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A RAZÃO DO DESINTERESSE PELA INFÂNCIA

De acordo com o medievalista James A. Schultz, citado por Heywood, por cerca de 2
mil anos, desde a Antiguidade até o século XVIII, as crianças no Ocidente, eram consideradas
como sendo adultos imperfeito, sendo e totalmente subordinadas aos adultos. Desse modo, a
ideia da infância estava ligada essencialmente à idéia da dependência. Se saía da infância
quando se atingia os mais baixos graus de dependência. Esse período era tão breve e
insignificante que a criança não chegava a sair de uma espécie de anonimato, que pode ser
explicado pelo alto índice de mortalidade infantil, que tornava a infância demasiado frágil para
ganhar um lugar significante.
Essa etapa da vida provavelmente seria de pouco interesse, para os escritores
medievais e, assim, somente em épocas comparativamente recentes veio a surgir um
sentimento de que as crianças são especiais, sendo dignas de serem estudadas.
Para Heywood, essa generalização com relação a períodos e lugares não é capaz de
resistir a uma análise mais rigorosa. No entanto, ele considera que a comparação entre
criança “imperfeita” (concepção medieval) e criança mística (concepção dos românticos do
século XIX) é uma ação bastante instrutiva.
(...) Aristóteles acreditava que apenas os homens no vigor dos anos seriam capazes de julgar
corretamente a outros, dado que os jovens exibiam demasiadamente confiança, e os velhos,
confiança de menos. Sendo assim, o conceito aristotélico de criança via esse menino (pois eram
meninos que geralmente se tinham em mente) como sendo “importante não por si mesmo, mas
por seu potencial”.

PERSISTÊNCIAS DAS VELHAS MANEIRAS DE PENSAR


SOBRE A INFÂNCIA NO SÉCULO XX
Até os anos 1960, os pesquisadores consideravam a criança como “organismo
incompleto”, que evoluía em direções distintas, em resposta a estímulos diferenciados. Vemos
que mais uma vez, a idade adulta era a etapa fundamental da vida, para qual a infância não
passava de uma preparação e, assim, o importante era encontrar formas de transformar a
criança imatura, irracional, incompetente, associal e acultural em um adulto maduro, racional
competente, social e autônomo. Esse modo de pensar pode ter criado um obstáculo para a
pesquisa sobre a criança, permanecendo o sentimento de que a infância era um fenômeno de
pouco interesse para os pesquisadores.
Em 1990 os sociólogos Alan Prout e Allison James apontavam para o surgimento de um
novo paradigma para a sociologia da infância, baseado em seis aspectos fundamentais. Em
1998 esses autores, juntamente com Chris Jenks, defenderam abordagens sociológicas, das
quais três são consideradas relevantes para os historiadores:
 A infância deve ser compreendida como uma construção social, de modo que os termos
“criança” e “infância” serão compreendidos de formas distintas por sociedades diferentes,
afinal a imaturidade das crianças é um fato biológico, mas a forma como ela é compreendida
e como atribuem significados é um fato cultural.
 A criança é uma variável da análise social, a ser analisada em conjunto com outras,
como a famosa tríade classe, gênero e etnicidade. Uma categoria relacionada à idade, como
a infância, não pode ser investigada sem que se faça referência a outras formas de
diferenciação social que a intersectam. Uma infância de classe média será diferente daquela
vivida no seio da classe trabalhadora, os meninos provavelmente não serão criados da
mesma forma que as meninas etc.
 As crianças devem ser consideradas como partes ativas na determinação de suas vidas
e das vidas daqueles que estão a seu redor, afinal, as relações entre adultos e crianças
podem ser descritas como uma forma de interação, na qual os pequenos têm cultura própria
ou sucessão delas (as crianças não são receptáculos passivos dos ensinamentos dos
adultos, como pensavam os neobehavioristas; pesquisas sociais recentes indicam ser um
engano atribuir aos pais o papel de modelo e às crianças o de seguidoras).

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