E STA D O D E M I N A S ● D O M I N G O , 1 1 D E A B R I L D E 2 0 0 4

GERAIS 21
ESTRADAS

Motoristas correm grande risco de acidentes ao enfrentar sono, cansaço e muitas horas
de viagem para trazer pacientes de cidades do interior para hospitais de Belo Horizonte
FOTOS SIDNEY LOPES

Muitos veículos chegam à capital mineira, vindos de várias regiões de Minas Gerais, rodando mais de 700 quilômetros por dia, em viagens que muitas vezes começam no meio da madrugada

Ambulâncias do perigo EDUARDO HYBNER

Os olhos vermelhos e arregalados indicam que o sono foi

curto. Falta pouco para chegar ao destino - a região hospitalar de
Belo Horizonte, para onde traz pacientes para consultas e exa-
mes - mas o motorista José Salvador, de 40 anos, que saiu de Pe-
dra Azul, a 720 quilômetros de BH, no Vale do Jequitinhonha, e
no começo da manhã de quinta-feira chegava à capital pela BR-
381 (BH-João Monlevade), assegurava que não estava cansado.
“Não rodei direto, parei para dormir”, garante. Mas o rosto
marcado, como o de dezenas de outros motoristas de ambulân-
cias de prefeituras do interior, que todos os dias chegam à re-
gião hospitalar da cidade, é um sinal de que a viagem foi dura.
Como ele, muitos outros enfrentam o mesmo desafio dia-
riamente e vão mais além. Depois da viagem cansativa, eles
também marcam consultas para pacientes, conversam com os
médicos, pegam resultados de exames e até fazem outros pe-
quenos serviços.
As condições precárias de trabalho desses profissionais fica-
ram mais evidentes depois do acidente com a ambulância Fiat
Ducato, que saiu de Coronel Fabriciano, a 198 quilômetros da
capital, no Vale do Aço, para fazer o transporte de pacientes pa-
ra hospitais da capital. O veículo ba-
teu de frente em uma carreta, na
noite de 29 de março, na BR-381, mu-
nicípio de Nova União, matando cin-
co pessoas, incluindo o motorista,
Hilton Ribeiro Gomes, de 45. Segun- A gente fica de
do testemunhas, ele teria invadido a
contramão depois de uma curva. olho aberto, mas
Pesquisa da Associação Brasileira
de Engenharia Automotiva/Scarin- a mente está
gella Trânsito aponta que o fator hu-
mano - que inclui cansaço, estresse e praticamente
condições físicas e mentais dos con-
dutores - é responsável por mais de dormindo. É um
80% dos acidentes urbanos e rodo-
viários registrados no País. trabalho muito
Os órgãos de saúde e as polícias
rodoviárias Estadual e Federal não cansativo
têm estatísticas sobre o número de
acidentes com veículos que fazem
transporte de pacientes entre a capi-
tal e o interior e chegam até a infor- ■ Antônio Canuto
mar que é inexpressivo, mas os con- Motorista
dutores que estão nas estradas todos
os dias sabem que a história é diferente. “A gente fica de olho
aberto, mas a mente está praticamente dormindo. É um traba- Antônio Canuto, de 50 anos, traz pacientes, todos os dias, de Santo Hipólito, a 241 quilômetros de Belo Horizonte, para tratamento na capital
lho muito cansativo”, diz o motorista Antônio Canuto, de 50,
que diariamente traz pacientes do município de Santo Hipóli-
to, a 241 quilômetros de BH, na região central do Estado, para
consultas e exames em hospitais da capital. Um dos carros da
prefeitura usado no transporte das pessoas capotou recente- ACIDENTES DE TRÂNSITO
mente em uma estrada de terra próxima a Cordisburgo, quan-
do o motorista retornava à cidade com pacientes.
Fatores de risco identificados nas amostras de desastres
“Ele disse que não sabe o que ocorreu, que deu um ‘branco’. urbanos e rodoviários (em %)
Mas a verdade é que quando o condutor está cansado, o risco
82,4
de acidentes é maior. Felizmente, ninguém se machucou”, com-
pleta. A rotina de trabalho de Antônio não é fácil. Ele acorda to-
dos os dias às 2h, enfrenta quase 250 quilômetros de estradas
ruins e trechos de terra e, depois de quatro horas de viagem, 37,6
chega a Belo Horizonte, onde afirma conhecer mais de 30 esta- 27,1
18,8
belecimentos de saúde. “O cansaço e o sono batem sempre. Aí,
não tem jeito: é parar, tomar um café e lavar o rosto. Às vezes, é
preciso dormir um pouco”, afirma. Condutor Pedestre Veículo Meio
ambiente

❚ LEIA MAIS SOBRE AMBULÂNCIAS DO PERIGO

PÁGINA 22 ❚ FONTE: Associação Brasileira de Engenharia Automotiva