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Resumo: O caráter religioso do pensamento esquilino se confunde com a maestria técnica envolta no
enredo e produção de sua tragédia grega clássica, Os persas. Percebe-se que mito e realidade histórica
formam, harmoniosamente, uma narrativa capaz de exprimir da melhor maneira possível o
pensamento ético-teológico de Ésquilo. A leitura critica de Os persas nos traz uma excelente
compreensão da formação do ethos nacionalista grego. Para quem se aproxima com cuidado numa
primeira ocasião do texto de Os Persas, perceberá não apenas o requinte linguístico utilizado por
Ésquilo na sua composição, mas também, elementos deveras interessantes do ponto de vista estrutural
e narrativo.
1. Introdução
A figura de Dario é reconhecida no texto, do ponto de vista persa, como uma figura de
prudência e sabedoria, a qual nitidamente se contrapõe as ações de Xerxes caracterizadas
como imprudentes e levianas. Aqui se apresenta não apenas um contraste de valores éticos,
como também, implicitamente, numa leitura subliminar, exalta a própria Grécia. Deve se
notar que Ésquilo também participou das batalhas contras os Persas durante sua vida, de
alguma forma isso pode ter alimentado seu gênio criativo, não diferente dos heróis gregos ele
via no desenrolar dos fatos o entrelaçamento entre o divino e o humano (cf. LESKY, 1995, p.
271). Pertinente é ressaltar que a ambição de Xerxes é um reflexo inspirado na glória
atribuída ao seu pai pelo povo da Pérsia. Entretanto, Ésquilo encena esses ideais persas como
sendo o pecado que os levaram a trágica destruição (cf. LESKY, 1995, p. 276).
Temos no texto o elemento mítico como marca da obra de Ésquilo, não só de sua obra,
mas como apresenta a crítica, ele comunga de uma crença tradicional grega, serem
influenciados pelos deuses os acontecimentos bons ou ruins, inclusive aqueles que levaram a
narrativa de Os persas, como destaca Albin Lesky:
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desígnios dos deuses, desestruturando as leis que regem a justa proporção
entre o universo humano e divino (RODRIGUES, 2007, p. 8).
A existência dos homens é ameaçada pela hýbris, pois os deuses o conduzem ao seu
castigo, devido sua culpa pelo erro da soberba. É a Ate que ofusca a visão do homem e o leva
a tombar, a perecer. Essas forças de justiça para o castigo são, na melhor concepção, forças de
equilíbrio. Essa força não é apenas a ação de um deus sobre a ação do homem, mas o “trágico
é efeito tanto do homem quanto do deus em igual medida”. É um caminho de justiça, punição
e aprendizado, pois o trágico produz amadurecimento. Conhecer através da dor (cf. LESKY,
1996, p. 104).
3. Elegância e grandeza
Ésquilo provou seu talento e perspicácia ao nos apresentar Os persas, uma análise
critica é capaz de demonstrar isso. O fato de pôr o diálogo na boca dos antagonistas
estrangeiros já adquire maestria na elaboração de uma dimensão nova na apreciação de uma
peça. Também na composição da obra, com diversas referências a nomes de pessoas
estrangeiras utilizando a proximidade do dialeto bárbaro com sua língua grega e a
mensuração; da grandeza, do poderio militar, em descrições do grandioso exército persa,
ressaltam não só a hýbris como o caráter dramático e o apelo a apreciação do espectador da
tragédia.
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Pela terra pátria, pelo oikos, pelos deuses e pelos antepassados se exortam os
Gregos mutuamente a combater, defendendo a liberdade – ao carácter uno e
coeso da sua acção responde a terra com um eco e os deuses com a vitória: é
que a vitória é, antes de mais, manifestação da vontade divina. Igualmente o
atesta o súbito inverno do Estrímon, que logo entra em degelo, por acção dos
deuses, na ficção esquiliana, a contribuir para a morte do inimigo. Assim o
confirmará Dario, na sua solene aparição (FIALHO, 2004, p. 217).
4. Conclusão
Assim como o visto e não muito diferente de outros povos antigos, a relação do
pensamento religioso e a influência do mito na formação dos valores morais, atrelando as
ações e responsabilidades humanas aos juízos das divindades, propõem mais do que um
recurso lírico e metafórico. A associação do relato com a aprovação ou reprovação do deus
pode ser entendida como uma justificação destes próprios valores culturais. Todo valor é
justificado, conquanto seja associado ao desígnio ou vontade daquele que representa e detém
o poder sobre os eventos da vida e da natureza e é o limite máximo da compreensão humana
de perfeição.
A obra de Ésquilo tem não só um valor artístico, mas também, moral, religioso e
histórico. Em todos esses aspectos ela ressalta a beleza da ética grega, exalta a grandeza dos
deuses pátrios, neste caso Zeus, o poderoso do Olimpo, abateu a arrogância dos Persas para
garantir a vida dos Gregos. Uma tradição erigida sobre aquilo que é dramático, belo, sagrado,
reflexivo e histórico. Os persas consegue em todos os efeitos ser uma grande obra do estilo
trágico.
Referências
FIALHO, Maria do Céu. Os Persas de Ésquilo na Atenas do seu tempo. Máthesis, n 13, ,
2004, p. 209-225.
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RODRIGUES, M. A. Mito e História em Persas de Ésquilo. Vocábulo, v. 12, 2007, p. 1-18.
VIEIRA, Trajano. Escritura dramática. In: ÉSQUILO. Os persas. São Paulo: Perspectiva,
2013, p. 9-23.