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Acórdão Do Tribunal Da Relação de Coimbra PDF
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Processo: 2/05.0TBPNL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ARTUR DIAS
Descritores: CONTRATO-PROMESSA
PROMESSA UNILATERAL
FORMA
SINAL
Data do Acordão: 17/04/2007
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE PENELA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 238º, NºS 1 E 2; 410º, NºS 1, 2 E 3; E 441º C.CIV.
Sumário: I – O contrato-promessa é a convenção pela qual alguém se obriga a celebrar
certo contrato - artº 410º, nº 1, C.Civ.
V – Não importa que ambas as partes o tenham assinado ou que a parte que
não se vinculou à celebração do contrato prometido tenha assumido a
obrigação de efectuar outra ou outras prestações, nomeadamente no caso do
promissário se obrigar a entregar uma ou mais quantias pecuniárias.
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2. QUESTÕES A SOLUCIONAR
Tendo em consideração que, de acordo com os artºs 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do Cód.
Proc. Civil, é pelas conclusões da alegação do recorrente que se define o objecto e se
delimita o âmbito do recurso, constata-se que à ponderação e decisão deste
Tribunal foram colocadas as questões seguintes:
a) Saber se o contrato promessa celebrado entre a A. e o R. é unilateral ou bilateral;
b) Saber se a quantia de € 328,00 paga pela A. no acto da celebração do contrato tem
ou não a natureza de sinal;
c) Saber se o artº 830º nº 2 do Código Civil estabelece uma presunção juris tantum
que a Autora ilidiu;
d) Saber se o R. actuou com abuso de direito.
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3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. De facto
Não tendo sido impugnada a decisão de facto nem havendo fundamento para
oficiosamente a alterar, considera-se definitivamente assente a factualidade dada
como provada na 1ª instância e que é a seguinte:
(……………)
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3.2. De direito
3.2.1. Se o contrato é unilateral ou bilateral
O contrato-promessa é a convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo
contrato (artº 410º, nº 1 do Código Civil [1]) e, embora habitualmente revista a
natureza, ou assuma a estrutura, de promessa bilateral, também pode ficar-se pela
mera promessa unilateral. A distinção está em terem ambas as partes contratantes,
ou só uma delas, assumido a obrigação de celebrar o contrato prometido (artºs 410º
nºs 2 e 3 e 411º).
Ao contrato-promessa são aplicáveis as disposições legais relativas ao contrato
prometido (princípio da equiparação), exceptuadas as relativas à forma e as que,
por sua razão de ser, não se lhe devam considerar extensivas (artº 410º, nº 1).
Quando para o contrato prometido seja legalmente exigível documento, autêntico
ou particular, o contrato-promessa só vale se constar de documento assinado pela
parte que se vincula ou por ambas, conforme se trate de contrato-promessa
unilateral ou bilateral (artº 410º, nº 2).
Assim, tendo em conta o disposto no artº 238º, nº 1, se do documento que formaliza
o contrato-promessa apenas consta a obrigação de uma das partes celebrar o
contrato prometido, estar-se-á perante um contrato-promessa unilateral. Mesmo
que, estando em causa a transferência da propriedade sobre imóveis, as partes lhe
chamem «PROMESSA DE COMPRA E VENDA», pois o que releva não é o nome que
lhe deram, mas o conteúdo que o enforma. Como igualmente não importa que
ambas as partes o tenham assinado ou que a parte que não se vinculou à
celebração do contrato prometido tenha assumido a obrigação de efectuar outra ou
outras prestações, nomeadamente, no caso do promissário, a de entregar, imediata
e/ou posteriormente, uma ou mais quantias pecuniárias. E não é possível procurar,
nomeadamente nas negociações havidas, a hipotética vontade real das partes
quanto à assunção da obrigação de celebrar o contrato definitivo, já que se está
perante um negócio formal e as razões determinantes da forma opõem-se à
validade duma promessa de compra (ou de venda) que não tem no texto do
documento um mínimo de correspondência (artº 238º, nºs 1 e 2).
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***
Mas há uma outra questão que não pode ser escamoteada e de cuja apreciação e
solução dependerá a possibilidade ou não de execução específica do contrato-
promessa em causa nos autos.
É ela a de saber se a natureza da obrigação assumida pelo Município de B... se opõe
à execução específica do contrato[6 ].
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“In casu”, não se vê que possa existir qualquer excesso manifesto dos limites
impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do
direito no facto de o R., tendo deliberado não aprovar a localização do Centro de
Transferência de Resíduos nos prédios prometidos vender, ter decidido revogar a
deliberação de reservar os terrenos para o investimento da “A..., Lda” e considerar-
se desobrigado da promessa de venda.
Com efeito, o que eventualmente poderia questionar-se[17] seria a validade ou
invalidade da deliberação de não aprovação da localização do Centro de
Transferência de Resíduos e as repercussões da mesma na esfera jurídica da “A...,
Lda”. Consumada essa não aprovação, apresenta-se-nos como consequência lógica
que a promessa de venda, feita exclusivamente na perspectiva daquele
investimento e não como mero negócio imobiliário, ficava sem justificação e
condições para ser cumprida.
Não há, portanto, abuso de direito do R. ao considerar-se desobrigado de cumprir a
promessa de venda.
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4. DECISÃO
Face ao exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente e em, com os
fundamentos acima explanados, manter a sentença recorrida.
As custas são a cargo da apelante.
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[1] Diploma ao qual pertencem todas as disposições legais adiante citadas sem
outra menção.
[2] Cfr. Ac. Rel. Coimbra de 17/01/2006 (Relator: Des. Freitas Neto), in www.dgsi.pt.
[3] Do Contrato Promessa, 3ª edição, pág. 169 e seguintes, que na exposição
subsequente, com a devida vénia, se seguirá de perto.
[4] De resto, no artº 2º, nº 2 do Plano de Apoio ao Investimento referido no ponto
3.1.4. da matéria de facto assente, onde está previsto o pagamento pelo “investidor”
da quantia em causa, designa-se a mesma como “depósito de caução”.
[5] Presunções são, nos termos do artº 349º, as ilações que a lei ou o julgador tira
de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido.
[6] Cfr. artº 830º, nº 1, in fine.
[7] Esse destino não foi objecto de menção expressa no contrato promessa, mas
resulta inquestionavelmente dos autos que corresponde à vontade real das partes
ao contratarem. E, não se lhe estendendo as razões determinantes da forma do
negócio (artº 238º), nada obsta a que seja considerado.
[8] Das Relações Jurídicas segundo o Código Civil de 1966, vol. V, pág. 9.
[9] Direito das Obrigações, pág. 58.
[10] Cód. Civil Anotado, 2ª ed., vol. I, pág. 277
[11] Direito Civil, Lições dadas ao 2º ano jurídico de 1972-1973, pág. 77.
[12] Jorge Manuel Coutinho de Abreu, Do Abuso de Direito, pág. 55.
[13] Idem, Ob. cit., págs. 59 e 60.
[14] cfr. Prof. Vaz Serra, Do Abuso do Direito, págs. 265-266.
[15] Pires de Lima-Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, pág. 297.
[16] P.L.-A.V., ob. cit., pág. 296.
[17] Noutra sede, que não neste processo.