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2-02Pt
ISSN 2358-1883 (edição online)
Artigo
Resumo
Mesmo usado com frequência em literatura científica e no cotidiano de partidos e movimentos sociais,
são escassas as definições do termo militância. Nosso objetivo é reconduzir a ideia de militância à
condição de problema. Através de uma revisão de literatura nacional, mostramos que o vocábulo é
empregado ora como adjetivo, ora como substantivo. Propomos definir militância como metodologia para
produzir ações coletivas a fim de intervir, ou interferir, nas normas sociais vigentes. Essa metodologia
privilegia como estruturas organizativas os partidos, os diretórios, as centrais sindicais e afins. O modo
de funcionamento destas é marcado pela disciplina e visa produzir docilidade, comprometimento e
obediência. Apresentamos em seguida como os Novos Movimentos Sociais (NMS) produziram
alternativas táticas e organizativas à militância. Prezando por relações horizontalizadas; operando em
redes descentralizadas e autônomas; reconhecendo a pluralidade dos interesses de seus atores, os NMS
têm ocupado ruas e reinventado os repertórios de ação e de protesto. O termo “ativismo” é sugerido
para designar essa outra metodologia. Ao diferenciar ativismo e militância objetivamos recolocar os
problemas ligados ao campo da participação social, da contestação e dos protestos.
Palavras-chave: Ativismo, militância, subjetividade, movimentos sociais.
Abstract
Even though “militancy” is frequently used in scientific literature and in the daily life of parties and
social movements, there are few definitions of the term. Our goal is to convert the idea of militancy
into a research problem. A Brazilian scientific literature review shows that the term is used either as an
–––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
* Endereço para correspondência: Av. Dom Antonio, 2100, Parque Universitário, Assis, São Paulo, CEP 19806-
900. Fone: (18) 3302-5800. E-mail: andreluislfs@gmail.com, flaviofontes61@gmail.com e silvioyasui@
gmail.com.
Este trabalho foi financiado em 2016 do através do processo 2015/26241-0 pela Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Agradecemos o apoio da instituição
Resumen
“Militancia” se utiliza con frecuencia en la literatura científica y en la vida diaria de los partidos y
movimientos sociales, pero definiciones del término son escasas. Nuestro objetivo es llevar la idea de
militancia a la condición de problema. Una revisión de la literatura brasileña muestra que el término se
usa ocasionalmente como un adjetivo o como un sustantivo. Proponemos definir militancia como una
metodología para producir acciones colectivas a fin de intervenir, o interferir, en las normas sociales
vigentes. Esta metodología se centra en organizaciones como partidos y sindicatos. El funcionamiento
de éstas está marcado por la disciplina y tiene como objetivo producir la docilidad, el compromiso y
la obediencia. Entonces presentamos cómo los Nuevos Movimientos Sociales (NMS) han producido
diferentes tácticas y organizaciones, constituyendo una alternativa a la militancia. Valorizando relaciones
más horizontales; operando redes descentralizadas y autónomas; reconociendo la diversidad de los
intereses de los participantes, los NMS han ocupado las calles y reinventado los repertorios de acción
y manifestación. Se sugiere el término “activismo” para describir esta otra metodología. Al diferenciar
activismo y militancia deseamos recolocar los problemas relacionados al campo de la participación
social y manifestaciones.
Palabras clave: Activismo, militância, subjetividade, movimientos sociales.
Em 04 de março de 2016, após avaliar a ria gera tumulto, conflitos e desordem nos cen-
condução coercitiva do ex-presidente da repú- tros urbanos. Tal fato, ocorrido em um momento
blica Luiz Inácio Lula da Silva, a fim de prestar em que estudamos as metodologias para produ-
depoimento à polícia federal como um “seques- zir ações coletivas a fim de intervir nas normas
tro” e uma afronta à democracia, o presidente sociais vigentes, tornou ainda mais pungente a
em exercício do Partido dos Trabalhadores (PT), necessidade de tentar responder a uma questão:
Ruy Falcão, em vídeo divulgado no Youtube, afinal, do que falamos quando usamos a palavra
convoca os militantes e a militância do PT a militância?
montarem vigília nos diretórios estaduais, en- Silva (2004) adverte quanto aos riscos
quanto esperam a orientação da direção nacio- oriundos da naturalização de algumas ideias,
nal. Ruy Falcão ressalta que os militantes e a como a de social na Psicologia Social:
militância da Central Única dos Trabalhadores É preciso em primeiro lugar deixar de to-
(CUT) iria seguir a mesma orientação. A reação mar o social como uma evidência e passar
ao discurso foi intensa, e fez circular na impren- a constituí-lo como um problema, isto é, ...
sa nacional a ideia de que essa convocação pode- passar a constituí-lo como uma multiplici-
dade necessariamente construída a partir de dos estudos que explicitem os modos de enga-
uma relação de forças num campo historica- jamento dos indivíduos em carreiras militantes;
mente dado. (Silva, 2004, p. 13) (b) à continuidade e ampliação das investigações
Transpondo as ponderações da autora para acerca das diferentes retribuições para os sujei-
o campo da militância, é nosso objetivo neste tos oriundos do engajamento militante; (c) à pro-
artigo reconduzir a ideia de militância à condi- posição de um exame atento da relação entre as
ção de problema. Estranhar obviedades, produzir transformações macrossociais e a composição e
dúvida, descontentar-se com certezas, eis a tá- organização da militância. Ao caracterizar o en-
tica argumentativa aqui empregada. Afinal, “há gajamento militante como “toda forma de parti-
momentos na vida em que a questão de saber se cipação coletiva que vise à defesa ou à promo-
é possível pensar de forma diferente da que se ção de uma causa” (Sawicki & Simeant, 2011, p.
pensa e perceber de forma diferente da que se vê 201), os autores empregam militância como uma
é indispensável para continuar a ver, ou refletir” espécie de “adjetivo”, que qualifica uma forma
(Foucault, 1977, p. 19). específica de engajamento de sujeitos em causas.
Para reconduzir a ideia de militância à con- Além disso, esse uso também indica a relação
dição de problema fizemos o seguinte trajeto: do termo com a participação em movimentos em
(a) revisão da literatura investigando os usos da defesa de causas e formação de associações e
noção de militância, que nos leva a propor uma agrupamentos de pessoas em defesa de interes-
definição e uma caracterização da mesma nas ses coletivos.
seções “Procurando Palavras” e “Militância: uns O dossiê “Educação e política: novas con-
quês, uns quais e alguns poréns”; (b) uma pro- figurações nas práticas de militância” publicado
blematização do uso naturalizado da noção de pela Revista Pro-Posições (vol. 20, n. 2, 2009)
militância à luz da sua comparação com aquilo aborda o assunto multidisciplinarmente, ressal-
que seria um exemplo de outra metodologia para tando aspectos antropológicos, sociológicos e
produzir ação coletiva executada pelos ditos no- políticos do assunto. A apresentação da obra a
vos movimentos sociais no Brasil, a saber, o ati- caracteriza como “referência fundamental para
vismo. Esta segunda parte é levada a cabo nas os pesquisadores que se dedicam ao tema do
seções “O Olhar Atento à Repetição Faz Nascer engajamento militante, bem como contribuição
a Diferença” e “Ativar e Ocupar”. Ao final, es- para um debate, cada vez mais necessário, sobre
peramos ter lançado operadores teóricos que ini- os referenciais teórico-metodológicos dos es-
ciam um debate para melhor compreender fenô- tudos sobre o fenômeno político” (Engelmann,
menos de ação coletiva, tais como os repertórios 2009, p. 19). Já a coletânea de artigos sobre o
empregados, as táticas de contestação e as for- tema publicada pelos Cadernos CERU (vol. 20,
mas de protesto. Recolocar o problema é o passo n. 1, 2009), apresentada por Lucena, Tomizaki e
inicial para perscrutar a forma como diferentes Campos (2009), tem sua pertinência justificada
repertórios de ação e organização empregados, pela diversificação, ampliação e complexifica-
diferentes táticas, podem ser relacionadas a dis- ção dos espaços de participação política e ainda
tintos modos de produção de subjetividades. pela urgência de se forjarem ferramentas teóri-
cas e analíticas mais adequadas para circunscri-
Procurando Palavras ção das experiências militantes.
Empregando a palavra-chave “militância”,
A busca por bibliografias que auxiliassem realizamos, em março de 2016, uma revisão da
a entender o que seria militância conduziu a literatura na base de dados do SciELO e loca-
atenção para a sociologia do engajamento mi- lizamos 102 artigos. Uma leitura dos resumos
litante. O trabalho de revisão de Sawicki e Si- buscando sintetizar uma definição que permitis-
meant (2011) aponta que os desafios atuais de se entender os usos do termo, indicou o emprego
compreensão deste campo estão ligados: (a) ao do vocábulo ora com o sentido de adjetivo, usa-
aprimoramento e diversificação metodológica do para caracterizar a forma como os indivíduos
se engajam e “lutam” por certas causas, ora com das do núcleo familiar. É interessante observar a
o sentido de substantivo, que definiria um sujei- ressalva da autora ao apresentar esses resultados:
to, ou um coletivo, engajado em uma causa para “Isso não significa dizer que com essa militância
defendê-la. O termo aparece com maior frequên- estamos querendo reforçar uma ideia, muito re-
cia na literatura que discute movimentos sociais, corrente entre muitos militantes e até ex-militan-
partidos políticos e ação coletiva e o emprego do tes, de que o envolvimento e a participação em
mesmo é realizado de forma semelhante ao feito diversas formas de organização popular geram
pelo presidente do Partido dos Trabalhadores. sofrimento e dor” (Baltazar, 2004, p. 188).
Na convocação de Ruy Falcão, os diretórios, Melo (2010), abordando discursos cine-
as centrais sindicais e outros dispositivos são ad- matográficos sobre a ditadura militar no Brasil,
jetivados como militantes, ao mesmo tempo em destaca que a representação do militante é fei-
que é informado que estes mesmos dispositivos ta pela exaltação de sua capacidade de resistir.
devem convocar as suas militâncias. Tais usos “As cenas reais e construídas trazem militares
sugerem uma naturalização da ideia, tratando-a com tanques de guerra e militantes a pé, num
como algo auto evidente, que dispensaria maio- confronto que simboliza a luta do mais fraco,
res definições ou conceituações. de mãos dadas e bocas lacradas com adesivos
Quando evocamos a imagem de um militan- para indicar o silenciamento provocado pela re-
te, quem facilmente nos vem ao pensamento pressão” (Melo, 2010, p. 77). Alves (2012), em
é alguém de fala firme e disposto ao sacrifí- trabalho semelhante, sublinha, entre os sentidos
cio por uma causa . . . Vemos que, frequen- atribuídos à militância nas obras por ela estuda-
temente, é posto em cena um militante/már- das, a capacidade de resistir exercida pelos mi-
tir disposto até mesmo a morrer em nome de litantes e os efeitos das posições defendidas por
seus ideais. (Oliveira et al., 2009, p. 1807) estes sobre seus amigos e familiares. Sublinhar
Como observou Canguilhem (2014): “as- a forma como são apresentadas as representa-
sim que procuramos aquilo que faria da vida um ções discursivas sobre militância na cultura,
meio, procurando uma razão de viver, encontra- pontuando como vão constituindo o imaginário
mos também razões para perder a vida”1 (p. 88). acerca do tema em foco, cumpre aqui a função
Disso é possível deduzir a suposição comum de de ajudar a sustentar a hipótese de que uma
que a militância produziria um modo específico posição militante aumentaria o vigor e a capa-
de investimento dos indivíduos nas atividades, cidade de sustentar a resistência de um indiví-
marcado por força e vigor, e também pela posi- duo. Tendo em vista a investigação dos modos
ção de disponibilidade e sacrifício de suas neces- de uso do termo colhidos até aqui, propomos
sidades pessoais em nome da defesa de um ideá- definir militância como uma metodologia para
rio. Parte dos resultados alcançados por Baltazar produzir ações coletivas a fim de intervir, ou in-
(2004) em estudo exploratório sobre a percepção terferir, nas normas sociais vigentes. No Brasil,
dos efeitos decorrentes do engajamento militante tal metodologia tem sido usada como estratégia
para os aspectos pessoais da vida cotidiana de preferencial para produzir, conduzir e acompa-
militantes reforça essa suposição. nhar muitas formas de ação coletiva. Captado
São indicadas como consequências da mili- do campo dos estudos sobre as técnicas de guer-
tância: a falta de tempo para atividades pessoais, ra, estratégia remete
prejuízos à vida profissional, interferências na à forma de organizar, planejar, e orientar
continuidade da educação formal e o desafio de os diversos combates (campanhas e opera-
conciliar as atividades militantes com as deman- ções), tendo em conta, uma visão conjunta
de todas as forças com as quais se conta,
assim como das forças inimigas, para atin-
1
Dès que l’on cherche ce dont la vie devrait être gir um objetivo fixado: ganhar a guerra con-
le moyen en cherchant une raison de vivre, on
trouve aussi des raisons de perdre la vie. tra determinados adversários. (Harnecker,
são dos desejos e necessidades individuais ex- ficarem questionando continuamente o ideário
clusivamente como captura do modelo de vida que norteia suas ações; eles devem é seguir,
burguês; (c) a tendência a organizar seus discur- junto com seus pares, as ações e os preceitos
sos e atividades pela afronta e desconstrução do já desenhados por alguns poucos” (p. 273). A
tempo presente – macropoliticamente dominado consequência desse modelo organizativo é que
pelo inimigo. Do segundo, emanaria parte da o militante se produz: (a) subjetivado a partir
força que os faz suportar a dura realidade con- de uma perspectiva hierárquica disciplinar; (b)
creta na qual travam suas batalhas, já que é a consciente da necessidade de martírio pessoal
defesa irrestrita deste futuro revolucionário que como condição para ascese a um mundo ideal
tornaria habitável o tempo presente. “O que os pós-revolucionário; (c) libidinalmente ligado a
alimenta, em sua cultura militante, desse ponto seus pares por uma necessidade de reconheci-
de vista, é imaginar-se de peitos ensanguentados mento; (d) orientado a posicionar-se dentro de
nas trincheiras embandeiradas da luta revolucio- uma topologia de guerra. Lutando em prol de uma
nária, conseguindo dar fim a essa realidade que causa, “o militante é, em realidade, um soldado
consideram maldita” (Rolnik, 2014, p. 133). a serviço de sua lei; e será tanto melhor solda-
Macedo e Silva (2009) apontam o militan- do quanto mais sua obediência decorrer de sua
te comunista como sendo o modelo de militante opção interior, de sua consciência e não de me-
político do século 20. “Fé, hierarquia e discipli- canismos reguladores” (Valverde, 1986, p. 92).
na constituem a tríade explicativa deste militante Atentos à ressalva de Silva (2004) sobre os
total, engajado de maneira organizada e devota riscos decorrentes da naturalização de algumas
na transformação da sociedade” (Macedo & Sil- ideias, observando a forma como o termo foi
va, 2009, p. 379). Impossível entrar em contato empregado na literatura estudada e levando em
com esse tripé de sustentação e não perceber nele conta todas as considerações feitas até aqui, tor-
ressonâncias das discussões de Freud em Psico- nam-se relevantes as seguintes questões: a me-
logia de Grupo e Análise do Ego (1921/2006). todologia militante ainda perdura em nós como
Nesta obra, o autor apontou que a sustentação forma de produzir coletivos de sujeitos capazes
da grupalidade de instituições como o exército de sustentar mudanças? Se admitirmos que “a
e a igreja estão alicerçadas na ilusão de que, no modernidade foi construída em torno do ideário
momento de ingresso nesses grupos, o indiví- da revolução, que materializava, como metáfora,
duo passar a ser amado por um líder superior, a crença transformadora do sujeito coletivo [mas
integrando-se a uma massa de indivíduos que ele que] a atualidade pós-moderna lançou uma pá
ama incondicionalmente e pelos quais é amado. de cal em tal pretensão” (Birman, 2007, p. 82),
É por essa via que Freud explica a coesão e falta ainda identificamos a militância como metodo-
de liberdade individual de um sujeito integrado logia preferencial para produzir ações coletivas
em grupos. Mezan (2006), ponderando sobre os a fim de intervir nas normas sociais vigentes? É
efeitos de um grupo fundado com tais caracte- possível produzir “movimentos de mudança e
rísticas, reforça a hipótese de que a militância ruptura” fora “dos temas, conceitos, métodos e
imprimiria força e vigor aos militantes. O autor instituições derivadas da ciência marxista” (Val-
é preciso ao afirmar que “enquanto perdura a verde, 1986, p. 182)?
massa, a agressividade é inibida no interior des- As indagações trazidas tiveram o intuito de
sa, sendo desviada para os que não pertencem a fazer uma provocação e, em certa medida, re-
ela (os inimigos militares, ou crentes em outras forçar a necessidade de desnaturalização do uso
religiões)” (Mezan, 2006, p. 154). corrente de um termo que comparece com frequ-
Veiga-Neto (2012) fornece outros elemen- ência aos discursos daqueles que trabalham para
tos elucidativos sobre os efeitos decorrentes do interferir nas normas sociais vigentes. O uso
uso do tripé (fé, hierarquia e disciplina) como tautológico da expressão militância na biblio-
forma de organização. “Não cabe aos militantes grafia consultada – aquele no qual a militância
destaca a presença de um questionamento forte mente diversa, cujo foco de atuação não estaria
da ação político-partidária sobre essa militância. alicerçado, necessariamente, na noção de classe
Ao aparelharem entidades como a União Nacio- social e estrutura social, mas, sim, na considera-
nal dos Estudantes, os diversos partidos acabam ção de questões como cultura, identidades, gêne-
reduzindo as assembleias e fóruns dos estudantes ro, raça, etnia, entre outros. A autora esclarece
a espaços para continuidade da articulação das que “embora não vise à conquista do poder, os
pautas partidárias. O aparelhamento produziria, movimentos geram demandas a serem atendidas
ainda, um estilo de intervenção centrado no con- pelo Estado, propiciando, assim, a instalação de
vencimento e conscientização, deixando pouco um processo de democratização da sociedade”
ou nenhum espaço para a construção comparti- (Saraiva, 2010, p. 9). Machado (2007) aponta
lhada de agendas de trabalho e entendimento das como novidade a perspectiva pela qual os mo-
necessidades dos próprios estudantes. Por fim, a vimentos entram em relação com o Estado – a
investigação deu visibilidade ao “surgimento de relação que outrora se constituiu pela via da opo-
uma nova sociabilidade militante no movimento sição, passa a ser articulada em termos de coope-
estudantil, contrapondo-se às práticas mais tradi- ração. Segundo ele,
cionais da militância dos estudantes, reprodutora as iniciativas da sociedade civil incorpo-
de um comportamento político institucionaliza- radas na ação dos movimentos sociais . .
do e (re)produzida nos espaços de apoio do mo- . em vez de serem vistas como subversi-
vimento estudantil como os partidos, sindicatos vas, revolucionárias ou marginais, passa-
etc.” (Mesquita, 2003, p. 135). ram a ser entendidas como manifestações
Pautada em relações mais horizontalizadas, próprias, típicas e até mesmo sadias de um
valorizando a dimensão mais subjetiva do enga- ambiente político e social plural. (Macha-
jamento, com formas de organização descentrali- do, 2007, p. 255)
zadas e relativamente autônomas, investindo em Há pouco consenso sobre o que haveria efe-
estratégias pedagógicas vivenciais e não restritas tivamente de novo no campo dos movimentos
às práticas argumentativas de convencimento ra- sociais. Partiremos da opinião de Gohn (2006),
cional, essa “nova sociabilidade militante” tem quando diz que a novidade consiste na politiza-
se fortalecido no embate com os modos tradi- ção de novos temas e em uma nova forma de se
cionais e, assim, vem ganhando espaço dentro fazer política. Poderia essa nova forma de fazer
do movimento estudantil. A incorporação de tais política trazer consigo uma mudança na meto-
características da “nova lógica de militância” dologia a ser usada para interferir nas normas
tem se mostrado uma alternativa ao esvaziamen- sociais vigentes? Estariam eles produzindo uma
to dos espaços de participação estudantil, uma “nova lógica de militância, uma nova sociabili-
vez que produz, reconhece e põe em funciona- dade militante” (Mesquita, 2003, p. 136)? Diante
mento outros dispositivos de participação além de tais mudanças, seria o termo militância ainda
dos diretórios, comitês e centros acadêmicos. adequado? Nesta seara, pode ser útil convocar
São signos destas novas linguagens as Exe- para a discussão as palavras precisas com que
cutivas de Curso (que apesar de algum tem- Foucault (2015) se posiciona em relação a uma
po de existência somente se fortaleceram e polêmica gerada a partir de algumas afirmações
ganharam maior visibilidade na última dé- suas sobre a questão da homossexualidade:
cada), os coletivos de cultura, grupos de es- um combate não pode se perpetuar sempre
tudantes negros, grupos de extensão univer- nos mesmos termos, caso contrário ele se
sitária realizados pelos estudantes, coletivo esteriliza, se imobiliza, sucumbe a armadi-
de mulheres universitárias etc. (Mesquita, lhas. Logo, uma mudança de frente de ba-
2003, p. 135) talha. E, consequentemente, uma mudança
Saraiva (2010) caracteriza os novos movi- de vocabulário. A mudança de objetivos é
mentos sociais (NMS) como um conjunto diver- também absolutamente indispensável. (pp.
so de movimentos, dotados de natureza igual- 6-7)
ria imediata, são mais que nunca, necessárias” terá sua resposta condicionada à precisão dos
(Mouterde, 2003, p. 170). termos nos quais foi proposto (Deleuze, 1988),
Experimentações políticas fortemente em- entendemos que reconduzir a militância à con-
bebidas das questões trazidas à pauta por esses dição de problema pode criar uma zona de visi-
novos movimentos sociais têm partilhado conos- bilidade tanto dos limites decorrentes do uso da
co a aposta supracitada. Conscientes dos limites metodologia militante hoje quanto de vislumbre
do nosso modelo de democracia representativa de quais caminhos se apresentam como poten-
multipartidária, mas tomados pela urgência de tes para reinvenção de nós mesmos e dos nossos
propor alternativas ao debate dentro da insti- modos de agir coletivamente.
tucionalidade democrática atual, organizações Nosso estudo do tema em questão segue
como o Syryza na Grécia, os movimentos de em andamento, uma vez que o mesmo é objeto
candidaturas cidadãs e a formação do Podemos de tese de doutorado de um dos autores. Con-
na Espanha são expressões significativas dessas tudo, reconhecendo a dimensão política do ato
tentativas de reinvenção da democracia (Cava & de produzir conhecimento, foi necessário tornar
Béltran, 2014). público aquilo que estamos produzindo. Cientes
da necessidade de encontrar operadores teóricos
Considerações Finais para recolocar o problema, esperamos, com esse
texto, iniciar o debate que nos conduza a ser me-
No início de 2016, a crise das democracias nos fascistas, principalmente quando nos cremos
representativas ocidentais somou-se, no Brasil,
revolucionários.
a uma crise de governabilidade e de institucio-
nalidade tamanhas que fazem circular em vários
Referências
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tar diferenças onde se vê identidade, realizar um tação de mestrado apresentada ao Programa de
diagnóstico do presente, identificar as virtualida- Pós-Graduação em Letras da Universidade Es-
des inatualizadas disponíveis para reinventar o tadual de Maringá, Maringá, SC, Brasil). Recu-
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