se assemelha indiretamente ao de Gaudí na medida em


que ambos buscaram compreender o funcionamento de estruturas e geometrias
naturais que reagem de forma positiva às forças do meio ambiente. Contudo, a
diferença entre eles está, sobretudo, no modo como essa compreensão é transposta
para a materialidade arquitetônica. Isto é, enquanto Gaudí centrou seus esforços na
produção de obras particulares e irreplicáveis, com excesso de recursos, Fuller se
esforçou por desenvolver artefatos universais e replicáveis a partir da economia de
recursos e materiais, tal como a Dymaxion House. Atuando nessa perspectiva de
responsabilidade social e ambiental, Fuller se destacou sobretudo por sistematizar
seu discurso e prática na Ciência do Design Antecipatório, por meio de objetivos e
estratégias que pudessem ser aplicados na resolução de problemas em diversos
contextos.

2.3 AS ANALOGIAS DO NATURAL DE FREI OTTO

Frei Otto foi um arquiteto alemão reconhecido no século XX e XXI, pela


pesquisa e aplicação prática dos princípios para as construções leves, as estruturas
tensionadas e pelo estudo da forma através da analogia a processos biológicos de
autoformação. Cruz afirma que “a natureza constituiu a extensa base de dados para

15 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/796023/classicos-da-arquitetura-biosfera-de-


montreal-buckminster-fuller. Acesso em: 09 mar. 2021.
28

a maior parte de suas obras/investigações e foi através dela que se consagrou como
um arquiteto polivalente nas diversas áreas das ciências” (2012, p. 124-125). Nos
estudos da forma desenvolvidos por Otto, eram utilizadas diversas ferramentas
como maquetes, elementos gasosos, viscosos, plásticos, que deram a ele uma
ampla possibilidade de modelagem e resultou em “uma arquitetura mais criativa,
viva e orgânica, mas também não tão ‘rígida’ como a maioria dos exemplos a que
estamos habituados” (CRUZ, 2012, p. 124-125).
Apesar de suas pesquisas e produção arquitetônica estarem intimamente
ligadas a natureza, é importante dizer que essa relação não se deu com fins
ecológicos ou sustentáveis e sim com a finalidade de se obter geometrias e soluções
otimizadas. Sobre esse aspecto, Cruz afirma:

A arquitetura do natural não implica a prática de uma arquitetura ecológica,


mas sim a prática de soluções ou conceitos capazes de catalisar e
improvisar uma arquitetura melhor. Frei Otto acredita que, através da
observação da natureza viva e inerte, podemos aproveitar e compreender
mecanismos e processos de formação, como a relação entre forma e
função ou forma e massa, além de outros, criando assim uma arquitetura
mais eficiente (2012, p. 126-127).

A natureza inerte (exemplificada por elementos como as nuvens ou as dunas)


participaram de seus estudos iniciais, enquanto os estudos sobre a natureza viva
(exemplificada pelos organismos microscópicos até os animais) foram desenvolvidos
após esse período. Nesse aspecto, se destaca o trabalho junto ao biólogo alemão
Johann-Gerhard Helmcke, que “foi o responsável por introduzir Frei Otto na
aparência das formas presentes nos organismos microscópicos, e também alertou
para a pesquisa em que [...] procurou explicar a origem das formas biológicas”
(CRUZ, 2012, p. 128-129). De acordo com Nascimento (2014), Otto e Helmcke já na
década de 1960, trabalharam em conjunto com o intuito de explorarem os modos de
vida microscópicos e as formas como se inter-relacionam, assim como as suas
origens, de modo a traçar paralelos entre arquitetura e tecnologia. A partir desses
estudos, Otto conseguiu encontrar princípios da construção leve – “lightweight
building”. De acordo com Nerdinger (2005, apud NASCIMENTO, 2014, p. 70):

Nas conchas diatomáceas (algas com paredes celulares silicificados) e os


esqueletos de radiolários, Helmcke e Frei Otto reconheceram os princípios
da construção leve no trabalho da natureza e a importância dos processos
de auto-formação para o desenvolvimento das formas.
29

Esses estudos levam em conta a reflexão sob a ótica dos processos que
geram a forma e não da forma finalizada. Desse modo, os processos da biologia
serviram de inspiração para o desenvolvimento de estratégias e técnicas de projeto
e construção vinculados a princípios ecológicos das construções leves que utilizam o
mínimo de materiais e energia (NASCIMENTO, 2014).
Essas estratégias de projeto estão relacionadas ao conceito de “Caminho
Oposto”, utilizado por Otto para denominar a estratégia de pesquisa que serviu para
compreender processos responsáveis pela formação de construções naturais.
Segundo Cruz, o Caminho Oposto pode ser considerado como “pesquisa de
analogias naturais, capazes de entender e transplantar as fórmulas da natureza para
resultados arquitetônicos” (2012, p. 132-133). Esse conceito se configura a partir de
uma inversão no processo de raciocínio, onde modelos físicos são criados para
entendimento de mecanismos biológicos, e não o contrário. Isto é, ao invés de
apenas meio de reprodução, os modelos físicos (geralmente maquetes) são
utilizados como meio de investigação e compreensão de mecanismos biológicos que
pudessem ser transportados para as construções humanas em processos análogos.
Sobre isso, Songel (2008, apud CRUZ, 2012, p. 130-131) cita a seguinte frase de
Frei Otto:

Construímos maquetes para conhecer a forma e, uma vez obtida,


construímos também maquetes para saber o que ocorre no seu interior.
Sem dúvida, as maquetes mais interessantes são as que geram formas
otimizadas pelo tipo de construção da maquete; em primeiro lugar trata-se
de construir maquetes que produzam formas físicas para mais tarde
demonstrar, mediante outro tipo de maquetes, que aquilo se pode construir.

No trabalho de Otto, o conceito de Caminho Oposto se relaciona diretamente


com o conceito de “Construção Ligeira”. Enquanto aquele se refere à estratégia de
pesquisa, este se refere à estratégia de projeto que busca estruturar a forma a partir
da compreensão da relação ótima entre a função, forma e massa em analogia às
formas da natureza. As formas da Construção Ligeira resultam do “desenvolvimento
e otimização dos processos que, por alguma razão, seguem o princípio de redução
da massa.” (NASCIMENTO, 2014, p. 146-147). Este princípio é encontrado na
natureza de diversas maneiras e se revela como elemento determinante na relação
entre forma e estrutura das construções vivas, as quais são formadas segundo um
processo eficiente para executar uma função durante um determinado ciclo e com
30

um gasto energético mínimo. Desse modo, Otto acreditava que a gestão de recursos
segundo padrões de eficiência deveria “ser um tópico presente na boa prática
arquitetônica” (CRUZ, 2012, p. 150-151).
Os experimentos com películas de sabão (figuras 16 e 17) são exemplos
representativos dos estudos de Otto sobre esses conceitos16, os quais originaram
experiências com estruturas pneumáticas e estruturas em membranas feitas com
alumínio, como visto no projeto nunca construído ‘The Arctic City’ de 1971 (figuras
18 e 19).

Figura 10 - Estruturas feitas com películas de sabão.

Fonte: Cruz (2012).

A proposta da Arctic City (figuras 18 e 19) consistia em uma cúpula


pneumática de 2km de diâmetro a ser construída no Círculo Ártico para uma cidade
de 40 mil habitantes.

16 As experiências com películas de sabão eram realizadas em um ambiente controlado (câmara


fechada), em condições adequadas, por meio de modelos feitos com água destilada, poucas gotas de
detergente ou fluído borbolhoso e estrutura feita com cabos metálicos finos. Através de uma técnica
fotográfica, os modelos eram fotografados e medidos, e através das condições da câmara eram
conservados por longos períodos de teste. (CRUZ, 2012).
31

Os planos, elaborados em colaboração com Ewald Bubner, Kenzo Tange e


Arup, aparecem como uma espécie de estudo de viabilidade e incorporam
uma alta confiança na tecnologia a um certo nível de visão. O projeto
resume vários tópicos de cidades de ficção científica, desde o clima interno
controlado até as calçadas móveis, mas envolve um nível interessante de
realismo. (FABRIZI, 2015)

Ela foi pensada como meio de exploração de recursos locais, estando situada
em um estuário, com acessos por um porto e um aeroporto próximos. Possuindo
uma usina nuclear que produziria energia e forneceria aquecimento de ar e
bombeamento da água do porto para manutenção das condições de subgelo. Área
industrial localizada fora da cidade, setores administrativos e recreativos no centro,
conectados à unidades habitacionais por caminhos e calçadas móveis (FABRIZI,
2015).

Figura 11 - The Arctic City - 1971.

Fonte: Cruz (2012) e Fabrizi (2015).

A construção com tendas foi um tema recorrente no trabalho de Otto


impulsionado pela relação com o empresário alemão Peter Stromeyer, maior
fabricante de tendas da Alemanha na época, que fez com que os conhecimentos
reunidos em suas investigações pudessem ser aplicados em larga escala. São
exemplos notáveis desse tipo de projeto a tenda da entrada da Exibição do Jardim
Federal de 1957, em Colônia, Alemanha (figuras 20 e 21), que foi construída através
de uma tenda arqueada com 34m de comprimento e 24m de largura, junto a 2
pavilhões construídos segundo o modelo de tenda curvada (CRUZ, 2012).
32

Figura 12 - Entrada da exposição do Jardim Federal, 1957.

Fonte: Cruz (2012).

As construções em rede, também presentes no trabalho de Otto, seguem os


mesmos princípios das tendas feitas com membranas, porém, possuem a
capacidade de cobrir maiores extensões de área por serem construídas como
malhas articuladas de cordas ou cabos metálicos. Essas construções possuem
versatilidade construtiva uma vez que conseguem cobrir qualquer tipo de superfície
e se adaptar a inúmeras formas (CRUZ, 2012). Assim como as tendas, as
construções tensionadas em rede tiveram origem nas pesquisas com bolhas de
sabão e com teias encontradas na natureza, e foram desenvolvidas com o suporte
do desenho assistido por computador (CAD) e de maquetes feitas com materiais e
proporções semelhantes, as quais permitiram o estudo das forças exercidas no
modelo com bastante precisão.
São exemplos notáveis os projetos do Pavilhão Alemão da Exposição Mundial
de Montreal de 1967 e o Parque Olímpico de Munique. O pavilhão foi feito com uma
rede de cabos de aço de 12mm de espessura e 50cm de espaçamento e a proteção
climática é feita através de uma membrana de poliéster revestida de PVC (figuras 22
e 23). Foi construído na Alemanha e levado para Montreal o que acabou por revelar
a facilidade de construção e mobilidade do sistema construtivo. Além disso, foi um
dos exemplos da exposição a mostrar um potencial da tecnologia aplicada a pré-
fabricação e uma arquitetura inovadora no período moderno da arquitetura
(LANGDON, 2016).
33

Figura 13 - Pavilhão Alemão.

Fonte: Otto (2016)17.

No Parque Olímpico de Munique, “a área da cobertura foi dividida num grande


número de redes curvas em forma de sela com cabos nas arestas para o suporte e
ligação” (NERDINGER, 2005, apud CRUZ, 2012, p. 240-241), e as estruturas
principais das coberturas estão ligadas através de uma “rede orgânica” de percursos
que se adaptam ao terreno. A implantação do projeto foi feita de modo a criar um
percurso interligado, contínuo e fluído, capaz de organizar o espaço do parque
(figuras 24 e 25).

17 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/794650/classicos-da-arquitetura-pavilhao-alemao-


da-expo-67-frei-otto-e-rolf-gutbrod. Acesso em: 16 mar. 2021.
34

Figura 14 - Implantação e corte longitudinal Parque Olímpico de Munique.

Fonte: Cruz (2012).

Como já dito, esses projetos remetem à tecnologia natural das teias de


aranha estudada por Otto, que foi capaz de compreender, aperfeiçoar e aplicar esse
princípio de construção ligeira aos sistemas construtivos em arquitetura (figura 26).
Na visão de Cruz (2012, p. 242-243):

Se analisarmos estas ao nível morfológico, construtivo e técnico, deparamo-


nos com nada mais nada menos, a construção de uma teia artificial, na qual
os elementos que são naturais nas teias – seda, nós e configuração
estrutural – são substituídos por elementos artificiais que executam de
forma quase idêntica as funções naturais desta
35

Figura 15 - Parque Olímpico de Munique.

Fonte: Cruz (2012).

Para Otto, uma boa prática ecológica na arquitetura não passa


necessariamente por soluções pontuais como uma cobertura verde ou jardins
verticais, mas está diretamente relacionado à criação de soluções que sejam
capazes de diminuir gastos energéticos e materiais. Isso está relacionado à
capacidade adaptativa e mutável dos organismos vivos, que são capazes de se
adequar de modo eficiente ao meio ambiente com gastos energéticos reduzidos.
Sobre isso, Nerdinger comenta:

A utilização de uma arquitetura inteligente, ou seja, uma arquitetura


adaptável, móvel, mutável, ligeira, racional nos recursos energéticos e
materiais utilizados. Otto salienta que estes requisitos podem ser
diminuídos, ao serem analisados e reconsiderados através não só da sua
reflexão, como também do cálculo do projeto durante a sua fase de
desenho (2005, apud CRUZ, 2012, p. 164-165).

Os exemplos apresentados indicam as seguintes características recorrentes


na produção arquitetônica de Otto: versatilidade e adaptabilidade ao contexto,
possibilidade de reutilização e eficiência construtiva. A defesa de uma arquitetura
que utilize o mínimo de materiais e energia para a sua produção, em analogia a
determinadas estruturas e processos biológicos, se configura como um ponto em
comum na sua obra e na de Buckminster Fuller. Assim como Fuller, Otto
36

desenvolveu artefatos capazes de serem replicados em contextos diversos, porém,


sua arquitetura se destaca pela maleabilidade e fluidez observada sobretudo nas
estruturas tensionadas, que podem se adaptar com facilidade ao local de
implantação.
Além disso, os exemplos anteriores mostram que os domos geodésicos de
Fuller e as tendas de Otto são capazes de abrigar uma diversidade de usos por não
estarem vinculadas a uma função específica, aspecto que define arquiteturas
versáteis e adaptativas no meio ambiente onde se inserem.

2.4 OS PRINCÍPIOS EVOLUCIONÁRIOS DE EUGENE TSUI

Eugene Tsui é um arquiteto americano conhecido principalmente pelo uso de


princípios ecológicos em seus projetos e pelo discurso contra a atitude de destruição
e desconsideração da natureza que define, há décadas, o modo como a sociedade
interage com o meio ambiente. Sobre isso ele defende que “a humanidade deve se
lançar ao risco evolucionário; um risco na direção de trabalhar com a natureza e não
contra ela – deve quebrar a cadeia de ódio, arrogância e conformidade neste
mundo” (TSUI, 2002, apud FUNG, 2005, p. 32, tradução nossa).
O conceito de arquitetura evolucionária define a abordagem de projeto de
Tsui focada no desempenho máximo que os organismos vivos conseguem alcançar
após processos evolutivos de adaptação ao meio ambiente. O estudo das
características responsáveis pela adaptação dos seres vivos ao seu meio sinaliza
fórmulas que supostamente poderiam ser traduzidas em uma linguagem
arquitetônica própria. Em seu livro “Evolutionary Architecture: Nature as a Basis for
Design”, Tsui argumenta:

A arquitetura evolucionária pode ser definida como uma arquitetura que


implementa as práticas evolutivas da natureza como uma síntese de bilhões
de anos de evolução aplicada às necessidades imediatas e circunstâncias
de forma, projeto e propósito. É a maior e mais avançada evolução do
projeto arquitetônico, porque leva em consideração as várias forças naturais
e preocupações humanas de uma forma ecológica e humanamente
produtiva. Uma abordagem evolutiva do design nos permite aplicar
princípios que se desenvolveram na natureza ao longo de grandes períodos
de tempo, sem referências à estética estilística do passado e presente
(TSUI, 1999, apud MAHMOODI, 2001, p. 50, tradução nossa).

Os padrões de circulação encontrados na natureza exemplificam os estudos


desenvolvidos pelo arquiteto que fundamentam a sua abordagem projetual. Segundo
37

Tsui, os túneis do cão da pradaria (figura 27) são uma indicação direta de como se
poderia obter um design evolutivo que equaciona, da melhor maneira, a forma e a
função dos espaços em atendimento pleno das necessidades físicas e emocionais
dos usuários.
Figura 16 - Túneis do cão da pradaria.

Fonte: Santos (2009).

Nesse exemplo, a forma dos túneis gerados pelos cães atende a função de
circulação não de maneira isolada, mas aliada a diversos requisitos ambientais
ligados à sobrevivência da espécie. Nesse sentido, Tsui (1999, p. 60, apud
SANTOS, 2009, p. 46) afirma:

A resposta emocional e a utilização funcional podem atuar como uma


experiência unificada – cada uma reforçando e exaltando a outra. A
natureza pratica este conceito de forma limitada. Por exemplo, o ambiente
do túnel do cão da pradaria, um animal da família dos esquilos, é composto
por uma série de corredores subterrâneos e tocas. Cada canal funciona
como passagem de ar para as câmaras interiores e tocas. Alguns dos túneis
são falsos para confundir e dissuadir predadores e intrusos. O padrão de
circulação é uma série de entradas e saídas que acomoda da melhor forma
a função das câmaras interiores – o sono, a reprodução, a alimentação e a
criação dos jovens. Nenhum dos túneis é aleatoriamente gerado. Todos têm
um objetivo designado, que está em conformidade com as necessidades
dos habitantes, bem como com os requisitos técnicos do ar, circulação, luz,
penetração da água e resistência aos predadores.

A visão de que todos os componentes das construções da natureza possuem


um objetivo designado e por isso não são gerados aleatoriamente, serve de esteio
para a defesa de que alguns componentes das construções arquitetônicas são
38

desnecessários e podem ser evitados. Sob essa ótica, Tsui afirma que “pode-se
eliminar as várias etapas da construção convencional, utilizando materiais que
desempenham funções simultâneas, economizando trabalhadores, custos e
materiais (TSUI, 1999, p. 61-62 apud, SANTOS, 2009, p. 47). Essa eliminação do
que não é necessário significa fazer mais com menos, de modo que cada elemento
do design serve a uma função valiosa.
Em seus estudos, também há a compreensão de que a natureza utiliza uma
variedade de formas e métodos nas suas construções, a fim de assegurar a
maximização da eficiência com o mínimo possível de materiais (TSUI, 1999, apud
SANTOS, 2009, p. 57). De acordo com Santos (2009), são exemplos dessas formas
e métodos:

• Maximização da força estrutural: a natureza emprega em suas construções


relativamente poucos materiais comparados às construções humanas. No
entanto, essas estruturas da natureza são capazes de ter uma performance
elevada em relação às construídas pelo homem, a partir de configurações
únicas e originais de materiais simples pertencentes a ela.
• Maximização do volume incluído: com a finalidade de conservar o calor, os
organismos devem manter uma relação eficiente entre a sua área de
superfície e o volume interno. Com o uso de formas curvas, a natureza se
mostra capaz de maximizar o volume interno de um organismo, ao mesmo
tempo em que minimiza a sua área de superfície. Essa relação reduz ao
mínimo a quantidade de calor perdida através da superfície de um organismo,
permitindo assim que continue quente com menos entrada de energia. Por
consequência, uma área de superfície menor resulta em menos exigências de
materiais para a formação dos organismos, o que acaba por reduzir o seu
peso.
• Integração da eficiência aerodinâmica com a forma estrutural:
organismos são móveis e estão sujeitos às leis da aerodinâmica ou
hidrodinâmica. Para habitar de maneira eficaz o seu ambiente, as formas dos
organismos são ajustadas frequentemente à máxima eficiência para obter um
gasto mínimo de energia ao se locomover ou resistir às forças ambientais,
como por exemplo o vento em uma árvore. De maneira parecida, uma parede
de forma curva consegue dissipar com maior facilidade a massa de ar, ao
39

mesmo tempo em que requer menos material para a construção.

Figura 17- Efeitos do vento e da carga viva sobre a estrutura.

Fonte: Santos (2009). Adaptado (2021).

• As formas curvilíneas que dispersam e dissipam forças multidirecionais:


com as formas curvilíneas, os organismos têm a habilidade de absorver e
dissipar cargas em toda a estrutura, que acaba por ajudar a reduzir as áreas
sujeitas à pressão e à consequente necessidade de reforço estrutural
desnecessário.
40

Figura 18 - Efeitos da carga viva sobre a estrutura.

Fonte: Santos (2009). Adaptado (2021).

O enfoque no estudo das fórmulas de máximo desempenho, conduz Tsui a


defesa de uma arquitetura que imita as formas da natureza a partir da tradução das
propriedades estruturais que são intrínsecas às formas naturais.

As estruturas naturais passaram por bilhões de anos de evolução. Eles


indicam um nível de perfeição inimaginável por meio de “tentativa e erro”.
As estruturas vivas de hoje representam os sucessos da natureza, enquanto
as falhas simplesmente se extinguem. Esses exemplos naturais existentes
exibem uma grande paleta de “materiais engenhosos” e formas estruturais,
que são dotados de capacidade de “responder a todo tipo de força climática
e ambiental”. Esses “designs superiores” tornam-se cruciais para o nosso
desenvolvimento arquitetônico (TSUI, 1999, p. 86, apud SPAHO, 2011, p.
12).

Esse entendimento foi utilizado na concepção da casa projetada para os seus


pais (figura 30), onde as características advindas da morfologia do tardígrado (figura
31) foram aplicadas de maneira profunda no projeto. Santos (2009, p. 27) aponta
que os tardígrados:
41

Constituem um filo de invertebrados de tamanho microscópico, também


conhecidos por ursos de água doce. São criaturas muito resistentes, que
segundo últimas experiências suportam (durante certo período de tempo)
temperaturas tão baixas como -271ºC e tão altas como 100ºC, pressão de
75 mil atmosferas e radiação 5700 grays. São capazes de sobreviver no
vácuo do espaço e viver até 120 anos.

Segundo Spaho (2011), essas características físicas responsáveis pela


longevidade do tardígrado foram traduzidas arquitetonicamente em uma casa de
estrutura forte capaz de suportar os frequentes terremotos e atividades sísmicas do
estado norte-americano da Califórnia.

Figura 19 - Casa dos pais de Eugene Tsui e Tardígrado.

Fonte: Santos (2009) e Wikipédia Foundation (2021)18.

Segundo Aldersey-Williams (2003, apud SANTOS, 2009) Tsui projetou a casa


de acordo com a geometria resistente da carapaça elíptica do tardígrado em planta e
em corte com uma curva superior parabólica e uma inferior catenária. A estrutura,
composta de arcos parabólicos de concreto que formam a cobertura, foi
parcialmente enterrada para suportar tanto temperaturas extremas quanto abalos
sísmicos fortes. Devido ao emprego desses conhecimentos que ultrapassam o
campo da arquitetura, o trabalho de Tsui foi desenvolvido em colaboração com
engenheiros, paisagistas, biólogos, ecologistas e outros profissionais que

18 Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Tardigrada. Acesso em: 23 mar. 2021.


42

contribuem nos estudos e aplicações arquitetônicas relacionados à natureza.

Figura 20 - Tardígrado e Casa dos pais de Eugene Tsui.

Fonte: Spaho (2011).

Por último, é necessário destacar que as características que permeiam o


trabalho de Eugene Tsui ainda hoje servem de estudo para muitos arquitetos,
designers e outras profissões. O conceito de evolução de Tsui se desenvolve
43

bastante em aspectos de adaptação do uso dos espaços pelos usuários, assim


como os processos evolutivos que acontecem na natureza, os quais, levados ao
âmbito da arquitetura, podem gerar soluções eficazes, econômicas assim como
encontradas no meio natural. Esse discurso da eficácia e economia se aproxima do
fazer mais com menos visto em Fuller, a produção de uma arquitetura evolucionária
– originada a partir da ideia da adaptabilidade ao meio ambiente decorrente do
processo evolutivo dos organismos vivos – se assemelha a visão de Otto. Pode-se
afirmar que em seu trabalho, o uso das analogias formais acontece de forma
contrária às empreendidas por Gaudí, que fazia o uso com a finalidade de se criar
uma linguagem biomórfica enquanto expressão plástica, já em Tsui essas analogias
são utilizadas com o objetivo de se obter eficiência em arquitetura e design.

2.5 AS FORMAS DA NATUREZA DE SANTIAGO CALATRAVA

Santiago Calatrava é um arquiteto, engenheiro e artista espanhol que se


destaca no cenário da arquitetura mundial por edifícios com aspectos plásticos
rebuscados e de caráter monumental. Segundo Malicheski (2019, p. 41), a formação
híbrida de Calatrava possibilitou a concepção de obras “permeadas tanto pela
técnica rígida da engenharia quanto pela inventividade e sensibilidade das artes e
arquitetura.”
Fernandes (2011) aponta que é possível enxergar nas obras de Calatrava a
influência das formas orgânicas de Gaudí, assim como a expressividade escultórica
de arquitetos como Félix Candela19, Kenzo Tange20 e Jorn Utzon21. Fala também
que, apesar de sua arquitetura não caracterizar uma nova corrente, é possível traçar
paralelos com arquitetos como Rem Koolhaas e Frank Gehry através da exploração
de tecnologias construtivas para edificação de prédios com formas ousadas e com a

19 Arquiteto espanhol conhecido por suas soluções estruturais e formais utilizando concreto. Entre
suas obras se destacam: o Restaurante Los Manantiales e o Palácio dos Esportes na Cidade do
México. (WATKINS, 2017).
20 Arquiteto e urbanista japonês premiado com o Prêmio Pritzker (1987) conhecido por suas obras e

projetos urbanos modernistas e com grande apelo à história e cultura japonesa. Teve grande
influência no Japão após participar do planejamento urbano de Hiroshima pós II guerra mundial. Entre
suas obras se destacam: o Ginásio Nacional Yoyogi e a Catedral de Santa Maria em Tóquio (QUIRK,
2015).
21 Arquiteto dinamarquês premiado com o Prêmio Pritzker (2003) conhecido por suas obras com

elementos de relação com o contexto, uso de elementos vernaculares, referências à natureza, uso de
formas orgânicas ou escultóricas e a valorização de texturas, em contraponto ao modelo maquinista
das décadas de 1920 e 1930. Se destacam entre suas obras: a Ópera de Sidney e a Assembléia
Nacional do Kuwait. (COLLARES, 2009)
44

intenção de promover uma transformação radical no contexto urbano. Nesse


aspecto, Figueiredo (2010) aponta que a forma como Calatrava usa os materiais e
as tecnologias construtivas tendem a realçar valores táteis e tectônicos em suas
obras.
A ousadia em suas formas se dá segundo Costa et al. (2017), com a
finalidade de evitar soluções simples e com o intuito de valorizar a área em que está
inserido, criando marcos urbanos que potencializam a criação de usos e atividades
paralelas, além de promover mudanças no âmbito social e econômico. Nesse
sentido, é possível destacar que a maior parte das obras de Calatrava é de caráter
público, entre elas espaços culturais e museus, equipamentos de transporte, pontes,
universidades, dentre outros.
Apesar da diversidade de tipos de edifícios, há características recorrentes em
sua produção arquitetônica: o uso do aço, concreto, vidro como materiais
predominantes, apesar da experimentação de novas tecnologias construtivas
(REVISTA AU, 2002, apud COSTA et al., 2017); a concepção de geometrias
precisas, apesar da expressão escultórica; a concepção de formas curvilíneas por
meio da junção sofisticada de elementos construtivos; a complexidade estrutural
obtida com o auxílio de modelos desenvolvidos em softwares CAD (figuras 36, 37,
38 e 39). Sobre isso, Calatrava comenta que as propriedades dos materiais e a
natureza, junto à linguagem geométrica e estrutural são importantes meios de
inspiração para ele (apud SOUZA, 2008).

Figura 21 - Estação Ferroviária, Reggio Emília, Parma; Estação Oriente, Lisboa; Museu do
Amanhã, Rio de Janeiro; Palácio das Artes Rainha Sofia, Valência.
45

Fonte: Santiago Calatrava – Arquitetos e Engenheiros (2014, 1998, 2006 e 2015)22.

Sobre a influência do mundo natural Tichhauser (1998, apud SANTOS, 2009,


p. 25) afirma que Calatrava busca na natureza dois princípios adequados à
construção, “um é a otimização do uso do material; a outra é a capacidade dos
organismos para mudar de forma, para crescer, e se mover”. Essa interpretação da
capacidade dos organismos vivos ocorre por meio de analogias animais e vegetais
(SANTOS, 2009), com a estrutura de sustentação do corpo exposta (ARRUDA;
FREITAS, 2018). Por exemplo a Estação de Transportes do World Trade Center em
Nova York – Estados Unidos (2016) e a Estação Ferroviária do Aeroporto Saint

22Disponível em: https://calatrava.com/projects/reggio-emilia-stazione-mediopadana-reggio-


emilia.html. Acesso em: 28 mar. 2021.
Disponível em: https://calatrava.com/projects/oriente-station-lisboa.html. Acesso em: 28 mar. 2021.
Disponível em: https://calatrava.com/projects/museu-do-amanha-rio-de-janeiro.html. Acesso em: 28
mar. 2021.
Disponível em: https://calatrava.com/projects/palau-de-las-artes-valencia.html. Acesso em: 28 mar.
2021.
46

Exupéry em Lyon – França (1994) são exemplos dessa estratégia de projeto porque
fazem analogia a pássaros com a estrutura aparente se projetando sob as asas
abertas.

Figura 22 - Estação de Transportes do World Trade Center, Nova York (acima) e Estação
Ferroviária do Aeroporto Saint Exupéry, Lyon (abaixo).

Fonte: Santiago Calatrava – Arquitetos e Engenheiros (2016 e 1994)23.

Calatrava afirma que o estudo das formas orgânicas com as quais o seu
trabalho possui analogias “é o resultado de uma escolha clara e não tanto do
processo de solução de certo problema estrutural” (LEFAIVRE; TZONIS, 2011, apud
ARRUDA; FREITAS, 2018, p. 80). Dessa afirmação, se pode deduzir que o estudo e
a interpretação da natureza não almeja a tradução literal das estruturas dos
organismos que poderiam se adequar ou solucionar de forma otimizada um
determinado problema de projeto. Ao invés disso, as soluções ótimas encontradas
na natureza, do ponto de vista de sustentação dos organismos utilizando o mínimo

23 Disponível em: https://calatrava.com/projects/world-trade-center-transportation-hub-new-york.html.


Acesso em: 29 mar. 2021.
Disponível em: https://calatrava.com/projects/lyon-saint-exupery-airport-railway-station-colombier-
saugnieu.html. Acesso em: 29 mar. 2021.
47

de materiais, são livremente interpretadas e reinventadas em seus projetos, apesar


da referência clara a corpos animais e elementos vegetais.
O planetário e cinema L’Hemisfèric, localizado na Cidade das Artes e das
Ciências em Valência, Espanha (1998) exemplifica essa livre interpretação, uma vez
que o edifício é nitidamente inspirado no olho humano, onde o planetário representa
a pupila, o sobressalto são as pálpebras e a estrutura móvel que atua como
proteção é entendida como ferramenta que imita o abrir e fechar do olho humano
(FERNANDES, 2011).

Figura 23 - L’Hemisfèric, Valência.

Fonte: Santiago Calatrava – Arquitetos e Engenheiros (2009)24.

Outra característica relacionada as já citadas é o desejo de unir estrutura e


movimento por meio de analogias projetuais a estruturas naturais que possuam
esqueletos e articulações (ARRUDA; FREITAS, 2018). O Museu de Arte de
Milwaukee, Winsconsin, Estados Unidos (2001) pode ser considerada a obra de
Calatrava que melhor ilustra esse aspecto através da analogia a um pássaro em
movimento, balanceado em simetria com duas asas modeladas com cordas
metálicas presas a uma espinha dorsal, de modo que, segundo Arruda e Freitas
(2018), o edifício aparenta ser uma gigante escultura cinética.

24Disponível em: https://calatrava.com/projects/ciudad-de-las-artes-y-de-las-ciencias-valencia.html.


Acesso em: 29 mar. 2021.
48

Figura 24 - Museu de Arte de Milwaukee, Milwaukee

Fonte: Santiago Calatrava – Arquitetos e Engenheiros (2001)25 e Yildiz (2007).

O caráter escultórico e a analogia literal a organismos vivos observados no


trabalho de Calatrava se assemelha, como já dito, ao biomorfismo de Gaudí,
contudo, isso é feito a partir de uma interpretação livre e não por meio da mimese
das formas da natureza. Esse aspecto torna-se mais evidente na silhueta de
pássaros assumida pelas estações de transporte em Nova Iorque e Lyon e na
silhueta das árvores da Estação do Oriente em Lisboa. Apesar do uso de uma gama
reduzida de materiais – sobretudo o aço, o concreto e o vidro – seu trabalho se
contrapõe ao de Fuller e Otto pela quantidade de elementos que possivelmente
ultrapassam o mínimo necessário. Não obstante, enquanto Otto transpõe para seus
edifícios geometrias já existentes no meio natural, Calatrava cria geometrias que
materializam a sua interpretação pessoal dos organismos vivos, tal como é visível na
geometria do planetário em Valência, que faz alusão ao olho, mas não parte
necessariamente da anatomia dessa parte do corpo humano. Também pode-se
afirmar que não há a tentativa de produzir artefatos repetíveis e replicáveis ou

25Disponível em: https://calatrava.com/projects/milwaukee-art-museum.html. Acesso em: 03 abr.


2021.
49

mesmo de sistematizar o pensamento em uma ciência do design, como em Fuller.


Por fim, pode-se afirmar que há, em seu trabalho, o uso das analogias formais
empreendidas por Gaudí com a finalidade de se criar uma linguagem biomórfica
enquanto expressão plástica.

2.6 SÍNTESE DOS ANTECEDENTES ARQUITETÔNICOS

A partir do estudo das características das produções arquitetônicas


apresentadas neste capítulo, foi desenvolvida a síntese a seguir, de modo a facilitar
a visualização das convergências do trabalho de Gaudí, Fuller, Otto, Tsui e
Calatrava no âmbito da relação entre natureza e arquitetura (tabela 1).

Quadro 01 - Convergências entre os arquitetos pesquisados.

GAUDÍ FULLER OTTO TSUI CALATRAVA


PREOCUPAÇÃO X X X
ECOLÓGICA
ECONOMIA DE
ENERGIA E X X X
MATERIAIS
CAPACIDADES X X
ADAPTATIVAS
ANALOGIA A X X X X X
PROCESSOS
BIOLÓGICOS DE
AUTOFORMAÇÃO
ABORDAGEM X X
HOLÍSTICA
TRANSDISCIPLINARI X X
DADE
USO DE
TECNOLOGIAS DE
CONCEPÇÃO DE X X
PROJETO (DESIGN
DIGITAL)
Fonte: o autor (2021).

Como pode ser observado, a analogia a processos biológicos de


autoformação existentes na natureza é uma constate no trabalho dos cinco
arquitetos. O trabalho de Fuller, Otto e Tsui são os que mais se aproximam dentro
desse grupo, uma vez que essas analogias são utilizadas como estratégia de projeto
a partir de uma preocupação ecológica que implica diretamente em uma produção
orientada pela economia de energia e materiais. Isso depende de uma
abordagem holística dos diversos aspectos do contexto de atuação (adotada por
50

Fuller e Tsui), dependente da transdisciplinaridade e integração dos


conhecimentos sobretudo das áreas da arquitetura, engenharia e biologia (tal como
observado em Otto e Tsui). Essas analogias aos sistemas biológicos são também
buscadas por meio da investigação das capacidades adaptativas dos organismos
ao seu meio (comuns no trabalho de Fuller e Otto) que podem ser transportadas
para a materialidade da arquitetura. Por fim, deve-se destacar que essa
transposição exige certo grau de sofisticação, viabilizado pelo uso das ferramentas
do design digital como suporte ao projeto, tal como pode ser observado em Tsui e,
de modo mais expressivo, em Calatrava, que possui uma produção recente
orientada pela tecnologia e complexidade de formas.
51

3 BIOMIMÉTICA – ORIGEM E FUNDAMENTOS

Este capítulo tem como objetivo compreender, sob uma perspectiva teórica, a
origem e os fundamentos da Biomimética na arquitetura e em áreas afins. Desse
modo, apresenta inicialmente a origem e a diferença entre os termos que participam
da terminologia da Biomimética: Biomimetics, Bionics e Biomimicry. Em seguida,
aborda a correlação entre a natureza, a sustentabilidade ambiental e os
fundamentos elaborados por Janine Benyus, na década de 1990, pelas
organizações Biomimicry Institute. Por fim, é apresentada uma metodologia de
projeto reconhecida no âmbito das pesquisas científicas: o ‘Biomimicry Thinking’.

3.1 ORIGEM E TERMINOLOGIA

Biomimetics, Bionics e Biomimicry são termos que compõem a terminologia


da Biomimética e se referem às associações feitas entre a natureza e diversas áreas
do conhecimento, como arquitetura, engenharia e design de produto.
O termo Biomimetics foi usado pela primeira vez na década de 1950 em um
artigo científico escrito pelo engenheiro biomédico alemão Otto H. Schmitt, com o
intuito de criar uma distinção em relação à Biofísica (LIMA; ANDRADE, 2002;
RAMOS; SELL, 1994; ROSENDAHL, 2011; SCHNEIDER, 2010, apud QUEIROZ;
AGUIAR; ARAÚJO, 2017). A concepção do termo foi fruto de sua pesquisa de
doutorado, em que buscava desenvolver um dispositivo físico capaz de imitar o
comportamento de um nervo (VINCENT, 2006, apud ANDRADE, 2014). A partir
deste momento, o termo se estabeleceu nas áreas biomédicas com a definição de:
“estudo e imitação dos processos, métodos e mecanismos da Natureza ‘com o
objetivo de sintetizar produtos semelhantes através de mecanismos artificiais que
imitam os naturais” (BUSHAN, 2009, apud QUEIROZ; AGUIAR; ARAÚJO, 2017, p.
126).
O termo Bionics foi aplicado na década de 1960 por Jack Ellwood Steele,
Major da Força Aérea Americana, e que o definiu como “ciência dos sistemas em
que o funcionamento é baseado nos sistemas naturais, ou que apresentam
características específicas dos sistemas naturais, ou ainda que sejam análogos a
estes” (ARRUDA, 1994, p. 19). Sobre isso, Bar-Cohen (2011, apud ANDRADE,
2014, p. 25) fala que o termo foi usado por Steele para se referir à integração entre
“a Biologia e a Engenharia, a fim de descobrir como a natureza solucionou
52

problemas, ao longo de milhões de anos de evolução, com o intuito de transmitir


esse conhecimento para a produção de artefatos pelo homem”. E para Hsiao† e
Chou‡ (2007, apud SANTOS, 2009, p. 33) o conceito de Biônica de Steele focava na
“imitação da forma biológica e estrutura fisiológica dos organismos, utilizando
características biológicas induzidas como base para o desenvolvimento técnico”.
Essa definição é compatível com a de Müller (2007, apud NASCIMENTO, 2014),
para o qual a Biônica pode ser considerada uma prática tecnológica de projeto e não
uma ciência, que tinha como base de conhecimento os sistemas biológicos.
Podborschi e Vaculenco (2005) citados por Santos (2009, p. 31) falam que a
Biônica enquanto disciplina científica, assume uma abordagem “sistêmica à
realização técnica e aplicação de processos de construção e princípios de
desenvolvimento observados nos sistemas biológicos”.
Já no campo de projeto, são encontradas na literatura referências à Biônica
em autores como Werner Nachtigall, criador dos dez princípios da Biônica; Victor
Papanek em sua obra de 1971 “Design for the Real World”; e Bruno Munari em sua
obra de 1981 “Das coisas nascem coisas” (QUEIROZ; AGUIAR; ARAÚJO, 2017).
Victor Papanek define a Biônica como:

O uso de protótipos biológicos para a concepção de sistemas sintéticos


feitos pelo homem. Em uma linguagem mais simples: estudar os princípios
básicos da natureza e a partir dela, emergir com aplicações de princípios e
processos para as necessidades da humanidade (1971, apud
NASCIMENTO, 2014, p. 75, Tradução nossa).26

Ao longo do tempo, Gruber (2013, apud QUEIROZ; AGUIAR; ARAÚJO, 2017)


fala que o termo passou a ser associado apenas para a inovação tecnológica, onde
a inspiração na natureza foi utilizada para melhorar o desempenho de diversos
artefatos, inclusive bélicos. Atualmente é associado na maioria das vezes à robótica
e a substituição de órgãos e membros, ou partes deles, por versões tecnológicas. O
autor Daniel Wahl faz uma ressalva à atuação da Biônica, segundo ele:

A prática, embora trate da inspiração na natureza, ironicamente, passou a


desencorajar propósitos ecológicos e sustentáveis. Muitas vezes,
negligenciando questões como a complexidade da atuação sustentável, a
ecologia, e questões sociais (WAHL, 2006, apud QUEIROZ; AGUIAR;
ARAÚJO, 2017, p. 127).

26 Do inglês: the use of biological prototypes for the design of man-made synthetic systems. To put it
in simpler language: to study basic principles in nature and emerge with applications of principles and
processes to the needs of mankind (PAPANEK, 1971, apud NASCIMENTO, 2014, p. 75).
53

Após a aparição no meio científico do termo Biônica, surge na década de


1970 um outro termo: Biomimética, em inglês Biomimicry, criado pelo casal John
Todd e Nancy Jack-Todd, a partir do grupo chamado de The New Alchemy Institute.
O grupo dizia que o estudo da Ecologia, Biologia e da abordagem de sistemas bio-
cibernéticos serviriam de base para as necessidades humanas em encontrar
soluções mais sustentáveis (WAHL, 2006, apud BROCCO, 2017, p. 33). Dessa
forma Queiroz, Aguiar e Araújo (2017, p. 127) apontam que “observa-se a intenção
de compreender a natureza e realizar uma associação harmoniosa entre mundo
artificial – idealizada pelos homens – e mundo natural”. Segundo John Todd,
“através do design ecológico é possível conseguir uma civilização superior, que
usará um décimo dos recursos mundiais que a sociedade de hoje usa” (SANTOS,
2009, p. 33). E para isso, ele e sua companheira foram os primeiros a formular uma
lista de princípios relativos ao design biológico/ecológico (WAHL, 2006, apud
SANTOS, 2009, p. 33):

1. O mundo vivo é a matriz para todo o “design”;


2. O “design” deve seguir, e não opor-se, às leis da vida;
3. A equidade biológica deve determinar o “design”;
4. O “design” deve refletir o bioregionalismo;
5. O “design” deve ser baseado em fontes de energia renováveis;
6. O “design” deve ser sustentável na integração de sistemas vivos;
7. O “design” deve ser co-evolucionário com o mundo natural;
8. A construção e o “design” devem ajudar a curar o planeta;
9. O “design” deve seguir a ecologia;
10. Todos somos “designers”.

Aqui já é possível enxergar uma atuação diferente das citadas nos termos
anteriores, uma atuação holística, participativa e comprometida com a
sustentabilidade ambiental (AGUIAR, 2015). Em relação a essas diferenças,
Fernandes (2013, apud VIANA, 2015) explica que apesar de publicações tratarem
da Biônica e da Biomimética como iguais, não se deve confundi-las, apesar de
participarem da mesma terminologia. Buscando explicar essas diferenças, Wahl
(2006, apud SANTOS, 2009, p. 31) aponta que Biônica e Biomimética apresentam
diferentes abordagens em relação ao design e natureza. Segundo ele, a Biônica
54

trata da “previsão, manipulação e controle da natureza, [enquanto] o Biomimetismo


aspira à participação na natureza, e por isso uma maior contribuição para a
sustentabilidade”.
Essa nova abordagem se difundiu em 1997 com o livro “Biomimicry:
Innovation Inspired by Nature”, lançado por Janine Benyus27, maior responsável da
recente divulgação e sistematização da Biomimética ou Biomimetismo como um
campo de pesquisa e estudo (SANTOS, 2009).
Ao falar sobre o assunto, Benyus (2002) diz que a Biomimética é um campo
transdisciplinar que conecta a natureza à tecnologia, Biologia, vida, design e
inovação. Benyus (2002, apud CUNHA, 2015) fala ainda que o biomimetismo é a
emulação do gênio da natureza e que exige uma mudança de paradigma na relação
com a natureza. Ao tratar sobre essa mudança de paradigma, Benyus (2006, apud
BROCCO, 2017, p. 34) fala que a Biomimética é:

Uma ciência que aprende com os modelos da natureza e depois os copia,


os usa como inspiração ou baseia seus processos para solucionar
problemas humanos. Considerando que o planeta Terra tem
aproximadamente 4.6 bilhões de anos, dos quais 3.85 bilhões são anos de
evolução, há muito para aprender com a natureza e não apenas para extrair
dela.

Sobre esse processo evolutivo Bar-Cohen (2006b, apud CUNHA, 2015, p. 22)
explica que a natureza encontrou para os seus desafios várias soluções,
melhorando as bem-sucedidas. Essas experiências envolveram princípios diversos:
físicos, químicos, mecânicos e muitos outros campos reconhecidos como ciência e
engenharia. E nesse processo, “os organismos vivos arquivam a informação
evoluída e acumulada codificada em genes da espécie e passam para outras
gerações através da autorreplicação” (BAR-COHEN 2006b, apud CUNHA, 2015, p.
22). A consequência dessa seleção natural é a adaptação dos organismos naturais
aos seus ambientes, processo que levou bilhões de anos (CUNHA, 2015).
Darwin (2002, apud CUNHA, 2015, p. 22) explica que a seleção natural
ocorre quando indivíduos de uma espécie que apresentam alguma vantagem
evolutiva são possuidores de maior probabilidade de sobrevivência e reprodução, ao
mesmo tempo em que indivíduos de uma espécie que apresentam variações

27 Autora de seis livros na área e co-fundadora do Biomimicry Institute – biomimicry.org;


55

desfavoráveis a esses mesmos aspectos são eliminados. Ele ainda fala que na
natureza:
A menor diferença de estrutura ou de constituição pode afetar
definitivamente o equilíbrio natural da luta pela sobrevivência e favorecer a
sua preservação. À medida que proliferam as espécies favorecidas e
selecionadas, as formas menos favorecidas vão tornando-se mais raras até
atingir o processo de extinção. A Seleção Natural, contudo, é um processo
muito lento e ocorre durante períodos geológicos inteiros.

Cunha (2015) explica que os organismos adaptados aos seus ambientes e


seus recursos de sobrevivência, frutos da seleção natural, são partes de um amplo
repertório de estratégias naturais úteis ao ser humano. No entanto, apesar dessas
potencialidades, Reed (2004, apud SANTOS, 2009) relata que em uma estimativa
de existência entre 5 e 30 milhões de espécies habitando a Terra, apenas 1.4
milhões são conhecidas, enquanto de acordo com a FAPESP (2013, apud CUNHA,
2015) nas hipóteses mais otimistas, apenas 30% das espécies existentes no planeta
são conhecidas. Sendo assim, a quantidade de organismos vivos desconhecidos
são detentores de informações de valor inestimável para serem exploradas e
consequentemente passível de utilização nas estratégias para resolução de
problemas humanos.
Esses pressupostos teóricos se relacionam ao pensamento de Janine Benyus
acerca da Biomimética, onde fala que o seu surgimento acontece para que
“aprendamos a compreender a ordem natural das coisas, uma compreensão
complexa do ecossistema para promover uma real adaptação do homem ao meio”
(QUEIROZ; AGUIAR; ARAÚJO, 2017, p. 129).

3.2 FUNDAMENTOS

Para Janine Benyus (2002), o fundamento-base da Biomimética é tratar a


natureza como modelo, medida e mentora do design. Acerca desses fundamentos
apresentados por Janine Benyus, Brading (2016, p. 48) mostra o diagrama (figura
50), que busca responder quando/onde/como e por que utilizamos esses
fundamentos:

1. “design da natureza” como modelo: A Biomimética é uma nova ciência que


estuda os modelos da natureza e depois imita-os ou inspira-se neles ou em
seus processos para resolver os problemas humanos. Por isso, esse
56

fundamento corresponde à criação e ao desenvolvimento de novas ideias,


sendo estas ideias de vida amigáveis, previamente testadas e com eficácia
comprovada pela natureza (figura 50).
2. “design da natureza” como medida: A biomimética usa um padrão
ecológico para ajuizar a “correção” das nossas inovações. Após 3.8 bilhões
de anos de evolução, a natureza aprendeu: O que funciona. O que é
apropriado. O que dura. Por isso, esse fundamento corresponde à avaliação e
teste de ideias por meio do seguinte questionamento: “o que a natureza não
faria?”. Desse modo, se torna possível identificar limites e baseadas em um
corpo de soluções já existentes e testadas pelo tempo no meio natural (figura
50).
3. “design da natureza” como mentora: A Biomimética é uma nova forma de
ver e valorizar a natureza. Ela inaugura uma era cujas bases assentam não
naquilo que podemos extrair da natureza, mas no que podemos aprender
com ela. Por isso, esse fundamento corresponde ao escopo do biomimetismo
formado pelas seguintes premissas: mudança de postura e mentalidade na
relação com a natureza; que implica na atuação intimamente vinculada ao
entendimento do contexto; e ampliação do espaço das soluções de design
orientadas pelos ensinamentos da natureza (figura 50).

Figura 25 - Biologia Integradora – a abordagem Biomimética.

Fonte: Brading (2016). Adaptado (2021).

Sobre o “design da natureza” como mentora, Benyus (2002, p. 15,


tradução do autor) aponta os seguintes ensinamentos que podem ser extraídos no
57

desenvolvimento de artefatos pelo homem, os quais se relacionam diretamente com


a sustentabilidade ambiental:

• A natureza é movida à energia solar;


• A natureza usa apenas a energia de que precisa;
• A natureza adapta a forma à função;
• A natureza recicla tudo;
• A natureza recompensa a cooperação;
• A natureza confia na diversidade;
• A natureza exige especialização geográfica;
• A natureza inibe excessos em seu seio;
• A natureza explora o poder dos próprios limites.

O Biomimicry Institute28, para o qual a prática da Biomimética incorpora e


interconecta três fundamentos – Ethos, Reconectar e Emular – que representam
seus valores e a sua essência, assim como também descrevem três formas para o
seu uso, de acordo com as mais variadas motivações, interesses e temas, além de
não imaginar a prática da biomimética com esses elementos dissociados
(BAUMEISTER, 2013, apud BROCCO, 2017).

Figura 26 - Elementos essenciais.

Fonte: DesignLens: Essential Elements – Biomimicry 3.8(2013)29.

28 Instituto criado em 2006 com o intuito de ajudar a resolver desafios da humanidade, através de
iniciativas de educação, inovação e inspiração biomimética. Possui uma rede de informações das
quais fazem parte o Biomimicry ToolBox (apresenta um conjunto de ferramentas e conceitos básicos
relacionados a Biomimética) e o Biomimicry 3.8, que funciona como uma espécie de mentoria
biomimética para empresas, projetos, dentre outros.
29 Disponível em: https://biomimicry.net/the-buzz/resources/designlens-essential-elements/. Acesso

em 15 set. 2020.
58

Ethos é uma representação do respeito, responsabilidade e gratidão da


espécie humana pelo planeta. Baumeister (2013, apud BROCCO, 2017) diz que
representa a essência da ética, às intenções e à filosofia da prática da Biomimética.
Ela aponta que um exemplo dessa aplicação é a reflexão ao realizar o projeto de um
novo produto, questionando o porquê da criação, a importância, a necessidade e o
impacto deste produto no mundo. Se o produto já existe, o questionamento vai em
direção a necessidade ou não de continuar existindo, ou se precisa ser melhorado e
otimizado, além de questionamentos relacionados a materiais que podem ser
substituídos e como o processo de produção pode se tornar mais sustentável.

Ao fixar o ethos, Baumeister (2013) afirma que a humanidade chegará a


soluções que criam condições propícias a vida, ou seja, a condições que
permitam a vida prosperar. Esse elemento age como um guia e cria
oportunidades de escolha sobre onde, como e quando a prática da
biomimética ocorre. (BAUMEISTER, 2013, apud BROCCO, 2017, p. 36)

Reconectar indica que nós somos parte da natureza, pessoas e natureza


estão profundamente entrelaçadas. Nesta perspectiva, existe uma reconexão do
humano com o meio natural. Baumeister (2013, apud BROCCO, 2017) aponta que
isso significa ressignificar, reconhecer e entender que não existe nós e eles nessa
relação entre homem e elementos da natureza. Ela explica que é uma prática e
mudança de pensamento que explora as relações entre o homem e a natureza,
tendo em mente que a vida é resultado de bilhões de anos de evolução, tempo esse
que revela a sabedoria com a qual os humanos podem e devem aprender e se
inspirar.

Dessa forma, conectar-se significa descobrir a inteligência da natureza e


começar a explorar a biologia inerente à prática da biomimética. Com isso,
os laços entre as espécies são estreitados e as habilidades humanas de
observar a natureza e de aprender com ela são reforçadas (BAUMEISTER,
2013, apud BROCCO, 2017, p. 36).

De acordo com Baumeister (2013, apud BROCCO, 2017) o elemento emular


tem relação com a resolução de problemas por meio da bioinspiração e por
consequência a diminuição dos impactos negativos no planeta. Isto é, representa os
princípios, padrões, estratégias e funções encontradas na natureza que podem
inspirar o design, e ainda um sentimento que instiga a imitar a natureza ou a excedê-
la, de modo estimulante e cooperativo e de modo a potencializar os seus
ensinamentos (QUEIROZ; AGUIAR; ARAÚJO, 2017).
59

Além desses fundamentos, o Biomimicry 3.8 apresenta princípios ou valores


que implicam em uma atuação ética e responsável pela sustentabilidade e
preservação dos ecossistemas locais. Dessa forma, esses princípios
poderiam/deveriam ser transportados para o campo das atividades de projeto, no
desenvolvimento de produtos, processos e espaços físicos (QUEIROZ; AGUIAR;
ARAÚJO, 2017). São eles:

1. Evoluir para sobreviver: identificar abordagens de sucesso anteriores;


identificar erros; integrar soluções alternativas a um mesmo problema; e
evoluir as abordagens criando opções de soluções (figura 52);
2. Adaptar-se as condições de mudanças: incluir soluções que permitam
resiliência, redundância e descentralização do sistema; permitir a adição de
energia e matéria, desde que voltado para reparar/sanar e melhorar o
desempenho do sistema; incorporar a diversidade que rodeia (estudar
processos, funções e formas para prover um melhor funcionamento) (figura
52);
3. Ser atento e responsivo a questões locais: usar materiais de fácil acesso
(local e energético); cultivar processos de cooperação mútua, onde todos
ganham; tirar proveitos de fenômenos locais que se repetem (clima, ciclos
etc.); incluir fluxo de informações em processos cíclicos, nunca lineares
(figura 52);
4. Usar química amigável a vida: usar poucos elementos de uma forma
elegante; usar química favorável a vida, ou seja, evitar produtos tóxicos; usar
água como solvente (figura 52);
5. Ser eficiente em recursos (materiais e energia): buscar fontes renováveis;
gerenciar o uso de materiais em ciclo, ou seja, planejar o ciclo de vida;
minimizar o consumo energético, que implica na concepção de formas que
devem seguir o desempenho pretendido (figura 52);
6. Integrar conhecimento e crescimento: combinar elementos modulares e
sistemas que evoluem do simples para o complexo; compreender o
funcionamento do todo e dos pequenos componentes e sistemas que o
compõem; ser capaz de construí-lo de baixo para cima criar condições para
que os componentes interajam de uma forma que o todo consiga ter a
capacidade de auto-organização (figura 52);
60

Figura 27 - Diagrama dos Princípios da Vida detalhado.

Fonte: DesignLens: Life’s Principles - Biomimicry 3.8(2013)30. Adaptado (2021).

No campo da Biomimética, o Biomimicry Toolbox31, apresenta por meio da


plataforma virtual toolbox.biomimicry.org (2021), um conjunto de 10 fundamentos,
que objetivam colaborar com a melhoria de processos em áreas de atuação
humana. Esses fundamentos são denominados de Padrões Unificadores da
Natureza, que correspondem a 10 lições essenciais do mundo natural que devem
ser consideradas como parte de um processo de design. O objetivo desses padrões
é ajudar a criar soluções mais sustentáveis, uma vez que são encontrados
amplamente na maior parte da vida na Terra. Nesse sentido, se configuram como

30 Disponível em: https://biomimicry.net/the-buzz/resources/designlens-lifes-principles/. Acesso em: 15


set. 2020.
31 Faz parte do grupo de colaboradores do Biomimicry Institute, onde apresenta um conjunto de

ferramentas e conceitos básicos relacionados a Biomimética que podem ajudar usuários ligados a
qualquer disciplina a incorporar percepções da natureza em suas soluções. Para mais informações,
acesso disponível em: toolbox.biomimicry.org.
61

premissas que podem ser traduzidas em especificações de design, métricas de


controle de qualidade, seleção de materiais e outras escolhas de fabricação ou
processo (BIOMIMICRY TOOLBOX, 2021):

1. A natureza usa apenas a energia que necessita e depende de energia


disponível gratuitamente: a energia é um recurso para os organismos e usá-
la em excesso pode ser prejudicial, incapacitando sua reprodução e até sua
morte. Dessa forma, a natureza utiliza a energia de forma moderada,
adaptando as necessidades à quantidade limitada de energia existente.
Entretanto, nenhuma energia é totalmente “livre”, já que ela demanda gastos
de outras energias. Assim, todas as fontes de energia disponíveis na natureza
são gratuitas, renováveis e passíveis de serem encontradas no local sem
necessidade de extração. Por exemplo, os elétrons da luz do sol, que são
usados pelas plantas para realização da fotossíntese, minerais dissolvidos
nas profundezas do mar, os materiais orgânicos e os nutrientes de plantas e
animais dos quais os organismos se alimentam (BIOMIMICRY TOOLBOX,
2019, apud STANM, 2019, p. 38)
2. A natureza recicla todos os materiais: Os organismos na natureza
acompanham um sistema cíclico, onde nada é descartado. Tudo se
transforma, ganha uma nova função, como um corpo em decomposição, que
acaba se tornando fonte de alimento e materiais para outros organismos. Na
natureza, tudo se recicla, e a descrição mais fiel para isso é “upcycling”,
também conhecido como reutilização criativa. Ele é definido como um
processo de transformação de produtos e resíduos em novos materiais ou
produtos de melhor qualidade, ou ainda, produtos com maior valor ambiental
(BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019, apud STANM, 2019, p. 38).
3. A natureza é resistente às perturbações: A natureza se mostra muito
resiliente quando se trata de recuperar-se após mudanças significativas e
imprevisíveis, por exemplo após tempestades, incêndios, inundações,
nevascas. Isso se deve ao fato de possuir diversidade, redundância,
descentralização, autorenovação e autorreparo, características que permitem
a capacidade de manter a função, apesar de uma perturbação.
Quanto a diversidade, a natureza possui processos ou sistemas que
respondem à uma necessidade funcional e a mudanças no ambiente por meio
62

de uma variedade de soluções comportamentais, físicas ou fisiológicas. A


redundância ocorre na medida em que há mais de um sistema, organismo ou
espécie que desempenha determinada função, impedindo, por meio dessa
sobreposição de seres com função semelhante, que o sistema todo seja
destruído onde há a perda ou declínio de um organismo. A descentralização
diz respeito a distribuição desses organismos de maneira que uma
perturbação pontual não compromete as partes vitais de todo o sistema. A
auto renovação e o autorreparo significam que organismos têm capacidade
de gerar novas células e curar feridas em resposta às ameaças.
(BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019, apud STANM, 2019, p. 39).
4. A natureza tende a otimizar em vez de maximizar: Ao invés de utilizar a
energia e os materiais em excesso, a natureza busca um equilíbrio entre os
recursos por ela criados e gastos, a fim de evitar o declínio de reservas e a
consequente criação de situações que prejudicariam a capacidade de
sobrevivência e reprodução de um ser vivo. (BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019,
apud STANM, 2019, p. 39).
5. A natureza oferece benefícios mútuos: Há uma variedade de integração
entre os organismos que fornecem benefícios mútuos. Estes benefícios são
como subprodutos simples de comportamentos específicos ou podem surgir
de relacionamentos próximos que evoluíram ao longo da vida. São exemplos
dessas relações as simbioses mutualistas, a cooperação entre membros de
um grupo familiar e a predação ou parasitismo, pode trazer benefício quando
vista de um ângulo diferente. O louva-deus macho, por exemplo, após o
acasalamento pode ser comido por sua parceira para garantir uma boa
nutrição para a fêmea e a perpetuação da sua prole. (BIOMIMICRY
TOOLBOX, 2019, apud STANM, 2019, p. 39).
6. A natureza funciona com informação: A natureza usa informação para
estar em sintonia com seu ambiente, de maneira que seus organismos e o
ecossistema precisam receber informações do local para ser capazes de agir
adequadamente em resposta às tais informações. Estes mecanismos
afinados através de milhões de anos de evolução ocorrem na troca de envio e
recebimento de sinais entre organismos ou mesmo dentro do próprio
organismo. (BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019, apud STANM, 2019, p. 39)
63

7. A natureza usa química e materiais que são seguros: Os organismos


fazem química dentro e perto de suas próprias células, o que torna imperativo
que se usem produtos, processos químicos e materiais derivados da química
que sejam favoráveis à manutenção da vida (BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019,
apud STANM, 2019, p. 39).
8. A natureza constrói usando recursos abundantes, incorporando
recursos raros apenas com moderação: Os materiais fornecidos e
encontrados na natureza são abundantes e de origem local. Com eles, os
organismos conseguem construir algo externo a si mesmo, como um
cupinzeiro ou ninho, por exemplo, ou até mesmo montar materiais que são
parte do corpo, como uma asa, um casulo, uma concha, uma folha ou um
chifre. Esses materiais mais abundantes, como um composto químico, são
formados por elementos mais comuns, tais como o carbono, o nitrogênio, o
hidrogênio e o oxigênio. A natureza também utiliza alguns minerais raros, mas
somente aqueles encontrados in loco e que estão prontamente disponíveis
(BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019, apud STANM, 2019, p. 40).
9. A natureza é localmente sintonizada e responsiva: Quando os indivíduos
reconhecem as condições e oportunidades locais, além de saberem como
gerenciar e localizar os recursos disponíveis, as chances de sobrevivência
aumentam. A sobrevivência também depende de receber e responder
adequadamente as informações recebidas. Os indivíduos e os ecossistemas
que estão presentes em um determinado local evoluem em relação direta às
condições locais, as quais são variáveis em um padrão cíclico, tais como as
marés, o dia e a noite, as estações do ano, as inundações e os incêndios
anuais. (BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019, apud STANM, 2019, p. 40).
10. A natureza usa forma para determinar a funcionalidade: A natureza usa a
forma ou o formato para atender aos requisitos funcionais. Desta maneira, os
organismos realizam o que é preciso, usando o mínimo de recursos. Com
raras exceções, quase sempre há uma razão funcional por trás das formas
notadas na natureza. (BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019, apud STANM, 2019, p.
40).
64

3.3 BIOMIMICRY THINKING

O processo metodológico biomimético – no âmbito da arquitetura, engenharia


e design de produto – é um assunto muito pesquisado na atualidade devido a
inexistência de uma metodologia universal consolidada e “devido à dificuldade na
tradução dos sistemas biológicos para o âmbito tecnológico” (PAWLYN, 2010, apud
QUEIROZ; AGUIAR; ARAÚJO, 2017, p. 133). Nesse sentido, há estudos atuais
divulgados em periódicos e eventos internacionais, sobretudo no campo do design
digital, que procuram inserir essa abordagem na área de projeto32.
A fim de introduzir esse assunto, esta seção do trabalho apresenta a
estratégia de projeto denominada Biomimicry Thinking – desenvolvida pelo
Biomimicry Institute na tentativa de sistematizar etapas que podem ser conduzidas
em diversas situações de projeto. Essa estratégia contém “uma descrição dos
elementos essenciais para um processo de projeto que utiliza a natureza como
modelo para encontrar soluções” (BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019, apud STANM, p.
42).
De acordo com o Biomimicry Thinking, existem quatro momentos cíclicos que
envolvem várias etapas relacionadas ao desenvolvimento de projetos: escopo –
descoberta – criação – avaliação (figura 53).
Mastroti fala que “o escopo é o momento em que é definida a função que se
quer utilizar no design, em que também se analisa o contexto em que a função será
inserida” (2019, apud STANM, 2019, p. 41). Esse momento se desdobra em três
etapas específicas, que são “definir o contexto ”, “identificar uma função” e “integrar
os princípios da vida”. O contexto é definido segundo as possibilidades e limitações
dos recursos para atender a uma determinada função ou grupo de funções. A
compreensão dos impactos desejáveis e indesejáveis, decorrentes dessa definição
inicial, deve auxiliar o projetista a definir os critérios e restrições determinantes para
o sucesso da solução. Nessa perspectiva, a escolha da função está atrelada à
compreensão dos impactos que irá gerar no ambiente onde o artefato será inserido.
Nesse momento também são utilizados os Princípios da Vida, já comentados
(evoluir para sobreviver; adaptar-se as condições de mudanças; ser atento e
responsivo a questões locais; usar química amigável a vida; ser eficiente em

32 A Conferência Internacional da Sociedade Íberoamericana de Gráfica Digital (SIGraDi) no ano de


2020, possui uma sessão temática para a Biomimética e o desenho bioinspirado.
65

recursos – materiais e energia; integrar conhecimento e crescimento) enquanto


ferramentas capazes de integrar a inteligência da natureza ao trabalho que é
realizado e, também, um meio de determinar as prioridades do projeto para que
funcione em conjunto com a natureza. De acordo com Baumeister (2013, apud
BROCCO, 2017, p. 38), o design “com base nesses princípios permite atuar na
sustentação da vida na terra, realizando projetos com princípios sustentáveis”. O
resultado dessas etapas é a delimitação do problema, do programa e dos objetivos a
serem alcançados (figura 53).
O momento de descoberta, que acontece após a definição do escopo, se
desdobra em duas etapas específicas, que são a “descoberta de modelos naturais”
e o “resumo de estratégias biológicas”. Esse é o momento de descobrir os
organismos que podem ajudar a resolver o desafio de projeto em questão e ir em
busca, através da pesquisa e coleta de informações de maneira interdisciplinar, de
elementos, organismos e ecossistemas que desempenham a mesma função em um
contexto de vida análogo (figura 53).

Esta é a hora de sair e explorar in loco, passar o tempo ao ar livre e


observar. Ao explorar o meio ambiente, cultive uma mentalidade naturalista,
grande aliada ao observar a natureza e suas criaturas. Perguntas como o
porquê das características e comportamento de determinados organismos
serem dessa ou daquela maneira ou sobre qual função deste ou daquele
sistema ou organismo vivo devem ser estimuladas (BIOMIMICRY
TOOLBOX, 2019, apud STANM, 2019, p. 43).

Em seguida, na etapa de resumo, é traduzido o que se deseja em termos


biológicos, que significa pensar como a natureza cumpre determinadas funções.
Aqui deve estar presente a seguinte pergunta: “Como a natureza resolveria isto?”.
Isso demanda do projetista um modo diferente de formular as questões/problemas
de projeto, uma vez que o discurso coloca a natureza como agente principal do
pensamento e da busca de soluções. Ao invés de perguntar “Como podemos manter
os edifícios climatizados no verão sem uso de energia?”, poderíamos indagar “Como
a natureza regula a temperatura em climas quentes?” (BIOMIMICRY TOOLBOX,
2019, apud STANM, 2019, p. 43). Desse modo, são elencadas as estratégias
biológicas que podem ser traduzidas em soluções de projeto porque “exercem as
funções definidas no escopo”, se configurando como uma oportunidade de explorar
“os princípios de design encontrados [nesses modelos e estratégias] para trabalhá-
los de acordo com o desafio enfrentado” (MASTROTI, 2019, apud STANM, 2019, p.
66

41) (figura 53).

As estratégias arquitetônicas irão traduzir as estratégias e lições da biologia,


identificadas para solucionar o problema, ou seja, as estratégias
arquitetônicas irão descrever como a estratégia biológica funciona, sem
depender de termos biológicos. É neste momento que ocorre a colaboração
interdisciplinar da Biomimética (BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019, apud
STANM, 2019, p. 43).

O momento de criação se desdobra nas etapas relativas ao “brainstorm de


ideias bioinspiradas” e “emular princípios da vida”. De acordo com Baumeister
(2013, apud BROCCO, 2017), é desenvolvido e apresentado um novo produto,
processo ou sistema que materializa as ideias bioinspiradas pelas descobertas da
fase anterior. Essa fase envolve, usualmente, uma combinação entre explorar
resoluções de problemas parecidos – utilizando casos de sucesso encontrados na
natureza – e efetuar brainstorming de novas soluções também inspiradas no mundo
natural. As inspirações nessa fase são ilimitadas e se originam das pesquisas
interdisciplinares desenvolvidas nas etapas anteriores. A etapa subsequente, de
emulação ou imitação, consiste na aplicação das estratégias biológicas na geração
de protótipos a serem paulatinamente desenvolvidos até a obtenção de um produto
definitivo. Esse passo depende da identificação prévia de padrões naturais que
podem ser traduzidos em princípios de design e materializados em diversas escalas,
do produto ao edifício (figura 53).

A emulação é um processo exploratório em busca de capturar um padrão


no exemplo observado na natureza, para assim, ser traduzido para projetos.
Nesta etapa, ao considerar e observar as estratégias encontradas nas
etapas anteriores, pode-se perguntar “Como essa estratégia pode informar
a solução de design?”, o que ajudará a abrir um leque de ideias a serem
analisadas. Existe uma variedade de outras ferramentas úteis, como por
exemplo, o brainstorming, que seria um mapeamento mental e a idealização
de vários esboços para ajudar a desencadear novas ideias (BIOMIMICRY
TOOLBOX, 2019, apud STANM, 2019, p. 43).

A fase de avaliação consiste na validação das soluções definidas pelos


protótipos gerados, utilizando como medida os fundamentos ou princípios da vida já
comentados (evoluir para sobreviver; adaptar-se as condições de mudanças; ser
atento e responsivo a questões locais; usar química amigável a vida; ser eficiente
em recursos – materiais e energia; integrar conhecimento e crescimento). Esse é o
momento de reler e analisar as etapas anteriores conforme necessário, para assim
realizar uma solução viável para o desafio proposto” (BIOMIMICRY TOOLBOX,
67

2019, apud STANM, 2019, p. 44). São realizadas reflexões acerca das intenções e
objetivos originais, com a finalidade de ajustá-los em função dos rumos que o projeto
pode assumir no decurso do desenvolvimento com a incorporação de descobertas e
novas ideias empreendidas nas duas fases anteriores (figura 53). Embora indique o
término do processo, a avaliação pode dar início a ciclos iterativos que percorrem
todas as etapas de modo que as soluções evoluam até o atendimento completo das
necessidades em jogo (figura 53).

Figura 28 - Biomimicry Thinking - Diagrama.

Fonte: DesignLens: Biomimicry Thinking - Biomimicry 3.8(2013)33. Adaptado (2021).

Por último, é necessário explicar que esses quatro momentos e as suas


respectivas etapas podem ser percorridos pelo projetista de duas maneiras distintas
definidas como: “Do Projeto para a Biologia”, também entendida como processo ‘top-
down’, e “Da Biologia para o Projeto”, também entendida como processo ‘bottom-up’
(figuras 54 e 55).
No primeiro caso, as etapas são lineares, seguem um sentido horário e
percorrem um caminho:

33Disponível em: https://biomimicry.net/the-buzz/resources/designlens-biomimicry-thinking/#. Acesso


em: 15 set. 2020.
68

Útil para criação de cenários, quando se tem um problema específico e se


está buscando ideias biológicas para a solução. Seria útil para uma
configuração “controlada”, ou para a criação de um processo interativo de
design. Os melhores resultados ocorreriam quando você navega o caminho
várias vezes (BIOMIMICRY 3.8, 2014, apud QUEIROZ; AGUIAR; ARAÚJO,
2017, p. 135).

No segundo caso, o projetista pode ir de uma etapa a outra de acordo com a


necessidade sem se atrelar a uma sequência pré-determinada. Ao invés de partir de
um problema de projeto específico, o processo inicia com a descoberta de algum
princípio natural que orienta, desde o começo, a definição do escopo e a criação das
soluções bioinspiradas percorrendo um caminho específico:

Que é mais adequado quando o processo inicia com uma visão biológica
inspiradora (como por exemplo, quando se visualiza em determinada
situação algum dos princípios da vida) e que se deseja manifestá-la como
um projeto (BIOMIMICRY 3.8, 2014, apud QUEIROZ; AGUIAR; ARAÚJO,
2017, p. 135).

Figura 29 - Biomimicry Thinking – Diagramas – Desafio para Biologia (esquerda) e Biologia


para Design (direita).

Fonte: DesignLens: Biomimicry Thinking - Biomimicry 3.8(2013)34. Adaptado (2021).

Essas etapas e seus respectivos diagramas sinalizam para um modus


operandi de projeto que possui fases que se assemelham a um processo de projeto
que não está baseado na biomimética35, contudo denotam a importância que a
emulação da natureza, dos seus modelos e estratégias biológicas, tem no processo

34 Disponível em: https://biomimicry.net/the-buzz/resources/designlens-biomimicry-thinking/#. Acesso


em: 15 set. 2020.
35 Este aspecto será discutido ao final do capítulo 3.
69

de projeto. Não obstante, faz-se necessário investigar qual dos dois casos – “Do
Projeto para a Biologia” ou “Da Biologia para o Projeto” – pode produzir os melhores
resultados em termos de qualidade das soluções.
70

4 BIOMIMÉTICA: EXPERIÊNCIAS RECENTES

Este capítulo apresenta a descrição e análise de dois projetos


contemporâneos com o objetivo de compreender as estratégias de projeto36
utilizadas na produção recente da arquitetura biomimética. Na seleção dos projetos
foram utilizados os seguintes critérios: 1) o uso explícito e declarado da biomimética
no desenvolvimento do projeto, devido a necessidade de obter informações dos
respectivos autores sobre a influência da natureza na criação de soluções
arquitetônicas; 2) a disponibilidade de material gráfico e textual na web em sites
especializados e em quantidade e qualidade suficiente para se obter a compreensão
das etapas percorridas no desenvolvimento do projeto; 3) escalas e usos distintos,
devido a possibilidade de se aproximar da diversidade da produção contemporânea
realizada no âmbito da biomimética. A partir desses critérios, foram escolhidos: o
Votu Hotel, projeto nacional desenvolvido para a Península de Maraú, na Bahia; e o
Pavilhão LivMatS, projeto de arquitetura efêmera internacional executado por
acadêmicos da Universidade de Stuttgart, na Alemanha.
A etapas do processo do Biomimicry Thinking discutidas no capítulo anterior –
definição do escopo, descoberta, criação e avaliação – além do tipo de processo (Do
projeto para a biologia; Da biologia para o projeto) foram utilizadas como categorias
de descrição e análise desses projetos. Apesar disso, destaca-se que há a
consciência de que a identificação dessas etapas não foi suficiente para
compreender os detalhes do percurso seguido pelas equipes de projeto, o que seria
possível apenas com o acompanhamento presencial dos projetos na fase de
desenvolvimento. Contudo, o enquadramento dessas etapas possibilitou a
compreensão de como o discurso da biomimética pode ser traduzido para a
materialidade arquitetônica por meio de estratégias específicas. Por fim, os
resultados da descrição e análise fornecerão subsídios para compreender os
avanços trazidos pela biomimética no âmbito da aproximação entre arquitetura e
natureza presente ao longo da história da arquitetura, tal como abordado no capítulo

36Para Brandão (2002, p.29), estratégia de projeto é “o conjunto de ferramentas físicas e conceituais
que subjazem ao processo criativo do projetista, e também o modo como o projetista as usa”. Essa
definição será a utilizada neste trabalho.
71

4.1 VOTU HOTEL – DO PROJETO PARA A BIOLOGIA

4.1.1 DEFINIÇÃO DO ESCOPO

Definir o contexto

O projeto deste hotel foi desenvolvido em 2016, pela equipe do escritório GCP
Arquitetura e Urbanismo, para uma área localizada na Praia dos Algodões –
Península de Maraú, Bahia, uma região muito rica em biodiversidade, a qual possui
mar, bancada de corais, lagoas naturais, mata atlântica e manguezal (figuras 56 e
57). O programa de necessidades foi organizado num terreno de 6.250 m² e conta
com oito unidades de chalés que se conectam, por meio de um eixo, ao bloco de
entrada (que contém a recepção, administração, área de apoio para funcionários e
restaurante) e à área de lazer na extremidade oposta voltada para a praia (que
contém spa e piscina), que totalizam 1.603 m² de área construída (figuras 58 e 59).

Figura 30 – Votu Hotel: Entrada e área de piscina/spa.

Fonte: GCP – Arquitetura e Urbanismo (2018)37.

37 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/887431/aprendendo-com-a-natureza-conheca-o-


projeto-do-votu-hotel. Acesso em: 09 nov. 2021.
72

Figura 31 – Votu Hotel: planta de implantação e corte esquemático com a posição dos
edifícios.
1 – administração/reunião
2 – check-in/restaurante
3 – serviço
4 4 – compostagem/lixo
ENTRADA 5 – chalés
CHALÉS
3 6 – spa/lazer
5 6 7 - piscina

2 5
5 5
5 5 5 5
1 7

RECEPÇÃO CHALÉS SPA/PISCINA

Fonte: GCP – Arquitetura e Urbanismo (2018)38. Adaptado (2021).

Além da biodiversidade, a região apresenta como características: altas


temperaturas, salinidade, índices pluviométricos consideráveis, existe o problema de
ser hoje, uma área onde restam cerca de 5% da cobertura de floresta original e com
fauna e flora específicas, com espécies apenas encontradas na região (WOOLLEY-
BARKER, 2017). Essas características fizeram com que o escritório tivesse uma
reflexão sobre o habitar a região, levando em consideração o cuidado com essa
paisagem, seus desafios de preservação e as suas fragilidades. Para isso,
buscaram a biomimética como forma de intervir arquitetonicamente, especialmente
em relação ao conforto térmico e eficiência energética. Para atingir esse objetivo, os
arquitetos da equipe foram treinados por Alessandra Araújo, bióloga especialista
certificada em biomimética pela Biomimicry 3.8, de modo a ajudá-los a identificar os
aspectos do projeto que poderiam ser solucionados por meio da bioinspiração
(DELAQUA, 2018). Esse conjunto de soluções foi apresentado nos tópicos a seguir.

Identificar uma função

A equipe do projeto procurou manter e apoiar as espécies nativas da região,


buscando minimizar o consumo de ar condicionado e eletricidade, administrando um
bom gerenciamento de água, além de preocupações com ventilação e conforto
38 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/887431/aprendendo-com-a-natureza-conheca-o-
projeto-do-votu-hotel. Acesso em: 09 nov. 2021
73

térmico. Esses requisitos tornaram-se desafiadores pelas características e


fragilidades identificadas no contexto, como a presença de chuvas fortes,
inundações, erosão costeira, altas temperaturas, maresia e alta umidade
(BIOMIMÉTICA..., 2019)39.

Integrar os princípios da vida

A biomimética é conhecida por confiar em um conjunto simples de Princípios


de Vida, e no discurso da equipe de projeto fica claro que o princípio “Ser eficiente
em termos de recursos” (QUEIROZ; AGUIAR; ARAÚJO, 2017), aparece em
destaque, onde as estratégias são pautadas em sua maioria com essa finalidade.
Segundo Woolley-Barker (2017) a equipe atinge esse princípio desenvolvendo um
design multifuncional, processos de baixo consumo de energia, reciclagem e forma
adequada para funcionar.

4.1.2 DESCOBERTA

Descoberta de modelos naturais

Para solucionar os problemas em projeto que foram identificados na etapa do


escopo, a equipe estudou espécies de animais e plantas que apresentavam
características semelhantes e que tornassem a vida mais confortável em ambientes
similares. Diante disso, a biomimética norteou a criação da volumetria das suítes, o
fechamento de todos os prédios e as soluções para a eficiência das coberturas. O
organismo que inspirou a ventilação natural e constante, garantindo conforto térmico
mesmo quando o espaço estiver fechado, é o Cão da Pradaria, que em uma
explicação resumida, faz suas tocas enterradas no solo com entradas e saídas de
ar. Além disso, o fechamento dos prédios foi inspirado na capacidade de alguns
cactos de se auto sombrearem (VOTU HOTEL – GCP, 2021). No prédio principal a
cobertura da cozinha é uma laje jardim, porém atua como um grande trocador de
calor inspirado nos bicos dos tucanos.
Estas estratégias de projeto permitem que os espaços sejam mais agradáveis
evitando o uso excessivo de energia com climatizadores (VOTU HOTEL – GCP,
2021). Também foram utilizadas estratégias para a preservação da topografia
39Disponível em: https://sustentarqui.com.br/biomimetica-arquitetura-hotel-bahia/. Acesso em: 09 nov.
2021.
74

natural da área como a elevação do edifício em relação ao solo enquanto solução


observada nas palafitas em respeito ao bioma local e como garantia de preservação
das características do solo natural (BIOMIMÉTICA..., 2019)40.

Resumo de estratégias biológicas

De acordo com a literatura, esta etapa aborda as estratégias biológicas que


podem ser traduzidas em soluções de projeto que exercem as funções definidas no
escopo. De modo geral, essas estratégias foram enunciadas a partir do discurso da
equipe de projeto divulgado na mídia especializada. Contudo, essa etapa envolve o
processo de reflexão dos projetistas guiada pela seguinte pergunta “Como a
natureza resolveria isto?” (BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019, apud STANM, 2019).
Diante disso, seria necessário um maior conhecimento do processo de
desenvolvimento do projeto em questão junto à equipe, para saber como as
reflexões foram construídas e quais estratégias, além das apontadas no discurso,
foram colocadas entre as possibilidades, o que não foi possível de compreender
com as informações coletadas durante a pesquisa.

4.1.3 CRIAÇÃO

Brainstorm de ideias bioinspiradas

Para se ter uma ventilação natural e constante que garantisse conforto


térmico mesmo em um ambiente fechado, a equipe se inspirou, como já dito, no
Cão-da-Pradaria (figura 60) que vive em temperaturas bastante elevadas durante o
dia e baixas durante a noite.

Figura 32 – Cão da Pradaria

Fonte: GCP – Arquitetura e Urbanismo (2018).41

40Disponível em: https://sustentarqui.com.br/biomimetica-arquitetura-hotel-bahia/. Acesso em: 09 nov.


2021.
41 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/887431/aprendendo-com-a-natureza-conheca-o-

projeto-do-votu-hotel. Acesso em: 09 nov. 2021


75

Para se proteger da temperatura externa eles criam tocas subterrâneas no


solo com entradas e saídas de ar com alturas e diâmetros diferentes para isolá-los e
mantê-los ventilados. Essa estratégia é chamada de Princípio de Bernoulli no qual “o
fluxo de ar é retardado pelos montes de terra (...) aumentando a pressão e forçando
o ar a fluir rapidamente pelos túneis” (BIOMIMÉTICA..., 2019)42. Baseados nesse
princípio, os projetistas criaram nos chalés do hotel, dispositivos capazes de
amenizar a temperatura interna como uma passagem no nível do piso por onde
circula a ventilação natural, que penetra na edificação pelo ponto mais baixo da
coberta e saí do ambiente pelo ponto mais alto da coberta interna (figuras 61 e 62).

Figura 33 – Diagrama tocas do Cão-da-Pradaria e aplicação arquitetônica

Fonte: GCP – Arquitetura e Urbanismo (2018)43.

A partir dessa estratégia, a equipe implantou o projeto na direção de captação


do vento dominante no local (leste), criou um duto de ventilação na coberta e inseriu
um elemento de vedação na fachada orientada aos ventos dominantes, que
diminuem a velocidade, puxando o ar para os dutos de ventilação abaixo do telhado
(figuras 63, 64, 65 e 66) (WOOLLEY-BARKER, 2017). Em complementação a essas
soluções, também foi utilizada vegetação na cobertura para amenizar o calor interno
a partir do resfriamento ocasionado pela evapotranspiração das plantas.

42Disponível em: https://sustentarqui.com.br/biomimetica-arquitetura-hotel-bahia/. Acesso em: 09 nov.


2021.
43 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/887431/aprendendo-com-a-natureza-conheca-o-

projeto-do-votu-hotel. Acesso em: 09 nov. 2021.


76

Figura 34 – Diagrama otimização de ventilação e massa térmica, planta baixa e cortes dos
chalés.

Fonte: GCP – Arquitetura e Urbanismo (2018)44. Adaptado (2021).

Outra fonte de inspiração segundo Woolley-Barker (2017) para a solução de


problemas de projeto foram as estratégias de auto-sombreamento utilizadas pelas
cactáceas, especialmente observadas no cacto saguaro, com estrutura formada por
longos espinhos e dobras que conseguem criar uma proteção contra o calor e
exposição solar excessivos (figuras 67 e 68).

44 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/887431/aprendendo-com-a-natureza-conheca-o-


projeto-do-votu-hotel. Acesso em: 09 nov. 2021.
77

Figura 35 – Mapa de calor cacto e diagrama de insolação e estratégia de auto-


sombreamento.

Fonte: GCP – Arquitetura e Urbanismo (2018)45.

Essa estratégia foi utilizada nas soluções para o sistema de vedação do


projeto formado por brises de madeira, que conferem relevo nas fachadas leste e
oeste dos chalés. Além disso, as dobras dos cactos foram transportadas para a
volumetria que possui uma inflexão na parede orientada a oeste que necessita de
sombreamento devido à insolação incidente. Internamente, observa-se que a
coberta é sustentada por paredes curvas de concreto que delimitam o fechamento
do banheiro. Ao lado da porta que dá acesso ao banheiro, observa-se o trecho de
parede perfurada por onde passa o ar que penetra no ambiente segundo o
mecanismo já explicado. Os chalés também possuem varandas delimitadas pela
extensão das paredes semipermeáveis das fachadas leste e oeste (figuras 69 e 70).

45 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/887431/aprendendo-com-a-natureza-conheca-o-


projeto-do-votu-hotel. Acesso em: 09 nov. 2021.
78

Figura 36 – Volumetria e ambiente interno dos chalés.

Fonte: GCP – Arquitetura e Urbanismo (2021)46.

Na cobertura da cozinha, situada no bloco da entrada foi utilizado um teto-


jardim projetado a partir de uma ideia bioinspirada no bico vascularizado do tucano,
que atua no animal como um regulador térmico, ajudando o animal a realizar a troca
de calor com o ambiente e o protegendo das oscilações de temperatura. Essa
estratégia foi utilizada para substituir e eliminar a necessidade de uso de elementos
artificiais de resfriamento (figura 71). O calor da cozinha proveniente dos
equipamentos é dissipado a partir desse mecanismo de inspiração biológica onde o
ar quente sobe por tubos até serpentinas de cobre inseridos no teto-jardim, resfria
por meio das trocas de calor possibilitadas pelo contato com a vegetação e retorna

46 Disponível em: http://www.gcp.arq.br/projetos/votu-hotel/. Acesso em: 10 nov. 2021.


79

para a cozinha. Dessa forma acaba atuando como um condicionador de ar que não
demanda gasto energético (WOOLLEY-BARKER, 2017).

Figura 37 – Estratégia radiador térmico do tucano e aplicação arquitetônica.

Fonte: GCP – Arquitetura e Urbanismo (2018)47.

O projeto de paisagismo do hotel utiliza apenas espécies nativas, respeitando


assim o bioma da área de implantação, e ao mesmo tempo demonstrando uma
sintonia com o local. Nessa perspectiva, a topografia e a drenagem natural do
terreno foram também respeitadas pela elevação dos chalés em relação ao solo, tal
como acontece com as palafitas (figura 72). Essas soluções denotam a conexão
com os princípios da vida que fundamentam a Biomimética, sobretudo ser atento e
responsivo a questões locais tirando proveito de características e fenômenos
existentes no contexto de atuação (QUEIROZ; AGUIAR; ARAÚJO, 2017).

Figura 38 – Palafita e fluxo de água.

Fonte: GCP – Arquitetura e Urbanismo (2021)48.

47 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/887431/aprendendo-com-a-natureza-conheca-o-


projeto-do-votu-hotel. Acesso em: 09 nov. 2021
48 Disponível em: http://www.gcp.arq.br/projetos/votu-hotel/. Acesso em: 09 nov. 2021.
80

Também relacionado a esse princípio, um bosque de bambu foi implantado


no projeto (figura 73), entre a área dos chalés e de lazer, como um sistema similar a
um filtro vivo que impede a chegada de bactérias e poluentes que seriam escoados
para o mar por meio das águas pluviais que caem nas áreas de piso e nas cobertas
das edificações (BIOMIMÉTICA..., 2019)49.

Figura 39 – Setorização do programa planta e corte.

Fonte: GCP – Arquitetura e Urbanismo (2018)50. Adaptado (2021).

Além disso, toda a água cinza produzida será conduzida para o círculo de
bananeiras, situado ao lado da área de carga e descarga, onde será purificada por
meio do processo de evapotranspiração das plantas. Enquanto a água negra será
tratada por meio de um biodigestor e posteriormente conduzida a uma pilha de
adubo que fertiliza um pomar frutífero, localizado entre o bloco de entrada e área
dos chalés (DELAQUA, 2018).

Emular os princípios da vida

A etapa de emulação de acordo com a literatura consiste na aplicação e


experimentação das estratégias biológicas na geração de protótipos até a obtenção
de um produto definitivo (BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019 apud STANM, 2019).
Assim, se faz necessário dizer que não foi obtido material suficiente para descrever

49Disponível em: https://sustentarqui.com.br/biomimetica-arquitetura-hotel-bahia/. Acesso em: 09 nov.


2021.
50 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/887431/aprendendo-com-a-natureza-conheca-o-

projeto-do-votu-hotel. Acesso em: 09 nov. 2021.


81

se foram feitos vários protótipos ou apenas as soluções finais de projeto citadas no


tópico anterior. De toda forma, é possível deduzir que as estratégias e as suas
respectivas aplicações arquitetônicas no projeto do hotel correspondem à emulação
de princípios da vida, como já comentado.

4.1.4 AVALIAÇÃO

A etapa de avaliação diz respeito a validação das soluções definidas pelos


protótipos gerados durante a etapa de emulação dos princípios da vida, que
geralmente acontece a partir de discussões críticas empreendidas de maneira
colaborativa pelos membros da equipe de projeto (BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019,
apud STANM, 2019). Nas fontes de informações utilizadas não foi encontrado
qualquer tipo de registro que aborde esse tipo de informação sobre o projeto e que
pudesse servir de apoio para análise. De toda forma, vale destacar que todas as
estratégias utilizadas foram utilizadas de maneira precisa para alcançar objetivos
bem definidos no momento de definição do escopo.

4.1.5 TIPO DE PROCESSO

Por tudo que foi discutido, é possível também apontar o projeto como sendo
do tipo ‘top-down’ ou “Do Projeto para a Biologia”, utilizado “quando se tem um
problema específico e se está buscando ideias biológicas para a solução”
(BIOMIMICRY 3.8, 2014, apud QUEIROZ; AGUIAR; ARAÚJO, 2017, p. 135). Isto é,
o projeto do Votu Hotel partiu do problema arquitetônico de como implantar o edifício
respeitando o contexto local e, a partir dessa definição, foram buscadas ideias
inspiradas em organismos vivos e mecanismos da biologia. Contudo, deve-se
ressaltar que essa conclusão partiu de uma análise apoiada na literatura, e não no
acompanhamento do processo de projeto em tempo real onde possivelmente seriam
identificados os detalhes de cada uma das etapas.
Outro aspecto que deve ser destacado é a utilização de ferramentas de
design digital durante o processo, em que a equipe de projeto mencionou o uso de
software (apesar de não indicar o nome) para otimização das estratégias de
eficiência energética. Esse tipo de projeto é definido por Kalay (1999) como projeto
baseado no desempenho (Performance-based design) que leva em consideração o
desempenho em diversas instâncias – ambiental, financeiro, ecológico etc. – a fim
82

de se obter soluções ótimas, inclusive no âmbito da forma arquitetônica, o que leva


alguns autores a afirmar que “a forma segue o desempenho”. De acordo com o
autor, isso acontece por meio da interação entre forma, função e contexto, dentro de
um processo generativo, onde o artefato produzido passa por simulações
computacionais de desempenho que possibilitam o refinamento das soluções até se
obter uma solução definitiva.
A ausência dessas informações nos sites pesquisados se apresenta como
uma lacuna na análise que não permitiu o aprofundamento da discussão sobre a
relação entre biomimética e design digital. Porém, aponta indícios de uma
aproximação desse campo de atuação com as ferramentas computacionais e
confirma a ideia de que a Biomimética é um campo transdisciplinar que conecta a
natureza à tecnologia, Biologia, vida, design e inovação (BENYUS, 2002).

4.2 PAVILHÃO LIVMATS – DA BIOLOGIA PARA O PROJETO

4.2.1 DEFINIÇÃO DO ESCOPO

Definir o contexto

O Pavilhão LivMatS se trata de um projeto de arquitetura efêmera executado


por acadêmicos no Jardim Botânico da Universidade de Freiburg, na Alemanha. Foi
construído em 2021 e faz parte de uma série de edifícios experimentais e inovadores
desenvolvidos anualmente por uma equipe interdisciplinar formada por arquitetos e
engenheiros do programa de mestrado ITECH da universidade de Stuttgart, no
Cluster de Excelência “Design Computacional Integrado e Construção para
Arquitetura (IntCDC)” e biólogos do Cluster de Excelência “Sistemas de Materiais
Vivos, Adaptativos e Autônomos em Energia (liv Mats) da universidade de Freiburg
(figuras 74 e 75).
83

Figura 40 – Pavilhão LivMats.

Fonte: ICD/ITKE/IntCDC – Universidade de Stuttgart (2021)51.

De acordo com as informações coletadas no site oficial da Universidade de


Stuttgart (2021), o projeto é o resultado de mais de 10 anos de pesquisa em
construções com fibra. As pesquisas anteriores investigavam a possibilidade de
execução de construções utilizando compostos de fibras sintéticas, como fibras de
vidro e carbono, com o auxílio do design computacional avançado e de suas
ferramentas de simulação de desempenho e fabricação digital. O projeto desse
pavilhão inovou em relação aos anteriores ao pesquisar e utilizar materiais naturais
– a fibra de linho – na produção de um artefato sustentável.

51 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/966381/pavilhao-livmats-icd-itke-universidade-de-


stuttgart. Acesso em: 15 nov. 2021.
84

O principal desafio do projeto foi a substituição dos materiais sintéticos pelos


materiais naturais (que possuem composição heterogênea) e a inserção no
processo de produção que inclui a robótica como ferramenta de execução e
fabricação das peças previamente modeladas em softwares específicos. Nesse
sentido, os “ajustes de modelo de design computacional (...) permitiu que as
propriedades do material heterogêneo alimentassem o design e o planejamento dos
componentes individuais, bem como da estrutura geral” (UNIVERSIDADE DE
STUTTGART, SITE OFICIAL, 2021, tradução nossa).
O projeto não foi idealizado e executado para um local específico, uma vez
que a própria transitoriedade é uma característica da arquitetura efêmera. Contudo,
partiu de uma preocupação com as questões ambientais globais e, nesse sentido, se
contrapõe à produção da indústria da construção do século XX, de materiais nocivos
ao meio ambiente. Segundo o site oficial da Universidade de Stuttgart (2021), o
Pavilhão LivMatS “é um projeto que evidencia as possibilidades de articulação
espacial e estrutural de materiais naturais em conjunto com tecnologias digitais e
que se mostra como uma ‘expressão arquitetônica distinta, porém autêntica” (2021,
tradução nossa).

Identificar uma função

A escolha da função, como já discutido, está atrelada à compreensão dos


impactos gerados no ambiente onde o artefato será inserido (BIOMIMICRY
TOOLBOX, 2019, apud STANM, 2019). Nesse sentido, o pavilhão busca oferecer
uma alternativa tecnológica, viável e eficiente em relação aos métodos de
construção tradicionais (baseados na construção in loco com produção de resíduos)
para que se possa economizar recursos, gerar menos impactos ambientais e
promover sustentabilidade na arquitetura (LIVMATS..., 2021)52.

Integrar os princípios da vida

O projeto utilizou uma estrutura de suporte feita completamente de fibra de


linho, material que possui propriedades mecânicas comparáveis à fibra de vidro,
com rigidez semelhante, mas com um baixo consumo energético dispendido na sua

52 Disponível em: https://www.gooood.cn/livmats-pavilion-2020-21-by-icd-itke-intcdc-livmats.htm.


Acesso em: 15 nov. 2021.
85

produção (LIVMATS..., 2021)53. No processo de fabricação dos elementos


estruturais, estas fibras foram enroladas, na composição de uma trama de fibra de
linho, com o auxílio do aparato tecnológico da robótica, sobretudo de um braço
mecânico manobrado por softwares (PINTOS, 2021) (figuras 76, 77 e 78).

Figura 41 – Auxílio de robótica na produção e detalhe fibra de linho na estrutura.

Fonte: ICD/ITKE/IntCDC – Universidade de Stuttgart (2021)54.

A inserção de uma matéria-prima natural (um material biodegradável de


renovação natural) em um processo de produção caracterizado pelo baixo consumo
energético e baixa produção de resíduos, denota a utilização de Princípios da Vida
que fundamentam a Biomimética: ser eficiente em recursos – a partir da economia

53 Disponível em: https://www.gooood.cn/livmats-pavilion-2020-21-by-icd-itke-intcdc-livmats.htm.


Acesso em: 15 nov. 2021.
54 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/966381/pavilhao-livmats-icd-itke-universidade-de-

stuttgart. Acesso em: 15 nov. 2021.


86

de materiais e energia); ser atento e responsivo a questões locais – utilizando


materiais de fácil acesso – como a fibra de linho disponível na região da Europa
Central; usar química amigável à vida – evitando o uso de material tóxicos e
artificiais; integrar conhecimento e crescimento natural a partir da combinação de
pequenos elementos (as fibras) que interagem na formação de um sistema
complexo (os feixes dos elementos estruturais) (QUEIROZ; AGUIAR; ARAÚJO,
2017).

4.2.2 DESCOBERTA

Descoberta de modelos naturais

O processo de descoberta dos modelos naturais utilizados na concepção do


pavilhão dependeu da relação interdisciplinar entre as equipes de arquitetos,
engenheiros e biólogos da universidade de Stuttgart e Freiburg, que já desenvolviam
pesquisas colaborativas investigando como princípios da natureza podem ser
transferidos para a arquitetura (UNIVERSIDADE DE STUTTGART, 2021).
Sobre o modo como a biologia inspira a arquitetura – no caso desse pavilhão
e de outros projetos executados a partir de princípios naturais – a equipe
interdisciplinar destaca o uso eficiente e econômico de energia e materiais
possibilitado pela reprodução dos sistemas de suporte de carga encontrados na
própria natureza, que se configuram como:

Sistemas de materiais reforçados com fibras e suas estruturas fibrosas [que]


são tipicamente diferenciadas; a orientação, direção e densidade das fibras
são precisamente adaptadas às forças que ocorrem localmente, e nenhum
material é desperdiçado ou usado onde não é necessário (UNIVERSIDADE
DE STUTTGART, 2021, tradução nossa).

Para este projeto em análise, a inspiração veio da estrutura especial de


madeira oca presente nos cactos Carnegia gigantea e Opuntiasp, espécies que
possuem um núcleo cilíndrico de madeira oca, que os faz extremamente leves
(figuras 79 e 80). Estas estruturas em forma de rede dão estabilidade ao esqueleto e
o resultado surge do intercrescimento e entrelaçamento dos elementos de madeira,
compondo feixes de fibras que se dispõem em camadas interconectadas. Segundo a
equipe de projeto:
87

O tecido espinhoso do cacto é caracterizado por uma capacidade


particularmente alta. Ao abstrair essas estruturas de rede, os cientistas
foram capazes de transferir as propriedades mecânicas das estruturas de
fibra reticulada para os elementos leves do pavilhão (UNIVERSIDADE DE
STUTTGART, 2021, tradução nossa).

Figura 42 – Estrutura cactos.

Fonte: ICD/ITKE/IntCDC – Universidade de Stuttgart (2021)55.

Essas informações ratificam que o momento de descoberta na Biomimética


compreende a investigação interdisciplinar de organismos e ecossistemas que
podem ajudar a resolver o desafio de projeto em questão por desempenharem a
mesma função em um contexto de vida análogo (BIOMIMICRY TOOLBOX, 2019,
apud STANM, 2019).

Resumo de estratégias biológicas

Assim como no projeto do Votu Hotel, seria necessário um maior


conhecimento do processo de desenvolvimento do projeto em questão junto à
equipe, para saber como as reflexões foram construídas e quais estratégias, além
das apontadas no discurso da equipe interdisciplinar, foram consideradas enquanto

55 Disponível em: https://www.gooood.cn/livmats-pavilion-2020-21-by-icd-itke-intcdc-livmats.htm.


Acesso em: 15 nov. 2021.
88

possibilidades projetuais. Contudo, é possível deduzir que desde o começo as


reflexões se centraram na pesquisa de um material natural fibroso mais eficiente e
sustentável dos que os materiais sintéticos até então utilizados nos experimentos
dentro dessa universidade.

4.2.3 CRIAÇÃO

Brainstorm de ideias bioinspiradas

O desenho bioinspirado criado a partir das estratégias citadas na fase de


descoberta é uma estrutura de fibra de linho em forma de rede (figuras 81, 82 e 83),
que apresenta uma estabilidade estrutural típica de determinadas espécies de
cactos que possuem capacidade de suporte de cargas devido a essa constituição
natural das paredes em trama. De modo geral, isso sintetiza o conjunto de ideias
que orientaram a produção do artefato na etapa de criação.

Figura 43 – Vista interna do pavilhão e modelos de análise estrutural - redes.


89

Fonte: ICD/ITKE/IntCDC – Universidade de Stuttgart (2021)56.

No caso desse artefato, é impossível falar da etapa de criação sem citar as


ferramentas do design digital que possibilitaram o seu desenho e execução. A
concepção dessa complexidade formal só foi possível com a utilização de softwares
de desenho paramétrico e equipamentos de robótica e fabricação digital.
O desenho paramétrico se relaciona a um processo de projeto que faz uso de
algoritmos – em softwares específicos como o Rhinoceros juntamente com o plugin
Grasshopper – para geração de formas a partir de regras ou dados pré-
estabelecidos (LARA, 2016). Em suma, quando se alteram os dados de entrada do
algoritmo – que no caso da arquitetura são dados geométricos como circunferências,
curvas etc. – a forma é automaticamente modificada pelo software. Nesse caso, o
projetista não projeta formas e sim os algoritmos que geram a forma por meio de um
processo interativo e dinâmico.
A fabricação digital é um termo proposto para designar todas as tecnologias
disponíveis para a produção de artefatos físicos. Estas possibilitam a realização da
interface entre o desenho paramétrico e o processo de construção por meio de
máquinas específicas como a impressora 3D (PUPO, 2016). Nesse âmbito, a
interface das áreas digital e material se torna possível com o uso de técnicas de
fabricação digital que “permitem ao arquiteto controlar processos de fabricação por
meio de dados de projeto, o que transforma as possibilidades e, assim, o escopo
profissional do arquiteto” (GRAMAZIO; KOHLER, 2008, apud PUPO, 2016, p. 98).

56 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/966381/pavilhao-livmats-icd-itke-universidade-de-


stuttgart. Acesso em: 15 nov. 2021.
90

No caso do pavilhão, os elementos estruturais foram gerados digitalmente a


partir do desenho paramétrico e de algoritmos que determinaram o padrão de
enrolamento dos filamentos de fibras naturais, enquanto a fabricação digital
possibilitou a execução das peças por meio da adição de fibra por fibra (manufatura
aditiva) com o auxílio de robôs que garantiram a execução dos feixes com extrema
precisão (UNIVERSIDADE DE STUTTGART, 2021) (figuras 84 e 85).

Figura 44 – Desenho paramétrico com definição de padrões de enrolamento de fibras


naturais e visão geral da sequência de enrolamento final.

Fonte: ICD/ITKE/IntCDC – Universidade de Stuttgart (2021)57. Adaptado (2021).

57 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/966381/pavilhao-livmats-icd-itke-universidade-de-


stuttgart. Acesso em: 15 nov. 2021.
91

Segundo os pesquisadores, a forma dos elementos estruturais surge apenas


por meio da interação das fibras dentro da moldura do enrolamento (figura 86), que
acaba por eliminar a necessidade de molde ou núcleo adicionais para sua
construção. Além disso, esse método de fabricação produz sem desperdícios de
material e de fôrmas, uma vez que a mesma moldura de enrolamento e a mesma
estrutura de enrolamento modular poder ser usada na fabricação de outros
elementos com padrões geometricamente variáveis. (LIVMATS..., 2021)58.

Figura 45 – Interação das fibras dentro da moldura do enrolamento – configuração de


fabricação robótica.

Fonte: ICD/ITKE/IntCDC – Universidade de Stuttgart (2021)59.

Como resultado, a forma do pavilhão se configura como um elemento de


coberta autoportante, recoberto com material transparente (pele de policarbonato à
prova d’água) para proteção das fibras, a partir da junção de 15 elementos
estruturais de fibra de linho fabricados digitalmente (figuras 87, 88 e 89). que variam
em comprimento total entre 4,50m e 5,50m, pesando em média 105kg cada.

58 Disponível em: https://www.gooood.cn/livmats-pavilion-2020-21-by-icd-itke-intcdc-livmats.htm.


Acesso em: 15 nov. 2021.
59 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/966381/pavilhao-livmats-icd-itke-universidade-de-

stuttgart. Acesso em: 15 nov. 2021.


92

Figura 46 – Componente finalizado, vista superior e corte do pavilhão.

Fonte: ICD/ITKE/IntCDC – Universidade de Stuttgart (2021)60. Adaptado (2021).

60 Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/966381/pavilhao-livmats-icd-itke-universidade-de-


stuttgart. Acesso em: 15 nov. 2021.
93

Devido à leveza do material, o pavilhão consegue cobrir uma área de 46m²


pesando apenas 1,5 tonelada (UNIVERSIDADE DE STUTTGART, SITE OFICIAL,
2021), aspecto que se apresenta como uma vantagem em relação aos materiais de
construção convencionais porque resulta em uma alta capacidade de carga com um
baixo consumo de materiais (NILAND, 2021).

Emular os princípios da vida

As estratégias e as suas respectivas aplicações arquitetônicas no projeto do


pavilhão correspondem à emulação de princípios da vida, como já comentado.
Assim como no projeto do Votu Hotel, não foi obtido material suficiente para
descrever se foram feitos vários protótipos ou apenas a solução de projeto citada no
tópico anterior. Porém, é possível deduzir que além do uso de máquinas de
fabricação digital, também podem ter sido utilizadas máquinas de prototipagem
rápida para produção de modelos reduzidos antes de se obter uma solução
definitiva.

4.2.4 AVALIAÇÃO

Nas fontes de informações utilizadas não foi encontrado, assim como no caso
do primeiro projeto analisado, qualquer registro que indique como a equipe
interdisciplinar de projeto validou as soluções dos protótipos gerados durante a
etapa de emulação dos princípios da vida. De toda forma, vale destacar que a
eficiência construtiva obtida no pavilhão, definida pela alta capacidade de carga com
um baixo consumo de materiais (NILAND, 2021), provavelmente implicou na
avaliação de modelos reduzidos nesse processo que é caracterizado pela
experimentação de soluções arquitetônicas inspiradas na natureza.

4.2.5 TIPO DE PROCESSO

Por tudo que foi discutido, é possível também apontar o projeto como sendo do
tipo ‘bottom-up’ ou “Da Biologia para o Projeto”, utilizado “quando o processo inicia
com uma visão biológica inspiradora (...) e que se deseja manifestá-la como um
projeto (BIOMIMICRY 3.8, 2014, apud QUEIROZ; AGUIAR; ARAÚJO, 2017, p. 135).
Isto é, o projeto do Pavilhão LivMatS (de maneira inversa ao projeto do Votu Hotel)
94

partiu do interesse na investigação de um organismo vivo e, a partir do estudo e da


pesquisa científica, realizou a transposição das suas características biológicas para
a materialidade da arquitetura com o auxílio das tecnologias digitais.
Diferente do primeiro projeto analisado neste capítulo, foi possível expandir a
discussão sobre a relação entre biomimética e design digital a partir da coleta de
informações sobre as ferramentas que foram utilizadas na fabricação e concepção
do projeto. Além do desenho paramétrico, da fabricação digital e da robótica, deve-
se destacar que o pavilhão se enquadra no processo de projeto digital denominado
de morfogênese. Em síntese, morfogênese significa que a origem da forma está
associada a processos que empregam as ferramentas de tecnologias digitais como
dispositivos capazes de potencializar a geração da forma e de suas transformações,
assim como a construção dos próprios processos de conceitualização e fabricação
(MENGES, 2007, apud PAIO, 2016). No caso do pavilhão, isso foi observado nas
transformações experimentais dos padrões de enrolamento dos feixes de fibra
natural que, ao final do processo, geraram uma forma otimizada que associa alta
resistência estrutural, leveza e consumo reduzido de materiais.

4.3 CONVERGÊNCIAS: ANTECEDENTES ARQUITETÔNICOS E BIOMIMÉTICA

A partir do estudo das características das produções arquitetônicas


apresentadas no capítulo 1, dos fundamentos biomiméticos apresentados no
capítulo 2 e das análises feitas no capítulo 3, foi possível identificar as
convergências entre a biomimética e os antecedentes arquitetônicos que já
abordavam a relação entre arquitetura e natureza, apesar dos cinco arquitetos
estudados apresentarem divergências quanto ao seu modus operandi, e apesar das
experiências recentes também apresentarem diferenças quanto às estratégias
utilizadas e ao tipo de processo adotado.
Enquanto características convergentes, foram identificadas: a preocupação
ecológica, que inclui o respeito ao contexto local (escala local) e ao planeta (escala
global); a economia de energia e materiais, relacionada a busca do melhor
desempenho utilizando o mínimo de recursos; a capacidade adaptativa dos
organismos ao seu meio natural enquanto característica transposta para a
materialidade da arquitetura; a analogia a processos biológicos de
autoformação, que vai além das analogias formais e se ocupa da analogia dos
95

mecanismos naturais capazes de qualificar o espaço construído; abordagem


holística a partir do entendimento e consideração de todos os aspectos do contexto
de atuação, sobretudo os ambientais; e a transdisciplinaridade por meio da
colaboração profícua, ao longo do processo de projeto, entre profissionais das áreas
da arquitetura, engenharia, biologia, química etc. (quadro 2).

Quadro 02 - Convergências entre os arquitetos pesquisados e biomimética (cinza) e


avanços da biomimética (sem realce).
ANTECEDENTES ARQUITETÔNICOS BIOMIMÉTICA
PREOCUPAÇÃO ECOLÓGICA PREOCUPAÇÃO ECOLÓGICA
ECONOMIA DE ENERGIA E MATERIAIS ECONOMIA DE ENERGIA E MATERIAIS
CAPACIDADES ADAPTATIVAS CAPACIDADES ADAPTATIVAS
ANALOGIA A PROCESSOS BIOLÓGICOS DE ANALOGIA A PROCESSOS BIOLÓGICOS DE
AUTOFORMAÇÃO AUTOFORMAÇÃO
ABORDAGEM HOLÍSTICA ABORDAGEM HOLÍSTICA
TRANSDISCIPLINARIDADE TRANSDISCIPLINARIDADE
SISTEMATIZAÇÃO DO PROCESSO DE
PROJETO INSPIRADO NA NATUREZA
USO DE FERRAMENTAS DE DESIGN
DIGITAL COMO SUPORTE AO PROJETO
Fonte: o autor (2021).

Apesar dessas convergências, a biomimética avança em relação aos


antecedentes arquitetônicos em dois aspectos principais. O primeiro é a
sistematização do processo de projeto, denominado Biomimicry Thinking, que
fornece todas as etapas a serem percorridas para a obtenção de um artefato
bioinspirado independente da escala e do uso (tal como exemplificado pelo Votu
Hotel e pelo Pavilhão LIVMATS, que possuem usos e escalas completamente
distintas). Além disso, são apontadas duas possibilidades para o desenvolvimento
de projetos, um processo linear – que busca inspiração na natureza para resolver
um problema arquitetônico (Do Projeto para a Biologia) – e um processo não linear
– onde uma solução da natureza inspira a arquitetura a expandir os seus limites por
meio da experimentação de soluções inovadoras (Da Biologia para o Projeto). O
trabalho dos cinco arquitetos investigados no capítulo 1, apesar das características
em comum, não estava vinculado a um movimento específico com conhecimentos
sistematizados.
E o segundo aspecto é o uso de ferramentas de design digital como
suporte ao projeto, que proporciona um avanço no campo da experimentação de
formas complexas e do emprego de novos materiais, inclusive naturais, por meio de
softwares, máquinas de fabricação digital e robôs. Ao observar os antecedentes,
96

percebe-se que os cinco arquitetos pesquisados inovaram em vários aspectos de


acordo com a tecnologia disponível na época. Porém, na produção arquitetônica
recente (como explicitado no projeto do Pavilhão LIVMATS), o design digital pode
potencializar, por meio do seu aparato tecnológico, a obtenção dessas inovações.
Dentre os cinco, Calatrava foi o que mais utilizou e utiliza essas ferramentas para a
criação das suas formas da natureza.
97

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desenvolvimento deste trabalho possibilitou a compreensão de formas


distintas de aproximação entre arquitetura e natureza a partir de experiências
antigas e recentes. Nesse sentido apresenta uma tripla contribuição que envolve os
campos da teoria crítica da arquitetura, da teoria do projeto e do design digital.
No campo da teoria crítica da arquitetura, esse estudo possibilitou a
compreensão, sob uma perspectiva histórica, da produção arquitetônica inspirada na
natureza num intervalo de tempo que inicia no fim do século XIX e chega até o
século XXI. Nesse intervalo, foi visto que os arquitetos estudados, apesar das
diferentes épocas de atuação e da vivência em diferentes contextos mundiais,
possuem características convergentes em suas maneiras específicas de incorporar a
vida, a biologia e a preocupação com o planeta em seus projetos.
No campo da teoria do projeto, a principal contribuição deste trabalho reside
na compreensão dos fundamentos que podem ser utilizados na produção de
qualquer artefato bioinspirado. Além disso, a pesquisa contribuiu com a explicitação
das etapas dos processos de projeto vinculados ao Biomimicry Thinking, que podem
ser experimentadas por professores e estudantes na academia (onde esse tema
ainda é pouco discutido, pelo menos ao nível de graduação) e por profissionais
atentos à sustentabilidade (condição instríseca à produção da arquitetura
Biomimética).
No campo do design digital, esse estudo mostra que a tecnologia pode ser
aliada da arquitetura na inovação e principalmente na produção de projetos
responsivos à questões locais, a partir da preocupação ecológica, da priorização da
economia de materiais e energia, das capacidades adaptativas, da visão holística e
da transdisciplinaridade. Nesse âmbito, aponta-se a necessidade de produzir
estudos e pesquisas futuras que apronfudem a discussão sobre o potencial da
estreita dependência entre Design digital e Biomimética.
Não obstante, poderiam produzir bons resultados pesquisas focadas no
acompanhamento de processos de projeto em tempo real, uma vez que
possibilitariam não só a identificação das etapas do Biomimicry Thinking (definição
do escopo, descoberta, criação e avaliação) mas os caminhos que podem ser
percorridos entre elas na produção de artefatos arquitetônicos. Esse tipo de
pesquisa seria capaz de avaliar quais os tipo de processo que produzem os
98

melhores resultados: o linear ou o não linear, ‘Do Projeto para a Biologia’ ou ‘Da
Biologia para o Projeto’.
Por fim, recomenda-se que os estudos futuros nesse campo de pesquisa
incorporem a análise de uma quantidade maior de projetos arquitetônicos a fim de
se obter uma compreensão mais ampla das especificidades da produção
arquitetônica contemporânea inspirada na natureza. Uma vez realizadas, essas
pesquisas seriam capazes de estimular produções teóricas e práticas que tivessem
como motivação principal utilizar a arquitetura como elo de (re)conexão entre
homem e natureza.
99

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