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N.Cham 7.

036(81) Z31a
Autor: Zanini, Walter,
Título: A arte no Brasil nas décadas de

11111111111111111111111111111111111111111111111111
@ 1991 Livraria Nobel S.A.

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dezembro de 1973, artigos 122-130.

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t.036{8J)
WAITER ZANINI 1v 3 i C\.,

A Arte no Brasil
nas Décadas
de 1930-40
o Grupo Santa Helena

NobeI led::
Coordenação editorial
'Carla Milano
ISlIOTE'CAS 01\ "UCM/NAS
18ecretaria editorial BELO '."' ~l~"".~-
.. '.nr,,'TE
,
. .---
Martha Assis de Almeida
'IREG/S7RC1'_~-93' ~gJ_
Normatização bibliográfica
Neusa Dias de Macedo DATA:.lc? I~-.-
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ACERVO: 321 "
Fotografia ...~,

Gerson Zanini
Revisão
Carlos Zanchetta de Oliveira
IElena Benclowicz
Hildegard Feist
Márcia T. Courtouké Menin
Oscar A. F. Menin

Produção gráfica
Natal B. Pepe
Renan Morais Figueiredo
Sérgio Madureira

Dados de Catalogaçãona Publicação (CIP) Internacional


(Câmara Brasileirado Livro, Brasil)

Zanini, Walter, 1925-


A arte no Brasil nas décadas de 1930-40: o Grupo Santa Helena.
- São Paulo: Nobel, Editora da Universidade de São Paulo; 1991

Bibliografia.
ISBN 85-213-0591-5

1. Arte moderna - Século 20 - Brasil 2. Grupo Santa Helena (São


Paulo, SP) 3. Modernismo (Arte) - Brasil4. Pintura moderna - Século
20 - Brasil- SãoPaulo(SP)I. Título.
CDD-709.81
89-0721 -730.0981611

índice para catálogo sistemático:


1. Brasil: Arte moderna: Século 20: Artes visuais
709.81
2. Grupo Santa Helena: Biografia: São Paulo: Cidade
730.0981611 '1
3. Modernismo: Século 20: Artes visuais: Brasil
709.81
4. São Paulo: Cidade: Artes plásticas: História
730.0981611
ftgtadecimentos

oaUtor é agradecido a numerosas pessoas que, por várias formas, trouxe-


(lIfIl.valioso apoio à realização deste livro. Salienta a colaboração do artista
(efll.~nescente do Grupo Santa Helena, Fulvio Pennacchi; dos artistas Nél-
,on Nóbrega, Raphael Galvez, João Tonissi, Renée Lefevre, José Moraes,
o~etto Guersoni, Bassano Vaccarini, Lúcia Suané, Vicente di Grado, Flávio-
~111r() (Tanaka), Giancarlo Zorlini; dos familiares dos artistas José Roberto
araQiano, Eugênia Volpi, Esmeralda Rizzotti, Dante Rosa, Teresa Rosa, EI-
~9-Re Martins, Sílvio Ré Martins, Waldyr Bonadei Fücher, Maria Rosa An-
~reQni; do arquiteto Roberto Cerqueira Cesar; de Alice Rossi, Hélio Atalla,
yVOhne T. Arié Levi, João Cândido Portinari, Adriano Ficarelli, Ileana Ma-
(ia Ficarelli Ferrari, Florença Sercelli, Anna Maria Guasti, Nélsa Alípio, Hé-
JIO~organti, Oswaldo Martone, Orlando Porretta, Luís Médici, Liliane Ma-
~o t.1edina, Maria Margarida de Araújo; da bibliotecária Maria Itália Causin;
~os jornalistas Luís Ernes.to Machado Kawall e Fernando Cerqueira Lemos;
~os historiadores e pesquisadores de arte Mário Barata, Annateresa Fabris,
p0':'ato MelloJúnior, Marta Rossetti Batista, Rui Moreira Leite, Ivone Luzia
vie1ta, Daisy Peccinini de Alvarado, Carlos Scarinci, Lisbeth Rebollo Gon-
t;alvts, Harumi Yamagishi, Cacilda Teixeira da Costa, Ana Maria de Moraes
lfJell\1zzo, Fátima Bercht e Domingos Tadeu Chiarelli. Exprime sua grati-
Óão particular a Neusa Boari Zanini. É reconhecido a museus e outras enti-
Óad~s e a colecionadores, citados no livro, que permitiram a reprodução
Óe C)bras.

1
\

Sumário

PRIMEIRA PARTE
Introdução ao movimento modernista em nova fase
I Reaproximação da realidade e quadro geral do meio
artístico . 19
11 Órgãos associativos e manifestações artísticas............... 31
111 Proveitos de retornos e chegadas de artistas ................ 48
IV As mostras raras e as exportações visitantes................. 52
V Exposições coletivas brasileiras no Exterior.................. 63
VI Mudança, reiteração e afirmação de rumo.................... 68
VII A expansão da arte em vários Est~dos.......................... 72
VIII Aspectos da crítica de arte.......................................... 78 )n-
Apêndice: as publicações nacionais e estrangeiras......... 85 ;ão
lue
SEGUNDA PARTE >is-
O Grupo Santa Helena do
50,
I Formação e desenvolvimento...................................... 89 >ri-
11 A obra dos santelenistas.............................................. 115 cia
Ira
Conclusão ~ ... ... ....... 160 li-
Bibliografia ........................................................................ 179 105
Tábua de ilustrações .......................................................... 183 ~m
Índice Onomástico ............................................................. 185
as.
105
a"s.
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no
ita,
do
lue
r.

13
,
Prefácio

Pouco teórica, recorrente às pulsões internacionais da figuratividade con-


ciliadora de valores do Modernismo e da tradição, objetivada como visão
direta do ambiente natural, humano e social em que se radica, é a arte que
amplamente se delineia no Brasil desde o início da década de 1930. Dis-
tanciada das subjetividades e dos significantes que haviam caracterizado
a produção da fase inaugural do Modernismo, ela terá longo curso,
estendendo-se, em transformações, pelo decênio de 1940, até perder a pri-
mazia na clivagem de novos contextos de linguagem. Carregada da exigência
de interação com a realidadf circundante, essa arte pertence a um quadro
histórico que decorre em boa parte num clima político desfavorável à li-
berdade cultural e, não obstante, é aquele em que se consolida, em ganhos
de luta incessante, o processo de renovação plástica tornado tangível em
1922.

Um dos fatores dessa afirmação reside no espír~ão dos artistas.


Várias foram as comunidades por eles criadas, relevantes para os rumos
da arte moderna, que enfrentava a força inercial das posições acadêmicas.
Uma delas, e das mais consistentes e originais - o Grupo Santa Helena
-, é o escopo do presente ensaio. Não obstante o que já se discorreu, no
passado e no presente, sobre essa aliança de pintores da capital paulista,
_+ a nível de crítica, crônica e reportagem, pesava a ausência de um estudo
I abrangente de sua natureza e contribuição. Foi na atenção a tal fato que
I se empreendeu este trabalho, resultante de antigo propósito do autor.

13
De nascimento espontâneo e obscuro, em 1935, formado por artistas que
em certOs casos já se relacionavam em anos anteriores e que ainda esta-
riam ligados no começo da década seguinte, o agrupamento tem suas raí-
zes no meio do proletariado imigrante, essencialmente italiano, de São Paulo.
Esta referência é vital para o entendimentO dos componentes técnicos e
expressionais que o identificam. Sem dúvida, alcançaram os santelenistas
uma qualidade rara de percepção coletiva, sem prejuízo de suas distintas
personalidades, constituindo-se no elemento nuclear de uma aliança maior
- a FamíliaArtística Paulista ~ e num dos esteios da cosmopolita cultura
plástica instaurada nesta cidade. Denotavam uma imagética ideológica que
era profundamente a de sua classe social, dimensionada, portanto, a partir
de seu interior, na tipologia humana, nõs cenários domésticos e de traba-
lho, em aspectOs do habitat urbano e na paisagem. Se registram consisten-
tes conteúdos de vida, de uma dor muda, como diria Mário de Andrade,
acima de tudo realizaram uma obra pictórica de alta sensibilidade, discipli-
nada pelo métier rigoroso. Capazes no desenho e na composição, cultiva-
dos em aprimoramento permanente, uma de suas idiossincrasias passionais
revelava-se no gosto pelos cinzas. Desenvolveram, como se fora um meta-
motivo, rico espectro de tais tonalidades. Isto causava estranheza à crítica
do Rio, que, sem deixar de, por vezes, admirá-Ias, batia-se pelas sensuais
cores tropicais de seu entorno, esquecida da ecologia múltipla do País. Mas,
para retomar a reflexão de Klee, sobre exatamente os cinzas, neles esse fe-
nômeno respondia a uma necessidade fundamental - ipso Jacto não sen-
do decorrente de uma determinação a priori. Ele é parte das mais signifi-
cativas da tradução de seu temperamento e de um complexo de empatias
com a realidade específica da brumosa urbe operária. E que, por isso mes-
mo, possuía sua grande valia, sua grande afirmação qualitativa. Releve-se
que os integrantes da associação - Rebolo Gonsales, Mário Zanini, Alfre-
do Volpi, Aldo Bonadei, Clóvis Graciano, Fulvio Pennacchi, Manoel Mar-
tins, Humberto Rosa e Alfredo Rullo Rizzotti -, em sua maioria, atingi-
riam um ápice de maturação individual na década de 1940, preocupando-
se este ensaio com tal evolução.
A abordagem do Grupo Santa Helena, distribuída em dois segmentos -
o primeiro sobretudo atinente aos dados biográficos e cronológicos, onde
se cuidou de estabelecer sua formação e trajetória, e o segundo concentra-
do na apreciação crítica - é precedida de um traçado histórico-artístico
geral dos decênios de 1930-40. Através de alguns blocos temáticos, juntaram-
se dados por vezes dispersos ou pouco conhecidos desse contexto em que,
sincronicamente à operosidade de uma nova geração, desdobram-se, não
raro bastante alteradas, carreiras de artistas de projeção anterior e onde ou-
tras vão surgir. Foram arrolados, principalmente, os movimentos associa-

14

..........
tivos e as mostras coletivas do período. Dedicou-se interesse à questão,
até hoje bastante negligenciada, do conjunto de exposições estrangeiras
que nos visitou, algumas de maior porte e significação. Ao lado de outros
fatores, como a vinda de artistas europeus e de outras procedências, pro-
porcionavam essas mostras - raras ainda nos anos de 1930 - confrontos
por vezes dos mais valiosos para o meio ressentido de uma comunicação
fluente com os centros mundiais da arte, o que se tornaria mais efetivo de-
pois da guerra. Os levantamentos procedidos a respeito, e noutros casos,
exigirão continuidade de pesquisa. Aos estudos já efetuados sobre essa época
de arte no Brasil e aqui retomados desejou-se, em suma, adicionar elemen-
tos novos para sua compreensão, com insistência nos eventos coletivos
que a assinalam e de que o Grupo Santa Helena é uma das expressões mais
autênticas.

15
BIBUOTECA DA PUC Ma -
i
I Reaproximação da realidade
e quadro geral do meio artístico

Causas muito diversas contribufram para configurar a etapa do Modernis-


mo artístico no Brasil que se inicia por volta de 1930 e estende-se até qua-
se o final da década seguinte. Pela via da pintura, essencialmente, o movi-
mento tomava outra direção depois dos anos marcados pela exposição de
Anita Malfatti (1889-1964) e pela Semana de Arte Moderna, acontecimen-
tos que, em 1917-18 e em 1922, respectivamente, haviam transformado
o meio, submetido até então aos padrões acadêmicos herdados do século
XIX - todavia sempre resistentes - e onde uma tênue renovação se fize-
ra notar sobretudo por tardios lampejos impressionistas e simbolistas.
Ficava para trás a ênfase colocada na investigação formal. Também superava-
se o que fora, na busca de uma arte de identificação nacional, o teor subje-
tivo da visão do ambiente, que em São Paulo atingira o limite na ortodoxia
do ideário antropofágico (1928-29). Manifestava-se agora, na arte emergente
em nova quadra histórica, a vontade de uma conversão aos dados sensí-
veis do mundo circundante, recuperando-se certos procedimentos repre-
sentativos de antiga tradição pictórica. As atitudes intelectualizadas da van-
guarda dos segundo e terceiro decênios, que interiorizavam os problemas
plásticos, cediam ao apelo mais direto do entorno físico, humano e social.
Recorria-se, entretanto, às soluções espaciais tectônicas estabelecidas por
Paul Ctzanne (1831-1906), assim como (noutro extremo) à análise expres-
sionista da imagem: Tais linhas de força prevaleceriam até ganharem cor-
po as concepções estéticas abstratas, impulsionadas desde antes da influência
trazida pela internacionalidade da Bienal de São Paulo.

19
Os artistas do primeiro Modernismo, pertencentes às altas classes sociais,
mudavam, por vezes, de cQmportamento, acercando-se da realidade da vi-
vência popular no início dos anos de 1930, porém mais incisivamente este
apego ocorria com a geração entrante, em boa parte de modesta origem
e de formação em geral menos sofisticada. A crítica, em momento de defi-
nição'na época, estimulava a nova orientação. Para numerosos de seus mem-
bros impunha-se a necessidade de uma arte comprometida com a proble-
mática social - questão que se tornava alvo de muitos debates.
Essa evolução da pintura no Brasil acorda-se em vários aspectos aos siste-
mas figurativos imperantes no Velho Continente desde o fim da Primeira I
Guerra Mundial. As correntes realistas que ali eram restauradas, em oposi-L'\
ção à radicalidade das posições formais dos primeiros vinte anos do sécu-
lo (a que não renunciava apreciável contingente de artistas), evidenciavam-se
também no México, nos Estados Unidos e em outros países deste hemisfé-
rio, com uma procura de status próprio.
Em nova fase, o Modernismo brasileiro receberia infusões variadas ae va-
lores europeus e aqui penetravam os estímulos da arte mexicana, mas
afirmavam-se também soluções geradas pelo próprio ambiente de traba-
lho, de onde resulta uma parcela de contribuição ao fenômeno geral da
figuração reintroduzida.
Uma série de ensaios críticos e uma crescente vaga de exposições nos últi-
mos anos - dentre as quais se destaca Les Réa1ismes,organizada pelo Centro
Georges Pompidou e pela Staatliche Kunsthalle de Berlim, em 1980~81,com
vistas ao período interguerras (1919-39) - têm enfocado essa ressur~n- !

ci~ do discurso que confronta a construção do espaço plástico com a or-


denaç.?o do universo exterior, assumindo muitas vezes diferenciados com-
promissos com a matéria social e política. Na história da arte contemporâ-
nea ocorreram assim óbvios conflitos entre as concepções que preservam
a!lalogias essenciais com o real, de um lado, e os desdobramentos da arte 'J
abstrata (assinalados em termos individuais e nã criação de novos grupos, I "I
como Abstraction-Création e Cercle et Carré, fundados em Paris, da So-
ciety of American Abstract Artists, nos Estados Unidos etc.) e o Surrealis-
mo, de outro. Se o purismo estético da arte abstrata em suas vertentes e
o Surrealismo que o contestava são fenômenos salientes na armação histó-
rica da arte do século XX, as tendências que exprimem conteúdos extraí-
dos da vida cotidiana e do social em múltiplas variantes, menos avalizadas
até data recente, não deixaram de desempenhar um papel no complexo
jogo de forças do Modernismo, embora sem maior impacto e conseqüên-
cia a nível de linguagem. Seus representantes reuniram-se em associações
por vezes notórias, comb são os casos de Valori Plastici, desde 1919, na

20
Itália, e, mais tarde, em 1923, de Novecento, também na Itália, e da Neue
Sachlichkeit, na Alemanha. Entre seus vultos internacionais encontram-se
artistas que haviam adotado o "retour à 1'0rdre", como o ex-metafísico
Giorgio de Chirico (1888-1978), os ex-futuristas Cado Carrà (1888-1966),
Gino Severini (1883-1966), Ardengo Soffici (1879-1964) e Mario Sironi
(1885-1961) e os expressionistas alemães Max Beckmann (1884-1950), Ot-
to Dix (1891-1969) e George Grosz (1893-1959). Ressaltem-se as mutações
sofridas por um artista de importância extrema como Pablo Picasso
(1881-1973), ou de um André Derain (1880-1954) e um Fernand Léger
(1881-1955): ~poca constituíram.=se eles em criadores (te uma aborda-
g~m icônica lig~d~ a parâmetros de tradição cláss~ca e portanto divergente
do gue h~vi_~mproduzido em fases de ruptur:a. E o que sofrivelmente se
--' chamou de rétourà l'ordre. No México, desde o começo dos anos de 1920,
eVIC1enciou-seumniõVimento de arte social, estimulado pela Revolução,
que tinha em conta elementos de sua cultura autóctone e popular e foi in-
fluente nas Américas. Os artistas organizaram-se ali em sindicato e obtive-
ram do governo condições para a realização de murais em edifícios públi-
cos, destacando-se a obra deJosé Clemente Orozco (1883-1949), Diego Ri-
vera (1886-1957), que renunciara ao Cubismo dos anos parisienses, e Da-
vid Alfaro Siqueiros (1896-1974). Esse exemplo seria seguido nos Estados
Unidos, cujo principal pintor realista percorreu, entretanto, solitário cami-
nho existencial: Edward Hopper (1882-1967). Outro exemplo a citar, na
senda de uma arte de fundamentos realistas e sociais, desta vez no Brasil,
é o de Cândido Portinari (1903-62). O reexame da crítica fez com que o
nome do introspectivo francês B.K. Balthus (1908) entrasse recentemente
na constelação internacional dessa neofiguração.
,,'-' Desde o "finaldos anos de 1920, o Rio de Janeiro fortalecia-se com a apari-
ção de artistas dispostos a opor-se aos objetivos rotineiros traçados pela
~ Escola Nadonal de Belas-Artes e influentes no País. Por obra do arquiteto
Lucio Costa (1902)1, no início d~oxa..dé.Ç.:tda [eç~_tmtllnuwn=se-a.ENBA.
e o Salão Nacional. Pouco antes, em 1929, uma exposição aberta a todos
õS ãrtistãs, organizada pelo crítico e artista Celso Kelly (1906-79), mentor
da recém-criada Associação de Artistas Brasileiros, j~ indício d~ inco.n-
formismos
, com a mentalidade reinante na velha escola imperial.. 2
."

Tanto no Rio como em São Paulo eram comuns as reações de repulsa aos
1 Lucio Costa assumiu a direção da ENBA artistas avançados mais jovens, os quais, em boa parte, pertenciam a clas-
em 8 de dezembro de 1930.
ses de menores posses para que lhes adviessem as possibilidades de estu-
2 Cf. VIEIRA, Lúcia Gouvêa, "Introdução",
in Salão de 1931, Marco da Revolução da do e conhecimento que não haviam faltado aos primeiros moder!listas. No
Arte Moderna em Nível Nacional, Rio dela- Rio, o tradicional espírito acadêmico opunha óbvias resistências à subver-
neiro, Instituto Nacional de Artes Plásticas, são de suas regras, enqua~to em São Paulo a hostilidade fazia-se notar em
p. 22, 1984.
duas frentes: a dos próprios acadêmicos e a da geração de 1922, aristocrá-

21
'\
tica e preconceituosa em relação à origem social e à formação dos {...
recém-chegados.
Ao tratar dos "representantes novos" da FamíÍia Artística Paulista, o críti-
co Mário de Andrade em mais de uma oportunidade referiu-se a sua condi-
ção social. Citava-os como sendo "todos do povo, sinão diretamente pro-
letários, pelo menos vindos de operários ou de gente de pequenos recur-
sos econômicos e culturais".3 Ora, esta condição foi determinante de suas
carreiras. Do mesmo modo que muitos de seus colegas do Rio, sua presen-
ça corresponde a aspectos recentes de uma sociedade em que se registra
a progressiva intervenção da classe média e do proletariado em seu desti-
no, apesar da irrelevância do papel político que exercem.4 Elemento de pri-
meira plana a considerar nesse contexto e na história do Modernismo, de
um modo geral, é a participação de artistas imigrantes ou de seus descen-
dentes. Mais que em outras partes do País, esta questão é decisiva em São
Paulo e tem grande importância em todo o Sul do Brasil.
A etapa histórica em que se situa a produção desses artistas ascendentes,
bem como a dos primeiros modernistas em nova fase, fora assinalada, de
início, pela débâcle financeira de 1929 - e suas graves repercussões na
década seguinte (queda dos preços dQ café no mercado internacional) -
e pela Revolução de 1930, organizada para derrubar a oligárquica Repúbli-
ca Velha, acontecimento sucedido pelos conflitos ideológicos que provo-
caram a implantação do discricionário Estado Novo (1937-45). Getúlio Var-
gas imprimira uma linha nacionalista a seu governo, valendo-se de mode-
los europeus para estabelecer o regime autoritário. A nova ordem política,
inaugurada em 1930, desiludiu as esperanças dos que acreditavam em sua
. capacidade de promover maior igualdade social. Vargas procurou, sem dú-
vida, a melhoria das condições de vida das classes operárias através de le-
gislação reparadora, mas as graves contradições entre capital e trabalho re-
sultaram em crescente clima de repressão. Antes do golpe de Estado de
1937, as tensões políticas e sociais marcar-se-iam, em 1932, pela derrotada
revolução dos paulistas em prol da Constituinte e, em 1935, pela insurrei-
ção comunista. Esse período, que, não obstante a crise política, conheceu
'substancial impulso de industrialização, coincidiu parcialmente com a du-
ração da Segunda Guerra e a situação de certo retraimento que isso signifi-
cou para o País. "3ANDRADE, Mário de, "Ensaio sobre Cló-
O processo de abertura cultural desencadeado nas décadas de 1910 e 1920 vis Graciano", 1944, Transcrito in Motta,
Flávio, "A Família Artística Paulista", sepa-
teria continuidade nos anos de 1930, sendo uma de suas evidências maio- rata da Revista do Instituto de Estudos Bra-
res a publicação de obras fundamentais sobre a sociedade brasileira, assi- sileiros, São Paulo, (10): 157, 1971.
nadas pelo modernista Sérgio Buarque de Holanda, pelo regionalista, "mo- 4 Ver FAUSTO, Boris, A Revolução de 1930
dernista a seu modo", Gilberto Freyre e Caio Prado Júnior. As restrições - Historiografia e História, 2 ed., São Pau-
ã liberdade de pensamento, impostas no período de 1937-45, prejudica- lo, Brasiliense, pp. 82-5, 1972.

22
5 O anteprojeto do Departamento de Patri- ram, em certas áreas mais que em outras, esse desenvolvimento, mas não
mônio Histórico e Artístico Nacional foi re-
digido por Mário de Andrade em 1936, ao
conseguiram sustá-lo. Na verdac:!e...o ,poder não se furtava, às vezes, a aS,si-
tempo em que era diretor do Departamen- I!!.ila!!com oportunismo, os princípios do Modernismo.
to Municipal de Cultura de São Paulo. Por Houve, entretanto, homens esclarecidos dos altos escalões do governo que
muito tempo, a orientação do órgão fede-
ral não levou na devida conta o patrimônio
foram autores de alguns empreendimentos notáveis nesse decênio,
de períodos posteriores ã época colonial, sobressaindo-se a atuação de Gustavo Capanema no Ministério da Educa-
que inclui as construções neoclássicas, eclé- ção e Saúde Pública e a de Rodrigo Mello Franco de Andrade na condução
ticas e Art Nouveau. dos trabalhos que culminaram no programa de preservação do patrimônio
6 Sobre o Departamento Municipal de Cul- histórico e artístico colonial.5 Releve-se a redefinição do ensino através da
tura, ver DUARTE, Paulo, Mário de Andra- Escq.Ia Nova, por 'obra de educadores como Anísio Teixeira e Fernando
de por Ele Mesmo, São Paulo, Ed. Huci-
teclPrefeitura do Município de São Paulo, de Azevedo, a constituição de universidades, especialmente a de São Pau-
pp. 32-5, 49-121, 1985. lo, criada em 1934 e sua, desde logo importante, Faculdade de Filosofia,
7 Os estatutos da Universidade de São Pau- Ciências e Letras. Em São Paulo, outra realização das mais significativas,
lo, baixados por decreto de 3 de setembro que se deve ao escritor Paulo Duarte, é o Departamento Municipal de Cul-
de 1934, previam, entre seus institutos, a Es-
tura, que Mário de Andrade dirigiu entre 1933 e 1938.6 As disciplinas ar-
cola de Belas-Artes, com cursos de pintura,
escultura e gravura de uma duração de seis tísticas receberiam incisiva atenção da Universidade do Distrito Federal,
anos. Entretanto o dispositivo legal perma- organizada por Anísio Teixeira, ao contrário do que ocorreu na USP,7 Os
neceu letra morta. dois anos de existência de seu instituto especializado (1935-37) represen-
8 Quando de visita ao Brasil, em viagem pe- taram válida tentativa para o melhor desenvolvimento das artes e Seu estudo.
la América Latina, no final de 1936, Augus-
te Pérret (1874-1954) também contribuiu Uma das áreas culturais que apresentou maior evolução foi a da arquitetu-
com sugestões para o projeto. A opinião des- ra, que ganhou força no próprio âmbito oficial, malgrado a estreiteza do
te arquiteto francês, de linha muito diversa regime em suas linhas gerais. A arquitetura moderna local, com o antece-
daquela de Le Corbusier, foi altamente apre- dente histórico de Victor Dubugras (1868-1933), o funcionalismo de Gre-
ciada. Ver HARRIS, Elizabeth D., Le Corbu-
sier and the Headquarters of the Brazilian. gori Warchavchik (1896-1972) e Rino Levi (1901-65), os projetos cubo-
Ministry of Education and Health futuristas e expressionistas de Flávio de Carvalho (1899-1973), raramente
l executados, havia recebido o estímulo das visitas de Le Corbusier
1936c1945, Chicago, pp. 126-7, 1984.
9 Inúmeros são os testemunhos das dificul- (1887-1965), em 1929, e de Frank Lloyd Wright (1869-1959), em 1931. Se-
dades encontradas pelos artistas não conser- rá certamente considerada um dia a presença de Bernard Rudofsky (1907-88)
vadores para sobreviverem de seu trabalho
nesse período. O incipiente colecionismo
em São Paulo. Com a construção do edifício do Ministério da Educação
local inclinava-se para os acadêmicos ou se e Saúde Pública, no Rio, entre 1937 e 1943, resultado de um projeto de
voltava para os nomes estrangeiros. Rio e Le Corbusier,8 que retornara ao Brasil em 1936, e das variáveis nele intro-
São Paulo eram tradicionalmente freqüen- duzidas por uma equipe de jovens arquitetos cariocas - audácia inventiva
tados por marchands europeus, como e pureza amena das formas -, seria definida uma linha estrutural própria
Georges Petit, que vinha uma vez por ano no contexto da arquitetura internacional.
ao Brasil vender quadros, e seu sucessor
Blanchon, que instalara uma galeria de arte Não obstante adensar-se, nessa segunda fase o movimento modernista en-
no Triângulo (depoimento de Alfredo Mes- frentava um instante particularmente difícil para melhor expandir-se. Não
quita ao autor em 27 de junho de 1975). Ou- se difundira o suficiente o gosto de conviver com o novà.9 Raros eram os
tro exemplo é o do filho do marchand Jor-
ge de Souza Freitas, casado com a filha do artistas modernos que alcançavam o sustento através do próprio trabalho,
pintor francês Edgar Maxence. "Ele trazia de num meio de poucos interessados, de raros colecionadores,1O sem museus
Paris obras de Maxence e outros artistas aca- atuantes. O educador Fernando de Azevedo exprime a verdade quando afir-
dêmicos muito aceitos pela burguesia pau- ma que o público não acompanha, senão lentamente, o desenvolvimento

23
nos (depoimentO do artista ao autor em 14 maio de 1976 e 21 de dezembro de 1985,
listana" (depoimento de Nélson Nóbrega ao
autor em 7 de outubro de 1985). Como em de novembro de 1974). Os pintores do Gru- respectivamente).
toda parte, havia aqui o "divórcio do artis- po Santa Helena, em boa parte, dedicavam- 10O estudo do colecionismo privado no
ta com o público" e muitos tributavam a in- se à decoração de casas. "Com o que recé- Brasil, de um modo geral, está por ser fei-
compatibilidade não à falta de entendimento bia decorando uma sala, eu podia viver três to. Por essa razão as referências que seguem,
dos novos códigos utilizados pelo artista, meses e podia pintar no campo", disse-nos no que diz respeito ao Modernismo, são for-
mas à "cerebralização de sua arte", como Volpi ao falar dessa sua atividade nas déca- çosamente precárias. Em São Paulo,
afirma Milliet ("Posição do Pintor", in Pin- das de 1920-30 (depoimento ao autor em 3 sobressai-se naquela época Mário de Andra-
tura quase Sempre, Porto Alegre, Globo, de fevereiro de 1976). Como afirma Rebo- de, que continuou a ampliar a coleção ini-
1944, p. 97). Crescia, porém, a audiência à lo, "a classe rica não aceitava a obra de ar- ciada nos primeiros anos da década de 1920.
arte moderna, mesmo se em proporções te. só a decoração" (depoimento ao autor Formou com zelo de escolha e perseveran-
modestas para permitir horizontes melho- em 3 de março de 1976). E outro artista do ça o acervo de 604 peças (nacionais, sobre-
res à maioria dos artistas. A principal exce- grupo, Manoel Martins, afiança que, às ve- tudo), hoje no Instituto de Estudos Brasilei-
ção à regra era Portinari, que possuía renO- zes, "vendia um quadro por cip.co contos, ros da USP (d. Coleção Mário de Andrade
me, o que lhe assegurava mercado e enco- o que dava para comprar tinta, que na épo- - Artes Plásticas, Catálogo organizado por
mendas importantes. Segundo o empresá- ca era só francesa e holandesa" (depoimen- Marta Rosseiti Batista e Yone Soares de Li-
rio Luís Médici, que formou pequeno acer- to ao autor em 3 de março de 1976). Para ma, IEB-USP, São Paulo, 1984). Permanece
vo de obras brasileiras, "Portinari vendia a escultora e pintora Pola Rezende, nos anos uma incógnita a extensão e localização da
seus quadros à razão de um conto e qui- de 1930 "a arte moderna não tinha valor" coleção do mecenas Armando Álvares Pen-
nhentos quando expôs em 1934 em São (depoimento ao autor em 8 de junho de teado, que incluía numerosas obras euro-
Paulo. Por uma representação com figura in- 1974). péias, sobretudo da Escola de Paris (ver OU"
teira cobrava oito contos e com a figura pe- Seria fácil alinhavar uma série de outras de. RAND, José Carlos Garcia, Arte, Privilégio
la metade, quatro contos. Era muito, pois clarações a respeito. A ilustração para jor- e Distinção, v. 2, São Paulo, l1SP, p, I.
um Ford na época valia onze contos. Segall nais, revistas, livros, capas de livros trazia 309-311, 1985). Pela década de 1940, o em-
vendia por preços ainda mais altos. Cobra- alguma recompensa para vários artistas, a presário Francisco Matarazzo Sobrinho,
va sistematicamente trinta contos por seus exemplo de Goeldi. A Casa Comado (de orientado pelo intelectual Carlos Pinto Al-
quadros. Ele só conhecia o número trinta" Comado Sorgenicht Filho) valia-se de "artis- ves, pelo industrial e colecionador Carlo A.
(depoimento ao autor em 17 de julho de tas especializados" para os atendimentos de Tamagni, pelo pintor Alberto Magnelli, pe-
1985). Como é notório, Segall não depen- gravação em crystallique e encomendava a la escritora Margherita Sarfatti e por outros
dia da venda de seus quadros para viver. As Antônio Gomide seus trabalhos de vitral. amigos, adquirira obras modernas, e este in-
dificuldades deparadas por muitos artistas Flávio de Carvalho incluía entre seus prés- teresse resultaria em larga coleção estrangei-
''',!
modernos não devem ser imputadas a uma timos as tarefas de decorador. Noutra pers- ra e nacional, num total de 438 peças (de-
contínua repercussão das palavras virulen- pectiva, a da animosidade ou do repúdio do zenove das quais de propriedade que divi-
tas de Monteiro Lobato publicadas em 1917, público pela expressão moderna, os exem- dia com Yolanda Penteado, apreciadora de
a dano de Anita Malfatti, como já se argu- plos também não faltam, como o das telas arte e colecionadora), doadas à USP em II
mentou. Havia, isto sim, contínuo despre- dilaceradas em exposições citadas neste li- 1962-63. A coleção, em sua parte interna-
paro do público, em geral refratãrio à arte vro. Raphael Galvez, a respeito desse com- cional, constituída nos anos do pós-guerra,
moderna. A iniciadora do Modernismo portamento, lembra um episódio da expo- deve-se a Magnelli e Margherita Sarfatti (d.
"nesses anos dedicou-se a uma pintura Gom sição de Flávio de Carvalho, em 1934: cer- CatãIogo da Exposição-Homenagem a Fran-
intenções decorativas, com a qual procura tas pessoas evitavam passar pela rua Barão cisco Matarazzo Sobrinho 1898-1977, MAC-
manter-se" (BATISTA, Marta Rossetti, in Ca- de Itapetininga, servindo-se da rua 24 de USP, São Paulo, 1977, e depoimento pres-
tálogo da Exposiçãó de Anita Mal/atti, São Maio, de "horror a seus nus" (depoimento tado ao autor pela desenhista Gerda Bren-
Paulo, MAC-USP, p. 26, 1977) e através do ao autor em 17 de março de 1985). No meio tani em 30 de maio de 1977). Matarazzo cul-
ensino. Como Anita, também Antônio Go- dos artistas acadêmicos, as restrições aos tivava a idéia de criar um museu. Seu dese-
mide, Alberto da Veiga Guignard, Waldemar modernistas tinham vãrias "conceituações". jo tornou-se realidade com a fundação do
da Costa, Nélson Nóbrega, Axl Leskoschek, O pintor Torquato Bassi considerava os Museu de Arte Moderna de São Paulo, em
Bruno Lechowski, Yolanda Mohalyi e mui- membros do Grupo Santa Helena como 1948, do qual ele se tornou o principal
tos outros davam aulas para garantir o su's- "brincalhões", e Adolpho Fonzari afirmava apoio econômico. Assinale-se que Carlo A.
tento. John Graz "nada auferia de pintura" que eles "não sabiam desenhar" (depoimen- Tamagni doou ao MAMde São Paulo um to-
e ganhava a vida com seus móveis moder- to de Fulvio Pennacchi ao autor em 19 de tal de 85 obras, especialmente dos pintores

24

L
, da F""rua Anistic' p,oo",. =nJw <re,- da arte.ll Mas faltava ao artista, como ao público, o apoio de uma infra-
u de fins dos anos de 1940 (cf. Catálogo da estrutura cultural. Muitos artistas exerciam-se em funções paralelas, sendo
Exposição Coleção Tamagni, São Paulo, que as oportunidades oferecidas em âmbito estatal aquinhoavam apenas
MAM, 19(8). Cabe lembrar, entre outros co-
lecionadores, Samuel Ribeiro, Sérgio Milliet, alguns nomes, entre eles essencialmente Portinari.
Rino Levi, Artur Sivers, Mário Schenberg, Nada houve de semelhante no Brasil às amplas oportunidades oferecidas
AdolphoJagle, Osório Cesar, Aldo Magnel- na década de 1920 pelo governo mexicano a seus artistas - mas no caso
li Sílvio Matsa, João Amoroso Neto, Bene-
dito Lacorte Peretto. O crítico Sérgio MiI- visando à afirmação do regime revolucionário - ou à Works Progress Ad~
liet chegou a possuir uma galeria de nume- ministration (WPA), nos Estados ~nidos, que, nos anos de 1930, garantiu
rosas obras, todavia em grande parte disper- trabalho aos que eram duramente atingidos pela depressão econômica. Es-
sas, pois o crítico tinha hábito de fazer doa- sa providência permitiria, na nação do Norte, a execução de milhares de
ções a amigos e instituições (depoimento de decorações murais, quadros, esculturas, gravuras etc. Enquanto, entre nós,
Lourdes Milliet ao autor em 16 de fevereiro
de 1974). O pintor e escultor Ottone Zorli- iniciativas governamentais de apoio foram escassas. A construção do edifí-
ni foi o primeiro colecionador importante cio do MEC, entregue a Lucio Costa - que de início liderou o trabalho
e uma espécie de marchand do Grupo Santa -, Oscar Niemeyer (1907), Jorge Moreira (1904), Carlos Leão (1906-83),
Helena, desde os anos de 1930. No Rio, en- Affonso Eduardo Reidy (1909-64) e Ernani Vasconcellos (1912), possibili-
tre os nomes que podem ser arrolados, fi-
tou um programa único de integração das artes no País. Foi graças à deci-
gura o do industrial Raimundo Ottoni de
Castro Maya, que, ao lado de Niomar Mo- são do ministro Capanema que a obra pôde concretizar-se depois de supe-
niz Sodré e Rodrigo Mello Franco de Andra- , radas objeções políticas e estéticas das mais reacionárias.12 Da exemplari-
de, foi um dos fundadores do Museu de Ar- da de do edifício participaram as realizações plásticas, nele acomunadas em
te Moderna, em 1949. O acervo nacional e espaços planos e ambientais. As têmperas que representam os ciclos eco-
internacional de Castro Maya encontra-se
nômicos brasileiros no gabinete do ministro (concluídas em 1944) e os azu-
hoje no Museu da Chácara do Céu. Cite-se
o diplomata Josias Leão, que, ao longo do lejos de Portinari, que decoram as amplas paredes externas, o paisagismo
tempo, formou importante acervo de artis- de Roberto Burle Marx (1909); o monumento em granito, simbolizando
tas nacionais e estrangeiros. Outros colecio- a juventude brasileira, de Bruno Giorgi (1905) são os elementos mais im-
nadores cariocas daquele tempo foram o portantes dessa magnífica convivência das artes no prédio que inclui, ain-
médico, dirigente político comunista, co-
merciante e escritor Leôncio Basbaum e o da, esculturas de Jacques Lipchitz (1891-1973), Celso Antônio (1896-1984)
escritor Marques Rebelo. Em depoimento ao e Adriana Janacopulos (1892-1978).
autor, em 5 de agosto de 1985, José Moraes,
além de Basbaum, lembrou os nomes do O exemplo do Rio seria imitado por Juscelino Kubitschek, quando prefei-
médico Jayme Guimarães, de Paulo de Bar- '\ to de Belo Horizonte, ao fazer construir, em 1944, o conjunto da Pampu-
ros e Edgard de Almeida. Acrescente-se os " lha, convidando para esse fim Niemeyer, Burle Marx e Portinari. Em São
nomes de Prederico Barata e Bruno Lobo
(cf. pesquisas em andamento do Prõf. Má-
Paulo, houve reduzidas oportunidades para os artistas nos poucos edifí-
" do Barata). cios públicos que se erguiam. O Teatro de Cultura Artística, fruto da ini-
11.~EVEDO, Fernando de, A Cultura Bra- ~ ciativa privada, projetado em 1942 por Rino Levi e construído em 1949,
sllelra, 2 ed., São Paulo, Ed. Nacional, p. tem na parte superior da fachada um painel em mosaico pastilhado, para
278, 1944.
12- o qual Di Cavakanti (1897-1976) fornecera os cartões.13
E um fato, entretanto, que o ministro Ca-
pa~ema entendera-se longamente com o ar- Nove anos depois da Semana de Arte Moderna,'a criação do Núcleo Ber-
quiteto italiano Marcello Piacentini nardelli e a realização do XXXVIIISalão Nacional de Belas-Artes, respecti-
(1881-1960) para realizar o projeto da Cida- vamente em abril e setembro de 1931, tornaram-se acontecimentos mar-
de U.niv<:.rsitária,no Rio de Janeiro (cf, co-
mUOlcaçao de Lucio Costa ao Colóquio de cantes da fase que se inaugurava. Não obstante os múltiplos obstáculos que
História da Arte, do Comitê Brasileiro de enfrentava, a arte, em seus novos rumos, começava a repercutir mais em
t
25
termos nacionais e a contar com certo respaldo junto a uma elite da opi-
nião pública. A reformulação do Salão Nacional, graças à liberalidade de
espírito de Lucio Costa, coadjuvado pelo poeta Manuel Bandeira, permitia
finalmente que a ele tivessem acesso os artistas modernos. É verdade que
este ensejo foi logo contrariado e que se reentrava a seguir no velho domí-
nio do pompierismo. Mas o Salão Revolucionário provocava uma quebra
nas legitimidades anteriores, mesmo sendo uma miscelânea paradoxal de
pintores, escultores, gravadores e arquitetos, entre a índole mais retarda-
tária e o que constituía as vanguardas locais.
Ao lado dos primeiros modernistas de &ão Paulo - Anita Malfatti, Victor
Brecheret (1894-1955), Di Cavalcanti, LâsarSegall (1891-1957), John Graz
(1891-1980), Antônio Gomide (1895-1967), Regina Gomide Graz (1902-73)',
Tarsila do Amaral (1886-1973) - alinhavam-se, dando força ao toque de
transformação do salão, artistas da segunda leva paulista, como Flávio de
Carvalho, Paulo Rossi Osir (1890-1959), Vittorio Gobbis (1894-1968), Al-
do Bonadei (1906-74), Moussia Pinto Alves (1910-86), Esther Bessel
(1908-64); os representantes dO§, Hélios Seelinger (1878-1965), Alberto
da Veiga Guignard (1896-1962), bugênio de Proença Sigaud (1899-1979),
Ismael Nery (1900-34), Quirino da Silva (1902-81), Orlando Teruz (1902-84), História da Arte, Rio de Janeiro, julho de
Sylvia Meyer (1889-1955), Martinho de Haro (1907), Cândido Portinari e 1983). De características historicistas e mo-
numentais, típicas do fascismo, não seria ja-
artistas germânicos, entre eles Leo Putz (1869-1940), recém-integrado ao mais executado, como, aliás, também aquele
corpo docente da ENBA. Compareciam também o escultor maranhense Cel- de espírito totalmente diverso, proposto por
so Antônio, até há pouco residente em São Paulo, e os pintores Cícero Dias Le Corbusier. Consultar SCHWARTZMANN,
(1908), pernambucano radicado na Guanabara (cujo friso traduzindo feéri- S. et alii, Tempos de Capanema, Rio de Ja-
ca visão nordestina chagalesca, de quinze metros de extensão, foi a sur- neiro. Paz e Terra/EDUSP, pp. 93-105,1984.
13 Anteriormente, em edifício privado, o t
presa consternada da mostra), Waldemar da Costa (1904-82), paraense de UFA-Palace (atual Art Palácio) (1936), Rino
~v origem, fixado no Brasil depois de 21 anos vividos em Lisboa e Paris, e Levi integrara baixos-relevos de um jovem
-PAlberto Delpino Júnior (1907-76), de Minas Gerais. artista na sala de projeções do cinema, com
Dos acadêmicos renomados, que não se sentiam ofendidos pela mudança, figurações mitológicas estilizadas.
14 Sobre a XXXVIII Exposição Geral de
só estavam presentes os pintores Henrique Bernardelli (1857-1936) e Car- Belas-Artes, ver VIEIRA,Lúcia Gouvêa, "In-
los Oswald (1882-1971) e os escultores Amadeo Zani (1869-1944), Hum- trodução", e BURLAMAQUI,Maria Cristina,
berto Cozzo (1900-81) e Hildegardo Leão Velloso (1899-1966), notando-se "O Salão de 31, uma Reavaliação", in Ca-
a ausência de Antônio Parreiras (1860-1937), Augusto Bracet (1881-1960), tálogo de 31..., pp.13-30, 31-57.
Lucílio de Albuquerque (1877-1939), Georgina de Albuquerque (1885-1962), 15Sobre os prêmios no Salão Nacional, ver
Osvaldo Teixeira (1904-74), entre outros. Ficara ausente o introdutor do BARATA, Mário, "Arte Moderna nos Prê-
mios de Viagem dos Salões Nacionais de
Impressionismo, Eliseu Visconti (1866-1944).14 1940 a 1982", in Arte Moderna no Salão
As sementes que atualizaram o Salão Nacional, em 1931, só frutificariam Nacional de Artes Plásticas - Sala Espe-
plenamente mais tarde, em 1940, ao fundar-se a Divisão Moderna, que, por cial, Rio de Janeiro, MEC-FUNARTE,
sua vez, antecede o Salão Nacional de Arte Moderna, criado em 1951. Na 1983-84. O Salão, por seus prêmios, sobre-
tudo, funcionava como mercado privilegia-
antiga exposição anual, os modernos sustentavam luta política tenaz, vi- do de repU!:!ção no País. Não foram raCO'
sando aos prêmios de viagem ao Exterior. 15Um marco na história dessas os equívocos de seus júris.

26

I.
~
atribuições é o prêmio de José Pancetti (1902-58), em 1941, que rompeu
frontalmente a praxe das distinções acadêmicas. Mas, ainda nos primeiros
anos do decênio de 1940, poucos eram os artistas que se inscreviam na
seção especial, reservada aos modernos, por isso fisicamente restrita no
âmbito geral da mostra. Seja como for, o salão atrairia os nomes mais signi-
ficativos do Rio e artistas de São Paulo e outras cidades, travando-se contí-
nua disputa entre modernos e conservadores, com vantagem para aqueles.

Vista das pinturas de Portinari no edifício do


MEC (1936-1944).

27
Em São Paulo, por sua vez, o Salão Paulista de Belas-Artes, fundado em 16As mostras, seguindo tradição antiga no
1934 pela antiga Sociedade Paulista de Belas-Artes, acatava a presença de País, realizavam-se em espaços os mais di-
versificados, desde entidades culturais, edu-
artistas modernos ou tendendo a uma expressão menos conformista. Já em cacionais e de classe até hotéis de alto lu-
sua primeira edição, por entre a participação maciça de representantes da xo, casas comerciais, livrarias, estúdios de
área acadêmica, a exemplo de Pedro Alexandrino (1864-1942), Oscar Pe- fotógrafos ou mesmo recintos de lojas e ar-
reira da Silva (1867-1939), Lucílio de Albuquerque, Georgina de Albuquer- mazéns temporariamente vazios e alugados
que, Theodoro Braga (1872-1953), Adolpho Fonzari (1880-1959), Carlos para esse fim. Eram poucas as galerias de arte
naquelas duas décadas. Pode-se assim dizer
Oswald, Antonio Rocco (1880-1944) etc., vemos os nomes de Anita Mal- que, embora não faltassem locais, as condi-
/
fatti, Tarsila, Hugo Adaroi (1900), Flávio de Carvalho, Guignard, Vittorio ções de apresentação das exposições deixa-
Gobbis, Paulo Rossi Osir, Nélson Nóbrega (1900), Gastão Worms (1905-67), vam geralmente a desejar. No Rio, as prin-
Ado Malagoli(1906), Yolanda Mohalyi (1909-78), Esther Bessel, Alfredo Volpi cipais 'sedes de mostras oficiais eram o
(1896-1988), Bonadei, Mário Zanini (1907-71) etc. Na segunda mostra, em MNBAe a Biblioteca Nacional. O MNBA,ob-
viamente de tendência conservadora, abri-
1935, Portinari, que se transformava em símbolo local da arte moderna, gou, entretarIto, individuais como as de Por-
figurava como membro do júri de seleção de pintura e no júri de premia- tinari (1939 e 1943) e Segall (1943) e diver-
ção da seção. Ele mesmo expunha ao lado de Anita Malfatti, Gobbis, Duja sas coletivas modernas estrangeiras, desde
Gross, Nóbrega, Joaquim Lopes Figueira (1904-43), Arnaldo Barbosa o início da década de 1940. O patrocínio,
(1902-81), Bonadei, Volpi, Zanini e O~ltros. O humor dos organizadores em I contudo, vinha do MEC. Também o Liceu
de Artes e Ofícios hospedava mostras. A As-
relação aos concorrentes modernos podia alcançar extremos: Volpi foi por sociação dos Artistas Brasileiros, em seu es-
vezes cortado e, no salão de 1936, o novato Rebolo Gonsales (1903-80) paço do Palace Hotel, recebia sobretudo ar- J
obtinha a medalha de ouro... Assim, não obstante primar pelo caráter tra- tistas tradicionais pelos anos de 1930 e 1940.
dicionalista, penetravam o salão oficial de São Paulo obras contrárias a suas A Galeria Heuberger, de Theodor Heuber-
regras, o que não se explica senão pela ausência de maior força enraizada ger, desenvolvia atividades desde meados da
década de 1920, acoplando-se à Sociedade
. dos artistas acadêmicos locais, ao contrário de seus parceiros cariocas, de Pró-Arte, instituída em 1930, com sede na
recuada data formados pela velha Academia de Belas-Artes. Nesse salão am- avenida Rio Branco, 118-120. A Associação
bíguo, treinayam, pois, alguns promissores valores que, todavia, encon- Brasileira de Imprensa adaptou o saguão ao
trariam seu próprio território no Salão de Maio, nos salões do Sindicato lado do auditório, no edifício da rua Araú-
dos Artistas Plásticos - órgão em que se converter:J a SPBA, em 1936-37 jo Porto Alegre. E da mesma forma proce-
deu o Instituto de Arquitetos do Brasil, em
-, nas mostras da Família Artística Paulista, que assumiriam papel decisi-
sua sede da praça Floriano, 7, já nos anos
vo na divulgação e melhor aceitação das novas referência$ da arte. de 1940. O salão do fotógrafo Nicolas, na
Cinelândia, e o Studio Eros Volusia são ou-
Para o meio carente de museus e galerias era natural que os espaços de ex- tros locais :i mencionar. A antiga Galeria)or-
posições fossem freqüentemente improvisados.i6 Os museus de arte mo- ge, do marcband)orge de Souza Freitas, ex-
derna, que a partir dos anos de 1930 começavam a difundir-se na Europa punha trabalhos acadêmicos nas primeiras
e nos 'Estados Unidos,17 concorrendo eficazmente para o maior reconhe- décadas do século, e os testemunhos con-
cimento de uma visualidade poética marginalizada, não haviam chegado vergem em considerar a Galeria Askanazy,
estabelecida em 1945, à rua Senador Dan-
a esta parte do mundo. A campanha pela criação de tais órgãos especializa- tas, 55, com orientação moderna, como o
dos, que, desde a década de 1920, se faria vigorosa em Paris, Nova York primeiro passo de sentido mais promissor
e outras capitais, aqui ecoava, emulando entusiasmos em intelectuais co- nessa atividade. Mais tarde, o pintor e de-
mo Ronald de Carvalho, Mário de Andrade, Sérgio Milliet, Anibal Macha- signer Joaquim Tenreiro abriria espaço pa-
do, Luís Martins, Carlos Pinto Alves, e em artistas como Vicente do Rego ra exposições em sua loja de móveis, inau-
gurada em 1947, na rua Barata Ribeiro.
Monteiro (1899-1970) e Carlos Scliar (1920). O reclamo tornara-se insistente Na capital paulista, as exposições ocornam
nos anos de 1930-40, mas só no final desta última década novos museus em vários endereços, sobretudo de estabe-

28

.........
l \ seriam finalmente instituídos, em coincidência, aliás, com a nova etapa que
I se delineava para a arte. Enquanto isto não se dava, a arregimentação dos
l se
artistas em sucess,ivas associações e outras formas de aproximação tornou-
elemento fundamental para a solidificação da arte moderna no País.

lecimentos comerciais. O velho centro, ou MIS, apud DURAND,José Carlos Garcia, op.
seja, o Triângulo e ruas adjacentes, desde os cit., v. 1, p. 86, nota 2), a Galeria da Casa
primeiros anos do século, hospedava fre- e Jardim (aberta no número "41por Heuber-
qüentes mostras. Aos poucos elas começa- ger, em 1938), a Galeria Itá, no número 70
ram a ter lugar também na parte nobre da (do marchand francês Bénéteau, que antes
antiga São Paulo, ou seja, o outro lado do mantivera uma galeria no Hotel Esplanada)
Viaduto do Chá. Na rua São Bento, 12-B, e a Galeria de Barros, o Mulato, todas fran-
localizava-se, desde fins dos anos de 1920, queadas a artistas modernos, que também
a galeria de Jorge de Souza Freitas, o mar- dispunham de local cedido pelo coleciona-
chand do Rio. Nessa mesma rua, no núme- dor Samuel Ribeiro à rua Barão de ltapeti-
ro 14, funcionava a Galeria Blanchon. Pró- ninga, 30. O atelier de Clóvis Graciano, à
ximos ao Triângulo, estavam o Automóvel rua Xavier de Toledo, 98, li? andar,
Clube, à rua Líbero Badaró, 287, o Palacete tornou-se local de exposições na década de
das Arcadas, à rua Quintino Bocaiúva, 54, 1940, assim como o Centro Paranaense, no
e o Palacete Pirapitinguy, à rua João Bríco- Edifício Martinelli. A Livraria Brasiliense, na
Ia, 22, com salas que receberam numerosas rua Dom José de Barros, 163, e a Livraria
exposições. O Diário Oficial, à rua Onze de Jaraguá, na rua Marconi, 54, adaptaram pe-
Agosto, 41 (onde, por algum tempo, quenas áreas para exposições. Em 1947, a
instalou-se a Pinacoteca do Estado), cedia es- Galeria Domus, à rua Vieira de Carvalho, 11,
paço para esse fim. A Galeria Prestes Maia, do casal Pasquale Fiocca e Ana Maria Fioc-
inaugurada em 1940, na praça do Patriarca, ca, foi a primeira a dedicar-se exclusivamen-
com acesso fácil para grande número de pes- te aos artistas de orientação moderna. A se-
soas, foi o último local importante de apre- de do "Clubinho", sucessivamente instala-
sentação de obras de arte nessa área. Do ou- da na rua Barão de Itapetininga, 273, e na
tro lado do vale, região nova e elegante, as rua Bento Freitas, 306 (no edifício do Insti-
mostras ocorriam no Teatro Municipal (que tuto dos Arquitetos), desde 1948 realizava
abrigou a Semana de Arte Moderna), no Ho- accrochages de obras de seus associados.
tel Esplanada e em várias galeJ;iase espaços 17O Muzeum Sztuki de Lodz (Polõnia), fun-
da praça Ramos de Azevedo e da rua Barão dado em 1929. foi provavelmente o primei-
de Itapetininga e proximidades. Entre 1925 ro no gênero. Precedem-no o colecionismo
e 1930 estavam estabelecidas nessa rua a loja pioneiro da Societé Anonyme de Katherine
de arte e antiquariado Novelty, de proprie- Dreier-Marcel Duchamp, nos Estados Uni-
dade do jornalista Marcelino de Carvalho (d. dos, e de Malevitch (1878-1935) e Stchou-
depoimento de Carolina da Silva Telles a0 kine. na União Soviética.

29
l
.;

11 Orgãos associativos e manifestações artísticas

A ampliação do espaço dos artistas modernos deveu-se em muito a sua ca-


pacidade de constituir sociedades e promover exposições e encontros de
estudos. Contribuiu para isso também o interesse de intelectuais e outros
animadores da cultura. A tendência à aglutinação dos artistas não se desen-
volveu identicamente no Rio e em São Paulo. O escritor Anibal Machado,
tendo em mente a capital federal, lamentava a "ausência do espírito de as-
sociação em nossos artistas",! e o pintor José Moraes (1921), participante
ativo do movimento carioca dos anos de 1940, ratifica isto ao dizer que
o "espírito de associaçã9 no Rio nunca foi o nos~o forte e quando ocorria
era bem pouco duradouro e tinha outras feições" (em relação a São Pau-
lo), considerando com acerto o Núcleo Bernardelli como a "grande exce-
ção carioca".2 Ainda assim, esses grupos do Rio foram expressivos.
Congregando numerosos membros, criara-se, em 1929, a Associação dos
Artistas Brasileiros, que, além das Artes Plásticas, estimulava espetáculos
teatrais, patrocinava concertos, festivais de cinema e conferências. No ano
seguinte Theodor Heuberger fundava a Pró-Arte, órgão que dava seqüên-
I In Art Brésilien Moderne (peinture et cia e ampliava as atividades desenvolvidas desde 1924 por esse incentiva-
sculpture), p. 1. Entretanto, os encontros de dor do intercâmbio cultural entre Alemanha e Brasil. Naquele ano, com
intelectuais e artistas, em sua casa, origina- a ajuda do pintor Navarro da Costa (1883-1931), então cônsul em Muni-
ram um "clube" que levava seu nome.
2 MORAES,José, Algumas Histórias de um que, ele apresentara no Liceu de Artes e Ofícios do Rio a 1 Exposição de
Sobrevivente Carioca da Classe 1940, São Arte Alemã, depois remetida a São Paulo, Campinas e Santos. Essa e outras
Paulo, p. 1, set. 1984. mostras por cuja vinda foi responsável na década de 1920 - como a Ex-

31
posição de Arte Alemã no Brasil (~928)3 e a Exposição de Arte Decorativa
Alemã no Brasil, preparada pela Deutscher Werkbund,4 apresentada na
ENBA (Rio) e na rua Álvares Penteado, 7 (São Paulo), em 1929 - teriam
continuidade nos anos de 1930, a começar pela Exposição Alemã de Li-
vros e Artes Gráficas na América do Sul, composta de volumosa produção
editorial e de um accrochage de obras expressionistas, como veremos a
seguir.s Em 1933, a Pró-Arte, que desde o ano anterior contava com Guig-
nard na direção artística, exibiu na Sociedade. Pró-Arte Moderna de São Paulo
obras do Salão que realizava no Rio (ver adiante).
I
Expressão da maior conscientização política que artistas e escritores ad- \

quiriam foi a constituição do Club de '"Cultura Moderna, no Rio, a quem ~V" NEXICO
se deve o Salão de Arte Social, no primeiro semestre de 1935, o ano do
surgimento do Fronte Popular em Moscou (para a luta internacional anti-
l _ DA-.."",,".
Emblema do Núcleo Bernardelli.
fascista), no VII Congresso do Comintern e da "Intentona Comunista" no
Brasil. Ao Salão de Arte Social - demonstrativo de que as dissensões no
meio não se reduziam à refrega entre modernos e acadêmicos - acorre-
ram numerosos artistas, por vezes distanciados da questão, com inscrição
de trabalhos gráficos (principalmente) que atendiam ao apelo dos organi-
zadores: o de produzirem "uma arte objetiva, realista, popular".6 Entre
outros, participaram Di Cavalcanti, Osvaldo Goeldi (1895-1961), Guignard,
Hugo Adami, Portinari, Carlos Leão, Paulo Werneck (1907), Alcides da Ro- 3 Organizada pela Seção de Berlim da So-
cha Miranda (1909), Santa Rosa (1909-56), Aldary Toledo (1915). É de no- ciedade Geral de Belas-Artes da Alemanha
tar que, em São Paulo, sem atitudes programáticas, o gravador Lívio Abra- e patrocinada pela Legação Alemã no Bra-
mo (1903), desde 1923, num momento inicial de carreira, apegava-se a re- sil, foi integrada por artistas de linha tradi-
presentações da classe operária, e um dos primeiros pintores a cultivar te- cional. O catálogo é prefaciado por Félix
Krause, presidente da sociedade.
mas proletários foi César Lacanna (1903-83), .de discreta tendência moder- 4 O prefácio do catálogo traz rápida expli-
na, na passagem da década de 1920 para a de 1930. Assinale-se, ainda, na cação dos propósitos da Deutscher Werk-
Guanabara, a fundação, no começo dos anos de 1940, da Sociedade Artis- bund e de sua difusão internacional.
tas Brasileiros Reunidos. 5 A exposição teve o patrocínio do minis-
tro das Relações Exteriores da Alemanha.
O primeiro agrupamento movido pelo desejo de produção artística atuali- Organizou a parte dos livros a União dos Li-
zada foi o Núcleo Bernardelli, cuja existência se estende de 1931 a 1940. vreiros Alemães, de Leipzig, enquanto a se-
leção de obras gráficas coube ao dr. Alfred
Nascendo do curso livre da ENBA, em anteposição ao ensino cristalizado Kunn e aos artistas Karl Hofer e George
da Escola, com denominação que prestava homenagem a dois antigos mes- Grosz (d. catálogo da mostra, Leipzig,
tres liberais da instituição, Rodolfo Bernardelli (1852-1931) e Henrique Ber- 1930).
nardelli, o Núcleo tornou-se um lugar de convivência, aprendizado e afir- 6 Mostra de Arte Social, palestra de Anibal
mação profissional. Eram seus membros os pintores Bruno Lechowski Machado pronunciada por ocasião do encer-
ramento do Salão, in Movimento, Rio de Ja-
(1889-1941), Manoel Santiago (1897) e Quirino Campofiorito (1902) - que neiro, Revista do Club de Cultura Moderna,
cumpriam a função de professores -, Eugênio Proença Sigaud, José Pan- 1 (4): 19, out. 1935. Ver também AMARAL,
cetti, Bráulio Poiava (1904), Ado Malagoli, Joaquim Tenreiro, Martinho de Aracy, Arte Para Quê?, São Paulo, Nobel,
Haro, Borges da Costa, Bustamante Sá (1907), Expedido Camargo Freire pp. 50-I, 1983.

32
(1908), Yoshyia Takaoka (1909-78), Edson Motta (1910-81), João José Res-
cala (1910), José Gomez Correia (1913), Milton Dacosta (1915-88) e Yuji
Tamaki (1916-79). Caracterizavam-nos o interesse pelo ofício e uma mo-
derada posição modernista. Desenvolviam-se em contínuos estudos de de-
senho e composição e no trabalho ao ar livre. Em seu espectro temático
figuram o paisagismo de recantos do Rio, cenas de trabalho operário, re-
presentações de nus, retratos, auto-retratos e naturezas-mortas, observando-
se a influência construtiva de Cézanne por entre a relativa liberdade de seus
procedimentos técnicos na forma de compor. Entre os artistas mais atuan-
tes do Núcleo estavam Edson Motta, Ado Malagoli e João José Rescala, de-
pois dirigidos também à profissão de restauradores de obras de arte, en-
quanto José Pancetti e Milton Dacosta seriam os que melhor se consolida-
riam no devir de suas obras. De 1932 a 1935, o Núcleo realizou quatro sa-
lões e exibiu um conjunto de obras de seus integrantes no Studio Eros Vo-
lusia (1933),7 além de comparecer à Exposição Internacional da Feira de
Amostras, promovida pela Sociedade Brasileira de Belas-Artes (1934).
Por sua vez, um verdadeiro. círculo de trabalho constituiu-se junto a Porti-
nari, no atelier de pintura mural que dirigia no Instituto das Artes da UDF,
destacando-se dentre os discípulos Rubem Cassa (1905), Roberto Burle Marx,
Alcides da Rocha Miranda, Aldary Toledo e Edith Behring (1916).
No Instituto lecionaram ainda os pintores Guignard e Carlos Leão, os es-
cultores Celso Antônio e Lelio Landucci (1890-1954), o escritor Mário de
Andrade, o crítico e pintor Celso Kelly, o arquiteto Lucio Costa e o profes-
sor de estética da Sorbonne Etienne Souriau, o que demonstra o apuro e
a sensibilidade que regeram a escolha do corpo docente.
Em fins dos anos de 1930 e início da década seguinte situou-se a atividade
7 MORAIS,Frederico, Núcleo Bernarde/li
Arte Brasileira nos Anos 30 e 40, Rio deJa-
de um grupo de estudantes e ex-estudantes da ENBA inconformado com
neiro, Edições Pinakotheke, pp. 48-51, o ensino retrógrado da instituição.8 Não há nome ou título que identifi-
1982. que essa secessão, mas a posição rebelde acusa os conflitos existentes no
8 Cf. BARATA, Mário, "Panorama da Arte velho estabelecimento. "Entramos naquela Escola virgens-inocentes. En-
Moderna no Brasil", Brasil Arquitetura Mo- contramos, saindo dela, Roberto Burle Marx, Aldary Toledo e Ubi Bava9
derna, Rio de Janeiro, (1): 37, ago.lset. 1953.
Ver ZANINI, W., "Arte Contemporânea", in
(os dois primeiros ex-alunos de Portinari, em 1936-37), que pouco pude-
História Geral da Arte no Brasil, São Pau- ram fazer por nós, pois quem iria na verdade fazer nossas cabeças seria quase
lo, Fundação Walther Moreira Salles e Fun- que exclusivamente o nosso professor de desenho Quirino Campofiorito",
dação Djalma Guimarães, v. 2, p. 604. MO- testemunha José Moraes,1Oque acrescenta: "Em 1939, a grande exposição
RAES,José, Algumas Histórias de um So- Portinari no Museu de Belas-Artes,. patrocinada pelo MEC, foi a máxima
brevivente Carioca da Classe 1940 (texto
datilografado), São Paulo, p. 1, set. 1984.
revelação." Ele enfatiza também "a grande Exposição Francesa" (1940) e
9 Ubi Bava (1915-88). a "finalização, na época, do edifício do MEC".l1 Entre outros, pertenciam
10MORAES, José, op. cit., p. 1. ao grupo, liderado por Maurício Roberto (1921), então estudante de arqui-
1\ Idem, pp. 1-2. tetura, Flávio de Aquino (1919-87) e Francisco Bologna (1923), da mesma

33
área (Aquino voltar-se-ia depois para a crítica de arte); os pintores José Mo-
raes, Sansão Castello Branco (1920-56), percy Deane (1921) e Maria Cam-
pello (1923); e os escultores José Pedrosa (1915) e Alfredo Ceschiatti (1918).
No término de 1942, José Moraes e Percy Deane, dois desses artistas mais
afirmados posteriormente, organizaram no recinto da Escola uma exposi-
ção que foi depredada por alunos fiéis ao Academismo, obrigando seu fe-
chamento. As obras foram então transportadas pelos expositores para o
espaço livre de uma loja no prédio da Associação Brasileira de Imprensa.
Reaberta, mereceu o desagravo de escritores e artistas favoráveis às novas
correntes.12 No ano seguinte (1943), a facção estudantil dissidente da EN-
BA, que tinha ponto de reunião no Café Porto Alegre - o Vermelhinho
-, voltou uma vez mais a expor na ABI, contando com a participação, en-
tre outros, de Athos Bulcão (1918) e poty Lazzarotto (1924); depois se dis-
persou.13 O mesmo grupo se havia destacado em 1941, no arranjo de cer-
tames inusitados para o ambiente lerdo da Escola. Expuseram reproduções
de Vincent van Gogh (1853-90) e desenhos infantis e fizeram ambiciosa
mostra intitulada "25 Séculos de Arte", com obras originais cedidas pelo
MNBAe colecionadores, ao lado de reproduções de telas de Henri Matisse
(1859-1954), Picasso e outros artistas.14 Ainda a seu crédito vai o lança-
mento da revista do Diretório Acadêmico, em agosto-setembro de 1942,
dirigi da por Délio Ribeiro Sá e Eduardo Corona (1921).
Cumpre mencionar dois atelieres de curta duração. Em 1943, Alberto da
Veiga Guignard, que ensinava para alguns jovens artistas no terraço do pré-
dio da União Nacional dos Estudantes, passou a dispor de sala alugada na
rua Marquês de Abrantes, 4, onde atendia número maior de alunos, entre
eles Geza Heller (1902), Alcides da Rocha Miranda e Iberê Camargo (1914).
Em outubro daquele ano, o grupo expôs 153 desenhos na ENBA, compro-
vando o resultado de estudos feitos junto ao mestre, que respeitava a li- 12 Entre os escritores e artistas que defen-
deram os jovens da ENBA achavam-se Ma-
berdade de criação dos discípulos. A exemplo da mostra de 1942 no mes- nuel Bandeira, Anibal M. Machado, Afonso
mo local, também esta foi depredada por alunos contrários à arte moder- Arinos, Marques Rebelo, Murilo Mendes, Al-
na. A exposição teve o patrocínio do Diretório Acadêmico, e o incidente cides da Rocha Miranda, Francisco Assis Bar-
levou Guignard a retirar as obras e a remontá-Ias na ABI. Além dos artistas bosa, Guignard, Santa Rosa e Oscar Nieme-
yer (ZANINI, W., História Geral da Arte, v.
citados, participaram Elisa Botelho ByingtOn (1910), Vera Bocaiúva Min- 2, p. 604, e MORAES,José, Algumas Histó-
dlin (1920-85), Milton Martins Ribeiro (1922), Maria Campello e Werner Ama- rias). Participaram da exposição 29 artistas.
cher, num total de sete. Os incidentes suscitaram protestos públicos do 13Cf. Rio Social, Rio de Janeiro, jan. 1941.
Grupo Guignard.' SEsses episódios selvagens, como o atentado ocorrido 14MORAES, José, op. cit., p. 2.
na grande exposição que Segall realizou no Rio no mesmo ano,16 IS "A Exposição do Grupo Guignard na
repetiram-se na Exposição de Arte Moderna de Belo Horizonte, em 1944, ENBA", A Manhã, Rio de Janeiro, out. 1943.
16Depoimento de Antonio Bento, in BEC-
quando se violentaram telas de Milton Dacosta eJosé Moraes, e na Exposi- CARI, Vera D'Horta, Lasar Segall e o Mo-
ção de Arte Degenerada Condenada pelo III Reich, organizada em 1945 dernismo Paulista, São Paulo, Brasiliense,
pela Galeria Askanazy, no Rio, ocasião em que foi atingida uma tela de Wi- p. 154, 1984.

34
L I.
S08 o PATROCINIO DA I lhelm WoelIer (1907-54). A proliferação desses atos comprova que, não obs-
tante a aceitação progressiva da arte moderna por um público elitista, per-
CASA DO ESTUDANTE durava a recusa de espectadores contrariados em seus interesses estéticos
DO BRASIL. e ideológicos e impulsionados pelo modelo repressivo recente (aliás pou-
co original) de Hitler. Registre-se que, em 1943, no ano seguinte à declara-
~ ção de guerra do Brasil ao Eixo, à qual Getúlio Vargas fora praticamente
~~ compelido, os meios artísticos do Rio e de São Paulo arregimentaram-se
na promoção de manifestações contra o fascismo. Com esse objetivo
realizou-se a Exposição Antieixista nas duas capitais (Palácio Itamarati e Ga-
leria Prestes Maia), com a participação de artistas que a seguir formariam
a delegação brasileira que rumou para a Inglaterra (ver adiante).
Data de 1944 a fundação da Associação Brasileira de Desenho (ABD), que
durante vários anos realizou cursos de Desenho Artístico, Dezenho Técni-
co e Pintura. Nos anos seguintes (1946-47), foi a vez do curso de Desenho o

e Artes Gráficas da Fundação Getúlio Vargas assumir um ensino livre de


arte. Coordenado por Tomás Santa Rosa, com a participação de Carlos Os-
wald, Axl Leskoschek (1889-1975), artista austríaco de figuração entre o
Realismo e o Expressionismo, e da professora de Teoria da Arte Hannah
...

GALERIA ASKANASY Levy, estudiosa da arte colonial brasileira, que também fizera palestras junto
Rua Sanador Dantaa N. e& o~ ,.~ Andar ao Grupo Guignard, formava alunos sem deixar de preservar a inclinação
APRESENTA A estética de cada um. Seguiram o curso, entre outros, Fayga Ostrower (1920),
Misabel Pedrosa (1927) e Teresa Nicolao (1928).
EXPOSiÇÃO
OE De especial significado para o desenvolvimento artístico do Rio de Janeiro
ARTE CONDENADA foi a vinda de refugiados no período da guerra. A questão mereceu levan-
PEL.O tamento recente, resultante na exposição em dois segmentos, realizada na
11I. REICH Galeria Banerj, em Copacabana, e a seguir na Fundação Bienal de São Pau-
lo (1986), sob a curadoria de Frederico Morais,17 Boa parte desses artistas
Capa do catálogo da mostra realizada pela habitou o bairro de Santa Teresa, instalada no antigo e decadente Hotel
Galeria Askanazy, no Rio, em 1945. Internacional e na Pensão Mauá. As principais figuras do ambiente que cria-
ram, mesclado de brasileiros, eram a portuguesa Maria Helena Vieira da Silva
(1908) e o húngaro Arpad Szenes (1897-1985). Além do casal parisiense (bem
conhecido e vinculado à melhor arte de inclinação abstrata), ligavam-se ao
movimento modernista, da então capital federal, o polonês August Zamoyski
(1893-1970), os alemães Henrique Boese (1897-1982) e Wilhelm Woeller,
o húngaro Laszlo Meitner (1900-68), o suíço Jean-Pierre Chabloz (1910-82),
os franceses France Dupaty (1913-87) e Jacques van de Beuque (1923), o
17Catálogo Ciclo de Exposições sobre Arte
no Rio de Janeiro, 6 Tempos de Guerra,
tcheco Jan Zach (1914), o belga Roger van Rogger (1914-83), o romeno
Hotel Internacional, Pensão Mauá, Rio de Emeric Marcier (1916), o espanhol José Boadela, a americana PolIy McDo-
Janeiro, Galeria de Arte Banerj, mar.labr. nell (1911) e o japonês Tadashi Kaminagai (1899-1985). Predominava nes-
1986.
se grupo a caracterização expressionista. Entre outros brasileiros achega-

35 .
dos aos exilados ou parte deles, achavam-se os poetas Murilo Mendes e Ce- 18Catálogo Ciclo de Exposições..., 1986.
19NAVARRA,Ruben,jornal de Arte. Org.
cília Meireles (1901-64), o crítico Ruben Navarra, Marc Berkowitz, os pin- Virgínius da Gama e Meio, Campina Gran-
tores Djanira (1914-79), Milton Dacosta, Frank Schaeffer (1917), Carlos Scliar, de, PB. Prefeitura Municipal, Comissão Cul-
Ivan Serpa (1923-73), Almir Mavignier (1925), Eros Martins Gonçalves tural do Município, p. 179, 1966. Em depoi-
(1919-73), Tikashi Fukushima (1920), Flávio-Shiró (Tanaka) (1928).18 mento para o autor (julho de 1985), Mário
Barata informa que o Clube Anibal Macha-
Naqueles anos, dois ambientes de encontro obrigatório para artistas e inte- do era algo semelhante ao que se entende
lectuais do Rio, além da casa de Portinari, eram o Clube Anibal Machado por salão literário. Diz Ohistoriador: "A ca-
e o Casal Szenes. No dizer de Navarra, "o atelier deles [de Vieira da Silva sa era em Ipanema, na rua Visconde de Pi-
e Szenes] acabou se tornando um dos mais sérios concorrentes do chama- rajá, 476 (...) Quando passei a freqüentá-Ia
do Clube Anibal Machado. Praticamente, ninguém hoje que se preze de (cerca de 1943, esporadicamente, e após
1949, mais amiúde) já estava construído o
ter alguma ligação com as letras e as artes pode evitar a lei de atração des- pavilhão-biblioteca no fim do terreno, no
ses dois 'Salões' ".19 qual habitualmente ficavam os 'intelectuais'.
Antes de 45 vi bastante ali Carlos Lacerda,
Essas poucas associações, salões e atelieres trouxeram constribuição váli-
Moacyr Werneck de Castro, Murilo Mendes
da para o amadurecimento de numerosos artistas cariocas.2o e Yeda Miranda, Rubem Braga, Carlos Scliar.
Mais que no Rio, manifestou-se, desde o começo dos anos de 1930, o espí- A partir de 1949, artistas plásticos e críticos
ritO comunitário dos artistas modernos de São Paulo. Já na década anterior de arte apareciam mais do que na fase ante-
havia o hábito dos encontros, promovidos regularmente na casa dos escri- rior e também gente de teatro, ligada a Ma-
ria Clara. Lembro-me de Mário Pedrosa, Dja-
tores Mário de Andrade e Paulo Prado, da incentivadora cultural Olívia Gue- nira, Sílvia Chalreo, Frank Schaeffer, poty
des Penteado e da pintora Tarsila do Amaral, todos das classes altas. Nas e Célia Neves..."
décadas de 1930 e 1940, os contatos entre artistas e intelectuais tinham 20Pintores jovens como Inimá de Paula, Ti-
endereços geralmente não menos refinados, como o de Lasar Segall,21do kashi Fukushima, Ivan Serpa, Mavignier,
Flávio-Shiró (Tanaka), entre outros, freqüen-
casal Mina (1896-1969) e GregoriWarchavchik, de Rino Levi,22do intelec- taram a oficina de molduras e o atelier de
tual Paulo Ribeiro de Magalhães e da escultOra Elisabeth Nobiling Tadashi Kaminagai, em Santa Teresa, sem
(1902-75).23 O pintor Paulo Rossi Osir igualmente tOrnou-se anfitrião co- que isto caracterizasse um relacionamento
nhecido: relacionava-se aos artistas da alta-roda e do círculo proletário.24 a nível de mestre com alunos, ao contrário
Já o médico Adolpho Jagle e o médico, escritOr e crítico Osório César reu- do que já se supôs (o autor aqui se baseia
niam em suas casas os artistas dessa última condição social. 25O atelier de em depoimento prestado por Flávio-Shiró
em 7 de agosto de 1985). O fauve Kamina-
Bruno Giorgi era também local de encontros. gai, experiente de mais de uma década de
No início do decênio de 1930 formaram-se as primeiras agremiações. A So- vivência em Paris (de 1927 ao fim dos anos
de 1930), fixara-se no Brasil entre 1941 e
ciedade Pró-Arte Moderna (SPAM)e o Clube dos Artistas Modernos (CAM) 1955. Vários dados sobre este artista
nasceram quase simultaneamente, em novembro de 1932, para uma exis- encontram-se no Catálogo de Exposição de
tência profícua, embora tumultuada e de curta duração (o CAM desapare- Kaminagai, realizada pelos MNBA e MASP
ceu em fins de 1933 e a SPAM no começo de 1934).26 em junho-j~lho de 1985 (com introduções
de Antonio Bento, Quirino Campo fiorito e
Anos depois, o Salão de Maio, com três edições, entre 1937 e 1939, tornou-se Manabu Mabe) e no Catálogo da ExposiçãO
outro fator de aproximação, assim como a Família Artística Paulista, que da Galeria Banerj (1986).
organizou três mostras, duas em São Paulo (1937 e 1938) e uma no Rio 21Sobre encontros promovidos por Segall
(1940). O posteriormente denominado Grupo Santa Helena, núcleo da FAP, ver diversos depoimentos prestados a Vera
por sua vez, foi fruto da convivência de vários pintores em atelieres do D'Horta Beccari, constantes de sua disser-
tação de mestrado, apresentada à FFLCH-
edifício do mesmo nome, na praça da.Sé. Em 1936-37, a SPBA, existente USP, Lasar SeRall, Esboço de um Retrato,
desde 1921, transformou-se, por força de lei, no Sindicato dos Artistas Plás- São Paulo, V.2. 1979 . Ver dã'mesma autora

36

L
~
.-
Ao altO, em pé, Maria Helena Viejra da Sil-
va e Arpad Szenes. Sentado à esquerda, Car-

tt
los Scliar (fotO tirada na Pensão Internacio-
nal em 1946, reproduzi da no catálogo
"TempoS de Guerra", Galeria de Arte BA-
NERJ, Rio, 1986).
~

....

Lasar Segall e o Modernismo, 1984, pp.


149-227.
22 Rino Levi e Yvonne T. Arié Levi foram
anfitrióes de artistas e intelectuais em sua ca-
sa da rua Bélgica, 116. Além dos componen-
tes do Grupo Sete, visitavam o arquiteto, en-
tre outros, Ernesto de Fiori, Paulo Rossi
Osir, SegaIl, Bonadei, Rebolo, Bernard Ru-
dofsky, o bibliófilo José Mindlin, o profes-
sor Eduardo D'Oliveira França, o bibliote-
cário Rubens Borba de Morais e Burle Marx.
Em época posterior àquela de que trata es-
te livro, o casal Levi receberia arquitetos co-
mo Alvar Aalto, Walter Gropius e o escri-
tor Siegfried Gieclion (depoimento do arqui-

r teto Roberto Cerqueira Cesar ao autor em


13 de junho de 1985). Também o freqüen-
tavam muitos músicos, entre eles Yara Ber-
nette e Antonieta Rudge (correspondência
de Yvonne T. Arié Levi para o autor datada
de Roma, 6 de agosto de 1985). ticos, que, a partir de 1938, manteria salão anual até 1949. Essa vontade
23 Em sua casa da avenida Dr. Arnaldo,
2313, no Sumaré. coesiva comprovar-se-ia novamente em 1945 com a criação do Clube dos
24Artistas do Grupo Santa Helena, Gobbis, Artistas e Amigos da Arte (o Clubinho). Empresa sem continuidade foi o
Gerda Brentani, Goeldi, o crítico Paulo Men- I Salão de Arte, instalado na Feira Nacional de Indústrias do Estado de São
des de Almeida, entre outros, participavam Paulo. Tratava-se de uma tentativa de relacionamento entre os artistas plás-
dos encontros que, com sua mulher, a can- ticos modernos e o mundo empresarial da produção fabril. Os agrupamentos
tora Alice Rossi, promovia em suas casas da
avenida Ipiranga e da alameda Barão de
mais importantes trouxeram contribuição cultural bem caracterizada ao am-
Limeira. biente. Alguns deles preencheram funções que, no futuro ainda distante,
25 Catálogo da Exposição Mário Zanini caberia aos museus desempenhar.
(~907-71), São Paulo, MAC-USP,p. 28,1976. Os programas da SPAM e do CAM dão a conhecer a extensão de seus obje-
2 Sobre o CAM e a SPAM ver ALMEIDA
Paulo Mendes de, De Anita ao Museu, Sã~ tivos artísticos, intelectuais e, por que não dizer, educacionais. Essas enti-
Paulo, Perspectiva, pp. 41-81, 1976. dades procuraram estabelecer correspondência entre as formas poéticas.

37
Criaram ambientes de trabalho para os artistas e preocuparam-se com sua
remuneração. Propiciaram a discussão de temas atuais, tendo em vista a
formação do público, sempre carente de maior informação sobre a arte e
sua modernidade. Iam às questões de base, como a formação de bibliote-
cas especializadas. As artes, que em São Paulo ficariam fora do ensino da
USP, usufruíram, assim, do estímulo de duas agremiações, sem dúvida à
frente de seu tempo, para que pudessem vingar plenamente. Dentro da ge-
neralidade de propósitos comuns, cada uma delas escolheu sua via de rea-
lização. O CAM, que resultou da união de quatro artistas - Di Cavalcanti,
Antônio Gomide, Carlos Prado (1908) e Flávio de Carvalho, este último
como líder -, assumiu com garra uma posição mais de acordo com os pro-
blemas culturais e sociais da época. Organizou comissões especiais para
as artes visuais, o teatro, a música, a literatura, assim como para os "estu-
dos gerais", confiando a direção a personalidades como Procópio Ferrei-
ra, Paulo Torres, Afonso Schmidt, Sérgio Milliet, André Dreyfus, Caio Pra-
do Júnior, Paulo Ribeiro de Magalhães etc.27 Promoveu exposições, como
a da artista gráfica alemã Kaethe Kollwitz (1867-1945), de cartazes russos,
além do insólito Mês da Criança e dos Loucos, mais tarde considerado por
Flávio de Carvalho como "verdadeiro grito de revolta contra as paredes
opressoras e asfixiantes das escolas de Belas-Artes" .28Em sua sede, na rua
Pedro Lessa, 2, o CAM tornara-se verdadeiro foro de assuntos artísticos e
sociais. Atraiu cientistas, intelectuais e artistas que abordaram temas novos
para o meio, como arte proletária (Tarsila do Amaral), marxismo e arte (Mário
Pedrosa), o desenho infantil e seu valor pedagógico (Pedro de Alcântara),
a arte dos loucos e as vanguardas (Osório César). Caio Prado Júnior fez ali
relato de sua viagem à União Soviética. Entre outros conferencistas do CAM
estavam o anarquista italiano Oreste Ristori, ativo em São Paulo, depois
expulso do País, que defendeu idéias contra Deus e a Igreja Católica; o es-
critor Oswald de Andrade, que leu trechos da peça O Homem e o Cava-
10,.29e o pintor Siqueiros, que trouxe do México sua mensagem de arte so-
cial. Das mais relevantes foi ainda a criação do Teatro da Experiência por
Flávio de Carvalho, personagem central do meio cultural paulista, autor
de performances (como o irreverente desafio à procissão de Corpus Chris-
ti de 1931, narrada e analisada em seu livro Experiência n.o 2), engenhei-
27 "Clube dos Artistas Modernos", Diário
ro, arquiteto, desenhista, pintor, escultor, escritor. No palco do CAM en- de S. Paulo, São Paulo, 10 jan. 1933 (recor-
cenou sua peça O Bailado do Deus Morto, logo retirada de cartaz pela po- te cedido ao autor pelo pesquisador Rui Mo-
lícia. A medida repressiva não impediu a ressonância da obra, renovadora reira Leite).
da arte dramática no País. 28CARVALHO, Flávio de, "Recordação do
Clube dos Artistas Modernos", Revista
A SPAM, integrada por artistas do primeiro Modernismo, do qual repre- Anual do Salão de Maio, 1939.
sentava a continuidade, desenvolveu atividades que não causaram impac- 29Flávio de Carvalho tinha em mente ence-
to sobre o público, como era comum nos eventos provocadores do CAM. nar a peça no Teatro da Experiência.

38

I........-
Entre elas acham-se o.Sdo.is famo.so.Sbailes de carnaval animado.s de verve
I.~ EXPOSiÇÃO crítica: Carnaval na Cidade de SPAM e Expedição. às Matas Virgens da Spa-
DE ARTE MODERNA mo.lândia, realizado.s respectivamente em 1933 e 1934 po.rum mutirão. de
DA artistas so.b a direção. de Lasar Segall. Do.último. deles participo.u a dançari-
SPAM na expressio.nista Chinita Ulmann, de formação. alemã e muita experiência
internacio.nal. A sede da entidade, na praça da República, 44, co.ntava co.m
atelier de pintura, biblio.teca e salão. para música, dança e teatro..
Organizo.u a SPAM duas expo.sições: a primeira em abril-maio. de 1933, na
rua Barao. de Itapetininga, 18, co.m o.bras estrangeiras pertencentes a co.le-
cio.nado.reslo.cais(ver adiante) e do.s "spamistas" Segall, Anita Malfatti, Victo.r
Brecheret, Jo.hn Graz, Tarsila, Antônio. Go.mide, Vitto.rio.Go.bbis, Hugo. Ada-
mi, Regina Go.mide Graz, Wasth Ro.drigues (1891-1975), Paulo. Ro.ssi Osir,
Arnaldo. Barbo.sa, Jenny K. Segall (1900-67), Mo.ussia Pinto. Alves, Esther
Bessel (ao. lado. de peças de deco.ração. interio.r, mo.biliário., tapeçaria etc.
de Grego.ri Warchavchik, Jo.hn e Regina Graz). A segunda mo.stra, em no.-
vembro do. mesmo. ano., realizo.u-se na sede so.cial da entidade, sendo. ex-
PINTURA clusivamente dedicada a artistas do. Rio.;co.ntinha o.bras expo.stas no. III Sa-
ESCULTURA lão. da So.ciedade Pró-Arte do. Rio.30e fo.i co.nsiderada co.mo. "o. primeiro
ARQUITETURA passo. para o. desenvo.lvimento do. intercâmbio. entre artistas do. país" .31
Dela participaram Di Cavalcanti, Guignard, Ismael Nery, Po.rtinari, Orlan-
1933
do. Teruz, Bruno. Lecho.wski, Cecília Meireles, Sylvia Meyer, Jo.sé Bernardo.
Capa do catálogo da P Exposição de Arte Cardo.so.Júniar (1861-1947), Erwin Busse Grauand, Octávio Pinto., Oscar
Moderna da SPAM, São Paulo, 1933. Rathkirch e Zangerl.
O maralismo. provinciano. do. ambiente,32 as desavenças entre as asso.cia-
do.s, a presença de adepto.s da ideo.lo.giaintegralista e alimentado.res de ódio.s
30Catálogo da Segunda Exposição de Arte raciais co.ntra o.Smembros judeus (ódio.s generalizado.s naquela épo.ca) e,
Moderna da SPAM, São Paulo, novo 1933.
31 Relatório das Atividades da SPAM, de ainda, as dificuldades financeiras arruinaram a SPAM. Acrescente-se que,
dez. 1932 até mar. 1934, São Paulo, 1934. integrada po.r membros da alta classe paulistana, não. faltava à SPAM o.go.s-
32A exemplo do que se lê na carta publica- tO das práticas mundanas. O mundanisma, aliás, afeto.u também a CAM.
da na "Seção Livre" do Diário Popular, São Se a mais amparada SPAM enfrento.u pro.blemas para pagar suas co.ntas, o.
Paulo, em 1934, citada por ALMEIDA, Pau- CAM, que se jactava de não. po.ssuir "sócio.s patro.cinado.res", deles tam-
lo Mendes de, De AnUa ao Museu, pp. 58-9.
° missivista pede o fechamento da SPAM bém não. escapo.u. Determinada po.r o.bjetivo.s de vanguarda e instigando.
pela polícia e refere-se com zelo nacionalis- a discussão. aberta de problemas culturais e so.ciais, a agremiação. preo.cu-
ta a seus associados como "estrangeiros de pava a mentalidade co.nservado.ra predo.minante. O espírito. liberal e.críti-
nacionalidade um pouco incerta, outros ca de Flávia de Carvalho. deixo.u testemunho.s das refregas po.líticas trava-
neobrasileiros desafetos de nossas tradições, das entre o.rto.do.xo.spartidárias da direita e da esquerda no. "ambiente aco.-
e outros, ainda, embora pertencentes ao
tronco racial mais antigo". lhedo.r e irrespo.nsável" do. Clube.33 O Teatro da Experiência, ainda em
1.1 CARVALHO, Flávio de, "Recordação do seus primeiros passo.s, não. fo.i a causa única que provo.co.u o. prematuro
Clube dos Artistas Modernos", Revista encerramento. das atividades do. CAM, mas deve ser co.nsiderada co.mo. a
Anual do Salão de Maio, 1939. mais impo.rtante e uma prova da into.lerância do. meio. às idéias progressistas.

39
Acentuadas oposições ideológicas separavam a elitista SPAM e o CAM, eli-
tista também, porém de mentalidade mais intelectual e contestatária. Isso
não impedia o trânsito de indivíduos entre as agremiações. Mais tarde, em
1937, repetia-se o fenômeno da instituição, num só ano, de duas associa-
ções, de início algo estranhas uma à outra: a dos realizadores do Salão de
Maio e a Família Artística Paulista, sendo que esta, à diferença dos demais
agrupamentos, compunha-se de numerosos artistas de origem proletária. I.
As duas primeiras versões do Salão de Maio tiveram a direção do pintor I

Quirino da Silva, coadjuvado, entre outros, pelo crítico Geraldo Ferraz e


por Flávio de Carvalho, cabendo a este último organizar a terceira.34
O Salão de Maio foi certamente mostra exemplar daquele período. Rece-
beu as críticas então comuns que consideravam a arte moderna, entre ou-
tras coisas, como produto do comunismo. Por esse raciocínio, alimentado
em outros países também, os artistas modernos não seriam senão os des-
truidores da moral cristã. Convém citar a diatribe publicada no jornal ca-
tólico Legionário, dirigido por Plínio Corrêa de Oliveira. Afirmava o ór-
gão direitista "existir, em São Paulo, um grupo de 'artistas' comunistas
e judaizantes [que] já tem causado devastações tremendas nos domínios do
bom gosto e da decência. Filiam-se alguns àquele célebre movimento 'an-
tropofagista' que, antes da Revolução de 30, perpetrou uma série de aten-
tados contra a arte e a moralidade (...). E agora, depois do levante comu-
nista de novembro de 35, em pleno estado de guerra, apareceram esses
fervorosos prosélitos da Revolução, confraternizados com elementos de
grande destaque de nosso meio social e político, encontrando os mais en-
tusiastas mecenas de arte na burguesia que ela visa destruir! Entre todos
destacam-se os indefectíveis Lasar Segall e Flávio de Carvalho, este último
autor da famosa 'experiência n? 2' , em que desrespeitou um dos mais so-
lenes atos do culto católico, dando assim provas da virulência de seu anti-
clericalismo" .
Seguem-se os nomes de pessoas "da sociedade paulistana, entre as quais
alguns vereadores municipais", que apoiavam o Salão.35
A primeira versão do Salão de Maio contou com a presença de Victor Bre-
:\4 o Salãode Maio,em suasprimeirae se-
cheret, Lasar Segall, Tarsila do Amaral, Hugo Adami, Antônio Gomide, Qui- gunda versões, foi apresentado no Grill-
rino da Silva (modernistas da década de 1920) e dos que surgiram ou to- room do então mais luxuoso hotel de São
maram pé a seguir, como Cícero Dias, Guignard, Flávio de Carvalho, Vit- Paulo, o Esplanada, enquanto o último te-
torio Gobbis, Waldemar da Costa, Portinari, Santa Rosa, Nélson Nóbrega, ve lugar na Galeria Itá, à rua Barão de Itape-
Tomoo Handa (1906), Odette de Freitas (1897-1984), Moussia Pinto Alves, tininga, 70.
Elisabeth Nobiling, Yolanda Mohalyi, Lucy Citti Ferreira (1914), Carlos Pra- 35 "A Burguesia Paulistana Patrocina uma
Exposição de Arte Revolucionária e Comu-
do, Oswald de Andrade Filho (1914-72), Esther Bessel, Gervasio Furest Mu- nista", Legionário, São Paulo, 13 jun. 1937
nõz (1893) e Ernesto de Fiori (1884-1945). Entre as atividades complemen- (recorte cedido ao autor pelo pesquisador
tares do Salão, registram-se conferências como "O Aspecto Mórbido e Psi- Rui Moreira Leite).

40
-------
cológico da Arte Moderna" (Flávio de Carvalho) e "Interpretação da Arte
pela Psicologia Moderna" (Vera Vicente de Azevedo), ambos assuntos iné-

IAI.AD
ditos no ambiente. O visitante Anton Giulio Bragaglia discorreu sobre "As
Tendências Modernas na Cenografia" .36
As edições de 1938 e 1939 reuniram artistas locais e do Exterior (a estes
se fará alusão adiante). Aos que haviam figurado na primeira mostra juntaram-
.MAI se Di Cavakanti, Osvaldo Goeldi, Paulo Rossi Osir, Lisa Ficker Hofmann
(1879-1964), Renée Lefevre (1910), Joaquim Lopes Figueira, Duja Gro~,
Akides da Rocha Miranda, Luís Soares (1876-1948), Paulo Werneck, Sylvia
Meyer, Orlando Teruz, Rino Levi, Bernard RudofskY,Jacob Ruchti (1917-74),
entre outros. Acrescente-se a presença, no 11Salão, de Rebolo Gonsales,
Alfredo Volpi e Manoel Martins (1911-79) e, no seguinte, de Clóvis Gracia-
no (1907-88) e Fulvio Pennacchi (1905) e, novamente, Rebolo e Manoel
Martins. A exemplo da m~nifestação inicial, também quando dessas duas

.1138 últimas deu-se ênfase ao programa de conferências, a cargo de escritores


progressistas como Jorge Amado, Graciliano Ramos, SangirardiJúnior, Anibal
Machado e críticos como Quirino Campofiorito e Geraldo Ferraz. A Revis-
ta Anual do Salão de Maio (RASM),contendo o catálogo do III Salão e in-
cluindo textos de Flávio de Carvalho, Anita Malfatti, Lasar Segall, Alberto
Capa do catálogo do 2? Salão de Maio, São Cavakanti, Guilherme de Almeida, Oswald de Andrade, Cassiano Ricardo,
Paulo, 1938. Tarsila do Amaral, Luís Martins, Rino Levi, SangirardiJúnior, Ciro Montei-
ro Brisolla, Paulo Mendes de Almeida, entre outros, resultou em documento
significativo para a história do Modernismo brasileiro.
O Salão de Maio estava interessado em manter características próprias, e
o episódio de Flávio de Carvalho, registrando a exposição em seu nome,
receoso de que passasse a mãos de terceiros, é outro atestado das incom-
patibilidades mencionadas.37
36Ver ALMEIDA,Paulo Mendes de, De Ani-
ta ao Museu, pp. 89-90.
Reorganizando o Salão e com um projeto de seis anos (não cumprido), Flá-
37Ver ALMEIDA,Paulo Mendes de, De Ani- vio de Carvalho redigiu o Manifesto do 1I/ Salão de Maio, onde é clara
ta ao Museu, pp. 105-7, e FERRAZ, Geral- a intenção de manter a exposição aberta às correntes modernas e assegurar-
do, Depois de Tudo, Rio de Janeiro, Paz e lhe o "caráter internacional". Aspecto importante do Manifesto é a insis-
Terra, pp. 113-6, 1983. tência no valor primacial da idéia na obra de arte, razão pela qual faz obje-
38Uma primeira versão do Manifesto, exis-
tente em forma datilografada, de posse do
ções à "desteridade técnica que, pelo malabarismo e pelo truque, se so-
autor, contém, além do nome de Flávio de brepõe à emoção profunda ou à pureza mentalista da arte" .38
Carvalho, o primeiro da lista, os de Jacob A FAP guiava-se por objetivos mais modestos, porém da maior seriedade.
Ruchti, Guignard, J. L. Figueira, Martins (Ma- Além de Paulo Rossi Osir, o fundador, coadjuvado por Waldemar da Cos-
noel Martins), Rebolo Gonsales, Oswaldo
Sampaio, Furest Mufioz, Sangirardi Júnior, ta, participaram de suas três exposições entre 1938 e 1940, uma ou mais
Paulo Rossi OSir, Nicanor Miranda e Antô- vezes, Anita Malfatti, Vittorio Gobbis, Armando Balloni (1901-69), Arnal-
nio Gomide. O nome de Geraldo Ferraz apa- do Barbosa, Arthur Krug (1896-1964), Joaquim Lopes Figueira, Ernesto de
rece riscado.
Fiori, Bernard Rudofsky, Hugo Adami, Domingos Viegas de Toledo Piza

41
(1887-1945), Nélson Nóbrega, Renée Lefevre, Franco Cenni (1909-73), Vicente
Mecozzi (1909-64), Paulo Sangiuliano (1907-84), Vilanova Artigas
(1915-85), Bruno Giorgi, Carlos Scliar.. Também compareceu todo o gru-
po mais tarde batizado de "Santa Helena", formado por Rebolo Gonsales,
Mário Zanini, Aldo Bonadei, Clóvis Graciano, Alfredo Volpi, Manoel Mar-
tins, Fulvio pennacchi, Humberto Rosa (1908-48) e Alfredo Rullo Rizzotti
(1909-72). Portinari foi convidado especial da segunda exposição.
Como se observa, não poucos membrQs da FAP participaram do Salão de
Maio. Mas em 1939 foram considerados nestes termos por Geraldo Ferraz:
"Até os que fundaram, contra o Salão de Maio, em fins de 1937, o movi-
mento fracassado da Família Artística Paulista, até esses surgiram. E eram
os tradicionalistas, os defensores do carcamanismo artístico da Paulicéia,
a morrer de amores pelos processos de Giotto e Cimabue" .39O crítieo vi-
sava mais diretamente a Paulo Rossi Osir. Não há dúvida de que outros ar-
tistas de São Paulo - e não somente os pertencentes à FAP - estavam en-
volvidíssimos com a pesquisa de inerente natureza plástica, mas a distân-
cia das soluções de redução formal. A tônica generalizada era a de um re-
Vo s
, -.,
11
a
11

batimento da liberalidade da arte moderna reconciliada com a observação


sensível do mundo exterior e atenta aos valores da tradição da arte ocidental.
Capa do catálogo do V Salão dos Artistas
Anos depois, desfeita a Família, em seguida à terceira exposição (1940), al- Plásticos de São Paulo, São Paulo, 1939.
guns de seus membros resolveram criar o Clube dos Artistas e Amigos da
Arte, de cujas origens informa Paulo Mendes de Almeida: "E assim, em 1945,
os pintores Paulo Rossi Osir, Alfredo Volpi, Mário Zanini, Rebolo Gonsa-
les, Quirino da Silva e Nélson Nóbrega congregaram-se para promover a ~
decoração de um baile carnavalesco, num local da avenida Ipiranga" .40
Com o lucro apurado fundou-se a nova associação no subsolo do Edifício
Esther (na praça da República). O "Clubinho", como era chamado, seria,
entre todas as sociedades artísticas de São Paulo, a de vida mais longa e
a menos polêmica. Promoveu exposições, conferências e outros eventos,
mas, pelos anos de 1950, suas funções culturais se reduziram, tornando-se
sobretudo lugar de convivência social.
Registre-se que em 1939 surgia outra sociedade de artistas e intelectuais,
o Círculo Artístico do Brasil, para promover exposições, concertos, a pu-
blicação de um órgão de imprensa, "tendo como objetivo principal a va- 39 ALMEIDA, Paulo Mendes de, De Anita
lorização das nossas forças artísticas criadoras em estreito contato com as qo Museu, p. 116. Cimabue (1240-1302),
características nacionais, propondo-se também desenvolver o intercâmbio Giotto di Bondone (1266-1337).
40 ALMEIDA, Paulo Mendes de, De Anita
cultural e artístico do Brasil com os demais países da América e da Euro- ao Museu, pp. 197-200.
pa" .41Aproveitava o projeto idéias e realizações dos anos recentes, como 41 Notícia publicada pelo SuplementO em
a do Salão de Maio. A associação, que não foi adiante, teve como dirigen- Rotogravura de O Estado de S. Pau/o, SãO
tes Antonieta Rudge (música), Odette de Freitas, Vittorio Gobbis, Quirino Paulo, 11 mar. 1939.

42
42Ver introdução ao Catálogo do VI Salão
da Silva (pintura), Elisabeth Nobiling (escultura), Lívio Abramo (desenho),
do Sindicato dos Artistas Plásticos (Socieda- entre outros.
de Paulista de Belas-Artes, 1940). Consultar
ALMEIDA, Paulo Mendes de, De Anita ao Enquanto tinham curso o Salão de Maio e os certames da FAP, surgia o Sin-
Museu, pp. 191-4. dicato dos Artistas Plásticos de São Paulo. Antes, no Rio, em 1931, arquite-
43 Em 1936 haviam sido realizadas assem- tos haviam criado o SindicatO de Trabalhadores de Arte. Como se obser-
bléias visando à criação.do Sindicato. Em 12
de agosto desse ano houve a "Assembléia vou, o sindicato paulista, que logo instituiu seu Salão, é herança da SPBA,
Geral extraordinária (00')' especi:tlmente con- reduto de artistas acadêmicos.42 O órgão foi oficialmente estabelecido em
vocada para a transformação da Sociedade 1937 por força do sindicalismo imposto de cima para baixo pelo Estado
Paulista de Belas-Artes em órgão sindical dos Novo.4:\ Precedendo a exposição do Sindicato, o Salão Paulista de Belas-
Artistas Plásticos de São Paulo", registrando-
se o comparecimento de Alexandre Albu- Artes, inaugurado em 1934, representara um outro momento para as mos-
querque, Ottone Zorlini, Roque de Mingo, tras coletivas de São Paulo. Ali os acadêmicos sentiram desde logo a con-
Mário Zanini,]osé Cucé, Alfredo Volpi, An- corrência dos modernos. Em 1936 consideraram-se prejudicados pelo júri
gelo Simeone, Francisco Rebolo Gonsales, e disp\l<;~ram-se à realização de um Salão dos Recusados.44 Os modernos
Fulvio Pennacchi e Adolpho Fonzari. Antes
dessa data, em 19 de março de 1936,
obtiveram, de fato, sucessivos reconhecimentos no Salão, até a fundação
instalara-se o Syndicato dos Artistas Pinto- do Sindicato, quando passaram à força dominante. A maior parte abando-
res de São Paulo, na Sociedade Paulista de nou o Salão Paulista de Belas-Artes a partir de 1938. Sediado no Edifício
Belas-Artes, dominado por artistas conser- Santa Helena, na praça da Sé, 43, a exemplo de sindicatos de diversas cate-
vadores e presidido por Paulo V. Lopes de gorias profissionais, e vizinho dos atelieres dos pintores que formariam o
Leão (Diário da Noite, São Paulo, 20 mar. grupo do mesmo nome - embrião da FAP -, o Sindicato dos Artistas Plás-
1936).
44Ver Correio de S. Pau/o, São Paulo, 18 ticos, presidido sucessivamente pelo engenheiro-arquiteto Alexandre AI-
dez. 1936. buquerque (1880-1940), fundador da SPBA, por Anita Malfatti e, a partir
45 Segundo o pintor e gravador Odetto de 1944, pelo escultor e pintor José Cucé (1900-61), tornar-se-ia, até o fim
Guersoni, o Sindicato constituía uma força da década de 1940, o promotOr da principal exposição coletiva da cidade.
no ambiente: "Para ser considerado artis-
Fazer o Salão foi sua atividade essencia1.45 Sucumbiu, porém, no alarga-
ta era preciso ser filiado". Outro exemplo
disto é que "não se podia abrir galerias de
mento do espaço cultural provocado pela aparição dos museus. Deve ser
arte sem a sua autorização". Realizou o Sin- lembrado que, em 1951, criava-se o I Salão Paulista de Arte Moderna, en-
dicato reuniões e bailes beneficentes. Levou quanto o Salão Paulista de Belas-Artes permaneceria feudo dos artistas
mostras ao interior do Estado. Uma delas, acadêmicos.
em ]undiaí, resultou na criação da pinaco-
teca local, com doação de obras dos asso- O Salão do Sindicato, já antes de 1940, vira crescer rapidamente o número
ciados do Sindicato. Guersoni supõe ter si- de modernistas em seu conselho diretor e na comissão organizadora. Ao
do o próprio presidente José Cucé o respon- salão inaugural da década foi admitida porcentagem muito maior de repre-
sável pela caducidade do Sindicato, debili- sentantes das novas tendências em relação aos artistas conservadores. Fi-
tado pela luta entre modernos e acadêmi-
cos. Afirma que Cucé - a quem fora con- guravam no certame os escultOres Bruno Giorgi e Figueira e os pintores
fiado o programa escultórico da catedral da Anita Malfatti, Antônio Gomide, Flávio de Carvalho, Paulo Rossi Osir, Gob-
Sé - "era contra a arte moderna" e que os bis, Waldemar da Costa, César Lacanna, Domingos Viegas de Toledo Piza,
que tinham essa opinião ganhavam sempre Odette de Freitas, Aldorigo Marchetti (1892-1955), Nélson Nóbrega, Fran-
maior prestígio no Sindicato, tornando o co Cenni, João Tonissi (1896), Oswald de Andrade Filho, Paulo Sangiulia-
presidente pouco empenhado em desenvol-
ver a entidade. Pondera, porém, que, para
no, Renée Lefêvre, Carlos Sc1iar e todos os santelenistas. Entre os artistas
os museus, criados em fins da década de mais caracterizados do outro lado achavam-se os escultores Eduardo O.
1940, não havia interesse na "existência do Pirajá, Roque de Mingo (1890-1972) e Ricardo Cipicchia (1885-1969) e os
Sindicato e toda a sua influência" (depoi- pintores Gino Bruno (1901-77) e Nicola Petti (1904-83).

43
Nos anos seguintes, o Salão do SindicatO registrou sempre esse duplo com-
parecimento. A ala modernista, porém, afirmava-se com a participação con-
tínua dos artistas citados e de múltiplos outros, tanto de antiga carreira co- DEAITE
r SALÁD
mo em fase de formação. Estavam entre os inscritos, incluindo muitos es-
trangeiros: John Graz, De Fiori, Takaoka, Quirino da Silva, João Goussef
(1897 -1953), Arthur Krug, Angelo Simeone (1899-1974), Mick Carnicelli
(1893-1967), Armando Balloni, Gastão Worms, Arnaldo Ferrari (1906-74),
Walter Lewy (1905), Pola Rezende (1905-78), Raphael Galvez (1907), Sam-
son Flexor (1907-71), Hajime Higaki (1908), Lisa Ficker Hofmann, Gerda
Brentani (1908), Vicente Mecozzi, Moussia Pinto Alves, Giuliana Segre Gior-
gi, Danilo di Prete (1911-84), Lothar Charoux (1912-87), Júlio Guerra (1912),
AnatOl Wladislaw (1913), Hilde Weber (1913), Mário Levi (1913), Lucy Cit-
ti Ferreira, Bella Karawaewa Prado (1915), Virgínia Artigas (1915), Maria
Leontina (1917-84), Alice Brill (1920), Bernardo Battioni, Athayde de Bar-
ros (1920), Jacques Douchez (1921), Berco Udler (1923-71), Geraldo de Bar-
ros (1923), Manabu Mabe (1924), Odetto Guersoni (1924), Giuliana Pedrazza
(1924), Eva Lieblich Fernandes (1925~, Antônio Carelli (1926), Darci Pen-
teado (1926-87), Mário Gruber (1927), Sophia Tassinari (1927), Flávio-Shiró
(Tanaka), Artur Luiz Piza (1928), Caciporé Torres (1932), Jorge Mori (1933).
Assinale-se que o Sindicato promoveu também "algumas exposições me-
nores em bairros da Capital".46 Em 1945 o Comitê Democrático Popular Capa do catálogo do I? Salão de Arte da Fei-
ra Nacional de Indústrias, São Paulo, 1941.
dos Artistas Plásticos teve iniciativa semelhante, organizando mostras de
que constavam, entre outros, Volpi, Graciano, Bonadei, Rebolo, Pancetti,
Berco Udler, Maria Leontina e Carlos Scliar.47 No interior do Estado, a ci- mento ao autor em 12 de novembro de
dade de Araraquara demonstrava pioneirismo ao inaugurar, em 1936, 01 1974). Por sua vez, LHaCamargo Cucé, viú-
Salão de Belas-Artes, sob a orientação de Quirino CampofioritO e Lafayette va de)osé Cucé, declara que foi graças a ele
que o Sindicato "abriu-se aos modernos",
Toledo, contando com a presença de artistas modernos de São Paulo e do fazendo frente "a muitas resistências" (de-
Rio de Janeiro. poimento ao autor em 13 de janeiro de
Observou-se anteriormente que em 1941 realizara-se o 1 Salão de Arte da 1976). Segundo Luís Saia, o Sindicato con-
tribuiu para "a consciência e encaminha-
Feira Nacional de Indústrias. Guilherme de Almeida, na introdução ao Ca- mento profissional dos artistas" (depoimen-
tálogo, fala "dessa indispensável união entre a indústria e a arte, do que to ao autor em 26 de dezembro de 1974).
realmente significa a palavra 'artefacto', da imperiosa e recíproca aplica- O Sindicato subsistia ainda nos primeiros
ção da arte à indústria, da urgente necessidade de dar-se às fábricas um sen- anos da década de 1950. Entrevistado pelo
tido de escolas de artes aplicadas, de formar-se o artífjr~, enfim, de ao nos- autor, Cucé fez crítica velada aos novos mu-
seus e seus dirigentes, afirmando que "os
so progresso acrescentarmos, assim, cultura e civilização". Estava-se lon-
movimentos artísticos deviam ser entre.$ues
ge, entretanto, de tornar efetiva a aproximação referida pelo poeta moder- aos próprios artistas e não a intrusos. E um
nista em termos de arte e mundo industrializado. direito profissional de que não desejamoS
O Salão da FNI, sem continuidade., serviu para novamente reunir numero- abrir mão" (Suplemento Dominical de O
Tempo, São Paulo, 9 novo 1952)
so grupo de artistas: os pintores Bonadei, Aldorigo Marchetti, Volpi, Anita 46 ALMEIDA, Paulo Mendes de, De Anita
Malfatti, Antônio Gomide, Antonio Pedro (1909-66), Cícero Dias, César La- ao Museu, p. 194.
canna, Clóvis Graciano, Di Cavalcanti, Emídio Souza (1868-1949), Ernesto 47 Hoje, São Paulo, 14 dez. 1945.

44
48 O Catáiogo do I Salão de Arte da Feira de Fiori, Flávio de Carvalho, Franco Cenni, Fulvio Pennacchi, Gastão
Nacional de Indústrias foi publicado sob os
auspícios da Federação das Indústrias do Es- Worms, Humberto Rosa, Joaquim Figueira, Lívio Abramo, Manoel Martins;
tado de São Paulo (1941). Formaram a co- Mário Zanini, Moussia Pinto Alves, Nélson Nóbrega, Noêmia Mourão (1912),
missão organizadora do Salão o jornalista Odette de Freitas, Oswald de Andrade Filho, Paulo Rossi OSir, Paulo San-
Elias Chaves Neto e os artistas Vittorio Gob- giuliano, Quirino da Silva, Rebolo Gonsales, Tarsila, Gobbis, Waldemar da
bis e Quirino da Silva. Vários intelectuais fo-
ram convidados a realizar conferências du- Costa, Walter Lewy, os escultores Victor Brecheret, Bruno Giorgi, Elisa-
rante a exposição, como Tulio Ascarelli, o beth Nobiling e o arquiteto Gregori Warchavchik. 48
poeta e professor Giuseppe Ungaretti, en- Uma iniciativa oficial nova, na busca de maior audiência para os artistas,
tão residente em São Paulo, Guilherme de
Almeida, Cados Pinto Alves, Sérgio Milliet, foi a I Exposição Circulante de Arte, patrocinada em 1947 pelo Departa-
Menotti deI Picchia, OswaId de Andrade, o mento Estadual de Informações e pela Divisão de Turismo e Expansão Cul-
professor francês Jean Maugüé e Paulo Emí- tural. Coube a organização ao professor e pintor Guelfo Oscar Campiglia
lio Salles Gomes, seguindo hábitos adquiri- (1907-6~l Levada a algumas cidades do Interior, incluía 97 obras de pinto-
dos em São Paulo.
res e escultores modernos e acadêmicos.49 Figuravam na mostra exposi-
49Esta exposição itinerante visitou Tauba-
té, Araraquara, Ribeirão Preto, Franca e Ja- tores de gerações diversas, como Di Cavalcanti, Segall, Tarsila, Guignard,
buticabal, sendo acompanhada de conferen- Bruno Giorgi, Volpi, Zanini, Bonadei, Rebolo, Pennacchi, Manoel Martins,
cistas e monitores. Foi fermento para a fun- Humberto Rosa, Arnaldo Barbosa, César Lacanna, Raphael Galvez, Oswald
dação de escolas de arte e de salões no in- de Andrade Filho, Arnaldo Ferrari, Angelo Simeone, Renée Lefevre, Vicente
terior do Estado e propiciou encontros de Mecozzi, Danilo di Prete, Yolanda Mohalyi, Pola Rezende, Caetano Fraca-
artistas da Capital com os dos meios locais.
Ensejou vários concursos de desenho infan- rolli (1911-87), Bassano Vaccarini (1913), Arcângelo Ianelli (1922), Alde-
til, sendo que uma seleção de trabalhos foi mir Martins (1922), Mário Gruber e Flávio-Shiró (Tanaka).
exibida na Capital e a seguir transportada pa- Além dos grupos de artistas precedentemente referidos, cabe lembrar o Sei-
ra vários países.
50 "Em 1941 o Japão entrou na guerra ao bikai, fundado em 1935 e desde 1938 organizador de exposições reserva-
lado da Alemanha e da Itália. Os japoneses das a membros da colônia japonesa. A seqüência de suas mostras foi inter-
eram considerados súditos do Eixo. Até pin- rompida no período de 1942 a 1947 em conseqüência da guerra. 50Entre
tar paisagens tornava-se algo suspeito. Ta- seus membros estavam o pintor decano da comunidade, Tomoo Handa;
kaoka foi detido no Rio por causa disso. O Takaoka, depois da passagem pelo Núcleo Bernardelli; Tamaki, outro ex-
Grupo Seibi cessou suas atividades durante
a guerra. A situação da colônia era confusa integrante da coterie carioca; e Walter Shigeto Tanaka (1910-70). Seus as-
ainda em 1945. Havia conflitos, pois a maio- sociados eram não raro de nível amador,51 Com a maioria de artistas des-
ria não acreditava na derrota do Japão. Em sa nacionalidade surgiu, em 1948, o Grupo 15.
1947 (a 30 de março), ressurgia o Grupo Sei-
bi. Os velhos se reuniram novamente e ha- Nesta resenha assinale-se também o Grupo dos Sete, criado em 1936. Reu-
via elementos novos" (depoimento do prof. nia Rino Levi, John Graz, Antônio Gomide, Brecheret, Flávio de Carvalho,
Teiti Susuki ao autor em 30 de março de Elisabeth Nobiling e Yolanda Mohalyi, mas não constam iniciativas maio-
1977).
51 Sobre o Grupo Seibi ver PECCININI, res a seu respeito. Naquele ano sugeriram ao Departamento de Cultura, di-
Daisy, Catálogo da Exposição Grupo Seibi rigido por Mário de Andrade, a construção de um Pavilhão de Exposições
- Grupo Santa Helena - Décadas 35-45, no centro da praça da República. Rino Levi preparou o projeto que, apro-
São Paulo; Fundação Armando Álvares Pen- vado pelo diretor, não seria realizado pelo prefeito Fábio Prado. 52
teado, mar.labr. 1977.
52 FERRAZ,Geraldo, "Individualidades na Iniciativa diversa, no período, foi a criação do Atelier Osirarte, em 1940,
História da Atual Arquitetura no Brasil III - destinado inicialmente à execução. dos azulejos de revestimentos das pare-
~quiteto Rino Levi". Separata de Habitat, des externas do edifício do MEC, no Rio, para os quais Portinari preparara
Sao Paulo, pp. 38-9, maio 1956. os cartões. Nas intenções do fundador, Paulo Rossi Osir, estava a recupe'-

45
ração da arte do azulejo do País, mas seu objetivo seria também o de abrir
campo de trabalho para artistas geralmente com poucas possibilidades de
aceitação no mercado incipiente. Iniciado na técnica do azulejo junto ao 53Instalado de início à rua Vitória, 433, o
pintor Wasth Rodrigues e quem sabe também orientado por César Lacan- Atelier Osirarte teria sucessivamente sede
na, além de estimulado pelo engenheiro-arquiteto Alexandre Albuquerque; nos seguintes endereços: rua Barão de li-
Osir reuniu a seu lado, em diferentes momentos, Volpi, Zanini, Virgínia meira, 117; rua Bento Freitas, 306 (edifício-
sede do Instituto dos Arquitetos); rua do
Artigas, Hilde Weber, Ettore Moretti, Gerda Brentani, Giuliana Segre Gior- Arouche, 144; e, finalmente, rua Tobias Bar-
gi, Maria W ochnick e outros, como o próprio Lacanna, de rápida passa- reto, 68. O Atelier Osirarte atravessou alguns
gem pelo atelier.53 Produziram eles peças com motivos nacionais, como anos difíceis antes de desaparecer em 1959,
cenas populares, folclóricas, religiosas e índias, temas de animais, peixes, quando da morte de seu fundador. Além dos
flores, mapas etc. Foi grande e contínua, pelos anos de 1940, a feitura des- artistas citados, também trabalharam no ate-
lier Frans Krajcberg, Waldemar Cordeiro e
sas faianças policrômicas, a que tanto Zanini - o artista mais longamente Paolo Maranca (1938).
ativo do Osirarte - como Volpi, com razão, não davam maior importân- 54 Além de atrair uma clientela local,
cia, pois era-lhes essencialmente uma maneira de sobrevivênciã. Mas há registre-se que os azulejos. despertaram o in-
exemplos de qualidade nesses azulejos, executados artesanalmente, esmal- teresse de colecionadores norte-americanos,
tados a temperaturas superiores a mil graus e hoje dispersos entre muitas entre eles Lincoln Edward Kristein, dirigente
do Museum of Modern Art, de Nova York.
mãos.54 Por vezes, as peças eram articuladas em amplos painéis.55 Os azu- 55 Exemplo disso é o revestimento de um
lejos do MEC, datados de 1941,56atingiram o total de 48 mil unidades (dis- pequeno pavilhão e chafariz na residência
tribuídos em mil metros quadrados da área). Também a igreja da Pampu- da família Sivers, em Tremembé (SP), com
lha, em Belo Horizonte, recebeu azulejos da Osirarte, com cartões igual- motivos indígenas e de natureza tropical,
mente desenhados por Portinari. Pelos anos de 1940, o Atelier organizou inspirados em ]ean-Baptiste Debret
(1768-1848), realizados por Paulo Rossi Osir,
várias exposições.57 Volpi, Zanini, Hilde Weber e Maria Woch-
Aproximações efêmeras de artistas mais jovens foram as que resultaram em nick, de um pitoresco geralmente inconvin-
cente. Em correspondência para o autor (da-
duas mostras pau listas no Rio, em 1946: a do Grupo dos Quatro Novíssi- tada de Roma, outubro 1974 / fevereiro
mos - com Luís Andreatini (1921), Luís Sacilotto (1924), Marcelo Grass- 1975), Alice Rossi, viúva de Paulo Rossi Osir,
mann (1925) e Octávio Araújo (1926) - e a dos Seis Novos de São Paulo informava que ele desejava realizar os azu-
- com Lothar Charoux, Virgínia Artigas, Maria Leontina, Huguette Israel lejos nas condições de um artesanato anô-
(1923), Enrico Camerini e Bernardo Battioni. Em 1947 surgiu uma coesão nimo. Entretanto os interessados, principal-
mente norte-americanos, indagavam sempre
maior, o Grupo dos 19, que se apresentou na exposição ideada pela crítica o nome dos autores e exigiam a assinatura
Maria Eugênia Franco, organizada por Rosa Rosenthal Zuccolotto e pro- ao adquirir obras. Ainda segundo Alice Ros-
movida pela União Cultural Brasil - Estados Unidos, na Galeria Prestes si, o Osirarte recorria a biscoitos já indus-
Maia. Entre seus nomes mais destacados encontravam-se Lothar Charoux, trializados pela Cerâmica Matarazzo. Somen-
te com a vinda da técnica Luciana Petruc-
Maria Leontina, Grassmann, Aldemir Martins, Odetto Guersoni, Sacilotto,
celli a São Paulo e a aquisição de fornos, o
Flávio-Shiró (Tanaka), Mário Gruber e Octávio Araújo. Ligavam-se eles quase atelier pôde produzir inteiramente seus
sempre à iconografia expressionista e suas carreiras sofreriam não raro pro- azulejos.
fundas mutações mais tarde. O Expressionismo caracterizou também o ci- 56Cf. inscrição no último carreau situadc
tado Grupo 15, criado pelo pintor e fotógrafo Athayde de Barros e integra- na parede externa do auditório.
do sobretudo por artistas japoneses. Formavam a associação, entre outros, 57Consultar Catálogo Osirarte, Pinacoteca
do Estado de São Paulo, 1985 (texto de Ma-
Takaoka, Handa, Hajime Higaki, Yuji Tamaki, Takashi Susuki (1908), Ge- ria Cecília França Loureiro e Ruth Sprung
raldo de Barros, Antônio Carelli e Athayde de Barros. Sua dissolução ocor- Tarasantchi e cronologia de Myrna de Ar-
reu depois de uma única exposição, na sede do Instituto dos Arquitetos. ruda Nascimento).

46
A criação do Museu de Arte de São Paulo, em 1947, e dos Museus de Arte
Moderna de São Paulo e do Rio, respectivamente em 1948 e 1949, frutos
de gestão particular - num momento cultural dos mais despertos, em que
apareciam também, com idêntica base, o Teatro Brasileiro de Comédia e
a Companhia Cinematográfica Vera Cruz -, marcaria nova fase institucio-
nal para as artes no País. Eles haviam sido antecedidos pelos primeiros mu-
seus do acervo brasileiro antigo, estabelecido pelo Serviço do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional a partir de 1943.
O MASP nasceu da vontade de Assis Chateaubriand. Fundador da cadeia
dos Diários Associados, o jornalista valeu-se de seu impéri<;>para obter ou
tomar somas vultosas das classes empresariais e construir a mais represen-
tativa coleção de arte européia do País, entre o Pré-Renascimento e o Pós-
Impressionismo. Este objetivo foi alcançado sob a orientação técnica de
Pietro Maria Bardi. Por sua vez, o MAMde São Paulo brotou de antigo de-
sejo de artistas e intelectuais, apoiados pelo empresário Francisco Mataraz-
zo Sobrinho. Pela década de 1950, através de doações e peças premiadas
na Bienal de São Paulo, a entidade agruparia o principal núcleo de arte mo-
derna existente no Brasil. Esse patrimônio e a importante coleção de Mata-
razzo, igualmente de arte contemporânea, em 1962 seriam transferidos para
a USP, onde se criou o MAC-USP, em 1963. No Rio de]aneiro, foi decisiva
a participação de Niomar Moniz Sodré para que vingasse a idéia do MAM.
Em São Paulo, Sérgio Milliet dera um conceito cultural avançado ao Setor
de Arte da Biblioteca Pública Municipal, reunindo, desde 1945, um núme-
ro expressivo de obras em técnicas diversas, várias expostas na sala de
leitura. 58

No campo da formação de artistas, ressalte-se a fundação, em 1949, da Es-


cola Livre de Artes Plásticas, por empenho de Flávio Motta (1923), Bona-
dei, Waldemar da Costa, Nélson Nóbrega e outros, com o apoio do MAM.
Embora já fora do período previsto para este livro, mencione-se que a mo-
tivação associativa prosseguiria no início da década de 1950. O Grupo Gua-
nabara, criado por Tikashi Fukushima, tomou a sucessão do Grupo 15. Em
58Hoje dali removida com a fragmentação 1950 abriam-se o Art Club do Rio e o Art Club de São Paulo, ligados à asso-
do setor, essa coleção contava com exem- ciação romana do mesmo nome. Originava-se, na capital paulista, a ODA
plares de Franz Post (1612-80), Flávio de (Oficina de Arte), equipe que organizaria duas exposições, uma dirigi da às
Carvalho, Volpi, Rebolo, Carlos Prado, Wal- artes aplicadas e outra à decoração arquitetônica, contando entre seus mem-
demar da Costa, Bonadei, De Fiori, Quiri-
no da Silva, José Pancetti, Graciano, Mick
bros Bonadei, Volpi, Manoel Martins, Graciano, Rebolo, Zanini, Carlos Pra-
Carnicelli, Gastão Worms, Emídio Souza, a do, Bassano Vaccarini, Bruno Giorgi, Lothar Charoux, Odetto Guersoni,
que se acrescentaram mais tarde, entre ou- Eva Lieblich Fernandes, Frans Krajcberg (1921) e Gastone Novelli (1925-68),
tras, obras de Aldemir Martins e Jorge Mori. vários demonstrando relacionamento mantido por três lustros ou mais.
......

47
m Proveitos de retornos e chegadas de artistas

No estudo das mudanças plásticas desses dois decênios devem ser levados
em alta conta os proveitos resultantes do retorno de mestres brasileiros
que se encontravam no Exterior e a fixação temporária ou definitiva de
artistas estrangeiros no País. Na época, em conseqüência da crise econô-
mica e da longa duração da guerra, diminuíram as partidas para os grandes
centros. Mesmo para aqueles de maiores posses que, no período precedente,
viajavam e se instalavam na Europa, não se ofereciam mais as mesmas faci-
lidades. Raros foram, por sua vez, os artistas das novas gerações que tive-
ram a oportunidade de uma estada no Exterior. A grande maioria só em
momentos ulteriores de sua produção, e já na fase pós-bélica, desfrutaria
desse contato, valendo-se sobretudo dos prêmios da Divisão Moderna e
do Salão Naciona1. Mas, então, já se declarava a relativa atração pelos Esta-
dos Unidos. Observou Mário Barata que, como uma espécie de compensa-
ção a essa irrealizada vivência fora do País, intensificava-se o interesse pela
descoberta do próprio meio, a nível tanto regional como naciona1.!
Os artistas mais velhos, que regressavam depois de, às vezes, demoradas
ausências, traziam renovadas forças para o ambiente. Guignard é disso exem-
plo significativo. Tendo absorvido principalmente o modernismo da Es-
cola de Paris - o de Henri Rousseau (1844-1910), Cézanne, Matisse e Raoul I Arte Modernanos Prêmios de Viagemdos
Dufy (1878-1953) - e o grafismo de Botticelli (1445-1510), a que conjuga- Salões Nacionais de 1940 a 1982, in Arte Mo-
va a experiência recente, desenvolviáa na terra de origem, para a qual vol- derna no Salão Nacional 1940 a 1982, Rio
tou em 1929, formou discípulos no Rio e principalmente em Minas Gerais. de Janeiro, FUNARTE, 1983-84.

48

L ~
,..

Outro reencontro com o meio, naquele mesmo ano, foi o de Antônio Go-
mide, amadurecido nos rigores do Cubismo - os quais todavia cederam
no Brasil a figurações conformes a realidades mais diretas, a exemplo da
obra de Rivera, no México. As cenas populares é que ganharam sua prefe-
rência. Reconhece-se nesse pintor e professor de sólidos e variados conhe-
cimentos técnicos a ampla influência que exerceu em São Paulo. Também
Waldemar da Costa viajava de volta, em 1931, após longa vivência no Ex-
terior, com estudos em Portugal e nas "academias livres" de Paris. Partici-
para de exposições da Societé des Artistes Indépendants e relacionara-se
com De Chirico, Foujita (1886-1968) e Pascin (1885-1930). Revelava aqui
um modernismo refreado, não submetido a correntes e apoiado em segu-
ras bases técnicas, aproveitadas por muitos discípulos, entre os quais Cló-
vis Graciano. Outros retornos para o meio foram os de Manuel Santiago
(em Paris de 1928 a 1932) e Quirino Campofiorito (em Paris e Roma de
1929 a 1934), ambos ligados ao Núcleo Bernardelli e o último também à
ENBA,onde introduziu inquietações. Enquanto Campofiorito trazia um "rea-
lismo imaginário", captado em De Chirico, Santiago dera curso a um im-
pressionismo subjetivo, de carregadas tonalidades. Em São Paulo, a gran-
de experiência de Paulo Rossi OSir, adquirida a partir da segunda década
na França, Inglaterra e, sobretudo, na Itália, reverteu, desde seu regresso
em 1927, em ganhos locais. Este pintor, fiel ao movimento europeu de re-
tomada de valores figurativos e essencialmente ao Novecentismo, trans-
mitiu lições de requinte artesanal. Ademais, Osir se transformaria num dos
promotores da segunda vaga modernista na capital paulista. Longe dessas
quase sempre prolongadas temporadas no Exterior, a curta estada de Por-
tinari na Europa, entre 1928-30, fora fundamental para a obra do artista,
que também desempenharia funções de ensino.
A vinda e a fixação de estrangeiros, intensa nos anos de 1930-40, como
fora nas décadas anteriores, constituem aspecto relevante da história artís-
tica do Brasil e de outros países do Novo Mundo. Trata-se de fenômeno
que recua ao passado colonial, recrudescido na época romântica e pelo fim
do século XIX, e que se estende sem quebra até os dias de hoje. São incon-
táveis os artistas europeus e de outras procedências, de qualidade e forma-
ção diversas, aqui itinerantes ou radicados, que não raro atuaram como
mestres.
O primeiro Modernismo registrara nomes com0 o dO escultor expressio-
nista alemão Wilhe1m Haarberg (1891-1986), do pintor suíço]ohn Graz (in-
fluenciado por Ferdinand Hodler (1853-1918) e Cézanne), ambos partici-
pantes da Semana de Arte Moderna, e, sobretudo, do pintor, gravador e
escultor expressionista Lasar Segall, nascido em Vilna. Em São Paulo radicara-
se, desde 1922, o impressionista alemão Georg Fischer Elpons (1865-1939),

49
professor de Di Cavalcanti, Tarsila, Mário Zanini e outros modernistas. Note- 2 Cf. pesquisa em andamento de Anna Car-
boncini e comunicação que apresentou ao
se, ainda, na década de 1"920,a vinda do polonês Bruno Lechowski, autor 11Congresso Brasileiro de História da Arte
de paisagens construtivas, e dos italianos Vittorio Gobbis e Guido Viaro do Comitê Brasileiro de História da Arte, in-
(1897-1971), pintOres de uma realidade afetiva. Os três foram influentes titulada Os Escultores Italianos no Brasil
no meio. O primeiro peregrinou por alguns Estados antes de se decidir pe- Rio de Janeiro, set. 1984. '
lo Rio; o segundo ligou-se definitivamente a São Paulo, enquanto o último 3 A maioria deles participou da Exposição
dos Artistas de Idioma Alemão, organizada
optou pelo Paraná. Numeros,os eram também os escultOres residentes ha- pela Pró-Arte na ENBA, em 1931, e que in-
via tempo em São Paulo, quase sempre italianos e de linha tradicional.2 cluiu Guignard e Rossi Osir. Faltam-nos da-
Na capital federal estabeleceram-se Leo Putz e outros pintores e esculto- dos biográficos de vários desses artistas.
res, no geral expressionistas de origem germânica, como Friedrich Maron 4 Antonio Pedro chegou ao Brasil em de-
(1887-1944), Erwin Ritter Busse Grauand, Hans Reyersbach, Otto Singer, zembro de 1940. No ano seguinte, expôs no
MNBA, no Rio, e na Galeria Itá, em São Pau-
Lothe Benter Bogdanoff, Hans Noebauer (1893-1971), Lucie Bromberg e lo, aqui sob o patrocínio da revista Clima,
Franz Heise.3 sendo introduzido no Catálogo por um en-
saio do poeta Giuseppe Ungaretti. Retomou
A deteriorada situação política européia e a perseguição racial na Alema- a Portugal em fins de 1941. Ver LUCAS,
nha, bem como a eclosão da guerra, foram as principais razões que condu- Constança M.L. de Almeida, "Não Há Plu-
ziram ao Brasil outros artistas, muitos dos quais fixados no Rio, quase sem- ral para a Arte (sobre o trabalho de Antonio
pre temporariamente, a exemplo de Maria Helena Vieira da Silva, Arpad Pedro, 1909-66)", in Arte em São Paulo, n?
30, São Paulo, maio 1985.
Szenes e outros, já citados. Com Szenes estudaram alguns jovens, entre eles 5 Ver WOLLNER, Alexandre, "Comunica-
Almir Mavignier e Ligia Clark (1920-88). Ali chegara nos anos de 1930 o ção Visual", in ZANINI, W., História Geral
pintor e gravador austríaco Axl Leskoschek, um artista de bons méritos, da Arte no Brasil. v. 2, p. 957.
ativo também como ilustrador e professor. Em São Paulo, destaque-se o 6 A história do primeiro Modernismo regis-
escultor de Berlim Ernesto de Fiori, de origem ítalo-germânica, que cum- tra a presença de Blaise Cendrars e F.T. Ma-
rinetti. Entre outros visitantes dos anos de
priu, entre 1936-45, a última etapa de uma obra conciliadora de grandes 1920 acha-se Le Corbusier. Benjamin Péret
tradições clássicas e o espíritO de modernidade e que, ao mesmo tempo, permaneceu aqui entre 1929 e 193 I, retor-
retomava com o maior empenho sua pintura expressionista de outrora. Ou- nando em 1955. Nos anos em retrospecto,
tra presença definitiva na capital paulista, desde antes da guerra (1937), é cabe citar as estadas de Frank Lloyd Wright
a do pintor surrealista judeu-alemão, Walter Lewy, enquanto o português e Eliel Saarinen (1873-1950), em 1931, por
ocasião dos trabalhos da segunda fase do
Antonio Pedro, pintor da mesma tendência (e também poeta e escritOr), Concurso Internacional para o Farol de Co-
aqui passou algum tempo, expondo nas duas cidades.4 Estiveram por tem- lombo na República Dominicana; de Siquei-
poradas no Brasil, nos anos de 1930, o pintor japonês-parisiense Foujita ros, em 1933; novamente de Le Corbusier,
e um dos pioneiros da arte moderna na Argentina, Emilio Pettorutti em 1936; de Emilio Pettorutti; do estet:1
(1892-1971). Duas aquisições significativas para São Paulo, na década de francês Étienne Souriau, que lecionou na
UDF. Cite-se, ainda, a vinda do poeta Giu-
1930, foram as da pintora húngara Yolanda Mohalyi e da desenhista e cari- seppe Ungaretti, do etnógrafo Claude Lévi-
caturista Hilde Weber, vinda da Alemanha. Strauss, do sociólogo Roger Bastide, do pro-
fessor de Filosofia Jean Maugüé, que se
É oportuno lembrar que, além de Warchavchik, o construtor da primeira acham entre os mestres contratados pela en-
casa modernista no Brasil, trabalharam em São Paulo arquitetos como Luc- tão recém-criada Faculdade de Filosofia,
jan Korngold (1897-1963), AdolfFranz Heep (1902-78) e Bernard Rudofsky, Ciências e Letras da USP (1934). Houve na-
este também pintor, designer gráfico e escritor; o artista plástico e desig- turais empecilhos para o maior intercâmbio
cultural na época da guerra, mas ao mesmo
ner Leopoldo Haar (1910-54) é outro nome a recordar.5 Seria longa a lista tempo o Pai.sbeneficiou-se com a vinda de
completa de arquitetos, além de poetas e intelectuais, ligados às artes, que intelectuais e artistas, como os numerosos
visitaram o Brasil ou aqui se radicaram.6 O arquiteto e estudioso Carlos Le- nomes citados neste trabalho, de escritoreS

50
como Stefan Zweig, Georges Bernanos e Ot-
tO Maria Carpeaux, este último um estUdio- mos (1925) observou que, durante a guerra e depois dela, os arquitetos es-
so de vasto espectro cultural, onde se in- trangeiros davam preferência a São Paulo (pelas maiores possibilidades de
cluem as artes. Outro estUdioso de peso, da trabalho), enquanto pintores, músicos e escritores optavam pelo Rio.7 No
área de teatro e literatura, aqui radicado é entanto foram em bom número os pintores (e os músicos, como H.J. Koell-
AnatOl Rosenfeld. O teatro ganhou com a reutter e Ernst Mehlich) arraigados à capital paulista, conforme estudo atento
fixação de Zbigniew Marian Ziembinski, em
1940, ano também marcado pela visita de poderá demonstrar. Os jornais da época, catálogos de salões e exposições
Louis )ouvet. A vinda de companhias tea- em geral, tanto no Rio como especialmente em São Paulo e outros Estados
trais, de orquestras, conjuntos de balé e 'ex- do Sul, registram considerável número de artistas de várias nacionalidades
posições de arte sem dúvida sofreu com a aqui fixados naquelas décadas. Mas, se nomes como os de Ernesto de Fiori
guerra, porém mesmo assim houve ou Lechowski são mais conhecidos, dezenas de outros permanecem escas-
intercâmbio.
7 LEMOS, Cados, "Arquitetura Contempo-
samente lembrados ou em inteiro ostracismo. A contribuição que trouxe-
rânea", in ZANINI, W., História Geral da ram ao desenvolvimento artístico do País, pela própria atividade plástica
Arte no Brasil, v. 2, p. 856. ou na decorrência de ensino, é ainda em grande parte ignorada.

51
IV As mostras rarase as exposições visitantes

Entre as causas que assinalam a evolução do quadro artístico no Brasil -


no que concerne sobretudo ao Rio de Janeiro e a São Paulo, nas décadas
de 1930 e 1940 - estão as exposições coletivas estrangeiras e, por vezes,
a inclusão em mostras locais de artistas residentes no Exterior. Esta comu-
nicação com o mundo lá de fora não se poderia medir com as trocas inten-
sas que se registravam no hemisfério norte. Em maioria de caráter oficial
e destinadas a percorrer outras cidades importantes do continente, aque-
las manifestações, de portes diversos e níveis estéticos contrastantes, em
geral contendo artistas modernos, não deixavam de evidenciar também aqui
a expansão da política de intercâmbio cultural internacional. Procediam
essas mostras da França, Alemanha, Inglaterra e Itália, principalmente, mas
a seu lado colocavam-se, desde a fase atípica da guerra, os Estados Unidos,
que ativavam as relações com a América meridional (como parte de sua
estratégia de boa vizinhança).

A citação de tais eventos não pretende ser exaustiva. Assinale-se, colateral-


mente, que apenas de forma muito esporádica era dado ao público o co-
nhecimento das poucas e magras coleções estrangeiras aqui existentes. Em l
São Paulo, depois do accrochage de 1924 - com obras de Léger, Albert
Gleizes (1881-1953), Robert Delaunay (1885-1941), artistas citados por Aracy
Amaral, entre outros possíveis participantes, quando da conferência de Blaise 1 AMARAL,Aracy, Blaise Cendrars no Bra-
Cendrarsl -, nova ocasião ofereceu-se somente em 1930. Consistiu na sil e os Modernistas, São Paulo, Martins, pp.
Exposição de uma Casa.Modernista, na recém-construída residência proje- 106, 109, 115, 1970.

52

.......
l
tada por Warchavchik na rua Itápolis, de que constavam pequena escultu-
ra de ]acques Lipchitz (hoje no MASP) e objetos de arte aplicada da Bau-
haus e de Sonia Delaunay-Terk (1891-1979). De outras proporções seria
I. gXPOSIÇAO ~
a iniciativa da SPAM, em 1933, que reunia em sua I Exposição de Arte Mo-
derna dezesseis artistas da então soberana Escola de Paris: Edouard Vuil-
lard (1868-1940), De Chirico, Picasso, Léger,]uan Gris (1887-1927), Cons-
I,IRT[ DRÂNCt~A tantin Brancusi (1876-1957), Gleizes, Lipchitz, Delaunay, André Lhote
"PINTURA (1885-1962), Dufy, Marie Laurencin (1885-1956), Foujita, François Pom-
pon (1855-1933),]oseph Csaky (1888-1971), além de Sarah Affonso de AI-
mada Negreiros (1899).2
Exemplo mais tardio de mostra contendo peças de origem exterior per-
tencentes a acervos locais foi a organizada pelos MNBA e MEC em 1941,
com apresentações no Rio e em São Paulo. Intitulada Alberto Dürer e a Gra-
vura Alemã e composta de obras estatais e de colecionadores particulares
(entre eles]ulius Arp, Vittorio Gobbis, Theodor Heuberger, Friedrich Ma-
ron e Alfredo Weissflog), documentava a evolução gráfica germânica des-
de os primitivos do século XV até o movimento expressionista, represen-
JUNHO 1940 JULHO
MUleu N.cion.1 de 8el.. Artel
tado por Ernst Barlach (1870-1938), Oskar Kokoschka (1886-1980) e Kae-
M.nlstirlO d.. E.lucfÇÜ. S~. the Kollwitz, entre outros. Acrescente-se que das circulantes pioneiras pre-
paradas pelo escritor Marques Rebelo, a partir de 1947, faziam parte pintu-
Capa do catálogo da Exposição de Arte Fran- ras, desenhos e gravuras a ele pertencentes, de treze artistas: Maurice de
cesa, Rio de Janeiro, 1940. Vlaminck (1876-1958), Oufy, Alfred Kubin (1877-1959), Derain, Léger, Se-
verini, Alberto Magnelli (1884-1971), Marc Chagall (1889-1985), ]oan Mir6
(1893-1985), Pettorutti, Filippo de Pisis (1896-1956), Szenes e Victor Vasa-
rely (1908).
2 Artistas brasileiros participaram dessa ma- Abordando agora o assunto das exposições coletivas que chegaram ao País,
nifestação, cujo interesse maior estava em cabe lembrar que não constituíam novidade no meio. Desde o começo do
ampla seção de literatura modernista, mas século por vezes essas mostras vinham para cá, concomitantemente com
que servia sobretudo à divulgação da arqui-
tetura de Warchavchik. FERRAZ, Geraldo,
outras, menores e numerosas e de conteúdo a averiguar mais de perto -
Warchavchik e a Introdução da Nova Ar- sobretudo espanholas, italianas e francesas -, trazidas "por um s6 artista
quitetura no Brasil: 1925 a /940, São Pau- e/ou comerciante de arte". 3 Registre-se a Exposition d' Art Français de São
lo, MASP, pp. 83-99, 1965. Paulo, promovida em 1913 pelo Comité France-Amérique e apresentada
.\ CHIARELLl, Domingos Tadeu, Monteiro no Liceu de Artes e Ofícios. Possuía aspectos didáticos, sendo formada de
Lobato, Crftico de Arte, São Paulo, ECA-
USP, pp. 16-22, novo 1983, maio 1986.
originais e reproduções fotográficas de edifícios, pinturas e esculturas de
4 O Catálogo traz prefácio de Gabriel Hano- várias épocas. Entre as obras predominavam aquelas de artistas de tradi-
taux e uma introdução geral de Hourticq. ção acadêmica.4 Mais tarde, em 1919, veio-nos a Exposição de Pintura e
A mostra compunha-se de três seções: re- Escultura Francesa, acolhida no Teatro Municipal de São Paulo. Patrocina-
trospectiva; exposição de belas-artes; expo- da pela Legação da França, continha trabalhos de Auguste Rodin (1840-1917)
sição de arte decorativa. Há uma relação de e Emile Antoine Bourdelle (1861-1929), entre outros artistas.5
786 números entre reproduções e originais.
5 CHIARELLI, Domingos Tadeu, op. cit., Nos anos de 1920 destacam-se sucessivamente as mostras que se devem
p.20.
ao animador das relações teuto-brasileiras Theodor Heuberger.

53
No decênio de 1930 registrou-se evidente progresso em relação ao perío-
do anterior. Já no ano inaugural da década, com o empenho do mesmo
Heuberger, apresentava-se no Rio e em São Paulo a citada Exposição Ale-
mã de Livros e Artes Gráficas na América do Sul. A mostra de Artes Gráfi- pQo
A~Te
cas incluía aquarelas e gravuras dos seguintes mestres do Impressionismo SOCIEDADE
e do Expressionismo: Max Liebermann (1847-1935), Lovis Corinth D E ARTES
LETRAS E
SCIENCIAS
(1858-1925), Max Beckmann (1884-1950), ütto Mueller (1874-1930), Karl
Hofer (1878-1955), Erich Heckel (1883-1970), Karl Schmidt-Rottluff
EXPO$lçAO QOS ARTISTAS CARIOCAS
(1884-1976), Kaethe Kollwitz, George Grosz e ütto Dix, além de Lyonel
Feininger (1871-1956). sAO AAULO
DEUMBRO
1 9 3 8
O ano de 1930 foi assinalado por nova manifestação de envergadura, des- SAtAO PA CASA DAS ARCADAS

ta vez consagrada à Escola de Paris. Sob os auspícios da revista Montpar- RIU Oulnt1!l~ 8j)c.i(1v. Nó> 54

nasse e organizada pelo pintor modernista Vicente do Rego Monteiro e pelo Abut'. du
10 jsi20' hot.-
escritor Géo-Charles, era integrada por cerca de noventa obras de cinqüenta
artistas, entre outros Matisse, Picasso, Derain, Vlaminck, Dufy, Léger, Geor-
ges Braque (1882-1962), Gleizes, Louis Marcoussis (1883-1941), Le Faucon- INTERCAMBIO ENTRE OS ARTISTAS
PLASTICOS
nier (1881-1946), Auguste Herbin (1882-1960), Gino Severini, De Chirico,
Juan Gris, Lhote, Pascin, Georges Valmier (1885-1937), Maria Blanchard
(1881-1932), Frans Masereel (1889-1971), Leon Zack (1892-1980), MareeI
Gromaire (1892-1971), Jean Lurçat (1892-1966), Miró e André Masson Capa do catálogo da Exposição dos Artistas
Cariocas, promovida pela Pró-Arte em São
(1896).6 A exposição foi sucessivamente vista no Teatro Santa Isabel (Re- Paulo, 1938.
cife), Palace Hotel (Rio) e Hotel Esplanada (São Paulo).
Outra mostra que nos visitou naquele decênio, e sobre a qual as informa-
ções são precárias, é a que a Itália, em pleno fascismo, nos enviou em 1937 I
1
como parte da Esposizione Commemorativa deI Cinquantenario deIl'Im-
migrazione Ufficiale. Trata-se da Mostra d' Arte, constituída de 69 artistas
de predominante espírito tradicional, mas que incluía os pintores Arturo
Tosi (1871-1956), Carrà, Giorgio Morandi (1890-1964), Fausto Pirandello
(1899-1975) e os escultores Francesco Messina (1900) e Marino Marini 6 Catálogo Grande Exposition d'Art Mo-
derne I 'École de Paris au Palacette Gloria
(1901-80).7 du 6 au 20 juin, Direction Géo-Charles -
Ao lado dessas mostras, assinalou o período também a junção em exposi- V. do Rego Monteiro, São Paulo, 1930. A
mostra incluía obras do co-organizador bra-
ções locais de artistas residentes no Exterior e brasileiros. Deveu-se isto sileiro e de seu irmão, Joaquim do Rego
a Flávio de Carvalho, que embutiu numerosos convidados no Salão de Maio Monteiro (1903-34), e exibia também obras
de 1.938 e 1939, alguns da maior relevância. Da primeira exposição cons- de Tarsila na apresentação de São Paulo. Ver
tava um grupo do jovem movimento surrealista britânico, formado por Ro- dados sobre a mostra no Catálogo Vicente
land Penrose (1894-1982), Charles Howard (1899), Ceri Richards (1903-71), do Rego Monteiro, São Paulo, exposição no
MAC-USP, 1971.
John Banting (1902-72), Julian Trevelyan (1910), entre outros, além do pintor 7 O Catálogo, sob a responsabilidade do
construtivista Ben Nicholson (1894-1982), da mesma nacionalidade. E na Commissariato Italiano per I'Esposizione di
segunda houve a presença de artistas abstratos de várias origens, como AI- San Paulo deI Brasile, traz introdução de Va-
bertO Magnelli, Josef Albers (1888-1976), Jean Xceron (1890-1967), Jean He- lerio Mariani.
..

54
lion (1904), Hans Erni (1909), Eileen Holding (1909), além do criador do
móbile, Alexander Calder (1898-1976). Cabe notar que no Salão de 1938
figuravam xilogravuras dos mexicanos Díaz de León (1897) e Leopoldo Mén-
dez (1902-69).

A guerra não foi empecilho para a vinda de algumas exposições do Exte-


rior. Da Associação Francesa de Ação Artística recebemos, em 1940, a prin-
cipal remessa de toda essa época, em trânsito pelo continente. Com a Ex-
posição de Arte Francesa, surgia a oportunidade, inédita no Brasil, de um
contatO direto com a evolução da pintura produzida em seu centro histó-
rico do século XIX. A mostra cobria alguns aspectos da Escola de Paris nas
primeiras décadas deste século. Do grande número de artistas constavam
jacques-Louis David (1748-1825) - ponto de referência inicial do acervo,
desde um aceno a seu rococó -, Antoinejean Gros (1771-1835), François
Pascal Símon Gérard (1770-1837), jean-Auguste Dominique Ingres
8 Catálogo Exposição de Arte Francesa, Rio (1780-1867), Théodore Géricault (1791-1824), Eugene Delacroix
de Janeiro, MEC-MNBA,jun. / jul. 1940. In- (1798-1863), Théodore Chasseriau (1819-56), Honoré Daumier (1808-79),
trodução de Osvaldo Teixeira. Note-se que
a Argentina, como outros países do hemis- jean François Millet (1814-75), Gustave Courbet (1819-77), Georges Michel
fério, também recebia mostras circulantes (1763-1843),jean-Baptiste CorOt (1796-1875), Théodore Rousseau (1812-67),
da França. Em 1929, ali chegava a Exposi- Charles-François Daubigny (1817-78), johan-Bartholdjongkind (1819-91),
tion de Tableaux de I'École Contemporai- Eugene Louis Boudin (1824-98), Camille Pissarro (1831-1903), Edouard Ma-
ne à Buenos Aires, organizada por Jean Con-
rard e patrocinada pela Association Françai-
ne"t(1832-83), Edgard Degas (1834-1917), Alfred Sisley (1839-99), Claude
se d'Expansion et d'Échanges Artistiques. Monet (1840-1926), Auguste Renoir (1841-1919), Paul Cézanne, Paul Gau-
Pertencentes a coleções e galerias francesas, guin (1848-1903), Vincent van Gogh, Toulouse-Lautrec (1864-1901), Geor-
as obras eram assinadas por Paul Signac, Fé- ges Seurat (1859-91), Odilon Redon (1840-1916), Puvis de Chavannes
lix Vallotton, Maurice Denis, Marquet, Vla- (1824-98), Henri Rousseau, Paul Signac (1863-1935), Félix VallotOn
minck/Dufy, Othon Friesz, Kees van Don-
gen. Observe-se que essa mostra antecedeu
(1865-1925), Edouard Vuillard, Pierre Bonnard (1867-1947), Maurice De-
a que Géo-Charles e Vicente do Rego Mon- nis (1870-1943), Georges Rouault (1871-1958), Albert Marquet (1875-1947),
teiro haviam organizado para o Brasil em Kees van Dongen (1877-1968), Othon Friesz (1879-1949), Derain, Delau-
1930. Neste ano, uma das muitas mostras do nay, Maurice Utrillo (1883-1955), Roger de La Fresnaye (1885-1925), Dufy,
Novecento, preparada por Margherita Sar- Matisse, Picasso, Braque, Vlaminck, Lurçat, Gromaire, Lhote, Masson, Yves
fatti e seu grupo e considerada excelente -
Il Novecento Italiano -, ocorria em Buenos Tanguy (1900-55), Christian Bérard (1902-49), Tal Coat (1905). A mostra,
Aires (cf. BOSSAGLIA,Rossana, /l Novecen- com 175 obras,8 foi apresentada no MNBAe em local da rua Barão de Ita-
to Italiano, Milão, Feltrinelli, pp. 35, 55, petininga, em São Paulo.
118, 120, 181-2, 209, 237, 1979).
9 A mostra teve o patrocínio de Fernando De interesse bastante relativo supomos que tenha sido a Exposition de Pein-
Costa, na época interventor em São Paulo, ture Française, com dez participantes, no Hotel Esplanada, em 1943.9
e os expositores eram Lucien Jonas, Paul
Emile Boutigny, Georges Delastouche, Emi- Em 1942, a Inglaterra, que enviara pouco antes (1941) a Exposição de De-
le Albert de Mandre Suzanne Thullier-
Feuillas, Bernard Hen;i Calvet France Du- senhos de Escolares da Grã-Bretanha, nos fez chegar a Exposição de Gra-
paty, Jacques Boucher, Bernardo Moreira e vuras Britânicas Contemporâneas, com 240 obras de 123 artistas dos sécu-
João Maria dos Santos. los XIX e XX. Abrigada no MNBA,tinha fortes aspectOs retrospectivos, pon-

55
do em evidência as correntes realistas e enfatizando a diversidade de pro-
cessos técnicos ali desenvolvidos em data recente.10

No ano seguinte, a Inglaterra remetia nova e volumosa delegação, a Expo-


sição de Pintura' Britânica Contemporânea, a qual, depois de hospedada
pelo MNBAe pela Galeria Prestes Maia, foi levada a Belo Horizonte (1944).
Com 163 pinturas e gravuras de 110 artistas, deu a conhecer ângulos des-
tacados dessa arte insular influenciada pela Escola de París. Constavam en-
tre os participantes (alguns já vistos no Salão de Maio) Walter Richard Sic-
kert (1860-1942), Paul Nash (1889-1946), Ben Nicholson, Henry Moore
(1898-1986), John Piper (1903), Gilbert Spencer (1902), Graham Suther-
land (1903-80), William Scott (1913) e Michael Ayrton (1921).1l Os artis-
tas brasileiros retribuíram essas visitas com a grande coletiva transportada
a Londres e outras cidades da nação aliada.

Sempre no decurso da guerra, em junho de 1944, realizou-se na capital pau-


lista (Galeria Prestes Maia), na seqüência de manifestações européias, a Ex-
posição de PIntura Austríaca Contemporânea, com trabalhos de 55 mem-
bros da Casa dos Artistas de Viena e da Secessão Vienense, além de outros
pertencentes a colecionadores locais. A única figura de maior realce do con-
junto era Egon Schiele (1890-1918), representado por quatro obras.l2

Além dessas exposições do Velho Mundo, houve as do próprio continente


americano. Em 1941, o MNBA recebia as itinerantes Arte Contemporânea
do Hemisfério Ocidental e Arte Gráfica do Hemisfério Ocidental, ambas 10 A exposição foi organizada pelo British
compostas de peças do acervo da International Business Machines Corpo- Council e sob os auspícios do MNBA e da
ration. Reunindo respectivamente 93 e 150 obras de artistas da América Sociedade Brasileira de Cultura Inglesa, do
Latina, do Canadá e dos Estados Unidos, consagravam-se, grosso modo, Rio de Janeiro; acompanhava-a um Catálo-
a tendências realistas e expressionistas. A primeira delas, e a menos inte- go prefaciado por Campbell Dodgson.
11A exposição foi preparada pelo British
ressante, incluía quadros dos brasileiros José Pancetti, Santa Rosa, Leopol- Council e patrocinada pelo MEC. O Catálo-
do Gotuzzo (1887-1983), Vicente Ferreira Leite (1900-41) e Osvaldo Tei- go é prefaciado anonimamente. Integravam
xeira; dos mexicanos Roberto Montenegro (1885-1968) e Jesús Guerrero o Comitê de Seleção Eric Maclagan, Clive
Galván (1910-73); do norte-americano Charles Burchfield (1893-1967), entre Bell, Kenneth Clark, Herbert Read e Alfred
outros. A segunda, mais consistente, englobava peças escalonadas do sé- A. Longdsen.
culo XVIII ao XX, achando-se entre os selecionados dos Estados Unidos 12 Coube ao pintor Karl Rob, presente em
São Paulo, a direção artística da exposição,
James McNeill Whistler (1834-1903), Winslow Homer (1836-1910), Mary patrocinada pelo Departamento Municipal
Cassat (1845-1926) e Edward Hopper. O elenco brasileiro era composto de Cultura. No prefácio ao Catálogo, assi-
por Carlos Oswald, Osvaldo Goeldi e Percy Lau (1903-72). De um modo nado pelo Comitê de Proteção dos Interes-
geral, os latino-americanos - como os mexicanos Orozco, Rivera, Ignacio ses Austríacos no Brasil, lê-se que Rob con-
seguira "salvar das garras nazistas rica e va-
Aguirre (1900), Abelardo Avila (1907-67), José Chávez Morado (1909) e Fran- liosa coleção de pinturas austríacas" e que
cisco Dosamante~ (1911); o brasileiro Percy Lau; os argentinos Pompeyo numerosas das obras eram de sua coleção
Audivert (1900), Victor L. Rebuffo (1903) e Demetrio Urruchua (1902-78); particular.

56
13 Os Catálogos Arte Contemporânea do o uruguaio Guillermo Rodríguez (1889-195~); os cubanos Domingo Rave-
Hemisfério Ocidental e Arte Gráfica do He- net Esquerdo (1905-69) e Enrique Caravia Montenegro (1905); a peruana
misfério Ocidental trazem introduções de Carmen Saco (1882-1948) -, com seu realismo de comprometimento so-
Thomas]. Watson, presidente da IBMC, sen-
do que o último contém prólogo de ]ohn
cial, formavam um acervo distinto dos diversificados aspectOs do movi-
Taylor Arms, presidente do American Na- mento artístico norte-americano ou do "Romantismo" canadense, que a
tional Committee of Engraving. O autor de- IBMC colecionava.13
ve a Donato Mello ]únior a consulta a am-
bas as publicações.
14a Livro-Catálogo Pintura Contemporâ- Nesse mesmo ano veio para o Rio (MNBA)a grande mostra Pintura Con-
nea Norte-Americana teve come editores temporânea Norte-Americana, com 119 artistas. Organizada pelo critério
os seguintes museus: The American Museum de "assunto americano", enfatizava a produção realista dos anos de 1930,
ofNatural History, The Brooklyn Museum, com muitas obras demonstrando influência da pintura social mexicana.
The Metropolitan Museum of Art, MaMA e Colocavam-se em evidência artistas de gerações e tendências diversas, co-
The Whitney Museum of American Art, com
a colaboração do Comitê de Arte do Gabi- mo John Marin (1870-1953), Lyonel Feininger, Arthur Dove (1880-1946),
nete do Coordenador das Relações Cultu- Max Weber (1881-1961), Edward Hopper, Charles Demuth (1883-1935),
rais e Comerciais entre as Repúblicas Ame- Georgia O'Keeffe (1887-1986), Charles Burchfield, George Grosz, Stuart
ricanas. a prefácio é assinado por ]ohn E. Davis (1894-1964), Ben Shahn (1898-1969), Arshile Gorky (1904-48).14 Es-
Abbott, Aifred H. Barr ]r., ]uliana R. Force, sa itinerante é exemplo da nova atitude dos Estados Unidos, que, durante
Laurence P. Roberts, Francis Henry Taylor
e George C. Vaillant, do Comitê de Arte. A a guerra, abandonavam a posição de potência periférica e assumiam res-
introdução é de Helen Appleton Read. A ex- ponsabilidades internacionais, conscientes do papel que doravante podiam
posição foi programada para circular, entre representar na ordem mundial.15 Além do envio de missões econômicas,
maio e dezembro de 1941, pela cidade do fomentavam o intercâmbio cultural com os países aliados através de expo-
Rio de Janeiro e mais nove capitais da Amé- sições de seus artistas, patrocínio de conferências ou realização de mos-
rica meridional. Prometida no prefácio co-
mo sendo a "primeira de uma série de co- tras especiais antinazistas, como a resultante no concurso United Hemis-
leções de arte que serão exibidas nos cen- phere Posters, promovido pelo MOMA em 1942.16 Registre-se a estada no
tros culturais do Novo Mundo", não encon- Rio, em 1942, de George Biddle (1885-1973), pintor e escultor de destaca-
trou no futuro outra expressão de tal porte. da atuação na política artística dos anos de recessão e, a seguir, defensor
15Para satisfazer interesses aqui desperta- de uma posição de alcance social; aqui Biddle realizou os murais da Biblio-
dos, Sérgio Milliet escreveu rápido porém teca Nacional e pronunciou conferência sobre Novos Rumos da Arte Ame-
excelente ensaio sobr~ as grandes linhas da
evolução histórica da pintura nos 'Estados
ricana. Em 1944, visitava-nos nova mostra, com 28 pintores, patrocinada
Unidos, captando sua importância crescen- pela associação Contemporary Artsl7 de Nova York. Foi alojada no MNBA
te, embora não a projeção universal que co- e na Galeria Prestes Maia, juntamente com numerosos artistas brasileiros
meçava a adquirir naqueles anos (A Pintu- ou aqui residentes.18 Os nomes estadunidenses eram desconhecidos e as
ra Norte-Americana, São Paulo, Martins, obras, salvo exceções, de referência realista.
1943).
16Participaram do concurso artistas de vá-
rios países do hemisfério. Os brasileiros Ary Da América do Norte procedeu, ainda em 1944, a exposição Pintura Cana-
Fagundes e Carlos Frederico Ferreira rece- dense çontemporânea (acrescentada de uma seção folclórica), apresenta-
beram "menções honrosas". da no MNBAe, depois, no começo de 1945, na Galeria Prestes Maia. Atra-
17A única referência à associação Contem- vés de 189 peças de 74 artistas, documentava em especial linhas de evolu-
porary Arts no Catálogo é a de que se trata
de "organização sem finalidade lucrativa, ção histórica de acentuado caráter endógeno, como no paisagismo de in-
presidida por Miss Emily A. Francis, cujo es- terpretação lírica. Participava da mostra Paul-Emile Borduas (1905-60), que
copo é o progresso da arte e dos artistas". se tornou o mais importante pintor abstrato canadense de sua geração.19

57
o ritmo de exposições intensificou-se nos anos do pós-guerra. No geral
repetia-se sua procedência, acrescentando-se, entretanto, delegações de ou-
tros países.
Em 1945, Rio e São Paulo (MNBAe Galeria Prestes Maia)hospedaram a mos-
tra Pintores Franceses de Hoje,20 que, em 1949, seria sucedida de outra: 18 Ao lado dos pintores norte-americanos
A Nova Pintura Francesa e Seus Mestres - de Manet a Nossos Dias.21 De- Sarah Baker, Herbert Barnett, Jon Corbino,
las constavam nomes não raro maiores da Escola de Paris entre os dois sé- Nassos Daphinis, Samuel Koch, Sigmund
culos e de fases mais recentes, muitos já presentes em 1940, além de Aris- Koslow, Joseph Li Marzi, Josef Presser,
Leighton Smith e outros, figuravam, no Rio
tide Maillol (1861-1944), Jacques Villon (1875-1963), Amedeo Modigliani e em São Paulo, Tarsila do Amaral, Cícero
(1884-1920), De Chirico, Léger, Gheer van Velde (1898-1977), Gerard Dias, Alcides da Rocha Miranda, Arpad Sze-
Schneider (1898), Maurice Esteve (1904), Jean Bazaine (1904), Léon Gis- nes, Maria Helena Vieira da Silva, Burle
chia (1904), Edouard Pignon (1905), Balthus, Gustave Singier (1909), Jean Marx, Santa Rosa, Iberê Camargo, Paulo
Rossi Osir, Gobbis, Nélson Nóbrega, Lívio
Le Moal (1909), Alfred Manessier (1911) e Jean Atlan (1913-60). entre outros.
Abramo, Hilde Weber e artistas que haviam
Frente a esses envios significativos, foram secundárias outras exposições pertencido ao Grupo Santa Helena, entre
francesas, como a organizada em 1947 pelo marchand A. Bénéteau no outros.
MNBA, sob o patrocínio da Associação dos Artistas Brasileiros, com 36 19H.O. McCurry e J,D. prefaciam o Catálo-
artistas. go da Exposição, para a qual colaboraram
MEC, Interventoria Federal, Prefeitura Mu-
Iniciativa marcante foi a da recém-instalada Galeria Askanazy, no Rio, abrin- nicipal de São Paulo, Instituto Brasil-Canadá,
do, em 1945, a Exposição de Arte Degenerada Condenada pelo III Reich, órgãos oficiais canadenses, Galeria Nacional
sob o patrocínio da Casa do Estudante do Brasil. Agrupavam-se obras em de Ottawa, Galeria das Artes de Toronto,
Galeria das Artes de Montreal e artistas
várias técnicas (gravuras, sobretudo) de 26 artistas, a maioria expressionis- canadenses.
ta, entre eles Max Liebermann, Corinth, Max Slevogt (1868-1932), Wassily lI) Cf. Catálogo Peintres Français d'Aujour
Kandinsky (1866-1944), Emil Nolde (1867-1956), Kaethe Kollwitz, Feinin- d'hui - Arts Décoratifs, São Paulo, 1945.
ger, Alfred Kubin, Paul Klee (1879-1940), Franz Marc (1880-1916), Ernst A mostra foi organizada pela Association
Ludwig Kirchner (1880-1938), Max Pechstein (1881-1955), Wilhelm Lehm- Française d' Action Artistique e ocorreu sob
os auspícios do Departamento Municipal de
bruck (1881-1919), Erich Heckel, Max Beckmann, Ludwig Meidner Cultura. Foi comissário o prof. René Huy-
(1884-1966), Karl Schmidt-Rottluff, Oskar Kokoschka, August Macke gue, autor da "Introdução Geral", cabendo
(1887-1914), Willy Baumeister (1889-1955) e Otto Dix, além de Lasar Se- a Germain Bazin, comissário-delegado, a
gall e Wilhelm Woeller. apresentação da seção de pintura e a Michel
Faré a introdução da seção de Artes Deco-
Em 1946, nova exposição norte-americana vinha ao Brasil, desta vez de rativas.
aquarelas.22 De caráter retrospectivo, contendo 45 trabalhos que abran- 21 Catálogo A Nova Pintura Francesa e
giam o período de 1870 ao ano da'mostra, incluía artistas-chaves da pintu- seus Mestres - de Manet a Nossos Dias, Rio
ra moderna ianque, entre o Impressionismo e concepções recentes, vários de Janeiro, out. 1949. Organizaram a mos-
tra os Serviços Artísticos do Ministério das
já conhecidos de nosso público. Apresentada no MNBAe na Galeria Pres- Relações Exteriores da França. Foi comissá-
tes Maia, reunia James McNeill Whistler, Winslow Homer, Mary Cassat, John rio geral Gaston Diehl.
Singer Sargent (1856-1925), Maurice Prendergast (1859-1924),John Marin, 22 Com obras selecionadas pelo Whitney
Lyonel Feininger, Max Weber, Edward Hopper, Charles Demuth, Charles Museum de Nova York, a exposição foi rea-
Burchfield, George Grosz, Stuart Davis, Ben Shahn e Morris Graves (1910). lizada sob os auspícios da National Gallery
of Art de Washington, do Walker Art Cen-
Outras mostras foram vistas no decorrer de 1946. Exibida nos mesmos es- ter de Mineápolis e da União Cultural Brasil-
paços das anteriores, Artes Gráficas do Canadá continha 201 obras de 56 Estados Unidos.

58

L
Capa do catálogo da Exposição Pintura Con-
temporânea Americana, Rio de Janeiro,
1941.

59
desenhistas e grav,adores e realçava os esforços feitos nessas áreas plásticas
no país setentrional, em vertentes assentadas na observação do mundo
PINTURA
exterior.23
CANADENSE
No mesmo ano inaugurava-se, na Galeria Prestes Maia, uma exposição de
arte belga, organizada pelo Centro. de Expansão Artística de Bruxelas, com
a presença, entre outros, do pintor Louis-Lievint Clesse (1889-1961); seguiu-
se uma mostra de artistas franceses de poucas referências, na Galeria Itá.
Um dos principais eventos desse imediato pós-guerra, entretanto, não di-
zia respeito à contemporaneidade. Trata-se da Exposição de Pintura Italia-
na Antiga (do século XIII ao século XVIII), organizada pelo Studio d'Arte
Palma, de Roma, de propriedade de Pietro Maria Bardi, e apresentada no
MEC em 1946. Várias das obras vistas nessa ocasião seriam depois destina-
das ao acervo do MASP.

Ainda em 1946, o pintor e escultor milanês Bassano Vaccarini, que se radi-


caria definitivamente no Brasil, trouxe na bagagem a mostra Arte Italiana
Contemporânea, dela constando obras suas e de 22 colegas de várias ex- CONTEMPORANEA
periências figurativas, entre os quais se incluíam Mario Sironi, Renato Bi-
rolli (1907-59), Giuseppe Santomaso (1907), Ennio Morlotti (1912) e Bru- Capa do catálogo da Exposição Pintura Ca-
no Cassinari (1912). O conjunto foi exibido no Rio e em São Paulo (ABI nadense Contemporânea, São Paulo, 1944.
e Galeria Barros, o Mulato). Duas outras exposições italianas chegaram lo-
go em seguida (1947) à capital bandeirante, ocupando simultaneamente as
Galerias Itapetininga e Domus. A primeira com obras de pintores macchiaio-
li, como Silvestro Lega (1826-95), Giovanni Fattori (1825-1908) e Giovan-
ni Boldini (1842-1931), além de De Chirico, Felice Carena (1879-1966), Ot-
tone Rosai (1895-1957), Tosi, De Pisis, Achille Funi (1890-1972) e outros.
A segunda, patrocinada pelo Studio d'Arte Palma, também levada ao MEC,
documentava exclusivamente a arte italiana de nossos dias nas figuras de
De Chirico, Carrà, Severini, Sironi, Fausto Pirandello, De Pisis, Mario Maf-
fai (1902-65), Birolli, Renato Guttuso (1912-87), entre outros.
23 Organizada com a colaboração da Gale-
No último ano da década, a citada exposição francesa e a mostra Do Figu- ria Nacional do Canadá, dos artistas cana-
denses e do Instituto Brasil-Canadá e resul-
rativismo ao Abstracionismo, que inaugurou o MAMde São Paulo, curada tado de entendimentos entre a Embaixada
por seu primeiro diretor, o crítico belga Léon Degand, davam estímulo aos do Canadá no Brasil, MEC e MNBA, foi
que aqui se inclinavam à abstração.24 Esta última incluía Kandinsky, Fran- acompanhada de um Catálogo com prefá-
çois Kupka (1871-1957), Francis Picabia (1878-1953), Jacques Villon, So- cios de Lawrence Hyde, ]acques G. de Ton-
phie Taeuber Arp (1889-1943), Calder (de quem o MASPe o MEC apresen- nancour e apresentação de Lygia Martins
Costa, conservadora do MNBA.
taram uma individual em 1948), Herbin, Bram van Velde(1895-1982), Gheer
24 Catálogo Do Figurativismo ao Abstra-
van Ve1de, Sonia Delaunay-Terk, Cesar Domela (1900), Victor Servranckx cionismo, Introdução Sérgio Milliet e textO
(1897-1965), Jean Dewasne (1921) e os representantes locais Cícero Dias, crítico de apresentação de Léon Degand,
Samson Flexor e Waldemar Cordeiro (1925-73). São Paulo, MAM, 1949.

60

L
J
r
,

As exposições coletivas internacionais são parte do complexo sistema de


agentes que interferem na produção contemporânea e na formação do pú-
blico, a partir do trabalho original, o que as torna insubstituíveis. Ainda
muito raras no Brasil no decênio de 1930, tais mostras tornaram-se mais
freqüentes a seguir, inclusive na época da guerra, ganhando sempre maior
ritmo depois. Foram aqui vistas, no decorrer das décadas de 1930-40, cer-
ca de vinte dessas exposições de arte moderna - algumas de relevância
- ou incorporando movimentos contemporâneos'avançados,25 afora as
organizadas localmente. Somente um pouco mais da metade desse núme-
ro, entretanto, refere-se ao longo período até 1945, o que demonstra uma
comunicação com O mundo externo ainda precária por essa via. Seja co-
mo for, os acervos europeus e das Américas aqui exibidos - com a parti-
cipação de nomes-chaves da arte internacional - representaram um aces-
so valioso para os artistas locais, num tempo em grande parte avaro no pro-
porcionar estadas de brasileiros no Exterior. Novas análises a nível do sig-
nificado das obras e sua expressão no contexto da carreira dos artistas ex-
positores poderão detectar a fundo essa aproximação.
Dentre todas as mostras, há consenso geral quanto à ampla receptividade
de nossos artistas à exposição francesa de 1940, a qual documentava o Mo-
dernismo de dois séculos. Sua marca foi certamente profunda para todos
Capa do catálogo da Exposição de Arte Con- os inexperientes de viagens. Dez anos antes, a mostra de Rego Monteiro
temporânea do Hemisfério Ocidental, Rio e Géo-Charles, com elementos do formalismo pós-cubista parisiense do fim
de Janeiro, 1941. dos anos de 1920, caía, provavelmente, um pouco no vazio, não obstante
a riqueza de exemplares selecionados. Pois era outra a direção que come-
çava a imprimir-se à pintura. Já as exposições da Pró-Arte (e não podemos
esquecer a individual de Kaethe Kollwitz, em 1933) reforçavam a corrente
expressionista local, fluente desde o primeiro Modernismo e ativada por
artistas germânicos residentes no Brasil. No Salão de Maio, além dos traba-
lhos abstratos e surrealistas, a concorrência de tendências incluía gravuras
mexicanas afinadas à tese social aqui encorajada.
Para os artistas ascendentes em São Paulo nos anos de 1930 - muitos de
origem italiana -, a mostra do cinqüentenário da imigração, em 1937, por
alguns componentes, poderá ter provocado interesse. Observe-se que não
nos visitou nenhuma exposição do movimento Novecento - exibido acu-
radamente em Buenos Aires em 1930 - "com seus aspectos novos datra-
dição", que atingiam por outros caminhos a pintura de São Paulo e Rio.
As mostras de pintura e gravura inglesas de 1942 e 1943 reuniam elemen-
25Esse número não é definitivo, mas acre- tos de primeira ordem, e o acervo de gravura da IBMC ilustrava, em 1941,
ditamos que pouco se poderia acrescentar o curso da arte, principalmente em vários países da América Latina e nos
de significativo aos dados aqui expostos. Estados Unidos. Nesse ano, ~nda, a importante exposição Pintura Contem-

61
porânea Norte-Americana foi oportunidade para aferir-se sobretudo a apli-
cação dos artistas na compreensão de seu environment durante os anos
de 1930 (o tempo central da retrospectiva). Pela décWa de 1940, a cultura
norte-americana, aqui difundida através de múltiplos canais - rádio, cine-
ma, publicações etc. -, tomava boa parte do lugar da cultura européia,
predominante no Brasil até a Segunda Guerra Mundial. No terreno da pin-
tura, entretanto, essa influência não parece ter alcançado plano notório.
Cabe observar que a exposição mencionada, preparada sob a égide do Rea-
lismo, conotava-se nas linhas gerais à orientação de muitos artistas daqui.,
contudo tradicionalmente vinculados à acreditada plástica européia (fran-
cesa, italiana e alemã) e sensíveis também ao Realismo mexicano, por sua
vez incidente nos Estados Unidos. Desde o fim da guerra visitou-nos por
outras vezes a Escola de Paris, e aspectos do movimento italiano dessa época
também nos foram dados a conhecer. Registramos a escassez de exposi-
ções de maior cobertura da História da Arte, uma ausência de intercâmbio
ainda hoje manifesta.
Vale notar que o Salão de Maio de 1938 e 1939 tornava mais familiar a arte
abstrata ou dessa propensão. Embora haja exemplos isolados de Abstra-
cionismo aqui produzido no fim dos anos de 1930, foi na década de 1940,
e mais perto de seu término - ou seja, antes da Bienal de São Paulo -,
que essa tendência internacional (penetrada no País não apenas através de
exposições) começou a incidir com peso, tanto em artistas em vias de ama-
durecimento como em outros de longa carreira e cuja realização se fizera
a partir da visão objetiva da realidade, de um EinJuehlung local, de amál-
gamas e influxos de tempos diversos de vastas correntes ocidentais.

62
I
V Exposições coletivas brasileiras no Exterior

A presença de brasileiros em mostras e salões no Exterior é dado histórico


a juntar-se na apreciação do período. Expor no estrangeiro, em centros de
poder catalisador, significa, evidentemente, a busca de afirmação em con-
frontos mais complexos e difíceis. Uma arte de teor periférico - segundo
o conceito que lhe deuJan Bialostocki -, como a aqui produzida, poderia
ter sido (embora carente de maior força coletiva) apresentada lá fora de
forma mais definida e coesa, de sorte a melhor revelar características atin-
gidas. No entanto, as exposições dirigidas ao mundo internacional peca-
vam freqüentemente pela ausência de critérios. Salvo no caso da delega-
ção levada à Inglaterra em 1944, em que se mesclavam interesses de soli-
dariedade na guerra contra o nazismo e a promoção artística, não houve
seleções apuradas. Das mostras preparadas com esse fim, nenhuma seguiu
para Paris. Foi para os Estados Unidos, em ascendência artística, que se en-
dereçou a maior parte dessas exposições.
Restringimo-nos, nestas anotações, a levantamentos sucintos de eventos
coletivos, escassos nos anos de 1930, bem mais intensos na década seguinte
e, como dissemos, não raro reveladores de muitas limitações de escolha
para que se pudesse oferecer lá fora uma idéia mais orgânica da arte aqui
em proces~o. Faltava-Ihes, em geral, melhor planejamento, prevalecendo
por vezes os critérios seletivos políticos (a exemplo da conciliação de inte-
resses acadêmicos e modernistas). Enquanto eram das mais reduzidas as
ocasiões de expor na Europa, contribuindo para isso a guerra, tornava-se
crescente o intercâmbio com os Estados Unidos e nações vizinhas. O úni-

63
co nome de artista brasileiro a impor-se a uma larga apreciação internacio-
nal é o de Portinari, que, em 1935, recebera menção na International Ex-
hibition of Paintings. do Institute Carnegie de Pittsburgh. Ele realizou nu-
merosas exposições individuais, sobretudo nos Estados Unidos, e foi pre-
sença constante nas delegações brasileiras.! Apesar de as artes nos Estados
Unidos não gozarem do prestígio alcançado posteriormente, aquele prê-
mio foi decisivo para a afirmação de Portinari no País. Vem a propósito
dizer que, anos depois, em 1942, seria ainda nos Estados Unidos, através
de mostra do MOMA e do livro Brazil Builds,2 que se iniciaria o proces-
so de reconhecimento internacional da arquitetura moderna brasileira.
Abre a série de exposições a Exhibition of the First Representative Collec-
tion of paintings by Contemporary Brazilian Artists, promovida em 1930
pelo International Art Center of Roerich Museum, em cooperação com The
Brazilian Society of Friends of Roerich Museum, reunindo 53 pintores. Na
introdução ao Catálogo, Christian Brinton refere-se à ênfase regional da te-
mática abordada e ao contraste entre o predominante conservadorismo dos
artistas do Rio (na linha da ENBA) e o Modernismo dos "vigorous Paulis-
tas". A mostra era das mais híbridas, colocando, ao lado de Anita Malfatti,
Di Cavalcanti, Tarsila, Ismael Nery, Guignard, Gomide, Cícero Dias, Rossi ~
Osir, Quirino da Silva, pintores de espírito tradicional, como Carlos Cham-
belland (1884-1950), Georgina de Albuquerque, Carlos Oswald, Paulo Valle
Júnior (1886-1958) e Osvaldo Teixeira, acompanhados de um dos princi-
pais pintores do passado, Almeida Júnior (1850-99).
Em 1935, uma delegação brasileira, com Anita Malfatti, Segall, Portinari, Lu-
cílio de Albuquerque, entre outros, estaria presente na exposição anual de 1 Nesse período Portinari expôs dezessete
vezes individualmente nos Estados Unidos,
arte do Instituto C~lfnegie de Pittsburgh, ocasião em que se atribuía men- sete na América Latina e uma na Europa e
ção honrosa ao quadro Café, de Portinari. participou de trinta mostras coletivas nos Es-
O critério da escolha eclética teria outros exemplos como no Salón de los tados Unidos, América Latina e Europa, aqui
Estados Unidos del Brasil, incluído no XXVIISalón Nacional de Buenos Ai- inclusas as sete apresentações da exposição
enviada à Inglaterra em 1944 (d. dados for-
res (1937), em que se juntaram os pintores Guignard, Osir, Gobbis, Busta- necidos pelo Projeto Portinari ao autor em
mante Sá, Henrique Cavaleiro (1892-1975), Georgina de Albuquerque, Ma- 1986).
noel Santiago, Osvaldo Teixeira, Haidéia Lopes Santiago e os escultores Flá- 2 Brazil Bui/ds, Architecture New and O/d
vio de Carvalho, Figueira, Humberto Cozzo, Leão Velloso, Hugo Bertaz- 1652-1942; Introdução de Philip L. Good-
win e fotos de G.E. Kidder Smith, New
zon (1897-1940) e Samuel Chaves Martins Ribeiro (1896-1949).3 York, The Museum of Modero Art, 1943.
Em 1939, devido à guerra que se deflagrava, falhou, como lembra Geraldo 3 "Arte Brasileira", in Vamos Ler!, Rio de
Ferraz,4 a tentativa de envio ao Exterior de mostra organizada no Rio, pa- Janeiro, 3 (65), 28 out. 1937 (recorte cedi-
ra a qual Anibal Machado escrevera a introdução ao Catálogo, publicada do ao autor pela pesquisadora Harumi
Yamagishi).
com ilustrações de várias obras sob o título de "Art Brésilien Moderne (Pein- 4 FERRAZ, Geraldo, Depois de Tudo: Me-
ture et Sculpture)". A escolha dos artistas, ao que parece, manter-se-ia na mórias, Rio de Janeiro, Paz e Terra, pp.
mesma tradição de juntar modernos e acadêmicos. 118-9, 1983.

64
L 1111
I Somente em 1944, por razões ao mesmo tempo culturais, políticas (repú-
dio ao fascismo) e beneficentes, rumou para a Europa a primeira coletiva
de artistas modernos brasileiros. A delegação era volumosa e representati-
va, incorporando apreciável número de artistas da segunda geração mo-
dernista. Intitulada Exhibition of Modern Brazilian Painting, foi enviada à
Inglaterra como homenagem à Royal Air Force (RAF)e apresentada na Ro-
yal Academy of Art de Londres (novembro/dezembro 1944), com Catálo-
go prefaciado por Sacherevell Sitwell e para o qual Ruben Navarra prepa-
rara longa e fundamentada introdução. Ele mencionava aspectos da histó-
ria da arte moderna no Brasil e as diferenças existentes entre a pintura do
Rio, de atmosfera mais tropical, e a de São Paulo, mais européia e inclina-
da para uma paleta flou e fria, enfatizando artistas como Segall, Portinari,
Cícero Dias, Pancetti e o primitivo Heitor dos Prazeres (1898-1967). A mostra
englobava 168 pinturas, desenhos e gravuras de setenta autores. Neste ca-
so, uma grande campanha, que se estendeu por vários meses, movimenta-
ra artistas e intelectuais. As condições de apresentação, durante e logo após
o conflito mundial, não teriam sido das mais próprias. Participaram, entre
outros: Segall, Di Cavalcanti, Tarsila, Goeldi, Flávio de Carvall1o, Guignard,
Cícero Dias, Portinari, Carlos Leão, Orlando Teruz, OSir, Jorge de Lima
(1895-1953), Raimundo Cela (1890-1954), Quirino da Silva, Quirino Cam-
pofiorito, Carlos Prado, Milton Dacosta, pancetti, Graciano, Burle Marx,
Alcides da Rocha Miranda, Toledo Piza, Odette de Freitas, Lívio Abramo,
Gastão Worms, Volpi, Rebolo, Bonadei, Zanini, Manoel Martins, Nélson
Nóbrega, Duja Gross, Santa Rosa, Rubem Cassa, Luís Soares, Athos Bul-
cão, Virgínia Artigas, Oswald de Andrade Filho, Edith Behring, Dj,anira
Scliar, Iberê Camargo, Percy Lau, percy Deane, José Moraes, Lucy Citti Fer.
reira, Paulo Werneck, Noêmia, Poty, Augusto Rodrigues (1913),Jacob Ruch-
ti, os primitivos José Bernardo Cardoso Júnior e Heitor dos Prazeres e ar-
tistas estrangeiros radicados ou refugiados no Brasil, como Leskoschek, Ar-
pad Szenes, Maria Helena Vieira da Silva e Emeric Marcier. Além de Lon-
dres, a exposição foi sucessivamente levada, de março a agosto de 1945;
a museus de Edimburgo, Glasgow, 'Bath, Bristol, Manchester e
Whitechapel.5
Foi para países latino-americanos vizinhos que se prepararam as novas co-
letivas. Em 1945, o escritor, colecionador e organizador improvisado de
exposições Marques Rebelo, juntando obras em sua maior parte de artistas
do Rio, formou a itinerante Veinte Artistas Brasilefios, montada no Museu
Provincial de Belas-Artes de La Plata,6 no Museu Nacional de Belas-Artes
5 Participaram também da exposição 162
fOtografias de arquitetura colonial e de Buenos Aires e no Museu Municipal de Montevidéu. Estavam presentes
moderna. Di Cava1canti, Tarsila, Guignard, Pancetti, Portinari, Carlos Leão, Gracia-
6 Apresentada no Catálogo por Pettorutti. no, Quirino Campofiorito, Hilda Campofiorito (1901), Burle Marx, Alcides

65
da Rocha Miranda, Orlando Teruz, Djanira, Milton Dacosta, Santa Rosa, Iberê
Camargo, percy Deane, Aldari Toledo, José Pedrosa e Cardoso Júnior. Ser-
viu essa exposição para ativar o ralo intercâmbio com a Argentina e o Uru-
guai, e nela, não obstante as lacunas, o crítico platino Jorge Romero Brest
colheu dados para escrever sua Pintura Brasilefía Contemporánea,7 na
verdade, um ensaio introdutório em que ressalta o que mais lhe aprazia
no conjunto, ou seja, a fixação dos artistas em interpretar a realidade de
seu ambiente.
Em 1946 coube ao Chile receber nova representação brasileira, agora mais
ampla e de aspectos atualizados, .incluindo três gerações de artistas. Intro-
duzida no Çatálogo pelo pintor Berco Udler - a quem é devida -, foi vis-
ta inicialmente em Valparaíso e a seguir em Santiago.8 O contingente era
numeroso: Di Cavalcanti, Tarsila, Guignard, Flávio de Carvalho, Portinari,
Sigaud, Waldemar da Costa, Quirino Campofiorito, Nélson Nóbrega, Re-
bolo, Bonadei, Zanini, Rizzotti, Manoel Martins, Volpi, Clóvis Graciano,
Burle Marx, Carlos Prado, Alcides da Rocha Miranda, Teruz, Santa Rosa,
Bianco, Renée Lefevre, Berco Udler, Iberê Camargo, Jorge de Lima, Lula
Cardoso Ayres, Lucia Suané, Augusto Rodrigues, Scliar, Athos 'Bulcão, AI-
dari Toledo, Hilda Campofiorito, Joaquim Tenreiro, Percy Deane, Percy
Lau, Sílvia Chalreo, Walter Lewy, Lothar Charoux, Maria Leontina, Poty,
Inimá de Paula (1918) e Marcelo Grassmann.
Citamos ainda duas mostras menores que visitaram a Argentina e o Uru-
guai. Foram as que o Osirarte realizou em 1946 e 1947, respectivamente
no Salón Peuser de Buenos Aires e na Galeria Giménez, de Mendoza. Ao
lado de azulejos, figuravam quadros de Volpi e Zanini. Por sua vez, o Ate-
neo de Montevidéu acolheu, em 1946, um conjunto de 35 litografias de
Bonadei, Graciano, Scliar, Lívio Abramo, Manoel Martins, Oswald de An-
drade Filho e Walter Lewy, apresentado no Catálogo pelo crítico Cipriano
S. Vitureira.9
Outras ocasiões de presença conjunta de artistas brasileiros no Exterior
deram-se na Latin American Exhibition of Fine and Applied Arts e na Latin
7 Buenos Aires, Poseidon, 1945.
American Exhibition of Fine Arts, no Riverside Museum de Nova York, em 8 Intitulada Exposición deI Brasil en Chile,
1939 e 1940, respectivamente, patrocinadas pela United States New York em Valparaíso, onde foi patrocinada pela Câ-
World's Fair Commission. A primeira, com citações no Catálogo do presi- mara de Comércio Brasileiro-Chilena (11-22
dente Franklin D. Roosevelt, do secretário de Estado Henry A. Wallace e out.), e Exposición de Pintura Contempo-
de L.S. Rowe, diretor geral da Pan American Union, compreendia nume- ránea Brasilefia, em Santiago, com apresen-
tação no Instituto de Extensión de Artes
rosos e, em geral, obscuros artistas, mantendo-se praticamente só nos es- Plásticas da Universidad de Chile (12-30
treitos limites acadêmicos (participando, entretanto, membros do Núcleo nov.).
Bernardelli). A mostra foi alvo de comentários desfavoráveis em Nova York 9 O patrocínio foi da Associación Urugua-
e Mário de Andrade criticou-a duramente no artigo "Essa Paulista Família" ya de Professores de Idioma Português.

66

~
(O Estado de S. Paulo, 2 de julho de 1939). A segunda, introduzida por
Henry A. Wallace, contou com obras de Portinari e Maria Martins. Outras
participações brasileiras haviam-se dado na Feira Internacional de Paris, em
1937, na Exposição Internacional de Arte da Califórnia e, mais tarde, na
exposição dedicada à Art~ Contemporânea do Hemisfério Ocidental, or-
ganizada em Nova York, em 1941, pela International Business Machines
Corporation. Ainda em Nova York, num momento de euforia, em que se
passava a exibir a arte também fora de museus e galerias, realizou-se, em
1942, a mostra Paintings and Sculptures from Latin America, na Macy's La-
tin American Fair, tomando parte Tarsila, Guignard, Flávio de Carvalho,
10Organizaram a mostra itinerante o Con-
selho de Cooperação Latino-Americana e o Portinari, Pancetti, Burle Marx, Graciano, Rocha Miranda, Maria Martins,
Museu da Cranbrook Academy of Art, de Scliar, Bulcão, Percy -Deane, José Moraes, além de Georgina de Albuquer-
Bloomfield, Michigan. que, Henrique Cavaleiro, Pedro Corrêa de Araújo e Ignês Corrêa da Costa.
11 As introduções ao Catálogo são de Gra- Em ano posterior à guerra (1946), comprovava-se o interesse oficial exis-
ce L. McCann Morley e Edgar KaufmannJr.
12 A apresentação do Catálogo é de Ray- tente nos EUA pelos artistas da América do Sul, com a exposição de 65
mond Cogniat. desenhos de 44 artistas de nove países; a mostra percorreu museus de Kansas
13 De certames anuais, como o Salon des City, San Francisco, Nebraska, Cleveland e Boston, incluindo os brasilei-
Artistes Indépendants, Salon d'Automne e ros Segall, Tarsila, Portinari, Graciano e Oswald de Andrade Filho.10 Em
SaIon des Tuileries, participavam Vicente do 1947, as Knoedler Galleries promoveram a mostra An Exhibition of Pain-
Rego Monteiro, Victor Brecheret, Antônio
Gomide, Guignard e Anita Malfatti, tings and Drawings of Latin America, com Segall, Di Cavalcanti, Portinari,
registrando-se também exposições indivi- Graciano, Carlos Prado, Maria Martins, Edson Motta, Noêmia, Lucy Citti
duais, em galerias, de Rego Momeiro e Tar- Ferreira e Cardoso Júnior. \1 Ao final da década, em 1949, a Exposition
sila do Amaral. Em 1930 apresentaram mos- d'Oeuvres d'Artistes Latino-Americains, patrocinada pela UNESCO, em Paris,
tras pessoais no Foyer Brésilien pintores co- trazia participação brasileira de alguns nomes novos, como os de Antônio
mo Joaquim do Rego Monteiro, Hugo Ada-
mi, Waldemar da Costa, Manoel Santiago, Bandeira, Octávio Araújo, Enrico Camerini, Israel Pedrosa (1926) e Teresa
Gastão Worms e Portinari. Noutras cidades Nicolao, ao lado de Graciano, Scliar, Lucy Citti Ferreira, Frank Schaeffer
européias (e norte-americanas) ocorreram e Athos Bulcão.12
também apresentações como a de Osvaldo Mas em Paris, onde nossos artistas expunham desde os anos de 1920, jun-
Goeldi nas galerias Gute Kunst-Klipstein, de
Berna, e Wertheim, de Berlim (1930), e a de to ao grupo de latino-americanos ou em individuais,13 nunca aportou uma
Tarsila no Museu de Arte Moderna de Mos- grande mostra coletiva brasileira. Recorde-se que só a partir de 1950 o Brasil
cou (1931). começaria a se fazer representar na Bienal de Veneza.

67
VI Mudança, reiteração e af11TI1açãode rumo

Recorrências a fIgurações de antiga tradição européia ou as que a recupe-


ravam, o Impressionismo e Pós-Impressionismo de Cézanne e Van Gogh
e o Expressionismo fizeram parte da compósita absorção da arte do Brasil
na década de 1930 e ainda na seguinte, no olhar que se endereçava à reali-
dade concreta do País.
As preocupações sociais, aqui dominantes nos anos posteriores à Revolu-
ção de 1930, tornaram-se manifestas no mundo das Artes Plásticas - co-
mo ocorreu noutras áreas poéticas, por exemplo, na literatura, no teatro
e no cinema. Uma parte da crítica empenhava-se para que a mensagem dos
artistas deixasse a aura dos puros fenômenos estéticos e se comprometes-
se ideologicamente com os interesses das classes populares.
Pela via do Expressionismo ou das formas realistas, múltiplos artistas, de
mais de uma geração, davam atenção aos conteúdos proletários, que en-
volviam também os de atitude conservadora, como, em São Paulo, são os
casos, entre outros, de Henrique Manzo (1896-1982), José A. Ribeiro, AI-
berto Baroni, José Bersano e Silvio Nigri.1 Entretanto essa abordagem não
era a única. Houve outros universos plásticos naquelas décadas em que se
cruzavam os modernistas de 1920 e seus sucessores, tão independentes,
e em que se registra o aparecimento de nova leva de artistas, já na metade I Não obtivemos dados biográficos da
da década de 1940. maioria desses artistas.

68
-,

No novo tempo dos representantes do primeiro Modernismo havia por vezes


mudanças profundas. Anita Malfatti, depois dos anos vitais da etapa expres-
sionista (1915-16), afastara-se de sua posição de vanguarda. Na década de
1930, pintou retratos realistas e, nas cenas de festividade popular em pai-
sagens suburbanas e outros motivos, acercou-se dos membros mais jovens
da FAP. Tarsila, deixadas atrás as fases Pau-Brasil e Antropofágica, apegou-
se à pintura de apelo social, instigada pelo que viu na União Soviética, quan-
do de visita em 1931. Foi sem evolução de linguagem que realizou, em 1933,
telas como Operários e 2 ~ Classe. Vicente do Rego Monteiro, em seguida
aos anos parisienses de 1920 - os melhores de sua carreira -, de volta
a Pernambuco entregou-se a vários ipteresses, entre eles o cinema e a poe-
sia, ingressando numa etapa de escassa produção, em que aparecem assuntos
regionalistas. Permaneciam elementos cubistas e surrealistas nesse pintor
que se reencontrava com o meio nordestino.
Não houve, por sua vez, solução de continuidade na obra de Lasar Segall
e Di Cavalcanti. Na década de 1920, este último assimilara Cubismo e Ex-
pressionismo, depois de sofrer a influência do Art Nouveau. Avizinhara-se
de Picasso e nos anos de 1930 foi sensível ao Surrealismo. Não raros dese-
nhos e ilustrações do artista, que se iniciara pela caricatura, aplicam-se nu-
ma temática de denúncia social ou ironizam as classes dominantes,2 mas
o que prevalece em sua obra é a visão decorativa e sensual motivada pela
tropicalidade carioca. Segall reiterava os conteúdos humanos de seu Ex-
pressionismo judaico-alemão, ligado à Nova Objetividade. Dedicou-se a com-
posições dramáticas, como Navio de Emigrantes e Pogrom, a representa-
ções de guerra, pintando, ao mesmo tempo, a nostálgica série de paisagens
de Campos do Jordão. A interioridade de seu mundo plástico e o resguar-
do da vivência aristocrática não favoreciam a formação de alunos. Mesmo
assim, Segall serviu de paradigma profissional a artistas mais jovens e reve-
lou capacidade de liderança no importante empreendimento que foi a SPAM.
O gravador e desenhista Osvaldo Goeldi, espiritual e esteticamente ligado
a Auguste Kubin e admirador de Edvard Munch (1863-1944), desenvolvia
no período imagens de homens e animais, paisagens e casas solitárias, em
atmosferas fantasmáticas de vazios e silêncios, impregnadas de luz notur-
na. Não menos que o Expressionismo de Goeldi, o Surrealismo da perso-
nalidade igualmente solitária de Ismael Nery permaneceu fiel, nas grandes
linhas, ao sentido internacional da tendência, depois que se empolgara por
Chagall, em fins dos anos de 1920.
Na área da escultura, Victor Brecheret readaptava-se ao Brasil, em 1936,
2 Como as constantes do álbum A Realida- após longa temporada em Paris e uma evolução marcada por Brancusi, pe-
de Brasileira, de 1930. lo Cubismo e pela estilização Art Déco. Retomou o antigo projeto do Mo-

69
numento às Bandeiras, cujo porte é exemplo único na história da estatuá-
ria moderna no Brasil. Construiu-o com o sentido depurado das formas
e da concepção global. Empregou-se, ao mesmo tempo, em outras obras,
guardando fidelidade aos materiais tradicionais, influenciado também pela
abstração, sem abandonar as formas orgânicas. A temática índia foi-lhe cam-
po fértil de exploração. Por vezes cedeu às vontades oficiais. Outro escul-
tor, revelado ainda na década de 1920, Celso Antônio, formado na França
junto a Bourdelle e atraído pela monumentalidade da estatuária egípcia,
com rigor e espírito de síntese, elaborou na pedra, no bronze e em outros
materiais uma figuração atraída pelos caracteres antropológicos do negro
e do mulato.
Enquanto essa primeira geração de modernistas mantinha ou mudava prin-
cípios estéticos da fase anterior, os mais jovens provocavam com decisão
outro andamento para a arte, recorrendo a estímulos da existência diária
e a uma imagética que aproveita elementos da tradição. Emerge, então, a
figura de Portinari (1903-62), de faixa etária próxima à de seus antecesso-
res modernistas (Di Cavalcanti é de 1897; Rego Monteiro, de 1899; Ismael
Nery, de 1900), mas que, vindo de outro nível social- o do proletariado
imigrante -, trará, a exemplo de toda uma série de artistas dessa origem,
uma visão nova da realidade. Submisso ao autoritarismo da ENBA,seus dotes
revelaram-se depois da viagem à Europa, em 1928-30 (como premiado do
Salão Nacional), ocasião em que descobre a Escola de Paris e desfruta do
conhecimento da arte do Primeiro Renascimento na Itália. Possuidor de
dotes técnicos e expressivos, que conjugam o desenho táctil e aplicado a
uma paleta vibrante, o pintor de Brodósqui impõe-se pela construtividade
ampla das formas e sua articulação no espaço. Tematicamente é a matéria
social, dirigida à representação do trabalho físico,3 que está no centro de
suas preocupações, nele repercutindo o exemplo da pintura mexicana, to-
davia absorvida por uma vitalidade fleugmática que não se curva à ilustra-
ção política.
Nas dimensões da tela já era evidente a vocação do muralista, como se con-
firmou nas pinturas do MEC (1936-44), do Monumento Rodoviário da via
Dutra (1936) ou da sala da Fundação Hispânica da Biblioteca do Congresso
de Washington (1941-42). Note-se que o fundo c1assicista que o regia nos
anos de 1930 desviou-se em meados do decênio seguinte para o Expres-
sionismo captado em Picasso, quando realizou as explosivas cenas
nordestinas.
Deve-se em muito a ele o alargamento difícil do entendimento da arte mo- 3 Ver Fabris, Annateresa, Portinari, Pintor
derna junto à opinião pública brasileira, menos incrédula depois que seu Social, São Paulo, Escola de Comunicações
quadro Café, de 1934, recebeu prêmio nos Estados Unidos. Cercado de e Artes, USP, 1977.

70

L
entusiasmos radicais, mas também alvo de críticas severas (polêmica do por-
tinarismo versus antiportinarismo), acusado de ligação ideológica com O
EStado Novo, o pintor, na verdade, soube permanecer intransigentemente
leal às próprias razões plásticas. Sua obra, de constantes qualidades explo-
ratórias, responde ao contexto físico, social e cultural brasileiro e é, ao mes-
mo tempo, de uma indiscutível consciência universal.
Se o empenho por uma arte socialmente engajada às vezes atraiu Di Caval-
canti, coube a Portinari - que preparou discípulos e influiu na geração
ascendente a que pertencia, de forma tanto específica como generalizada
- elaborar todo um repertório estilístico de cenários, posturas e gestos
proletários.
O proletarismo teve, entretanto, não raras claves pessoais, como a do gra-
vador Lívio Abramo e, no caso dos pintores do Grupo Santa Helena, uma
expressão solidária exemplar nos anais da arte moderna no Brasil. Esse uni-
verso imagístico do social, que assinalou fortemente as décadas de 1930
e 1940, contrastava com o Expressionismo existencial de Segall, Goeldi
ou Flávio de Carvalho ou, ainda, com a visualidade onírica de Guignard
e Cícero Dias, com o dourado tropicalismo de Di Cavalcanti e com a ver-
são telúrica da cultura popular que nos deram Antônio Gomide em São
Paulo e Lula Cardoso Ayres (1910-87) em Pernambuco. Para a caracteriza-
ção desse período foi também das mais significativas a pesquisa dos valo-
res intrinsecamente plásticos da obra eje arte, como comprova o espírito
que motivou o aparecimento do Núcleo Bernardelli e dos atelieres super-
visionados por Portinari e outros artistas e que deu base à Escola de São
Paulo e seus pintores operários.

71
VII A expansão da arte em vários Estados

Se nas décadas de 1930 e 1940 Rio e São Paulo mantiveram-se como os


principais pólos artísticos do País, algumas capitais regionais, não raro sub-
metidas ã influência de escolas oficiais que seguiam o modelo de ensino
da ENBA, começaram a superar a morosidade anterior. Ali também surgi-
ram associações, promoveram-se salões, editaram-se revistas culturais -
todos elementos que contribuíram para uma visível transformação do meio.
A isso, além das viagens de artistas e outros fatores de divulgação do Mo-
dernismo, devemos acrescentar a presença de exposições, mesmo se es-
parsas, enviadas pelas duas metrópoles. Um dos primeiros eventos desse
tipo ocorreu graças a Waldemar da Costa, que em 1937 levou a Fortaleza
e Belém um conjunto de obras de São Paulo. Em 1940, entusiasmado com
a nova pintura paulista - de que fez parte por algum tempo e sobre a qual
também escreveu -, Carlos Scliar patrocinou, em Porto Alegre, uma mos-
tra embutida no Salão d6 Instituto de Belas-Artes. Em 1944 - ano em que
Juscelino Kubitschek, prefeito de Belo Horizonte, atraía Guignard e pro-
movia na capital mineira a arte moderna de Sãp Paulo e Rio -, o pintor
e gravador Manoel Martins transportava a Salvador uma seleção de traba-
lhos de artistas das duas capitais. Já em época mais tardia, Marques Rebelo
preparou uma circulante, com predominância de peças gráficas, que per-
correu, entre 1947 e 1950, as cidades de Porto Alegre, Salvador, Florianó-
polis, Belo Horizonte e Resende. Participavam obras de brasileiros e es-
trangeiros, várias de suá coleção particular. O trabalho do contista cario-

72
ca, interessado pelas Artes Plásticas, resultaria em embriões de museus, de
certa importância para a agilização da cultura em centros mais distantes.
Um deles é o Museu de Arte Moderna de Florianópolis, fundado em abril
de 1949.1 A Circulante de Arte organizada em São Paulo em abril de 1947
e a mostra de Marques Rebelo, que encetou viagem a Porto Alegre em ou-
tubro do mesmo ano, precedidas pelas iniciativas de Heuberger, Walde-
mar da Costa e Scliar, configuram um tipo de ação cultural e educacional
ainda hoje pouco desenvolvido no Brasil,2 Em Minas Gerais, onde a ex-
posição de Zina Aita (1900-68), em 1920, representara o primeiro (e isola-
do) impulso de modernidade artística no Estado, registram-se espaçados
1 AQUINO,Flávio de, "Um Museu em Flo- esforços de renovação do ambiente, enrustido e apegado à rotina. Abriram-se
rianópolis", Diário de Notícias, Rio de Ja- perspectivas na Escola de Arquitetura, fundada em 1930, e em Belo Hori-
neiro, 24 abro 1949. Ver Espelho Carioca- zonte apareceram edificações de novo curso.3 Arregimentados, sob a lide-
Memória de Marques Rebelo, Rio de Janei- rança de Delpino Júnior, os artistas organizaram em 1936 a Exposição de
ro, Rio Arte/Fundação Casa de Rui Barbo- Arte Moderna, ou Salão do Bar Brasil, a primeira manifestação do gênero
sa, 1984.
2 Entre os artistas nacionais selecionados na capital mineira. Concorreram à mostra, entre outros, além de Delpino
por Marques Rebelo achavam-se Di Caval- Júnior, Genesco Murta (1885-1966), Renato de Lima (1898-1978), Jeanne
canti, Segall, Tarsila (etc.). Milde (1900) e Fernando Pierucetti (1910). Como conseqüência, fizeram-
3 VASCONCELLOS, Sylvio de, "A_Família se dois salões, oficializados pela prefeitura, em 1938 e 1939. O movimen-
Mineira e a Arquitetura Contemporânea", in to foi apoiado por intelectuais como J. Guimarães Menegale e José Carlo~
Noções sobre a Arquitetura,' 2. ed., Belo Ho-
rizonte, Escola de Arquitetura da UFMG, pp.
Lisboa e pelo político José Osvaldo de Araújo.4
29-31, 1963. Ver MELLO, Suzy de, Arqui-
tetura Moderna em Minas Gerais, II Semi-
A esses fatos sucederam-se outros, no decênio seguinte, que marcam o ápice
nário sobre a Cultura Mineira (Período Con-
temporâneo), Conselho Estadual de Cultu- da longa introdução do Modernismo em Minas Gerais. Coube a Juscelino
ra de Minas Gerais, Belo Horizonte, p. 44, Kubitschek, quando prefeito de Belo Horizonte (1940-45), propiciar con-
1930. Note-se que em 1928 Carlos Drum- dições mais favoráveis para a evolução da arte moderna, juntamente com
mond de Andrade comentara favoravelmen- seu projeto de desenvolvimento industrial da capital. Deve-se a ele a orga-
te o projeto de Flávio de Carvalho para a nização da Pampulha, conjunto arquitetõnico e paisagístico a que se inte-
Universidade de Minas Gerais (cf. o pesqui-
sador Rui Moreira Leite, Flávio de Carva- gram a pintura e a escultura. O antecedente direto dessa grande empresa
lho, Catálogo de Exposição de Flávio de Car- é, como vimos, o edificiodo Ministério da Educação. Na Pampulhaj repete-se
valho, XVII Bienal de São Paulo, São Pau- a presença conjunta de Niemeyer, Portinari e Burle Marx e a do pintor nas
lo, pp. 47 e 55, 1983). decorações da Igreja de São Francisco. Participaram também do programa
4 VIEIRA, Ivone Luzia, Escola Guignard, os escultores August Zamoyski e Ceschiatti e o pintor Paulo Werneck, com
40 Anos: Sua Significação na Cultura Mi-
neira, Belo Horizonte, p. 5, 1985. mosaicos. Do governo Kubitschek partiu, ainda, o convite para Guignard
5 Idem, ibidem, p. 37, sego dirigir o Curso Livre de Desenho e Pintura no Instituto de Belas~Artes da
6 Guignard fora inicialmente assistido pela Prefeitura, criado em fevereiro de 1944. Ao ensinamento de Guignard-
gravadora Edith Behring e pelo escultor cujo curso se tornaria particular em 1946, transformando-se na Escola
Franz Weissmann. Com o mestre fluminense
Guignard5 - deve-se a formação de vários artistas que ocupariam a me-
estudaram muitos outros artistas mais jo-
,:ens, como Yara Tupinambá (1931), Sara lhor cena mineira, como Mário Silésio (1913), Amilcar de Castro (1920),
Avila (1932), Wilma Martins (1934), Álvaro Maria Helena Andrés (1922), Marília Giannetti (1925), Farnese Andrade
Apocalipse (1937). (1926), Mat;y Vieira (1927) e Chanina L. Szejnbejn (1927).6 Segundo Mary

73
Vieira, "o apoio de um grupo de intelectuais mineiros à arte moderna foi
decisivo para a consolidação da Escola Guignard. Dentre eles cito: üuo
Lara Rezende, Emílio Moura, Fernando Sabino, Hélio Pellegrino, J. Mene-
gale, Murilo Mendes, Murilo Rubião, Paulo Mendes Campos, Wilson de Fi-
gueiredo, Jacques do Prado Brandão, Sylvio de Vasconcellos, Bernardino
Franz de Lima, José Israel Vargas (...). A casa de Antonio Joaquim de Almei-
da e Lúcia Machado de Almeida era nosso ponto de encontro preferido,
onde se discutiam a necessidade e a urgência de uma renovação artística
e social na capital do Estado (...). A geração artística da década de 40 em
Minas determinou a morte definitiva do Academismo (...), essa geração per-
mitiu a Minas dialogar com voz autônQma com o (...) Brasil e também com
a Europa (...)"7
A Exposição de Arte Moderna foi outra contribuição corajosa e de vulto
ensejada pelo prefeito liberal. 8 Realizada em 1944 no Edifício Mariana, a
ela compareceram artistas do primeiro Modernismo - Anita Malfatti, Di
Cavalcanti, Tarsila, Segall, Goeldi, Guignard - ao lado de Portinari, Paulo
Rossi Osir, Pancetti, Burle Marx, Quirino Campofiorito, Lívio Abramo, Santa
Rosa, Hilda Campofiorito, Quirino da Silva, Waldermar da Costa, Oswald
de Andrade Filho, Iberê Camargo, Poty, José Moraes, Rubens Cassa, Mil-
ton Dacosta, A1cides da Rocha Miranda, Percy Lau, Percy Deane, Enrico
Bianco (1918), Lucy Citti Ferreira, Mário Levi, Djanira, AugustO Rodrigues,
HeitOr dos Prazeres, Alfredo Volpi, Clóvis Graciano, Mário Zanini, Rebolo
Gonsales, Manoel Martins, Carlos Scliar, Hilde Weber, Noêmia Mourão, Mar-
ta Loutsch, Hans Etz, Fernando Fam e A. Toledo. Foi esta uma das primei-
ras mostras do País a reunir a maioria dos principais artistas modernos. A
exposição provocou também a aproximação a Minas de artistas e intelec-
tuais de São Paulo e do Rio (chegados em caravana); entre eles, figuravam
os artistas plásticos Anita Malfatti, Paulo Rossi Osir, Graciano, Rebolo, Volpi,
Zanini, Waldemar da Costa, Quirino da Silva, Djanira, Milton Dacosta, poty
e os intelectuais Oswald de Andrade, Sérgio Milliet, Caio Prado Júnior, Jo-
sé Lins do Rego, Millôr Fernandes (1924), Jorge Amado, Décio de Almeida
Prado, Paulo Emílio Salles Gomes, Alfredo Mesquita e Lourival Gomes
Machado.
Houve uma reação negativa: a já referida dilaceração de telas de Milton Da- 7 Depoimento de Mary Vieira a Ivone Lui-
costa e José Moraes, ao que parece obra de um só indivíduo. Prevalece- za Vieira (Escola Guignard, p. 64, nota 84).
ram, porém', os fatos positivos, que reverteram para a melhor compreen- 8 Idem, pp. 23-5. Sobre a exposição ver
são do Modernismo no ainda bastante conservador meio montanhês. Sem SANTOS, Cristina Ávila, "Modernismo em
Minas - Literatura e Artes Plásticas: um Pa-
considerar antecedentes, afirma Menegale no Catálogo: radoxo, uma Questão em Aberto", in Aná-
lise & Conjuntura, Belo Horizonte, Funda-
Vale a pena prevenir a objeção de que, a despeito de tudo, Minas ainda não con- ção João Pinheiro, (1): 179-89, 194, jan.labr.
tribuiu para o movimento modernista. São óbvias as razões. Minas não alcançou, 1986.

74
ainda, o grau de densidade econômica propícia ao florescimento das belas-artes.
Estado agrário e pastoril, geograficamente disperso, só agora começa a ossificar-se
na constituição das cidades grandes; e só as grandes cidades possibilitam o rendi-
mento do trabalho artístico, já pelo estímulo econômico, já pelas oportunidades
didáticas. Em qualquer hipótese, ainda que Minas contasse com a alvoroçada agi-
tação de um colmeial artístico, o movimento moderno a contagiaria devagar, atra-
vessando montanhas, detendo-se na filtragem do temperam~nto morno e refratá-
rio dos mineiros... E aquela contribuição viria (como, a seu tempo, virá), mais re-
fletida, bem dosada e bem 5egura. De mais a mais, agora é que Minas começa "a
ver". A Exposição de Arte Moderna - acontecimento nacional - será, para mui-
ta gente, um choque, um escândalo, e, na realidade, será, para Minas, a revelação
que precede a catequese. Logo que os mineiros acomodarem o aparelho ótico a
essa nova forma de interpretar e exprimir a natureza, o humano e o social, sua
sensibilidade reagirá - e teremos o que contar.

o Rio Grande do Sul é outro Estado que começa a suplantar tardiamente,


no término dos anos de 1930, antigas carências de uma arte estagnada que
espelha com vigor a ideologia de suas classes dominantes. Entre os fatores
que concorreram para a mutação dessa mentalidade, que desde a primeira
década do século tinha como fulcro o Instituto de Belas-Artes, estava a atua-
ção de Carlos Scliar e do escritor Manoelito de Ornellas, diretor do Depar-
tamento Estadual de Imprensa e Propaganda (DEIP).9 Scliar juntou a sua
atividade de pintor a de animador cultural e, procurando romper corp os
males do isolacionismo, foi o responsável pelo crescente intercâmbio de
arte entre o Estado sulino e outras partes do País. Freqüentador dos meios
de São Paulo e Rio, teve, como já se referiu, a iniciativa de levar a Porto
Alegre, para apresentação no Salão de Belas-Artes do Rio Grande do Sul
de 1940, uma exposição paulista composta por Anita Malfatti, Flávio de
9 Consultar SCARINCI, Carlos, A Gravura
Carvalho, Arnaldo Barbosa, Oswald de Andrade Filho, Bonadei, Clóvis Gra-
no Rio Grande do Sul 1900-1980, Porto ciano, Manoel Martins, Rebolo, Humberto Rosa, Franco Cenni, pennacchi,
Alegre, Mercado Aberto - Ed. Propaganda, Zanini, Volpi, Lívio Abramo, Lucy Citti Ferreira, Renée Lefevre, Nélson Nó-
pp. 68-9, 1982, e KERN, Maria Lúcia Bastos, brega, Tereza D'Amico (1914-65), Joaquim Lopes Figueira, Angelo Simeo-
Os Sistemas Visuais e Ideologias no Rio ne, Madeleine Roux e Bruno Giorgi.1o Despontava então no Sul um valor
Grande do Sul, comunicação apresentada
ao Colóquio de História da Arte do Comitê como Iberê Camargo. Ornellas trouxe apoio aos artistas que renovavam
Brasileiro de História da Arte, Mariana, out. o ambiente, onde o embate entre conservadores e modernos exprimiu-se,
1986. em 1942, por autêntico coup de théâtre.11 No estudo do movimento lo-
10 SCARINCI, Carlos, op. cit., p. 63, e d. cal, é necessário considerar a criação da Associação Rio-Grandense de Ar-
dados do arquivo de Clóvis Graciano. tistas Plásticos em 1938 e o desempenho da Revista do Globo. Em 1945,
11 Trata-se do pseudo "Salão Moderno", na cidade periférica de Bajé, José Moraes, chegado do Rio, dava formação
organizado pelos acadêmicos com a inten-
ção de ridicularizar os artistas sensíveis aos a um núcleo de artistas, composto entre outros por Glênio Bianchetti (1928)
novos problemas plásticos. Ver a respeito e Glauco Rodrigues (1929). Já em 1950, floresceu em Porto Alegre o Clubé
SCARINCI, Carlos, op. cit., pp. 68-70. de Gravura, engajado social e politicamente, o que resultou em Realismo

75
e Expressionismo regionalistas. Pela gravura é que se daria, em termos co-
letivos, o melhor da participação gaúcha à arte brasileira do período.
Em Recife, a década de 1930, inaugurada com a vinda da delegação da Es-
cola de Paris, mostrou a atividade de alguns artistas de excelente nível. Além
de Vicente do Rego Monteiro - embora motivado por outros afazeres, co-
mo a co-direção da revista Renovação, entre fins de 1930 e os primeiros
anos de 1940 -, registrem-se os nomes de Joaquim Cardozo (1897-1978)
e Manuel Bandeira (1900-64). Outro pernambucano, Cícero Dias, deslocara-
se para o Rio, onde cursou a ENBA, na segunda metade dos anos de 1920.
Artista afim ao Surrealismo e sugestionado pela vida popular é desde então
Lula Cardoso Ayres. Mencione-se o atelier do jovem percy Lau, no início
da década de 1930, e o aparecimento de um desenhista, Augusto Rodri-
gues, organizador, em 1934, da primeira exposição de arte moderna local.
MuitO mais tarde, em 1948, o escultor realista Abelardo da Hora (1924),
ajudado pelo pintor Heitor Feijó (1913), criava a Sociedade de Arte Moder-
na, matriz do Atelier Coletivo, aberto em 1952, testemunho do espírito de
união existente entre artistas de origem pobre.12 Na capital pernambuca-
na tomaria vulto, nesses núcleos, um Realismo aferrado às condições cul-
turais do ambiente.
Data de 1941 a Sociedade Cearense de Artes Plásticas, ligada a figuras lite-
rárias que formavam o Grupo Clã, de Fortaleza, promotora do Salão de Abril,
embrião da Escola de Belas-Artes. Contribuiu a entidade para a tardia afir-
mação da arte moderna no Estado. Registramos a mostra de artistas paulis-
tas, coordenada por Waldemar da Costa, ali apresentada em 1937. Os ar-
tistas mais antigos, como Mário Baratta e Clidenor Capibaribe (Barrica) (1913)
e Jean Pierre Chabloz (1910), eram sucedidos por Inimá de P~ula (1918),
Antônio Bandeira (1922-67) e Aldemir Martins, que deixariam Fortaleza à 12Sobre a Sociedade de Arte Moderna do
procura de ambientes mais centrais. Os três últimos, como outros, fariam Recife ver depoimento de Abelardo da Ho-
sua primeira exposição no Rio sob os auspícios da Galeria Askanazy.13 ra, in CLÁUDIO, José, Memória do Atelier
Coletivo (Recife 1952-1957), São Paulo, Edi-
Na Bahia, sede de uma Escola de Belas-Artes fundada no século XIX, o mo- ção Artespaço, Renato Magalhães Gouvêa,
vimento de renovação apoiou-se na Associação das Letras e das Artes (ALA), Escritório de Arte, p. 31 e segs., 1978.
instituída em 1936 por Carlos Chiacchio e outros, promotora de um salão 13Cf. depoimento de Antônio Bento à pes-
quisadora Cacilda Teixeira da Costa, Rio de
de treze edições, entre 1937 e 1949. Antes, em 1932, o pintor José T. Gui- Janeiro, 7 novo 1980.
marães (1899-1969), ex-aluno da Academia Julian, de Paris, influenciado 14O velho mestre de naturezas-mortas Pe-
por Cézanne, realizara uma exposição solitária, patrocinada pelo jornal A dro Alexandrino (1865-1942) e outros pin-
Tarde e mal acolhida pelos artistas. Em 1935 chegou a Salvador a mostra tores e escultores acadêmicos, como Oscar
bandeirante integrada na Feira Interestadual de Amostras da Bahia. Intitu- Pereira da Silva, TuBo Mugnaini, Gino Bru-
no, Theodoro Braga, Vicente Larocca e João
Iada Salão de Arte Paulista, dela constavam Anita Malfatti, Nélson Nóbrega, Batista Ferri (1896-1978) (d. "Arte Paulista
Gastão Worms, Aldo Bonadei e Renée Lefevre, assim como artistas acadê- na Bahia", Folha da Manhã, São Paulo, 18
micosY' Mais tarde, em 1944, o pintor e gravador santelenista Manoel Mar- jan. 1935).

76
tins para ali levou uma exposição de maior amplitude, com cerca de cem
obras, incluindo Segall, Di Cavalcanti, Goeldi, Flávio de Carvalho, Porti-
nari, Pancetti, Cícero Dias, Manoel Martins, Clóvis Graciano, Takaoka, Au-
gusto Rodrigues, Walter Lewy e Cados Scliar, entre outros. Recebida com
desprezo pela imprensa provinciana, tornou-se referência obrigatória para
explicar a evolução local das artes. Nesse mesmo ano, os novos Mário Cra-
vo Júnior (1923), Cados Frederico Bastos (1925) e Genaro Antônio de Car-
valho (1926-71) uniram-se para uma exposição influente nos rumos artísti-
cos baianos.15
Bem tardia seria também a abertura para as novas idéias em outras capitais,
c.omo Belém. Entretanto, no Sul do País, além de Porto Alegre, a luta pela
modernidade atingia Curitiba, graças sobretudo ao artista imigrante Guido
Viaro, ali radicado desde 1930, que se distingue por bons recursos artesa-
15 Ver CALDERON, Valentin, "Evolução nais e expressivos, além de uma dedicação ao ensino que marcou a evolu-
das Artes Plásticas na Bahia (1912-1974)", ção do Paraná. A revista Joaquim, fundada em 1946, é dos elementos de
A Tarde, Salvador, I? mar. 1975. ponta na vida cultural do Estado naquela época.

77
VIII Aspectos da crítica de arte

A crítica de arte do Modernismo, bastante incipiente nos anos anteriores


à década de 1930 e restrita a poucos nomes, emersos da literatura e do jor-
nalismo, adquiriu maior consistência nos dois decênios seguintes. Alguns
autores demonstravam melhor preparo e profundidade de conceitos, no
crescente número dos que a exerciam, geralmente procedentes daquelas
mesmas fontes culturais. O que equivale a dizer que perseverava sua con-
dição autodidata. São valiosos, a esse respeito, depoimentos como os de
Geraldo Ferraz e Luís Martins, revelando a forma improvisada de sua
iniciação.!
Acreditamos que é possível tirar algumas conclusões pertinentes sobre o
que se pensava da crítica, no que concerne aos anos de 1930, através da
opinião de um artista experiente da época. Afirma a pintora (e também es-
critora) Tarsila do Amaral, em trechos de uma conferência no III Salão de
Maio, publicados na imprensa,2 que:
em geral, quem comenta as obras de pintura é o intelectual amigos dos pintores
(...). Embora inteligentes e dotados de boa vontade, isso não basta. Por outro la- J Ver FERRAZ, Geraldo, Depois de Tudo:
do, não temos galeriasnem museus, nem possuímos grande número de obras cé- Memórias, Rio de Janeiro, Paz e Terra, pp.
lebres. Muitosdos nossos escritores que assinam críticas nada lêem sobre pintura, 26-7,1983, e MARTINS, Luís, Um Bom Su-
não compram revistasespecializadas,nem possuem álbuns. Suaspreocupações in- jeito: Mémorias, Rio de Janeiro, Paz e Ter-
telectuais são outras. As artes plásticas são, para eles, "mero passatempo". ra, p. 98, 1983.
2 "A Arte e a Crítica", O Estado de S. Pau-
Refletindo uma opinião certamente comum, cita Mário de Andrade como lo, São Paulo, 30 jul. 1939 (recorte cedido
"nosso melhor crítico musical e um dos melhores das artes plásticas", mas pelo pesquisador Rui Moreira Leite).

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faz restrições a seu conhecimento de pintura. Menciona Anibal Machado,
Luís Martins, Geraldo Ferraz, Paulo Mendes de Almeida e Sérgio Milliet,
considerando que este último (militante na crítica desde 1938) leva' 'apre-
ciável vantagem sobre os demais", "por ter sido educado na Europa". Diante
de um quadro que tão pouco a entusiasma, termina por sugerir aos artistas
que escrevam eles mesmos sobre arte, tomando o pintor e cenógrafo To-
más Santa Rosa como exemplo.
As referências de Tarsila dizem respeito. sobretudo a São Paulo, porém de
há muito eram também nomes da crítica Celso Kelly e Quirino Campofio-
rito, ambos igualmente pintores. Desde 1933 destacava-se Mário Pedrosa,
durante algum tempo radicado em São Paulo, depois de sua estada na
Alemanha.

o crescente círculo de críticos assíduos ou de aparições esporádicas, nes-


se decênio e no seguinte, incluía ainda Menotti deI Picchia, Osório César,
Peregrino Júnior, Henrique Pongetti, Quirino da Silva, Frederico Barata,
Lelio Landucci, Antônio Bento, João Ferreira, Mozart Firmeza, Arsênio Pa-
lácio, Virgílio Maurício, Jorge Amado, Rubem Braga, Manoelito de Ornel-
Ias,]. Guimarães Menegale, Ruben Navarra (Rubens de Agra Saldanha), Carlos
Cavalcanti, Carlos Scliar, Gonçalo Simões, Brito13roca, Lourival Gomes Ma-
chado, Maria Eugênia Franco, eiro Mendes, Mário Schenberg, Flávio de
Aquino, Carlos Pinto Alves, Franco Cenni, Sílvia Chalreo, Mário Barata, Ama-
deu Mendes, Ibiapaba Martins, Luís Washington, Flávio Motta, entre ou-
tros. Um homem de teatro, Alfredo Mesquita, exerceu a crítica de arte por
breve tempo, em fins dos anos de 1930, substituindo Nestor Pestana em
o Estado de S. Paulo. Embora de outro caráter, cite-se a contribuição aos
estudos de arte trazida pelas aulas e'textos de Claude Lévi-Strauss, Jean Mau-
güé e Roger Bastide, professores da USP,3 e de Hannah Levy Deinhard, no
Rio.4 A estudiosa Giuliana Segre Giorgi também trouxe sua colaboração,
assim como o pintor e intelectual Antonio Pedro, em suas passagens pelo
Brasil. Entre os diversificados textos de Ernesto de Fiori, inclusive envia-
dos ao Exterior, não fa]tam os que se referem à arte. Em geral, a crítica
assumia comprimisso com a arte moderna, mas cabe registrar posições con-
servadoras, como as de Flexa Ribeiro, Carlos Rubens no Rio, Aníbal Matos
(1889-1969), em Minas, e Angelo Guido (1893-1969), no Rio Grand{; do
3 Consultar MELLO E SOUZA, Gilda de, "A Sul. Das mais reacionárias mostrou-se, por sua vez, a atuação de Carlos Maul
Estética Rica e a Estética Pobre dos Profes- nos jornais Correio da Manhã e A Noite, no Rio. Na crítica de que aqui
sores Franceses", Discurso, São Paulo, sobretudo se trata era obviamente primacial a sustentação da luta contra
9:9-30, novo 1978.
4 BARATA, Mário, "Hannah Levy Dei- a arte acadêmica, ou seja, a tudo o que dizia respeito às escolásticas con-
nhard", jornal do Comércio, Rio de Janei- cessões naturalísticas. No Rio, Celso Kelly, Quirino Campofiorito, Ruben
ro, 5 abro 1986. Navarra, entre outros, escreveram em oposição ao ensino professado na

79
ENBA. Esta postura é também a de Anibal Machado e de poetas como Ma-
nuel Bandeira, Murilo Mendes e Vinícius de Moraes. Outros compromis-
sos diziam respeitO à expressão de dados culturais de identificação com
o País e à arte social. Observe-se que o sociólogo Gilberto Freyre referia-se
a artistas desde os anos de 1920, quando assinalava a obra de Vicente do
Rego Monteiro e tratava da pintura do Nordeste em livro de 1925, citando
a arte muralista do México.5 Nas múltiplas atividades de Flávio de Carva-
lho não faltam textos especulativos ou polêmicos sobre a matéria artística,
a partir de fim dos anos de 1920 e sobretudo depois de 1935.6
A pressão dos acontecimentos sociais, provocou mudanças por vezes sen-
síveis na conduta de artistas e intelectuais. As coerções do governo instala-
do em 1930 e a ditadura de 1937 arregimentavam os espíritos para a defe-
sa da liberdade na arte.
Desde o começo da década de 1930 disseminavam-se as idéias de estudio-
sos de Marx, analisadas e debatidas com conseqüências nas concepções do
realismo artístico que se desejava concorde com o ideário de construção
da nova sociedade socialista. Foi o momento em que na União Soviética
a arte passou a angular-se por critérios de redução ideológica. Enfatizava-
se a luta pela existência da classe proletária, embora não faltassem os que,
como principalmente Lunarcharski, propusessem maior flexibilidade de con-
teúdo e expressão. Tal utilitarismo da arte alcançava o Brasil, tornando-se
Georges Plekhanov um dos intérpretes do pensamento marxista, se não
dos mais estudados ao menos dos mais citados.7
Em parte, a propensão entre nós, como já foi dito, era a de encampar o
assunto realista de denúncia social, com críticos envolvidos nessa direção.
Nestes breves reparos, cabe assinalar que Mário de Andrade, um dos pala-
dinos da Semana de Arte Moderna, sempre ativo na crítica, trazendo apoio
à jovem geração, deixava princípios estéticos anteriores e aderia às finali-
dades da arte socialmente motivada. Vários são QStextos em que demons-
tra a nova orientação, desde a apresentação da I Exposição de Arte Mo-
derna da SPAM, em abril de 1933, onde afirma: "O que realmente faz falta 5 Catálogo da Exposição Vicente do Rego
em nossa pintura spamista são criadores de ordem social. É uma falha sen- Monteiro, realizada pelo MAC-USP,São Pau-
sível essa ausência de arte social entre nós, a não ser que compreendamos lo, 1971. Ver BARATA, Mário, Dados sobre
a Presença da Arte Social Mexicana
como talo diletantismo estético, caracterizadamente burguês, em que per- (Pós-1922) no Brasil dos Anos 20 aos 50
sistimos". Em artigos e ensaios que se estendem até o final de sua existên-
Comunicação ao Colóquio do Instituto de
cia (1945), o crítico bandeirante exprime essa idéia, a exemplo do texto Investigaciones EStéticas da Universidade
sobre Portinari, de 1939, da carta a um "jovem pintor", de 11 de junho Nacional Autónoma de México, jun. 1985.
de 1942, da conferência de expiação de 1942 e do ensaio póstumo sobre 6 Cf. pesquisas em andamento de Rui Mo'
Clóvis Graciano, de 1944. reira Leite.
7 Ver, a propósito, entre outros autores,
Em Sérgio Milliet há decidida preocupação com a função social da arte. FERRAZ, Geraldo, op. cit., p. 103, 1983.

80
--
Socialista liberal e intelectual de vigorosa formação humanista, obtida em
longos anos de estudo e vivência na Suíça, de uma cultura pluridisciplinar
que incluía as Ciências Econômicas, a Sociologia, a Literatura, a Estética
e as Artes Plásticas, a que acrescentou sempre novos conhecimentos vin-
do de discreta participação no Modernismo de 1922, desempenhou papel
central na crítica paulista, a partir do final dos anos de 1930, tornando-a,
sobretudo, um instrumento transparente para aproximar artistas e públi-
co. Contrário a critérios extremistas de julgamento, como avesso aos mo-
vimentos artísticos absolutistas, defendeu "a liberdade para o artista ex-
plorar O assunto que mais o comova". 8 Dono de um estilo fluente e colo-
quial, estendeu-se na análise dos elementos estruturais e expressivos da obra
de arte, realçando a importância do tema, relegado pelas tendências anti-
narrativas da arte moderna. Desejava, substancialmente, uma arte de alcance
público.9 Esperava que a pintura, "em suas manifestações mais jovens",
evoluísse "para o grande assunto social", 10 tomando como exemplo a ar-
te mural por onde "se dizem ao povo coisas importantes e de um modo
acessível" e onde há a representação de "um sentir geral, uma ambição
comum, preocupações e angústias coletivas".l1 Inconformava-se, por is-
so mesmo, com o individualismo da àrte contemporânea e utopicamente
imaginava uma arte como a da "perfeita conjugação que existia no mundo
da Idade Média, por exemplo, entre o artista e o povo". Diz Milliet:
Estamos muito longe ainda do artista artesão, do operário qualificado como diría-
mos hoje, com seu lugar anônimo e de horizontes bem delimitados dentro da or-
dem social estável. Estamos muito longe do artista que fazia sua tela, sua estátua
ou seu pedaço de catedral, como nós vendemos mercadorias ou escrituramos o
débito e o crédito de um negócio. Estamos muito longe ainda do artista trabalhan-
do para receber um salário, como qualquer um de nós, sem nenhuma ambição
de perenidade, sem nenhuma idéia çle glória, sem nenhuma superestimação de
sua obra.12

Milliet acompanhou com discernimento a evolução dos artistas da geração


de 1930 e a que surgiu depois da guerra. Colocou não raras restriçoes à
arte abstrata que se difundia na década de 1940, mas não se omitiu no re-
8 MILLIET,Sérgio,Pintura Quase Sempre,
Porto Alegre, Globo, p. 75, 1944. conhecimento do valor de artistas com essa orientação. A seu trabalho crí-
9 Idem, ibidem, p. 55. tico agrega-se organicamente a dimensão do animador cultural na criação
10 Idem, ibidem, p. 151. do Setor de Arte da Biblioteca Pública Municipal, na futura direção do MAM
II Idem, ibidem, p. 152. de São Paulo e na organização de Bienais.13
12 Idem, ibidem, p. 94.
13 Consultar GONÇALVES, Lisbeth R.R., Um convicto e ortodoxo apoio à retomada da função social da arte, perdi-
Sérgio Mi//iet, Crítico de Arte, São Paulo, da em favor do individualismo na evolução da arte ocidental, aparece no
Fac. Filosofia, Letras e Ciências Humanas, crítico, teórico e político trotskista Mário Pedrosa. Em conferência que pro-
USP, 1985.
nunciou no CAM, em julho de 1933, quando da exposição de Kaefhe Koll-

81

"'
\1

witz, publicada no semanário O Homem Livre, refere-se à ausência de "pers-


pectivas sociais" dos artistas modernos na sociedade capitalista.14 "Em
nossos dias", afirma, "a arte só poderá ser restaurada na sua dignidade an-
tiga e representar uma função social, embora talvez com prejuízo de sua
pureza estética, se se opuser aos valores admitidos". Para Pedrosa, tal fun-
ção diz respeitO exclusivamente à causa da classe proletária. Por essa ra-
zão, divide radicalmente o campo artístico em dcis blocos:
De um lado, a arte desses criadores que ficaram absorvidos por essa segunda natu-
reza superposta à primitiva que é nossa natureza moderna e mecânica - a técnica
- e desligados completamente da sociedade, em parte por estreiteza mental, em
parte para não tomar uma atitude em frente à implacável batalha das duas classes
inimigas(...). No outro lado, colocam-se os artistas sociais, aqueles que se aproxi-
mam do proletariado e, numa antecipação intuitiva da sensibilidade, divisam a sín-
tese futura entre a natureza e a sociedade, destituída afinal dos idealismos defor-
'"
madores e das convulsões místicas das carcomidas mitologias.
Em seu envolvimento ideológico, dava lugar primacial na linguagem a es-
pecíficos componentes conteudísticos - o que ainda está presente no ar-
tigo que dedicou a Portinari em 1934.15 Mas nos anos de 1940, quando
colaborava no Correio da Manhã e em outros órgãos, o crítico evoluiu
para o entendimento das formas abstratas da arte, das quais se tornou grande 14Intitulada "As Tendências Sociais na Ar-
defensor.
te de Kaethe Kollwitz", republicada in Arte
O apoio a uma arte capaz de sensibilizar as camadas populares e identificar-se Necessidade Vital, Rio de janeiro, Editora
com elas aparecia de forma apaixonada em Anibal Machado. Suas asseve- da Casa do Estudante do Brasil, pp. 7-34,
1949.
rações em palestra pronunciada quando do I Salão de Arte Social, promo- 15"Impressões de Portinari", in Arte Neces-
vido pelo Clube de Cultura Moderna em 1935, no Rio,16valia-se de Geor- sidade Vital, Rio de)aneiro, Editora da Ca-
ges Plekhanov e não poupavam a arte que se afastasse dessas intenções pro- sa do Estudante do Brasil, pp. 35-44,1949.
gramáticas. Assim, entretanto, não pensavam outros literatos e críticos da 16 Mostra de Arte Social, reproduzida in
época, como Luís Martins, que, citando Plekhanov e seus reclamos da arte Movimento, Rio de janeiro, Clube de Cul-
engajada, afirma, em conferência de 1936, na Associação dos Artistas Bra- tura Moderna, 1(4): 19-23, out. 1935. Ver
AMARAL,Aracy, Arte Para Quê?, pp. 50-2,
sileiros,17 que "por temperamento" é "contrário a todo parti pris e a to- 1983. Reunindo numerosos intelectuais de
da atitude dogmática", considerando mais acertado, "no domínio da arte, esquerda, num momento de grande eferves-
deixar passagem aberta a todos os caminhos" .18 Plekhanov, intelectual cência política, a associação não resistiu à
voltado para a literatura, em nome de sua vertente ideológica, desconside- censura do governo e procurou refazer-se,
rava a importância da percepção impressionista e da construção espacial conduzi da por Anibal Machado, Oswald de
Andrade e Raul Bopp, sem conseguir atin-
cubista, para ele pertencentes ao ranço das meras preocupações burguesas. gir seu objetivo (d. BARSANTE,Cassio Em-
Alimentada por outros homens de letras, críticos e artistas mais jovens a manuel, Santa Rosa em Cena, Rio de janei-
questão da arte social prosseguiria na década de 1940 e no início da se- ro, Instituto Nacional de Artes Cênicas, p.
39, 1982.
guinte, quando aqui se propagava o "Realismo socialista" e cobria-se de 17 MARTINS, Luís, A Pintura Moderna no
invectivas a instituição da Bienal de São Paulo - portadora, para eles e Brasil, Rio de janeiro, Schmidt ed., pp.
para não raros artistas, dos malefícios da abstração, considerada imperia- 54-5, 1937.
lista e castradora de valores nacionais. 18Idem, ibidem, p. 12.

82
Não menos a questão dos valores nacionais continuou presente na crítica
dos anos de 1930 e 1940. A doutrina do primeiro Modernismo estendia-se
em variantes por esse período, sendo parte de um vasto e diferenciado es-
pectro em que se inclui o próprio nacionalismo' da orientação política de
Getúlio Vargas. A expressão artística buscava apoios mais diretos no meio
em que se produzia. O jovem crítico Lourival Gomes Machado contestava
a idéia de que o isolamento da Europa, provocado pela guerra, fizera a arte
local descer em seu nível coletivo. Tomando o exemplo de dois artistas
do Grupo Santa Helena - Rebolo e Graciano -, salienta a existência de
"núcleos bem formados", considerando "que o que baixou e ameaça morrer
é a cópia, a falsificação", para concluir que não "estamos em fase de declí-
nio, mas em época de definição" .19
As formas próximas da realidade, assim como o Expressionismo, contavam
com defensores convictos, enquanto o Abstracionismo e o Surrealismo so-
friam objeções de Mário de Andrade. Sérgio Milliet e outros críticos. Nos
artigos e ensaios de Mário Pedrosa, pelos anos de 1940, desenvolve-se, en-
tretanto, a receptividade às formas da "arte pura". A exemplo dele, mui-
tos teóricos trotskistas de outros países reformularam posições para reco-
nhecer a linguagem abstrata como uma força que se amalgamava à cons-
ciência social em evolução.
Na década de 1940 a crítica encontraria em Ruben Navarra uma de suas
figuras mais abertas a toda a complexidade da arte. Interessado igualmente
pela dança e pelo teatro, o crítico paraibano, radicado no Rio e prematura-
mente desaparecido, deixou uma série de apreciações sobre artistas e even-
tos artísticos, de rara competência. Segall, Portinari, Guignard, Pancetti,
Cícero Dias, entre outros, os parisienses refugiados no Rio, Maria Helena
Vieira da Silva e Arpad Szenes, com os quais manteve estimulante amizade
e os novos pintores de São Paulo foram objeto de sua melhor atenção, re-
gistrada nas páginas do Diário de Notícias, em revistas e catálogos. Prima-
vam nele a observação penetrante, o raciocínio inteligente e sagaz molda-
do em linguagem ácida. Era alguém que sabia ver' 'além do plano das apa-
rências" (Murilo Mendes). E que se mostrou sensível aos diversos caminhos
da arte. Seguindo o exemplo de Mário de Andrade, voltou-se também para
a arte colonial brasileira, da mesma forma que Lourival Gomes Machado
em São Paulo. Bastante ilustrado, demonstrou uma concepção universalis-
ta da arte. O treçho seguinte, extraído de análise que fez da obra de Cícero
Dias, é esclarecedor de suas idéias:
Internacionalismo e regionalismo na pintura de nossos dias... Sabemosque os pin-
tores sociais mexicanos consideram-se mais descendentes dos astecas do que dos
) Cf. "Notas de Arte - Omnibus", Folha espanhóis. Reivindicam uma pintura mexicana autóctone inspirada na escultura
rl Manhã, São Paulo, 25 out. 1944. dos astecas. Mascomo esquecer que neste meado do Século Vinte somos obriga-

83

t
dos a viver cada instante como um sopro universal, sob o patrocínio do avião e
do rádio? Querer por amor-próprio uma arte subcivilizada como forma de origi-
nalidade seria uma insensatez, além de ser praticamente impossível. Ao contrário
dos antigos, fechados em suas cidades-santuários, podemos dizer que a nossa res-
piração não tem fronteiras, não podemos isolar os sentidos do que está no ar e
abraça o globo. Pretender um chauvinismo estético baseado no isolamento p.rimi-
tivo e folclórico, o sistema de relações do nosso mundo não permite mais isso.
Mesmo porque entre nós, até o folclore é internacional nas suas origens (...) Que
nos adiantaria fazer, por exemplo, "arte negra" em busca de originalidade e exo-
tismo, se "arte negra" já foi integrada na "Escola de Paris"! Nacionalismo e exo-
tismo, eis duas estéticas sem mais nenhuma or'iginalidade. Razão a mais, e decisi-
va, para aceitarmos o individualismo em arte, ou seja, a idéia do artista criador
sem levar em conta, literalmente, o critério da arte como simples fenômeno de 20NAVARRA,Ruben,"Cícero Dias" ,jornal
sociologia primitiva. Uma arte fechada e chauvinista não existiu nem nos Estados de Arte, Campina Grande, Edição da Cothis-
municipais da Itália, nem na França renascentista, nem na Península Ibérica, sem são de Cultura do Município, pp. 254-5,
1966.
esquecer o Portugal dos mestres flamengos. E naquele tempo não havia avião nem
rádio.20

84
Apêndice
As publicações nacionais e estrangeiras

A difusão da arte moderna nos anos de 1930 e sobretudo de 1940 fez-se


em muitv pela acolhida que lhe davam os jornais e as revistas culturais,
por vezes especializadas e de ideologias diversas.
No Rio, cabe mencionar Jornais como jornal do Comércio, Gazeta de No-
tícias, Diário de Notícias, Correio da Manhã, O Imparcial, Ojornal, Deuts-
che Rio-Zeitung, A Manhã, A Nação, A Noite, Vanguarda, Tribuna Po-
pular; revistas culturais ou especializadas como Base, a nova Bazar, Bole-
tim de Ariel, Cultura, jornal de Bel/as-Artes, Rumo, Roteiro, Revista Bra-
sileira, Revista do Brasil, Movimento, Síntese, Rio Magazine, Aspectos,
Sombra, Revista Acadêmica, Dom Casmurro, Leitura, Diretrizes, Cultu-
ra Política, Letras-e Artes, jornal de Letras, Intercâmbio, jornal das Ar-
tes; revistas de âmbito geral, como Carioca, O Cruzeiro, Fon-Fon!, Revista
aa semana, Vamos Ler!, Ilustração Brasileira, Para Todos, Selecta. Em
São Paulo, o comentário de arte era também matéria presente nos princi-
pais jornais: Correio Paulistano, O Estado de S. Paulo, Fanful/a, A Gaze-
ta, Folha da Manhã, Folha da Noite, Deutsche Zeitung, Correio de S. Paulo,
A Platéia, Diário da Noite, Diário de S. Paulo, jornal da Manhã, Hoje,
Notícias de Hoje; em revistas culturais como Revista Nova, O Homem Li-
vre, Revista do Arquivo, Augusta, Revista da Academia Paulista de Le-
tras, Revista Anual do Salão de Maio, Clima, Roteiro, Problemas, Pla-
nalto, Inteligência, Fundamentos, Habitat,jornal das Artes, no Suplemen-
to em Rotogravura de O Estado de São Paulo, na Gazeta Magazine, em Ar-

85
1I

tes Plásticas; em revistas diversas como Va~itas, Paulistânia, Piratininga,


Universal, Elite. Noutras capitais do Brasil, as duas décadas viram apare-
cer não poucas e diferenciadas publicações que abrigavam a cultura mo-
dernista ou eram seus órgãos, como as revistas Fronteiras e Renovação,
em Recife; Revista do Globo e Movimento, em Porto Alegre;]oaquim, em
Curitiba.
O movimento editorial de arte, no entanto, era exíguo. Registre-se a obra
de referência bibliográfica intitulada Artistas Pintores do Brasil, de Theo-
doro Braga (São Paulo, Editora São Paulo, 1942). Luís Martins publicou A
Pintura Moderna no Brasil (Rio de Janeiro, Schmidt Editora, 1937) e A
Evolução Social da Pintura (São Paulo, Departamento de Cultura, 1942).
Sérgio Milliet reuniu textos de imprensa como em O Sal da Heresia (São
Paulo, Departamento de Cultura, 1941), Pintura Quase Sempre (Porto Ale-
gre, Livraria do Globo, 1944) e em seu Diário Crítico (São Paulo, Brasi-
liense e Livraria Martins Editora, a partir de 194'1), o mesmo fazendo Mário
Pedrosa em Arte Necessidade Vital (Rio, Editora da Casa do Estudante do
Brasil, 1949). O crítico Lourival Gomes Machado publicou Retrato da Ar-
te Moderna no Brasil (São Paulo, Departamento de Cultura, 1948).
O acompanhamento do que se passava no mundo externo dependia em
muito das revistas especializadas. Sem dúvida, eram numerosos os títulos
assinados por assoCiações, artistas e críticos ou que aqui eram postos à venda.
Entre eles, figuravam publicações francesas de arte, arquitetura e artes apli-
cadas como L 'Art Vivant, XX Siecle, Promethée - L 'Amour de I 'Art, L 'Ar-
chitecture d'Aujourd'hui; italianas como Emporium, Dedalo, Casabella,
L 'Artista Moderno; alemãs como Die Kunst, Deutsche Kunst und Dekora-
tion; inglesas como The Studio e Circle; americanas como Athene; argenti-
nas como Signo. As revistas russas, proibidas de entrar, chegavam através
do México... Exemplo significativo do interesse pela importação de revis-
tas de arte e arquitetura aparece na SPAM. Seus asssociados, segundo um
relatório, dispunham "das melhores revistas de arte do estrangeiro e de
cultura geral", como algumas assinaladas acima, além de Poligono, Domus,
Formes, L '/llustration, Forum, Art et Industrie.t O CAM também se pro- J Cf. Relatóriodas Alil'idades Geraisda So-
pôs assinar revistas para sua biblioteca.2 Graças a Sérgio Milliet, coadjuva-
âedade Pró-Arte IHodema, pp. 8-9,
do por Maria Eugênia Franco, a partir de 1944 a Biblioteca Municipal de 2 CARVALHO, Flávio de. "Recordac;ão do
São Paulo daria organização e impulso ao Setor de Arte, oficialmente inau- Clube dos Artistas Modernos". Rel'istll
gurado em 1945, não faltando ali os títulos estrangeiros. Anual do Salão de Jlaio, 19~ I .

86
PARTE SEGUNDA

o GRUPO SANTA HELENA

Uma estória singela, mas não comum.


Paulo Mendes de Almeida

De Anita ao Museus, Editora Perspectiva.


São Paulo, 1976, p. 129.
I Ibrmação e desenvolvimento

Entre as plêiades de artistas de espírito moderno surgi das no Brasil e espe-


cialmente em São Paulo nos anos de 1930, o Grupo Santa Helena (ou Gru-
po do Santa Helena) ocupa, sem dúvida, destacado lugar.Ílierdavam os Pin
tores dessa comunidade, no avultado organismo artístico da capital paulis
ta daquela década, o clima de abertura propiciado pelo Modernismo de 1922
manifestando, porém, atitude de independência na compreensão dos pro ~
blemas plásticos e nos vínculos ideológicos com a realidad<;)Alguns inte-
grantes da confraria foram categóricos ao dizer que nada deviam aos ante-
cessores.! Dividem, aliás, esta sua certeza com outros colegas contempo-
râneos paulistas e do Núcleo Bernardelli, para quem também era das mais
I Depo~mentoscom esse teor foram pres- pálidas a memória do chamado "período heróico" e sua projeção no tem-
tados ao autor por Rebolo Gonsales, Fulvio po inaugurado pela virada histórica de 1930.2r'f;1 sentimento de autono-
Pennacchi e Alfredo Volpi, respectivamen- mia advinha de peculiaridades da formação cultural, fundamentalmente pró-
te em 14 de abril, 17 e 24 de maio de 1976.
2 Em depoimento prestado ao autor em 13
pria aos extratos sociais proletários 04 da pequena burguesia a que perten-
de dezembro de 1973, Milton Dacosta ma- ciam, contrastante com aquela dos hierarquizadosprotagonistas da Sema-
nifestou essa opinião. na de Arte Moderna ou de sua esfer~ Veremos, noutra parte do trabalho,
.\ Originariamente Rebollo.
4 Respectivamente em Araras, Cruz das quefesses artistas absorviam a modernidade conciliando-a com a tradição...:,
Posses e Serrana. Rizzotti naturalizara-se ita-
Constituíam o Grupo: Francisco Rebolo Gonsales (1903-80)3, Aldo Cláu-
liano. "Fez isso para poder estudar na Itá-
lia, onde permaneceu de 1924 a 1935." (Cf. dio Felipe Bonadei (1906-74), Mário Zanini (1907-71) e ManuelJoaquim Mar-
depoimento ao autor de Esmeralda Rizzot- tins (1911-79), todos paulistanos; Clóvis Graciano (1907-88), Humberto Rosa
ti, viúva do artista, em 28 de dezembro de (1908-48) e Alfredo Rullo Rizzotti (1909-72), nascidos no interior do Esta-
]974.) do;4 Alfredo Volpi (1896-1988), originário da Itália, mas ainda na infância

89
,
fixado em São Paulo; e Fulvio Pennacchi (1905), da mesma nacionalidade
e aqui residente desde 1929.5
A partir de aproximadamente 1934, em diferentes momentos, foram eles
chegando ao Palacete Santa Helena, na antiga praça da Sé, 43 (depois 247),
convivendo até o final da década em salas transformadas em atelieres. Ne-
nhuma intenção os guiara no sentido de criar uma associação ou organizar
um movimento.(Acercaram-se naturalmente uns dos outros, identificados
pela origem social e não raras semelhanças de formação artesanal e artísti-
c~jíReuniram-se por razões primordiais de vida e trabalho, pelas tarefas que
boa parte deles desempenhava na pintura de paredes e na decoração resi-
dencial, por partilharem convicções estéticas e pela necessidade de inter- <; Nascidos respectivamente em Lucca e ViI-
Ia Collemandina, Garfagnana (Toscana).
cambiar experiências que lhes assegurassem melhor afirmação profission~

r--
-

Vista do Palacete Santa Helena (construído


na Praça da Sé na década de 1920, demoli-
do em 1971).

90
Germinado sem cálculo,rQ Grupo, que começou a tomar forma em 1935,
só foi publicamente reconhecido nos significados proletários de sua arte6
ao converter-se no esteio de uma corpo ração maior, a Família Artística Pau-
lista. Muito embora evidenciando uma qualificação de componentes plás-
ticos comuns, capazes de se impor sem prejuízo dos valores individuais
de personalidades em evolução, houve alguma demora na admissão das
virtudes que tornam o Grupo Santa Helena um dos mais peculiares da his-
tória do Modernismo brasileiro. Pelo que depreendemosÇ1Oi somente no
início ~ década de 1940 que se aproveitou o nome do edifício tardo-eclético
do velho coração urbano de São Paul07 para a designação do GrupO.8
rDiferencia-se o GSH das complexas associações de artistas e intelectuais
emersas da classe burguesa nos anos de 1930, com amplos objetivos pro-
gramáticos, como a SPAM e o CAM, ou ainda de facções como a que orga-
nizava o Salão de MaiqJ Mesmo se mais próximo do Núcleo Bernardelli,
é preciso convir que este brotara em ambiente escolar, sendo resultado da
convivência de mestres e alunos conduzidos pelo desejo do exercício li-
vre da arte na atmosfera sufocante do autoritarismo acadêmico carioca.
(Acresce observar que os santelenistas9 respondem à situação sociocultu-
6 O espírito dessadefinição cIassistaremon- ral de uma metrópole em rápida expansão, onde se faz fortemente sentir
ta a ANDRADE, Mário de, "Ensaio sobre a presença italiana. A maioria de seus membros pertence à grande colônia
Clóvis Graciano", jul./dez. 1944, in A Fa-
mt1ia Artística Paulista, Separata da Revista
que se estabelecera no Estado. Volpi e Pennacchi, como vimos, são italia-
IEB-USP, n? 10, São Paulo, USP, p. 157, nos natos, enquanto Bonadei, Graciano, Rosa, Rizzotti e Zanini são oriun-
1971. di. Dessa engolfada atmosfera ítalo-brasileira participam Rebolo, descen-
7 Construído na década de 1920 e demoli- dente de espanhóis, e Manoel Martins, de pais portugueses. I
do em 1971.
8 A nosso conhecimento, as primeiras refe- [Nas maciças levas de emigr~ntes italianos que se deslocav;;;; para o Brasil
rências específicas ao Grupo Santa Helena a partir dos últimos decênios do século XIX, o principal contingente era
foram as de Sérgio Milliet nos artigos "Re- de campones~- uma gesta vista sob vários prismas, desde os mais enal-
bolo" e "Mário Zanini", publicados no Su- tecedores, dos que realçam o País promissor em que não raros (e sobretu-
plemento em Rotogravura de O Estado de
S. Paulo, São Paulo, respectivamente em do os que, já ao chegar, desfrutavam de melhor status), alcançavam posi-
agosto (n? 188) e novembro de 1941 (n? ções de destaque, até os que acusam as muitas e amargas decepções aqui
193). encontradas, de início na substituição do braço escravo, ou constatam a
9 Essa denominação foi utilizada, pela pri- exploração econômica e política a que o governo da Itália submetia os
meira vez e por este autor, na introdução recém-chegados.lo Contudo, não deixava de ser significativa a parcela de
ao Catálogo da Exposição Mário Zanini artesãos e industriários que, sobretudo em São Paulo, na cidade que se agi-
(1907-71), no MAC-USP.
10 Sobre este último aspecto ver lANNI, gantava, trazia contribuição das mais relevantes. Os obstáculos que enfren-
Constantino, Homens sem Paz, São Paulo, tavam os imigrantes, dessa e de outras nacionalidades, não constituíram
Difusão Européia do Livro, 1963. Sobre a empecilho para que aqui engendrassem nova expressão de existência, de
imigração italiana no Brasil consultar tam- operosas iniciativas.
bém, entre outros autores, CENNI, Franco,
Italianos no Brasil, São Paulo, Liv. Martins, ÍÃgente notório da transformação do meio, a colônia italiana teve impor-
s.d. tante participação na construção civil e nas Artes Aplicadas, com seus ope-

91
\
rários, mestres-de-obras e arquitetos. Desde o final da centúria passada nota-
se no surto urbano e industrial 11 ESSainfusão profissional, marcante tam-
bém em múltiplas outras atividades. Uma cidade muito diferente do anti-
go burgo d€ ares coloniais despontava com novos atributos culturais. No
que diz respeito à arquitetura aqui implantada ou desenvolvida em muito
por italianos, Salmoni e Debenedetti trouxeram os préstimos de um estu-
do sistemático.12
Mais recentemente, a questão das Artes Aplicadas e da ornamentação tem
preocupado pesquisadores como Ana Maria de Moraes Belluzzo, que estu-
da o trabalho dos imigrantes na "integração da experiência artística à ativi-
dade produtiva" ,[âcrescentando que a figura do artista decorador "foi tan-
to o pintor de interiores, o escultor de ornatos, o modelador de frisos, o
fundidor de apliques de gesso, o fundidor de grades de ferro, o estucador
dos motivos de fachada, cada um em sua especialidade" .13Na tradição que
se originou encaixam-se os artistas do Santa Hele~ Entre os estudiosos
que mais têm refletido sobre "a contribuição do imigrante e seus filhos
para o aprimoramento das relações de trabalho e de produção dentro da
vida brasileira, notadamente nas implicações referentes à história da pin- 11 Entre os autores que trataram do assun-
tura, da arquitetura, da escultura etc.", acha-se Flávio Motta, autor do tre- to acham-se BRUNO, Ernani Silva, História
cho citado e que considera tal questão de "especial relevo" em São Paulo, e Tradições da Cidade de São Paulo, 3. ed.,
e a figura de Portinari como um "ápice desse processo" .14 São Paulo, Ed. Hucitec, v.3, I Palacetes e
Chalés, pp. 915 e segs., 1984; REIS FILHO,
rxo contrário do Rio de Janeiro, o meio paulista por muito tempo não pos- Nestor Goulart, Quadro da Arquitetura no
suiu ensino artístico oficial. Um estabelecimento de belas-artes fora criado Brasil, São Paulo, Perspectiva, p. 154, 1970;
em 1910, antecedendo a fundação, em 1925; da Academia de Belas-Artes e MORSE, Richard M., Formação Históri-
ca de São Paulo Corpo e Alma do Brasil,
de São Paulo (instalada em 1926), depois com o nome alterado para Escola São Paulo, Difusão Européia do Livro, pp.
de Belas-Artes de São Paulo. Isto com certeza contribuiu para que a forma- 255-6, 1970. Consultar também 'MOTTA,
ção acadêmica de arte não alcançasse jamais na capital bandeirante a gran- Flávio, A Família Artística Paulista, Sepa-
de desenvoltura atingida na Guanabara, favorecendo, portanto, as inten- rata da Revista lEB, São Paulo, USP, pp.
138-9, 1971.
ções que almejavam uma arte renova~ No caso dos jovens das classes 12 SALMONI,Anita e DEBENEDETTI,Em-
menos favorecidas, quem atendia essencIalmente a sua demanda era o cur-
ma, Arquitetura Italiana em São Paulo, São
so noturno do Liceu de Artes e Ofícios, que, em 1883, havia sucedido a Paulo,Perspectiva, 1981 (aI~edição, em ita-
escola técnica fundada dez anos antes pela Sociedade Propagadora de Ins- liano, data de 1953).
trução Popular. Quando dirigido pelo engenheiro empresário Ramos de I; Comunicação intitulada Artistas Decora-
Azevedo, a partir de 1895, o Liceu tomara impulso renovador, ali ensinan- dores. Estudo de Caso na Primeira Repú-
blica, em São Paulo, apresentada ao Coló-
do numerosos professores e artistas italianos. Os jovens de famílias de maior quio de História da Arte, do Comitê Brasi-
posse podiam dispor, na fase entre os dois séculos, de outras possibilida- leiro de História da Arte, São Paulo, set.
des, como a freqüência a escolas mantidas por estrangeiros, segundo a hi- 1985.
pótese de José Carlos Garcia Durand.15 14 MOTTA, Flávio, A Família Artística
Paulista, Separata da Revista lEB, São Pau.
No que co~cerne aos artistas. de origem humilde, a situação não sofreu mui- 10, USP, n? 10: 138, 1971.
tas alteraçoes nos anos segumtes. É um fato que a formação daqueles que 15Idem, ibidem, p. 153, 1985.

92
~
l
comporiam o GSH possui complexidade ainda hoje pouco ressaltada. Não
obstante os pontos comuns que os relacionam a esse respeito, não podem
nos escapar certas especificidades{lli um iniciado unicamen,te pelo empe-
nho autodidata, como outros que estão quase no mesmo plano; há os que
realizaram aprendizado na Escola de Belas-Artes ou junto a mestres locais;
e há os que estudaram também no Exterio~
Mário Zanini cursou a cadeira de Desenho e Artes do Liceu de Artes e Ofí-
cios entre 1923 e 1926; Aldo Bonadei fez o mesmo em 1925. Pelo Liceu
passaram muitos outros futuros artistas, como César Lacanna, Joaquim Lo-
16 Cf. Livro Série C, n? 10 - 1914-25, do pes Figueira, Ado Malagoli e Arnaldo Ferrari. 16Os alunos recebiam ali o
Liceu de Artes e Ofícios (conservado na bi- ensino de princípios tradicionais de professores (geralmente italianos), co-
blioteca da instituição). mo Alfredo Norfini (1867-1944), Enrico Vio (1874-1960), Amadeo Zani, An-
17 Nomes constantes do álbum Lyceu de tonio Quadrench, Aladino Divani (1878-1928), Américo Salfatti, Orlando
Artes e Offícios (1924). Não obtivemos da-
dos biográficos de vários deles.
de Oliveira, Nogueira Lima, Milton Ranzini, Ferdinando Panelli, Adolfo Bo-
rione e Romolo Guglielmi.17

Sede da Escola de Belas-Artes de São Paulo,


à rua Onze de Agosto.

93
,---
o autOdidatismo caracteriza sobretudo o caso de Volpi, que aprendeu o
mister artístico na própria práti~ 18 Rebolo estudou ornatos na EscolaPro-
fissional Masculina (estabelecimento fundado em 1911) e começou a instruir-
se no desenho com Zanini em 193319 e Lacanna. Martins, que se iniciou
pela ourivesaria em 1925, foi, mais tarde, nos anos de 1930, aluno do es-
cultor Vicente Larocca (1892-1964) e seguiu cursos que a SPBA oferecia
(em meados da década).20 Segundo Paulo Mendes de Almeida, realizava es-
cultura e desenhos e pintava desde 1932.21 Graciano, que muito moço
já se interessava pela música (tocava pistão, violino e contrabaixo), decidiu-se
pelo desenho em 1926 e somente em 1934 pela pintura.22 Acompanhou
posteriormente as sessões de desenho com modelo vivo na SPBA. Por sua
vez, Humberto Rosa foi aluno regular da Escola de Belas-Artes de São Pau-
lo entre 1927 e 1932, tendo se formado neste último ano.23 Muito jovens,
eles procuraram aperfeiçoar-se também tomando aulas com mestres reno-
ma dos da cidade. Assim, Bonadei estudou desenho com o especialista em
naturezas-mortas Pedro Alexandrino, foi aluno de outro pintor acadêmi-
co, o italiano Antonio Rocco, e enriqueceu-se conceitualmente com o pin-
tor Amadeo Scavone. Zanini freqüentou em 1928 o artista alemão Georg
Fischer Elpons, e.Graciano reforçou conhecimentos com o experiente Wal-
demar da Costa em 1936-37 [Não faltou a três deles, em dosagens diversas,
a formação européia, mais especificamente italiana.\ Bonadei desfrutou de
breve viagem a Florença entre 1930-31, adiantanã6-se em sua Academia Corredor interno do Palacete Santa Helena.
de Belas-Artes, particularmente junto a Felice Carena, e convivendo com
artistas de várias nacionalidades. 24Pennacchi chegou ao Brasil em 1929,
com estudos feitos na Academia Real de Pintura de Lucca, onde foi discí-
pulo de Pio Semeghini (1878-1964), constando ainda de seu currículo al-
18Cf. depoimento de Volpi ao autor em 24
guns meses de permanência na Academia de Florença. Alfredo Rullo Riz- de maio de 1976.
zotti Jixou-se por cerca de onze anos na Itália, a partir dos quinze anos de 19Cf. depoimento de Rebolo ao aUtor em
idade (1924-35), e ali cursou a Escola Profissional Novaresa e a Academia 29 de janeiro de 1976.
Albertina de Turim, como aluno livre. É oportuno lembrar que outros mem- 20 Cf. depoimento de Manoel Martins ao
bros da FAP - Domingos Viegas de Toledo Piza, Paulo Rossi Osir, Hugo aUtor em 13 de agosto de 1974.
21In Crônica, "Movimento", Rio de Janei-
Adami, Armando Balloni, Waldemar da Costa e Arnaldo Barbosa - haviam ro (r~corte de posse do autor).
residido na Europa. 22 Cf. CÉSAR, Osório, "Clóvis Graciano",
Diário de S. Paulo, São Paulo, 22 jan. 1942.
Mesmo considerando o que usufruíam desses estudos de arte, aqui e no 23 Cf. certificado emitido pela EBASP em
Exterior,í<) que predomina nesses artistas é indiscutivelmente o esforço pes- 17 de abril de 1935. Rosa realizou o curso
soal de aprimoramento, somado, a partir da existência do Grupo, aos ga- de pintura gratuitamente.
nhos da atividade conjunta. Pelos anos de 1930, até os de formação mais 24Ao retornar ao Brasil, em entrevista con-
cedida a A Platéia, São Paulo, em 24 de se-
antiga dedicavam-se ao desenho com modelo vivo, comparecendo ao cur- tembro de 1931, Bonadei referiu-se ao cos-
so livre da SPBA, então procurado por muitos outros artistas. Ali mopolitismo do ambiente florentino. "O
cimentavam-se amizades. Esta prática com modelo vivo teve continuidade que menos existe por lá são itaUanos" ,
declarou.
nos próprios atelieres do Palacete Santa Helen:j

94
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[Não se poderia, obviamente, comparar as aquisições de fllguns deles em
escolas oficiais de arte italianas com a larga experiência internacional dos
primeiros modernistas, residentes em Paris e outras cidades ou visitantes
assíduos da Europa. Pelo mais, sua formação fizera-se quase sempre, e ba-
sicamente, no próprio ambiente paulistano, com absorção, sobretudo, de
complexos elementos das culturas plásticas italiana e francesa, que reper-
cutiam fortemente na cidade e eram inerentes na lição de mestres locais
ou aqui radicado~
. ... iSAíAê
Ao fixar-se no prédio da praça da Sé - por uma confluência de fatores
sociais e propósitos individuais que acabariam por se tornar bem determi-
nados, muitas vezes ligados, como dissemos, pOFbalhos de simples pin-
.'
11 "'~!8EI'

turas de paredes ou de decoração de residências e, principalmente, pela


própria necessidade de uma união que lhes permitisse enriquecer conhe-
cimen~o~ :. prátic~, os a~tistas do S~nta Helen~ atr~vessariam uma fase
de deflll1çao em suas carreuas, consohdadas maiS adiante. '\
\
Entretanto o estágio de evolução em que se encontravam demonstra dis-
crepâncias. Se Rebolo e Graciano cumpriam etapa inaugural por volta de
1935, o mesmo não se dava com Bonadei, Zanini e, mais ainda, Volpi, os
quais de longa data desenvolviam uma obra(AS mais remotas pinturas co- f
nhecidas de Volpi remontam a 1914, e ele já havia participado, em 1925
e 1928, de duas mostras coletivas. Bonadei, que se exercia na pintura des-
de a adolescência, reunira trabalhos para uma individual de estréia em 1929 '- -4
e expusera pela primeira vez no Salão Nacional de Belas-Artes em 1928. Capa do catálogo do I Salão Paulista de
Não é muito diferente o caso de Zanini, que precocemente, aos dezesseis Belas-Artes, 1934.
anos (1923), decidira-se pela pintura, realizando nessa década seus primei-
ros quadr~Ele tomou parte nas duas edições iniciais do Salão Paulista
de Belas-Artes (1934 e 1935), como Bonadei e Volpi, que continuaram pre-
sentes nesse certame. Por sua vez, Pennacchi, depois de um período aca-
dêmico, entre 1925 e 1927,25 mostrava progressos nos últimos anos em
que viveu na Itália e primeiros no Brasil, quando se aplicava mais no dese-
nho do que na pintura. Rizzotti, numa curta biografia que subscreveu, in-
forma se ter motivado "ao ver trabalhar em sua terra natal [Serrana, SP]
um pintor 'cubano' que por lá esteve em seus tempos de infância", antes
de seguir para a Itália, em 1924. Por essa época, Rosa dava passos de es-
tréia decorando o teto da sacristia da Igreja da Sagrada Família de Cruz das
Posses.26
25 Cf. depoimento de Pennacchi ao autOr
em 18 de dezembro de 1985.
O companheirismo que cultivavam remontava em alguns casos a anos an- 26Cf. depoimento de Oswaldo MartOne ao
teriores aos da encruzilhada do Santa Helena. Volpi e Zanini, que mora- autor em 11 de junho de 1986.
vam no bairro operário do Cambuci, conheciam-se havia mais tempo. Da- 27 Cf. depoimento de Rebolo ao autor em
tam de 1933 a aproximação de Zanini e Rebolo27 e certamente a deste e 29 de janeiro de 1976.

98
Volpi. Já Pennacchi e Rebolo fizeram amizade por ocasião do III Salão Pau-
lista de Belas-Artes (1936).28
Volpi, Rebolo e Zanini possuíam experiência na pintura de ornatos. Com
familiares, Rebolo introduziu-se nessa tarefa já na segunda década. Em 1926
estabeleceu-se com escritório na rua São Bento e a seguir, em 1933, na rua
Três de Dezembro, onde continuou a reunir empreiteiros, caiadores e de-
cora dores de casa, servindo a uma clientela que lhe encomendava ornatos
da moda, entre eles Luís XV, Luís XVI, Damasco, Liberty, Futurista ou, ainda,
"motivos fantasistas".29 Cabe registrar que, decadente com a imposição da
arquitetura funcional desde os anos de 1930, os misteres decorativos ha-
viam sido de longa data exercidos em São Paulo por mestres geralmente
italianos, como Oreste Sercelli (1869-1927), Sebastiano Sparapani
(1876-1955), Bernardino Ficarelli (1887-1960), Ernesto Frioli (1890-1985)
e Bruno Sercelli (1892-1954). Ficarelli, um dos mais preparados, que se ini-
ciara com Sparapani, pode servir aqui de exemplo. Originário da Apúlia
e emigrado da Itália aos seis ou sete anos de idade, para lá retornara, estu-
dando nas Academias de Belas-Artes de Roma e Florença entre 1909 e 1913.
Tornou-se, na volta, requisitado mestre decorador do meio paulistano,
associando-se a Frioli entre 1918 e 192 I , quando executaram obras de gran-
de porte nas mansões que se erguiam na avenida Paulista, em Higienópolis
e outros locais, das quais hoje só restam estudos e projetos. Ficarelli, que
se manteve ativo nesse trabalho até cerca de 1936, construíra atelier em
sua casa da rua Conselheiro Furtado, 987. Era visitado por Volpi, Rebolo, II
~ No Catálogo da Exposição Fulvio Pen- Zanini, Worms e outros pintores que consultavam a ampla biblioteca que
.acchi, Quarenta Anos de Pintura, São Pau- formara desde 1928, incluindo vasta matéria artística.3o
>, MASP, p. 19, 1973, Rebolo afirma que
relacionamento entre ambos datava de
935, ocasião em que Pennacchi se referiu ~lém da decoração de casas, profissão da maioria, a biografia dos artistas
um quadro seu exposto no salão da SPBA.
do GSH menciona outras ocupações próprias da condição proletária ou
a verdade, sua primeira participação nes- da burguesia de poucos recursos. Volpi, o mais velho, começou cedo nos
Imostra deu-se em 1936. Também a refe- ofícios de marceneiro e entalhado r e foi também encadernador. Rebolo
:ncia à exposição de miniquadros, no Pa- empregou-se aos doze anos como entregado r de chapéus (e destacou-se
cio das Arcadas não é precisa, pois ela como jogador de futebol). Zanint, entre 1922 e 1924, aproximadamente,
:orreu no ano seguinte (intitulada Exposi-
:0 de Pequenos Quadros).
trabalhou como letrista da Companhia Antárctica Paulista. Graciano prin-
Ver Catálogo da Exposição Mário Zanini cipiou como ferreiro em Leme (SP), foi pintor de carroças e funcionário
907-71), São Paulo, MAC-USP,p. 27, 1976. da Estrada de Ferro Sorocabana, onde executava serviços de pintura em
Os dados sobre Bernardino Ficarelli - tabuletas, porteiras etc., para mais tarde tornar-se fiscal de imposto de con-
te na pintura de cavalete elaborou paisa- sumo. Pennacchi, chegado ao Brasil na crise de 1929-30, improvisou-se
ns com algumas características técnicas
pressionistas - foram transmitidosao au- açougueiro e ganhou o pão em ocupações tão diversas quanto as de deco-
: pelos filhos do artista, Ileana Maria Fi- rador floral, cartazista (na Companhia Pirelli), projetista de escultura tumular
:elli Ferrari e Adriano Ficarelli, em 7 e 24 e professor de Desenho no Colégio Dante Alighieri. Rizzotti tinha os ofí-
novembro de 1986. cios de torneiro e fresador. Já Bonadei, com melhor situação econômica,

99
especializara-se nos anos de 1920 como bordador e costureiro na oficina
da família. Típicas profissões de classe média eram as exerci das por Ma-
noel Martins, vendedor na praça, relojoeiro e guarda-livros, e Humberto
Rosa, professor de Desenho Geométrico até os anos de 1940 em alguns
colégios (Bandeirantes, Sion e Dante Alighieri), mas que começara a vida
no armazémdo pai, na antiga SantaCruz das Posses,e fora pintor de paredes.J
Não é tarefa fácil reconstituir com a exatidão desejada a cronologia dos ar-
tistas no Edifício Santa Helena. Ela se estende por vários anos, desde cerca
de 1934.(õ primeiro a chegar foi Rebolo, que, ainda sem pintar? ali insta-
lou seu mais novo escritório de empreiteiro e artista decorac!2cl Seguiu-o
Zanini, que com ele passou a partilhar a sala alugada no segundo andar,
de número 231, um exíguo compartimento de 4 m x 4 m. Zanini tornou-
se pouco depois locatário da sala de número 233, idêntica à de Rebolo (e
a ela ligada por uma porta interna). Como resultado desse encontro no pré-
dio da Sé, o grupo deu seus primeiros passos em 1935,31 Zanini, a seguir,
dividiu sua sala com Manoel Martins, enquanto Fulvio Pennacchi juntou-
se a Rebolo (em 1936). "Éramos só quatro de início: Rebolo e Pennacchi,
eu e Zanini", afirma Martins.32 Depois chegou Bonadei, que, ao lado de 31 Esta data foi repetida por várias fontes.
Paulo Mendes de Almeida, o crítico mais fa-
Martins, ajudav~ a pagar o aluguel da sala de Zanini. Bonadei, porém, co- miliarizado com o Grupo, refere-se a "1934'
meçou a utilizar o atelier de sua nova casa de Moema,33 embora se manti- ou 35" como a época em que Rebolo e Za- '>
vesse vinculado aos demais. Quem tomou a vaga de Bonadei, ao lado dos nini "se instalaram, nas salas n '." 231 e 233,
outros dois, foi Graciano, que ali permaneceu "por dois ou três anos" .34 respectivamente", no Palacete Santa Hele-
Volpi também se juntara a ZaninL35 Rebolo, por sua vez, além de Pennac- na (De AnUa ao Museu, p. 130). Inclinamo-
nos pelo ano de 1935 como o do nascimen-
chi, acolheu Humberto Rosa, provavelmente em 1936. Algum tempo de- to da comunidade, pois ela surgiu dos dois
pois, Pennacchi mudava-se para outra sala, de que se servia ainda em (de Zanini, já experiente, e de Rebolo, que
1938-39,36 enquanto Zanini deixou a sua em 1939 e passou novamente a começou a pintar nesse ano).
dividir O espaço de Rebolo, antes de sair do prédio naquele mesmo ano. 32Cf. depoimento ao autor em 18 de mar-
Rizzotti foi certamente o último aderente ao Grupo, em torno de 1937, ço de 1976.
33 Cf. depoimento de Clóvis Graciano ao
freqüentando os atelieres. autor em 5 de março de 1976.
Essa oficina COmum começou a desfazer-se no final da década de 1930, mas 34 Cf. depoimento supra.
isto não significou o término dos relacionamentos. Zanini trocou O Santa 35Em depoimento ao autor, em 17 de maio
de 1976, Rebolo informou que Volpi "fre-
Helena por um atelier que repartia com Figueira, Galvez e Mário Levy, na qüentava e trabalhava na sala 233, que era
avenida Brigadeiro Luís Antônio, 62, enquanto Pennacchi, por volta de 1939, de Mário Zanini". Não era locatário, "mas
passou a contar com novo local de trabalho, na alameda Lorena.37 Manoel vivia lá". Isto contradiz não raras afirmações
Martins, de sua parte, mudou-se para uma sala da rua Bittencourt Rodri- segundo as quais Volpi apenas visitava o Pré-
gues, nas vizinhanças da praça da Sé. Rebolo, entretanto, permaneceria no dio Santa Helena.
prédio até 1952, e Zanini, não escapando à atração do local, ali voltaria 36 Cf. depoimento de Pennacchi ao autor
em 3 de janeiro de 1986.
na década de 1940, quando se fixou por muitos anos, em parte dos quais 37 Cf. depoimento de Pennacchi ao autor
dividiu uma sala com o pintor Arnaldo FerrarL38 Foi ele o derradeiro re- em 18 de dezembro de 1985.
manescente do antigo Grupo a deixar, em 1965, o imóvel já havia muito 38Utilizava também a:sala o empreiteiro es-
decadente, posto abaixo em 1971 para dar lugar à nova praça da Sé. Frise- panhol Francisco Perea.

100

'--
se que, ~rminada a fase de estreita união nos atelieres, os encontros não
deixavam de acontecer, na sala de Rebolo, no atelier de Martins, na casa
de Bonadei, no atelier de Bruno Giorgi na praça Marechal Deodoro e em
residências de amigos comu~
Podemos imaginar o ambiente criado por esses artistas - introvertidos como
Volpi, Zanini e Rizzotti ou extrovertidos como Pennacchi e Rebolo - na-
quelas salas simples e apertadas, situadas nos corredores mal iluminados
da parte posterior do edifício. Dividiam o espaço entre si, determinando-
se horários, discutindo pintura, decidindo muitas vezes em conjunto a re-
messa de obras aos salões, 39reunindo-se à noite para desenhar com mo-
delo vivo, recebendo alguns colegas e a clientela que vinha encomendar
decorações de casas, o que garantia o sustento da maioria. Através das ja-
nelas, dando para os fundos, com a vista do velho quarteirão que cedeu
lugar à praça Clóvis Bevilacqua, da Igreja do Carmo e da baixada do Brás,
que às vezes representaram, é que a luz penetrava nos atelieres. Ali, discre-
tamente de iIÚcio, quase como num retiro, realizaram parte de sua obra,
utilizando não raro suportes pobres, como o papelão. Sobreviviam, como
39Cf. depoimentos de Manoel Martins à es- vimos, de atividades paralelasrNão havia quase interessados em adquirir
tudante Matia de Paula, da FAAP, em 1974, o que faziam. Ofereciam as pinturas a amigos, por vezes' em troca de al-
e de Pennacchi ao autor em 17 de maio de gum serviço ou favor. Diz Pennacchi que "os quadros eram geralmente
1976.
dados de presente para os engenheiros: assim obtínhamos alguns trabalhos
40 Cf. Livro-Catálogo da Exposição de Re-
bolo no MAM-SP, p. 86, 1973.
de pinturas de casa e outros" 40 "Vender um quadro", acrescenta, "era
41Entrevista de Pennacchi ao jornalista Fe- muito, muito difícil, era quase como ganhar no bicho. "41 Afirma Rebolo
derico Mengozzi, in Pennacchi, 80 Anos. No que, às vezes, ao decorar uma casa, "ludibriava a freguesia", dizendo ser
trabalho, O Estado de S. Paulo, São Paulo, "um quadro indispensável para este ou aquele ambiente", e assim conse-
27 dez. 1985. guindo vender uma obra.42 Também Rosa dava sua produção~ J
42Cf. depoimento de Rebolo ao estudante
da FAAP Ariovaldo de Oliveira, em 1976.
43 Cf. depoimentos ao autor de Dante Ro- rNa crônica do grupo desconhecido, que se concentrava nas salas do Santa
sa e Teresa Rosa (irmão e sobrinha do pin- Helena, tomava vulto as saídas dos domingos para a pintura nos subúrbi~s1
tor, respectivamente) em 25 de setembro de Não faltavam os momentos de lazer nos encontros dos cafés centrais. Fre-
1986. qüentavam livrarias, como a Elo, de Guido deI Picchia, na rua Senador Fei-
44Depoimento de Guido deI Picchia ao au-
jó, 28, importadora de livros de arte, onde "formavam-se grupos de artis-
tor em 9 de fevereiro de 1976. O depoente
recordou-se da clientela artística dos anos tas". 44 Reuniam-se ainda, assiduamente, no apartamento do urologista
de 1930, formada, entre outros, por Tarsi- Adolpho ]agle, na avenida Brigadeiro Luís Antônio, 76, onde se ilustravam
Ia, Graciano, Rebolo e Manoel Martins. em música.45 O médico - que cuidaria da saúde de alguns deles, como
45Foi Joaquim Lopes Figueira quem intro- Bonadei e Zanini -, estimulado pela afluência de interessados a sua casa,
duziu os artistas do GSH ao de. Adolpho Ja- criou, em 1939, o Grupo Cultura Musical, promotor de audições, confe-
gle (cf. dissertação de mestrado de Harumi
Yamagishi, Estudo Crítico e Catalogação da
rências e debates (inclusive políticos) na Sociedade Krishnamurti, sediada
Obra de Joaquim Lopes Figueira Júnior, no Edifício Santa Helena. Posteriormente, por volta de 1942, outro médi-
apresentada à ECA-USP, São Paulo, p. 12, co, o psiquiatra Osório César, amante das artes, crítico e fundador da Es-
1981). cola de Arte do )uqueri, também passou a receber artistas em seu aparta-

101
mento da avenida São João - entre eles, os antigos membros do GSH Bo-
nadei, Rebolo, Zanini e, ainda, Walter Lewy e Carlos Scliar - "a fim de ~lUm''4'UIIUlIIIUtlIIIU'''lfnunah..u..nIUIIUII'umlUII..tIItU''1
~ 'CI s
ouvir música e realizar desenhos motivados por ela". 46 ',.

I SynditatodOsArtistaS
Nas décadas de 1920-30 e mais tarde, o Palacete Santa Helena abrigou" nos
vários andares, atelieres de outros artistas, como Adolpho Fonzari, Bernar- I flasticoSd~Sãt: -
. "~ , I

dino Ficarelli, Tulio Mugnaini (1895-1975), Vicente Larocca, Pedro Coro- I (Sociedade
1»a1ll~di.<'
na (1897-?) e José Cucé. O prédio era um centro de escritórios comerciais -: 'fi'..

e de profissionais liberais e sede de associações de classe. O refinado tea- I .


tro ali existente foi depois transformado em cinema, de prestígio na épo- i
i
ca. Desde o começo de 1930, vários dos novos sindicatos operários cria-
dos pela Revolução instalaram-se no imóvel, além da Federação dos Sindi- ii
catos dos Trabalhadores (órgãos que, em outubro de 1934, enfrentaram ~

e dispersaram a manifestação de integralistas).47 Àquelas associações de


classe juntou-se, em 1937, o Sindicato dos Artistas Plásticos de São Paulo. ;
Na verdade, era a antiga SPBA, presidida por Alexandre Albuquerque, que I
ã
se transformava em Sindicato, constituído com o apoio de numerosos ar- 11

tistas de tendência moderna, como Volpi, Pennacchi, Rebolo e Zanini, e I ~


§
outros de suas relações, como Angelo Simeone, Ottone Zorlini (1891-1967), :1
r.", IU''''''''''''''
José Cucé, Roque de Mingo e Adolpho Fonzari.
Citamos atrás o Grupo Cultura Musical, promotor de manifestações assisti- Capa do impresso contendo os estatutos de
das pelos artistas do GSH. Essa sociedade deixou de existir em 1942. Ade- Sindicato dos Artistas Plásticos de São Pau.
10, 1937.
mais, nas proximidades, à rua Onze de Agosto, 39, estavam sediadas a SPBA
e, por certo tempo, a Pinacoteca, nos anos de 1930. Na SPBA, artistas do
grupo e mais Ottone Zorlini, César Lacanna, José Cucé, Takaoka, Gastão
Worms, Waldemar da Costa, Gino Bruno, Bernardino Ficarelli e Adolpho
Fonzari (autor de decorações no Prédio Santa Helena), entre outros, dese-
nhavam à noite com modelo vivo.48 Tal prática estendeu-se aos atelieres 46 Cf. depoimento de Osório César ao au
dos santelenistas, onde posava a modelo Adolfina,49 cujas sessões atraíam tor em 29 de janeiro de 1974.
outros artistas, como o arquiteto Villanova Artigas e Hilde Weber.50 Além 47 Ver PEDROSA, Mário, "A Bienal de C:
desses, segundo Paulo Mendes de Almeida, compareciam por vezes ao Santa para Lá", in GULLAR, Ferreira, org., Art,
Helena Paulo Rossi Osir, Gobbis, Arnaldo Barbosa, Wasth Rodrigues, Fi- Brasileira Hoje, Rio de Janeiro, Paz e Ter
ra, pp. 28-32, 1973.
gueira, Virgílio della Monica e o arquiteto e pintor José Maria da Silva Ne- 48Cf. depoimento de Takaoka ao autor en
ves (1896-1978),51 aos quais devemos acrescentar os nomes de Ottone 19 de novembro de 1974.
Zorlini, Ado Malagoli, Waldemar da Costa, Angelo Simeone, Raphael Gal- 49Cf. ALMEIDA,Paulo Mendes de, De Am
vez, Virgínia Artigas, Bruno Giorgi e Giuliana Segre Giorgi. Mas, como vi- ta ao Museu, p. 131.
1110S,pelo fim da década de 1930 e nos anos seguintes, o atelier de Rebolo, 50 Cf. depoimento de Clóvis Graciano ac
autor em 5 de março de 1976.
que servia também de sede ao Sindicato dos Artistas, era o único que sub- 51ALMEIDA,Paulo Mendes de, op. cit., [:
sistia, nele perseverando a tradição dos encontros. Em 1941, quando de 131.
sua temporada no Brasil, ali trabalhou o pintor surrealista português Anto- 52Cf. depoimento de Rebolo ao autor en
rlio Pedro.52 9 de janeiro de 1976.

102
Ressalte-se a presença no prédio, em torno de 1940, de Artigas e Luís Saia,
então estudantes da Escola Politécnica. Ambos atribuíam particular impor-
tâ~cia ao convívio h~mano e artístico que ali se estabelecera. Artigas, que
fOI aluno do curso hvre de Desenho da SPBA, realizou numerosas obras
("pintei muita coisa que desapareceu"), parte das quais ao ar livre, por ve-
zes ao, l~do de ~aia, seguin<:i0 o costume dos artistas do GrupO.53 Segun-
do ClovIs Graclano, os ateheres do Santa Helena eram visitados por inte-
lectuaiscomo Paulo Ribeiro de Magalhães, Sérgio Milliet, Mário de Andra-
de, Paulo Mendes de Almeida e pelos artistas Anita Malfatti, Giuseppe Pe-
rissinoto (1881-1965), Gobbis, Balloni, Takaoka e Handa.54
/Aóque nos leva a crer um depoimento de Rebolo,55 teria sido quando da
Exposição de Pequenos Quadros - organizada pela SPBA no Palácio das
Arcadas, em outubro de 1936, por iniciativa dos pintores Torquato Bassi
(1880-1967) e Hélios Seelinger - que, pela primeira vez, o Grupo (ao me-
53 Cf. depoimentos de Luís Saia e Vilanova nos com a presença do próprio Rebolo, Rosa, Pennacchi, Volpi e Bonadei)
Artigas ao autor, respectivamente em 26 de despertou alguma atenção sobre sua existência. Naquela ocasião, Gobbis
dezembro de 1974 e 12 de julho de 1976. (participante da mostra), Rossi Osir e Hugo Adami, artistas experientes, fo-
54Cf. manuscrito de Clóvis Graciano, s.d. ram atraídos por suas obras~
(arquivo da família do artista).
55 Depoimento de 14 de abril de 1976 ao Paulo Rossi Osir é o fundador da FAP.57Note-se que ele não fora convi-
autor. Consultar Catálogo da Exposição de dado para os I e 11Salões de Maio (1937 e 1938), a exemplo de vários artis-
Mário Zanini no MAC-USP, p. 24, nota 5. tas que traziam outras características à pintura de São Paulo na virada da
56 Da Exposição de Pequenos Quadros, década de 1930, incluindo os que se reuniam no edifício da praça da Sé,
inaugurada no dia 2 de outubro de 1936,
com cerca de trezentos trabalhos de apro-
estes os que dariam a base de sustentação à Família. Descartados ou omiti-
ximadamente 25 cm "de extensão", parti- dos na primeira edição do Salão de Maio - o que provocou a reação de
cipavam também, enrre outros, os artistas alguns intelectuais, como Oswald de Andrade, Sérgio Milliet e Paulo Ribei-
Torquato Bassi, Gobbis, Franco Cenni, ro de Magalhães58 -, numerosos deles seriam convidados para as exposi-
Gousseff, Ottone Zorlini, Simeone, Della ções de 1938 e 1939 (como Rossi OSir, na última edição).
Monica, Perissinotto, Fonzari, Marchetti (ver
Suplemento em Rotogravura de O Estado Uma proposta de Arnaldo Barbosa definiu os critérios para a entrada de
de S. Paulo, São Paulo, 9 set. 1936, e "No- novos membros na recém-constituída FAP:
tas de Arte", Folha da Manhã, São Paulo,
2 out. 1936). Encerrada a mostra, sob idên-
tico patrocínio e no mesmo local, Considerand.o a circunstância de cada proposta de novos membros para o quadro
inaugurou-se, em 13 de outubro, a "Expo- social da Família Artística Paulista suscitar discussões e divergências em torno do
sição de Quadros Grandes", na qual figura- que sejam os princípios ou tendências da Família; considerando a dificuldade, ou
vam trabalhos de vários artistas, inclusive melhor, a impossibilidade de se fixar um conceito preciso sobre as tendências de
dos que concorreram à exposição anterior".
(O Estado de São Paulo, São Paulo, 14 out.
cada artista individualmente, ainda porque estas variam em função das procuras,
1936.) do estudo, da curiosidade, enfim outros fatores da evolução humana; consideran-
57 Nome inspirado em associação artística do que a arte não tem fronteiras no tempo nem no espaço, e que ela, no seu espí-
italiana de Milão, segundo ALMEIDA, Pau- rito eterno, transcende às fórmulas, escolas e tendências; considerando, também,
lo Mendes de, De Anita ao Museu, p. 123. que, no próprio quadro da Família Artística Paulista, as mais divergentes tendên-
58Cf. depoimento de Rebolo ao autor em cias se notam, a um exame mais atento; propõe, ainda, como medida de simplifi-
14 de abril de 1976. cação na escolha de novos membros: sejam aceitos todos aqueles que, qualquer

103
que seja a sua forma de expressão, revelem talento, enfim estejam trabalhando """;7'"-
_
num sentido de aperfeiçoamento ou enriquecimento da criação artística. 59 '- i; ....
Nessa proclamação, dava-se resposta às críticas havidas quando do apare-
cimento da FAP, contemporânea do Salão de Maio, dispondo-se a nova agre-
miação à mais ampla receptividade, porém exigindo' 'talento" e capacida-
de de pesquisa ("aperfeiçoamento ou enriquecimento da criação artística").
Como vemos, os termos utilizados caem em formulações genéricas. Com-
posta coerentemente de vários dos principais artistas de São Paulo, a Fa-
mília não se acresceria demasiado nas sucessivas exposições, o que demons-
tra a seletividade de sua organização.
Conforme referência anterior,rc;s pintores do Santa Helena estariam pre-
sentes nas três mostras da F~realizadas, respectivamente, no Grillroom
do Hotel Esplanada, em novembro de 1937,60 no Automóvel Clube, à rua
Líbero Badaró, em maio-junho de 1939, e no Palace Hotel do Rio - a con-
vite da Associação dos Artistas Brasileiros e sob o patrocínio da revista As-
pectos -, em agosto-setembro de 1940.

A relação completa dos pintores e escultores é a seguinte, nas três edições:

1937 (com dezesseis participantes): Aldo Bonadei, Alfredo Volpi, Anita Mal- Paulo Rossi Osir.
fatti, Armando Balloni, Arnaldo Barbosa, Arthur P. Krug, Clóvis Gra-
ciano, Rebolo Gonsales, Fulvio Pennacchi, Hugo Adami, Humberto
Rosa, Joaquim Figueira, Manoel Martins, Mário Zanini, Paulo Rossi
Osir e Waldemar da Costa.

1939 (com vinte e um participantes, além de Portinari, "expositor de hon-


ra"): Aldo Bonadei, Alfredo Rullo Rizzotti, Alfredo Volpi, Anita Mal-
fatti, ArnaldoBarbosa, Arthur P. Krug, Bernard Rudofsky, Clóvis Gra-
ciano, Domingos V. de Toledo Piza, Ernesto de Fiori, Rebolo Gon-
sales, Fulvio Pennacchi, Joaquim Figueira, Nélson Barbosa, Nélson
Nóbrega, Manoel Martins, Mário Zanini, Paulo Rossi Osir, Renée Le-
fêvre, Villanova Artigas e Waldemar da Costa.
1940 (com vinte e seis participantes): Aldo Bonadei, Alfredo Rullo RizZüt-
ti, Alfredo Volpi, Anita Malfatti, Arnaldo Barbosa, Carlos Scliar, Cló-
vis Graciano, Domingos V. de Toledo Piza, Rebolo Gonsales, Fran-
co Cenni, Fulvio Pennacchi, Humberto Rosa, Nélson Barbosa, Nél-
59 O documento está transcrito in ALMEI-
son Nóbrega, Manoel Martins, Mário Zanini, Paulo Rossi Osir, Paulo DA, Paulo Mendes de, De Anita ao Museu,
Sangiuliano, Renée Lefevre, Vicente Mecozzi, Vittorio Gobbis, Wal- p. 118.
demar da Costa, Arthur P. Krug, Bruno Giorgi, Ernesto de Fiori e 60Rizzotti não figurou nessa mostra inicial,
Joaquim Figueira. assim como Humberto Rosa na seguinte.

104
Note-se o comparecimento isolado de um representante do primeiro Mo-
dernismo, Anita Malfatti, bastante achegada à "nova vaga", nessa sua fase
secundária. Outro expositor veterano era Hugo Adami, com uma única par-
ticipação, em 1937. Toledo Piza, que aqui se reintegrara em 1933, depois
de viver Jongo tempo na França, fez parte das duas últimas exposições
a exemplo de Nélson Nóbrega. O gaúcho Scliar foi anexado na mostra d~
Rio. De Fiori e Bernard Rudofsky eram estrangeiros havia pouco fixados
em São Paulo que prestigiavam a iniciativa de Osir. A pintura dominou in-
teiramente as três edições, restringindo-se a presença da escultura - com
poucos valores modernos na época - a Arthur P. Krug e Joaquim Figueira
nas duas primeiras e ao mesmo Krug, Ernesto de Fiori e Bruno Giorgi na
terceira. O fato de vários expositores da FAP terem também aderido ao Sa-
lão de Maio não esconde a profunda diferença na composição dos dois cer-
tames: o Salão de Maio envolvia nomes já conhecidos no meio e no País,
muitos da geração de 1922, e contava com ilustres convidados do exterior.
fAprimeira exposição da FAP passou despercebida, "quase que em bran- I,
I
cas nuvens", como diz Paulo Mendes de Almeida,61 que prefaciara o Ca-
tálogo, onde destacou o repúdio do grupo ao academismo, o fato de não
se encartar "nas correntes mais 'avançadas' da arte [e de estar] integrado
nas mais legítimas tradições da pintura". Esse quadro de desconhecimen-
to público alterou-se depois da segunda apresentação, contribuindo em mui-
to para tanto o ressoante artigo de Mário de Andrade, de 1939, intitulado
I
"Esta Paulista Família" ,62em que o escritor tinha sobretudo em mente os I
pintores do Santa Helena. Um ano antes ele dissera: "Artista que não seja II
ao mesmo tempo artesão, quero dizer, artista que não conheça perfeita-
mente os processos, as exigências, os segredos do material que vai mover,
não é que não possa ser artista (psiCologicamente pode), mas não pode fa-
zer obras de arte dignas deste nome" .63Observe-se que, quando da últi-
ma versão da FAP, encerrada em setem ro de 1940, já não mais existia o
conjunto de atelieres do Edifício Santa Helena. Isto significa que, não obs-
tante a dispersão, permanecia sempre acesa a união entre el~ Outros no-
61 ALMEIDA,Paulo Mendes de, De Anita mes da crítica, além de Paulo Mendes de Almeida e Mário de Andrade,
ao Museu, p. 133. interessar-se-iam pela nova leva, destacando-se Sérgio Milliet, o autor da
62 O Estado de S. Paulo, São Paulo, 2 jul.
1939. introdução ao Catálogo da Exposição de 1940 (que despertou atenção na
63ANDRADE, Mário de, "O Artista e o Ar- capital federal) e acompanhante fiel de sua futura evolução.
tesão" (aula inaugural dos cursos de Filoso- Quando se faz alusão ao GSH, é preciso considerar sua natureza peculiar.
fia e História da Arte, do Instituto de Artes, Mesmo entre os que a ele pertenceram, há quem negue, surpreendente-
da Universidade do Distrito Federal, em
1938), in O Baile das Quatro Artes, São Pau- mente, -sua existência. Volpi, em anos tardios, afirmou ter sido encaixado
lo, Martins, p. 12, 1963. no Santa Helena, como o que efetivamente ocorreu nos anos de 1950, com
64"Eles Tiveram o Dom da Humildade", O sua inclusão no movimento concretista.64 Nélson Nóbrega, artista repre-
Estado de S. Paulo, São Paulo, 28 fev. 1971. sentativo e atuante da Escola de São Paulo, contesta a existência da corpo-

105
ração.65 E, por outro lado, houve também quem - como os pintores Hen-
rique Manzo e Gino Bruno, de orientação conservadora - declarasse per-
tencer ao Santa Helena, certamente por se ter aproximado de alguma for-
F -/ ~-.\/~ I I L I -/,
ma de seus integrantes.
~A
~
n.', I ~: fil I (: A
Deve-se por isso entender o termo "grupo" dentro de certos limites, co-
mo os que aqui foram definidos. Por outras palavras, ainda, devemos
semantizá-Io não no sentido de uma constituição predeterminada, imposi-
tp
li
ÁU I I S .r A
tiva, como uma resolu<,;ãode indivíduos que se propõem objetivos de afir" ~'
11

mação caracterizadora. Como frisamos, a solidariedade de seus membros


era de ordem vital e não dependia de programas ou embasamentos teóri-
M
1'. A m. I rI o
cos. A condição proletária e de classe média baixa dos artistas, o fato de
DO
originarem-se do meio imigrante, as tarefas artesanais que oesempenhavam,
a formação plástica, todos esses diversos componentes de identidade os
"
~
s
distinguiam tanto dos refinados modernistas da década anterior, enrique- ~G U PO DOS
cidos de experiências, muito viajados, quase sempre assistidos pela críti- .
ca, como dos que não arredavam pé da lerda visão historicista da arte e
I
I~A liSTAS
que também provinham de outra classe social. Pode-se, entretanto, traçar
analogias entre aspectos de sua produção e a de outros participantes da
~ rI ~ S "f '1 (: () S
FAP, a exemplo de Figueira, ou de fora desse círculo, como Mick Carnicel-
li e Raphael GalvezfNão faltaram os que os consideravam meros artífices,
de tal sorte lhes pesava a imagem de caiadores e decoradores de casas, en- <: l~ '1 I I () (~J O
tendimento que nem sempre se corrigiu mais tarde.
~
Durante a convivência assídua, além da prática de atelier, haviam-se habi- p fi 1 " 11
ff

tuado (à exceção de Graciano) a sair constantemente em grupo, aos do- ----


mingos, pelos bairros e arredores da cidade, especialmente a periferia ope- Catálogo da I Exposição da Família Artís
rária, ainda bucólica, revivendo o gosto da pintura de plein air herdado ca Paulista (inicialmente chamada Grupo d
pelos impressionistas na segunda metade do século anterio..!JA maioria am- Artistas Plásticos).
pliou as excursões a cidades próximas, no interior - Moji das Cruzes, Pi-
racicaba, Serra Negra, Socorro, Atibaia, Jacareí - e no litoral- Itanhaém,
principalmente.66 Esta é uma atividade essencial e duradoura dos santele-
nistas. Por vezes, eram acompanhados de outros artistas. Bairros como Cam-
buci e Aclimação, a região ao longo do leito tortuoso do Tietê - da Vila
Maria à Vila Guilherme, do Canindé à Ponte Grande -, Casa Verde (Chá-
cara dos Padres), Freguesia do 0, Ipiqnga, ]abaquara, Sumaré, Penha, o
burgo de Santo Amaro, Tremembé e a Serra da Cantareira estavam entre
65 Depoimento ao autor em dezembro
os ce~rios que melhor correspondiam ao apelo de sua sensibilidade e cul- 1985.
tura. ,IstO levou a crítica a chamá-Ios de "pintores suburbanos". Sua pro- 66Em anos posteriores, novos bairros e ,
dução de quadros compreende igualmente a figura humana, isolada ou em giões, como a de Campos do )ordão, ale
grupo, o retrato, o auto-retrato, a natureza-mor~ de outros Estados, seriam por eles visitad(

106
Catálogo da III Exposição da Família Artísti-
ca Paulista; a última delas realizada no Rio de
Janeiro, 1940.

., ,I
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!i
Catálogo da 11Exposição da Família Artísti-
ca Paulista, São Paulo, 1938. 1,1
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MAIO IVNHO 1939

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DA

FAMILIA.
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107
......
o
00
(Outro aspecto da operosidade dos pintores do GSH, que perseverará na
carreira de vários deles, é o da pintura mural de representações. Ao lado
das empreitadas para a execução de frisos com elementos geométricos ou
de estilização floral - que basicamente lhes assegurava o sustento - re-
ceberam encomendas para figurações por vezes de vulto, sendo de n~tar
que o contemplado co~ freqü~ncia se valia do préstimo dos colegas. A
regra era ceder ao desejo dos clIentes, ocorrendo, entretanto, circunstân-
cias em que se conciliavam o interesse de ambas as partes. Em fases poste-
riores, pelos anos de 1940, essa situação alterou-se para a aceitação das pró-
prias mensagens dos artistas. Muito se destruiu do que fizeram, porém sub-
sistem algumas decorações de diversos períodos (em excelente estado), que
serão aqui mencionada.§.J
Alfredo Volpi testemunhou que pertencera a um círculo de pintores, inte-
grado, entre outros, pelos citados Bernardino Ficarelli e Ernesto Frioli, além
de Aldorigo Marchetti, Tarquínio Rossi (1894-1970), Attilio Baldocchi
(1901-84), João Tonissi e, mais tardiamente, o jovem Mário Zanini.67 To-
nissi, em depoimento ao autor,6Rafirmqu que participara do Grupo duran-
te alguns anos, desde cerca de 1924, quando dos trabalhos dirigidos por
Frioli nas residências da família Jafet, no Ipiranga. A princípio não possuía I'
experiência alguma no ramo. Mas para aquele convívio levara conhecimen- I
tos adquiridos na Itália, entre 1911 e 1919, quando estudara nas academias
de Lucca e Roma, devendo registrar-se que este pintor do interior de São
Paulo (São Carlos), ainda hoje pouco reconhecido, por volta de 1915 fora I1I
relacionado a artistas do Futurismo, fator de influência em sua obra. II
Do que produziram é certo que pouco permaneceu. Datada de época mais I ti
recente é a decoração da capela de Monte Alegre - de Volpi, auxiliado li
por Marchetti e Zanini -, conjugando ornatos e representações a que fa-
remos alusão mais adiante. Ainda de Volpi (e Marche'tti) sobreviveram pat-
cialmente as pinturas a óleo de fins dos anos de 1930 em sobrado da famí-
lia Grecco, à ru4 Barão de Jaguará, 1155, no Cambuci. Não há nelas maio-
res aspirações. Ao alto da escada interna, vê-se, no teto, uma cena em trompe
l'oeU, com meninos nus, anjos e flores, junto a uma platibanda. O motivo
repete-se algo no teto ao pé da escada, onde aparece pequena balaustrada
com pássaros, flores e árvores. Os tons levemente azulados predominam
:f. depoimento de Volpi ao autor em 23
fevereiro de 1976. nessas figurações modestas, que revelam, entretanto, segurança e liberda-
~m20 de janeiro de 1987. de de execução. Nada restou da decoração de duas salas adjacentes.
:f. depoimentos de Hélio Morganti e An- De outra importância são as pinturas da capela da Usina de Açúcar de Monte
Maria Zorlini Guasti ao autor, respecti-
lente em 13 de outubro de 1986 e 21 de Alegre (Piracicaba), encomendadas a Volpi pelo proprietário, Pedro Mor-
~reiro de 1987. ganti, em 1937 e concluídas em 1938.69 Restauradas em meados da déca-
)s trabalhos de restauro foram realiza- da de 1960, acham-se em bom estado.7o Volpi preparara os croquis, trans-
por Mário Zanini. postos quase sempre a óleo por ele e seus colaboradores, Marchetti e Zani-

109
ni, ao longo de seis meses.71 A obra abrange, numa atmosfera de horror
vacui, tOdo o recinto do pequeno edifício de traços italianos renascentis-
tas. Pelas paredes reparte-se a ornamentação geométrica e floral, textos em
latim, assim como - o mais importante - várias representações (e.g., Ba-
tismo de Cristo, Quo Vadis, evangelistas e anjos), todas de cunho plástico
tradicional, certamente para atender à vontade do empresário. Os elegan-
tes anjos da pequena cúpula do transepto, de suaves vestimentas verdes
e azuis, constituem o ponto alto do conjunto. Sem dúvida essa obra con-
tém elementos valiosos para resgatar o conhecimento de outras represen-
tações no gênero e da pintura de ornatos. Recorde-se que desapareceram
decorações em edifícios religiosos, como as de data imprecisa, a cargo de
Volpi e Zanini, em igreja da Quarta Parada.
Data de 1945, aproximadamente, o painel de 150 x 200 pintado a óleo por
Mário Zanini, sob encomenda da família Morganti, em que traça, em vista
aérea, uma síntese da Fazenda e Usina Tamoio (na região de Araraquara).
Mais tarde realizaria outros painéis, por vezes de grandes dimensões, de-
senvolvendo sua temática de figuras populares em composições geometri-
zadas, como o do acervo do Palácio dos Bandeirantes. Lembre-se que, co- 71 Cf. depoimento de Hélio Morgan
mo Volpi, Zanini foi ativo em pinturas de amplas superfícies de azulejos. supra.

"'I

\.~
'O

- .
Vista lateral da Capela da Usina de Açúca
de Monte Alegre (Piracicaba-SP), decorad
''''J.rA''J'':':~j
por Alfredo Volpi, Mário Zanini e Aldorig'
Marchetti, em 1937-38.

110
De Volpi, em anos posteriores (1949), há a mencionar a participação na
série de murais do antigo pavimento da Maternidade e Pediatria do Hospi-
tal São Luís Gonzaga, no ]açanã. Ali trabalharam também Bonadei, Mário
Zanini, Manoel Martins, Nélson Nóbrega e Lúcia Suané (1930), com uso de
pintura a óleo. De Volpi são duas composições, as principais, que rema-
nescem do conjunto. Ambas espelham significativamente sua nova tendência
formal e a aquisição de um colorido transparente de verdes, ocres, rosas
e azuis. A primeira é dominada pela arquitetura de um coreto, aparecendo
em sua vizinhança um mastro junino e pássaros esvoaçantesj a outra arti-
cula alguns elementos (cavalinho de balanço, sol de rosto humano e papa-
gaio empinado). Bonadei buscou uma figuração despretensiosa, porém das
mais eficazes, para o olhar infantil, no friso de evoca tivos assuntos paisa-
gísticos, abarcando três paredes (datado de 1949), enquanto Martins des-
creve um parque de diversões, junto a edifícios, saturando o espaço de re-
gistros. Nada resta dos murais realizados por Nélson Nóbrega, Zanini e Lú-
mia da Capela da Usina de Açúcar de
He Alegre (Piracicaba-SP), decorada por
cia Suané, conservando-se um outro, de autor desconhecido, com cenas I'
de beira-mar e vivo colorido.
edo Volpi, Mário Zanini e Aldorigo Mar-
tti, em 1937-38.
Por vezes Rebolo utilizou a superfície arquitetônica para seus cenários pai- ,1
sagísticos. O exemplo mais antigo deve ser a colaboração que prestou a ,11
Pennacchi em 1937 na residência da rua Frei Caneca, 351 (ver adiante). I
Em 1944, pintou em afresco uma cena de vindima, evocando imaginaria- I
mente a Toscana, e outra a que intitulou Hospitalidade (duas gráceis figu- ti'
'Ij,
ras femininas diante de paisagem), na residência de Antonio Giudice, à rua ti'
]úpiter, 175. Retiradas da parede em 1984, encontram-se de posse de Adib lU
Yazbek. Não mais existe a decoração que se deve conjuntamente a ele, Rossi 1'11
I
Osir, Nélson Nóbrega, Quirino da Silva, Volpi e Zanini, preparada para o
carnaval de 1945, em benefício da criação do Clube dos Artistas e Amigos
da Arte, bem como a que lhe coube realizar, ao lado de Volpi, na igreja
do Instituto Maria Immacolata Piero Roversi, no Ipiranga, do começo dos
anos de 1950. Desse período é a paisagem em afresco do hall do edifício
de Artigas, à rua Piauí, 1081, elaborada ainda segundo o sentido espacial
e o colorido que o haviam distinguido anteriormente.

Um contínuo e perfeccionista labor de muralista marcou a produção de


Pennacchi, atraído pelo Humanismo quatrocentista. Em 1937, ele realizou
a óleo o episódio de vindima (com a ajuda de Rebolo na paisagem do se-
gundoplano) e um conjunto de figuras alegóricas na citada residência do
engenheiro Nicolau Filizola, à rua Frei Caneca. Depois atendeu a outras en-
f. Catálogo da exposição de Pennacchi comendas, com a decoração da capela da fazenda da família Prada, nas ime-
Irenta Anos de Pintura, São Paulo, diações de Santa Rita do Passa Quatro (SP).72Em seu atelier do Palacete
;P, 1973.
Santa Helena preparou os cartões dos óleos por ele transpostos no hall do

111
prédio de A Gazeta, na antiga rua da Conceição, contendo uma sinopse
da história da imprensa. Numerosas seriam suas obras, com seguro empre-
go da técnica do afresco, que aprendera por si mesmo em 1939. Acham-se
entre elas as amplas decorações da Igreja Nossa Senhora da Paz, em São
Paulo - iniciadas em 1941, em que se sobressaem o Nascimento da Vir-
gem e a Natividade, dominados por uma Crucifixão monumental-, e as
vastas decorações do Hotel Toriba (auxiliado por Mário Zanini), em Cam-
pos do Jordão, com motivos caipiras e cena com figuras de bandeirantes.
Datada de momento já avançado de sua carreira, é prolífera a empresa mu-
ral de Clóvis Graciano. Embora com um primeiro painel pintado em 1949,
somente quando de seu regresso da Europa, em 1951 (como premiado do
Salão Nacional), deu ele verdadeiro começo a essa atividade. Empregando
óleo e cera, foi autor de dezenas de representações (muitas de fundo histó-
rico) para imóveis de São Paulo e outras cidades, como as da antiga sede
de O Estado de S. Paulo, do Teatro João Caetano, da Fundação Armando
Álvares Penteado, do Paço Municipal etc. Por fim, são raras as referências
a esse respeito sobre Rizzotti, o pintor da secundária cena campestre, a óleo,
no Hotel Refúgio Alpino, em Campos do Jordão, na década de 1940.
Quando terminou a fase dos atelieres coletivos, repetimos, os artistas con-
73 Volpi obteve a medalha de ouro nl
tinuaram a manter os laços que os prendiam, como demonstram, entre ou- lão de Belas-Artes Muse Italiche, em 1
tros fatos, as várias empresas decorativas aqui citadas ou o episódio da cria- e a medalha de bronze no Salão Paulis
ção, em 1945, do Clube dos Artistas e Amigos da Arte, pela qual alguns Belas-Artes de 1935 e no de 1937. Bor
deles foram responsáveis. recebeu o prêmio Prefeitura de São f
e a menção honrosa, respectivamente n
Tais ligações de amizade e trabalho, como vimos, tiveram começo, para lão Paulista de Belas-Artes de 1934 e 1
parte deles, em período anterior ao do agrupamentoCNascidos em maioria 1937, e a medalha de prata no Salão N
nal de Belas-Artes de 1940. Pennacd
na primeira década do século, eram quase todos jovens no momento da nhou a grande medalha de prata no ~
arregimentação. Retraídos, entregues a afazeres simples - mas procuran- Paulista de Belas-Artes e no Salão Nac
do abrir espaço para a pintura -, nenhuma inclinação mundana (comum de Belas-Artes, ambas em 1936. Huml
a outros ambientes artísticos)parece ter assinaladosua vivênç@jAlgunsper- Rosa recebeu a medalha de bronze fi
lão Paulista de Belas-Artes de 1936. Re
maneceriam pelos anos afora rigorosamente distanciados das rotinas pro-
ganhou a pequena medalha de ouro n
mocionais. Nos primeiros tempos da comunidade, participavam do meio lão Paulista de Belas-Artes de 1936 e c(
das Artes Plásticasapenas pelo envio de obras aos poucos salões da época, cutivas medalhas de bronze e prata fi
onde receberam prêmios honoríficos próprios da tradição oficial.73Cer- lão Nacional de Belas-Artes em 1936,
tamente jamaislhes ocorrera a idéia de uma mostra conjunta. Coube a Paulo e 1940. No Salão Nacional de Belas-Art
1940, a medalha de prata foi atribuída
Rossi O~, que por eles nutria interesse, tomar a iniciativa de agregá-Ios nini, e a menção honrosa, a Clóvis GI
na FAP.\Como afirma Paulo Mendes de Almeida, "essa gente do Santa He- no. A Rizzotti coube a medalha de br
lena vivia para a sua arte obscuramente, longe do público e da crítica, sem na edição de 1942 desse último salãc
manter contato algum com elementos da corrente mais avançada ou da so- 74 ALMEIDA, Paulo Mendes de, De .I
ciedade apredadora das artes",74Segundo ainda o crítico, "seus contatos ao Museu, p. 133.
se limitariam aos acadêmicos",75 A ampliação dos relacionamentos ocor- 75 Idem, ibidem, p. 132.

112
reu essencialmente quando das mostras da Família e do Sindicato instala-
do no Palacete Santa Helena. É de lembrar-se a camaradagem que estabele-
ceram com pintores do Núcleo Bernardelli, entre eles, Quirino Campo fio-
rito, Sigaud, Bustamante Sá, Milton Dacosta e, evidentemente, Malagoli e
Takaoka,76 ambos de ~ão Paulo e amizades já antigas.
!Alguns dos pintores do GSH não possuíam senão instrução primárial Bo-
nadei e Martins, entretanto, atingiram os cursos de segundo grau.zanini,
Rosa e Rebolo fizeram o grupo escolar, o primeiro e o último matricularam-se
na Escola Profissional Masculina (Zanini foi depois aluno do Liceu de Artes
e Ofícios) e o segundo completou o curso de Belas-Artes. Pennacchi, na
Itália, adiantara-se em escola técnica (curso médio), abandonada pela aca-
demia de pintura. Três deles adquiriram apreciável cultura através do tem-
po: Bonadei, Graciano e Zanini.
/Õriginários do meio imigrante, onde eram antigas e difusas as ideologias
socialista e anarquista, pelo menos vários deles possuíam convicções pro-
gressist~ numa época de ditadura e intensas reivindicações da classe tra-
balhadora. Em Clóvis Graciano, que teve militância política, localizam-se
conteúdos sociais mais empenh~os, que se manifestam também em Ma-
noel Martins, Zanini e Rebolo.77 }Todavia a arte desses pintores não resul-
tou numa adesão a programáticas partidária§,j Como afirma Alice Brill:'
II
(;ara Mário Zanini e seus companheiros, a temática social de sua obra não repre- I
senta algo exterior à sua vivência, uma causa alheia a ser defendida em demonstra- ,I
poimento de Rebolo ao autor em 19 !I
vereiro de 1974. ção de solidariedade: para eles esta temática é auto-expressão. Confinados em seu
II
nnacchi esclareceu, em depoimento meio e forçados a dividir o tempo entre o trabalho de ganha-pão e sua paixão pela
tor em 7 de janeiro de 1986, que se pintura, seu engajamento político é de outra ordem: é uma luta pela profissão,
1I
ra "dissidente do Partido Fascista" e o que subentende uma luta pela sua classe social.7!0
:m razão disso, ele e sua família enfren-
problemas na Itália, o que contribuiu A não ser Pennacchi, eram céticos em matéria religiosa. Mário de Andrade,
I sua decisão de emigrar para o Brasil. ao referir-se à FAP. assim os descreveu:
em contato com o Consulado da Itá-
alizou trabalhos decorativos na Casa
IScio, localizada na alameda Barão de Operários, filhos de operários, ou de tradição proletária, todos esses representan-
ra. tes da escola de São Paulo, com a exceção única de Fulvio'Pennacchi, um místico
Mário Zanini e Seu Tempo, São Pau- não exatamente religioso, e apesar do exemplo insistente deste: toda essa Família
:rspectiva, p. 50, 1984. Artística Paulista era arreligiosa, materialista e sem Deus. I?ode ser até que qual-
DRADE, Mário de, Ensaio sobre C/ó- quer desses pintores fosse católico de consciência,"ou de preguiçoso desleixo de
'aciano, p. 160, jul./dez. p.160, 1944. se identificar com a sua personalidade legítimafem sua arte, porém, eles eram ar-
Centro ParanaeflSe de São Paulo (Edi-
Mart'inelli) e na Galeria há, religiosos, fortemente materialistas e agnÓsticos~
ctivamente.
lini expôs na Galeria da Livraria Bra- Para a maior parte deles, somente os anos de 1940 trariam a possibilidade
ie. Volpi, Pennacchi e Rebolo apresen- de apresentações individuais. Com efeito, Graciano expôs em 1941 e
suas mostras na Galeria Itá. 1943;80 em 1944 foi a vez de Volpi, Zanini, Pennacchi e Rebolo,81 assim

113
como de Bonadei (que fizera sua primeira mostra em 1929),82e, em 1944,
coube a vez a Rizzotti,83 Rosa preparava uma série de obras em 1946, pa-
ra esse fim, mas morreu antes de realizar sua exposição.84
fEm anos posteriores, sobretudo Volpi ganharia maior evidência, essencial-
mente na circunstância em que foi aproximado da arte concreta. Além de
Mário de Andrade, Paulo Mendes de Almeida, Luís Martins e Sérgio Milliet,
houve críticos, como Osório César, Mário Schenberg, Lourival Gomes Ma-
chado, Quirino da Silva, Luís Washington e Ibiapaba Martins, que, no de-
cênio de 1940-50 (ou mesmo mais adiante), acompanharam ~lguns deles.
A disseminação da arte abstrata deixou quase todos em situação marginali-
zada: somente em época recente puderam, por vezes, receber um tardia
reconhecimento público reparador.)Volpi, Pennacchi, Rebolo, Zanini, Gra-
ciano e Bonadei foram objeto deIivros ou dissertações universitárias e, à
exceção dos dois últimos, também de mostras retrospectivas. Em relação
a Manoel Martins, Humberto Rosa e Alfredo Rullo Rizzotti pouco ou nada
se fez. Recorde-se, ainda, a raridade de exposições reunindo trabalhos do
GrupO.85 E que a promoção e a especulação mercadológica se têm feito
sentir claramente em relação a Volpi, Rebolo, Pennacchi e Bonadei desde
a década de 1970.
~ fá recato
e a humildade são virtudes reconhecidas nos jovens pintores do
Santa Helena. Tudo isto não significou alienação diante do quadro artísti- 82 Na Galeria da LivrariaBrasiliense.
co de seu tempo. Bem ao contrário, revelaram-se atuantes na luta pelos 83 Na Galeria da Livraria Brasiliense.
princípios modernos, obtendo resultados no ambiente retardatário do Sa- 84Cf. depoimento de Teresa Rosa ao aut(
lão Paulista de Belas-Artes, fundamentando a FAP, contribuindo decisiva- em 25 de setembro de 1986.
mente para a criação e desenvolvimento do Sindicato dos Artistas Plásti- 85A mais cuidada foi a organizada pelo P:
ço das Artes/MIS, em 1975, intitulada 4
cos e participando de outras manifestações de importância, dentro e fora Anos - Grupo Santa Helena, reunindo n<
do Estado) venta obras dos nove artistas, numerosas d:
~ ~em dúvida, a análise penetrante da obra que realizaram, superando limi- quais posteriores à época dos atelieres CO
juntos. O Catálogo traz introdução da cur:
tações e dificuldades, no período de convivência e dos anos imediatos, quan- dora Lisbeth R.R. Gonçalves. Duas outr:
dó afirmaram mais suas individualidades, requer, de modo muito particu- mostras com artistas do Grupo tiveram li
lar, o cOJ?,hecimento dessa condição e trajetória de vida, que procuramos gar na Galeria 4 Planetas, em 1966, e na G
leria Uirapuru, em 1973.
enuncia;

114
II A obra dos santelenistas

I'
1

! I"
-!> No quadro das mudanças sofridas pela pintura de São Paulo, depois da eta- I ,1~,
pa de implantação do Modernismo, o GSH situava-se num plano litigioso, ~,
desaprovado quer pelos redutos conservadores, quer pelas posições mais ,111
avançadas. Isto era conseqüência de modernidade e tradição transformarem- ; j1
1I
se por um processo de reação mútua na linguagem de seus artista~ Dir-se-
li,
á, com razão, que este é um fenômeno bastante generalizado na época e
que na própria capital paulista outros artistas demonstravam orientação apro-
, I1
ximada. É certo, porém, que uma Foesão maior de conteúdo e forma mar-
cain~l~nte os pintores que partilharam experiências nos at~lieres do
Palacete SEnta Helena. Eram os "rapãzes da segunda turma", como foram
chamados,-parte-ponderável da existêncIa..da-Escola de São Paulo - a qual,
para Mário de Andrade, "baseia-se num conjunto de caracteres que lhe dão
a dignidade dos esforços em comum: vem de baixo para cima, ignora o
individualismo e se proletariza na tendência à tradição", tradição que não
"se pode confundir com o academismo';'l Em particular constituíam os
membros do GSH um fenômeno raro dê10rça coletiva na história da arte
contemporânea do País. Entenda-se, entretanto, que, no universo de seus
interesses comuns, não deixavam de estar presentes diferenciações por vezes
bastante acusadas.

j) \Contrastando com a prioridade atribuída à forma pelos modernistas ante-


n Pintor Clóvis Graciano", Correo Lite- riores e com seu transcendentalismo, dedicaram-se esses artistas de uma nova
ia, Buenos Aires, p. 5, 11 novo 1944. geração e de outra classe social pelo retorno aos apelos estéticos direta-

115
mente centrados na realidad~ Com tal objetivo, uma unidade de propósi-
tos determinou a configuração discursiva que os distingue nos rumos da
pintura nacional, sem prejuízo para os impulsos pessoais. .CI

Vimos os limites cronológicos de atuação do Grupo, entre 1935 e o início 7


J- '-<é"
da década de 1940. Antes desse tempo, havia, em certos de seus futuros <5'~~.
componentes, uma predisposição para o ideário solidário que os assinala- ~(; /"
ria. Observamos que aqueles anos de intensa convivência caracterizaram-
se, para uns, como crescente robustecimento de carreira e, para outros, (j~'if'<
(J,
como exórdio destinado a rápido amadurecimento. E que, em seguida à
fase comunitária (num período em que sua evolução individual atingiria
estágios de excelência), continuariam relacionados, mantendo, em aspec-
tos de seu trabalho, elementos básicos da interação que os norteara.
~ À diferença de outros movimentos contemporâneos, que surgem não raro
de atitudes traçadas a priori, muitas vezes para a afirmação de uma posi-
ção de independência radical e de contestação, o GSH despontou despre-
meditado e despretensioso sem manifestos, no silêncio do trabalho e no
exclusivo propósito de realização profissional) A própria idéia de tornar
pi.blica sU3>xistê~ de travaílleurs cachés, co~i obra de
t~_~, Decorreria depois algum tempo, como notamos, para-quêrõs-
sem reconhecidos pela crítica2 e para que começasse a se impor a deno-
minação identificadora.
~ Por outro lado, enquanto parte dos pintores ganhava ressonância, outra
foi praticamente esquecida nas abordagens quase sempre sumárias que se
fizeram sobre o Grupo nas décadas posteriores.3 A atenção para essa pura
aliança de artistas só tomaria nova consistência nos anos de 1970, quando
de retrospectivas individuais, por vezes contendo pesquisa original, e mo-
mento em que também se organizaram mostras sobre a pequena facção co-
mo um todo.

Desde as primeiras reflexões e estu90s da produção do GSH, ressaltaram-


se dados fundamentais a respeito~Elarexprimia a imaginária de indivíduos
da classe trabalhadora e da burguesia de exíguos recursos econômicos, no
geral pertencentes à colônia italiana de São Paulo, que assumiam uma po-
sição modernista moderada. Por outro lado, salientou-se a correspondên-
cia indissolúvel existente entre o espírito de classe social a que pertence
essa grei de pintores e sua instauração artístici] Mário de Andrade - que,
2 No artigo de ANDRADE, Mário de,
vivendo fora de São Paulo, apercebera-se da existência do Grupo em 1939, Paulista Família." .
no citado artigo "Esta Paulista Família" - fez em seus dois rodapés sobre 3 Em reportagens e entrevistas publi
o Salão da Feira Nacional de Indústrias, em 1941, comentários penetrantes em jornais e revistas nos anos de 194(
sobre o "proletarismo psicológico intenso" desse "grupo admirável" de guintes e em exposições do Grupo.

116
pintores que, a seu ver, constitui a "formação mais socialmente importan-
te da Escola de São Paulo".4 Anos depois, no "Ensaio sobre Clóvis Gra-
ciano", datado de 1944 e publicado postumam~nte, retoma a diagnose do
"núcleo principal" da Família Artística Paulista:C,O que caracteriza esse gru-
po é o seu proletarismo", o fator que determina a sua "psicologia coletiva,
e conseqüentemente a sua expressão:1 O ensaio de Mário de Andrade, que
assimilava elementos do pensamento marxista, como era internacionalmente
comum na época, é sugestiva tentativa de incursão no terreno sociológico
da arte para esclarecer a via seguida pelos santelenistas.(Sem dúvida, a trans-
missão da ideologia de classe na obra desses artistas é fator imprescindível
para explicá-I~Aqui podemos dirigir uma crítica ao conceito de "ideolo-
gia imagética" de Nicos Hadjinicolaou, ou seja, ao que ele entende "como
característica essencial dos 'objectos', dos 'factos' que pertencem ao do-
mínio da produção de imagens".5 A profunda complexidade da arte não
permite aceitar o reducionismo proposto pelo teórico neomarxista, em-
I i
bora se deva reconhecer sua nova e válida contribuição à pistoriografia ar-
tística e seus métodos de análise. Para Mário de Andrade, a natureza da ar- I,
te do Grupo de São Paulo é exclusivamente ditada por seu proletarismo I'
11

e em seu arrazoado, que também assume um caráter freudiano, ele dá par- I1II
ticular relevo à aspiração dos pintores de transpor as fronteiras de sua clas- 1,11

se e atingir escalas sociais mais altaS]


: I

I I
A pintura foi pra esses expressivos filhos de operários uma aspiração de subir. Su- I

J'"", bir, em complexo sentido: não só porque esses artistas abriam caminho através ,,
y,~ da arte, para a sua educação, conquistando os meios que em nossa (...) igualdade :I1I
classista lhe são praticamente negados, como também porque se apossavam do I

di jeito mais rápido de se libertar de sua classe, pairando nesse limbo paraclassístico
da arte, que lhe permitia, como a um sangue, circular indistintamente pelos com-
partimentos da sociedade. 6
O crítico desenvolve sua tese sobre a "qualidade elevada" desses "operá-
rios qualificados", que ousa comparar à ~ópria Escola de Paris "pela se-
riedade profunda", estudando-os em sualtécnica tradicionalista, encon-
trando refinamentos aristocráticos na tonalização discreta de seus quadros
'IDRADE, Mário de, "Um Salão de Fei- e interpretando particularmente sua temática purista de paisagens e
, 11", Diário de S. Paulo, São Paulo, 21 naturezas-mortas como indícios inconscientes de vontade de ascensão so-
e 2 novo 1941. cia!2Jobserva as "casinhas operárias arrabaldeiras, as chacrinhas operárias
\,DJINICOLAOU, Nicos, História da Ar- suburbanas", onde vê "a confissão de classe: a aspiração à pequena pro-
Movimentos Sociais, Antonio José Mas-
), Lisboa, p. 151, 1973. priedade".8 E descobre nas naturezas-mortas "com grande repetição os
mRADE, Mário de, Ensaio sobre Clóvis \li~ pêssegos, as maçãs, as uvas, frutas mais caras e delicadas. Enfim os temas
Iciano, p. 157, jul./dez. 1944. 'príncipes e reis', realce y dignidad, da natureza-morta..." Diz Mário de
em, ibidem, p. 158.
em, ibidem, p. 159.
l Andrade que esses pintores "não tinham a exigência física da fome" e, em
razão disso, ignoraram alimentos mais cotidianos nas representações. "Mas,
'\\I\\<-.~ t (j\(jUmoJ) k-Y>-",J..:, cd') <;}. c,-uc.cl..;fJ
117
se não tinham a exigência física da fome, tinham a presença psíquica do
seu fantasma, acentuada pela 'traição' que aspirava a subir".9

~ãO de muito interesse estudos como esse, voltados para os ingredientes ,?:
sociais, ecpnômicos e psicológicos que contribuem para a formação do dis- . t,..~'
tinto universo artístico. A temática surge aí em relevo e não é secundária ~" ~-
em relação aos componentes formais da obrà;como de há muito demons- (' ~-r-
trou Friedrich Antal, um dos pensadores maiores da linha de pesquisa so-
ciológica da arte. ~ravés dela se abrem perspectivas mais gerais para a com-
preensão estrutural das relações entre os valores propriamente plásticos
e o largo plano da existência que envolve o objeto artístic~FOi o que Má-
rio de Andrade procurou extrair de seu exame, onde, entretanto, não fal-
tam ilações carregadas de subjetividade. Obviamente não se poderia admi-
tir que, pelo fato de pertencer a certa classe social, um artista se limite tão-
somente a transmitir os conteúdos que a distinguem em relação a outras.
. \. Sua grandeza residirá na superação de ideários localizados para colimar ob-

jetivos de significado universal.

j: ~êlímento
origem de
p!oletária
sua obra.dosPorém
pintores
não santelenistas
traíam eles osé fundamental paraa que
extratos sociais o enten-
per-
tenciam ao procurar horizontes mais vastos de expressã0 O proletarismo
achava-se em tudo embutido naturalmente, pelas condições artesanais de
sua formação, fossem elas resultado de autodidatismo ou por vezes tam-
bém do aprendizado em escolas de ofício ou ainda encorpadas pela convi-
vência assídua que mantiveram entre si. No entanto igualmente aqui a pro-
blemática não é tão simples, na medida em que alguns freqüentaram cur-
sos de Belas-Artes, inclusive no Exterior, e que houve os que se aprimora-
ram junto a mestres locais de outros padrões sociais e culturais, devendo-
se ainda examinar os contatos que aos poucos usufruíram com artistas do
Modernismo de fora de seu acanhado milieu. Qualquer estimativa de sua
produção requer, ainda, a consideração de que
ção per!fériça, atentos à 2i!'!.t~roQéia,
~encontravam em situa-
sohrNnclo ~ it~li~na e a francesa,
éomo demonstra a absorção de elementos heterogêneos de lon~ tradição
9 Idem, ibidem, pp. 160-2.
representativa, do Novecentismo que a recuperara, do Impressionismo e
10Alguns deles (Bonadei, Graciano e Zan
do Pós-Impressionismo - especiaTmente Cézanne -, além do Expressio- ni), em seu esforço de ascensão, formaral
nismo. Aqui podemos nos reportar à comunicação advinda de livros e re- pequenas bibliotecas. A de Graciano, hOI
vistas estrangeiros~ e a impulsos receoidos de exposições quecfiegaVãm de posse de seu filho José Roberto, dev
do Exterior. NUllí-a)palavra, aldinâmica desses artistas era das mais apreciá- crescer desde aqueles anos. Quando se ]
veis e caracterizada por uma progressão contínua no desejo legítimo de garam de perto a Paulo Rossi Osir, é evidel
te que consultavam seus livros, catálogos
alargar sua significação estética, onde acaba por prevalecer a atmosfera de revistas. (Os acervos deste último e de M
cultura instigada localmenté']fodavia, em quase nenhum aspecto, naquela rio Zanini encontram-se hoje incorporadc
etapa de suas carreiras, h~es interesse pelas vias formalistas da ar tO à biblioteca do MAC-USP.)

118
- --
Deve-se insistir no fato de que seu ~nominador comum estava na ex{?e-
riência da pintura decorativista, no cultivo de um artesanato específico -
õu seja, em fundamentos que podem gerar a arte no mais alto sentidóJ Re-
corda André Chastel, em seu livro L 'Art Italien: "O hábito ancestral ~ or-
nar o décor interior de ladrilhamentos, de pinturas ornamentais de pare-
de, estuques, mosaicos (...) alimentou sempre um artesanato especial de
onde sempre pode sair um artista inovador, um Cimabue, um Borromi-
ni..."ll No c~so aquLemestudQl as práticas da colônia italiana paulista fo-
ram valiosas para estimular as sensibilidàdes mais abertas.
É claro que há outros dados a apreciar na formação dos membros do GSH,
comQjl captação técruca e cultur;n-;-porum ou outro, no próprio ambiente
.penin~ular. Ao lado de um exemplo d{autodida.!!smopuro, registrou-se
a recorrência da maioria ao aprendizado escolar, a cursos livres e mesmo
a aulas particulareS'lNum outro momento - e sem querer generalizar -
assinale-seo que poctam auferir da amizade com pintores que deles se apro-
ximaram, principalmente Paulo RossiOsir e Vittorio Gobbis, ou de elemen-
tos ~própria obra de LasarSegall,como se revela no caso de Manoel Mar-
tins4.!:.>e
Portinari, que fora convidado especial do 11Salão da FAP,emana-
vam influências que se fizeram sentir bastante em Clóvis Gracianõ1 Para
a compreensão dessa célulade pintores, entretanto, é preciso remonetrlsem-
pre aos antecedentes do artesanato artístico e à atividade grupal discreta,
no princípio isolada, como testemunha Paulo Mendes de Almeida.12Se-
gundo Mário Zanini, antes que a comunidade se formasse e mesmo depois
de seu surgimento,f'pintávamos instintivamente, nada entendíamos de ten-
dências como o Cu1>ismoe só num segundo momento começamos a estu-
darj.13 Sua formação, não obstante o que passavam a assimilar, conserva-
va muito de sua base, e isto lhes dera a resistência necessária para enfren-
tar com autenticidade os inevitáveis confrontos inerentes à vida artística. 11 CHASTEL,André, L 'Art lta/ien, Pa
Larousse, I, p. 10, 1956. Francesco Cast
É preciso compenetrar-se disso para chegar ao cerne de seu proletarismo Borromini (1599-1667).
em conflito com outras posições modernistas, o fato, registrado por Mário 12 ALMEIDA, Paulo Mendes de, De An
de Andrade, de que eles "não copiavam nunca" e, "como artistas verda- ao Museu, p. 160.
deiros, assimilavam o conteúdo dos exemplos", pois eram "expressional- 13Cf. depoimento ao autor em 8 de ju
de 1968.
mente artistas criadores, na pesquisa da expressão nova e dum fazer me- 14ANDRADE, Mário de, Ensaio sobre (
lhor" .14
vis Graciano, p. 158, juI./dez. 1944, p. 1
15Um entrevero surgiu entre Mário de.
Vários críticos, a começar pelo autor de Macunaíma, aludem à importân- drade e Luís Martins a propósito do art
cia, no meio paulistano, de pintores como Osir e Gobbis. No artigo de 1939 "Esta Paulista Família" e os conceitos a J
ele dera realce a sua exemplaridade técnica (e à áe :segall), considerando peito da técnica da arte emitidos pelo
tor. Ver MARTINS, Luís, "Que É Isso, J
fecundantc:se.'l destro !!létier pictórico, que, observado muito à risca, po- rio?", Cultura, n? 10, Riode)aneiro, p.
dia, contudo, inibir acria.t.iYidade. "A Família", seduzida pelo desvelo téc- ago. ANDRADE, Mário de, "Técnica e
nico, "falta a coragem de errar", ele diz.15 Nos membros do GSH, Mário te", idem, n? 12, p. 20 out.lnov. 193~

120
de Andrade percebeu depois os rogressos da liberação. O que cabe outra
vez frisar é que, muito antes dos contatos com Slr e Gobbis, a maioria
dos santelenistas já possuía o sustento de longa experiência artesanal. Ha-
via, por outro lado, inconciliáveis discrepâncias entre, principalmente, o
Verismo escrupuloso a que tendia Osir e a pintura crescentemente mais
livre, mais espontânea e moderna dos artistas do Santa Helena. De Ernesto
de Fiori, por sua vez, derivavam influências localizadas em ~anini e Volpi
apartir de 1940, aproximadamente, convertidas, entretanto, às substân-
ctãS<jUetraziãiTIdas origens. Os que se tinham familiarizado com o ensino
acadêmico, como Bonadei, Manoel Martins e Humberto Rosa, souberam
aproveitar certos elementos, a nível de desenho, no principal, mas diluíam
esses conhecimentos na amplitude de sua sensibilidade.
JÃpaisagem foi para quase todos a via de afirmação por excelência. Aqui
] o Impressionismo germinava neles como idéia de pintura ao ar livre, de
procura de sítios suburbanos e urbanos capazes de atender a seu apelo te-
Lmático voltado para a vivência popular.

Manoel Martins, Guerra, c. 1943.

121
&ários reterão sobretudo a lição de Cézanne na articulação de seus espa-
ços. É possível que da contemplação de obras antepassadas ou de ilustra-
ções - fossem elas as paisagens atmosféricas de um Giovanni Bellini
(1431-1516) ou as vistas singelas e quaisquer de Corot - derivassem liçõ~
Se uma parte do Grupo permanece calma e mais estática na ordenação es-
pacial, como Rebolo e Pennacchi, outros, comoNolpi e Zanini, se decidi-
rão pela composição apoiada em ritmos expressionistas.
Mário de Andrade deixou-nos um dos mais perspicazes estudos desses "ex-
pressa dores da paisagem paulistana" e do meio suburbano que os inspir~
Uma das coisas menos turísticas e espetaculares que conheço e no entanto mais
agradáveis é a paisagem suburbana de S. Paulo. Não há nada como paisagem, que
possa contentar mais humanamente que a visão dos nossos subúrbios. Toda a ter-
ra está trabalhadíssima, dum trabalho que vem de baixo para cima. Nada das aris-
tocráticas vistas alpestres da Tijuca, em que, na grandeza do matagal, se abrem
as miríficas residências dos milionários. Nada dos subúrbios cariocas da E. F. C.
B., em que a distância amontoa as casinhas umas sobre as outras, sem verdes nem
o verdadeiro espírito rural do subúrbio. Os subúrbios cariocas são legítimos bair-
ros pobres, com todas as deficiências vitais dos bairros mal dispostos e nada das
graças e da higiene de viver dos verdadeiros subúrbios. Eu sei que há neles uma
"poesia" também, mas os que a souberam tratar, os Lima Barreto, os Marques Re-
belo, os Ribeiro Couto, a conceberam triste e penosamente humana.
A coincidência é perfeitamente explicável:rã poesia do subúrbio carioca nos foi
revelada pelos prosadores; a do subúrbio paulistano pelos pintores. É que a pro-
sa, sendo mais conscientemente uma crítica da vida, exige o drama e não se aco-
moda bem na descrição do bem-estar e do agradável. E quando São Paulo deu
o cOntista que lhe revelou a "poesia" do pobre, esse contista lhe ignorou comple-
tamente o subúrbio, e foi bairrístico, nos dando Brás, Bexiga e Barra Fun~
O subúrbio paulistano é uma gostosura de se ver. Grupos claros das casas peque-
nas, com seus telhados róseos, entremeados de plantações, hortas, pomares. Para
certos iados da cidade essas pequenas propriedades operárias já se envaidecem
em chácaras mais ambiciosas, de subidos de classe. Deus me livre negar haja por
aí muito drama e a "poesia" do sofrimento, mas não é só o aspecto plástico que
despista essa infelicidade, esta se manifesta muito mais genericamente humana que
de classe. Se esta observação não justificará nenhum descaso nosso pelos (...) ou-
tros, é certo que a nossa vida suburbana possui um bem-estar prático de vida que
lhe é dado pela convivência do verde, do manso ar puro do campo e da posse
de sua propriedade. /
1:}.. esse grupo de pintores paulistanos, dotados de um proletarismo psicológico in-
tenso, coube descobrir e revelar essa paisagem suburbana da cidade. É mesmo
este um dos bonitos e comoventes casos "humanos" de arte que conheço. Seria
mesm~ curioso compará-Ia ao de nosso outros grupos plásticos nacionais, igual-
mente Importantes, mas um pouco ciosos (e com razão!) da originalidade e exotis-

122

L
mo de seus costumes e paisagens. E isto se prova por serem mais numerosoS e
mais valiosos os desenhistas que os pintores, em certos centros do norte. (...)
A contribuição destes paulistanos difere profundamente como sentido e expres-
são. Nada tem de combativa, não respira e menor espécie de intelectualismo: é
plástica por excelência. Mas revela de maneira intensa e comoventíssima um so-
nho, uma aspiração de classe. A graça amável, o idílio sossegado do subúrbio pau-

dade
listanocromática em que
foi transferido há aum
para telahumilde e calmo de
numa mansidão gosto (desejo?..)
formas quietas, de viver.
numa (...)
suaviJ
Essa a grande expressão e o melhor sentido social que tiveram até agora estes ar-
tístas. Eles souberam descobrir e cantar toda a poesia humana de uma paisagem
e, de alguma forma, todo o sentido profundo de uma classe.rA arte deles não se
:anini, Três Figuras Sentadas, 1." manifestou combativa, mas representa uma aspiração, que não deixa de ter seu
'40. queixume. Sem barulho, sem nenhum ódio, ela é uma dor dinâmica, como é a
dor das aspirações. E se se fizesse um salão só dedicado à paisagem suburbana
de São Paulo, ver-se-ia toda a grandeza de contribuição artística e toda a indecisão
de contribuição estética deste grupo admirávelJExatos em sua função de artistas
e excelentes artesãos, e por isso coletivamente grandes, estes pintores são menos
importantes por enquanto como contribuição individual. É certo que a arte impli-
ca também maior liberdade. Mas também não é menos certo que um Bonadei, um
Zanini, um Volpi, um Graciano e outros cada vez se distinguem mais e se esfor-
çam por adquirir a amplitude dessa liberdade. Mas desde já a contribuição do gru- I,
po é a da maior importância para a pintura brasileira.16 I
Ao referir-se a Volpi, Mário de Andrade notou o antídoto impressionista
na ausência da cor clara. Os paulistas davam-se aos cinzas, aos tons foscos. I
Ao ver do crítico, isto traduzia um refinamento de espírito,17 e sobre es- I!
sas tonalidades baixas, tão características, montaram-se teses, como a de i
Luís Martins, que nelas descobriu equivalências do pessimis!llo gerado pe-
la baixa do café.18 Oli, dizia-se, como Di Cavalcanti, que,[2'no Brasil, há JI
-mais razão para um colorido intenso porque o colorido intenso é um ele-
mento mais são (sic), mais direto na interpretação da natureza ou na sua
Salão de Feira lI", Diário de S.
;ão Paulo, 2 novo 1941.
própria representação artística" j
"O elemento cor", afirma o pintor, "de-
ve ser para nós um elemento de eloqüência e de afirmação." Considerava,
~DE, Mário de, Ensaio sobre Cló- assim, a pintura paulista como "uma estética pauperista", algo "tanto mais
:iano, p. 158, jul./dez. 1944. estranho num país como o Brasil, que pode ser pobre por muitas coisas,
MILLlET, Sérgio, Pintura Quase
(Luz-Paisagem-Arte Nacional), Por- mas que é riquíssimo em cores, milionário mesmo".20 Antes de Di Caval-
e, Globo, pp. 76-8, 1944. canti, Sérgio Milliet contestara a idéia da paisagem brasileira de horizontes
WALCANTI, "Cor, Poesia, Vida", sempre azuis, de "cores nítidas e quentes, planos marcados, luminosida-
~ Manhã, São Paulo, 10 jun. 1943 de".21 Ele acrescenta: "Outra coisa ainda contradiz a fórmula da paisagem
) autor).
ibidem. brasileira; a grande variedade de climas do Brasil e, por conseg,uinte, de
ET, Sérgio, O Sal da Heresia (Far- atmosfera plástica". 22 Afinal, podemos afirmar, haverá (e ele~ eXistem) ar-
cos e Artistas), São Paulo, Departa- tistas escandinavos temperalmente voltados para as cores v~vas.e artistas
le Cultura, p. 112, 1941. de regiões como a nossa, nem sempre tão tropicais, que se mchna~ para
ibidem, p. 113. uma paleta de reação à luz plena. Ruben Navarra, ao comentar a pmtura

123
de São Paulo nos anos de 1940, aludia ao "influxo das suas próprias condi-
ções sociais - que lhe dão o ambiente de uma metrópole do ocidente in-
dustrial" e a "sua forte preocupação social e humana"23 e também se re-
feria a São Paulo, terra de clima e luz parecidos com os da Europa.24 Co-
mo dissemos noutro texto: "Os pintores de São Paulo simplesmente des
cobriram este céu pesadamente nublado e a atmosfera brumosa da paisa-
gem paulista, fazendo interpenetrar-se os fatores físicos do ambiente e a
sensibilidade grave de seu temperamento" .25 '-
~
r5eu impressionismo, tonalmente, por assim dizer, à rebours, revelava-se
'fia paisagem, como aliás, em outros aspectos de sua figuração, de uma con-
sistente analogia de visão. Inevitavelmente, do ponto de vista temático, tra-
balhavam sempre os mesmos cenários suburbanos e urbanos de São Pau-
lo, as mesmas praias. Por vezes o descampado, os lugares ermos, a nature-
za selvagem. Sua escolha recaía freqüentemente nos vagos limites que se-
param a cidade e o campõ. ~
Quase sempre anônimo, esse espaço possui marcante caráter de gosto po-
pular. São pequenas casas despojadas, dispersas pelo solo ondulante, jun-
to a árvores e terrenos cultivados. Seu único adorno é, às vezes, o lambre-.
quim. Pintam também as ruas de terra batida, as margens rústicas de um
rio, a praia dos excursionistas de fim de semana. Isto muitas vezes lhes basta.
Amiúde, ~figura humana, ainda que vista a meia distância, reduzida a si-
lhueta, torna-se elemento de animação integrada, não raro indispensável,
como nas lavadeiras de Zanini e nos lavradores de Rebo@]Excepcional-
mente podem deter-se diante de um motivo prestigioso ou que acuse um
ponto de referência no tecido citadino: a velha ponte das Bandeiras, a se-
de da antiga Associação Athlética São Paulo, edifícios das imediações da
praça da Sé, que divisavam dos atelieres, igrejas como as de São Vicente,
Itanhaém e Embu. Porém, a rigor, não pintavam essa arquitetura no senti-
do da "paisagem-retrato", e sim, via de regra, como elementos comuns.
Toda essa vi~ualidade é de uma franqueza a que não falta 00irismo da ...
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in~enUidadej ~
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~~ Tais traços coletivos que se reconhecem no GSH não podem fazer perde
de vista as particularidades de cada um de seus artistas. Formavam sem dú- 23"Fichas da Pintura Brasileira
vida uma oficina, naquela acepção que Roberto Longhi deu ao termo num rânea", Diário de Notícias, Ri<
24 set. 1944.
de seus mais celebrados estudos: um forte substrato solidário de expres- 24"Salão de 1941", Diário de 1
são que não exclui sensíveis caracteres de inventividade pessoal. E que tam- de Janeiro, 5 out. 1941.
bém aqui se ajusta se levarmos em conta a origem quase sempre operária 25 Catálogo da Exposição de 1
dos santelenistas e sua aplicação artesanal. ./
no MAC-USP, p. 18.

124
Dentre todos Volpi era o pinto!: sI~ maiores recursos plásticos - evidência
que se confirmou nas etapas de sua coerente e vigorosa evolução poste-
rior. Era também o mais experiente, com uma obra que remontava à se-
gunda década do século. Autodidata, amealhara conhecimentos na pintu-
raãeqúacrros- e na decoração de igrejas e residências, das quais nos restam
raros exemplos.
"Fui um pintor sem mestre nenhum!", repetia ele ainda recentemente.26
Sem dúvida, embora catalisasse para seus evidentes dons sensíveis os fato-
res ambientais, a que contribuía o círculo de artistas decoradores de for-
mação italiana a que pertencia ao menos desde os anos de 1920, entre os
quais se encontrava João Tonissi, experiente do próprio Futurismo e avan-
çado para os padrões de Volpi na época. Num certo momento, a amizade
que o ligou a Mário Zanini e depois a Rebolo e Bonadei preparou o agrupa-
mento da praça da Sé.
Já nos anos inaugurais, utilizando quase sempre o óleo sobre cartão, ma-
deira e tela, Volpi demonstra p~dileção pel!}paisagem_e pela figura huma-
na, sobret~d~peIaprini~Esses objetivos perdurarão com insIstência
até à década de 1940. Em termos de paisagem, o casario anônimo do Cam-
buci, os charcos do Canindé, o bairro do Jabaquara e Moji das Cruzes atraem
principalmente seu olhar, assim como as praias, que pintava desde os anos
de 1920. Como exemplos marcantes de sua produção dessa época citamos
Os Girassóis (meados da década de 1930, de posse da família do artista)
e outros quadros com aspectos de Moji das Cruzes (coleções do MAC-USP,
de João Marino e particular), datáveis do final dos anos 1930 e começo da
década seguinte; uma vista de Itanhaém, dominada pela torre da igreja (Fun-
dação José e Paulina Nemirovsky); marinhas de Itanhaém (coleções da fa-
mília do artista, IEB-USP e LídiaJustus). S~!).teresse concentra-se no ha-
bitat popular ou naquilo que o reflete.

-p Em seu espaço germina uma cor turva, aplicada por pinceladas que dei-
xam o rastro denso do óleo no suporte, matizando todos os planos, sejam
eles os mais construídos (casas, sobretudo), sejam os mais instáveis, que
definem o solo e o céu. À parte certos registros superficiais de a.lgum en-
ternecimento que não lhe são próprios, esse gênero de representação pos-
sui em Volpi uma específica vitalidade que, no exímio conhecedor da arte
de pintar em que se transformou, muito se deve aos recordados segredo~
)epoimento de Volpi ao autor em 4 de
il de 1986. de ofício] Margherita Sarfatti a este respeito diz que "ele faz p~n~ar em Carra
'Terra do Brasil", in Espejo de Ia Pintu- por uns modismos de mão e de toque, apropriados da tradlçao dos bons
Actual, Buenos Aires, Argos, p. 111, artesãos por certa divina sutileza em solucionar problemas complicados sem
i7. perceber que corta nós górdios".27

125
de São Paulo nos anos de 1940, aludia ao "influxo das suas próprias condi-
ções sociais - que lhe dão o ambiente de uma metrópole do ocidente in-
dustrial" e a "sua forte preocupação social e humana"23 e também se re-
feria a São Paulo, terra de clima e luz parecidos com os da Europa.24 Co-
mo dissemos noutro texto: "Os pintores de São Paulo simplesmente des
cobriram este céu pesadamente nublado e a atmosfera brumosa da paisa-
gem paulista, fazendo interpenetrar-se os fatores físicos do ambiente e a
sensibilidade grave de seu temperamento". 25 <-
~
Seu impressionismo, tonalmente, por assim dizer, à rebours, revelava-se
'fia paisagem, como aliás, em outros aspectos de sua figuração, de uma con-
sistente analogia de visão. Inevitavelmente, do ponto de vista temático, tra-
balhavam sempre os mesmos cenários suburbanos e urbanos de São Pau-
lo, as mesmas praias. Por vezes o descampado, os lugares ermos, a nature-
za selvagem. Sua escolha recaía freqüentemente nos vagos limites que se-
param a cidade-e o campo. ~
Quase sempre anônimo, esse espaço possui marcante caráter de gosto po-
pular. São pequenas casas despojadas, dispersas pelo solo ondulante, jun-
to a árvores e terrenos cultivados. Seu único adorno é, às vezes, o lambre-
quim. Pintam também as ruas de terra batida, as margens rústicas de um
rio, a praia dos excursionistas de fim de semana. Isto muitas vezes lhes basta.
Amiúde, [.figura humana, ainda que vista a meia distância, reduzida a si-
lhueta, torna-se elemento de animação integrada, não raro indispensável,
como nas lavadeiras de Zanini e nos lavradores de ReboI.2]Excepcional-
mente podem deter-se diante de um motivo prestigioso ou que acuse um
ponto de referência no tecido citadino: a velha ponte das Bandeiras, a se-
de da antiga Associação Athlética São Paulo, edifícios das imediações da
praça da Sé, que divisavam dos atelieres, igrejas como as de São Vicente,
Itanhaém e Embu. Porém, a rigor, não pintavam essa arquitetura no senti-
do da "paisagem-retrato", e sim, via de regra, como elementos comuns.
Toda essa visualidade é de uma franqueza a que não falta ofíirismo da .f'
~

ingenuidade. .,..-
J ~
- ~ Tais traços coletivos que se reconhecem no GSH não podem fazer perde
de vista as particularidades de cada um de seus artistas. Formavam sem dú- 23"Fichas da Pintura Brasile
vida uma oficina, naquela acepção que Roberto Longhi deu ao termo num rânea", Diário de Notícias,
24 set. 1944.
de seus mais celebrados estudos: um forte substrato solidário de expres- 24"Salão de 1941", Diário ti
são que não exclui sensíveis caracteres de inventividade pessoal. E que tam- de Janeiro, 5 out. 1941.
bém aqui se ajusta se levarmos em conta a origem quase sempre operária 25 Catálogo da Exposição de
dos santelenistas e sua aplicação artesanal. no MAC-USP, p. 18.
Refinamentos e rudezas mesclam-se nessa visualidade. A singeleza e até o
pauperismo dos elementos que mobiliam seu espaço demonstram resolu-
ção de escolha imagística que se mantém no universo morfológico aos pou-
cos abstratizado da evolução posterior. Em tal rumo estavam filtradas con-
fluências da antiga tradição tonal italiana e da mais recente tradição mo-
derna francesa - Impressionismo e Cézanne -, assim como do Expres-
sionismo, mas sem traumas nórdicos. É de notar que nutria simpatia pelo
pintor primitivo de Itanhaém Emídeo Souza, a quem conheceu por volta
de 1940,28 instante em que, como dissemos, constata-se alguma incidên-
cia de De Fiori em suas marinhas, por vezes mais agitadas, como no exem-
plar do IEB-USP. No principal, contudo, Volpi amadurecia contemplando
esses modestos pedaços de mundo através de um olhar essencialmente in-
terior, sem jamais desvirtuar a condição da realidade de apoio e sem por
isto deixar de transformá-Ia em intuitivas sínteses formais e acordes de cor.
Seu escopo era atingir significados plásticos primordiais ou fazer do tema,
da forma e da cor uma só natureza.
Quando se estabeleceu a união de artistas do Santa Helena, Volpi levou
para o grupo o exemplo de suas qualidades técnicas e expressivas e a índo-
le de um partido temático que fora o primeiro a desenvolver nesse meio.
Integrou-se àquela atmosfera de trabalho, participando de suas atividades,
entre elas as excursões para a pintura exterior, pelos subúrbios, interior
do Estado e borda oceânica.29
Algumas afinidades mais acentuadas declararam-se entre tais artistas, co-
mo no caso de Volpi e Zanini, este onze anos mais moço. Conheciam-se
desde antes da existência do GSH, e sua convivência profissional era das
mais íntimas. Não há dúvida de que Zanini tirou proveito dessa aproxima-
ção, sabendo, porém, impor-se pelas características tensas que são ineren-
tes a sua personalidade. 28 Foi na pequena cidade litorânea
que Volpi e Mário Zanini conhecer
No histórico das origens de Mário Zanini não se pode obliterar o que tec- tor, que, quando jovem, admirav:
nicamente apreendera no Liceu de Artes e Ofícios, assim como os conhe- to CalixtO (1853-1927). Registrem
cimentos absorvidos do experiente George Fischer Elpons. Desejando an- analogias de composição existen
tes de mais nada penetrar no métier de mestres antigos, elucidara-se a res- Vista de Itanhaém, de Volpi (Fun
sé e Paulina Nemirovsky), e um q
peito, com pertinácia, nos anos de 1920, através de uma série de cópias mesmo tema, de Souza, expostO
meticulosas (o que se comprova também no caso de Bonadei). no I Salão de Arte da Feira Na.
A paisagem, que ocupa lugar privilegiado em sua obra, já o atraía no come- Indústrias.
ço da década de 1920, quando pintara impressionisticamente uma cena cam- 290isse Volpi, no depoimento ao
pestre sobre tampa de caixa de charutos. Será, entretanto, no decênio se- 4 de abril de 1986, que ia pintar I
"ou sozinho, ou com os outros". I
guinte que a desenvolve a fundo (usando óleo sobre papelão, madeira e mento anterior (23 de fevereiro
tela), a partir de vistas de locais despojados, como vemos em Canindé (1934), referindo-se a ltanhaém e a suas ]
Paisagem com Igreja (1936) - pertencentes, respectivamente, às coleções afirmou que "ali pintei com Máric
de Giancarlo Zorlini e MAC-USP- e Barcos Carregando Lenha, de cerca Bonadei" .

126
de 1935. Apoiando-se em Cézanne, pôde evoluir rápido no caminho da
composição estruturada, como mostram, entre outros trabalhos, Vista da
Ponte Grande, de 1935, e Mulheres numa Rua de Mo}i das Cruzes, de 1938
ambos da coleção de O~ette Branco Garcia, e Trecho de Linha, de 1939:
outrora no acervo de Sllvio Matsa.
Numerosas são as paisagens em que fixa o subúrbio paulistano, especial-
menteo das zonas ribeirinhas, manifestando particular interesse pela água
e seus reflexos, além do céu, sobrecarregado de nuvens, como vemos nas
telas Casas à Beira-Rio, da coleção do MAC-USP, e Lavadeiras, da cole-
ção de Augusto Guasti, ambas de 1939-40. Introduz roceiros nessas para-
)i, Itanhaém, c. 1939. gens e principalmente lavadeiras debruçadas (um motivo que continuará
a explorar noutras condições formais na obra futura). O aspecto rural des-
sas imagens, de uma cidade que desapareceu com a industrialização, é real-
çado em cenas de trabalho ou lazer, a exemplo das que registrou às mar-
gens mais afastadas do rio Tietê ou junto aos clubes náuticos. Isto se repe-
te nas vistas de cidades do Interior, como na citada tela Mulheres numa
Rua de Moji das Cruzes ou em Igreja de São Vicente (1940), do MAC-USP.
Captou, também, das janelas do Prédio Santa Helena, o velho centro da
cidade e seus transeuntes, como em Rua do Carmo (1937).30 .
~nalogias com as composições de Volpi são, às vezes, evidentes, mas
desenho e cor têm em Zanini uma idiossincrasia: o desenho é instintiva-
mente agitado e as cores possuem dosagens de verde, ocre e vermelho que
o distinguem também de outros santelenist~. Nos anos de trabalho gru-
paI, sua pale~~u:te.escalasPfli?Castransforma-se pelo uso de valores lumino-
sos (êf. Lavadeiras, de cerca -de T940, da coleção de Orandi Momesso).
fgualmente a linha a~cwir~_st~J:t<:1~ge.@:influência de De Fiori, a que nos
referimos, aparece no começo dos anos de 1940, quando acentua a ges-
tualidade da pincela4if.Um crítico como Ruben Navarra notava então a pre-
sença d~_.:.J!g~lQl1§'Y!.YQs2.~~de.E!es" ,31e Sérg.!.<?
Mlniet repor~ou-se à "li-
berdade" e "segurança" de suas cores.32 Essa determinação, que confir-
mava õingênito f.?CPressionisrnodo artista, fez-se notar então e mais adiante
na vista deufu edifício, de 1942 (da coleção da família de Alfredo Volpi),
e, sobretudo, em Regatas no Tietê, de 1943 (da coleção de Roberto Leme
Monteiro), e Marinha, de 1945 (da coleção de Orandi Momesso).~ário
Zanini afigura-se como um dos coloristas essenciais do grupo. -
ltálogo da Exposição Retrospectiva no
:-USP, São Paulo, ilustr., p. 94, 1976.
Das mais individualizadas é a percepção naturista de Rebolo - como vi-
mos, o primeiro dos artistas locatários do Edifício Santa Helena. Os conta-
) Salão", Diário de Notícias, Rio de Ja-
o, 40ut. 1942. tos que então estabeleceu ou fortaleceu favoreceram seu despertar para a
\rte e Artistas - VII Salão do Sindica- pintura. Ele emergiu, entretanto, graças à própria carga emotiva, no extra-
O Estado de S. Paulo, São Paulo, 8 jul.
2.
vasamento espontâneo do ato artístico, que permaI?-eceu naqueles anos e
por uma parte da década de 1940 seu melhor atributo.

127
É na p~sagem que encontramos () principal da contribuição de Rebolo.
<Fõiele um dos melhores intérpretes do cenário paulistano, captado em pe-
culiares vistas panorâmicas e numa perspectiva de alto para baixo que se .
detém no registro de acidentes ~eográficos e nas transformações.ambien-
tais introduzidas pelo homem) /ytilizando o óleo sobre madeira, papelão
ou tela) Seu temperamento meditativo e melancólico transfunde-se nesse
paisagismo de ar ingênuo, em que aparecem o casario humilde e a terra
de muitos verdes, não raro lavrada] como em Paisagem (1936), de cole-
ção particular (atestando estágio inicial de pesquisa); Fazenda do Prada
(1937), da coleção de Armando Rebollo; Tremembé (1937), da coleção de
Rodrigo Monteiro Lobato; Arredores de São Paulo (1938), do MAM-SP;Pai-
sagem Suburbana (1938), da coleção de Fernando Silva; Paisagem com
Casas (1940), da coleção do IEB-USP; Praça Clóvis Bevilacqua, da cole-
ção de Anésio Urbano; e a posterior Paisagem (1942), do MAC-USP.
/À.pequena propriedade, as árvores copadas, o quadrilátero das plantações,
õs caminhos irregulares de terra - tudo é particularizado em ritmos com-
passados, de muita serenidade, a distância das vistas inquietas de Volpi e,
sobretudo, de Zanini. Seu paisagismo compreende também o centro da ci-
dade, como na tela 1?ua do Carmo, de 1936, da coleção de Chaim J. Hai-
mer, setor urbano articulado à amplidão do horizonte (como é de seu há-
bito), ou às vezes um trecho de cidade do Interior, como na atmosférica
Socorro, de 1938.
Vários críticos referiram-se a ele, interessados em seu "talento natural" ,33
na "ternura das cores" e na "doçura das linhas"34 que expressa, não fal-
tando quem se arriscasse ao paralelo entre seus "pequenos aglomerados
humanos situados na orla de São Paulo" e "os encantadores recantos de 33MILLIET, Sérgio, "Rebolo", Suple
Paris" ,35de Utrillo. Dois depoimentos sobre Rebolo prestam-se ainda pa- em Rotogravura de O Estado de S. .
São Paulo.
ra melhor evidenciar aquela fase. Milliet alude à "perfeita comunhão entre 34BASTIDE, Roger, "Paisagem", Dit
seus arrabaldes humildes e sua alma ingênua de poeta dos simples. E para S. Paulo, São Paulo, 1943 (apud Ca
essa alma sensível a expressão natural é a paisagem. Como verdadeiro pai- da Exposição de Rebolo no MAM-SP,
sagista que é, até em seus retratos faz paisagens, até em suas composi- 1973 ).
35 ALMEIDA, Paulo Mendes de, "R.
ções" .36O mesmo crítico disse que ele "é um dos poucos pintores nos-
dos Primórdios à Europa", (apud Ca
sos que souberam evitar a tentação do exotismo, que souberam descon- da Exposição de Rebolo no MAM-SI
fiar dos 'motivos' tropicais (palmeiras, cactos, flamboyants), tão do agra- Paulo, p. 81, 1973).
do do estrangeiro e tão insignificantes, em verdade, na nossa paisagem de 36In O Sal da Heresia (Da Paisagem
São Paulo" .37Já Lourival Gomes Machado. tratou de seu "primitivismo po- leira), São Paulo, Departamento de Cl
pular", o que o induzia a negar ao artista "qualquer ligação com o espírito p. 123, 1941.
37O Estado de S.Paulo, São Paulo, 2
do Modernismo", acrescentando que "Rebolo tem, em autêntico sentido
1941 (apud Catálogo da Exposição (
popular e emocional, exatamente a cota que inexoravelmente falta ao Mo- tista no Salão Há, 1943).
dernismo da primeira hora, que era sobretudo civilizado, citadino e, quan- 38 "Notas de Arte - Omnibus", Foi)
do não inteligente, tremendamente intelectual" .38 Manhã, São Paulo, 25 out. 1944.

128
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Bonadei acha-se entre os artistas de trajetória formativa já extensa quando
a corporação se define. Seu aprendizado fora dos mais aplicados no âmbi-
to de mestres acadêmicos. Tais contatos, entretanto, estavam longe de tomá-
10 um discípulo conformista. Há rebeldias de comportamento em sua fase
embrionária, dos anos de 1920 e princípio da década seguinte. Mas, se as- . ~'.)
q,...'
sume posições impressionistas, pós-impressionistas e expressionistas, não
abandona de vez o gosto pelo pompierismo. Chega a ser desconcertante ,,\
observar que o artista que ousou os traços informais de cor de seu auto-
r
retrato datado de 1929 seja o mesmo que retroage para uma sedentária
natureza-morta de 1932.39 Outros avanços e recuos aparecerão em sua
obra futura, encarados com naturalidade e humor pelo pintor diante do
estranhamento que causavam. As tentativas de redimensionar-se, o dom
de especular com novas idéias não seriam razões suficientes para desprender-
se de terrenos explorados.
Para o amadurecimento de seu espírito contribuiria a estada em Florença
no começo dos anos de 1930, assinalada pela aproximação a Felice Care-
na, pintor situado na encruzilhada de tradições e Modernismo, e a vivên-
da na Itália do Novecentismo. Há nus desenvoltos dessa época e constru-
ções articuladas de vistas urbanas e cãmpestres.
Ao chegar o momento do Santa Helena, a paisagem já era nele longa expe-
riência e uma das motivações prioritárias. Datada de 1928 é a vista desa-
domada de periferia paulistana, que se encontra de posse de Waldyr Bo-
nadei Fücher. A exemplo de seus novos colegasGle dará densidade a esse
empenho, que dos recantos suburbanos desdobra-se para o interior e o li-
toral. Emprega cores esmaecidas em pinturas a óleo sobre papelão, madei-
ra ou tela, dominadas pelos rosas, verdes e terras, importando-se com a
descrição dos volumes dos primeiros planos e às vezes deixando a luz es-
parsa dominar as partes ulteriores, como vemos no cenário simplório das
casinhas Jie Cantareira (1936), da mesma coleção, escoradas ao fundo pe-
lo arvoredo que aos poucos perde consistência no encontro com a atmos-
fera das nuvens. Em Ilha Porchat (1937), da coleção do Banerj, a propen-
são do pintor é fazer valer o fator dos tons diluídos, mesmo nos planos
da terra. Sua disposição maior, no entanto, na observância de Cézanne,
será a busca de planos bem declarados de cor, por onde faz valer as quali-
dades plásticas em face do conteúdo narrativo. O animismo lírico que o
caracteriza é contrapesado, nos anos do Santa Helena, pela imposição de
um equilíbrio racional demonstrado cabalmente no futuro em longa série
de composições que dosam a construtividade do espaço e o expressionis-
mo da cor.
Esta junção de construtividade e emotividade das tintas, que aparece niti- 39 Ambos da coleção de W
damente em Paisagem (1937), da coleção de Darcy Barros, evoluirá para Fücher.

132
visões mais orgânicas, como em Pico do Jaraguá (1942), da coleção
Norberto Nicola, onde a montanha recorda Sainte- Victoire, influência q
dramatiza na complexa paisagem com casas e torres metálicas da coleç
de João Estefan (1943) e, já num caminho mais prenhe de conseqüência
em outro quadro no gênero, da coleção de João Cados Leite Bastos (194 !
de planos circunscritos e entrosados.40

Bonadei, depois dos anos de 1930, continuaria a pe~uisa( alorma e a e


riquecer os meios-tQns. Ruben Navarra apercebe-se de suas "preocupa.çõ
introspectivas", citando sua Paisagem exposta no Salão Nacional de 194
"toda diluída em tons de cinza e verde muito brandos, sem nenhum se
sualismo, mas de grande poesia".41 Porém, ao mesmo tempo que con
nuaria a investir muita energia no tema paisagTst1co,-por vezes retornan
Bonadei, Paisagem, 1943. a uma concepção mais fiel à realidade (a exemplo de Ubatuba, de 194
e-:-entretanto, fazendo avançar sua mais forte tendência geometrizante
isto se vê em Fundo de Quintal, de 1945, da coleção de Arthur Octav
de Camargo), o artista, ainda nos tempos do Santa Helena, demonstra o
tras inquietações plásticas, que despertaram nele antes que em seus co
gas, como veremos depois.

Não obstante compartilhar os propósitos fundamentais do grupo, Penn


~ chi singulariza-se, de um lado, pela influência definitiva que, quando j
vem, recebera da antiga pintura toscana e, de outro, por sua temática co
traponteada entre assuntos sacros e profanos. A ênfase colocada na figu
humana distingue-o, ainda, da maior parte dos santelenistas, mais diri
dos à paisagem. Além de sua atração por grandes mestres do afresco
como Giotto, Masaccio e Piero della Francesca, e pela obra de Fra Ang
CO,42temperada por escalas visuais da iluminura, o que também o rem
a apanágios medievais e humanistas -, outros fatores perfizeram sua fj
mação, como o ensinamento de Semeghini, mestre italiano de experiên
parisiense que entende liricamente a realidade. E devemos reportá-Io, m
largamente, ao meio peninsular de tendências realistas dos anos de 1921
Todos esses influxos filtraram-se em sua veia de narrado r tranqüilo e be
40As obras citadas no parágrafo são todas
pintadas a óleo sobre tela. humorado de eventos populares e da história religiosa, que reflete o
41"Salão de 1941", Diário de Notícias, Rio mem devoto. Se permaneceu solidário à cultura italiana, é também ver
de Janeiro, 5 out. 1941. de que, aqui radicado, amoldou-se bastante à "ambientação brasileira q
42 Giotto (1266-1337), Masaccio tanto compreende", como afirmou Bonadei,43 Tornou-se intérprete de
(1401-c.1429), Piero della Francesca
(1416?-1492), Fra Angelico (1387-1455).
tigas e imperturbáveis aldeias paulistas e seus caipiras, dos lavradores
43Cf. depoimento incluído in BARDI, Pie- periferia da cidade, de acontecimentos folclóricos, sem por isso deixar
tro Maria, Pennaccbi, São Paulo, Raízes Ar- representar em telas e murais (como o de 1937, da antiga residência de
tes Gráficas, p. 42, 1980. lizola) certos motivos equivalentes da terra provincial de onde emigrai

1
Sua fixação entre
. . .d em fins da década de 1920, com p reende um Peno-_
nós,
d d d d d
o e re UZl a attvl a e que se prolonga até a fase dos relacionament
, do Santa Helena. As particularidades culturais italianas que acusa~:
~, permitiram-lhe sintonizar-se em vários aspectos com seus novos camara-
das. Pennacchi integrou-se ao Grupo, participando da busca de significa-
~ ~a realidade que constituía a preocupação de tod~
O elemento paisagístico tem nele importância, mas o artista reserva-o es-
sefiCialmente para uma função de apoio. Os exemplos de paisagem "pu-
ra''- são raros em sua obra e talvez mais freqüentes em seus primórdios,
quando realizou as vistas de Garfagnana (1928 e 1929) e a de Magnano
(1929), pintadas a óleo, quadros de apuro formal e cores translúcidas, res-
peitosos de tradições no gênero. Ligada a esses antecedentes, Paisagem
do Canindé, óleo de 1936, da coleção do artista, harmoniza-se, no partido
temático e na composição, com a concepção dos demais. Essa ingestão de
soluções locais desenvolve-se com sentido mais pessoal na posterior e tran-
qüila cena suburbana da coleção de Marino Pennacchi, do início da déca-
da de 1940, ou, ainda, na visão panorâmica agitada de Campos do jordão,
da mesma época (coleção particular)./Ã cor cinérea e a matéria espessa fo-
ram dele características. Entretanto, ~ravés dos anos de 1940, seus tons
tornaram-se mais sensíveis à luz. Em que pese o interesse demonstrado pe-
la paisagem, será, como dissemos, a figura humana o objetivo por exce-
lência desse pintor que, ulteriormente, à diferença de outros colegas, manter- lIII'
se-ia fixado nos padrões figurativos de origem] II
,',
A vocação do desenhista despontou em Clóvis Graciano muito antes da I
realização das primeiras aquarelas, guaches e óleos e tornou-se determi-
nante em seus objetivos plásticos. Essa imanente pulsão gráfica estende-se
a todas as suas formas de representação, com o leitmotiv no ser humano.
A natureza-morta e a paisagem foram sobretudo interesse do momento a
que pertenceu ao GSH e dos anos imeaí~itamellte posteriores. A primeira
é um campo de contribuição significativa no conjunto do que a comuni-
dade produziu a respeito, mas a paisagem, que nos outros pintores consti-
tui um elemento de citação obrigatória, em Graciano é aspecto menos
saliente.
Exemplo de seu paisagismo inicial é a pequena e tímida tela a óleo Barcos,
da coleção de José Roberto Graciano, cujo clima cromático nostálgico
aparenta-se ao de seus colegas: tons prateados e verde-escuros. Desta sere-
na composição naturalística, datada de 1935, ele evolui, sempre u~ando
o óleo, para apreensões expressionistas da realidade, como na movl~~n-
:nnacchi, Paisagem com Figuras, tada Paisagem de Pinheiros, de 1938, quadro do Museu de Arte Brastlel~a
da FAAP, singularizado pelo edifício erguido diagonalmente, e na sombna

135
Marinha, de 1939, que pertenceu a Osório César. Na vista de Pinheiros
as esparsas casas proletárias do segundo plano, entre árvores algo agitadas
que lembram Van Gogh, são típicas do modelo sante1enista. Reencontra-
mos os fios elétricos que atravessam essa cena nas paisagens ferroviárias
do começo da década de 1940, um assunto autobiográfico, tratado pela
linha e pelo apego à síntese que, em geral, identificam bastante o que faz.
Ainda próximas daqueles anos são as vistas de Campos do ]ordão, que abran-
gem com decisão o panorama das montanhas, pouco visitadas pelos de-
mais, e que sobretudo estimulou artistas como Lasar Segall, Pancetti, Pau-
lo Rossi Osir e a desen)1ista Odette de Freitas. Mário de Andrade, na mono-
grafia sobre Gracianou:nfatiza sua familiaridade com esses "morros, hori-,
zontes, caminhos longos" e a "masculinidade possante" que aí revela.44 -/ Manoel Martins, A tibaia , 1937
1 A primazia do desenho, a se1etividade e recomposição dos sítios flagrados,
a preferência do quadro elaborado no atelier diferenciam-no quase sem-
pre dos colegas de Grupo. A paisagem estará parcimoniosamente presente
em sua pintura posterior, sobrevivendo máxime como espaço reconstruí-
do que serve de enquadramento para vários tipos de representação.
Manoel Martins percorreu os subúrbios paulistanos e foi ao interior do Es-
tado para colher fragmentos da natureza e da vida cotidiana, na mesma li-
nha de gosto dos demais, tal como vemos nos óleos de 1937 Serra da Can-
tareira e Atibaia (da coleção de Sílvio Ré Martins) e Ameaçando, de 1938
(exposto no II Salão de Maio), assemelhados pela despretensão da compo-
sição, o que se repete, ainda, na bem posterior Paisagem, de 1945 (cole-
ção de Elza Ré Martins), de cores refeitas mais tarde. A paleta reduzia-se
a monocromias (como nos verde-escuros de Atibaia).
O que, porém, melhor define a individualidade de Manoel Martins e faz
sua diferença em relação aos colegas de Grupo está nos cenários urbanos.
Nesta específica direção temática ele se voltou para um <;!9ssignos maiores
da civilização moderna: o homem anônimo da cidade~a São Paulo que
visualiza entre ,o real e o imaginário, em descrições turbulentas e sumárias,
através de um perspectivismo caótico, minúsculos seres humanos agitam-
se nas ruas, comprimidos nos encontros com edifícios e veícul§fjPraça
da Sé (coleção de Fernando Henrique Cardoso), óleo de 1940, exposto na
segunda mostra da FAP - de leves dosagens de grisailles, rosas e ocres,
denotando progressos momentâneos de cor de_um artista que, entretanto,
se define sobretudo como desenhista -, é exemplo bem-sucedido dessa 44 ANDRADE, Mário de, Ensaio
percepção, aguçada pelo interesse no social.. vis Graciano, p. 163, jul./dez.

136
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Dos nove membros do GSH, Humberto Rosa e Alfredo Rullo Rizzotti são
. os menos conhecidos. No caso do primeiro, a destruição de obras, poste-
rior a sua morte - precocemente ocorrida em 1948 -, contribuiu para
o esmaecimento de seu nome.45 A saúde debilitada devia também reduzir
a capacidade de trabalho do pintor. 46Ademais, o que Rosa e Rizzotti pro-
duziram encontra-se sobremodo disperso ou é de paradeiro ignorado. Na
época, porém, participaram de salões de São Paulo, do Salão Nacional e
foram notados pelos críticos.
Rosa, que se iniciara livremente no interior do Estado para depois realizar
o curso acadêmico de arte, avizinhou-se do Grupo através de Rebolo. Em
contato com os novos camaradas e assimilando Cézanne, divergiu do ru- Rosa, Tucuruvi, c. 1942.
mo tradicional que seguia.
A obra que deixou compreende paisagens, naturezas-mortas e figuras. Na
paisagem localiza-se seu campo de expressão por excelência. Exemplo mais
antigo e ainda imaturo de sua pintura no gênero, de certa vivacidade de
pincelada, é o pequeno óleo sobre madeira, com vista do rio Pardo, data-
do de 1931, de propriedade de Teresa Rosa. Do momento do GSH são vá-
rias paisagens interioranas, geralmente o Vale do Paraíba. Denotam uma
evolução comedida e segura. Entre elas, a vista com sobradões à beira de
um lago, com montanhas ao fundo, da mesma coleção; a cena à beira-rio,
da coleção de Márcia R. Der Bedrossian, datada de 1938, fim de década
em que pintou também Rancho de Pescador e São Luís de Paraitinga, am-
bos da coleção de Oswaldo Martone, e Ubatuba, de propriedade de Oran-
di Momesso. De um tempo um pouco posterior devem ser Tucuruvi, da 45 Em depoimento ao autor, em 17
tembro de 1986, o filho de Humbel
coleção de Armando Rebollo, e Paisagem com Igreja, de Isaac Krasilchik sa, Airton Rosa, confirmou essa per<
(primeira metade dos anos de 1940). mediável. O fato é atestado também
mã do artista, Maria Rosa Andreoni (
.--ÀTratados sempre a óleo sobre tela ou madeira, esses quadros todos reve- mento ao autor em 25 do mesmo r
lam a força de seu caráter amável e um saber de reflexão. Circunscritos 46Humberto Rosa é descrito por seu
em manchas textura das ou traços curtos e nervosos, seus tons baixos e de- gas tomo um homem de pequena es
licados acertam-se no agenciamento harmônico da composição, desenvol- sofrendo de enfermidades e miopia. (
Orlando Porretta, que o convidou I
vida com capacidade de ritmo e espírito de síntese. cionar no Colégio Dante Alighieri,
Outra figura pouco lembrada é Rizzotti, o último aderente ao núcleo, on- que, não obstante seu estado, "não
às aulas" e revelava-se "perfeccion
de se ligara sobretudo a Bonadei. Há em seu estudo lapsos difíceis de preen- que fazia" (depoimento ao aUtor el
cher, como.a longa experiência italiana, que permanece desconhecida. Bro- junho de 1986).
blemas sérios de saúde limitaram sua atividade.47 Ademais, de espírito exi- 47 Rizzotti sofria de um eczema e eJ
gente, rendia-se à vontade constante de refazer seus trabalhos, cuja quan- gico às tintas, que lhe causavam in
tidade deve ser pouco expressiva. ções. Todavia só.abandonou a pintu
ximo ao fim da vida (d. depoimento
A paisagem dominava sua participação nas segunda e terceira exposições meralda Rizzotti ao autor em 28 de (
da FAP. Pintor do subúrbio e da zona rural, portanto com o mesmo inte- bro de 1974).

138
resse dos demais pelos ambientes de vida simples, denota por vezes seme-
lhanças com Pennacchi, ao dar destaque à presença humana e uma influên-
cia de Bonadei na intelectualização crescente da composiào. Paulo Men-
des de Almeida considerou "pobres suas paisagens" quando da estréia do
pintor na Família, em 1939,48 mas Ruben Navarra, algum tempo depois
dedicou-lhe, em ar~igo sobre o Salão Nacional de 1942, longo trecho e~
que ressalta as quahdades de cor e desenho de algumas das obras exibidas.
A creditar-se a ele há a constância da pesquisa que, nos anos de 1940, atin-
ge resultados de liberdade pessoal, sobretudo na interiorização inquieta dos
dados da realidade. Próxima dos tempos do Santa Helena é a vista com
capela ao fundo, da coleção de Esmeralda Rizzotti (guache datado de 1942),
e, de alguns anos adiante, a Paisagem, de propriedade de Isaac Krasilchik,
marcada por convinc)ent~vpla?OS din~mic~s.,
Sem a importância dapà1sag~m, ã naturezà-morta entra com parcela signi-
ficativa na Er9QÜÇ~Qdo G.sH.~sse gênero artístico antigo, que possui cul-
tores áe primeira linha na arte moderna, a partir dos impressionistas e par-
ticularmente de Cézanne, atendia à atitude realista do GruPg. Diga-se de
passagem que a representação isolada da matéria inanimada suprime não
c~ ) raro os componentes temporais narrativos e exige uma concentração to ta-
lizante nos ingredientes puramente plásticos. MuitOs precon~eitos proçu-
raram reb~i~á-JÊ-a umg[;ll!..<klI1teresse m~nor. Como afirma Charles Ster-
ling, pretendeu-se "que a natureza-morta não é capaz de fazer pensar e que
a sua imobilidade oferece ao pintor uma facilidade a nível de procedimen-
to como de resultado", ao que ainda acrescenta o estudioso: éSabemos
hoje que uma natureza-morta pode trazer satisfação ao espírito, que alguns
frutOs num prato podem evocar todas as harmonias possíveis do universo,
todos os seus ritmos, suas luzes, seus acordos cromáticos, da mesma for-
ma que a música".;!]
A recorrência a esse tema foi constante no meio brasileiro da época, seja
o acadêmico ou o de pintores como os santelenistas e outros membros da
FAP, como Paulo Rossi Osir, Vittorio Gobbis, Hugo Adami e Waldemar da
Costa. Já nos referimos à interpretação dada por Mário de Andrade a com-
ponentes das naturezas-mortas do Grupo da Sé. Do mesmo modo que a
representação da peguena propriedade suburbana, ele~ r:efletiriam uma am-
biçãõ-(femu_dàn~a -de. claSse. Na verdade, essa especialidade pictórica
"exprime-se desde há dois mil anos por uma escolh~ de o~jetos de. uma
regularidade notável", salvaguardando-se o que cada epoca tntroduzIU da-
Salão da Família Artística Paulista", quilo de que se utilizava, segundo ainda o ex-conservador de pinturas do
da Noite, São Paulo, 4 jun. 1939. Museu do Louvre.50
RLING, Charles, La Nature Morte,
Éditions Pierre Tisné, p. 123, 1952. Quase tOdos os artistas do Grupo incluíram naturezas-mortas nas ~xpos.i-
D, ibidem. ções da FAP. Obras dessa espécie temática permitiam-Ihes conduzir mais

139
a fundo e disciplinadamente os conhecimentos do métier, como nas solu-
ções de matéria e tonalidade. Alguns - casos de Bonadei, Rosa e Zanini
- haviam come_çad.o_pDLfórmulas-convencionais. Bonadei, notadamente,
vinrulou-se por m.uitO-teD1po aos..m.etais e às frutas verossfniéiS ClePeCíro
Alexãnctrino, dando aos poucos, entretanto, livre trânsito ao próprio tem-
peram~nio. A influência de Cézanne assinalou a evolução desses pintores
nõs anos de 1930 e na década de 1940 (quando, a certa altu~a, também
intervém a óptica cubista no arranjo do espaço de alguns deles - em Bo-
nadei, contudo, desde 1937).
c9 que entra na composição de seus trabalhos a óleo sobre tela, cartão ou
madeira, nos tempos do Santa Helena e na fase imediata, são as diferentes
naturezas de frutas - das refinadas maçãs, peras e pêssegos, até o mamão
e a fruta-do-conde -, alimentos como o peixe, pássaros, flores, utensílios
domésticos e quinquilharias, estatuetas, livros, tecidos, por vezes recortes
de ambiente caseiro como plano de fundo ou a janela aberta para a vida
exterior, em moldes herdados da clássica veduta renascentista. A triviali-
dade do cenário de certas obras é de toda a evidênci~ Sobre a mesa e os
panos de cozinha articulam-se os comestíveis e os objetos baratos, como
em dois quadros de Humberto Rosa, datáveis do início da década de 1940,
das coleções de Orlanao Porretta e Orandi Momesso (onde o autor se es-
força nos efeitos de trompe l'oeU), e numa obra de Rebolo, de maior liber-
dade plástica, pertencente à coleção de Clara Sancovsky (aproximadamen-
te 1939). Isso, porém, estava longe de ser a regra. Na representação de flo-
res, ao lado de exemplares selecionados, não faltam em obras de Rizzotti
os buquês de espécies silvestres contidos em vasos despojados. Manoel Mar-
tins, que se aplicaria em narrativas de cunho social, abordou também essa
1ãce da arte, como no excelente Vaso de Flores da coleção de Sílvio Ré
Martins.
~m Volpi, a natureza-morta e as flores ocupam lugar de relativo destaque
numérico, a julgar pelos levantamentos sobre sua obra procedidos até ago~
Do expressionista Vaso de Flores, da coleção de Gilberto Chateaubriand
ao da coleção de Marcos Marcondes (com os plat:los de cor mais puros e _ ~\~ r
a silhuetagem da forma, que recordam Matisse), entre outras peças, notam-se '\S.
(aqui também) sua evolução e as aptidões no gênero. O Vaso de Flores da
co.leção da f~mília do artista, datável de cerca de 1939, r~Q mIanto trans-
gnde o motIvo inspirador no informalismo das pinceladas de t9ns vivos
contrastantes com os marrons.

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Rebolo aplicou-se bastante na natureza-morta durante o período do Sant
Helena e nos. anos seg~intes, tr.ata~d?-a com o mesmo senso poético d:
cor que o assmala na pmtura palsaglStlCa. Um poder de síntese e a preocu-
pação com os planos dominam as composições com frutajJ (cf. óleos das
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i\. coleções de Clara Sancovsky, Fernando Silva e Israel Dias Novais, este da-
tado de 1937), e as flores foram para ele interpretadas em ímpetos de ex-
pansão (como nos quadros das coleções de ]uranda Brecheret e Lucinda
de Moura Albuquerque)lÉm momentos tardios, nesse, como em outros
temas, a procura mais int~ctualizada da cor e da forma tomaria o espaço
precioso de sua espontaneidad~
Tanto quanto a paisagem, a natureza-morta não é motivação importante
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na obra de Pennacchi. Foi uma de suas preferências nos anos de formação
na Itália, mas passou a ser pouco tratada no Brasil. Data de 1939 o exem-
f ,r<, plar de sua coleção em que, sobre papel Fabriano e usando aquarela e óleo,
\ ,,v compõe ordenado ambiente com jarros, garrafas, limões e as tábuas de que
se servia para pintar (o plano de fundo é refazimento posterior). O artista
guarda também consigo algumas peças do começo da década de 1940, em
que se alternam tons brilhantes e sombrios, representando pássaros, fru-
tas, vasilhames e flores. O óleo sobre cartão Vaso Azul com Flores (1942)
contém certa liberdade de forma e exaltações de cor, pouco comuns em
sua arte de fundo clássico.
Escasso ainda deve ter sido o tema na produção de Rizzotti. Datam dos
anos seguintes ao agrupamento da Sé a Natureza-morta de 1943 exibida
~I'
\\ na mostra Do Modernismo à Bienal (MAM-SP, 1982) (coleção particular),
) em que evidencia rasgos de desenvoltura na composição, e uma aguçada
representação de flores silvestres (1945) que pertenceu a Orlando Porretta.

Bonadei é um dos artistas do Grupo que melhor se identificam com o espí-


rito da natureza-morta, pesquisando as regras que a regem e tornando-a
um fator de fundamentação de linguagem. Foram numerosas as pinturas
,&Y daquela época a que trouxe amplitude e complexidade de reflexão no re-
lacionamento dos objetos que lhe serviam de modelo (e que armazenava.
tyr\ em casa), como no pequeno quadro de 1940 em que apõe a inscrição
"1 + 1 = " (coleção particular), de sólida organização e força de estilo. Na
obra da coleção de Gilberto Chateaubriand (1942), a composição, de as-
pectos mais fluidos e avançados de fatura e forma, tendo também ao cen-
tro um vaso de flores, abrange um ângulo de atelier. Do mesmo modo que
na pintura de paisagem, ele se empenhou continuamente na naturez_a-~orta
e nas flores pelo avançar da década de 1940, sob influxo da metommla cu-
bista e também na aproximação da sensibilidade abstrata.

143
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'I()Clóvis Graciano dedicou-se à flor com talento, o que lhe valeu encômios '"
de1VIãrio creAí1drade. Ao lado de representações mais estáticas, como no
óleo pertencente ao IEB-USP, deixou outras, de manchas esparramadas e
mais pessoais, a exemplo do que vemos nas obras, também a óleo, outrora
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na coleção do artista (1940) e de Nélson Palma Travassos. Passados os anos ~
de 1940, esse motivo tOrnar-se-ia apenas elemento complementar de suas ~ . \,
composições com figuras.
~ A natureza-morta e as flores, que interessavam Mário Zanini desde os anos
de 1920, alteraram-se de uma relação mais direta -conrõSdados reais para ir "'t

o crescente Expressionismo que o caracteriza desde a época do Santa He-


lena. Sem a mesma assiduidade que Bonadei demonstrou nessa abordagem,
Zanini, em seu desenvolvimento, terá com ele alguns pontos afins na pro-
cura decidida de construção e agenciamento de volumes, onde encaixa a
peculiaridade de sua cor. [. CÁ~. ~ "-

A figura humana foi objeto di ~~hO decidido entre os artistas do Gru-


po. Dois deles - Graciano e Pennacchi - fizeram-na sua forma essencial
de representação, e, no caso de Mário Zanini, ela se equilibra, ou quase,
no decurso de sua obra, com a produção do paisagista. Nas linhas amplas,
acordava-se à visão da tendência realista e às preocupações sociais que as-
sinalam parte importante da arte e sua teoria na época, nela prevalecendo,
entretanto, a espontaneidade do ideário proletarista de seus autores. Com Volpi, Figura Feminina Sentada, c
a mesma significação da paisagem, a figura participa dos valores que lhes
conferem uma alma coletiva, sem que também aqui deixem de marcar seus
próprios atributOs individuais.
Quando da atividade conjunta, alguns deles freqüentavam o curso livre da
SPBA, para aplicar-se nos estudos com modelo vivo, hábitO que se esten-
deu a9s atelieres do edifício da Sé. Para essas sessões convidavam pessoas
do povo, não faltando, porém, a pose de modelos profissionais, como a
já citada e bastante lembrada Adolfina. Realizaram elevado número de de-
senhos a lápis, lápis de cera, nanquim, carvão e desenhos realçados a aqua-
rela, que vão do simples registro descritivo à qualidade da alteração inven-
tiva, ordenando em atitudes múltiplas nus femininos, figuras de homens
e mulheres, além de adolescentes: jornaleiros, engraxates e office-boys, ca-
racterísticos das ruas de São Paulo. Este afinco gráfico, mesmo para os de
larga experiência, somava-se ao trabalho mais solto, exercido ao ar livre.
Grosso modo, compõem seu repertório o retrato, o auto-retratO e repre-
sentações diversas de grupos ou indivíduos isolados. Alguns cultivavam o
retrato de longa data, mas o período do Santa Helena e os anos a seguir
fora~ fecundos para vários membros do grupo aprofundarem-se na per-
cepçap do rosto humano, com uma escolha de modelos que não ultrapas-

146
sava,
. de início, a sociedade "fechada de seus parcos relacionamen t os. M a'-
d A d d d h
no e n ra e recor a que nen u~ deles fazia o menor esforço para re-
ceber encon:end~s de retrato~ dos ncos" ~enhuma concessão. Se retrata-
vam entre S1,a S1mesmos e as suas fam1has e amigos..."51 Foi de fato o
que se deu.
O autO-retrato foi objeto de interesse, principalmente para Graciano Bo-
nadei, Rebolo, Pennacchi e Rizzotti, que se consagraram a essa interpreta-
ção íntima do eu também na seqüência de sua obra. Se observam distân-
cias entre si - e bem declaradas - no estudo dos próprios caracteres fi-
sionômicos (onde registram tensões que no caso de Graciano assumem dra-
mático envolvimento na análise moral), é também verdade que há neles
uma harmonia de conjunto, como ocorre igualmente no tratamento do re-
tratO e da figura de modo geral. O tema social adquiriria relevância sobre-
tudo na evolução de Graciano e Manoel Martins e está presente em Zanini
e Rebolo - enquanto o assunto religioso foi enfrentado com convicção
por Volpi e Pennacchi.
É apreciável o espaço que Volpi dedicou à figura humana antes das depu-
o, Nu Feminino, 1937. rações formais e da busca da cor pura que assinalam sua transformação na
segunda metade do decênio de 1940. Quando de sua primeira exposição
individual, em 1944, reunindo 64 óleos, têmperas e guaches, com predo-
mínio de assuntos paisagísticos, perto de um terço das obras tinha títulos
como Costureira, Menina, Cabocla, Retrato de Mulher, Retrato, além de
figuras de santos e outros temas religiosos. 52
Nos anos de juventude, Volpi aliava o aprendizado da arte do passado -
da tradição plástica italiana e do apego à realidade humana e social, que
identificam um Bartolomé Esteban Murillo (1618-82) e um Courbet - ao
sentido liberto da modernidade deste século. Parecem-nos elementos com-
probatórios dessa linha Menina e Boneca e Retrato de Mercedes (respecti-
vamente óleos das coleções de Alfredo Nagib Rizkallah e Mercedes Vituz-
zo). Em tais trabalhos e em outros, os estímulos ópticos derivam de am-
bientes populares ou de sua própria vida doméstica. A comedida veia ex-
pressionista do pintor paulistano robustece-se nos anos de 1930, com fi-
DRADE, Mário de, Ensaio sobre Cló-
guras de contidas desenvolturas gráficas e acurada estrutura.
raciano, p. 162, jul./dez. 1944. "Volpi permanece dentro da linhagem dos grandes disciplinados", disse
Catálogo da Exposição de Volpi na certa vez Sérgio Milliet.53Os personagens de olhos exorbitados que pin-
ia Itá, em 1944 (introdução de Mário
lberg). tou no período Santa Helena possuem ar taciturno e parado. Na Menina
)lpi", Suplemento em Rotogravura de de Vestido Verde (c.1940), têmpera da coleção de Paulo Kuczynski, VolI?i
ado de S. Paulo, n? 170, São Paul<'.
novo 1940.
capta a postura simples e desajeitada da pequena modelo, tOdav1a
conferindo-lhe graciosidade. A rudeza que lhe vinha da formação artes a-

147
nal não cede à finesse que absorvia em Cézanne (como no posterior Re- .'.
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trato, de cerca de 1943, da coleção de Júlio Bogoricin), em Dufy e Matisse. ~ ~


Por aí se pode entender o particularismo de sua mensagem, própria do am- "
biente a que pertencia. Em meados da década, em espaços ordenados, reu-
niria indivíduos ao redor de uma mesa tosca, enfatizando o isolamento exis-
tencial de cada um (como na têmpera do MAC-USP).
Além de integrada à paisagem, a figura humana comparece, autônoma e
com assiduidade, nas diferentes fases de Mário Zanini. Em fins do decênio
de 1930 e início do seguinte alcança resultados maduros. É um tempo em
que se aprofunda no estudo, inclusive teórico, da pintura francesa e italia-
na. Situam-se ali peças a óleo que assumiram uma decisão de rumo. A defi-
nição incisiva da forma nos traços do pincel que carregam cores convic-
tas, manifesta-se em Mulher Sentada, de 1936 (coleção de Giancarlo Zorli-
ni), e Boneca, de cerca de 1938 (coleção de James Lisboa). No Retrato de
Ottone Zorlini, de 1940 (coleção de Giancarlo Zorlini), a leveza gráfica re-
corda Dufy e é exemplo de uma visão que apreende com segurança e dis-
tensão o modelo. Já no Retrato de Hilde Weber (coleção do MAC-USP),
a interiorizada e enérgica figura emerge do ríspido circumscriptio e de mais
densas e vibrantes manchas fauves, que atestam a evolução do pintor. Rizzotti, Retrato de Rapaz, 1944
Conotam-se a essa imagem forte o Expressionismo de Sanfoneiro (coleção
de Amélia Mariot Zorlini) e Figura Feminina Sentada (coleção de Orandi
Momesso), ambas de 1942. Vários personagens de seu círculo de amizade
foram por ele fixados com busca de entendimento moral. Os grupos de
figuras populares que inseria na paisagem ganham, ao menos desde o co-
meço dos anos de 1940, dimensão própria, daí por diante constatando-se
sua sistemática aplicação em elaboradas composições onde preserva e en-
riquece uma iconografia predominantemente feminina. Pertencem ao pe-
ríodo da guerra representações de gente que dormita na rua, em filas do
pão, além de, por exemplo, cenas de trabalho rural (conforme Campone-
ses, de cerca de 1943, da coleção do MAC-USP)ou de lazer junto ao mar,
as quais correspondem às tendências sociais da arte em trâmite. É de lembrar-
se o gravador, na madeira e no linóleo, que se revelou na década de 1940.
Mário Zanini tenderia aos rigores geométricos nos anos de 1950, onde
fluíam, subjacentes, as pulsões cromáticas expressivas que procuraram re-
tomar a seu lugar mais tarde, num instante difícil e terminal de re-
identificação com seus tempos melhores.

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. outros.. interesses que a moveram, a obra de Clóvis Gra Clano
d IZ resp~lto, em pnmelro 1ugar e d esta~adamente, à figura humana. Para
ela o artIsta consagrou um espaço contmuo, de prospecção física moral
e social, descrevendo vários caminhos, sempre fundamentado no~ recur-
sos gráficos que são predominantes em sua tradução expressionista da rea-
lidade. As convergências com seus companheiros estão sobretudo no ri-
gor da compreensão artesanal da pintura e em sua ideologia proletarista.
Entretanto destravava-se desde logo da conjunção sensória dos demais
em grande parte atraídos pela pintura ao ar livre - na decidida preferên-
_
cia pelo atelier. O pathos que o caracteriza demonstra-se na forte essência
dinâmica da figuração e identificamo-l o quer na exegese existencial, quer
na preocupação com a questão social.
Entre suas primeiras formas de representação, geralmente a óleo, está o
autO-retrato, a que retoma várias outras vezes mais tarde. No de 1936 (co-
leção de Milton Guper), os traços todos convergem para a afirmação de
uma qualidade intelectual. A postura é rígida e altiva, determinada pelo de-
senho econômico e marcado. Dois anos depois, em 1938, num desenho
a nanquim, a atitude descontrai-se algo e assume ar de reflexão, para read-
quirir tensão na pintura de 1940. Em Auto-Retrato e Mão, de 1942 (cole-
ção da Biblioteca Mário de Andrade), a variação é mais profunda, o rosto.
é agora distorcido, com os olhos salientados por círculos brancos. Poste
riormente, em 1948, na tela em que superpõe dois auto-retratos (coleçã
do MNBA),enfatiza, por sobre as inquietações íntimas, um estado de segu
rança moral. Mário de Andrade chamou a atenção sobre a deficiência d
um dos olhos do artista no texto monográfico de 1944 e em carta que lh
dirigiu no mesmo ano,54 referindo-se à repercussão psicológica de tal fa
to no significado de sua obra.
O que cumpre ainda dizer sobre esses e outros auto-retratos que produzi
entre fins de 1930 e o começo da década seguinte, é que usa de tOda a crue
za em sua citação íntima. Em outras obras do período, incluindo retratOs
composições com figuras, Mulher Pensativa, de 1937; o certo détour te
mático de Ladrão de Galinhas e representações de conteúdo social com
bativo, percebe-se a franqueza da observação expressa pelos valores tác
teis da grafia e pelas dosagens equilibradas de claro-escuro. Às cores nã
lhes resta senão a presença complementar. Sem dúvida, Graciano - qu
a rigor, engatinhava em 1935 - reiterava uma conduta conteudística de nu
ças próprias, paralelamente à assimilação rápida de conhecimentOs artesanai
Seu envolvimento mais diretO em assuntos sociais tornou-se conhecido n
III Salão de Maio, como atesta Sérgio Milliet. Nessa ocasião, Graciano apr'
54 No arquivo do artista. sentou desenhos "dir-se-ia para ilustrar as Cidades Tentaculares, de Ve
haeren: maquinistas, mineiros, operários obreiros de músculos e triste-
zas" .55Caso de evolução dessa iconografia operária é Graxeiro (nanquim
de 1940), de rosto macerado pelas deformações da linha .e oposições de
s.ombra e luz, que se estendem pela figura (da coleção de Antônio Carios
Vianna de Barros). .

Desde aproximadamente 1940, o artista, engajado politicamente, multipli-


ca figurações, com uso do óleo sobre tela, que explicitam a referida "ex-
pressão combativa":56 são as composições.intituladas Família, as cenas
que evocam a guerra em curso (conforme obra do Museu de Arte Brasilei-
ra da FAAP, de 1943), as de retirantes nordestinos (como no exemplar que
já foi da coleção de Marcos Antônio Marcondes, de 1945), as figuras solitá-
rias (Homem Ferido, da coleção da família do artista, e Duas Mulheres, ambas
de 1944) ou que se solidarizam no vazio de áridos espaços (Homens e Fios
Elétricos, da coleção do MAC-USP, de 1946). Nessa fase, inaugurada quan-
do o GSH existia, seu Expressionismo gráfico evoluiu para. definições es-
truturais mais complexas, que assimilam a geometrização cubista, as de-
formações de Picasso e Portinari - este um artista a quem era ligado por
sólida amizade.
Peças de relevo da época são também as de motivos de dança ou seus vio-
lonistas e violoncelistas construídos linearmente por fusões transparentes
de planos. Não obstante os distanciamentos temáticos de todas essas obras,
aproxima-as uma unidade essencial de percepção. A linha permanece co- Clóvis Graciano, Graxeiro, 1940.
mo o principal predicado de expressão do movimento. Se a investigação
do real, em níveis sociais, constitui uma de suas inclinações mais profun-
das, desloca-se ele com freqüência para as visões oníricas (como em Ba-
nho de Sol, pintura de 1940), o que é comum também na prolífera ativida-
de do desenhista. .
Clóvis Graciano valeu-se bastante de várias técnicas: o desenho em diver-
sos procedimentos, a pintura a óleo e a têmpera, a aquarela, o guache, a
monotipia, a litografia (caracterizadoras também de parte do núcleo a que
pertenceu). Tornou-se ilustrador de numerosos jornais, revistas e livros,
assim como ativo autor de cenários e figurinos de teatro. Desde o começo
do decênio de 1950, empenhar-se-ia em pinturas murais, como vimos noutra
parte, usando sobretudo o óleo e desenvolvendo outra etapa de sua obra,
de perseverantes aspectos temáticos, onde se incluem motivos de dança,
a presença de músicos (assunto autobiográfieo), e intervindo também a no-
vidade dos cenários histórico-simbólicos. O sentido decorativo que se im- 55"Clóvis Graciano", o Estado de S
pusera em trabalhos antigos ampliou-se, no entanto, com friezas formais /0, São Paulo, 6 jan. 1949.
e de cor, tributárias da abstração lírica na organização dos segundos pla- 56ANDRADE, Mário de, Ensaio sob
nos de suas representações. vis Graciano, p. 173, juI./dez. 1944

152
(~
1/\
.....
As referências ao paisagista na pintura de Rebolo ~têmabsorvido grande parte
da apreciação da crítica, passada ou presente. E um fato, porém, que a fi-
gura humana aparece com qualitativo curso em sua produção daquela época,
contribuindo para contextualizá-Ia. A esse domínio mais intelectual o pin-
tor estende as peculiaridades da óptica sensível que impregna suas vistas
suburbanas. Não teria sido por outra razão que Milliet asseverou que ele
"até em seus retratos fez paisagens, até em suas composições".57
Rebolo procurou superar dificuldades na abordagem da figura, alcançan-
do resultados a partir de traçados de cautelosa correção. Aplicou-se em re-
tratos a óleo, pesquisando calmas interações com o modelo, como em Ope-
rário, de 1936 (da coleção de]osé Roberto Bortoletto). Comparando essa
figura de meio-corpo com o Retrato de Osório César, de 1939, inteiramo-
nos da destreza e liberdade que adquiriu, a nível do desenho como da cor.
Nos dois auto-retratos, de 1941 e 1942 (das coleções de Isaac Krasi1chik
e particular), essa evolução se confirma, notando-se a influência de Van
Gogh no primeiro e do Cubismo no segundo. Nus enquadrados entre ob-
jetos do atelier do Santa Helena (das coleções de Waldomiro Taubkin e
Maria Alice Arrôbas Martins), pintados em respectivamente 1937 e 1939,
e composições com figuras, como Lavadeiras, de 1937 (da coleção de Isaac
Krasi1chik), e Cena de jogo no Bar, de cerca de 1938 (do MAC-USP), esta
sobretudo vizinha da pintura novecentista, fazem também parte de seu re-
pertório, com o mesmo índice de desenvolvimento plástico que atinge mais
adiante momentos de plenitude, como em Moça no jardim, de 1942 (da
coleção de Said Farhat), Mulheres no Terraço, de 1943 (da coleção de Má-
rio Schenberg), e no afresco Hospitalidade, de 1944 (da coleção de Adib Rebolo, Nu Feminino, desenho, 19
Yazbek). No proletarismo de suas imagens o aspecto social é por vezes mais
engajado, como em Esperando o Trem, de 1937 (de coleção particular),
ou na composição Operários, de cerca de 1940 (presumivelmente perdida).
Pennacchi situa-se, como vimos, entre os artistas que conciliam fontes da
pintura maior de outrora e controladas infusões da plasticidade moderna.
Observou-se também a importância da figura em sua obra. A própria paisa-
gem, contrariamente a outros santelenistas, funciona nele não como um
ato estético em si, mas como plano cenográfico inseparável do ser que a
povoa e transforma.
Suas composições com múltiplos personagens são uma herança toscana de
formas e planos que constroem um espaço perspéctico equilibrado. Resul-
tam no principal, do desenho ágil, mas ele faz prova também de sofistica-
. do~ conhecimentos cromáticos e materiais. Sua mensagem acessível diz res-
p~1tOa uma humanidade popular presente na bipolaridade temática (reli-
glosa e profana) que o caracteriza, como se registrou.
Da fase do Santa Helena são as cenas idealizadas de vindima das coleções
de Maria Aparecida Mendes de Almeida (1935) e do artista (1939) e Volta 57 O Sal da Heresia, p. 123, 1941.

154
do Trabalho (1939), também - de sua coleção, executadas a ól eo so b re pe-
quenos suportes d. e Acartao.
. Semeadores
. . M ata-
(1940), (da cole ç ão de LíVia
B h ) d d d
razzo erc t, e 1 entlcos proce lmentos técnicos, é dos quadros que al-
cançam .melhor
. Eresultado
I d - d das figuras e na leve inclinaçao
no bloco gestual -
expres.slofilsta. xemp o e retrataç~o e aldeolas e caboclos é Paisagem
com Ftguras (1941), do MAC-USP;Alem dessa e de não poucas outras obras
de assunto religioso (e.g., Fuga para o Egito, do acervo do Palácio de Ve-
rão de Campos do ]ordão, e Esmola de Santo Antônio, da coleção do ar-
tista), pertencem a esse momento murais (a óleo, do mesmo modo que as
telas mencionadas) como os da casa de Nicolau Filizola (1937) e do escul-
tor Galileo Emendabile (1898-1974) (1940).58
Pennacchi prosseguiria em anos seguintes, no afresco e no quadro de ca-
valete, nessas figurações e nas representações religiosas, recorrendo por
I'--.,
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vezes à verve caricatural. Mais tarde reduziria, com prejuízos, a compacta-
ção escultural das figuras interpenetradas ao ambiente, endereçando-se para
uma visão de gosto primitivista.
.s.-(/trld/~1r1
Sem demonstrar o mesmo grau de intensidade que notamos no paisagista
e no pintor de naturezas-mortas, Bonadei cultivou bastante a figura huma-
o Pennacchi, o Pintor Paulo Sangiu- na nas primeiras fases. Esta sua face, todavia, foi menos cogitada pela críti-
" 1941. ca e permanece menos conhecida.
A exemplo daqueles outros aspectos temáticos, também aqui, valendo-se
do óleo, registra avanços e recuos. CúmPlices (1928), de tons obscureci-
dos, pertence à estética de fundo realista, como Retrato de Inês Bonadei,
(1935), o nu reclinado Aura (1939) ou, ainda, Retrato de Wilma. No en-
tanto um desprendimento dessa correspondência rígida com o real ocor-
rera já no Auto-Retrato de 1929, onde expande as cores em movimentos
rápidos de pincel e, a seguir, em 1931, nos planos sensíveis e libertos, in-
fluenciados por Cézanne, do quadro Penteando Mulher Nua e na figura
feminina diante do espelho, do mesmo ano, que pintara no atelier de Ca-
rena, na Itália, de deformações expressionistas e senso de humor. 59
A carga expressionista acentua-se nele nos anos do Santa Helena, como no
Auto-Retrato de 1937 e no Retrato de Waldyr de 1939 (coleção de Waldyr
Bonadei Fücher), de fortes contrastes de claro-escuro (retomando a postu-
ra do mesmo modelo feita em 1932). Bonadei, aqui e em outros trabalhos,
aprofundava a interpretação dos que posavam para ele. Além disso, A Mu-
lata, de 1937 (coleção de Waldyr Bonadei Fücher), de tons monocrômi-.
cos, denota franca aproximação ao Cubismo e especialmente a Picasso -
tes últimos retirados da parede em uma abertura que não corresponde ao que se vê numa série de retratos,
mais ou menos imaginados, de concepção todavia reali~ta, pintados às ve-
das obras da coleção de Waldyr Bona- zes no mesmo ano. Provas, aqui também, no campo da figura, de seus pro-
ücher. gressos e retrocessos.

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Lisbeth Rebollo Gonçalves lembra que, comparado aos "companheiros do
Santa Helena, em relação ao estudo da figura humana, notamos, nestes, o
uso constante da 'gente humilde' como modelo: o trabalhador, o engraxa-
te, o moleque de rua, a moça do bairro que se apronta para o passeio de
domingo, elementos que aparecem freqüentemente nos trabalhos de Re-
bolo, Volpi e Pennacchi".6o Aliás, como aparecem também nos desenhos
de Graciano, Rizzotti e Zanini. Se há exemplos nesse sentido na iconogra-
fia de Bonadei, é nele de fato tênue e sem conseqüências a preocupação
com o Realismo social. Outros desígnios estavam em seu rumo. Personali-
dade introvertida, a que não faltam recalques, movido por assídua refle-
xão dos problemas estéticos, assumindo as contradições de sua produção,
ele reservou surpresas para seus contemporâneos, como quando pintou
Negra, de 1937, e O Sonho, de 1940 (da coleção de Waldyr Bonadei Fü-
cher). O Sonho é um devaneio sexológico levado à conta de "tentativa hí-
brida de fantasia e naturalismo" por Sérgio Milliet.61As especulações do
artista foram adiante, entre 1940 e 1944, na tentativa de traduzir a música
em formas plásticas - um interregno apenas curioso em sua obra, mas con-
1'- dizente com a expressão abstrata de que se tornou um dos pioneiros entre
nós.62 A notória influência cubista que nele se assenta com constância,
desde aproximadamente a metade do decênio de 1940, nas naturezas-
mortas, paisagens e figuras, não o impulsionará, porém, para uma visão fo-
ra da realidade.
Manoei Martins, como antes escrevemos, desde os tempos de participação
no Grupo assumiu uma via alternativa de representação, que continuará
a caracterizá-Io nos anos seguintes. O espaço urbano tornou-se o objeto
principal deste pintor e desenhista que se coloca na tradição dos artistas
do "heroísmo da vida moderna" e cuja vivacidade de encenação faz lem-
111
brar, em seus limites, os memoráveis filmes expressionistas, de câmaras fi-
xadas em multidões de metrópoles assustadoras. Uma "dor muda" repas-
sa o conteúdo social de seus registros de ocorrências populares da cidade
grande (São Paulo), vislumbrada, como dissemos, segundo uma óptica em
que se cruzam os níveis da realidade e da invenção fantasiosa. A figura hu-
mana, reduzida à proporção de um ínfimo aceno gráfico ou identificada
em expressões e gestos, é relacionada a um quadro perspéctico de traça-
dos irregulares, com vistas de cima para baixo, produzindo-se convulsa at- 60 Aldo Bonadei, Introdução a<
mosfera de sensações dramáticas. de um Pintor, São Paulo, Depart
Além da narrativa de ambientes externos (como no desenho da coleção Ciências Sociais da FFLCH-USI
de José Eduardo Gandra da Silva Martins, de 1937, com cenas de trabalho 1977.
61O Estado de S. Paulo, São Pat
e lazer, e na xilografia Rua de Mulheres, de 1942, do IEB-USP) e internos, 1941.
com? Cabaré (óleo de 1942, da coleção de Dinah Lopes Coelho), Manoel 62 Numerosas dessas cor
Martms, nos anos de guerra, descreveu urbes bombardeadas, onde se acres- encontram-se na coleção de Wa
centam incidências surrealizantes ao teor expressionista de sua linguagem. dei Fücher.

158
A guerra sugeriu-lhe outros temas, como o torpedeamento de navios (con-
forme Náufragos, litografia de 1942, da coleção de Elza Ré Martins).63 Sua
obra, de aspectos iconográficos sensíveis a Segall, desdobrou-se na ilustra-
ção de livros de escritores e poetas, como Aluísio Azevedo, Jorge Amado
Ja~.il.Almansur Haddad e Mário Neme, mas tenderia à crescente visão pri~
mlt1Vlsta.
É pouco o que se pode dizer da figura humana na obra de Humberto Rosa.
As cabeças femininas de 1940-43, exibidas na terceira exposição da FAP
e no Salão do Sindicato, podem ajudar à compreensão de suas característi-
cas. O artista atinha-se a uma retratação realista, elaborando a imagem atra-
vés de um desenho de acento forte. Por sua vez, o trabalho de Rizzotti
nesse campo, inclui desenhos de nus, composições com figuras, retrato~
e auto-retratos. Já fizemos alusão à participação do elemento humano em
suas paisagens, visto em primeiro plano ou a média distância. Em alguns
auto-retratos, busca sua persona austera e aflita (conforme quadros a óleo
de 1942 e 1943 e carvão de 1944 da coleção de Esmeralda Rizzotti). Riz-
zotti aproximou-se de Pennacchi e Bonadei, mas devemos reconhecer-lhe
um olhar diferencial na compreensão agitada da figura, como, ainda, de
Retrato de Rapaz, datado de 1944 e da mesma coleção, e na complexida-
de que atinge a nível de composição. Em fases tardias, tenderia, como ou-
: de um álbum contendo trabalhos
tros santelenistas, a avizinhar-se da abstração, tanto a informal como a geo-
era de vários artistas. métrica - adaptação que não lhe trouxe maiores resultados.

159
Conclusão

Meio século está transcorrendo desde a militância conjunta dos pintores


proletários do Santa Helena. Os fatores e circunstâncias que os reuniram
profissionalmente resultaram numa visão de múltiplos elementos comuns
sem que se afetassem os referenciais particulares de cada artista. Por ou-
tras palavras: em toda a sua produção há a configuração de uma consciên-
cia solidária, não sendo, entretanto, menor a crescente projeção de carac-
teres individuais. Esta feliz contextualização é que dimensiona o Grupo e
o investe de importância.
Acreditamos que se mantém na obra por eles lega da o viço de sua tempo-
ralidade - condição asseguradora da permanência de qualquer objeto ar-
tístico. Conduzidos por severa disciplina ética e estética, esses inter-
relacionadores de modernidade e tradição, movidos pelo desejo de recu-
11
111
peraçao da cultura artesanal e regidos pelas puras razões da sensibilidade,
1/
criaram um específico tecido de significados. Seus contatos com domínios
mais eruditos alargariam suas disponibilidades, permanecendo consisten-
te, entretanto, o campo emocional de imagens que lhes era próprio, inspi-
rado nas singelezas da vivência popular e seus pequenos sonhos, onde se
inseriam, e de que desvelariam os conteúdos com amplitude humanística.
Neste estudo procurou-se situar os artistas dessa associação que atravessa-
vam fase jovem de suas carreiras na segunda metade da década de 1930,
mas onde já estavam contidos ingredientes essenciais de um discurso que
alcançaria estágios de plenitude logo depois, nos primeiros anos do decê-
nio seguinte. Outros pintores daquele período, como alguns colegas seus
da FAP, seguiram, por vezes, vias expressivas e temáticas afins a suas equa-
ções e interesses. O GSH provém, entretanto, de uma coerência psicosso-
cial e estética que o torna uma unidade reconhecível no sistema represen-
tativo de toda uma geração. Mais tarde, o rumo de vários dos integrantes
da plêiade sofreria mutações consideráveis (com resultados desiguais),so-
bretudo na conjuntura da penetração da arte abstrata no País. Mesmo en-
tão afioram sempre os valores culturais que os haviam caracterizado em
seus primórdios de artistas artesãos. Com certeza trouxeram eles uma cota
respeitável para a afirmação da pintura no Brasil, em sua visualidade arrai-
g~~a no meio paulista e em correspondência com o que se produziu de
,:ahdo em outras partes deste continente, naquela época, na arte de empa-
tIa com a realidade.
(W.z. São Paulo, SP, 1987)

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182
Ja de ilustrações

onadei Nu Feminino, 1940 p. 154 Vaso de Flores, c.1940 p. 167


Desenho a nanquim, 30x20 Óleo s/tela, 59,4x45
, 1943, p. 133 Col. Lisbeth Rebollo Gonçalves, São Paulo Col. Sílvio Ré Martins, São Paulo
Ia, 76x85,5
, Estefan, São Paulo Auto-retrato, 1941 p. 165 Cal1aré, 1942 p. 168
Óleo s/tela, 45x38 Óleo s/ tela, 61 x 71
Jaraguá, 1942 p. 134 Col. Isaac Krasi1chik, São Paulo Col. Dinah Lopes Coelho, São Paulo
Ia, 59x78
berto Nicola, São Paulo Praça Clóvis Bevilacqua, início déc. 1940 p. 166 Fulvio Pennacchi
Óleo s/tela, 66x77
:te Atelier, 1942 p. 145 Col. Anésio Urbano, São Paulo Paisagem com Figuras, 1941 p. 135
Ia, 60x60 Óleo s/madeira, 51,9x72,6
,erto Chateaubriand, Rio de Janeiro Clóvis Graciano Col. MAC-USP, São Paulo
, 1937 p. 156 Paisagem do Canindé, 1936 p. 135
Barcos, 1935 p. 137
Ia, 77x57 Óleo s/tela, 40x50 Óleo slcartão, 30x40
dyr Bonadei Fücher, São Paulo Col. do artista, São Paulo
Col. José Roberto Graciano, São Paulo
39 p. 156 Paisagem de Pinheiros, 1938 p. 137 Vaso azul com Flores, 1942 p. 144
Ia, llOx150 Óleo s/tela, 56x48 Óleo s/cartão, 44,5x34,5
dyr Bonadei Fücher, São Paulo Col. Museu de Arte Brasileira -
FAAP, .São Paulo Col. do artista, São Paulo
ato, 1937 p. 161 Graxeiro, 1940 p. 152 o Pintor Paulo Sangiuliano, 1941 p. 155
não, 49,5x37 Nanquim, 32x20 Desenho à pena, 25,5xI8,5
dyr Bonadei Fücher, São Paulo Col. Antônio Vianna de Barros, São Paulo Col. do artista, São Paulo
Flores, 1940 p. 162 Auto-retrato e Mão, 1942 p. 153
Ia, 58x46 Esmola de Santo Antônio, 1938 p. 157
Óleo s/tela, 39x34 Óleo s/madeira, 30x40
icular, São Paulo Col. Biblioteca Mário de Andrade, São Paulo Col. do artista, São Paulo
Gonsales Bombardeio, 1943 p. 163 Colheita da Uva, 1939 p. 169
Óleo s/tela, 93x65 Óleo s/cartão, 60x40
morta, 1937 p. 30 Col. Museu de Arte Brasileira - FAAP, São Paulo Col. do artista, São Paulo
Oldeira, 32,4x40,5
Ole Haroldo Sancovsky, São Paulo Mulher Pensativa, 1937 p. 164 Semeadores, 1940 p. 170
Óleo s/tela, 64x48 Óleo s/cartão, 18x20
1936 p. 119 Col. José Roberto Graciano, São Paulo Col. Lívia Matarazzo Bercht, Itu (SP)
.a, 73x64
Roberto Bortoletto, São Paulo Manoel Martins Alfredo Rullo Rizzotti
:10 Prada, 1937 p. 129 Atibaia, 1937 p. 136 Retrato de Rapaz, 1944 p. 144
Ia, 47x65 Óleo s/papelão, 40,2x49,3 Óleo s/tela, 43,7x34,2
ando Rebollo, São Paulo Col. Sílvio Ré Martins, São Paulo Col. Esmeralda Rizzotti, São Paulo
tino, 1937 p. 147 Praça da Sé, início déc. 1940 p. 149 Vaso de Flores, 1943 p. 144
adeira, 48x38 Óleo s/madeira, 50x40 Óleo s/tela, 55x43 .
domiro Taubkin, São Paulo Col. Fernando Henrique Cardoso, São Paulo Col. Orandi Momesso, São Paulo

183
Auto-retrato, 1943 p. 171 Alfredo Volpi Mário Zanini
Óleo s/tela, 54,5x42,2
Col. Esmeralda Rizzotti, São Paulo Itanhaém, c.1939 p. 127 Igreja de São Vicente, c. 1940
Óleo s/tela, 33x46 Óleo s/ tela, 33,3 x 45,8
Paisagem, 1~ meto déc. 1940 p. 172 Col. Fundação José e Paulina Nemirovsky, São Paulo Col. MAC-USP, São Paulo
Óleo s/tela, 35x55
Col. Isaac Krasilchik, São Paulo Paisagem de Mogi das Cruzes, fim déc. 1930 p. 131
Óleo s/tela, 54x81,4
Paisagem com Capela, 1942 p. 172 Três Figuras Sentadas, 1 ~ meto dé
Coleção MAC-USP, São Paulo Óleo s/madeira, 32,8x48,8
Guache,32x41,3
Col. Esmeralda Rizzotti, São Paulo Col. MAC-USP, São Paulo
Vaso de Flores, c.1945 p. 142
Têmpera s/tela, 66x
Humberto Rosa Col. Marcos Marcondes, São Paulo Lavadeiras, c.1940 p. 130
Óleo s/tela, 32,8x45,9
Tucuruvi, c.1942 p. 138 Figura Feminina Sentada, c.1940 p. 146 Col. Orandi Momesso, São Paulo
Óleo s/tela, 40x50 Carvão, 49,5x35,5
Col. Armando Rebollo, São Paulo Col. da família do artista, São Paulo
Quatro Rostos de Menino, c.1936
Natureza-Morta, início déc. 1940 p. 141 Menina de Vestido Verde, c.1940 p. 175 Crayon, 34x27,7
Óleo s/tela, 31x39 Têmpera s/tela, 81x56 Col. José Eduardo Martins, São Pa
Col. Orandi Momesso, São Paulo Col. Paulo Kuczynski, São Paulo
Retrato de Hilde Weber, início dé
São Luís do Paraitinga, c.1939 p. 173 Retrato de Mulher, c.1943 p. 175
Óleo s/tela, 38,5x53 Têmpera a/tela, 80x64 Óleo s/tela, 54,9x46,3
Col. Oswaldo Martone, São Paulo Col. MAC-USP, São Paulo
Col. Júlio }!ogoricin, São Paulo

Paisagem à Beira-Rio, 1935 p. 174 Reunião à Mesa, c.1943 p. 176 Camponeses, c.1943 p. 178
Óleo s/papelão, 31,5x41 Óleo s/tela, 81,4x60,3 Óleo s/tela, 59,3x71
Col. Márcia A. Der Bedrossian, Londrina (PR) Col. MAC-USP, São Paulo Col. MAC-USP,São Paulo

184
" .
ce onomastlco

'ar, 37 Andrade, Carlos Drummond de, Baker, Sarah, 58 tlelluzzo, Ana Maria de Moraes
>hn E., 57 73 Baldocchi, Attilio, 109 92 '
Lívio, 32, 43, 45, 58, Andrade, Farnese, 73 Balloni, Armando, ,41, 44, 94, Bénéteau, A., 29, 58
, 71, 74, 75 Andrade, Mário de, 14, 22, 23, 103, 104 Bento, José
24,28,33,36,45,66,78,80, Balthus, B. K., 21, 58 Bérard, Christian, 55
Ig0, 28, 32, 39, 40, 41,
, 103, 104, 105, 139 83, 91, 103, 105, 108, 113, Bandeira, Antônio, 67, 76 Bercht, Lívia Matarazzo, 155
102, 146 114,115,116,117,118,120, Bandeira,M,anuel,26,34,76,8Q Berkowitz, Marc, 36
121, 122, 123, 136, 139, 146, Banting, John, 54 Bernanos, Georges, 51
gnácio, 56
L,73 147,151, 152 Barata, Frederico, 25, 79 Bernardelli, Henrique, 26, 32
'sef, 54 Andrade, Oswald de, 38, 41, 45, Baratta, Mário, 25, 26, 33, 36, Bernardelli, Rodolfo, 32
74, 82, 103 48, 79, 80 Bernette, Yara, 37
lue, Alexandre, 43, 46, Bersano, José, 68
Andrade, Rodrigo Mello Franco Barata, Mário, 76
de, 23, 25 Barbosa,Arnaldo,28,39,41,45, Bertazzon, Hugo, 64
que, Georgina de, 26, Bessel, Esther, 26, 28, 39, 40
,67 Andrade Filho, Oswald de, 40, 75, 94, 102, 103, 104
43,45,65,66,67,74,75 Barbosa, Francisco Assis, 34 Beuque, Jacques van de, 35
lue, Lucílio de, 26, 28, Bialostocki, Jan, 63
Andreatini, Luís, 46 Barbosa, Nélson, 104
Andreoni, Maria Rosa, 138 Bardi, Pietro Maria, 47, 60,133 Bianchetti, Glênio, 75
lue, Lucinda de Mouca,
Andrés, Maria Helena, 73 Barlach, Ernst, 53 Bianco, Enrico, 66, 74
Antal, Friedrich, 118 Barnett, Herbert, 58 Biddle, George, 57
, Pedro de, 38
Antônio Bento (de Araújo Lima), Birolli, Renato, 60
ino, Pedro, 28, 76, 94, Baroni, Alberto, 68
34, 36, 76, 79 Blanchard, Maria, 54
Barr Jr., Alfred H., 57 Blanchon, 23
Antônio Joaquim de, Antonio Pedro (da Costa), 44, Barreto, Lima, 122
50, 79, 102 Boadela, José, 35
Barros, Athayde de, 44, 46 Boese, Henrique, 35
Edgard, 25 Apocalipse, Álvaro, 73 Barros, Darcy, 132
Guilherme de, 41, 44, Aquino, Flávio de, 33, 34, 73, 79 Bogdanoff, Lothe Benter, 50
Barros, Geraldo de, 44, 46 Bogoricin, Júlio, 148
Araújo, José Osvaldo de, 73
Barros, Paulo de, 25 Boldini, Giovanni, 60
Lúcia Machado de, 74 Araújo, Octávio, 46, 67
Barsante, Cassio Emmanuel, 82 Bologna, Francisco, 33
Maria Aparecida Men- Araújo, Pedro Corrêa de, 67
Arinos, Afonso, 34 Basbaum, Leôncio, 25 Bonadei, Aldo, 14, 26, 28, 37,
:, 154
Paulo Mendes de, 37, Arms, John Taylor, 57 Bassi, Torquato, 24, 103 42,44,45,47,65,66,75,76,
,42,43,44,79,87,94 Arp, Julius, 53 Bastide, Roger, 50, 79, 128 89, 91, 93, 94, 96, 98, 99,
Barros, Antônio Carlos Vianna 100, 101, 102, 103, 104, 111,
02,103,104,105,112, Arp, Sophie Taeuber, 60
,20, 128, 139 de, 152 112, 113, 114, 118, 121, 123,
Artigas, João Batista Vilanova, 125, 126, 132, 133, 134,
Bastos, Carlos Frederico, 77
Junior, José Ferraz de, 42, 102, 103, 104, 111
Bastos, João Carlos Leite, 133 138, 139, 140, 143, 145,
Artigas, Virgínia, 44, 46, 65, 102 146, 147, 155, 156, 158,
trios Pinto, 24, 28, 45, Ascarelli, Tulio, 45 Batista, Marta Rossetti, 24
Atlan, Jean, 58 Battioni, Bernardo, 44, 46 159, 161, 162
JUssia Pinto, 26, 39, 40, Baumeister, Willy, 58 Bonadei, Inês, 155
Audivert. Pompeyo, 56 Bonnard, Pierre, 55
, Ávila, Abelardo, 56 Bava, Ubi, 33
, Werner, 34 Ávila, Sara, 73 Bazaine, Jean, 58 Bopp, Raul, 82
Bazin, Germain, 58 Borduas, Paul-Émile, 57
Jorge, 41, 74, 79,159 Ayres, Lula Cardoso, 66, 71, 76
Beccari, Vera D'Horta, 34, 36 Borione, Adolfo, 93
Aracy A., 32, 52, 82 Ayrton, Michael, 56
Beckmann, Max 21, 54, 58 Borromini, Francesco Castelli,
Tarsila do, 26, 28, 36, Azevedo, Aloísio de, 159
Bedrossian, Márcia R. Der., 138 120
',40,41,45,50,54,58, Azevedo, Fernando de, 23 Bortoletto, José Roberto, 154
,66,67,69,73,74,78, Azevedo, Francisco de Paula Ra- Behring, Edith, 33, 65, 73
li mos de, 92 Bell, Clive, 56 Bossaglia, Rossana, 55
Bellini, Giovanni, 122 Botticelli, 48
) Neto, João, 25 Azevedo, Vera Vicente, 41

185
Boucher, Jacques, 55 136 Cipicchia, Ricardo, 43 Demuth, Charles, 5~
Cardoso Junior, José Bernardo, Clark, Kenneth, 56 Derain, André, 21, ~
Boudin, Eugene Louis, 55
Bourdelle, Érnile-Antoine, 53, 70 39, 65, 66, 67 Clark, Ligia, 50 Dewasne, Jean, 60
Cardozo, Joaquim, 76 Clesse, Louis-Lievint, 60 Di Cavalcanti, Emilia
Boutigny, Paul-Emile, 55
Bracet, Augusto, 26 Carelli, Antônio, 44, 46 Coelho, Dinah Lopes, 158 32,38,39,41,44,
Braga, Rubem, 36, 79 Carena, Felice, 60, 94, 132, 155 Cogniat, Raymond, 67 65,66,67,69,70.
Braga, Theodoro, 28, 76, 86 Carnicelli, Mick, 44, 47, 106 Conrard, Jean, 55 77, 123
Bragaglia, Anton Giulio, 41 Carpeaux, Otto Maria, 5 I Corbino, Jon, 58 Dias, Cícero, 26, 40,
Branco, Sansão Castello, 34 Carvalho, Flávio de Rezende, 23, Cordeiro, Waldemar, 46, 60 64,65,71,76, T
Brancusi, Constantin, 53, 69 24,26,28,38,39,40,41,43, Corinth, Lovis, 54, 58 Diehl, Gaston, 58
Brandão, Jacques do Prado, 74 45,47,54,64,65,66,67,71, Corona, Eduardo, 34 Divani, Aladino, 93
Braque, Georges, 54, 55 73, 75, 77, 80, 86 Corona, Pedro, 102 Dix, Otto, 21, 54, 5
Brecheret, Juranda, 143 Carvalho, Genaro Antonio de, Corot, Jean-Baptiste, 55, 122 Djanira (da Mota e Si!
Brecheret, Victor, 26, 39, 40, 77 Correia, José Gomez, 33 66, 74
45,67,69 Carvalho, Marcelino de, 29 Costa, Borges da, 32 Dodgson, Campbell
Brentani, Gerda, 24, 37, 44, 46 Carvalho, Ronald de, 28 Costa, Cacilda Teixeira da, 76 Domela, Cesar, 60
Brest, Jorge Romero, 66 Carrà, Carlo, 21, 54, 60, 125 Costa, Fernando, 55 Dongen, Kees van,
Brill, Alice, 44, 113 Cassa, Rubem, 33, 65, 74 Costa, Ignês Corrêa da, 67 Dosamantes, Franci!
Brinton, Christian, 64 Cassat, Mary, 56, 58 Costa, Lucio, 21, 25, 26, 33 Douchez, Jacques, 4
Brisolla, Ciro Monteiro, 41 Cassiano Ricardo, 4 I Costa, Lygia Martins, 60 Dove, Arthur, 57
Broca, Brito, 79 Cassinari, Bruno, 60 Costa, Navarro da, 31 Dreyfus, André, 38
Bromberg, Lucie, 50 Castro, Amilcar de, 73 Costa, Waldemar da~ 24, 26,40, Duarte, Paulo, 23
Bruno, Ernani Silva, 92 Castro, Moacyr Werneck de, 36 41,43,45,47,49;66,67,72, Dubugras, Victor, 2
Bruno, Gino, 43, 76, 102, 106 Cavalcanti, Alberto (de Almeida), 73,74,76,94,102,104,139 Duchamp, Marcel, 2
Bulcão, Athos, 34, 65, 66, 67 41 Courbet, Gustave, 55, 147 Dufy, Raoul, 48, 53,
Burchfield, Charles, 56, 57, 58 Cavalcanti, Carlos, 79 Couto, Ribeiro, 122 Dupaty, France, 35,
Burlamaqui, Maria Cristina, 26 Cavaleiro, Henrique, 64, 67 Cozzo, Humberto, 26, 64 Durand, José Carlos
Burle Marx, ROberto, 25, 33, 37, Cela, Raimundo, 65 Cravo Junior, Mário, 77 29,92
58,65,66,67,73,74 Celso Antônio (Meneses), 25, 26, Cucé, José, 43, 44, 102 Dürer, Albrecht, 53
Byington, Elisa Botelho, 34 33, 70 Cucé, Lila Camargo, 44
Cendrars, Blaise, 50, 52 Czaky, Joseph, 53
Cenni, Franco, 42, 43, 45, 75,
79, 91, 103, 104
Cerqueira Cesar, Roberto, 37 Elpons, Georg Fisch
Calder, Alexander, 55, 60 Ceschiatti, Alfredo, 34, 73 126
I' Calderon, Valentin, 77 Cézanne, Paul, 19, 33, 48, 49, Dacosta, Milton, 33, 34, 36, 65, Emendabile, Galileo
Calixto, Benedito, 126 55, 68, 76, 118, 122, 126, 66, 74, 89, 113 Erni, Hans, 55
I Calvet, Bernard Henri, 55, 127, 132, 138, 139, 140, 148, D'Amico, Tereza, 75 Esquerdo, Domingo
I
Camargo, Arthur Octavio de, 155 Daphinis, Nassos, 58 57
II 133 Chabloz, Jean-Pierre, 35, 76 Daubigny, Charles-François, 55 Estefan, João, 133
Camargo, Iberê, 34, 58, 65, 66, Chagall, Marc, 53, 69 Daumier, Honoré, 55 Esteve, Maurice, 58
74,75 Chalreo, Sílvia, 36, 66, 79 David, Jacques-Louis, 55 Etz, Hans, 74
Camerini, Enrico, 46, 67 Chambelland, Carlos, 64 Davis, Stuart, 57, 58
Campello, Maria, 34 Charoux, Lothar, 44, 46, 47, 66 Deane,Percy, 34,65,66,67,74
Campiglia, GueIfo Oscar, 45 Chasseriau, Théodore, 55 Debenedetti, Emma, 92
Campofiorito, Hilda, 65, 66, 74 Chastel, André, 120 Debret, Jean-Baptiste, 46
Campofiorito, Quirino, 32, 33, Chateaubriand, Assis, 47 Degand, Léon, 60 Fabris, Annateresa, '
36,41,44,49,65,66,74,79, Chateaubriand, Gilberto, 140, Degas, Edgard, 55 Fagundes, Ary, 57
113 143 Deinhard, Hannah Levy, 79 Fam, Fernando, 74
Campos, Paulo Mendes, 74 Chaves Neto, Elias, 45 Delacroíx, Eugene, 55 Faré, ~ichel, 58
Capanema, Gustavo, 23, :1:5 Chiacchio, Carlos, 76 Delastouche, Georges, 55 Farhat, Said, 154
Capibaribe, Clidenor (Barrica), Chiarelli, Domingos Tadeu, 53 Delaunay, Robert, 52, 53, 55 Fattori, Giovanni, 6
76 Chirico, Giorgio de, 21, 49, 53, Delaunay-Terk, Sonia, 53,60 Fausto, Boris, 22
Carboncini, Anna, 50 54, 58, 60 DelpinoJunior, Alberto, 26, 73 Feijó, Heitor, 76
Cardoso, Fernando Henrique, Cimabue, 42, 120 Denis, Maurice, 55 Feininger, Lyonel, 5

186
es, Eva Lieblich, 44, Fücher, Waldyr Bonadei, 132, 137, 145, 146, 147, 149, Heller, Geza, 34
155, 158 151,152,153,158,163, Herbin, Auguste, 54, 60
es, Millôr, 74 Fukushima, Tikashi, 36, 47 164 Heuberger, Theodor, 28, 29,
Arnaldo, 44, 45, 93, Funi, Achille, 60 Graciano, José Roberto, 118, 31, 53, 54,73
135 Higaki, Hajime, 44, 46
Ileana Maria Ficarelli, Grassmann, Marcc:lo, 46, 66 Hitler, Adolph, 35
Grauand, Erwin Ritter Busse, Hodle:r, Ferdinand, 49
Geraldo, 40, 41, 42, 39, 50 Hofer, Karl, 32, 54
3,64,78,79,80 Galván, Je:sús Guerrero, 56 Graves, Morris, 58 Hofmann, Lisa Ficker, 41, 44
, Carlos Frederico, 57 Galve:z, Raphae:l, 24, 44, 45, Graz, John, 24, 26, 39,44, Holanda, Sérgio Buarque de,
Lucy Citti, 40, 44, 100, 102, 106 45, 49 22
7, 74, 75 Garcia, Odette: Branco, 127 Graz, Regina Gomide, 26, 39 Holding; Eilee:n, 55
, João, 79 Gauguin, Paul, 55 Gris, Juan, 53, 54 Home:r, Winslow, 56, 58
, Procópio, 38 Géo-Charle:s, 54, 55, 61 Gromaire, Mareei, 54, 55 Hoppe:r, Edward, 21, 56, 57,
ão Batista, 76 Gérard, François Pascal Si- Gros, Antoine: Jean, 55 58
Suzanne Thullier, 55 mon, 55 Gross, Duja, 28,41,65 Hora, Abe:lardo da, 76
, Adriano, 99 Géricault, Théodore, 55 Grosz, Ge:orge:, 21, 32, 54, 57, Hourticq, 53
, Bernardino, 99, 102, Giannetti, Marília, 73 58 Howard, Charlc:s, 54
Giedion, Siegfrie:d, 37 Gropius, Walte:r, 37 Huygue, Re:né, 58
Jr., Joaquim Lopes, Giorgi, Bruno, 25, 36, 42, 43, Grube:r, Mário, 44, 45, 46 Hyde, Lawrence, 60
1,43,45,64, 75, 93, 45, 47, 75, 101, 102, 104, Guasti, Anna Maria Zorlini,
101, 102, 104, 105, 105 109
Giorgi, Giuliana Segre:, 44, 46, Guasti, Augusto, 127
:10, Wilson de, 74 79, 102 Gue:rsoni, Odetto, 43, 44, 46,
Nicolau, IIl, 133, Giotto, 42, 133 47
lanelli, Arcângc:lo, 45
Gischia, Léon, 58 Guerra, Júlio, 44 lanni, Constantino, 91
\na Maria, 29 Giudice, Antonio, 111 Guglie:lmi, Romolo, 93
Ingre:s, Jean-Auguste Domini-
)asquale, 29 Gleizes, Albe:rt, 52, 53, 54 Guido, Angc:lo, 79
que:, 55
neSto de, 37, 40, 41, Gobbis, Vittorio, 26, 28, 37, Guignard, Alberto da Veiga, Israc:l, Huguette:, 46
7, 50, 51, 79, 104, 39, 40, 41, 42, 43, 45, 50, 24, 26, 28, 32, 33, 34, 39,
121, 126, 127 53, 58, 64, 102, 103, 104, 40,41, 45, 48, 50, 64, 65,
Mozart, 79 120, 121, 139 66,67,71,72,73,74,83
liró (Tanaka), 36, 44, Goe:ldi, Osvaldo, 24, 32, 37, Guimarãe:s, Jayme, 25
'i 41, 56, 65, 67, 69, 71, 74, Guimarães, José T., 76
;amson, 44, 60 77 Gullar, Ferreita, 102 J. D., 58
Adolpho, 24, 28, 43, Guper, Milton, 151 Jagle, Adolpho, 25, 36, 101
Gome:s, Paulo Emílio Salle:s,
103 45, 74 Guttuso, Re:nato, 60 Janacopulos, Adriana, 25
lliana R., 57 Jonas, Lucie:n, 55
Gomide:, Antônio Gonçalves,
49, 50, 53 24, 26, 38, 39,40, 41, 43, Jongkind, Johan-Barthold, 55
:lico (Fra Giovanni da José Cláudio, 76
44,45,49,64,67,71
e), 133 Jouve:t, Louis, 51
Gonçalve:s, Eros Martins, 36
i, Caetano, 45 Haar, Le:opoldo, 50 Justus, Lídia, 125
Gonçalve:s, Lisbeth Re:bollo,
Emily A., 57 81, 114, 158 Haarberg, Wilhelm, 49
Maria Eugênia, 46, 79, Goodwin, Philip L., 64 Haddad, Jamil Almansur, 159
Gorky, Arshile:, 57 Hadjinicolaou, Nicos, 117
~duardo D'Oliveita, Gotuzzo, Leopoldo, 56 Haimer, Chaim, 128
Goussef, João, 44, 103 Handa, Tomoo, 40, 45, 46, Kaminagai, Tadashi, 35, 36
xpedido Camargo, 32 Gouvêa, Re:nato Magalhãe:s, 76 103 Kandinsky, Wassily, 58, 60
orge de Souza, 23, Graciano, Clóvis, 14, 22, 29, Hanotaux, Gabric:l, 53 Kaufmann Junior, Edgar, 67
I
41, 42,44,47, 4~65, 66, Haro, Martinho de:, 26, 32 Ke:lly, Cc:lso, 21, 33, 79
)dette de, 40, 42, 43, 67, 74, 75, 77, 80, 83, 89, Harris, Elizabe:th, 23 Ke:rn, Maria Lúcia Bastos, 75
;, 136 91,94,97,98,99,100, He:cke:l, Erich, 54, 58 Kirchne:r, Ernst Ludwig, 58
;iIberto, 22, 80 101, 102, 103, 104, 106, Heep, Adolf Franz, 50 Klee:, Paul, 14, 58
Ithon, 55 Il2, Il3, Il4, Il5, Il7, Hc:ise, Franz, 50 Koch, Samuc:l, 58
'nesto, 99, 109 118, 120, 123, 135, 136, Helion, Je:an, 54 Koe:llre:utte:r, H.}., 51

187
Kokoschka, Oskar, 53, 58 Levi, Rino, 23, 25, 26, 36, 37, Manessier, Alfred, 58 Maxence, Edgar, 2
Kollwitz, Kaethe, 38, 53, 54, 41,45 Manet, Edouard, 55, 58 Maya, Castro, 25
58,61,81, 82 Levi, Yvonne T. Arié, 37 Manzo, Henrique, 68, 106 McCurry, H. O., S
Koslow, Sigmund, 58 Lévi-Strauss, Claude, 50, 79 "Maranca, Paolo, 46 Mecozzi, Vicente,
Levy, Hannah (Deinhard), 35 Marc, Fr:mz, 58 104
Korngold, Lucjan, 50
Krajcberg, Frans, 46, 47 Lewy, Walter, 44, 45, 50, 66, Marchetti, Aldorigo, 43, 44, Médici, Luis, 24
Krasilchik, Isaac, 138, 139, 77, 102 103, 109, 110, 111 Mehlich, Ernst, 51
154 Lhote, André, 53, 54, 55 Marcier;" Emeric, 35, 65 Meidner, Ludwig,
Krause, Félix, 32 Liebermann, Max, 54, 58 Marcondes, Marcos Antônio, Meireles, Cecília,
Kristein; Lincoln Edward, 46 Lima, Bernardino Franz de, 74 140, 152 Meitner, Laszlo, 3
Krug, Arthur P., 41, 44, 104, Lima, Jorge de, 65, 66 Marcoussis, Louis, 54 Mello Junior, Don
105 Lima, Nogueira, 93 Maria Clara, 36 Mello, Suzy de, 7
Kubin, Alfred, 53, 58 Lima, Renato de, 73 Mariani, Valerio, 54 Mello e Souza, Gi.
Kubin, Auguste, 69 Lima, Yone Soares, 24 Marin, John, 57, 58 Meio, Virgínius d:
Kubitschek de Oliveira, Jusce- Lipchitz, Jacques, 25, 53 Marinetti, F. T., 50 Mendes, Amadeu,
lino, 25, 72, 73 Lisboa, James, 148 Marini, Marino, 54 Mendes, Ciro, 79
Kuczynski, Paulo, 147 Lisboa, José Carlos, 73 Marino, João, 125 Mendes, Murilo, ~
Kupka, François, 60 Lobato, Rodrigo Monteiro, 24, Maron, Friedrich, 50, 53 80,83
Kunn, Alfred, 32 53, 128 Marquet, Albert, 55 Méndez, Leopold(
Lobo, Bruno, 25 Martins, Aldemir, 45, 46, 47, Menegale, J. Guin
Longdsen, Alfred A., 56 76 74, 79
Longhi, Roberto, 124 Martins, Elza Ré, 136, 159 Mengozzi, Federic
Loureiro, Maria Cecília França, Martins, Ibiapaba, 79, 114 Mesquita, Alfredo
La Fresnaye, Roger de, 55 46 Martins, José Eduardo Gandra Messina, Francesc
Lacanna, César, 32, 43, 44, Loutsch, Marta; 74 da Silva, 158 Meyer, Sylvia, 26.
45, 46, 93, 94, 102 Lucas, Constança M. L. de AI- Martins, Luís, 28, 41, 78, 79, Michel, Georges,
Lacerda, Carlos, 36 meida, 50 82, 86, 114, 120, 123 Milde, Jeanne, 73
Landucci, Lelio, 33, 79 Luís Washington, 79, 114 Martins, Maria, 67 Millet, Jean-Franç.
Larocca, Vicente, 76, 94, 102 Lunarcharski, A., 80 Martins, Maria Alice Arrôbas, Milliet, Lourdes, ;
Lau, Percy, 56, 65, 66, 74, 76 Lurçat, Jean, 54, 55 154 Milliet, Sérgio, 24
Laurencin, Marie, 53 Martins, Manoel, 14, 24,41, 45,47, 57,60,
Le Corbusier (Charles Edouard 42,45,47,65,66,72,74, 81,83, 86, 91,
Jeanneret), 23, 26, 50 75, 76, 77, 89, 91, 94, 96, 114, 123, 127,
Le Fauconnier, Henri, 54 100, 101, 104, 111, 113, 151,154,158
Le Moal, Jean, 58 Mabe, Manabu, 36, 44 114,120,121,136,140, Mindlin, José, 37
Leão, Carlos, 25, 32, 33, 65 MacDonell, Polly, 35 147, 149, 158, 167, 168 Mindlin, Vera Bo(
Leão, Josias, 25 Machado, Anibal, 28, 31, 32, Martins, Silvio Ré, 136, 140 Mingo, Roque de
Leão, Paulo V. Lopes de, 43 34,41,64,79,80,82 Martins, Wilma, 73 Miranda, Alcides
Lechowski, Bruno, 24, 32, 39, Machado, Lourival Gomes, 74, Martone, Oswaldo, 98, 138 32, 33, 34, 41
50,51 79, 83, 86, 114, 128 Marx, Karl, 80 67,74
Lefevre, Renée, 41, 42, 43, Macke, August, 58 Marzi, Joseph Li, 58 Miranda, Nicanor
45, 66, 75, 76, 104 Maclagan, Eric, 56 Masaccio, 133 Miranda, Yeda, 31
Lega, Silvestro, 60 Maffai, Mario, 60 Masereel, Frans, 54 Miró, Joan, 53, 5'
Léger, Fernand, 21, 52, 53, Magalhães, Paulo Ribeiro de, Masson, André, 54, 55 Modigliani, Amed
54,58 36, 38, 103 Matarazzo Sobrinho, Francis- Mohalyi, Yolanda
Lehmbruck, Wilhelm, 58 Magnelli, Alberto, 24, 53, 54 co, 24, 47 " 45, 50
Leite, Rui Moreira, 38, 40, 73, Magnelli, Aldo, 25 Matisse, Henri, 34, 48, 54, 55, Momesso, Orandi
78, 80 Maillol, Aristide, 58 140, 148 140, 148
Leite, Vicente Ferreira, 56 Malagoli, Ado, 28, 32, 33, 93, Matos, Aníbal, 79 Monet, Claude, 5'
Lemos, Carlos, 50, 51 102, 113 Matsa, Sílvio, 25, 127 Monica, Virgílio (
León, Diaz de, 55 Malevitch, Kasimir, 29 Maugüé, Jean, 45, 50, 79 103
Leontina, Maria, 44, 46, 66 Malfatti, Anita, 19, 24, 26, 28, Maul, Carlos, 79 Monteiro, Joaquir
Leskosckek, Axl, 24, 35, 50, 39, 41, 43, 44, 64, 67, 69, Maurício Roberto, 33 54,67
65 74, 75, 76, 103, 104, 105 Maurício, Virgílio, 79 Monteiro, Robert.
Levi, Mário, 44, 74, 100 Mandre, Emile Albert de, 55 Mavignier, Almir, 36, 50 Monteiro, Vicentc

188
4,55,61,67,69,70, Nicolao, Teresa, 35, 67 Pedrosa, Misabel, .35 39,40,42,45,46,49,64,
O Nicolas, 28 Pellegrino, Hélio, 74 65,66,67,70,71,73,74,
:gro, Enrique Caravia, Niemeyer, Oscar, 25, 34, 73. Pennacchi, Fulvio, 14, 24,41, 77, 80, 82, 83, 92, 104,
Nigri, Silvio, 68 42,43,45,75, 89, 90, 91, 120, 152
:gro, Roberto, 56 NObiling, Elisabeth, 36, 40, 94,96, 98, 99, 100, 101, Post, Franz, 47
Heni-y, 56 43, 45 102,103,104, 111, 112, Poty, Napoleon Potiguara Laz-
José, 25, 31, 33, 34, Nóbrega, Nélson, 24, 28, 40, 113, 114, 122, 133, 135, zarotto, 34, 36, 65, 66, 74
7, 74, 75 42, 43, 45, 47, 58, 65, 66, 139, 143, 144, 146, 147, Prado, Bella Karawaewa, 44
Vinicius de, 80 75, 76, 104, 105, 111 154, 155, 157, 158, 159, Prado, Carlos, 38, 40, 47, 65,
José Chavez, 56 Noebauer, Hans, 50 169, 170 66,67
Frederico, 33, 35 Nolde, Emil, 58 Pennacchi, Marino, 135 Prado, Décio de Almeida, 74
Rubens Borba de, 37 Norfini, Alfredo, 93 Penrose, Roland, 54 Prado, Fãbio, 45
, Giorgio, 54 Novais, Israel Dias, 143 Penteado, Armando Álvares, Prado, Paulo, 36
Bernardo, 55 Novelli, Gastone, 47 24 Prado Junior, Caio, 22, 38, 74
Jorge, 25 Penteado, Darcy, 44 Prazeres, Heitor dos, 65, 74
Ettore, 46 Penteado, Olívia Guedes, 36 Prendergast, Maurice, 58
i, Hélio, 109, 110 Penteado, Yolanda, 24 Presser, Josef, 58
i, Pedro, 109 Perea, Francisco, 100 Prete, Danilo di, 44, 45
rge, 44, 47 O'Keeffe, Georgia, 57 Peregrino Júnior, 79 Putz, Léo, 26, 50
Grace L. McCann, 67 Oliveira, Ariovaldo de, 101 Péret, Benjamin, 50 Puvis de Chavannes, 55
, Ennio, 60 Oliveira, Orlando de, 93 Peretto, Benedito Lacorte, 25
lichard M., 92 Oliveira, Plínio Corrêa de, 40 Perissinoto, Giuseppe, 103
idson, 33, 67 Ornellas, Manoelito de, 75, 79 Pérret, Auguste, 23
ilãvio, 22,47,79,92 Orozco, José Clemente, 21, 56 Pestana, Nestor, 79
Emílio, 74 Osir, Paulo Rossi, 26, 28, 36, Petit, Georges, 23 Quadrench, Antonio, 93
Noêmia, 45, 65, 67, 37,39,41,42,43,45,46, Petrucelli, Luciana, 46
49,50,58,64,65,74,94, Petti, Nicola, 43
Otto, 54 102, 103, 104, 105, 111, Pettorutti, Emilio, 50, 53
Li,Tulio, 76,102 112, 118, 120, 121, 136, Piacentini, Marcello, 25
Edvard, 69 139 Picabia, Francis, 60 Ramos, Graciliano, 41
Gervasio Furest, 40 Osório César, 25, 36, 38, 79, Picasso, Pablo, 21, 34, 53, 54, Ranzini, Milton, 93
Osvaldo Sampaio Fu- 94, 101, 102, 114, 136 55, 69, 70, 152, 155 Read, Helen Appleton, 57
4l Ostrower, Fayga, 35 Picchia, Guido dei, 101 Read, Herbert, 56
Bartolomé Esteban, Oswald, Carlos, 26, 28, 35, Picchia, Menotti dei, 45, 79 Rebelo, Marques (Eddy Dias
56,64 Piero della Francesca, 133 da Cruz), 25, 34, 53, 65,
;enesco, 73 Pierucetti, Fernando, 73 72, 73, 122
Pignon, Edouard, 58 Rebolo Gonsales, 14, 24, 28,
Pinto, Octãvio, 39 30, 37, 41, 42, 43, 44, 45,
Piper, John, 56 47,65, 66, 74,75,83,89,
Palãcio, Arsênio, 79 Pirajã, Eduardo O., 43 9:1,94,95,98,99, 100,
nto, Myrna de Arruda, Pancetti, José, 27, 32, 33, 44, Pirandello, Fausto, 54, 60 101,102,103,104,111,
47, 56, 65, 67, 74, 77, 83, Pisis, Filippo de, 53, 60 112, 113, 114, 119, 122,
ml, 56 136 Pissarro, Camille, 55 124, 125, 127, 128, 129,
Ruben, 36, 65, 79, Panelli, Ferdinando, 93 Piza, Artur Luíz, 44 138, 140, 143, 147, 154,
4, 123, 127, 133, 139 Parreiras, Antônio, 26 Piza, Domingos Viegas de To- 158, 165, 166
)s, Sarah Affonso de Pascin, Jules, 49, 54 ledo, 41, 43, 65, 94, 104, Rebollo, Armando, 128, 138
:Ia, 53 Paula, Inimã de, 36, 66, 76 105 Rebuffo, Victor, 56
fãrio, 159 Pechstein, Max, 58 Plekhanov, Georges, 80, 82 Redon, Odilon, 55
mael, 26, 39,64,69, Peccinini, Daisy de Alvarado, Poiava, Bráulio, 32 Rego, José Lins do, 74
45 Pompon, François, 53 Reidy, Affonso Eduardo, 25
:élia, 36 Pedrazza, Giuliana, 44 pongetti, Henrique, 79 Reis Filho, Nestor Goulart, 92
osé Maria da Silva, Pedrosa, Israel, 67 Porretta, Orlando, 138, 140, Renoir, Auguste,55
Pedrosa, José, 34, 66 143 Rescala, João José, 33
>n, Ben, 54, 56 Pedrosa, Mãrio, 36, 38, 79, Portinari, Cândido, 21, 24, Reyersbach, Hans, 50
Norberto, 133 81,82,83, 86, 102 25, 26, 27, 28, 32, 33, 36, Rezende, Otto Lara, 74

189
Rezende, Pola, 24, 44, 45 Saarlnen, Ellel, 50 26, 32, 66, 113 Taylor, Francis Henry, 57
Ribeiro, José A., 68 Sablno, Fernando, 74 Slgnac, Paul, 55 Telxelra, Anísio, 23
Ribeiro, Milton Martlns, 34 Saciloto, Luís, 46 Siléslo, Mário, 73 Telxelra, Osvaldo,
Ribeiro, Samuel Chaves Mar- Saco, Carmen, 57 Silva, Fernando, 128, 143 26,55,56,64
tlns, 25, 29, 64 Sala, Luís, 44, 103 Silva, Maria Helena Vieira da, Telles, Carolina da Silva, 2
Rlchards, Cerl, 54 Salfattl, Amerlco, 93 35,37,50,58,65,83 Tenrelro, Joaquim, 28,32,1
Rlstorl, Oreste, 38 Salmonl, Anlta, 92 Silva, Oscar Pereira da, 28, 76 Teruz, Orlando,
Rlvera, Dlego, 21, 49, 56 Sampalo, Oswaldo, 41 Silva, Qulrlno da, 26, 40, 42, 26,39,41,65,66
Rlzkallah, Alfredo Naglb, 147 Sancovsky, Clara, 140, 143 44,45,47,64,65,74,79, Toledo, Aldary, 32, 33, 6(
Rlzzottl, Alfredo Rullo, 14 42, Sanglrardl Júnlor, 41 111,114 Toledo, Lafayette, 44
66,89, 91, 94, 97, 98, 99, Sanglullano, Paulo, 42, 43, 45, Slmeone, Angelo, 43, 44, 45, Tonlssl, João, 43,109,125
100, 101, 104, 112, 114, 104 75, 102, 103 Tonnancour, Jacques G. d
138, 140, 143, 144, 147, Santa Rosa Junlor, Tomás, 32, Slmões, Gonçalo, 79 60
148, 158, 159, 171, 172 34,35,40,56,58,65,66, Slnger, Otto, 50 Torres, Caciporé, 44
Rlzzottl, Esmeralda, 89, 138, 74, 79, 82 Slngler, Gustave, 58 Torres, Paulo, 38
139, 159 Santiago, Haldéla Lopes, 64 Slqueiros, Davld Alfaro, 21, . Tosl, Arturo, 54, 60
Rob, Karl, 56 Santiago, Manoel, 32, 49, 64, 38, 50 Toulouse-Lautrec, Henri d
Roberts, Laurence P., 57 67 Slronl, Mário,. 21, 60 55
Rocco, Antonio, 28, 94 Santomaso, Gluseppe, 60 Slsley, Alfred, 55 Travassos, Nélson Palma,
Rodln, Auguste, 53 Santos, Crlstlna Ávila, 74 Sltwell, Sacherevell, 65 Trevelyan, Jullan, 54
Rodrlgues, Augusto, 65, 66, Santos, João Maria dos, 55 Slvers, Artur, 25, 46 Tuplnambá, Vara, 73
74, 76, 77 Sarfattl, Margherlta, 24, 55, Slevogt, Max, 58
Rodrlgues, Glauco, 75 125 Smith, G. E. Kidder, 64
Rodrlguez, Gulllermo, 57 Sargent, John Slnger, 58 Smlth, Lelghton, 58
Roosevelt, Franklln D., 66 Scarlnci, Carlos, 75 Soares, Luís, 41, 65
Rosa, Airton, 138 Scavone, Amadeo, 94 Sodré, Nlomar Monlz, 25, 47. Udler, Berco, 44, 66
Rosa, Dante, 101 Schaeffer, Frank, 36, 67 Sofflci, Ardengo, 21 Ulmann, Chlnlta, 39
Rosa, Humberto, 14, 42, 45, Schenberg, Mário, 25, 79, Sorgenlcht Filho, Conrado, 24 Ungaretti, Giuseppe, 45, ~
75, 89, 91, 94, 97, 98, 114, 147, 154 Sourlau, Etienne, 33, 50 Urbano, Anéslo, 128
100, 101, 103, 104, 112, Schlele, Egon, 56 Souza, Emídlo, 44, 47, 126 Urruchua, Demétrlo, 56
113, 114, 121, 138, 140, Schmldt, Afonso, 38 Sparapanl, Sebastiano, 99 Utrlllo, Maurlce, 55, 128
141,159,173,174 Schmldt-Rottluff, Karl, 54, 58 Spencer, Gllbert, 56
Rosa, Teresa, 101, 114, 138 Schnelder, Gerard, 58 Stchoukine, 29
Rosal, Ottone, 60 Schwanzmann, Slmon, 26 Sterllng, Charles, 139
Rosenfeld, Anatol, 51 Scllar, Carlos, 28, 36, 37, 42, Suané, Lúcia, 66, 111
Rossl, Alice, 37, 46 43,44,65,66,67,72,73, Susukl, Takashl, 46 Vaccarlnl, Bassano, 45, 4~
Rossl, Tarquínlo, 109 74,75,77,79, 102, 104, Susuki, Teiti, 45 Valllant, George C., 57
Rowe, L. S., 66 105 Sutherland, Graham, 56 Valle Junior, Paulo, 64
Rothklrch, Oscar, 39 Scott, Willlam, 56 SzeJnbejn, Chanlna L., 73 Valloton, Félix, 55
Rouault, Georges, 55 Seellnger, Héllos, 26, 103 Szenes, Arpad, 35, 36, 37, 50, Valmler, Georges, 54
Rousseau, Henrl, 48, 55 Segall, Lasar, 24, 26, 28, 34, 53, 58, 65, 83 Van Gogh, Vlncent, 34, 5
Rousseau, Théodore, 55 36, 37, 39, 40, 41, 45, 49, 68, 136, 154
Roux, Madelelne, 75 58, 64, 65, 67, 69, 71, 73, Van Rogger, Roger, 35
Rubens, Carlos, 79 74,77,83, 120, 136, 159 Vargas, Getúlio, 22, 35, ~
Rublão, Murilo, 74 Segall, Jenny K., 39 Vargas, José Israel, 74
Ruchtl, Jacob, 41, 65 Semeghlnl, Pio, 94, 133 Takaoka, Yoshyla, 33, 44, 45, Vasarely, Vlctor, 53
Rudge, Antonleta, 37, 42 Sercelll, Bruno, 99 46,77, 102, 103, 113 Vasconcellos, Ernanl, 25
Rudofsky, Bernard, 23, 37, Sercelll, Oreste, 99 Tal Coat, 55 Vasconcellos, Sylvlo de, ~
41,50, 104, 105 Serpa, Ivan, 36 Tamagnl, Carlo A., 24 74 .
Servranckx, Vlctor, 60 Tamaki, YuJl, 33, 45, 46 Velde, Bram van, 60
Seurat, Georges, 55 Tanaka, Walter Shlgeto, 45 Velde, Gheer van, 58, 60
Severlnl, Glno, 21, 53, 54,60 Tanguy, Yves, 55 Velloso, Hlldegardo Leão
Shahn, Ben, 57, 58 Tarasantchl, Ruth Sprung, 46 64
Sã, Bustamante, 32, 64, 113 Slckert, Walter Rlchard, 56 Tasslnari, Sophla, 44 Verhaeren, Émlle, 152
Sã, Déllo Ribeiro, 34 Slgaud, Eugênio de Proença, Taubkin, Waldomlro, 154 Vlaro, Guldo, 50, 77

190
vone Luzia, 73, 74 Worms, Gastão, 28, 44, 45,
.úcia Gouvea, 21, 26 47,65,67,76,99,102
,fary, 73, 74 Wright, Frank Lloyd, 23, 50
acques, 58, 60
ico, 93
, Eliseu, 26
I, Cipriano 5.,66
.Mercedes, 147 Xceron, Jean, 54
k, Maurice, 53, 54, 55
lfredo, 14, 24, 28, 41,
~, 44, ,45, ,46, 47,
5,74,75,89, 91, 94,
8, 99, 100, 101, 102, Yamagishi, Harumi, 64, 101
104, 105, 109, 110, Yazbek, Adib, 111, 154
112, 113, 114, 121,
123, 125, 126, 127,
131,140,142,146,
158, 175, 176
Edouard, 53, 55 Zach, Jan,35
Zach, LeOli, 54
Zamoyski, August; 35, 73
Zangerl, 39
Zani, Amadeo, 26, 93
Henry A., 66, 67 Zanini, Mãrio, 14, 28, 42, ,43,
chik, Gregori, 23, 36, 45,46,47,50,65,66,74,
i, 50, 53 75,89,91,93,94,97,98,
chik, Mina, 36 99, 100, 101, 102, 103,
Ddrigues, José, 39, 104,109,110,111,112,
)2 113, 114, 118, 120, 121,
Thomas J., '57 122, 123, 124, 125, 126,
iilde, 44, 46, 50, 58, 127, 128, 130, 140, 146,
)2 147,148,150,158,177,
.tax, 57, 58 178
g, Alfredo, 53 Ziembinski, Zbigniew Marian,
nn, Franz, 73 51
., Paulo, 32, 41, 65, Zola, Émile, 116
Zorlini, Amélia Mariot, 148
, James McNeill, 56, Zorlini, Giancarlo, 126, 148
Zorlini, Ottone, 25, 43, 102,
IV,Anatol, 44 103
'k, Maria, 46 Zuccolotto, Rosa Rosenthal,
Wilhelm, 35, 58 46
Alexandre, 50 Zweig, 5tefan, 51

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