Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Soldagem Na Industria Naval Moderna PDF
Soldagem Na Industria Naval Moderna PDF
MATERIAIS E PROCESSOS
(Artigo publicado na Revista Soldagem & Inspeção – Ano 6. Nº 9 – Suplemento Técnico BR)
RESUMO
A indústria naval brasileira permaneceu adormecida nas últimas décadas devido à sua situação
econômica desfavorável e pouco competitiva em relação ao mercado mundial. No entanto, devido
às novas medidas econômicas anunciadas pelo Governo Federal, espera-se a retomada das
atividades do setor naval já nos próximos meses. Diante desse quadro bastante promissor,
verifica-se a necessidade de atualização tecnológica do segmento naval nacional, visto que
muitos estaleiros estrangeiros continuaram ativos nesse período, incentivando o desenvolvimento
de novos materiais e técnicas mais modernas de soldagem. Assim, este artigo tem o objetivo de
apresentar e discutir resumidamente as características dos principais metais de base e metais de
adição utilizados na construção naval moderna; mostrar o resultado de experiências comparativas
realizadas entre alguns processos de soldagem e fornecer exemplos práticos de aplicação desses
materiais e processos de soldagem.
ABSTRACT
Brazilian shipbuilding industry remained sleeping during the last decades due to its unfavorable
and less competitive economical situation in relation to the world market. However, due to the new
decisions announced by the federal government, the Brazilian shipbuilding activities are tending to
take up again in the next months. In the face of this very promising picture, it is necessary to have
a technological updating, since the foreign shipyards have been active during this period,
supporting the development of new materials and modern welding processes. Thus, this paper has
the following objectives: present and discuss concisely the characteristics of the main base and
filler metals employed in modern shipbuilding industry; compare some welding processes in terms
of quality and productivity; and give some practical examples of these materials and welding
processes application.
A indústria naval brasileira está se preparando para a retomada de suas atividades a partir do
segundo semestre do próximo ano. Este impulso está relacionado às novas medidas de
financiamento anunciadas no último dia 24 de outubro pelo Governo Federal, que elevam o prazo
de amortização dos empréstimos de 15 para 20 anos, reduzem a taxa de juros de 6% para valores
entre 4% e 6% e aumentam o valor máximo dos financiamentos de 85 para 90%. Tais medidas já
deram resultado. A Transpetro, empresa transportadora da Petrobrás, pretende iniciar a
construção de dois navios Suezmax, com 130 mil toneladas de peso bruto cada um e dois
Panamax, com 60 mil toneladas de peso bruto cada, totalizando um investimento de US$ 150
milhões. A empresa Mercosul Line investirá US$ 50 milhões na construção de dois navios
contêineres nos estaleiros brasileiros. Além disso, segundo a Secretaria Estadual de Energia,
Indústria Naval e Petróleo do Rio de Janeiro, outras companhias estão interessadas em construir
suas embarcações no Brasil. A Aliança Hamburg Sud pretende montar quatro navios com
recursos de US$ 200 milhões, o grupo dinamarquês Maersk investirá US$ 100 milhões na
construção de quatro embarcações de apoio offshore e o grupo Neptunia tem um projeto de dois
“full containers” no valor de US$ 56 milhões cada (1,2).
Diante deste quadro bastante promissor, a comunidade de soldagem deve se preparar para
participar e atender as necessidades do segmento naval. Isto porque a soldagem sempre
desempenhou um papel fundamental no cenário mundial da construção de embarcações. Basta
dizer que a soldagem representa atualmente um terço de todos os serviços executados na
construção de um navio de grande porte (3).
Por este motivo, o presente artigo tem os seguintes objetivos: apresentar e discutir
resumidamente as características dos principais metais de base e metais de adição utilizados na
construção naval moderna; mostrar o resultado de experiências comparativas realizadas entre
alguns processos de soldagem e fornecer exemplos práticos de aplicação desses materiais e
processos de soldagem.
Em tempos mais remotos, quando não existiam materiais adequados e técnicas de junção
eficazes, muitos estaleiros já utilizavam a soldagem na construção de navios e embarcações.
Consequentemente, esta época foi marcada por problemas metalúrgicos e graves acidentes,
decorrentes principalmente, da inexperiência e falta de treinamento dos profissionais envolvidos
nos projetos, da baixa qualidade dos metais de base e de adição empregados e da ausência de
suporte técnico especializado. O exemplo mais conhecido deste período da história naval é o caso
dos navios ingleses “Liberty Ships”, os quais foram construídos totalmente por soldagem durante a
segunda guerra mundial e, quando colocados em operação, literalmente quebraram ao meio(3).
Com o objetivo de garantir a uniformidade e a qualidade dos serviços executados, a maioria dos
navios e embarcaçòes são construídos de acordo com normas técnicas de sociedades
classificadoras internacionais. Assim, as principais entidades deste tipo são: a ABS-American
Bureau of Shipping, a BV-Bureau Veritas, a LR-Lloyds Register of Shipping, a GL-Germanischer
Lloyd e a DNV-Det Norske Veritas. Essas sociedades tem a função de estabelecer os padrões e
métodos de classificação de todos os materiais empregados na construção naval, entre outras
atribuições(3). Com os materias utlizados na soldagem não poderia ser diferente.
No caso dos aços de resistência elevada, as propriedades mecânicas requeridas pela Norma são
atingidas através da adição de carbono, manganês e alumínio de maneira semelhante aos aços
de resistência moderada. No entanto, devido aos maiores limites de resistência e tenacidade
requeridos por estes aços, outros elementos ainda devem ser adicionados. O nióbio, o vanádio e
o titânio apresentam a mesma função do alumínio e, portanto, agem como refinadores de grão(5).
O cobre, o cromo, o níquel e o molibdênio podem ser adicionados com o objetivo de endurecer o
aço pelo mecanismo metalúrgico de solução sólida substitucional. Nos aços da classe FH, pode-
se ainda acrescentar nitrogênio para o endurecimento por solução sólida intersticial.
AH 32 0
DH 32 315 440 22 -20 31 22 38 26 46 31
EH 32 590 -40
FH 32 -60
AH 36 0
DH 36 355 490 21 -20 34 24 41 27 50 34
620
EH 36 -40
FH 36 -60
AH 40 0
DH 40 390 510 20 -20 41 27 - - - -
650
EH 40 -40
FH 40 -60
e=espessura L=cp longitudinal T=cp transversal
Os metais de adição normalmente empregados para a soldagem dos aços comuns na industria
naval são os eletrodos revestidos, utilizados no processo manual ou por gravidade, os arames
sólidos, para os processos MIG/MAG e Arco Submerso, e os arames tubulares, para a soldagem
com ou sem proteção gasosa(3,8). A Tabela 2 relaciona os consumíveis de soldagem utilizados
com maior freqüência na indústria naval.
Eletrodos revestidos
AWS A5.1
E 6012 Revestimento rutílico com sódio
E 6013 Revestimento rutílico com potássio
E 7018-1 Revestimento básico com adição de Mn e 30% de pó de ferro
E 7024 Revestimento rutílico com adição de pó de ferro
E 7028 Revestimento básico com adição de 50% de pó de ferro
Arames tubulares
AWS A5.20
E 71-T1 Fluxo rutílico-básico
Em princípio, os materiais especiais utilizados na indústria naval são os aços inoxidáveis, as ligas
de níquel e as ligas de cobre. Os aços inoxidáveis são largamente empregados na construção de
tanques para cargueiros químicos, petroleiros, embarcações para o transporte de produtos
corrosivos, gases liqüefeitos e tubulações de interligação entre tanques de armazenamento. As
ligas de níquel destinam-se às aplicações que necessitam de resistência à corrosão em altas
temperaturas ou elevados valores de tenacidade em temperaturas reduzidas. Já as ligas de cobre
são recomendadas para componentes que devam apresentar boas propriedades mecânicas,
elevada resistência á corrosão e ausência de magnetismo, evitando interferências nos controles
de direção do navio.
Conforme comentado anteriormente, existe uma variedade de ligas especiais que podem ser
empregadas na fabricação de um navio. No entanto, as operações de soldagem realizadas em
aços inoxidáveis são muito mais freqüentes do aquelas envolvendo as ligas de níquel ou de cobre.
Isto se deve à grande quantidade de aços inoxidáveis empregada na construção naval em relação
aos outros materiais especiais. A Tabela 3 relaciona os aços inoxidáveis mais utilizados na
fabricação de tanques para a indústria naval, com suas respectivas propriedades mecânicas e
composições químicas resumidas conforme a Norma ASTM A 240-83(10).
O aço inoxidável do tipo 304 apresenta uma microestrutura austenítica com moderada resistência
à corrosão intergranular e por pites. A susceptibilidade à corrosão por pites pode ser reduzida a
partir da utilização de ligas com adição de molibdênio tais como os aços 316 e 317. Já o problema
da corrosão intergranular pode ser resolvido através da utilização de ligas com teores reduzidos
de carbono tais como os aços “L” (Low carbon) nas versões 304L, 316L e 317L. No entanto, esta
redução das quantidades de carbono pode provocar a deterioração das propriedades mecânicas
do aço. Caso esta deterioração mecânica seja um problema para os requisitos de projeto, ao
invés da opção por aços da série “L”, é preferível utilizar ligas da série “LN”, com baixos teores de
carbono e adições de nitrogênio, o qual promove o endurecimento do aço pelo mecanismo
metalúrgico de solução sólida intersticial, substituindo o efeito endurecedor do carbono. Além
disso, as adições de nitrogênio também apresentam outras vantagens como o aumento da
resistência à corrosão por pites e a redução da temperatura crítica de transição(11). A Figura 1
mostra um tanque para transporte marítimo de produtos químicos inteiramente construído por
soldagem em aço inoxidável 316LN com eletrodo revestido especial E 316LN.
Além dos aços inoxidáveis austeníticos da série 300 discutidos até o momento, a indústria naval
também utiliza em larga escala os aços inoxidáveis duplex S31803 e S32550. Esses materiais
apresentam uma excelente combinação de propriedades mecânicas e elevada resistência à
corrosão. Em geral, os aços inoxidáveis duplex possuem o dobro do limite de escoamento dos
Figura 1 – Tanque para o transporte marítimo construído por soldagem em aço inoxidável
E316LN com eletrodos revestidos também E316LN-17. (Cortesia: Boehler Thyssen)
Além disso, as ligas duplex apresentam o dobro da resistência à corrosão por pites em relação
aos aços inoxidáveis austeníticos convencionais. Tais propriedades se devem à composição
química e à microestrutura ferrítica-austenítica desses materiais. A Figura 2 mostra um navio
cargueiro químico com tanques totalmente construídos por soldagem em aço inoxidável duplex
UNS S31803.
Figura 2 – Cargueiro químico com tanques de armazenamento construídos por soldagem em aço
inoxidável duplex UNS S31803 com arame tubular E 2209 T0-4. (Cortesia: Boehler
Thyssen)
Eletrodos revestidos
AWS A5.4
E 308L-XX XX =15 → revestimento básico
E 316L-XX XX =16 → revestimento rutílico
E 309L-XX XX =17 → revestimento rutílico-básico
E 309L-XX
E 309LMo-XX
~E 316LN
E 2209-XX (duplex)
* EN 1600 25 9 4 NL B22 (Superduplex)
Em princípio, o processo de soldagem por Arame Tubular apresenta maior produtividade do que
os outros dois processos mencionados(13). Como exemplo desta superioridade, pode-se citar que
no tempo de soldagem igual à 01 minuto, deposita-se um cordão de 800 mm de comprimento com
arame tubular, 670 mm com MIG e 280 mm com eletrodo revestido. A Figura 3 mostra os cordões
de solda obtidos nesta experiência. Além disso, a soldagem com arames tubulares promove uma
penetração mais uniforme e segura em comparação ao processo MIG, como pode ser verificado
na Figura 4. No entanto, o custo dos arames tubulares é mais elevado em comparação ao dos
Outro ponto importante que deve ser considerado na seleção do metal de adição adequado é a
posição em que a solda será feita. Na maioria das vezes, não existe a possibilidade de posicionar
a peça para a soldagem na posição plana, sendo necessárias as deposições verticais ou até
mesmo sobre-cabeça. No passado, existiam apenas eletrodos revestidos e arames sólidos
capazes de atender as necessidades das soldagens fora de posição. Atualmente, já existem
arames tubulares para a soldagem em todas as posições, conhecidos pelo nome “PW” (Positional
Welding). Este avanço tecnológico foi possível graças ao desenvolvimento de um fluxo interno ao
arame que proporciona a formação de uma escória de resfriamento rápido, evitando que o
material fundido escorra durante a soldagem em posições adversas(14). Por estes motivos, a
Como exemplo da aplicação dos arames tubulares PW, a Figura 5 mostra um injetor de água para
o sistema anti-incêndio de uma plataforma marítima de prospecção de petróleo norueguesa. Este
equipamento foi confeccionado inteiramente por soldagem a partir de tubos de aço inoxidável
duplex S31803, com espessuras de 15-25 mm e metal de adição AWS E2209 T1-4 de 2,0 mm de
diâmetro. Nota-se que existem soldas circunferenciais horizontais (posição 2G) e soldas
circunferenciais verticais (posição 5G), em locais de difícil acesso, executadas sem nenhum
problema.
Figura 5 – Injetor de água para sistema anti-incêndio de uma plataforma marítima de prospecção
de petróleo, construído totalmente por soldagem em aço inoxidável duplex,
utilizando os arames tubulares PW. (Cortesia: Frank Mohn Flatoy A.S. Norway)
A indústria naval mundial tem incentivado o desenvolvimento de novos materiais para atender aos
seus requisitos de produtividade e qualidade, os quais se mostram cada vez mais exigentes.
Assim, a crescente utilização dos aços inoxidáveis duplex em substituição às ligas inoxidáveis
convencionais e o desenvolvimento dos arames tubulares PW para a soldagem em todas as
posições são exemplos desse avanço tecnológico.
Do ponto de vista socio-econômico, pode-se concluir que a preparação técnica das empresas
brasileiras, em antecipação à esse novo impulso da indústria naval, certamente contribuirá para a
redução da importação de materiais e mão de obra, favorecendo o crescimento das atividades
industriais nacionais e a diminuição do desemprego local.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
3- OKUMURA, T; TANIGUSHI, C Engenharia de Soldagem e Aplicações. A Soldagem na Construção Naval. Ed. LTC Livros
Técnicos e Científicos. P. 296-313.
4- AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS. A 131-82 Standard Specification for Structural Steel for Ships. ASTM.
USA. v. 01.04. 1984. p. 151-158.
5- BUREAU VERITAS Rules and Regulation for the Classification of Ships and Offshore Installation-Materials. Section 2. NR.
216DNCRO2E. 1997.
6- COLPAERT, H Metalografia dos Produtos Siderúrgicos Comuns. Ed. Edgard Blücher. Brasil. 1992.
7- AMERICAN WELDING SOCIETY. AWS A5.1-91 Specification for Carbon Steel Electrodes for Shielded Metal Arc Welding.
AWS. USA. 1991. p. 42.
8- TOMINAGA, S; ZANIBONI, W Proposta para Desenvolver a Soldagem na Construção Naval do Brasil. Em: XIII Encontro nacional
de Tecnologia da Soldagem. Anais. Associação Brasileira de Soldagem. Outubro. 1987. P.197-229.
9 – SEYFFARTH, P; HOFFMANN, J O Laser na Construção Naval- Realidade, Visão ou Ideal? Em: I Simpósio sobre Tecnologia de
Soldagem Brasil-Alemanha. Anais. Associação Técnica Brasil-Alemanha. Junho. 2000. P.60-74.
10- AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS. A 240-83 Standard Specification for Heat Resisting Chromium and
Chromium-Nickel Stainless Steel Plate, sheet, and Strip for Pressure Vessels. ASTM. USA. v. 01.04. 1984. p. 185-194.
11- FOLKHARD, E.; Welding Metallurgy of Stainless Steels. Ed. Springer-Verlag, Austria, 1988.
12- OLSSON, J.; FALKLAND, M.L. The versatility of duplex. In: Duplex America 2000 Conference, Houston-USA, 2000. Proceedings,
2000, p. 41-51
13- AMERICAN WELDING SOCIETY. Welding Handbook. Volume 1. 8º edition. Ed. Leonard P. Connor. USA. 1991. p. 7-10
14- PERTENEDER, E; TÖSH, J; ZIEGERHOFER, J Capabilities and Limitations of Modern Slag-Forming Filler Materials for Duplex
Stainless Steel Welding. In: Duplex America 2000 Conference, Houston-USA, 2000. Proceedings, 2000.