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Perfil

Poesias selecionadas de Elizeu para o site Poetas Del Mundo

Elizeu filho de Orpheu

Eu me chamo Elizeu
filho de Orpheu.
Não tenho partido
e perdido caminha o homem
que caiu ao solo dos tolos.

Eu me chamo Elizeu
filho de Orpheu.
Carrego a flecha
do Super-Homem
para cravar a maçã.

Eu me chamo Elizeu
filho de Orpheu.
Levanto a pedra
que amanheceu
tomada de fogo.

Eu me chamo Elizeu
filho de Orpheu.
Desejo a rosa
que se eleva
até a luz do céu.

Poema para guardar as coisas

Guarda as coisas
que são tuas
para que ninguém
possa roubá-las;
guarda-as debaixo
da Pedra oculta,
para que o Tempo
não as destrua;
guarda,
mas não as esconda;
necessariamente
guarda as coisas
no teu coração.

Elizeu Moreira Paranaguá


Castro Alves – BA (1963)

ELIZEU MOREIRA PARANAGUÁ nasceu na cidade de Castro Alves, em 1963.


Reside em Salvador desde 1981. Publicou os livros Poema Terra Castro Alves (1992),
onde são cantados as ruas e becos de sua cidade, e O Fogo do Invisível (2006), trabalho
que apresenta a profundidade da sua poética existencialista. Participou das antologias
Sete Cantares de Amigos (2003) e Concerto Lírico a Quinze Vozes (2004). Editou, ao
lado de José Inácio Vieira de Melo, a revista CEPA/Poesia, no biênio 1999/2000.
Idealizou e coordenou os projetos Imagem do Verso (2000/2001) e Expressão da Poesia
(2003/2006), em Salvador. Seus poemas têm sido publicados em importantes revistas
literárias, como a Iararana, e suplementos culturais, como o A Tarde Cultural e o
Panorama da Plavra. Ruy Espinheira Filho afirma em Poema Terra Castro Alves que
"Lar é de onde se vem - diz o poeta T. S. Eliot. O que se vê, aqui, neste Poema Terra
Castro Alves de Elizeu Moreira, é o canto do que partiu, do que se aportou do lar – e
agora, através dos seus versos, realiza a viagem inversa, retornando ao mundo de onde
veio. Elizeu Moreira Paranaguá canta a sua terra, mas canta sobretudo sua própria
emoção ao evocar uma vida. " Sobre O Fogo do Invisível o crítico e poeta Antonio
Carlos Secchin comentou: “Luz, fogo, brasa e outros signos ígneos pontuam a poesia de
Elizeu Moreira Paranaguá, que, num mundo vazio de deuses, delega à fúria do verbo
poético a missão de substituí-los.” Elizeu Moreira Paranaguá vais se apresentar no
projeto Uma Prosa Sobre Versos, na próxima sexta-feira, dia 11 de abril de 2008, na
cidade de Maracás, na Bahia. (Fotografia do poeta: Ricardo Prado).

O SOM E O SENTIDO

O som que se ouve


vem da lagoa
que abriga os seres.

O som que se espalha


invade a casa azul
cujo telhado é forrado
de estrelas e de palhas.

Ouço vozes que aprofundam


o sentido
entre os pássaros
e os grilos.

Ouço vozes que se harmonizam


entre o ruído
do Universo
e a Pedra Só.

ELIZEU MOREIRA PARANAGUÁ

A Poesia Emotiva de Elizeu Moreira Paranaguá


01-04-2005 10:04:49
Gilfrancisco *

A poesia é uma forma de expressão lingüística


destinada a evocar sensações, impressões e emoções,
por meio da união de sons, ritmos e harmonia e
utilizando uma relação de vocábulos essencialmente
metafórica. Por isso a poesia diferenciasse da prosa
por não se fundamentar tanto nas normas lógicas da
língua, mas sim nas imposições do ritmo,
determinado pelo talento do poeta, pelo aspecto
sonoro das palavras e pela associação dos
significados.

O poeta Elizeu Moreira Paranaguá vive o destino que


para si escolheu, encontrou na poesia o intérprete fiel
de sua alma verdadeira. Porque ele sabe que existem
homens incapazes de olhar até o fim o espetáculo do
mundo e da história dos próprios homens. Este poeta
de que lhes falo é um homem do diálogo, do debate,
que passou anos lutando para mostrar sua poesia, apesar de somente ter um livro
publicado “Poema Terra Castro Alves”, 1992, Elizeu Moreira possui uma obra
dispersa ou inacabada, em grande parte inédita.

Num meio estagnado, sua obscura aparição em Salvador, coincide com a


predominância de grupos literários subjugados pela vaidade estéril de pensar sobre
o existente, povoando a resistência desse poder. Apesar de não poder negar a
influência desses poetas e das gerações anteriores, não deixou sem dúvida de se
exercer sobre ele influência real dos poetas em voga. O choque cultural produzido
no meio intelectual tem algo semelhante à queda dum enorme aerólito vindo de
outras esferas alterar a face da terra.
Poeta que precisa da realidade, imagens vivas e verdadeiras, apesar de trabalhar
em via de mão dupla, faz uma poesia que interessa – e muito – às antenas
cosmopolitas, porque deixa a marca indelével de seus passos em todos os
caminhos que percorre. Pelo jeito aceso de ser pensante e criador, ousou uma
poesia na qual o poeta se revela e se faz presente, de consciência perfeita, plena
da transitoriedade dos homens e das coisas. Elizeu também esteve ligado durante
muitos anos ao CEPA (Círculo de Estudos Pensamento e Ação), agremiação fundada
nos anos 50, da qual fez parte o jovem Glauber Rocha, continua sendo dirigida pelo
filósofo Germano Machado, onde ganhou asas e voou para fora, migrando para
outros espaços.

Não me lembro exatamente da primeira vez que o vi, mas posso assegurar que
esse encontro se deu no início dos anos oitenta, quando recém chegado do
recôncavo Baiano, do município de Castro Alves, fez parte da agremiação literária
CEPA, onde foi Relações Pública e editor da Revista CEPA Cultural, ao lado do poeta
alagoano José Inácio Vieira de Melo. Sua inclusão nos círculos literários na Bahia,
se deu timidamente; primeiro colaborando em “Letra Viva”, página do Caderno
Cultural do Diário Oficial do Estado, época em que estivemos juntos em vários
eventos promovidos pelo CEPA.

Este ex-cepista teve uma participação marcante na divulgação da cultura baiana.


Entre as suas produções estão alguns artigos que divulgou através das páginas da
Revista CEPA, dois me chamaram à atenção na época: “Um Breve Ângulo da Poesia
de Castro Alves” e “Um Verso e Universo da Poesia de Pound”, além das entrevistas
“Uma Voz para Combater o Racismo”, com o sociólogo Manuel Almeida Cruz e
“Uma Visão dos Anos 50 em Torno do CEPA”, com o poeta Carlos Anísio Melhor.

Os tempos tinham mudado. A sua ressurreição fez o poeta aparecer sob novas
vestes, tangenciando os males, persistindo na temática do mundo, com seus
componentes rítmicos e métricos, bem como às dificuldades e as soluções
encontradas em cada verso. A obra de Elizeu Moreira conseguiu produzir uma
expressão poética capaz de profunda ressonância. É bem verdade que o processo
de montagem e desmontagem do poema favorece a revelação. É com essa
disposição que o poeta castroalvense enfrenta a realidade para sentir
verdadeiramente o caos que está reservado e pronto a se revelarem.

Por isso o poema aflora do subconsciente e o poeta Elizeu Moreira Paranaguá


trabalha cada verso como artefato lógico, que se procura montar sem interferência
de elementos fortuitos ou casuais. Assim nasceram alguns dos seus mais
conhecidos poemas como “Poema Terra Castro Alves”. Sobre esse poema, vale
dizer, em relação a um momento histórico do passado, o período da infância, dos
mitos, das alegrias, das brincadeiras, dos lugares visitados. Por outro lado, a
sobreposição dos tempos implica a sobreposição de imagens, colocando o problema
sob duas perspectivas diferentes: a do adulto em face da infância interiorana, a do
homem urbano em face do desconhecido.

Na geografia da vida
- o ser é aquele,
que em sua circunstância,
de realidade
é o que é por si próprio.

E mais adiante:

o tempo se estende
no poema da existência.
O amor se desdobra
como as pontas do sol
- para dentro de minha alma.

A poesia de Elizeu Paranaguá sempre abre as portas de uma viagem cheia de


surpresas, trazendo soluções tão felizes, por mais cavadas e sutis que pareçam. O
poeta parece deixar o poema como que flutuar por algum tempo dentro do seu
espírito à espera de certos pontos de fixação. Foi o poeta Antonio Carlos de Oliveira
Barreto, autor do livro “Uns Versus Outros” (1995), que me chamou a atenção para
sua recente produção, me confidenciando seu amadurecimento humanista na forma
de pensar sobre o mundo, de ver as coisas como elas realmente são. Isso prova o
seu crescimento, suas novas investidas, seu atrevimento saído daquele sonho
perturbador e impossível.

Encontro agora, na apresentação que Maria da Conceição Paranhos escreveu para


“Sete Cantares de Amigo”, organizado por Miguel Antônio Carneiro, seleção e notas
de José Inácio Vieira de Melo, Edições Arpoador (2003), algumas observações
muito pertinentes sobre Elizeu Moreira Paranaguá. Observa Paranhos que “Para
Elizeu, o mundo se mostra como enigma a ser decifrado, mas apenas a poesia é
capaz de o fazer, como se lê em Correndo Atrás da Imagem – em que a imagem
várias vezes repetida nos seus poemas, a do rio, constitui uma ameaça de
dissolução, já que equivale ao tempo (V. também o Poema do Rio), e o poeta
enfrenta o risco e nele imerge sob a forma do anjo de luz, correlato objetivo para a
poesia, e, por extensão, para o poeta.”

O rio habita a geografia


da minha orla
e o anjo de luz
mergulha nele.

Angustiado pela pressão dos modelos de gerações anteriores, força que regiam a
atividade da vida literária na Bahia, e insuficiente para dar conta das novas
necessidades, Elizeu Paranaguá rompe o círculo de ferro que emperrava as
modificações de alteração da ordem vigente; Para produzir uma poesia que
refletisse dois momentos diversos, articulando as noções de distância e
desaparecimento – de vida e morte, que significa seu próprio caos. Por isso é
desligado de qualquer coisa que limite a sua espontaneidade.

Pedra do Caos, livro inédito, que reúne uma parte significante da sua obra, a ser
publicado pela Fundação Cultural do Estado, através da coleção editorial Selo Bahia
é um livro carregado de emoções, resultado de uma conquista notável, que irradia
a própria vida do poeta. Ou como disse o poeta Ezra Pound, a poesia é a forma
carregada de significado ao último grau.

* Jornalista, pesquisador e professor universitário

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