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UnB - Faculdade de Ciências da Saúde - FS

Farmácia Clínica/ Hospitalar


Atualização Farmacológica

(*) Profª Drª Patrícia Medeiros de Souza


(**)Profª Samara Haddad Simões Machado e Prof. Sérgio Augusto C. D. N. Júnior
(***)Ana Carolina Perdigão, Thais Almeida e Marianne Maciel

Antieméticos

Introdução

Náuseas e vômitos são efeitos adversos comuns. São sintomas muito comuns no início da
gravidez (cinetose), nas exaquecas, na quimioterapia, dentre outros. O tratamento é
direcionado de acordo com a causa. Porém, mesmo quando a etiologia da náusea não é
conhecida, ela pode ser tratada com antiémeticos. 4,11
O processo de êmese é coordenado pelo centro do vômito localizado na formação reticular do
bulbo. Esse centro recebe estímulos das fibras aferentes viscerais, das fibras vestibulares e da
zona deflagradora dos quimiorreceptores (CTZ). A estimulação visceral ocorre através da
liberação de dopamina e serotonina. Já a estimulação vestibular ocorre através da histamina e
da acetilcolina 11. Estes mecanismos estão ilustrados na figura 1.

A CTZ estimula o centro do vômito através da dopamina e serotonina1. A sua localização é


na base do 4º ventrículo em uma área em que a barreira hematoencefálica é pouco
desenvolvida. A CTZ é sensível a diversos estímulos químicos (como substâncias eméticas) e
é dotada de receptores para dopamina, histamina e acetilcolina3.
A histamina, a acetilcolina, a serotonina e a dopamina são os principais neurotransmissores
envolvidos na êmese. O tratamento é baseado de acordo com os a via e neurotransmissores
envolvidos11. Os antieméticos classificam-se da seguinte forma:

· Anti-histamínicos e anticolinérgicos
· Antagonistas dos receptores 5-HT3
· Antagonistas dos receptores D2
· Canabinóides
· Glicocorticóides
· Benzodiazepínicos

Aspectos Farmacológicos

Anti-histamínicos e Anticolinérgicos

Dimenidrinato(DRAMIN ®), hidroxizina, ciclizina e difenidramina, todos têm ações


antagonistas no receptor H1 e podem agir no centro do vômito e nas vias vestibulares. Esses
compostos são particularmente úteis na profilaxia e tratamento de distúrbios do movimento e
no controle da êmese seguinte à cirurgia auricular média. Desconhecem-se os efeitos
antieméticos destes fármacos podendo ser secundários ao bloqueio específico de receptores de
histamina no SNC ou a ações em outros sítios receptores com atividade antimuscarínica12. Os
anti-histamínicos como Dimenidrinato e difenidramina têm ação sedativa e anticolinérgica,
suprimindo o estímulo motor na via vestibular neuronal, resultando na ação antiemética4.
Tem sido sugerido que sítios do receptor colinérgico estão presentes no córtex cerebral e
ponte, e que compostos com atividade específica nesses receptores são fármacos efetivos
antieméticos12. A escopolamina (transdérmica) é o principal agente antimuscarínico com
atividade no SNC. Este fármaco bloqueia os receptores M1 no córtex cerebral, na ponte, os
receptores H1 no hipotálamo e no centro do vômito4. A biodisponibilidade oral da
escopolamina é limitada (11-48%). A escopolamina transdérmica foi desenvolvida tentando-
se aumentar a duração da ação enquanto diminuiu os efeitos adversos relacionados à dose,
mas ainda apresenta efetividade limitada e um tempo de início longo12.
Anti-histamínicos e anticolinérgicos são eficazes em pacientes com náuseas decorrente da
estimulação do SNC (medo e ansiedade) e das fibras vestibulares. Também são indicados para
o tratamento da náusea secundária a vertigem e distúrbios motores. Isoladamente, estes
agentes têm efeitos modestos contra a êmese induzida pela quimioterapia11.

Efeitos adversos

Tanto os anti-histamínicos como os anticolinérgicos podem ter efeitos adversos


anticolinérgicos, incluindo boca seca, retenção urinária, visão embaçada e exacerbação do
glaucoma11.

Interações Medicamentosas8

Os anti-histamínicos sedativos podem aumentar o efeito sedativo de depressores do SNC


como o álcool, barbitúricos e analgésicos opióides, sedativos ansiolíticos e hipnóticos. Eles
também possuem um efeito antimuscarínico aditivo com outros fármacos antimuscarínicos
como a atropina e alguns antidepressivos (tricíclicos e IMAO).
Foi sugerido que alguns anti-histamínicos sedativos, como o dimenidrinato, podem mascarar
os sinais de danos causados por fármacos ototóxicos como os antibióticos aminoglicosídicos.5
A difenidramina inibe a isoenzima CYP2D6, que é parcialmente responsável pelo
metabolismo do metoprolol e da venlafaxina.
A ciclizina pode equilibrar os benefícios hemodinâmicos dos opióides.
Há relatos de que a difenidramina poderia prejudicar a absorção entérica do ácido
aminosalicílico, em decorrência, possivelmente, do seu efeito sobre a motilidade
gastrintestinal.5
O efeito sedativo da escopolamina pode ser aumentado por álcool ou outros depressores do
SNC. Os efeitos antimuscarinícos podem ser aumentados pelo uso concomitantes de outros
fármacos com propriedades antimuscarínicas como alguns antihistamínicos, fenotiazina,
antipsicóticos e antidepressivos tricíclicos.
A redução da motilidade gástrica causada por antimuscarinicos pode afetar a absorção de
outros fármacos. Os antimuscarínicos podem também antagonizar os efeitos gastrintestinais
da cisaprida, domperidona e metoclopramida. Os efeitos antimuscarínicos e
parasimpaticomiméticos podem anular-se mutuamente.

Antagonistas dos receptores 5-HT3

São os antieméticos mais efetivos na profilaxia de náusea e vômito pós-operatórios. São


exemplos desta classe: ondansetrona, granisetrona, tropisetrona, dolasetrona e palonosetrona.
A ondasentrona é considerada o fármaco mais efetivo.6
Irritações ou distensões no trato gastrointestinal superior provocam a liberação de serotonina
(5-HT) pelas células enterocromafins. Esse neurotransmissor, por meio da interação com
receptores 5-HT3, estimula nervos aferentes vagais. Isso provoca a estimulação do centro do
vômito.
Os antagonistas do receptor 5-HT3 inibem a ação da serotonina no intestino, nervo vago e na
CTZ. Esta ação reduz a estimulação do centro do vômito através das fibras aferentes viscerais
e da CTZ.11

Efeitos Adversos

São geralmente bem tolerados. Os efeitos adversos mais comuns observados em um estudo
com crianças foram: cefaléia, diarréia, constipação e febre10.
Foram observados, em adultos, cefaléia, diarréia e fadiga, que ocorrem independentemente da
dose e via de administração.11
Em testes clínicos, os antagonistas da serotonina podem causar um aumento do intervalo QT e
alargamento do complexo QRS. Desta forma, esses agentes devem ser usados com cuidado
em pacientes com comprometimento cardiovascular QT.11

Interações Medicamentosas 8

A ondansetrona é substrato da isoenzima CYP3A4. A Rifampicina reduz a biodisponibilidade


da ondansetrona oral em 65% e intravenosa em 48% em pacientes saudáveis.
A associação de rifampicina ou outro indutor potente da CYP3A4 com ondansetrona pode
reduzir seu efeito antiemético. Uma redução da eficácia analgésica pós-operatória do tramadol
foi observada quando associado com ondansetrona.

Antagonistas dos receptores D2

Antagonistas dopaminérgicos minimizam o efeito da dopamina no receptor D2 na CTZ,


limitando a estimulação do centro do vômito. São medicamentos de baixo custo. Podendo ser
divididos em fenotiazidas, butirofenonas e benzamidas4, 11.
As fenotiazidas como a clopromazina, a proclorperazina e trifluoroperazina (antipsicóticas) e
atietilperazina são antieméticos eficazes para episódios graves de náuseas e vômitos
associados à vertigem, cinetose e enxaqueca. Possuem também certo grau de ação
bloqueadora nos receptores histamínicos e muscarínicos9.
As butirofenonas antipsicóticas, como o haloperidol e o droperidol podem ser utilizados para
vômitos induzidos pela quimioterapia 9.
A metoclopramida é uma benzamida. Ela atravessa a barreia hematoencefálica, bloqueando
outros receptores dopaminérgicos no SNC, resultando em várias reações adversas incluindo
distúrbios do movimento, fadiga, agitação motora, torcicolo espasmódico e crises giro-ocular.
Além disso, a metoclopramida também estimula a liberação de prolactina e pode causar
galactorréia e distúrbio da menstruação4, 9.
A metoclopramida em altas doses antagoniza o receptor 5-HT3 e pode ser usada em náusea
pós-quimioterápico como a cisplatina2. A metoclopramida e domperidona, além de suas ações
antiémeticas, possuem ação procinética (aumento da motilidade gastrointestinal)9.

Efeitos adversos

Os efeitos adversos que são relativamente freqüentes são: sedação, hipotensão e sintomas
extrapiramidais, como distonias e discinesias tardias. Os efeitos adversos raros incluem:
sintoma maligno neuroléptico e discrasias de sangue. Além disso, a domperidona tem sido
associado ao prolongamento do intervalo QT 9,11.
Interações Medicamentosas

A metoclopramida deve ser utilizada com cautela em pacientes em uso de outros fármacos
que podem causar reações extrapiramidais como as fenotiazidas. Antimuscarínicos e
analgésicos opióides antagonizam os efeitos gastrointestinais da metoclopramida.Há relatos
de neurotoxicidade associada ao uso de metoclopramida com carbamazepina8.
Os efeitos procinéticos da metaclopramida e da domperidona podem diminuir a absorção de
alguns fármacos (como a digoxina). Além disso, a chegada de alimento ao intestino pode ser
alterada nos pacientes diabéticos sendo necessário o ajuste de dose de insulina3.
Analgésicos opióides e antimuscarínicos podem antagonizar os efeitos procinéticos da
domperidona. A domperidona é metabolizada pela CYP3A4, portanto seu uso com inibidores
enzimáticos (cetoconazol) pode aumentar a sua concentração plasmática8.

Canabinóides

O delta-9-THC e seus derivados possuem pouca eficácia na êmese devido à quimioterapia 4.


Os principais agentes deste grupo são a nabilona, um análogo sintético do THC, e o
dronabinol, um THC sintético1. Esses análogos agem nos receptores canabinóides (CB-1 e
CB-2) exercendo ação central simpatomimética3.

Efeitos adversos

Os efeitos indesejáveis são comuns, principalmente sonolência, tontura e ressecamento da


boca. As alterações do humor e a ocorrência de hipotensão postural também são observadas
com bastante freqüência9. Alucinações, desorientação e reações psicóticas resultantes da
atividade de canabinóides no SNC limitam seu uso em pacientes refratários ou intolerantes a
outros agentes antieméticos.
O uso corrente da proclorperazina em doses baixas pode reduzir a incidência de disforia que
acompanha a administração de cabinol3.

Interações Medicamentosas

A nabilona tem mostrado um efeito sinérgico depressor do SNC quando administrado com
álcool, diazepam ou outros depressores do SNC 8.

Corticosteróides

São mais utilizados em combinação com outros antieméticos, na profilaxia e tratamento de


náusea e vômito induzidos por quimioterapia. Dexametasona e Metilprednisolona são os mais
utilizados, e não há diferenças significativas em termos de eficácia entre os dois fármacos.
Não está completamente esclarecido, mas os corticosteróides podem afetar a atividade das
prostaglandinas no cérebro e modificar a barreira hematoencefálica. Além disso, a ação
antiinflamatória dos corticosteróides pode ter um papel antiemético, seja pela prevenção da
liberação de serotonina nas vísceras ou interferindo na ativação dos receptores 5-HT3 no trato
gastrintestinal 7.

Efeitos Adversos7
São considerados como antieméticos seguros. Os efeitos adversos são dependentes da dose e
duração da terapia. Insônia, indigestão/desconforto epigástrico, agitação, aumento do apetite,
ganho de peso e acne foram relatados em estudos recentes.

Interações Medicamentosas8

A dexametasona pode reduzir ou aumentar as concentrações plasmáticas da fenitoína. A


fenitoína e outros indutores enzimáticos, podem aumentar o metabolismo da dexametasona.

Benzodiazepínicos

Os benzodiazepínicos, isoladamente, não são eficazes, mas servem como coadjuvantes em


esquemas antieméticos e parecem ser benéficos na prevenção das náuseas. O lorazepam é
bastante utilizado para prevenir vômitos que aparecem com as repetições de quimioterapia7.

Efeitos Adversos

Sonolência, confusão mental, amnésia e prejuízo da coordenação motora9.

Interações Medicamentosas

Os benzodiazepínicos potencializam o efeito depressor de outros fármacos. Há também um


aumento da sedação com o uso concomitante de cimetidina. Maior risco de intoxicação
digitálica foi observada devido a um aumento do nível sanguíneo da digoxina. O tabagismo
aumenta a eliminação dos benzodiazepínicos2.

Referências

[1] AMAR, M. B..Cannabinoids in medicine: A review of their therapeutic potential. Journal


of Ethnopharmacology, nº 105, February 2006, p. 1-25.
[2] Dicionário de Administração de Medicamentos na Enfermagem. 5ª Edição. 2007-2008.
EPUB.
[3] GARRET, K., et al. Managing nausea and vomiting, current strategies. Criticalcarenurse,
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[4] GILMAN, A.G.; RALL, T.W.; NIESV, A.S.; TAYLOR, P. (ed.) Goodman e Gilman - As
Bases Farmacológicas da Terapêutica. 9.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1996. p 610-
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[6] JORDAN, K., Kasper, C., Schmoll, H. Chemotherapy-induced nausea and vomiting:
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[7] JORDAN. K; Schmoll, H.J.; Aapro, M.S. Comparative Activity of antiemetic drugs
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[8] KLASCO R. K. (Ed): Martindale. The Extra-Pharmacopoeia. Thomsom MICROMEDEX,
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Acessado em 31/03/2007.
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Guanabara Koogan, 2004. 904 p.
[10] SZAJEWSKA, H., GIERUSZCZAK-BIALEK, D., DYLAG, M. Meta-analysis:
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[11] ZACHARY, F.A. et al. Practical Selection of Antiemetics. Clinical Pharmacology,
v.69(5), p1169-1174, 2004.
[12] Watcha., M. F. and White, P. F. Antiemetics. Baillière's Clinical Anaesthestology, Vol 9,
no 1, March 1995.

(*) Profª. Dr.ª Patrícia Medeiros de Souza é professora Adjunta do Curso de Ciências
Farmacêuticas da Universidade de Brasília (UnB).
(**) Profª Samara Haddad Simões Machado e Prof. Sérgio Augusto C. D. N. Júnior são
professores substitutos do Curso de Ciências Farmacêuticas da Universidade de Brasília
(UnB).
(***) Ana Carolina Perdigão, Thais Almeida e Marianne Maciel são alunas do curso de
Ciências Farmacêuticas da Universidade de Brasília (UnB).

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