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Introdução à Economia

2ª Frequência

1 Teorias e políticas económicas em perspetiva histórica.

1.1. Primeiras formulações: mercantilismo e fisiocracia.

Mercantilismo

Contexto histórico Mercantilismo


- O Mercantilismo foi uma doutrina económica que surgiu durante a Idade Moderna,
em um período de expansão marítima e comercial das nações europeias.
- As principais potências da época eram Portugal, Espanha, Inglaterra, França e
Holanda, que buscavam ampliar seus impérios coloniais e acumular riquezas.
- Acreditava-se que a riqueza de uma nação estava na posse de metais preciosos, como
o ouro e a prata, e o comércio internacional era considerado uma disputa de soma
zero, ou seja, o ganho de uma nação significava a perda de outra.

Características do Mercantilismo
- O Mercantilismo defendia a intervenção ativa do Estado na economia para aumentar
a riqueza e o poder do país.
- O acúmulo de metais preciosos, especialmente ouro e prata, era considerado
fundamental para a riqueza de uma nação, e o comércio exterior era estritamente
regulado pelo Estado.
- As colônias eram vistas como fontes de matérias-primas e mercados consumidores
para a metrópole, e o protecionismo comercial era amplamente adotado para proteger
a produção local e limitar a concorrência estrangeira.

Teorias do Mercantilismo
O Mercantilismo foi influenciado por várias teorias económicas da época.
- Uma das principais teorias era a Balança Comercial Favorável, que defendia que uma
nação deveria exportar mais do que importar, assim acumulando metais preciosos.
- Outra teoria era o Metalismo, que afirmava que a quantidade de metais preciosos
determinava a riqueza de uma nação, e por isso o Estado deveria controlar a mineração
e o comércio desses metais.
- Além disso, a teoria do Protecionismo defendia a imposição de tarifas e barreiras
comerciais para proteger a indústria local e estimular a produção interna.

Práticas do Mercantilismo
Na prática, o Mercantilismo foi marcado por políticas económicas protecionistas e
intervencionistas.
- Os Estados implementavam políticas de monopólios comerciais, concedendo
privilégios exclusivos a determinadas empresas para o comércio com as colônias e
outros países.
- Também eram comuns as políticas de subsídios e incentivos governamentais à
produção de bens considerados estratégicos para a nação.
- Além disso, eram utilizadas políticas de regulação e controle do comércio exterior,
como a imposição de altas tarifas de importação para proteger a indústria local e
estimular a produção interna.
- Os governos também buscavam promover a colonização de territórios ultramarinos
para garantir o acesso a matérias-primas e criar mercados para seus produtos.
- As Companhias de Comércio, como a Companhia das Índias Orientais e a Companhia
das Índias Ocidentais, eram exemplos de empresas comerciais monopolistas criadas
pelos Estados para explorar colônias e estabelecer monopólios comerciais.

Autores importantes no Mercantilismo


Thomas Mun, um escritor inglês, acreditava que:
- A acumulação de ouro era o meio mais importante para aumentar a riqueza nacional.
- O comércio exterior devia ser protegido e controlado pelo Estado para garantir a
entrada de ouro no país.
- O excedente de exportações em relação às importações era crucial para o
desenvolvimento económico.
- O papel do Estado era proteger e estimular o comércio, o que ajudaria a aumentar a
riqueza do país.
Jean Bodin foi um economista francês e um dos principais teóricos do mercantilismo.
Ele escreveu o livro "Les Six Livres de la République" em 1576, onde apresentou suas
ideias económicas. Algumas das principais ideias de Bodin incluem:
- O Estado deve ter o poder de controlar e regulamentar a economia para garantir o
bem-estar do país.
- O comércio exterior é importante para o desenvolvimento económico e deve ser
estimulado.
- A acumulação de ouro e prata é crucial para aumentar a riqueza nacional.
- O Estado deve proteger as empresas nacionais de concorrentes estrangeiros.
- A agricultura é a base da economia e deve ser protegida e desenvolvida.

David Hume foi um filósofo e economista escocês do século XVIII que teve um grande
impacto na filosofia e na economia. Suas ideias incluem:
- Escritos sobre a natureza da moeda, a inflação e o dinheiro
- Teoria da oferta e da procura
- Criticismo da teoria mercantilista
- Defesa do livre comércio
- Teoria do comércio justo e equilibrado
- Enfoque no papel da observação empírica na economia
- Crítica ao determinismo económico
- Defesa da razão e da liberdade individual.

Críticas e declínio do Mercantilismo


Apesar de suas teorias e práticas, o Mercantilismo foi alvo de várias críticas e
enfrentou desafios que levaram ao seu declínio.
- Algumas das críticas mais comuns ao Mercantilismo incluíam a visão de que a
acumulação de metais preciosos não era a única medida de riqueza de uma nação, e
que o comércio internacional poderia ser benéfico para todas as partes envolvidas.
- Outra crítica era de que as políticas protecionistas do Mercantilismo limitavam a
concorrência e prejudicavam o desenvolvimento económico e a eficiência produtiva.
- Além disso, a ascensão do liberalismo económico, com suas ideias de livre comércio
e liberdade individual, também desafiou os princípios mercantilistas.

Legado do Mercantilismo
Apesar do declínio do Mercantilismo, seu legado ainda é visível em muitos aspetos
do sistema económico moderno.
- Muitas das práticas económicas, como o protecionismo comercial e a intervenção do
Estado na economia, ainda são debatidas e praticadas em alguns países atualmente.
- O Mercantilismo também teve um papel importante na formação do capitalismo
moderno, ao estabelecer as bases para a acumulação de capital, o desenvolvimento da
indústria e do comércio, e a expansão colonial.
- Por fim, o Mercantilismo foi um marco importante na evolução do pensamento
económico, servindo como base para o desenvolvimento de outras teorias e escolas
económicas ao longo da história.

Conclusão do Mercantilismo
- O Mercantilismo foi um sistema económico que prevaleceu na Europa durante os
séculos XVI ao XVIII, caracterizado pela busca de acumulação de metais preciosos,
políticas protecionistas, controle do comércio exterior e intervenção do Estado na
economia.
- Apesar de suas críticas e declínio, o Mercantilismo deixou um legado importante na
formação do capitalismo moderno e influenciou muitas práticas económicas ainda
presentes atualmente.
Fisiocracia

Principais conceitos da Fisiocracia


Foi uma escola de pensamento económico que surgiu na França no século XVIII, foi uma
das primeiras escolas económicas a propor uma abordagem sistemática para o estudo da
economia e teve um impacto significativo na formação da economia moderna.
- A principal ideia da Fisiocracia era que a riqueza de uma nação dependia da produção
agrícola e da circulação de bens e serviços.
- Os fisiocratas acreditavam que a economia devia ser regida pelas leis da natureza e
que as interferências governamentais deveriam ser limitadas.
- os principais conceitos da Fisiocracia:
o "ordem natural" (l'ordre naturel);
o "classe produtiva" (classe productive.
- A agricultura era a única fonte verdadeira de riqueza, uma vez que os agricultores
produziam bens a partir da natureza e geravam excedentes que sustentavam toda a
economia.
- O governo deveria seguir a "lei natural" (la loi naturelle) e não intervir na economia,
mas sim garantir a proteção dos direitos de propriedade e a liberdade de comércio.

Críticas à Fisiocracia
- Falta de consideração de outras atividades económicas além da agricultura, a ausência
de uma teoria de valor e a visão utópica de uma ordem natural idealizada.

Teoria do Fluxo Circular de François Quesnay


Acreditava que a riqueza da nação estava na produção agrícola e que o Estado deveria
facilitar esse desenvolvimento, não interferindo na livre circulação de bens e na livre
iniciativa dos agricultores e defendia a redução de impostos e barreiras comerciais para
estimular a economia. Dividiu a economia em três classes principais: a classe produtiva,
a classe estéril e a classe proprietária.
- A classe produtiva, composta principalmente pelos agricultores, era vista como a
única classe que produzia bens reais e, portanto, era considerada a fonte verdadeira
de riqueza.
- A classe estéril, composta por artesãos e trabalhadores em outras atividades, não era
considerada produtiva, pois não produzia bens reais, mas apenas transformava ou
distribuía os produtos da agricultura.
- A classe proprietária, composta pela nobreza e pelo clero, era vista como uma classe
improdutiva, que obtinha sua riqueza através de privilégios e impostos sobre a
produção agrícola.
- O Fluxo Circular de Quesnay mostra como os produtos agrícolas fluem dos
agricultores para os artesãos e trabalhadores, e destes para a classe proprietária na
forma de renda.
- Por sua vez, a classe proprietária devolve parte dessa renda aos agricultores como
pagamento pelos produtos agrícolas, fechando assim o ciclo económico.
- A Teoria do Fluxo Circular de Quesnay defendia a importância da agricultura como a
atividade económica fundamental, responsável pela geração de riqueza na sociedade.
- Essa teoria influenciou a visão fisiocrata de que a agricultura deveria ser valorizada e
protegida, e que as políticas económicas deveriam estar voltadas para o
desenvolvimento do setor agrícola.

1.2. A Economia Política Clássica.

Adam Smith
Introdução
Adam Smith (1723-1790) foi parte do Iluminismo Escocês (juntamente com
David Hume, Adam Ferguson, Thomas Reid, etc.), tendo sido Professor de Lógica e
Filosofia Moral na Universidade de Glasgow, atividade da qual resultou o seu livro Teoria
dos Sentimentos Morais (1759).
Mas é com a publicação da Riqueza das Nações (1776) que Smith vai ganhar
maior notoriedade e ser por muitos considerado como o “pai fundador” da ciência
económica.
O objetivo da sua obra é como o próprio título completo indica, descobrir “a
natureza e as causas da riqueza das nações”.
Na resposta à questão do fundamento da riqueza das nações, Smith defende que é
o trabalho humano e a forma como é aplicado. Esta é uma ruptura significativa com as
ideias mercantilistas e fisiocratas que o antecederam.
A Riqueza das Nações está organizada em cinco partes ou “livros”:
- Os dois primeiros livros abordam a primeira e a segunda causa da riqueza das
nações;
- o terceiro discute a importância relativa das atividades agrícola, manufatureira e
comercial;
- o quarto apresenta e critica “os sistemas de economia política”;
- e o quinto trata dos “deveres do soberano” e do seu financiamento.

Divisão do trabalho e extensão de mercados


No livro I, acerca da primeira causa da riqueza das nações, a divisão do trabalho
é apresentada como a causa do “acréscimo do poder produtivo do trabalho”, isto é, do
aumento da produtividade do trabalho.
Smith parte da observação empírica de uma fábrica de alfinetes. Enquanto sem
divisão do trabalho, isto é, sem especialização dos trabalhadores numa só tarefa e sem
recurso a máquinas, um trabalhador produziria no máximo vinte alfinetes por dia, numa
manufatura em que a produção de alfinetes estava decomposta em múltiplas tarefas
simples, dez trabalhadores fabricavam 48 000 alfinetes por dia.
Devido aos seguintes fatores:
- ao aumento da destreza dos trabalhadores quando se dedicam a uma só tarefa;
- à poupança de tempo que de outra forma é gasto na mudança de uma tarefa para
outra;
- à facilitação da invenção e utilização de máquinas.
Smith não fez a distinção entre divisão técnica do trabalho – a que ocorre por
exemplo no interior da fábrica de alfinetes – com divisão social do trabalho – a que
existe numa sociedade em que os indivíduos se especializam em determinadas atividades
ou profissões.
A divisão (social) do trabalho depende da extensão dos mercados – numa
pequena aldeia ninguém encontra procura para todo o seu excedente; em contrapartida,
nas grandes cidades a procura é grande e a especialização fácil.
A generalização das trocas e da produção para a troca teria dado origem à moeda.
Valor e preço
A moeda facilita as trocas, mas quais são as regras que determinam o valor
relativo, ou valor de troca, dos bens?
O “valor”, constata Smith, tem dois significados: utilidade (valor de uso) e poder
de compra de um objeto expresso numa quantidade de outro objeto (valor de troca).
“Utilidade”, para Smith, não designa a satisfação (subjetiva) que um objeto de
consumo pode proporcionar, mas antes a capacidade que o objeto tem de satisfazer uma
necessidade (objetiva). Smith afasta assim a possibilidade de a utilidade determinar o
valor de troca dos bens.
Questões que, segundo ele, devem ser respondidas para elucidar a questão do valor:
a. Qual a verdadeira medida do valor de troca (ou preço real);
b. Quais as diferentes parcelas de que o preço real se compõe;
c. Quais as razões pelas quais o preço de mercado não coincide por vezes com o
preço natural.
Aqui existem três noções de preço - real, de mercado e natural – que serão sucessivamente
tratadas por Smith, ao tentar responder às questões de (a) a (c).

a) Preço real
O preço real de uma mercadoria é dado pela quantidade de trabalho que essa mercadoria
pode comprar.

b) Parcelas do preço real


Ao contrário das economias primitivas, nas economias da época, a quantidade de trabalho
empregue na produção de um bem deixa de ser o único fator a determinar o valor de troca
do bem, isto é a quantidade de trabalho que o bem pode adquirir, pois existe capital e
apropriação privada da terra.
Agora o valor de troca deve ser repartido em três parcelas:
o uma para remunerar o trabalho (salários),
o outra para remunerar o capital (o lucro),
o outra para remunerar a terra (a renda).
b.1) Preço natural
É possível assim esclarecer a noção de preço natural. Quando um bem é vendido por um
preço que cobre os salários, os lucros e as rendas à respetiva taxa natural, diz Smith, ele
é vendido pelo seu preço natural.
Existe uma taxa de salário abaixo ou acima da qual, só temporariamente, o salário
se pode situar –> a taxa de salário de subsistência.
Relativamente à taxa natural de lucro, Smith é muito mais impreciso. Sabe-se que a
taxa de lucro depende negativamente da acumulação de capital. Não há aqui uma teoria
explicativa do processo que leva à determinação de uma taxa natural de lucro. Esta é
indeterminada na teoria do valor de Smith.
Resta a taxa natural de renda, considerada como residual, mas que não é explicada.
O Preço Natural é o somatório de três parcelas: salário natural, lucro natural e renda
natural; destas três parcelas só o salário natural é teoricamente determinado (salário de
subsistência); o lucro natural é indeterminado e a renda natural é um resíduo.

c) Distinção entre preço natural e preço de mercado


O preço de mercado, isto é, o preço pelo qual as mercadorias são efetivamente
vendidas, pode ser diferente do seu preço natural, mas tende a convergir para ele.
O “preço de mercado” é determinado pela relação entre a quantidade que é, de facto,
posta no mercado e a “procura por parte daqueles que estão dispostos a pagar o seu preço
natural”, isto é, pela relação entre a oferta e a procura efetiva. O preço de mercado tende
a aproximar-se do preço natural.
“O preço natural”, conclui Smith, “é, portanto, por assim dizer, o preço central para
o qual tendem continuadamente os preços de todos os bens”.

Causas da segunda ordem da riqueza das nações


A existência e crescimento do stock de riqueza destinada ao desenvolvimento de
atividades produtivas, a acumulação de capital, é uma outra causa, de segunda ordem, da
riqueza da nação.
Esta causa é de segunda ordem porque a própria divisão do trabalho depende da
acumulação prévia de capital.
Os bens privados tanto podem ser destinados ao consumo como à obtenção de
rendimento. É destes últimos que se trata quando Smith fala de capital. O capital por sua
vez pode ser fixo (ex.: máquinas, ferramentas) ou circulante (ex.: matérias-primas).
O capital é, portanto, constituído por bens destinados à obtenção de rendimento.
Como se obtém rendimento a partir de riqueza acumulada?
- “Um homem enriquece empregando um grande número de operários”.
- Mas também é possível aplicar riqueza acumulada, delapidando-a: um homem
“empobrece se mantiver uma multidão de criados”.
Isto significa que a riqueza acumulada mesmo quando é aplicada na aquisição de trabalho
tanto pode levar ao enriquecimento como ao empobrecimento. Tudo depende do tipo de
trabalho que é adquirido e da sua utilização.
Assim, o trabalho produtivo é aquele “que eleva o valor daquilo a que é
aplicado”, enquanto é trabalho improdutivo aquele que “não é aplicado a qualquer
objeto destinado à troca”. O trabalho produtivo cria riqueza, enquanto o trabalho
improdutivo delapida-a.
Assim, a riqueza da nação depende “da proporção entre os que estão empregados
em trabalho produtivo e os que não o estão”.
Enquanto os proprietários tinham tendência para a prodigalidade, os capitalistas
preferiam a parcimónia.
Em síntese, a riqueza da nação dependia não só da divisão do trabalho, mas
também “da proporção entre os que estão empregados em trabalho produtivo e os que
não o estão”, ou, dito de outra forma, da proporção da riqueza que é destinada ao
pagamento de salários de trabalhadores produtivos, matérias-primas e equipamentos
(capital) e a que é gasta a financiar o consumo da parte não produtiva dos habitantes da
nação.

A crítica dos sistemas de economia política


Os “sistemas de economia política” a que Smith se refere e critica no livro IV – o
“sistema mercantil” (mercantilismo) e o “sistema agrícola” (fisiocracia) – são as ideias e
políticas económicas correntes da sua época.
O “sistema mercantil” é objeto de uma forte crítica por parte de Smith. Entre outros
aspetos destaca:
o A conceção falaciosa de riqueza (confundindo essência com aparência)
o O “espírito de monopólio” e o protecionismo por prejudicarem o interesse do
“público” (consumidores).
o A promiscuidade entre interesses económicos e poder político.
O “sistema agrícola”, a fisiocracia, o “sistema que apresenta o produto da terra como
única fonte de rédito”, era encarado por Smith com simpatia: “este sistema com todas as
suas incorreções é talvez aquele que mais se aproxima da verdade entre tudo o que tem
sido publicado em economia política”.
As “incorreções” da fisiocracia a que Smith se refere eram três:
a. A subvalorização da importância da indústria nas cidades;
b. A classificação do trabalho dos artífices como trabalho improdutivo;
c. O elogio do consumo, que ignorava a importância da parcimónia para a
acumulação de capital.
Em oposição ao “sistema agrícola”, e sobretudo “ao sistema mercantil”, Smith
defende o seu “sistema de liberdade natural” cujas características fundamentais são a
liberdade de iniciativa individual, a concorrência e a abstenção de comando da
economia por parte do soberano.
A iniciativa liberta, guiada pelo interesse próprio e enquadrada pelas leis da justiça,
levaria cada indivíduo a contribuir para o bem público mesmo quando essa não era a sua
intenção original, tudo se passando como se existisse uma mão invisível que fizesse
convergir interesses públicos e privados.

Os deveres do soberano
O primeiro dos deveres do soberano era a defesa da “sociedade da violência e
das invasões de outras sociedades independentes”.
A defesa poderia ser assegurada quer por uma milícia quer por um exército
permanente. Smith considerava o exército permanente profissionalizado uma melhor
solução e atribuía ao soberano, isto é, ao Estado, a missão de organizar e manter esta
instituição com fundos provenientes dos impostos.
O segundo dever do soberano era “proteger, tanto quanto possível, todos os
membros da sociedade contra a injustiça ou os ataques de qualquer outro membro”, isto
é, garantir a justiça – designadamente a proteção da propriedade privada e o respeito
pelos contratos.
Em terceiro, o soberano deveria ainda zelar pela “criação e a manutenção
daqueles serviços e instituições que embora possam ser altamente benéficos para uma
sociedade, são, todavia, de uma natureza tal que o lucro jamais poderia compensar a
despesa.
Exemplo: estradas, pontes, canais navegáveis e portos, e educação.
Smith defende como princípio geral o autofinanciamento desses serviços e
instituições através de portagens, taxas e, no caso do ensino, de propinas.
Thomas Malthus e o Ensaio sobre o Princípio da População
A Revolução Francesa e as guerras napoleónicas, deram origem em Inglaterra a
uma viragem conservadora e a uma reformulação da Economia Política, na ótica de um
liberalismo conservador.
Os trabalhadores manuais começaram a ser encarados como “classe perigosa”.

Thomas Robert Malthus (1766-1834), sacerdote anglicano, que veio a ser o primeiro
professor de Economia Política, é o expoente desta viragem.
No Ensaio sobre o Princípio da População, os autores que critica são, sobretudo, o inglês
William Godwin (1756-1836) e o francês Marquês de Condorcet (1743-1794):
- William Godwin (1756-1836), que propunha uma nova filosofia (anarquista): uma
sociedade perfeita pode produzir pessoas perfeitas. Um limite populacional não seria
problemático, já que a humanidade não se propagaria mais;
- Marquês de Condorcet (1743-1794), que via o progresso social baseado na igualdade
das nações, dos indivíduos dentro das nações e na perfeição da humanidade.

As ideias de Malthus
A melhoria da condição dos pobres não pode ser alcançada com políticas
assistencialistas e muito menos com medidas de redistribuição da propriedade.
No Ensaio sobre o Princípio da População, de 1798, defende que para garantir a
prosperidade geral, o esforço individual deve ser premiado e a preguiça punida.
A propriedade privada é essencial para premiar a iniciativa, o esforço e o engenho
individuais.
Contrariamente, a ajuda aos pobres é um prémio ao ócio, um desincentivo ao
trabalho que acarreta o aumento do número de pobres. O contexto é o das Poor Laws.

As leis naturais
Estas leis determinam que existe uma tendência permanente para que o
crescimento da população seja mais rápido do que o crescimento da produção de produtos
alimentares.
Enquanto a população tende a crescer em progressão geométrica (1, 2, 4, 8, 16...),
duplicando em cada 25 anos a produção de alimentos cresce apenas em progressão
aritmética (1, 2, 3, 4, 5, ...), já́ que os terrenos agrícolas são escassos e os seus
rendimentos limitados.
O banquete da natureza é limitado.
Tal deve-se aos rendimentos decrescentes da terra e finalmente à exaustão dos solos.
Fatores que atenuam estas leis:
o Antecipação de dificuldades quanto ao sustento das famílias, entrave ao
casamento precoce (redução de gastos, alterações ao modo de vida e da posição
social; tempo e meios necessários para a constituição da posição profissional;
dependência de caridade) – freio preventivo, que poderá́ causar vícios.
o Fome e privações sofridas pela infância nas classes baixas – freio positivo, que
é a causa da miséria
Conclusão: não se deve ajudar os pobres, para permitir a livre ação do equilíbrio natural.
É por esta razão que a Economia Política surge como uma “ciência sinistra” nesta época
para certos autores, como Thomas Carlyle.

Outros contributos de Malthus


A possibilidade de crises de sobreprodução (a procura pode ser lenta e depende
dos hábitos e dos gostos – ou seja, não existe necessariamente uma correspondência com
a oferta).
A ideia de procura efetiva como motor de crescimento (os capitalistas não gastam
todos os lucros, reduzindo a procura efetiva).

Críticas a Malthus
- Subvaloriza o progresso técnico na agricultura.
- Não considera a possibilidade de alterações demográficas substanciais que advêm do
próprio desenvolvimento (ver teoria da transição demográfica, slide seguinte).
- A política desumana que propõe em relação aos pobres.

A teoria da transição demográfica


David Ricardo
David Ricardo (1772-1823) é o principal teórico da economia política clássica. É oriundo
de uma família de financeiros ingleses de origem judaica portuguesa.
As grandes contribuições de Ricardo:
o A teoria do valor
o A teoria da renda
o A teoria da queda tendencial da taxa de lucro e o estado estacionário (ou
estagnação)
o A teoria do comércio internacional
Enceta ainda um método de abstração e dedução, diferente da observação e indução
usadas pelos predecessores.

A questão do valor
Para ele, a utilidade de um bem é necessária, mas não é a fonte do valor. O que
determina o valor das mercadorias é a quantidade de trabalho utilizada para as produzir.
Esta é a regra.
É certo de que existem bens que devem o seu valor à escassez, mas têm pouca
expressão – obras de arte, vinhos “vintage”, etc. – mas dado que são em número reduzido,
a Economia Política estuda os anteriores.
Por seu turno, o valor do trabalho é afetado pela relação entre oferta e procura de
trabalho, mas sobretudo “pelas alterações nos preços dos produtos alimentares e outros
bens de primeira necessidade”.
Ricardo considera não só́ o trabalho diretamente incorporado nos bens no seu
processo de fabrico, como o trabalho incorporado nos bens de capital (instrumentos de
produção e nas matérias-primas) que é “transferido” gradualmente para os bens
produzidos.
O valor da mercadoria tem de ser repartido pelo trabalho, o capital e a terra, mas
a forma como esta repartição é feita não afeta o valor de troca dos bens a não ser que se
deem três circunstâncias particulares:
a. se as proporções e capital fixo e circulante não for a mesma nos bens que
estão a ser trocados;
b. se o capital fixo não tiver a mesma duração em ambos os casos; (c) se a
velocidade de retorno do capital diferir.
No entanto, mais uma vez Ricardo vai abstrair destes casos particulares e teorizar como
se as exceções não existissem.

Repartição do rendimento
Uma vez determinado o valor de troca dos bens, como são determinados os
rendimentos respetivamente da terra, do trabalho e do capital – a renda, o salário e o lucro.

Determinação da renda
“A renda é aquela parte do produto da terra que é paga ao senhorio pelo uso das
potencialidades originárias e indestrutíveis do solo” – não compreende as benfeitorias.
Quando a terra é abundante não existe propriedade, nem renda. Só́ quando a terra se torna
escassa e apropriada privadamente é que existe renda.
Exemplo:
3 talhões de terra de igual dimensão, mas de fertilidade diferente. O proprietário e o
agricultor são personagens distintas.
Talhão 1 – 100 alqueires de trigo com produto líquido, ou seja, depois de retirados os
gastos com sementes e com trabalho.
Talhão 2 – 90 alqueires de trigo.
Talhão 3 – 80 alqueires de trigo
É possível demonstrar logicamente que o Talhão 1 vai fornecer ao seu proprietário uma
renda de até 20, o Talhão 2 de até 10 e o Talhão 3 nenhuma renda.
Trata-se de uma renda diferencial.
O valor de troca do trigo (como o de todos os produtos) estabelece Ricardo, é determinado
pela quantidade de trabalho incorporado nas piores condições de produção.
Nota: 1 alqueire corresponde a cerca de 13 litros.

Determinação do salário
O preço natural do trabalho é aquele preço que é necessário para permitir que os
trabalhadores, em geral, sobrevivam e se reproduzam sem que o seu número aumente ou
diminua.
O preço natural do trabalho, o salário natural, depende do preço natural dos
bens de primeira necessidade e tende a aumentar com o crescimento demográfico e a
acumulação de capital.
O preço de mercado do trabalho depende da oferta e da procura no mercado de
trabalho. O ajustamento do preço de mercado ao preço natural é feito pelo mecanismo
demográfico.

Determinação do lucro
O lucro é considerado o resíduo que sobra do excedente de produção, depois de pagos a
renda e os salários.

A tendência para a queda da taxa de lucro


Para Ricardo a acumulação de capital e o crescimento demográfico levariam ao
aumento dos salários naturais. Em consequência, os lucros, encarados como um resíduo,
teriam necessariamente de descer.
Os lucros tendem a decrescer até ao ponto de desaparecerem, deixando de existir
incentivo à acumulação de capital. Ora a acumulação de capital, tal como em Smith, é o
motor do crescimento económico.
A sociedade de mercado caminharia então para a estagnação, ou estado
estacionário.

Contra tendências
- Aperfeiçoamento nas máquinas utilizadas na produção de bens de primeira
necessidade.
- Melhoramento nos processos agrícolas.
O progresso técnico poderia assim (apenas) retardar o aparecimento do estado
estacionário.
Mas o comércio internacional poderia ter um efeito duradouro, se conseguisse
fornecer produtos agrícolas mais baratos, prevenindo que as terras marginais entrassem
em cultivo.
Assim, os lucros não cairiam e a acumulação de capital prosseguiria.

A teoria do comércio internacional


Um país pode beneficiar de importar artigos que pode produzir ele próprio em
condições mais favoráveis do que um parceiro comercial, desde que exporte para esse
parceiro internacional outros artigos em que relativamente tenha ainda mais vantagem.
Esta é a teoria das vantagens relativas (ou comparativas).
Exemplo:
O comércio do vinho e dos tecidos entre Portugal e Inglaterra.
No exemplo de Ricardo, Portugal tem uma eficiência mais alta em ambos. É possível
provar que ambos ganhariam se se especializassem no que produzem com mais eficiência
relativa interna. Portugal no vinho e Inglaterra nos tecidos.
Custo em trabalho de uma Custo em trabalho de uma
unidade de tecido (homens- unidade de vinho (homens-
ano) ano)
Inglaterra 100 120
Portugal 90 80

Uma unidade de tecido Uma unidade de vinho vale


vale quantas unidades de quantas unidades de
vinho? tecido?
Inglaterra 0,83 (100/120) 1,20 (120/100)
Portugal 1,13 (90/80) 0,89 (80/90)

- e a Inglaterra exportar tecidos para Portugal em troca de vinho português poderá́


adquirir 1,13 unidades de vinho com 1 unidade de tecido. Isto é, a Inglaterra poderá́
adquirir uma unidade de vinho que internamente lhe custaria o trabalho anual de 120
homens pelo de apenas 89,89 homens (100/1,13).
- Se Portugal exportar vinho para Inglaterra em troca de tecido inglês poderá́ adquirir,
adquirir 1,2 unidades de tecido com 1 unidade de vinho. Isto é, Portugal poderá́
adquirir uma unidade de tecido que internamente lhe custaria o trabalho anual de 90
homens pelo de apenas 66,67 homens (80/1,20).

Daqui resulta a convicção de Ricardo sobre os benefícios do comércio internacional,


o qual poderia evitar a queda da taxa de lucro e viabilizar a continuação da acumulação
de capital e do crescimento.
Este facto explica também a sua defesa do livre-cambismo.
Com efeito, ele opôs-se às Corn Laws, que impediam a importação de cereais do
continente a preços baixos.
Para ele, o livre comércio internacional não só́ permitiria sustentar o crescimento
em cada país, como ligar “entre si as diferentes partes do mundo civilizado por meio de
laços comuns de interesse, por relações de amizade”.

Jean-Baptiste Say
Jean-Baptiste Say (1767-1832) foi o mais importante representante da Economia
Política Clássica em França.
Divergiu dos clássicos ingleses em aspetos importantes e acrescentou elementos
inovadores à Economia Política.

Teoria do valor
Contrariamente à escola inglesa, Say defendia que a utilidade é o fundamento do
valor de um bem, sendo a utilidade definida pela capacidade que o bem tem de satisfazer
desejos subjetivos de quem o procura e está disposto a pagar por ele.

Os serviços
Como os serviços também têm utilidade, não faz sentido distinguir entre trabalho
produtivo e improdutivo, como autores precedentes fizeram (fisiocratas e Adam Smith).

O empresário
Inspirado em Cantillon, considera o empresário como ator central e distinto do
detentor de capital.
O empresário adquire os serviços do trabalho, do capital e da terra no mercado e
combina-os de forma a satisfazer a procura dos consumidores a um preço de venda que
cubra o custo dos serviços produtivos por ele adquiridos, deixando ainda uma margem de
lucro.
A consequência desta conceção é que lucros e juros emergem como categorias
distintas.
O lucro é a remuneração do empresário e o juro a remuneração do capital, o qual
pode ou não ser seu.
A lei de Say
Say é sobretudo famoso por um contributo que não foi seu – a chamada “lei de
Say” (“la loi des débouchés”).
Segundo esta lei, as situações de sobreprodução de que falava Malthus, não seriam
possíveis porque “os produtos se trocam por produtos” ou, como se passou a dizer, “toda
a oferta cria a sua própria procura”.
Quando um produto é vendido, há, ao mesmo tempo, um rendimento que é criado
e distribuído aos trabalhadores, aos credores, aos fornecedores e ao próprio empresário e
logo transformado por eles em procura de novos produtos. O produto que se vendeu criou
a procura de outros produtos, trocou- se por produtos
A moeda, como nos fisiocratas e em Smith, era apenas um intermediário das
trocas.
Por isso, Say era favorável ao “laissez-faire”. Os desequilíbrios de sobreprodução
no mercado tenderiam a ser ultrapassados pela deslocação do capital para outro mercado
(de um com excesso para outros com escassez). Ou seja, nunca poderia acontecer em
todos os mercados em simultâneo.
Esta asserção ignora, contudo, o efeito do entesouramento.

O socialismo utópico
Os “socialistas utópicos” consideravam o capitalismo como um sistema social
irracional, desumano e injusto e repudiavam a ideia de “laissez faire” e de concorrência,
assim como a doutrina da harmonia espontânea de interesses.
As alternativas de organização social que propunham partiam de uma visão
generosa da natureza humana e tinham como objetivo potenciar o melhor da espécie
humana, favorecendo a solidariedade e a cooperação em oposição ao interesse próprio e
à concorrência.

Robert Owen (1771-1858)


A sua visão deu lugar a uma experiência (bem-sucedida) na Escócia – New
Lanark Mills – que Owen geriu a partir de 1800.
As restrições ao trabalho infantil, a educação para todos, a atenção às condições de vida
das famílias dos trabalhadores, assim como o aumento dos salários, foram algumas das
“inovações” da experiência de Lanark Mills, na Escócia.
Proposta de intervenção estatal, uma vez falhada a persuasão junto dos restantes
industriais.
Defensor do cooperativismo (iniciativas autónomas dos trabalhadores).

Saint Simon (1760-1825)


A reorganização social proposta por este autor tem uma natureza corporativa e
baseia-se na ciência e na indústria.
Saint-Simon defendeu a constituição de um “parlamento industrial” que
utilizaria os conhecimentos da elite científica e industrial.
Este parlamento zelaria pela implementação de “obras públicas”, tendo em vista
a promoção do bem-estar, e coordenaria as atividades económicas.
Referência à intervenção do Estado: desemprego e assistência aos mais desfavorecidos.

Charles Fourier (1772-1837)


Charles Fourier acreditava numa evolução civilizacional, mas de carácter
cíclico: à “harmonia” da última etapa seguir-se-ia uma regressão da humanidade e um
retomar das etapas do seu aperfeiçoamento.
A alternativa de organização social proposta por Fourier envolvia as “cidades
jardins” (“falanstérios”) que foram idealizados a partir de um hotel onde 1500 pessoas
viveriam e trabalhariam em comum.
A redistribuição do rendimento, na qual Fourier não acreditava, daria lugar ao
direito de remuneração dos membros do “falanstério” como trabalhadores, capitalistas e
gestores a partir de um “stock” comum que teria como origem a propriedade individual.

Pierre Joseph Proudhon (1809-1865)


A universalização da propriedade, defendida por Pierre Joseph Proudhon, servia
o propósito de garantia de liberdade que este autor apresentava como o maior dos valores
a defender.
À semelhança de Saint-Simon, Proudhon apresentava a ciência como a “chave do
futuro” e a “garantia de harmonia social”: “[...] a ciência é a unidade da humanidade”.
O “mutualismo” de Proudhon.
O socialismo de Karl Marx (1818-1883)
O pensamento económico de Karl Marx não pode ser dissociado da sua visão da
história e da sociedade que acolhe, de forma crítica, a influência da filosofia alemã, do
socialismo francês e da Economia Política Clássica.
O materialismo histórico e dialético: a satisfação das condições materiais da vida
é o motor da evolução, o “primeiro ato histórico”.
História e economia surgem intimamente ligadas e a ciência económica torna-se
a “ciência da produção”.
Para além de motor da história, as condições materiais de existência são
determinantes na formação da natureza humana.

Forças produtivas, relações de produção e modo de produção


As forças produtivas são a terra, o trabalho, o capital e a tecnologia e têm uma
natureza “dinâmica”, isto é, estão em constante mutação quantitativa e qualitativa, em
consequência de alterações na população, da inovação, da educação, etc.
As relações de produção, por sua vez, consistem em “relações de propriedade”
(entre os homens e as coisas) e em “relações humanas”. Têm uma natureza “estática” e
impõem-se aos indivíduos, ou seja, são “independentes da sua vontade”.
Às “forças produtivas” correspondem determinadas “relações de produção”.
As forças produtivas e as relações de produção são a expressão das condições
materiais de existência. Em conjunto definem o modo de produção.
São a base económica da sociedade, ou infraestrutura, sobre a qual se ergue a
superestrutura (política, lei, religião, cultura, etc.).
Em determinados momentos da história, as forças produtivas (dinâmicas) entram
em conflito com as relações de produção (estáticas) provocando a erosão da “pirâmide”
através de um processo revolucionário (luta de classes). Dá-se então início a uma nova
etapa da evolução histórica e de um novo modo de produção.
Crítica da Economia Política Clássica:
- carácter histórico das suas ‘leis’, relativas apenas ao modo de produção capitalista
- Superestrutura ideológica do modo de produção capitalista

A Economia Política de Marx


No Capital Marx defende a tese segundo a qual o capitalismo, mais do que qualquer
modo de produção que o precedeu, conduzir a um desenvolvimento rápido das forças
produtivas.
No entanto, esse mesmo desenvolvimento acelera as condições para o colapso do
sistema e a emergência de novas relações sociais de produção.
a) A questão do valor
- Valor de uso: Tal como em Smith e Ricardo, utilidade ‘objetiva’, capacidade de
satisfazer necessidades humanas.
- Valor de troca: Tal como em Ricardo, tempo de trabalho socialmente necessário para
a produção (trabalho direto e indireto, “vivo” e “morto”).
No modo produção capitalista, a finalidade do trabalho não é produzir valores de uso
concretos (satisfazer necessidades humanas), mas produzir bens destinados à troca,
que proporcionem mais-valia e lucro a quem adquiriu a força de trabalho no
mercado.

A mais-valia
Os circuitos:
o M-D-M’ → [Circulação Mercantil Simples]
o D-M-D’ → [Circulação Monetário-Mercantil Desenvolvida]
Em que D’ é maior que D, sendo a diferença a mais-valia
Circulação mercantil simples
- Na circulação mercantil simples, os pequenos produtores – os artesãos e os
camponeses – vendem as suas mercadorias por dinheiro para comprarem outras
mercadorias.

Circulação Monetário-Mercantil Desenvolvida


- Em certa fase do desenvolvimento da produção mercantil, o dinheiro transforma-se
em capital. O dinheiro constitui o ponto inicial e final do movimento de capital, e é
uma mercadoria particular (o trabalho) que serve de intermediário.
- O dinheiro volta às mãos do seu proprietário inicial, mas em maior valor
- A este acrescentamento ou excedente do valor relativamente ao valor inicialmente
adiantado dá Marx o nome de mais-valia.

b) Força de trabalho
A força de trabalho, como qualquer mercadoria, tem um valor de uso e um valor de
troca.
O valor de uso da força de trabalho, é a utilidade que tem para quem a adquire, isto
é a sua capacidade de criar mais-valia.
O valor de troca da força de trabalho é, como no caso de qualquer mercadoria,
determinado pela quantidade de trabalho socialmente necessário para a produzir, isto é,
pela quantidade de trabalho necessário para produzir os bens de subsistência do
trabalhador.
c) Trabalho necessário e sobre-trabalho
Expresso em termos monetários:
o o trabalho necessário corresponde ao salário (valor de troca);
o o sobre-trabalho é a parte do trabalho realizado que não é remunerada e da qual
resulta a mais-valia.
O excedente obtido pelo capitalista sob a forma de mais-valia é a expressão direta da
exploração do trabalho pelo capital no modo de produção capitalista.

d) Tipos de capital, taxa de mais-valia e taxa de lucro


É necessário ainda distinguir entre dois tipos de capital e entre taxa de mais-valia e taxa
de lucro.
Marx identifica dois tipos de capital:
o capital constante (C) – destinado a meios de produção (matérias-primas,
máquinas e equipamentos); este capital é constante porque não cria valor,
limitando-se a transferir o seu valor para a mercadoria em cuja produção está
envolvido;
o capital variável (V) – capital adiantado sob a forma de salário.

- A taxa de mais-valia (mv’) é o rácio entre a mais-valia (mv) e o capital variável:


mv/v
- A taxa de lucro (l’) exprime a relação entre o retorno do capital e o capital adiantado:
mv/(c+v)
- A composição orgânica do capital: o Rácio “c/v” exprime a relação entre o capital
constante e o capital variável, ou entre o trabalho morto e o trabalho vivo, envolvido
na produção e é designado por Marx de composição orgânica do capital.

e) Leis tendenciais do capitalismo


A primeira lei é a da acumulação e da tendência para a queda da taxa de lucro.
Um capitalista individual obtém maiores lucros do que os seus concorrentes se
conseguir um maior volume de produção com os mesmos trabalhadores, ou seja,
introduzindo inovações poupadoras de trabalho (mecanização)
Paradoxalmente, quanto todos fazem isto e a composição orgânica do capital aumenta
e a taxa de lucro geral baixa.
Este comportamento da taxa de lucro geral decorre, aritmeticamente, das definições
acima apresentadas:
l’ = mv/(c+v)
Dividindo todos os termos por v, temos
l’ = (mv/v) / [(c/v) + (v/v)]
, ou seja,
l’ = mv’/ (c/v) +1
Marx assume que a taxa de mais-vaila é constante, portanto a mecanização (aumento de
c/v) reduz o valor da taxa de lucro
o Contra-tendências: aumento da exploração; aumento da produtividade;
imperialismo (Rosa Luxemburgo, Lénine).
A segunda lei, a da concentração e da centralização crescente do capital, decorre da lei
da acumulação.
- O sucesso das empresas mais eficientes num ambiente altamente competitivo
conduziria a uma concentração nos mercados e a uma centralização do poder
económico.
A terceira lei – crescimento do “exército industrial de reserva” – decorre também da lei
da acumulação.
- A mecanização crescente das empresas, envolvendo a substituição de homens por
máquinas, traduzir-se-ia no crescimento do desemprego. Isto contribuiria para manter
os salários baixos.
A quarta lei – pauperização crescente do proletariado – decorre da anterior.
- Com o crescimento do desemprego os salários tenderiam a descer, eventualmente
abaixo do nível de subsistência.

A última lei estabelece que o capitalismo está sujeito a crises e depressões cíclicas cada
vez mais frequentes e de maior intensidade.
- As crises são sempre de sobreprodução (ou subconsumo) decorrendo das despesas de
investimento (acumulação de capital), em articulação com a evolução do “exército
industrial de reserva”.

f) A tese fundamental e o fim do capitalismo


O colapso do sistema capitalista pela conjugação de condições objetivas e de
condições subjetivas.
Entre estas últimas, a tomada de consciência do proletariado da sua condição de
explorado, assim como a sua organização, assumem especial destaque no pensamento e
na ação de Marx.
Ao capitalismo, depois de um período de transição que poderia ser longo (‘ditadura
do proletariado’), sucederia o comunismo, um novo modo de produção caracterizado,
entre outros aspetos, pela abolição da propriedade privada dos meios de produção, pela
direção da produção pelos trabalhadores associados e pelo progressivo desaparecimento
do Estado.
1.3. As críticas à Economia Política Clássica.

As transformações associadas à emergência do capitalismo industrial foram alvo


de um conjunto de reações críticas ao longo do século XIX.
A Economia Política Clássica era entendida como justificação ideológica do novo
sistema.
o ROMANTISMO.
o HISTORICISMO.
o SOCIALISMO “UTÓPICO”.

1.4. O marginalismo e a corrente Neoclássica.

As origens da Economia Neoclássica


Em finais do século XIX, a Economia Política sofreu uma profunda
transformação, conhecida por “revolução marginalista”, que se traduziu na própria
mudança da designação da disciplina, de Political Economy para Economics.
Esta “revolução” metodológica e teórica está na origem da Economia Neoclássica,
isto é, da corrente que é ainda hoje dominante na disciplina, sobretudo no que se refere à
Microeconomia.

O utilitarismo de Bentham e a Noção de Utilidade


Jeremy Bentham (1748-1832) foi um filósofo moral inglês que concebeu o
projeto de fundar uma ciência moral, isto é, uma moralidade baseada na razão, liberta
do sentimento ou de preceitos baseados na fé religiosa.
No centro do utilitarismo de Bentham está o princípio da utilidade, segundo o
qual toda a ação deve ser aprovada ou desaprovada consoante aumenta ou diminui a
utilidade da entidade cujo interesse está em causa.
Por utilidade Bentham entende “a propriedade de qualquer objeto, pela qual tende a
produzir benefício, vantagem, prazer, bem ou felicidade [...] ou evitar a ocorrência de
dano, dor, mal ou infelicidade”
1. A utilidade pode assumir um “sinal” positivo ou negativo: os indivíduos
avaliam as ações tendo em conta os efeitos líquidos (efeitos positivos descontados
dos negativos).
2. O princípio da utilidade é, para Bentham, um princípio normativo, na medida
em que é apresentado como o critério à luz do qual a ação deve ser julgada.
3. O princípio da utilidade é suscetível de ser aplicado quer a indivíduos quer a
comunidades. O princípio da utilidade é um princípio de conduta moral que não
legitima o egoísmo ou a persecução do interesse próprio sem consideração dos
outros.
Mensuração, fatores que afetam o valor dos prazeres
Abrindo caminho à medição da utilidade, Bentham estabeleceu uma série
circunstâncias que afetam o valor dos prazeres e das dores para o indivíduo que as
experimentam:
a) a sua intensidade;
b) a sua duração;
c) o grau de certeza ou incerteza (no caso não de experiências vividas, mas de
expectativas relativas a experiências futuras);
d) o desfasamento no tempo.

A Revolução Marginalista
Crise da Economia Política Clássica (EPC) na segunda metade do século XIX,
com as críticas de inspiração historicista e socialista a ganharem influência.
Paralelamente, alguns economistas começam a desenvolver uma crítica da EPC
assente na ideia de renovação da teoria económica através do reforço da sua
“cientificidade” e na busca de “neutralidade axiológica”. Nesta perspetiva, a EPC
apresentava os seguintes problemas:
a) Não seria suficientemente científica.
b) Sofria de inconsistências teóricas.
c) Teria implicações sociais e políticas “perigosas”.

a) O problema de cientificidade
1. Uso da matemática
Não usava extensivamente a matemática (ao contrário da Física, encarada como o modelo
de “ciência exata”).
2. Leis não gerais
Apesar de pretender fazê-lo, a EPC não formulava leis gerais, universais, dado que se
referiam a classes sociais (trabalhadores, capitalistas, proprietários de terras) que
remetiam para as sociedades europeias em determinada época histórica.
3. Julgamentos morais
A Economia não deveria fazer julgamentos de valor, por exemplo, sobre redistribuição
(separação entre Economia e Ética).

b) Inconsistências teóricas
Críticas aos clássicos:
- Ricardo fazia depender a teoria de valor-trabalho de pressupostos exigentes e a sua
teoria da distribuição dependia inteiramente do postulado que estabelece que os
salários tendem a fixar-se ao nível de subsistência.
- Ao longo do século XIX, no entanto, ia-se tornando evidente que os salários dos
trabalhadores, em certas circunstâncias, podiam assegurar mais do que a simples
sobrevivência das famílias operárias, sem que implicasse uma tendência para a
descida posterior dos salários.

c) Implicações sociopolíticas
Quanto às implicações sociais e políticas, o problema, segundo alguns autores, residia:
- No antagonismo de interesses das classes sociais que inevitavelmente decorre da
teoria da distribuição do rendimento de Ricardo ou das análises de Malthus.
- Da tendência para a descida da taxa de lucro que logicamente resulta das suas teorias
da população e do valor (para uma ciência que advoga o laissez-faire, as perspetivas
de conflito social insanável e de estagnação futura surgiam como problemáticas).

A nova teoria do valor


No início da década de 1870 três economistas – William Stanley Jevons (1835-
1882), Léon Walras (1834-1910) e Carl Menger (1840- 1921) – apresentaram uma nova
abordagem para a questão do valor.
Jevons inspira-se diretamente na noção de utilidade de Bentham.
Segundo esta perspetiva, o valor das coisas depende não do trabalho (ou dos
custos de produção) que a sua produção envolve, mas da utilidade que elas
proporcionam a quem delas usufrui.
Além disso, a utilidade que os bens proporcionam não é constante, ela depende
da quantidade que está disponível.
o A utilidade de um bem é tanto menor quanto maior a quantidade disponível
desse bem, ou quanto maior a quantidade que foi consumida.
A utilidade marginal, ou seja, a utilidade da última unidade consumida ou a “intensidade
do último desejo satisfeito” (Walras) é o que determina o valor das coisas.
Acontece que a utilidade marginal, segundo o que na época se acreditava ser
uma lei psicológica fundamental, é decrescente.
A “lei da utilidade marginal decrescente”, é semelhante à “lei dos rendimentos
decrescentes” de Ricardo.
Exemplo:
Um copo de água no deserto. A utilidade de um copo de água no deserto pode ser imensa,
mas esta utilidade pode ser nula para quem está ao lado de uma fonte.
Mas mesmo para alguém que está com muita sede no deserto a utilidade de cada copo de
água vai diminuindo à medida que vão sendo bebidos copos de água adicionais. Pode até
chegar a um ponto em que a utilidade marginal de torna negativa (“ponto de saciedade”)
Copos de água Utilidade total Utilidade marginal
1 10
10
2 20
6
3 26
3
4 29
1
5 30

A conceção do comportamento económico individual estabelecia que os


indivíduos enquanto consumidores e produtores seriam racionais e maximizadores, da
utilidade (consumidores) e do lucro (produtores)
Procura
- Como a utilidade marginal é decrescente, o montante monetário que um indivíduo
está disposto a pagar por um bem vai diminuindo à medida que a quantidade
consumida desse bem aumenta.
Oferta
- Como a desutilidade marginal do trabalho é crescente, a quantidade oferecida de
um bem só́ aumenta se aumentar o seu preço de mercado.
A partir destes postulados, poderiam ser deduzidas as curvas da procura e da oferta.

Teoria dos preços e equilíbrio


A distinção entre preço e valor desaparece, na medida em que a utilidade tem
sempre equivalência num preço.
Dois resultados importantes surgem nas primeiras análises das propriedades dos
mercados:
a) o equilíbrio, isto é, a igualdade entre as quantidades oferecidas e procuradas tende
a estabelecer-se no mercado;
b) a situação de equilíbrio é eficiente e estável.
Léon Walras
A análise do equilíbrio do mercado baseava-se, em Walras, no modelo de equilíbrio
geral – um sistema de equações simultâneas que procurava representar a forma como os
preços se formam em simultâneo em todos os mercados de bens e fatores.
Alfred Marshall
Autor muito importante na afirmação da corrente neoclássica propôs uma análise de
equilíbrio parcial, que está na base das curvas da procura e oferta que analisámos, isto
é, uma análise da formação dos preços em cada mercado separadamente, mais fácil de
tratar do ponto de vista conceptual e matemático.
Pressupostos do modelo de concorrência perfeita
o Atomicidade
o Homogeneidade dos produtos
o Informação perfeita
o Livre entrada e saída dos mercados
o Mobilidade perfeita dos fatores produtivos

Esta nova Economia pretende ser positiva, separada da Ética e da Política.


Coloca a ênfase no equilíbrio e na análise estática.
Coloca o indivíduo no centro da análise, e não a classe social.
Recorre crescentemente à formalização matemática.

Pensamento clássico e pensamento neoclássico


Clássicos Neoclássicos
Análise centrada no crescimento, Análise centrada no equilíbrio, micro-
microdinâmica e de longo prazo. estática e de curto prazo.
Leis de circulação e distribuição. Afetação ótima dos recursos, numa ótica
estática.
Teoria “objetiva” do valor, a partir dos Teoria “subjetiva” do valor, assente na
custos de produção, em especial do utilidade atribuída pelos consumidores.
trabalho (valor-trabalho).
Valorização do papel da oferta. Valorização do papel da procura.
Preocupação com a produção e interesses Preocupação com os interesses, “bem-
dos produtores (industriais). estar”, dos consumidores.
Dimensão social (grupo/classe). Dimensão psicológica (indivíduo).
1.5. Keynes e o Keynesianismo.

O contexto da Grande Depressão


Após a I Guerra Mundial, nos anos 20, crises económicas na Europa (Alemanha,
Inglaterra), mas clima de prosperidade e confiança nos EUA.
No entanto a década seguinte vai ser marcada pela “Grande Depressão” - a designação
adotada para a grande crise que afligiu os EUA, a Europa e a economia mundial entre
1929 e 1939.

o Colapso da bolsa de Nova Iorque em 29 Outubro 1929.


o Queda do consumo, produção e investimento.
o Desemprego em massa.
o Grande número de falências.

Interpretações da crise
- “Correcção” dos excessos anteriores; confiança nos mecanismos “automáticos” de
mercado para ultrapassar a situação.
- No entanto, a deflação verificada (em termos de preços e salários), contribuiu para
agravar o problema.

Respostas de política económica da administração Hoover


- Política orçamental: visão convencional (equilíbrio orçamental), com corte na
despesa (austeridade).
- Política monetária: pouca capacidade de atuação devido à adesão ao padrão-ouro.
- Política aduaneira: recurso a medidas protecionistas.

As causas da Grande Depressão (Galbraith)


1) A má distribuição do rendimento.
2) A deficiente estrutura das empresas, patente sobretudo na sua dependência
relativamente a fundos de investimento.
3) A deficiente estrutura bancária expressa, sobretudo, na existência de um elevado
número de unidades independentes, envolvidas em actividades especulativas nos
mercados financeiros.
4) A “queda precipitada das exportações americanas” induzida pela resposta de
terceiros a políticas protecionistas dos EUA, com especial impacto na agricultura.
5) A insuficiente compreensão económica.

A partir de 1933, com a eleição do democrata Franklin D. Roosevelt, foi lançado um


programa de reformas, o New Deal, que alterou por completo as respostas de política
económica e contribuiu para inverter a espiral descendente:
o abandono do padrão-ouro;
o grande aumento do investimento público (obras públicas);
o reforma do sistema financeiro, com reforço da regulação e supervisão por parte
do Estado;
o controlo de preços;
o políticas sociais (subsídio de desemprego).
Outros casos: Alemanha, Suécia.

John Maynard Keynes (1883-1946)


A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda (1936) foi a mais influente obra de
Keynes.
A Teoria Geral é apresentada por Keynes como uma alternativa à “teoria clássica”.
Segundo Keynes, o problema desta “teoria clássica” residia no facto dos seus
postulados se referirem a um caso particular, uma situação de ausência de
desemprego (de pleno emprego), que não se verifica no mundo real.
Assim, os seus ensinamentos seriam desastrosos quando aplicados a um mundo
em que estes postulados não se verificam.
Em alternativa Keynes propunha uma Teoria Geral, isto é uma teoria que abarcava
todos os equilíbrios económicos possíveis, fossem eles de pleno emprego ou não – isto é
admitindo a possibilidade de equilíbrios de subemprego.
A sua preocupação era identificar os meios para fazer sair a economia de uma
situação de subemprego e restabelecer o pleno emprego.
- Rejeição da Lei de Say e argumento da “preferência pela liquidez”.
- Rejeição da descida dos salários como meio para alcançar o pleno emprego do
trabalho.
A Procura Agregada como determinante do emprego
O ponto de partida de Keynes é que os níveis de produção e de emprego são
determinados pela procura agregada, isto é, a procura total dirigida a todos os ramos
da economia. Esta perspetiva corresponde a uma inversão da Lei de Say, uma vez que o
papel fundamental passa a ser o da procura (a procura “cria” a sua própria oferta).
Neste quadro assumem particular relevância as expectativas dos empresários a
respeito do nível futuro da procura agregada.
Quando os empresários antecipam uma quebra da procura, suspendem os planos
de investimentos, o que conduz a uma futura redução da produção e ao despedimento de
trabalhadores.
Em consequência, a despesa de investimento regride, e, dado o desemprego, a
despesa de consumo diminui. A resposta dos empresários à expectativa de redução da
procura faz com a sua previsão se realize – surgindo a crise.
A tese fundamental de Keynes, raciocinando num contexto de economia fechada,
isto é, abstraindo das trocas com o exterior, é a de que não existe nenhum mecanismo
automático que faça a economia sair da depressão.
A solução é a intervenção do Estado através das políticas económicas.

As componentes da procura agregada


A procura agregada tem, segundo Keynes, duas componentes:
a) Despesa do consumo
A despesa de consumo dos particulares depende de fatores subjetivos e objetivos.
Fatores subjetivos:
o O aumento da incerteza a respeito do futuro;
o o desejo de assegurar o futuro dos herdeiros;
o o reforço da aspiração de independência e poder pessoal.
Fatores objetivos:
o o nível do rendimento;
o a distribuição da riqueza e do rendimento;
o o peso dos impostos e transferências (rendimento disponível).
Para Keynes, a relação entre a variação do consumo e a variação do rendimento
disponível, designada propensão marginal ao consumo, era estável, isto é, não sofria
variações significativas no curto prazo.
Então a despesa de consumo só pode aumentar se o rendimento aumentar. Para tal é
necessário que aumente o investimento, que assim assume um papel central na
determinação do nível de procura agregada.
A despesa de consumo também pode aumentar através do aumento do rendimento
disponível fazendo variar o nível de impostos e/ou transferências (política orçamental).
b) Despesa de investimento
Segundo Keynes, as decisões de investimento são tomadas tendo em conta a
comparação entre os custos e os benefícios esperados. Os custos são determinados pelo
nível da taxa de juro.
Os benefícios dependem do retorno esperado do investimento, que está associado às
expectativas formuladas pelos empresários quanto à evolução futura da economia e ao
grau de confiança que atribuem a essas expectativas.
A formulação de expectativas e da confiança – o problema da incerteza.

A determinação da taxa de juro


Keynes formula uma teoria monetária da determinação da taxa de juro, que
depende da interação entre oferta e procura de moeda.
A oferta de moeda é determinada pelas autoridades monetárias.
Quanto à procura, Keynes apresenta três “motivos” fundamentais para os agentes
económicos desejarem a detenção de moeda:
O primeiro é o “motivo transação”: os indivíduos necessitam de dispor de moeda
para fazer face a pagamentos correntes.
O segundo é o “motivo precaução”: os indivíduos podem querer dispor de moeda
para fazer face a contingências inesperadas.
O terceiro é o “motivo especulação”: em contextos de taxas de juro muito baixas,
ou de expectativa de subida futura das taxas de juros, os indivíduos podem preferir deter
as suas poupanças em moeda, não as aplicando em instrumentos de poupança.
Nesta perspetiva, a taxa de juro é um prémio que cobre o risco de eventuais perdas
nas aplicações da poupança - um prémio para o abandono da liquidez.
A taxa de juro para Keynes era assim, não a remuneração da poupança, mas a
remuneração da renúncia à liquidez.
As políticas macroeconómicas
A mais importante conclusão da Teoria Geral é a de que a saída das situações de
crise e depressão depende de um estímulo da procura agregada. Esse estímulo deveria
ser proporcionado com recurso a políticas macroeconómicas.

Política monetária
Através do aumento da oferta de moeda, as autoridades monetárias poderiam
influenciar o nível da taxa de juro. A descida da taxa de juro teria um efeito de aumento
do investimento privado (via redução dos seus custos)

Política orçamental
Keynes defendia o abandono do princípio do equilíbrio orçamental (de curto
prazo) em favor de uma política orçamental contra cíclica, geradora de déficits em
períodos recessivos e de excedentes em períodos de expansão – o que conduziria a um
equilíbrio orçamental inter-temporal (de médio prazo).
A dívida pública contraída na fase de recessão para financiar o déficit, seria
reembolsada na fase de expansão. Este reembolso da dívida contribuiria então para
reduzir o ritmo da expansão, amortecendo a amplitude do ciclo e contribuindo para a
estabilização macroeconómica.
Instrumentos de política orçamental expansionista: aumento direto dos gastos
(investimento público), redução de impostos, aumento de transferências.
Em situações de crise profunda/depressão, Keynes considerava a política
orçamental mais eficaz do que a política monetária. Dentro da política orçamental,
privilegiava os gastos diretos em detrimento de medidas que afetassem o rendimento
disponível (impostos, transferências).
Em complemento, Keynes defendia também:
- intervenções reguladoras nos mercados financeiros tendentes a controlar as
dinâmicas especulativas e a reforçar a confiança dos investidores;
- políticas redistributivas do rendimento e da riqueza tendentes a favorecer o
crescimento do consumo.
Alcance teórico e político
Segundo Keynes, os dois problemas económicos fundamentais a que era
necessário dar resposta consistiam na incapacidade de gerar pleno emprego e na
“arbitrária e desigual distribuição do rendimento e da riqueza”.
A sua posição era a de que só o reforço da intervenção do Estado na economia
poderia dar uma resposta eficaz a estes problemas.
Tal significava abandonar a lógica do “laissez-faire”. No entanto, a motivação
central não era a destruição do sistema, mas antes a salvaguarda das suas instituições
económicas e políticas fundamentais, a sua “salvação”.

Keynesianismo no pós-II Guerra Mundial


A grande influência de Keynes vai manifestar-se no período que se segue à II Guerra
Mundial.
Na teoria económica, a macroeconomia keynesiana será dominante até à década de
70 e atá aos dias hoje permanece muito influente (novos keynesianos, pós-keynesianos)
Nas políticas económicas, os decisores políticos estavam apostados em não repetir a
experiência da grande depressão e da guerra, construindo novas respostas em termos da
regulação económica e social das sociedades e também na arquitetura do sistema
económico internacional.

Welfare State
Relatórios Beveridge (1942, 1944)
Modelo de economia mista, visando um equilíbrio entre Estado e mercado, entre
interesses do capital e do trabalho.
Aspetos fundamentais:
o Políticas sociais - segurança social (cobertura universal, proteção no desemprego,
doença, velhice), educação, saúde.
o Políticas de estabilização keynesianas (política orçamental e política monetária).
o Intervenção direta do Estado (empresas públicas em áreas como a energia,
transportes, comunicações, banca, algumas indústrias, etc.).
o Redistribuição do rendimento e da riqueza, através de impostos altamente
progressivos e da composição da despesa.
o Modelo de concertação social, envolvendo a participação de representantes do
Governo, dos empresários e dos trabalhadores.
Globalmente, até à década de 70, o modelo vai garantir elevados níveis de crescimento
económico, com elevada estabilidade (ausência de crises significativas) e progresso
social.

Bretton Woods e o sistema económico internacional


Evitar a desordem económica internacional do período anterior à guerra, que havia
sido caracterizado por recurso generalizado ao protecionismo, às “desvalorizações
competitivas” e à suspensão de pagamentos internacionais (dívidas externas).
O essencial da nova arquitetura do sistema económico internacional vai ser
estabelecido na conferência de Bretton Woods (1944).
Regime de câmbios fixos, assente no dólar norte-americano que definia uma
paridade fixa em relação ao ouro, com as outras moedas a definirem taxas de câmbio fixas
em relação ao dólar (padrão dólar-ouro).
Para executar a nova ordem internacional foi prevista a criação de novas instituições
internacionais:
o Fundo Monetário Internacional.
o Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento (Banco Mundial).
o Organização Internacional do Comércio (que seria substituída pelo acordo
provisório GATT que só em 1995 daria origem à atual Organização Mundial do
Comércio).

Bretton Woods foi uma conferência realizada em Bretton Woods, New Hampshire,
Estados Unidos, em julho de 1944.
A conferência reuniu representantes de 44 países aliados durante a Segunda Guerra
Mundial, com o objetivo de estabelecer um novo sistema monetário internacional após o
fim da guerra.
Objetivos:
- o principal objetivo de Bretton Woods era criar um sistema financeiro e monetário
internacional estável que facilitasse o comércio global e a recuperação económica
pós-guerra.
- os líderes buscavam evitar a repetição das crises económicas que ocorreram na década
de 1930, como a Grande Depressão.
Como resultado da conferência, duas instituições importantes foram criadas:
o Fundo Monetário Internacional (FMI): O FMI foi estabelecido para promover
a estabilidade financeira global, monitorar as políticas económicas dos países
membros e fornecer assistência financeira em caso de crises económicas.
o Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) ou
Banco Mundial: O Banco Mundial foi criado para financiar projetos de
desenvolvimento económico e reconstrução pós-guerra, com foco em
infraestrutura e redução da pobreza.

Sistema de Taxa de Câmbio Fixa


Bretton Woods introduziu um sistema de taxa de câmbio fixa, no qual as moedas
nacionais estavam vinculadas ao dólar dos Estados Unidos, e o dólar estava ancorado ao
ouro. Isso significava que as taxas de câmbio eram fixas e as moedas não flutuavam
livremente.

Papel do Dólar
O dólar americano foi escolhido como a principal moeda de reserva internacional e como
referência para outras moedas. Isso deu aos Estados Unidos uma posição dominante no
sistema monetário internacional.

Fim do Sistema Bretton Woods


O sistema de Bretton Woods enfrentou desafios ao longo do tempo, como o
aumento dos desequilíbrios comerciais e a pressão sobre o dólar e o ouro.
Em 1971, os Estados Unidos suspenderam a conversibilidade direta do dólar em
ouro, e o sistema de Bretton Woods foi desmantelado gradualmente.
Bretton Woods teve um impacto duradouro na economia global. O sistema estabeleceu
regras e normas para o comércio e as finanças internacionais, influenciando a criação de
outras instituições financeiras internacionais e moldando a governança económica global.
1.6. Retorno do liberalismo.

Contexto: a crise dos anos 70


A crise dos anos 70 marca o fim do predomínio do keynesianismo que havia
perdurado durante cerca de 30 anos (“trinta gloriosos”).
Trata-se de uma crise complexa e multidimensional (política, cultural, ambiental).
Nos seus aspetos económicos podemos destacar os seguintes elementos:
1) Fim do sistema de Bretton Woods: inconvertibilidade do dólar em ouro decretada
pelo Presidente Nixon em 1971, câmbios flexíveis a partir de 1973. O sistema de
controlo dos movimentos de capitais que lhe estava associado vai ser
progressivamente abandonado (início da fase de globalização financeira?)
2) Choques petrolíferos (1973-74) e (1979-80): vieram amplificar
consideravelmente as tensões inflacionistas que já vinham a verificar- se;
paralelamente causaram recessão económica e desemprego; situação de
“estagflação”, que colocou um desafio de difícil resposta para as politicas de tipo
keynesiano (o desemprego surgia agora associado à inflação e não à deflação).
3) Crise do Welfare State: problemas de equilíbrio financeiro (desemprego e
demografia); contestação ideológica: o problema dos “incentivos perversos”.
4) Mudanças estruturais nas economias ocidentais: desindustrialização e
terciarização
Este contexto vai ser favorável aos críticos do keynesianismo, acabando por favorecer
as correntes de pensamento que advogavam um retorno ao capitalismo laissez-faire, os
novos liberais ou neoliberais.
Duas escolas de pensamento vão destacar-se: a Escola Austríaca e a Escola de Chicago.
Partilhavam duas preocupações centrais:
a) demonstrar que a intervenção económica do Estado não resolve nenhum dos
problemas que se propõe remediar, estando ao contrário na origem destes
problemas.
b) persuadir que o único sistema económico compatível com a liberdade pessoal é o
capitalismo liberal.
Friedrich Hayek e a Escola Austríaca
A Escola Austríaca tem origem em Carl Menger, um dos primeiros marginalistas,
e corresponde à bifurcação do marginalismo em duas correntes – a Austríaca e a
Neoclássica.
Partilham a teoria do valor e a visão dos mercados como mecanismos mais
eficientes de alocação dos recursos.
As duas correntes diferem no seguinte:
1. A teoria neoclássica assenta em pressupostos de informação e racionalidade
perfeita, enquanto os economistas austríacos enfatizam os limites de
conhecimento e de informação dos agentes.
2. Os neoclássicos defendem que a Economia não difere enquanto ciência das
ciências naturais, devendo recorrer a formalismos matemáticos. Os economistas
austríacos defendem que as ciências sociais, porque envolvem propósitos
humanos, não são redutíveis a leis deterministas e são radicalmente distintas das
ciências da natureza. Consequentemente, defendem que a Economia não deve
procurar reduzir as suas teorias a modelos matemáticos.
A Escola Austríaca, a partir de Menger, destacou-se sobretudo pela sua critica ao
socialismo, concebido como sistema de planeamento central. Hayek estendeu esses
argumentos à intervenção de tipo keynesiano.

Os ciclos económicos e a moeda


Na sua obra de 1933, Friedrich Hayek (1899-1992; Prémio Nobel em 1974)
defende que a recessão e o desemprego não resultam da insuficiência da procura
agregada, como em Keynes. Resulta sim de um excesso de crédito no período de
expansão, resultando num elevado consumo em detrimento da poupança/investimento,
induzido por políticas expansionistas do governo.
A saída da recessão dependia, assim, não de um aumento, mas de uma redução da
procura de bens de consumo que permitisse gerar a poupança necessária para o
desendividamento e a retoma do investimento.
A intervenção do Estado, através de políticas orçamentais e monetárias
expansionistas, criaria inflação, transformando pequenas recessões em grandes crises.
Para Hayek, a inflação era claramente um problema maior que o desemprego,
porque distorcia os preços a favor de atividades ineficientes e de consumo,
comprometendo o crescimento e a criação de emprego prazo.
A inflação era consequência da criação de moeda em excesso, e o responsável por
esta criação excessiva de moeda é o Estado.
Razões para o Estado criar moeda em excesso:
- porque permite financiar o aumento da sua despesa sem uma visível sobrecarga fiscal
(não aumentar impostos);
- porque permite reembolsar a dívida publica com dinheiro desvalorizado.
Solução: retirar ao Estado o monopólio da emissão de moeda.
Em alternativa, o sistema poderia ser privatizado conferindo a todos os bancos a
capacidade de emitir moeda. Uma vez que todos os emissores procurariam evitar que “a
sua” moeda se desvalorizasse, todos se preocupariam em não emitir moeda em excesso.

O problema do conhecimento
Partindo do reconhecimento das limitações do conhecimento e da escassez de
informação, Hayek defendia que os mercados tinham melhores resultados do que
qualquer outro mecanismo alternativo, pois permitiam mobilizar o conhecimento
parcelar dos indivíduos, permitindo que a economia beneficie como um todo deste
conhecimento disperso.
O mercado de Hayek é um “processo de descoberta”. Os agentes económicos
dotados de conhecimento e informação parcelar procuram constantemente oportunidades
de ganho, interpretando os sinais emitidos pelo mercado, através dos preços.
Pelo contrário, a intervenção do Estado, e em particular a sua forma extrema de
planeamento central, atribui a um indivíduo, ou grupo de indivíduos, com um
conhecimento e uma informação tão limitada como os restantes, a prerrogativa da
determinação dos preços e mesmo um poder coercivo sobre os restantes indivíduos. Não
era, por isso, eficiente.
Além disso, dada a coerção envolvida, o sistema de planeamento central, seria
atentatório da liberdade pessoal. A intervenção estatal na esfera económica seria um passo
na direção do totalitarismo político.
Na obra de Hayek, a defesa da não-intervenção passa pela contestação de todos
os argumentos a favor do envolvimento do Estado em questões económicas – seria não
só́ causadora de ineficiência, como também um passo para o totalitarismo.
o a necessidade de combater a tendência para a formação de monopólios;
o a necessidade de estabelecer a igualdade de oportunidades entre os indivíduos,
redistribuindo a riqueza e o rendimento.
Os monopólios resultam geralmente da proteção das empresas e de lobbies
profissionais pelos governos, contra a concorrência interna ou internacional.
Todas as empresas, por mais poderosas que sejam, estão sujeitas, no caso de não
serem protegidas pelo Estado, à entrada de concorrentes no “seu” mercado.
Se os monopólios procurassem tirar partido do seu poder, praticando preços
demasiado elevados para obter lucros extraordinários, eles estariam a criar condições para
que novas empresas se estabelecessem no ramo.
Na realidade, concluía Hayek, a existência de monopólios não constitui um problema.
As intervenções redistributivas em nome da “justiça social”, são particularmente
visadas por Hayek.
A desigualdade é vista não só́ como inevitável, mas como condição da
prosperidade.
Os indivíduos são diferentes, produzem resultados diferentes.
Se o Estado procurasse redistribuir estes resultados, retirando uma parte aos mais
bem-sucedidos para a dar aos menos bem-sucedidos, quer uns quer outros teriam um
incentivo menor para o esforço. Os primeiros porque veriam a sua recompensa
reduzida, os segundos porque obteriam uma recompensa, mesmo sem esforço.
E as vantagens individuais que não resultam do esforço nem da capacidade, como as
que decorrem de “nascer em berço de ouro”?
o “Há́ partes da herança cultural que são transmitidas de forma mais eficaz pelas
famílias”.
o “Seria insensato negar que uma sociedade terá́ provavelmente uma elite melhor
se a sua ascendência não for limitada a uma só́ geração, se os indivíduos não forem
deliberadamente obrigados a partir do mesmo nível”.
O domínio da justiça é procedimental, ao nível das regras e do seu cumprimento. Sobre
os resultados não se pode afirmar que sejam “justos” ou “injustos”. Todos tenderiam a
conformar-se com a distribuição resultante.

Milton Friedman e a Escola de Chicago


A Escola de Chicago, ou o monetarismo de Milton Friedman (1912- 2006; Premio
Nobel em 1976), radica no ramo neoclássico do marginalismo.
Divergindo da Escola Austríaca em aspetos importantes, apresenta semelhantes
conclusões políticas, nomeadamente a inutilidade e indesejabilidade da intervenção
económica do Estado e as vantagens da livre iniciativa privada e do “mercado livre”.
A importância da moeda
Friedman contrariou o “consenso keynesiano” das décadas de 1950 e 1960, que
considerava que as políticas orçamentais tinham mais efeito no nível da atividade
económica do que as políticas monetárias.
Friedman procurou demonstrar que o contrário é que era verdadeiro – que o
aumento da oferta de moeda, dependente de decisões das autoridades, tem um poderoso
efeito de curto prazo sobre o nível de produção, embora dê necessariamente origem à
inflação.
Os fenómenos monetários são a principal explicação para as flutuações na
atividade económica. Daí o termo “monetarismo”.
Quanto à política orçamental, era ineficaz por causa do efeito de crowding out,
resultante da substituição do investimento privado por investimento público, por causa
das restrições de financiamento (o Estado teria que recorrer ao crédito, a taxa de juro iria
necessariamente aumentar).
Friedman considerava que a política monetária não devia ser utilizada para
estabilizar os ciclos económicos.
As crises seriam, em grande medida, resultado de intervenções monetárias
erradas, recomendando que estas se limitassem a expandir a massa monetária ao ritmo
do crescimento do produto, abdicando de intervenções orientadas para a estabilização dos
ciclos económicos.

Inflação e desemprego
A par da crença na maior eficácia da política orçamental relativamente à política
monetária, o “consenso keynesiano” incluía também a convicção de existia uma relação
inversa entre desemprego e inflação.
Esta relação, formalizada na “curva de Phillips” estabelecia que era possível
reduzir o desemprego, quando o desemprego aumentasse, à custa de uma maior inflação,
e reduzir a inflação, quando a inflação era o maior problema, à custa do desemprego.
Em finais da década de 1960, Friedman contrapõe a esta visão uma teoria segundo
a qual existe uma taxa “natural” de desemprego abaixo da qual não é possível descer,
senão à custa de uma taxa de inflação crescente.
Em consequência, a tentativa de manter o desemprego abaixo da taxa “natural”,
com expansão da oferta de moeda, originaria uma espiral inflacionista incontrolável. Mas
a inflação, por sua vez, tenderia a reduzir o nível de emprego, repondo o desemprego na
taxa “natural”, sem que os preços baixassem. Qualquer tentativa de reduzir de novo o
desemprego implicaria uma inflação superior ainda. Além disso, provocaria uma maior
incerteza fruto da volatilidade de preços, aumentando a própria taxa “natural”.
Desta forma, quando a inflação é elevada, desemprego e inflação poderiam crescer
em paralelo. A teoria de Friedman parecia então explicar o fenómeno observado da
estagflação.
Na sua perspetiva, o desemprego poderia ser reduzido – a taxa “natural” de
desemprego podia descer – apenas se os mercados de trabalho fossem tornados mais
“flexíveis”. Isto implicava que fosse eliminado o poder “monopolista” dos sindicatos e
removida, ou reduzida, a proteção social aos desempregados (salário mínimo e subsídios
de desemprego).
As políticas monetárias que defendia deviam traduzir-se num controlo apertado
do crédito e da emissão monetária pelas autoridades monetárias. O objetivo seria evitar
um crescimento da massa monetária superior ao do produto. Esta seria a regra
fundamental para a condução da política monetária, chegando mesmo Friedman a
defender a sua constitucionalização.
Advogava, por isso, a independência das autoridades monetárias relativamente
ao poder político, possibilitando que a política monetária fosse conduzida exclusivamente
por critérios de ordem “técnica”.

Políticas económicas neoliberais


Subida ao poder de Margaret Thatcher no Reino Unido (1979) e de Ronald Reagan nos
Estados Unidos (1980).
Viragem nas políticas económicas:
o Política orçamental: redução do “peso” do Estado na economia, através de
redução das receitas (sobretudo a progressividade dos impostos) e das despesas
(sobretudo sociais); retorno è ideia de equilíbrio orçamental.
o Política monetária: objetivo de reduzir e estabilizar a inflação; independência dos
bancos centrais.
o Privatizações;
o Desregulamentação (ex.: mercado de trabalho, mercados financeiros);
o Liberalização (fluxos internacionais de capitais e de bens e serviços);
Expansão destas políticas nos países ocidentais durante a década de 1980.
A partir do início dos anos 1980, introdução da agenda de políticas neoliberais nos
países do Sul global (sobretudo América Latina e África), no contexto da chamada “crise
da dívida” e da intervenção do FMI e Banco Mundial (programas de estabilização e
ajustamento estrutural).
Nos anos 1990, com o colapso dos sistemas socialistas, estas políticas passam
também a ser dominantes a Leste.
Expansão global: tese do “Fim da História” de Francis Fukuyama. Neoliberalismo e
Globalização.

1.7. Panorama atual da teoria económica.

A “Grande Recessão” iniciada em 2007-2008, veio questionar as teorias e


políticas neoliberais, embora o panorama seja de alguma ambiguidade. Por um lado, as
políticas de austeridade e “reformas estruturais” seguidas por exemplo na Zona Euro, são
expressão de continuidade em relação à lógica neoliberal. Por outro lado, os seus
resultados foram objeto de grande contestação, surgindo diversas propostas alternativas.

Verifica-se igualmente um acentuar da pluralidade teórica e metodológica no seio da


ciência económica:
o correntes provenientes do passado que continuam atuantes, nomeadamente as
keynesianas, as institucionalistas e as marxistas.
o novas abordagens, como a economia feminista ou a economia ecológica.
Traços salientes nos últimos anos:
1. a intensificação da relação entre a Economia e outras ciências sociais e
humanas, especialmente a Psicologia, a Psicologia Social e as
Neurociências (economia comportamental, economia experimental);
2. o reforço de abordagens interdisciplinares, como a socioeconomica e a
economia política;
3. a introdução de novas ferramentas matemáticas (simulação, sistemas não-
lineares);
4. o diálogo da Economia com a Filosofia, em particular com a ética, tem
também vindo a acentuar-se.

1.8. A Economia e a(s) crise(s) atuais.

As teorias económicas e a crise de 2008


As contribuições teóricas de Smith, Malthus, Ricardo, Mill, Marx, Keynes e Hayek
são importantes para o debate sobre as causas das crises económicas e para a reflexão
sobre as estratégias possíveis da sua ‘resolução’.
o As contribuições teóricas de Smith, Friedman e Hayek inspiraram as políticas de
liberalização económica levadas a cabo a partir dos anos 1980 do século XX e a
possibilidade de se verificarem crises profundas do capitalismo foi prevista por
Marx e por Keynes.
o A discussão sobre as melhores estratégias para lidar com as crises do
capitalismo foram discutidas de forma detalhada por Keynes.

A crise e a contribuição de Adam Smith


- A contribuição de Smith sobre o conceito de mercados autorregulados e a noção de
‘ordem espontânea’ está na origem das ideias económicas que defendem o ‘livre’
funcionamento do mercado e que rejeitam a necessidade de uma forte intervenção do
Estado.
- A liberalização dos mercados financeiros, que veio a desempenhar um papel central
na crise económica de 2008, não teria sido possível sem o suporte dos argumentos
teóricos desenvolvidos por Adam Smith sobre a defesa dos mecanismos de mercado,
da livre concorrência, e a crítica que fez à intervenção do Estado (que, no seu tempo,
consistia numa crítica às ideias Mercantilistas).
A crise e a contribuição de Malthus
- Malthus chamou a atenção para a existência de crises cíclicas de sobreprodução,
sendo um dos autores fundadores da teoria dos ciclos económicos.
- Para o autor seria a procura a gerar oferta e não o contrário (Lei de Say).
- O estímulo da procura passaria pelo ‘consumo improdutivo’ (visão funcional sobre o
funcionamento do sistema económico em que cada ator tem o seu papel).

A crise e a contribuição de Karl Marx


- Ao contrário dos autores neoclássicos, que enfatizam as vantagens dos mecanismos
de mercado e a tendência do capitalismo para uma situação de equilíbrio, Marx
argumenta que o capitalismo é um sistema propício a crises económicas
frequentes.
- Segundo Marx, essas crises (muitas vezes, de sobreprodução) resultam das
contradições provocadas pelo desenvolvimento das forças produtivas.
- De acordo com o quadro conceptual desenvolvido por Marx, o aumento da
desigualdade na distribuição do rendimento a partir dos anos 1980 do século XX
contribuiu decisivamente para a crise económica de 2008.

- Marx argumentou também que o modo de produção capitalista tenderia a tornar-


se predominante nos países mais desenvolvidos, tendo dessa forma antecipado a
tendência para uma crescente globalização económica e uma crescente
interdependência económica entre os países.
- O processo de globalização económica contribui decisivamente para que a
crise de 2008 se tornasse global de uma forma muito rápida (à semelhança do
que tinha sucedido na crise económica de 1929).
- Por fim, as classes sociais desempenham um papel central na teoria Marxista.
Marx defende que existe um antagonismo de interesses entre capital e trabalho e,
portanto, entre capitalistas e trabalhadores.
- A forma como o Estado, durante o período da crise, salvaguardou os
interesses de algumas classes (por exemplo, os investidores e os clientes dos
bancos privados) e negligenciou os interesses de outras (por exemplo, os
trabalhadores que foram afetados pelo aumento do desemprego) pode ser
apreendida através da matriz conceptual desenvolvida por Marx.

A crise e a contribuição de John Maynard Keynes


- As ideias de Keynes são muito importantes para o debate acerca da crise atual
porque a sua reflexão foi motivada precisamente por uma das maiores crises
do capitalismo: a grande depressão iniciada em 1929.
- Keynes foi um critico do conceito de mercados autorregulados, tendo
argumentado que os mecanismos de mercado podem ser incapazes de lidar com o
problema do desemprego e que, nessas circunstâncias, as crises tendem a
prolongar-se e aprofundar-se.
- Para Keynes, é a insuficiente procura agregada que explica o aprofundamento
da crise económica. Para lidar com este problema, Keynes defende a necessidade
de o Estado intervir através do investimento público e do estímulo ao consumo
privado.
- Esta reflexão é muito importante porque a crise de 2008 também foi
caracterizada por um aumento substancial do desemprego em vários países e
também se desenvolveu ao longo de vários anos, o que revela a incapacidade dos
mecanismos de mercado para, por si só, garantirem uma retoma ‘automática’ da
atividade económica.
- Por outro lado, embora a partir dos anos 1980 se tenha verificado uma diminuição
do peso do Estado na Economia devido ao processo de liberalização, as ideias
Keynesianas continuam a influenciar a política económica dos países mais
desenvolvidos.

- Outra contribuição central de Keynes foi o seu enfâse no problema da incerteza.


No seu entender, era a incerteza que justificava o facto de a lei de Say não se
verificar, que justificava a redução dos níveis de consumo privado durante
períodos de crise e que também explicava o adiamento das decisões de
investimento por parte das empresas.
- Neste contexto, no quadro da teoria Keynesiana, a redução da incerteza
desempenha um papel importante no relançamento da atividade económica.

A crise e a contribuição de Friedrich Hayek


- A relação de Hayek com a crise de 2008 é ambígua:
- Hayek inspirou a viragem neoliberal dos anos 1980 porque foi um intelectual
que rejeitava a intervenção pública e defendia a superioridade dos mecanismos de
mercado. Na verdade, as suas ideias inspiraram Thatcher e Reagan.
- No entanto, Hayek também criticou os modelos económicos propostos pelos
neoclássicos, nomeadamente no que respeita à modelização e ao enfâse que esses
autores colocavam no equilíbrio e na análise estática.

As teorias económicas e a crise ecológica


- Vários foram os autores que chamaram a atenção para os limites dos recursos
naturais e, nessa medida, os limites do crescimento económico e a destruição da
natureza
- Malthus (e também John Stuart Mill) devem ser destacados a este propósito.
- No entanto, outros autores criticaram a instituição da propriedade privada da
terra dada a responsabilidade (económica e ecológica) que a instituição
envolve.
- Em suma: verifica-se a importância das teorias económicas para a análise e
compreensão dos problemas e desafios sociais atuais.

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