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citação por hora certa é constitucional

quarta-feira, 3 de agosto de 2016

NOÇÕES GERAIS SOBRE CITAÇÃO

O que é a citação, no processo penal?


Citação é o ato por meio do qual o Poder Judiciário...
• comunica ao indivíduo que foi recebida uma denúncia ou queixa-crime ajuizada
contra ele; e
• convoca o acusado para ingressar no processo e se defender.

O que acontece se não houver a citação válida do réu?


O processo será nulo desde o seu início, nos termos do art. 564, III, “e”, do CPP,
havendo, neste caso, violação ao art. 5º, LV, da CF/88 e ao artigo 8º, 2, “b”, da
Convenção Americana de Direitos Humanos.
Vale ressaltar, no entanto, que a falta ou a nulidade da citação estará sanada,
“desde que o interessado compareça, antes de o ato consumar-se, embora
declare que o faz para o único fim de argui-la. O juiz ordenará, todavia, a
suspensão ou o adiamento do ato, quando reconhecer que a irregularidade
poderá prejudicar direito da parte” (art. 570 do CPP).

Relação angular
Antes da citação, temos apenas a figura do acusador e do juiz. Depois deste ato
forma-se uma relação angular na qual existirão três personagens: o acusador, o
juiz e o acusado.
Assim, após ser realizada a citação do acusado, o processo completa a sua
formação (art. 363 do CPP).

Espécies de citação
Existem duas espécies de citação:
1) Citação real (pessoal)
2) Citação ficta (presumida)

Citação REAL (PESSOAL)


É aquela na qual o acusado é citado pessoalmente, ou seja, ele mesmo recebe a
comunicação.
A citação pessoal pode ser dividida em subespécies:
a) Citação por mandado (art. 351);
b) Citação por carta precatória (art. 353);
c) Citação do militar (art. 358);
d) Citação do funcionário público (art. 359);
e) Citação do acusado que estiver preso (art. 360);
f) Citação do acusado no estrangeiro (art. 368);
g) Citação em legações estrangeiras (art. 369).

Citação FICTA (PRESUMIDA)


Ocorre quando o acusado não é encontrado para ser comunicado pessoalmente
da instauração do processo. Apesar disso, se forem cumpridos determinados
requisitos legais, a lei presume que ele soube da existência do processo e, por
isso, autoriza que a marcha processual siga em frente.
Existem duas subespécies de citação ficta:
a) Citação por edital (art. 361);
b) Citação por hora certa (art. 362).

Formas de citação que não são admitidas no processo penal


• Citação por via postal (correios);
• Citação eletrônica;
• Citação por e-mail;
• Citação por telefone.

CITAÇÃO POR HORA CERTA

Nomenclatura
O CPP fala em “citação com hora certa”. Apesar disso, a doutrina e a
jurisprudência denominam esta espécie como sendo “citação por hora certa”.

O que é a citação por hora certa e quando ela ocorre?


A citação por hora certa ocorre quando o oficial de justiça vai tentar citar o réu,
mas nunca o localiza no endereço onde ele normalmente deveria estar. Diante
disso, o meirinho percebe que réu está, na verdade, praticando manobras para
não ser encontrado, buscando, com isso, evitar o início dos atos processuais.
Se o oficial de justiça constatar realmente essa situação, a lei autoriza que ele
marque determinado dia e horário para voltar no endereço do réu e, nesta data
designada, tentar novamente citar o indivíduo. Caso ele não esteja mais uma vez
presente, a citação considera-se realizada e presume-se que o réu tomou
conhecimento da ação penal que irá seguir o seu curso normal.

Previsão
Veja como o CPP previu a citação por hora certa:
Art. 362. Verificando que o réu se oculta para não ser citado, o oficial de justiça
certificará a ocorrência e procederá à citação com hora certa, na forma
estabelecida nos arts. 227 a 229 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 -
Código de Processo Civil. (Redação dada pela Lei nº 11.719/2008).
Parágrafo único. Completada a citação com hora certa, se o acusado não
comparecer, ser-lhe-á nomeado defensor dativo. (Incluído pela Lei nº
11.719/2008).

Obs: os arts. 227 a 229 do CPC/1973, mencionados acima pelo art. 362 do CPP,
correspondem, atualmente, aos arts. 252 a 254 do CPC/2015. É o que determina
o art. 1.046, § 4º do novo CPC:
Art. 1.046 (...) § 4º As remissões a disposições do Código de Processo Civil
revogado, existentes em outras leis, passam a referir-se às que lhes são
correspondentes neste Código.

Citação por hora certa foi introduzida pela Lei nº 11.719/2008


A citação por hora certa já existia há muito tempo no processo civil e foi
introduzida no processo penal apenas em 2008, por força da Lei nº 11.719/2008,
que modificou a redação do art. 362 do CPP.
Antes da Lei nº 11.719/2008, quando o réu estava se ocultando, a providência
determinada pela legislação era a citação por edital. O “problema” da citação por
edital é que se o acusado não comparecer nem constituir advogado, o processo
e o prazo prescricional ficam suspensos (art. 366). Já na citação por hora certa,
o processo segue normalmente. Assim, para o Estado-acusação, a citação por
hora certa é mais efetiva à persecução penal.

Réu que se oculta para não ser citado


Antes da Lei nº 11.719/2008 Depois da Lei nº 11.719/2008
Era citado por edital. É agora citado por hora certa.
O processo e o prazo prescricional ficavam O processo e o prazo prescricional continuam
suspensos. correndo normalmente.

Explicando com detalhes a citação por hora certa


• O juiz determina a citação do indivíduo.
• O oficial de justiça comparece uma primeira vez no domicílio ou residência do
citando, mas não o encontra no local.
• O oficial de justiça, em um outro dia, vai novamente até o endereço, no entanto,
mais uma vez não encontra o réu.
• Além de não ter encontrado o citando em dois dias diferentes, o oficial de justiça
percebe, por circunstâncias do caso concreto, que há suspeita de que o réu esteja
se ocultando.
• Chamo atenção mais uma vez para este fato. Existem dois requisitos para que
ocorra a citação por hora certa:
a) o oficial de justiça deve ter procurado o réu duas vezes no seu endereço, sem
conseguir localizá-lo (requisito objetivo);
b) deve haver suspeita, com base nas circunstâncias do caso concreto, de que o
réu está se ocultando para não ser citado (requisito subjetivo).
• Diante disso, ele chama alguém da família do réu que mora na casa e intima
esta pessoa, dizendo mais ou menos o seguinte: eu sou oficial de justiça e
amanhã (ou no próximo dia útil), às tantas horas, eu voltarei aqui para citar o
“Fulano”. Avise que ele deverá estar aqui para receber a citação e que, mesmo
se ele não estiver, a citação será realizada e o processo continuará contra ele
normalmente.
• Caso não tenha nenhum parente do réu morando na casa, o oficial de justiça
poderá dar esse aviso para um vizinho, requerendo que seja transmitido o recado
ao réu quando ele chegar.
• Se o réu morar em um condomínio edilício ou loteamento com controle de
acesso (guarita, portaria etc.), o oficial de justiça, em vez de intimar um parente
ou vizinho do réu, poderá intimar o porteiro responsável pelo recebimento de
correspondências, requerendo que ele transmita a informação ao morador.
• No dia e na hora designados, o oficial de justiça, independentemente de novo
despacho, comparecerá ao domicílio ou à residência do citando a fim de realizar
a diligência.
• Se o citando estiver presente, o oficial de justiça fará normalmente sua citação
(neste caso, será citação real/pessoal).
• Por outro lado, se o citando não estiver presente, o oficial de justiça procurará
informar-se das razões da ausência, dando por feita a citação, ainda que o
citando se tenha ocultado em outra comarca, seção ou subseção judiciárias.
• A citação com hora certa será efetivada mesmo que a pessoa da família ou o
vizinho que houver sido intimado esteja ausente, ou se, embora presente, a
pessoa da família ou o vizinho se recusar a receber o mandado.
• O oficial de justiça fará uma certidão de ocorrência de tudo o que se passou
acima e deixará uma contrafé (cópia) com qualquer pessoa da família ou vizinho.
• Feita a citação com hora certa, o escrivão ou chefe de secretaria enviará ao
réu, no prazo de 10 dias, contado da data da juntada do mandado aos autos,
carta, telegrama ou correspondência eletrônica, dando-lhe ciência.

O que acontece se o acusado, citado por hora certa, não integrar o


processo?
Se o acusado, mesmo citado por hora certa, não constituir advogado nem
apresentar resposta à acusação, o juiz deverá encaminhar os autos à Defensoria
Pública ou, não havendo órgão na localidade, nomear defensor dativo (art. 362,
parágrafo único, do CPP) para que faça a defesa do réu.
Vale ressaltar que o processo segue seu curso normal, sendo produzidas todas
as provas necessárias e, ao final, o acusado será julgado (absolvido ou
condenado).

Repare que a citação por hora certa é uma espécie de citação ficta
(presumida), no entanto, com um agravante para a situação do réu. Isso
porque, ao contrário do que ocorre na citação por edital, na citação por
hora certa o processo segue seu curso normal e o réu pode ser
condenado. Diante disso, muitos doutrinadores sustentam que a citação
por hora certa seria inconstitucional por violar a ampla defesa. O que
decidiu o STF? A citação por hora certa viola a Constituição Federal?
NÃO.

A citação por hora certa, prevista no art. 362 do CPP, é constitucional.


STF. Plenário. RE 635145, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 01/08/2016
(repercussão geral).

Segundo o Min. Relator Marco Aurélio, deixar de reconhecer a constitucionalidade


da norma do CPP, que tem como objetivo exatamente assegurar a continuidade
do processo nas situações em que o réu deliberadamente se esconde para evitar
a citação, representaria um prêmio à sua atuação ilícita.

Mas não haveria violação à ampla defesa?


NÃO. Essa modalidade de citação não compromete o direito de ampla defesa.
A ampla defesa é a combinação entre:
• defesa técnica e
• autodefesa.

A defesa técnica é indeclinável, ou seja, o réu possui o direito inalienável de ser


assistido por um profissional e, caso o acusado não constitua um advogado, o
Estado tem o dever de encaminhar os autos à Defensoria Pública ou nomear um
defensor dativo para fazer a sua defesa técnica, sob pena de nulidade total do
processo. Vale ressaltar, no entanto, que essa garantia é prevista expressamente
no procedimento da citação por hora certa, conforme vimos acima, nos termos
do parágrafo único do art. 362 do CPP. Assim, a defesa técnica é assegurada
mesmo havendo citação por hora certa.

A autodefesa é a garantia de o acusado estar presente ao julgamento. Esta


modalidade, contudo, é facultativa, ou seja, o réu pode escolher ou não exercê-
la. Caso o acusado opte por não comparecer, estará também exercendo um
direito, qual seja, o de não se autoincriminar ou produzir provas contra si. Esta
escolha, entretanto, não pode interromper o curso normal do processo.

Dessa forma, na citação por hora certa, é garantida a defesa técnica do réu e a
autodefesa não é por ele exercida por conta de uma opção sua, já que existem
concretos indícios de que ele tomou conhecimento da existência do processo,
mas optou por não comparecer.

Requisitos formais
A citação por hora certa é cercada de cuidados, entre os quais a certidão
pormenorizada elaborada pelo oficial de justiça e o aval pelo juiz.
Caso não existam elementos concretos de ocultação, o juiz pode determinar a
suspensão do processo, preservando a autodefesa. Entretanto, nos casos em que
constatada a intenção de interromper o processo, o magistrado dispõe de
instrumentos para dar prosseguimento à ação penal.

A citação por hora certa, como vimos, é prevista no art. 362 do CPP. Esta
modalidade de citação pode ser utilizada também nos juizados criminais
especiais, rito sumaríssimo, regido pela Lei nº 9.099/95?
Há polêmica sobre o tema:
1ª corrente: NÃO. Se o oficial de justiça informar que o réu está se ocultando
para não ser citado, deverá o juiz declarar a incompetência do Juizado Especial
e remeter os autos a uma vara criminal comum, a fim de que seja adotado o rito
sumário (art. 538 do CPP), com base no art. 66 da Lei nº 9.099/95. É adotada
por Norberto Avena. Veja o que diz a Lei dos Juizados:
Art. 66. A citação será pessoal e far-se-á no próprio Juizado, sempre que possível,
ou por mandado.
Parágrafo único. Não encontrado o acusado para ser citado, o Juiz encaminhará
as peças existentes ao Juízo comum para adoção do procedimento previsto em
lei.

2ª corrente: SIM. É a posição que prevalece no âmbito dos Juizados Especiais,


havendo um enunciado do FONAJE nesse sentido:
Enunciado 110-No Juizado Especial Criminal é cabível a citação com hora certa
(XXV Encontro – São Luís/MA).

O STF chegou a iniciar esta discussão no RE 635145 acima explicado, no entanto,


em virtude de o recurso extraordinário tratar apenas da constitucionalidade da
citação por hora certa, não foi possível avançar na análise do tema, já que não
era objeto do recurso.

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