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O tributo é uma forma de receita do Estado.

Uma vez que a função do


Estado é governar o seu povo, são necessárias condições mínimas que
proporcionem a possibilidade de bem realizar esta função. “No exercício de sua
soberania o Estado exige que os indivíduos lhe forneçam os recursos de que
necessita. Institui o tributo. O poder de tributar nada mais é que um aspecto de
soberania estatal, ou uma parcela desta”.1

1.1 COMPETÊNCIA E CAPACIDADE TRIBUTÁRIA

À luz do Princípio da Legalidade, que é Direito e Garantia Fundamental dos


indivíduos, albergado em nossa Lei Maior no artigo 5º, II, “a ninguém será imposta
uma conduta senão em virtude de lei”, sendo, assim, o exercício da competência
tributária está vinculado à edição de leis, em sentido lato, para que se possa
instituir tributos.
A Constituição que consagra o princípio federativo, em que os entes
possuem autonomia, também, atenta para a distribuição de recursos que
possibilitem efetivamente tal autonomia.
Luciano Amaro escreve que a Constituição, ao tratar de receitas tributárias,
optou “por um sistema misto de partilha de competência e de partilha do produto
da arrecadação”.2
Competência tributária é um poder atribuído a certos entes públicos de
instituir tributos, dentro dos limites constitucionais. Roque Antonio Carrazza alude
que:
A Constituição estabelece que a competência legislativa tributária é
concorrente, ou seja, cabe à União, Estados e Distrito Federal legislar sobre
Direito Tributário, de acordo com seu artigo 24, I.
Sendo assim, cabe à União estabelecer regras gerais de Direito Tributário
(artigo 24, §1º). Aos Estados e Distrito Federal compete suplementar a legislação
federal quando esta existir (artigo 24, §2º), na ausência de norma federal, terão
competência legislativa. No entanto, na superveniência de norma federal, a norma
estadual terá sua eficácia suspensa naquilo que lhe contrariar (artigo 24, §§3º e
4º).
Tais regras não afastam a competência dos Municípios, que podem legislar
sobre assuntos de interesse local ou suplementar às legislações federais e
estaduais, conforme artigo 30, I, II, da Carta Constitucional.
O Código Tributário Nacional garante que a atribuição de competência
tributária pela Constituição compreende a competência plena de legislar3, com
exceção das limitações contidas na própria Carta, bem como as que estão
estampadas no Código Tributário, Constituição Estadual e Leis Orgânicas do
Distrito Federal e Municípios (artigo 6º do CTN).

1
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p.
31.
2
AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 95.
3
“Por competência legislativa plena se deve entender o poder de instituir e exonerar tributos,
observadas as regras supra-ordenadas que condicionam tal exercício”. COELHO, Sacha Calmon
Navarro. Curso ... p. 431.
Os tributos, que têm sua receita distribuída entre outros entes de direito
público, nem por isso, deixam de ser de competência do ente a que foi atribuído
(artigo 6º, parágrafo único).
O Imposto sobre Produtos Industrializados é um exemplo, visto que parte
de sua receita arrecadada pela União – competente para instituir o tributo – é
entregue aos Estados que devem ainda repassar aos Municípios, à luz dos
artigos 159, II e §3º da Constituição Federal.
A competência tributária é indelegável, ou seja, não pode o ente que
recebeu competência para instituir determinado tributo repassar para outro ente
essa competência. Porém, podem ser delegadas algumas atividades a outro ente,
como arrecadação, fiscalização, execução de leis, serviços, atos e decisões
administrativas, conforme estabelece o artigo 7º do Código Tributário.
A competência tributária existe até a realização da lei, ou seja, esgota-se
na lei. Após a promulgação da lei de competência de determinado ente, há que se
falar em capacidade tributária ativa.
Neste sentido, a competência tributária não se confunde com a
capacidade tributária ativa. “Uma coisa é poder legislar, desenhando o perfil
jurídico de um gravame ou regulando os expedientes necessários a sua
funcionalidade; outra é reunir credenciais para integrar a relação jurídica, no
tópico de sujeito ativo”4.
Assim, a capacidade tributária ativa “é tema a ser considerado no ensejo
do desempenho das competências, quando o legislador elege as pessoas
componentes do vínculo abstrato, que se instala no instante em que acontece, no
mundo físico, o fato previsto na hipótese normativa”.5
A Carta Constitucional não só atribuiu competências como estabeleceu
determinados limites que devem circundar a elaboração de normas
infraconstitucionais de competência tributária.
Estes limites ao poder de tributar, ou limitações da competência tributária,
impostos pela Carta Constitucional e Código Tributário Nacional não passam de
Princípios Fundamentais de Direito Tributário, como legalidade, isonomia,
irretroatividade, anterioridade e outros, que, devido à sua importância, serão
tratados em capítulo específico deste trabalho.
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS
1.2 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
O Princípio da Legalidade, antes de tudo, constitui Direito e Garantia
Fundamental, estampado na Constituição Federal em seu artigo 5º, II,
estabelecendo que “ninguém será obrigado a fazer alguma coisa senão em
virtude de lei”. Assim, somente há possibilidade de se criar, modificar ou extinguir
direitos e deveres quando a lei autorizar.
Tal princípio também importa em limitação ao poder de tributar,
estabelecido pela Lei Maior, em seu artigo 150, I, quando proíbe os Entes da
Federação de “exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”.

4
Idem, Ibidem.
5
Idem, Ibidem.
O artigo 37 da Constituição vincula a Administração Pública à obediência
ao princípio referido. Assim, em se tratando de Direito Tributário, José Eduardo
Soares de Melo alude que:
a instituição, majoração e extinção dos tributos, bem como
os casos de subsídio, isenção, redução de base de cálculo,
concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a
impostos, taxas ou contribuições, deve ser sempre prevista em
lei, compreendida como espécie normativa editada pelo Poder
Legislativo (excepcionalmente pelo poder executivo, nos casos
de medidas provisórias, previstas no artigo 62 da Constituição),
contendo preceitos vinculantes.6
Para Luciano Amaro, não basta que a lei simplesmente autorize a cobrança
de tributos,
é mister que a lei defina in abstrato todos os aspectos
relevantes para que, in concreto, se possa determinar quem terá
de pagar, quanto, a quem, a vista de que fatos ou circunstâncias.
(...) requer-se que a própria lei defina todos os aspectos
pertinentes ao fato gerador; necessários a quantificação do
tributo devido em cada situação concreta que venha a espelhar a
situação hipotética descrita na lei.7
A lei que trata tais dispositivos constitucionais é oriunda de ato legislativo,
bem como as que a ela se equiparam, como é o caso das Medidas Provisórias8 e
Leis Delegadas9. Não obstante, Sacha Calmon Navarro Coelho acredita que em
matéria tributária não caberiam tais atos do executivo, sustentando que: “é tese
nossa, de longa data, vencida, mas sem que nos convençamos de nossa
desrazão, que em matéria penal e tributária descabe lei delegada ou medida
provisória”.10
Há, porém, uma exceção ao princípio da legalidade, posta pela própria
Constituição, em seu artigo 153, §1º, quando faculta ao poder executivo alterar
alíquotas dos impostos de importação de produtos estrangeiros; exportação de
produtos nacionais ou nacionalizados; sobre produtos industrializados e sobre
operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores
mobiliários.
Importante ressaltar que tal prerrogativa do poder executivo vale somente
para os impostos de competência da União relacionados. Não se aplica tal
exceção aos impostos que competem aos Estados e Municípios, as taxas,
contribuições de melhoria e sociais e empréstimos compulsórios, sendo o
princípio em análise absoluto nestes casos.
Há quem sustente que o princípio da legalidade é o mais importante do
sistema tributário nacional, e que dele decorrem outros princípios do direito
6
MELO, José Eduardo Soares de. Curso..., p. 20.
7
AMARO, Luciano. Op. cit., p. 112.
8
“Tendo força de lei, é meio hábil, a medida provisória, para instituir tributos, e contribuições
sociais”. Excerto do voto condutor do Min. Octavio Gallotti no julgamento da ADIN 1.417-0/
DF liminar, pelo plenário do STF, marco de 1996 apud PAULSEN, Leandro. Direito
Tributário. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002. p. 156.
9
“A matéria tributária pode ser objeto de lei delegada, que se acha no mesmo plano hierárquico da
lei ordinária”. MORAES, Bernardo Ribeiro de., apud PAULSEN, Leandro. Op. cit., p. 156.
10
COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso ..., p. 194.
tributário, como os da anterioridade e irretroatividade, entre outros, que veremos a
seguir.
1.3 PRINCÍPIO DA ISONOMIA
O princípio ora estudado é um dos pilares do Estado Democrático de
Direito, garantindo, no “caput” do artigo 5º da Lei Maior, que “todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (...)”. Assim, “nem pode o
aplicador, diante da lei, discriminar, nem se autoriza o legislador, ao editar a lei, a
fazer discriminações. Visa o princípio à garantia do indivíduo, evitando
perseguições e favoritismos”.11
Desta forma, a lei deve ser geral e abstrata para que este princípio atinja
sua finalidade, Luiz Felipe Silveira Difini:
(...) ou seja, não individualizará as pessoas com relação
às quais deva incidir. Qualquer pessoa que pratica o ato ou se
encontra em relação com o fato que é suporte fático (...) da
norma será colhida pela incidência desta e afetada, igualmente,
pelas conseqüências daí advindas, independentemente de raça,
cor, credo, ideologia, classe social a que pertença, ou quaisquer
outras condições pessoais.12
O Direito Tributário Constitucional também elegeu o princípio da isonomia
como fundamento específico de seu sistema, quando, no artigo 150, II, proíbe aos
entes políticos
instituir tratamento desigual entre contribuintes que se
encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção
em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida,
independentemente da denominação jurídica dos rendimentos,
títulos e direitos.
O artigo 151, I, da Constituição, também acolhe o princípio da isonomia, no
momento em que veda a União
instituir tributo que não seja uniforme em todo território
nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a
Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de
outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a
promover o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre
as diferentes regiões do país.
O princípio da isonomia (também denominado de princípio da igualdade)
tem como conteúdo, portanto, o ato de dispensar tratamento desigual aos
desiguais na medida de sua desigualdade ou, nas palavras do Jurista Rui
Barbosa, “a regra da igualdade não consiste senão em aquinhoar desigualmente
os desiguais na medida em que se desigualam”.13
Neste sentido, vale lembrar que
a legislação tributária, amparada na própria Constituição,
pode estabelecer diferenças, tais como concessão de subsídio,

11
AMARO, Luciano. Op. cit., p. 133.
12
DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Op. cit., p. 70.
13
BARBOSA, Rui. Oração aos Moços, Escritos e Discursos Seletos, apud PAULSEN, Leandro. Op.
cit., p. 165.
isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito
presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos taxas e
contribuições.14
É justamente pelo tratamento desigual dispensado àqueles que se
encontram em situação de disparidade que o princípio garantidor da isonomia
relaciona-se com outros princípios, como o princípio da capacidade contributiva
(artigo 145, §1º, CF) e o princípio da vedação do confisco (artigo 150, V, CF).
Ainda, neste sentido, “hão de ser tratados, pois, com igualdade aqueles
que tiverem igual capacidade contributiva, e com desigualdade os que revelem
riquezas e, portanto, diferentes capacidades de contribuir”.15
O agir com igualdade da administração pública deve ser de forma a tratar
igualmente aqueles que se equiparam e de forma desigual os que se diferenciam
na medida de suas desigualdades.
1.4 PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE
O princípio da irretroatividade é garantia fundamental expressa no artigo 5º
da Carta Constitucional, quando, no inciso XXXVI, estatui que “a lei não
prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.
O Decreto-lei 4.657/42, que institui a Lei de Introdução ao Código Civil, dá
o mesmo tratamento, estabelecendo que “a lei em vigor terá efeito imediato e
geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”.
No capítulo Do Sistema Tributário Nacional, o princípio da irretroatividade
está estampada no artigo 150, III, a, que proíbe a cobrança de tributos “em
relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os
houver instituído ou aumentado”.
Luciano Amaro faz uma crítica ao texto constitucional transcrito, pois
acredita que:
o fato anterior à vigência da lei que instituiu tributo não
era, ainda, fato gerador. (...) O que a Constituição pretende,
obviamente, é vedar a aplicação da lei nova, que criou ou
aumentou tributo, a fato pretérito, que, portanto, continua sendo
não-gerador de tributo, ou permanece como gerador de menor
tributo, segundo a lei da época de sua ocorrência.16
Abstraindo questões hermenêuticas, o princípio da irretroatividade impede
a incidência da lei que institua ou majore tributos a fatos ocorridos antes de sua
vigência. O que não ocorre quanto às leis que reduzam ou dispensam o
pagamento dos tributos, pois os efeitos dessa lei poderão retroagir se para
beneficiar o contribuinte.
O Código Tributário Nacional, em seu artigo 106, traz expressas as
possibilidades da retroatividade da lei tributária, ou seja, pode retroagir a lei de
cunho eminentemente interpretativa ou em casos em que institua condição mais
benéfica ao contribuinte.
O princípio constitucional da não retroatividade é endereçado tanto ao
aplicador do direito no, momento de seu julgamento, quanto ao legislador da
14
BERNI, Mauricio Batista e outros. Direito Tributário. Porto Alegre: Síntese, 2000. p. 26.
15
AMARO, Luciano. Op. cit., p. 133.
16
AMARO, Luciano. Op. cit., p. 118.
norma tributária, que, ao deliberar sobre lei, não pode agravar monetariamente
fato ocorrido antes da vigência desta.
Com o mesmo entendimento, Luciano Amaro alude que o princípio ora
analisado
é dirigido não só ao aplicador da lei (que não a pode fazer
incidir sobre fato pretérito), mas ao próprio legislador, a quem
fica vedado ditar regra para tributar fato passado ou para majorar
o tributo que, segundo a lei da época, gravou esse fato.17
Ainda, neste sentido, o princípio da irretroatividade concretiza o princípio da
segurança jurídica, visto que “constitui garantia do contribuinte contra o arbítrio do
Estado, assegurando-lhe o conhecimento prévio da carga tributária a que estará
sujeito”. Deste modo, “a cláusula da irretroatividade está baseada no
privilegiamento da segurança jurídica, princípio que deve nortear a atuação do
legislador e do aplicador da lei”.18
Na medida em que se torne possível a cobrança de tributos de forma
retroativa, ou seja, se o imposto instituído hoje alcançasse a industrialização que
se deu no mês anterior, jamais o seu contribuinte estaria seguro, não podendo
contabilizar de plano se sua atividade geraria lucro ou representaria desfalque
para sua empresa.
Questão controvertida é a da aplicação ou não, frente ao princípio da
irretroatividade, da Súmula 584 do STF, de teor: “ao imposto de renda calculado
sobre os rendimentos do ano-base, aplica-se a lei vigente no exercício financeiro
em que deve ser apresentada a declaração”.
A súmula citada foi editada na vigência da Constituição anterior e permitia
a retroatividade em relação ao Imposto de Renda. Hoje, entende-se por superada
a súmula em questão19, visto que não recepcionada pela Carta Constitucional de
1988, não obstante, o próprio STF continua aplicando-a em seus julgamentos20.
1.5 PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE
O princípio da anterioridade da lei tributária está estampado no artigo 150,
III, alíneas ‘b’ e ‘c’ da Constituição, respectivamente anterioridade comum e
anterioridade especial.

17
AMARO, Luciano. Op. cit., p. 118.
18
PAULSEN, Leandro. Op. cit., p. 173.
19
“Dos termos induvidosos em que consagrado na Constituição vigente o princípio da
irretroatividade, conclui-se não mais prevalecer, em se tratando de majoração de tributo, a Súmula
584 do STF, expedida na vigência da Constituição anterior, que permitia, em termos, a aplicação
retroativa de leis sobre imposto de renda”. DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Op. cit., p. 69.
20
“DIREITO CONSTITUCIONAL, TRIBUTARIO E PROCESSUAL CIVIL. IMPOSTO DE RENDA
SOBRE EXPORTAÇÕES INCENTIVADAS, CORRESPONDENTE AO ANO-BASE DE 1989.
MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA PARA 18%, ESTABELECIDA PELO INC. I DO ARTIGO 1º DA LEI
Nº 7.968/89. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ARTIGO 150, III, A, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
DE 1988. (...) 4. O acórdão recorrido manteve o deferimento do Mandado de Segurança. Mas está
em desacordo com o entendimento desta corte, firmado em vários julgados e consolidado
na Súmula 584 (...). Reiterou-se essa orientação no julgamento do R.E. nº 104.259-RJ (RTJ
115/1336). (...) 6. Em questão assemelhada, assim também decidiu o Plenário do Supremo
Tribunal Federal, no julgamento do R.E. nº 197.790-6-MG, em data de 19 de fevereiro de 1997. 7.
R.E. conhecido e provido, para o indeferimento do Mandado de Segurança. (...)”. STF, RE-
194612/SC, Rel. Min. Sydney Sanches, mar/1998, DJU 08.05.98, p. 00015. Apud PAULSEN,
Leandro. Op. cit., p. 175-176.
A anterioridade comum significa a proibição da cobrança, pela União,
Estados, Distrito Federal e Municípios, de tributos “no mesmo exercício financeiro
em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou”.21
Entende-se por exercício financeiro “o período de tempo para o qual a lei
orçamentária aprova a receita e a despesa pública”.22 A Lei n. 4320/64, no artigo
34, estabelece que o exercício financeiro vai de 1º de janeiro a 31 de dezembro
de cada ano.
A anterioridade especial, também denominada de anterioridade mitigada ou
nonagesimal, que ingressou em nosso Sistema Constitucional com a Emenda
Constitucional n. 42, de 19 de dezembro de 2003 (que altera o Sistema Tributário
Nacional e dá outras providências), veda aos entes da federação a cobrança de
tributos “antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a
lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b”.
Algumas exceções ao princípio estudado são previstas na própria Carta
Constitucional, tratam-se “de exações que, por atenderem a certos objetivos
extrafiscais (política monetária, política de comércio exterior) necessitam de maior
flexibilidade e demandam rápidas alterações”.23
A Reforma Tributária, que deu origem à Emenda de número 42, além do
dispositivo do artigo 150, III, c, também instituiu o §1º do mesmo artigo, definindo
quais os tributos fazem exceção à anterioridade comum ou especial, bem como
aqueles que respeitam ambas.
Aqueles tributos que já respeitavam a anterioridade comum, com a
Emenda, devem obedecer também à anterioridade especial, salvo disposição em
contrário. São alguns casos de exceção ao princípio da anterioridade os citados a
seguir.
Os impostos listados do §1º do artigo 153 (imposto de importação, imposto
de exportação, imposto sobre produtos industrializados, imposto sobre operações
de crédito), bem como o imposto extraordinário (artigo 154, II), continuam livres
da incidência da anterioridade comum.
O Imposto sobre Produtos Industrializados e as Contribuições Sociais para
fins de Seguridade Social passam a respeitar os noventa dias da anterioridade
especial, muito embora não estejam vinculados ao princípio da anterioridade
comum.
Já o Imposto de Renda não fica vinculado ao princípio da anterioridade
especial, mas deve respeitar o princípio da anterioridade comum, ou seja,
somente pode ser cobrado no exercício financeiro seguinte ao que foi instituído ou
majorado.
Independentemente de ser considerado comum ou especial, Sacha
Calmon Navarro Coelho afirma que:
O princípio da anterioridade expressa a idéia de que a lei
tributária seja conhecida com antecedência, de modo que os
contribuintes, pessoas naturais ou jurídicas, saibam com certeza
e segurança a que tipo de gravame estarão sujeitos no futuro
21
Artigo 150, III, b, CF.
22
AMARO, Luciano. Op. cit., p. 120.
23
AMARO, Luciano. Op. cit., p. 123.
imediato, podendo dessa forma organizar e planejar seus
negócios e atividades.24
O artigo 104 do Código Tributário Nacional define o conteúdo do princípio
em tela, ou seja, contempla os dispositivos de lei que instituem ou majoram os
impostos sobre o patrimônio ou a renda; que definem novas hipóteses de
incidência e as que extinguem ou reduzem isenções.
1.6 PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DE CONFISCO
O princípio da proibição ou vedação do confisco encontra-se no artigo 150,
VI da Lei Maior, que proíbe os Entes Federativos de “utilizar tributo com efeito de
confisco”.
A expressão confisco significa “apreensão, pelo fisco, de bens
(representados por moeda corrente) do contribuinte que comprometem
excessivamente seu patrimônio e sua renda”. Sua proibição repousa na regra do
artigo 5º, XXII, que estatui como garantia fundamental o direito de propriedade.
É evidente que o princípio da proibição do confisco incide apenas nos
casos em que há excesso de tributação a ponto de desamparar o contribuinte,
pois “não é admissível que a alíquota de um imposto seja tão elevada a ponto de
se tornar insuportável, ensejando atentado ao próprio direito de propriedade”.25
Por sua vez, com essa vedação, não se quer “outorgar a propriedade uma
proteção absoluta contra a incidência do tributo, o que anularia totalmente o poder
de tributar. O que se objetiva é evitar que, por meio do tributo, o Estado anule a
riqueza privada”.26
O princípio da proibição do confisco guarda forte ligação com o princípio da
capacidade contributiva, pois o respeito ao segundo torna impossível ou muito
difícil a prática de ato incompatível com o primeiro.
Questão controvertida apresenta-se quanto aos limites da tributação, que
deve ser analisada pelo aplicador do direito de acordo com o princípio da
razoabilidade. Assim, para José Eduardo Soares de Melo:
o poder público há de se comportar pelo critério da
razoabilidade, a fim de possibilitar a subsistência ou
sobrevivência das pessoas físicas, e evitar as quebras das
pessoas jurídicas, posto que a tributação não pode cercear o
pleno desempenho das atividades privadas e a dignidade
humana.27
Com o mesmo entendimento, Mauricio Batista Berni acredita que “apenas
ao aplicador será possível estabelecer com razoabilidade (...) as fronteiras entre o
confisco e o não confisco”.28
1.7 ILIMITABILIDADE DO TRÁFEGO DE PESSOAS OU BENS
O artigo 150, V, da Constituição Federal estatui o princípio da não-limitação
ao tráfego de pessoas ou bens, quando proíbe as Pessoas Jurídicas de Direito
Público de “estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de

24
COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso..., p. 195.
25
PAULSEN, Leandro. Op. cit., p. 183.
26
AMARO, Luciano. Op. cit., p. 142.
27
MELO, José Eduardo Soares de. Curso..., p. 33.
28
BERNI, Mauricio Batista e outros. Op. cit., p. 28.
tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela
utilização de vias conservadas pelo poder público”.
A Constituição proíbe, portanto, que o poder público onere de tal forma o
tráfego a ponto de barrar ou dificultar a locomoção de pessoas ou bens entre
Estados e Municípios. Assim, o que se quer proteger “é a liberdade de locomoção
(de pessoas ou bens), mais do que a não discriminação de bens ou pessoas, a
pretexto de irem para outra localidade ou de lá virem; ademais, prestigia-se a
liberdade de comércio e o princípio federativo”.29
Neste sentido, José Eduardo Soares de Melo:
Este princípio constitui reafirmação do princípio federativo,
coibindo a existência de gravames tributários que acarretem o
impedimento da livre circulação entre os Estados e Municípios,
sendo que o seu destinatário é o legislador respectivo, não
podendo ser criada uma autêntica barreira fiscal, (...) o legislador
está proibido de fixar alíquotas excessivas ou cobrar taxas
arbitrárias, em razão da procedência ou do destino dos bens e
serviços.30
Uma questão coloca-se controversa em relação ao inciso V, “in fine”,
quando o constituinte permite a cobrança de pedágio como exceção à cobrança
de tributos interestaduais e intermunicipais, levando à compreensão de que
pedágio é uma espécie de tributo.
Luiz Felipe Silveira Difini acredita que:
a ressalva à cobrança de pedágio, pela utilização de vias
conservadas pelo poder público, demonstra que o constituinte
compreendeu o pedágio como tributo. Assim não fosse, não
haveria porque excepcioná-lo em dispositivo que veda a restrição
à livre circulação por meio de tributos interestaduais e
intermunicipais. Considerado tributo pela Constituição, entre as
espécies deste gênero, situa-se o pedágio como taxa de serviço
(de conservação de vias públicas).31
O autor acredita que, pelo fato de a Constituição excepcionar a cobrança
do pedágio pela utilização das vias conservadas pela administração, estaria
considerando pedágio como tributo, ainda classifica-o como taxa pela utilização
de serviço público colocado à disposição do contribuinte. Não obstante tal
pensamento, há divergência.
Para Lobo Torres, que entende de forma diversa, “o pedágio pode ser
cobrado porque não é tributo, mas preço público. A sua ressalva no texto
constitucional é meramente didática ou cautelar da hipótese em que o poder
público lhe atribua o regime de taxa”.32
Mauricio Batista Berni alude que “(...) o pedágio tanto pode assumir a
feição de tributo (taxa), como de preço público, como vem entendendo o STF em

29
AMARO, Luciano. Op. cit., p. 143.
30
MELO, José Eduardo Soares de. Curso..., p. 33.
31
DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Op. cit., p. 79.
32
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. Apud BERNI, Mauricio Batista e
outros. Op. cit., p. 28.
Ação Direta de Inconstitucionalidade propostas contra o Estado do Rio Grande do
Sul (...)”.33
O Supremo Tribunal Federal já se manifestou neste sentido, ao julgar o RE
181.475-6-RS, DJU-e-1 de 25.6.99, p. 28: “CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO.
PEDÁGIO. Lei 7.712, de 22.12. 88. I. Pedágio: natureza jurídica: taxa: C.F., artigo
145. II, artigo 150, V. II. Legitimidade constitucional do pedágio instituído pela Lei
7.712, de 1988. III – RE. Não conhecido”.34
1.8 CAPACIDADE CONTRIBUTIVA
O princípio da capacidade contributiva, que se encontra expresso na
Constituição Federal, artigo 145, § 1º, estabelece que “sempre que possível, os
impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade
econômica do contribuinte (...)”.
Deste modo, “o princípio da capacidade contributiva é cada um dever
concorrer para com as despesas públicas consoantes suas posses e
disponibilidades econômicas”.35
A finalidade do princípio ora analisado é de proteger o contribuinte,
evitando que um excesso de tributação diminua sua capacidade econômica.
Neste sentido,
considerando-se que a tributação interfere no patrimônio
das pessoas, de forma a subtrair parcelas de seus bens, não há
duvida de que será ilegítima (e inconstitucional) a imposição de
ônus superiores as forças desse patrimônio, uma vez que os
direitos individuais compreendem o absoluto respeito à garantia
de sobrevivência de quaisquer categorias de contribuintes.
O tributo é cobrado pela utilização de determinado serviço posto à
disposição do contribuinte, ou pelo consumo de determinado produto, e por tantos
outros fatos geradores que vierem a ocorrer, assim, ele representa o aquecimento
da economia, a transferência de riqueza. O que não pode ocorrer é a oneração
em excesso de determinado tributo, que empobreça o contribuinte e restrinja a
sua liberdade de contratar.
Há divergência na doutrina, conforme se verifica nos autores citados na
seqüência, a respeito da aplicação deste princípio, se é cabível somente aos
impostos, como literalmente há de se extrair do texto constitucional (sempre que
possível, os impostos terão caráter pessoal...), ou se alcança outros tributos da
mesma forma.
Luiz Felipe Silveira Difini sustenta que este princípio
só se aplica aos impostos. (...) As taxas e contribuições de
melhoria tem caráter de retribuição de serviços e obras. Seu
valor está relacionado ao custo do serviço ou ao custo e

33
BERNI, Mauricio Batista e outros. Op. cit., p. 30.
34
BRASIL. Recurso Extraordinário n. 181.475-6. Relator Ministro. Carlos Velloso. Brasília: Supremo
Tribunal Federal. Disponível NA Internet em: <http\www.stf.gov.Br> Acesso em 26/10/04.
35
DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Op. cit., p. 72.
valorização que decorre da obra pública, e não a condição
econômica do respectivo contribuinte. 36
José Eduardo Soares de Melo, ao contrário, entende que:
argutamente tem sido observado que a capacidade
contributiva não se refere apenas a impostos (artigo 145, §1º),
pois é possível inferir sua aplicação às taxas (artigo 5º, LXXIV e
LXXVII, da Constituição), no caso do estado ser obrigado a
prestar assistência integral, e tornar gratuito o registro civil de
nascimento e certidão de óbito, aos que comprovarem
insuficiência de recursos.37
Com o mesmo entendimento, Luciano Amaro alude que:
embora a Constituição (artigo 145, §1º) só se refira a
impostos, outras espécies tributárias podem levar em
consideração a capacidade contributiva, em especial as taxas,
cabendo lembrar que, em diversas situações, o próprio texto
constitucional veda a cobrança de taxas em hipóteses nas quais
não se revela capacidade econômica (cf., p. ex., artigo 5º,
LXXVII).38
Outra discussão doutrinária trava-se quanto à expressão ‘sempre que
possível’, extraída do mesmo dispositivo constitucional, que alguns autores
afirmam tratar-se apenas da pessoalidade; e outros entendem que se trata tanto
da pessoalidade quanto da capacidade contributiva.
Luiz Felipe Silveira Difini entende que “a expressão ‘sempre que possível’
não se refere ao princípio da capacidade contributiva, mas apenas ao caráter
pessoal dos impostos”.
O autor Luciano Amaro acredita que a expressão sempre que possível
“cabe como ressalva tanto para personalização como para a capacidade
contributiva”.39
1.9 NÃO-CUMULATIVIDADE
A não-cumulatividade tributária é princípio específico do imposto sobre
produtos industrializados (IPI) e imposto sobre circulação de mercadorias (ICMS),
podendo incidir também no caso dos impostos de competência residual da União
(artigo 154, I) e de certas contribuições sociais (artigo 195, §4º, c/c artigo 154, I).
Encontra-se expresso no artigo 153, §3º, II da Constituição, estatuindo que
o imposto sobre produtos industrializados “será não-cumulativo, compensando-se
o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores”.
Também se encontra, tal princípio, na regra do artigo 155, §2º, I, do mesmo
diploma legal, garantindo que o imposto relativo à circulação de mercadorias e
prestação de serviços de transporte e comunicação
será não cumulativo, compensando-se o que for devido
em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou

36
DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Op. cit., p. 73.
37
MELO, José Eduardo Soares de. Curso ..., p. 32.
38
AMARO, Luciano. Op. cit., p. 140.
39
AMARO, Luciano. Op. cit., p. 136.
prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores
pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal.
O princípio da não-cumulatividade não é senão uma técnica de tributação
determinada pela Carta Magna, que tem por objetivo a proibição da incidência do
imposto em cascata, assim, Luiz Felipe Silveira Difini acredita que:
a não-cumulatividade significa diminuir (compensar), do
imposto devido em cada operação, o imposto pago nas
operações anteriores. (...) O contrário é a chamada incidência
em cascata (...), quando em cada operação é exigido
integralmente o imposto, não se abatendo o valor pago nas
operações antecedentes.40
O princípio da não-cumulatividade incide de forma a compensar o valor que
o industrial deve pela saída do produto industrializado de seu estabelecimento, no
valor que este contribuinte pagou em razão da entrada do mesmo produto no
mesmo estabelecimento, o artigo 49 do Código Tributário Nacional e o artigo 149
do RIPI tratam com maior especificidade da desta matéria.
Neste Sentido,
a não-cumulatividade implica na compensação de
‘créditos’ com ‘débitos’ dos mencionados impostos, gerados num
determinado período de tempo (usualmente mensal), mediante a
utilização de uma autêntica conta corrente fiscal (...).41
Por ser o tema central desta monografia, o princípio da não-cumulatividade
do imposto sobre produtos industrializados será tratado com maior abrangência
na quarta parte deste estudo.
1.10 SELETIVIDADE
A seletividade é princípio aplicável ao imposto sobre produtos
industrializados pelo artigo 153, §3º, I da Constituição, que define que o IPI “será
seletivo, em função da essencialidade do produto”.
Aplica-se também, tal princípio, ao imposto sobre circulação de
mercadorias, conforme estipulado no artigo 155, §2º, III, do referido diploma legal,
definindo que o ICMS “poderá ser seletivo, em função da essencialidade das
mercadorias e dos serviços”.
Note-se que a seletividade para o imposto sobre produtos industrializados
é de incidência obrigatória, enquanto para o imposto sobre circulação de
mercadorias ou serviços é de incidência facultativa dada pelo texto constitucional,
não obstante, “a Constituição Estadual do Rio Grande do Sul, porém, enuncia-o
de forma imperativa: ‘o imposto de que trata o inciso I, alínea B (ICMS), será
seletivo (...)”. 42
O princípio da seletividade significa onerar os produtos e serviços
supérfluos e desonerar os de primeira necessidade, realizando, desta forma, o
princípio da capacidade contributiva.

40
DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Op. cit., p. 78.
41
MELO, José Eduardo Soares de. Curso..., p. 37.
42
DIFINI, Luiz Felipe Silveira. Op. cit., p. 79.
Para José Eduardo Soares de Melo, a técnica da seletividade constitui na
observância de valores consagrados na Lei Maior,
como é o caso do salário mínimo, que toma em
consideração as necessidades vitais básicas, como a moradia,
alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene,
transporte e previdência (artigo 7º, IV), diante do que as
mercadorias necessárias e indispensáveis à subsistência da
população – como os gêneros alimentícios – devem implicar
menores alíquotas de imposto, ao passo que os produtos
supérfluos e artigos de luxo podem sofrer carga tributária mais
significativa.43
Assim, o princípio da seletividade, conjugado com os demais princípios –
como o princípio da capacidade contributiva e não-cumulatividade – busca
claramente realizar a justiça tributária, distribuindo ônus tributário de acordo com
a capacidade que o contribuinte tem de suportá-lo.

43
MELO, José Eduardo Soares de. Curso..., p. 37.

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