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IGREJA EM EMERGÊNCIA: UMA INTRODUÇÃO

ÀS PRIMEIRAS EXPRESSÕES VISÍVEIS DA


ECLESIA PÓS-MODERNA
Emerging Church: an introduction to the first visible
expressions of ekklesia postmodern

Rogério Hernandez de Oliveira.1


RESUMO

O presente trabalho é resultado de pesquisa sobre as primeiras expressões


eclesiológicas visíveis com o advento da pós-modernidade identificada no
movimento da Igreja em Emergência compilada em 2010. A abordagem parte
de uma breve avaliação dos tempos de mudança de uma cultura moderna para
pós-moderna que afeta a eclesiologia. Em seguida, segue um relato histórico
sintético do movimento da Igreja em Emergência e suas diversas tendências e
ênfases, sua origem, principais líderes, as primeiras expressões e impactos, as
avaliações de alguns acadêmicos que dialogam e pesquisam o movimento com
o levantamento de pontos para a continuidade de pesquisa do movimento que
continua evoluindo.

Palavras-chave: Eclesiologia pós-moderna; Igreja em Emergência; Igreja


Emergente; Pós-modernidade.

ABSTRACT

This work is the result of research on early ecclesiological expressions


visible with the advent of postmodernity identified in Church movement in
Emergency compiled in 2010. The approach begins with a brief review of the
changing times of a modern culture to postmodern affects ecclesiology. Then
follows a historical account of the synthetic Emerging Church movement and
its various trends and emphases, its origin, key leaders, the first expressions
and impacts, assessments of some academic research that dialogue and
movement to the survey points to continuing research movement that
continues to evolve.

1 Pós-Graduado em Liderança e Pastoreio e Mestrando em Teologia pela Faculdade


Teológica Batista do Paraná (FTBP). E-mail: netvida@bighost.com.br.

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Keywords: Postmodern ecclesiology; Emerging Church; Emergent Church;
Postmodernity.

INTRODUÇÃO

Ciclicamente no mundo ocidental, ocorrem transformações


nas relações do pensar e agir na organização da sociedade. Este
equilíbrio de forças e relações entre os agentes sociais que o
compõem é manifesto através de seus valores, sua maneira de
pensar e decodificar o mundo à sua volta desaguando nas ações
práticas das relações humanas em suas diversas esferas.
Os valores e o pensar que caracterizam o tempo dos
ventos pós-modernos reagrupam-se e transformam o jogo de
forças estabelecidas entre os diversos agentes da sociedade. Peter
Drucker aponta que estamos atravessando muitas transformações.
Aponta que vem ocorrendo desde em meados do século treze com
a emergência das cidades, do comércio, da arquitetura gótica,
das artes e do pensamento aristotélico e a literatura europeia
com Dante. Este reflexo na religião vem com o surgimento das
ordens religiosas urbanas como os dominicanos e franciscanos.
Cerca de duzentos anos se passam e nova transformação ocorre
agora com Gutemberg e a Reforma Protestante de Lutero e
o grande cisma que vem preparar o caminho do fenômeno do
protestantismo dentro do cristianismo institucionalizado e
totalitário da Igreja Católica Apostólica Romana2. O desabrochar
da ciência, o fortalecimento e organização das nações em estados,
o expansionismo das descobertas além-mares. Novamente mais
duzentos anos se passam e se inaugura o que chamamos de período
2 DRUCKER, Peter F. Sociedade pós-capitalista. 1. ed. São Paulo: PUBLIFOLHA,
1999, p. XI.

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embrionário dos tempos modernos, de onde nascem os chamados
“ismos” modernos. O capitalismo, o comunismo, a consolidação
formal e estruturada das expressões do protestantismo no cenário
religioso3. Drucker resume uma sequência histórica que acaba
desaguando numa conclusão simples:

O vazio criado pelo desaparecimento da crença na salvação pela


fé foi preenchido em meados de 1700 com o surgimento da
crença na salvação pela sociedade, isto é, por uma ordem social
temporal, personificada por um governo igualmente temporal.
Essa crença foi primeiramente exposta por Jean-Jacques
Rousseau, na França. Trinta anos depois, Jeremy Bentham,
na Inglaterra, transformou-a num sistema político, e ela foi
moldada em sua forma permanente, o absolutismo “científico”,
pelo “pai da sociologia”, Auguste Comte, e por G. W. F. Hegel,
na Alemanha. Os dois então “geraram” Marx que, por sua vez,
gerou Lênin, Hitler e Mao. Quando cresceu o domínio do
Ocidente sobre o mundo, a superioridade de equipamentos,
dinheiro e armamentos provavelmente era menos importante
do que a promessa de salvação pela sociedade. E agora
isso acabou.4

“E agora isso acabou”. Uma conclusão simples


e desconcertante.
Os pressupostos modernos encontram nestes tempos pós-
modernos uma realidade marcada pelo sentimento de frustração,
à medida que não se confirmam, ou mesmo vão se defrontando
com situações contraditórias ao que se esperava. A teoria da
evolução da religião ensinava que iniciamos com o animismo,
depois caminhamos para o panteísmo, politeísmo, monoteísmo

3 DRUCKER, Peter F. Sociedade pós-capitalista. 1. ed. São Paulo: PUBLIFOLHA,


1999, p. XI-XII.
4 DRUCKER, Peter F. O melhor de Peter Drucker: a sociedade. 1. ed. São Paulo:
NOBEL, 2001, p. 118.

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e finalmente o ateísmo, ou seja, a sociedade emancipada que não
precisa mais de Deus. Mesmo entre aqueles que se dizem cristãos,
a ideia é que os povos primitivos precisavam da linguagem
de milagres, etc., mas isso é passado. Assim antecipava-se uma
sociedade cada vez mais secular, com o eventual banimento
da religião. No entanto, o que se vê é que o mundo está mais
plurirreligioso e místico.
Na evolução da área técnico-econômica, as orientações em
vez de satisfazer as necessidades econômicas, destinam-se sim à
criação de exigência hedonistas,5 no paradoxo de um mundo com
mais tecnologia, recursos, mas com maior miséria e disparatados
desníveis sociais.
Na área política, com o aguardado fortalecimento evolutivo
de estados hegemônicos e autoritários, surge a fragmentação dos
grandes blocos políticos dominados mais por questões étnicas
e diferenças religiosas que ressuscitam características típicas de
sociedades tribais; sociedades que permaneciam sufocadas pelo
autoritarismo de estado que não mais as podia conter, como a
multiplicação de microconflitos e microrrevoluções cada vez mais
pontuais nos mais diversos tipos de estados e sociedades.
As análises clássicas sobre o papel da religião,
predominantemente cristã, são invadidas pela multiplicidade de
outras religiões onde o deus não somente pode ser outro, mas
vários. Assim, cada vez mais a discussão voltada aos meios de
expressão e construção da busca do divino e do sagrado restrito não
se restringe ao contexto histórico judaico-cristão. Ela se expande

5 MARTELLI, Stefano. A religião na sociedade pós-moderna. 1. ed. São Paulo:


PAULINAS, 1995, p. 326.

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para a significância de outras expressões religiosas que ganham
cada vez mais corpo e desenvoltura no mundo ocidental. Cada vez
mais este tipo de ocorrência e influência religiosa ganha espaço,
influência e se expande em outros espaços como a militância
em organizações não governamentais, o chamado terceiro setor,
principalmente naquelas engajadas com as questões ambientais.
Paradoxalmente, o que se esperava ser diluído e absorvido agora
toma o caminho inverso e afeta o ambiente sociocultural em
todos os níveis da sociedade ocidental.
Se o destino da religião previsto na modernidade era o da
sua gradual redução como agente influente na sociedade pela
secularização, a realidade pós-moderna mostra outra dimensão.
Um cenário onde a religião, de valor considerado menor e pouco
a pouco dissipável, vem agora, paradoxalmente, levantando-se
mais forte e presente interagindo ativamente nas variáveis dos
tecidos sociais, com peculiaridades próprias. O mundo, de forma
surpreendente e inimaginável para os pensadores modernos,
tornou-se mais religioso e místico do que antes e, ao mesmo
tempo, cético, desconfiado, de olhos baços e tristes.
O cenário não só mudou, mas os métodos e conceitos como
se pressupunha ser o papel da religião devem ser rediscutidos
e analisados no ambiente pós-moderno que introduz uma real
descontinuidade diante da previsibilidade moderna, ambiente dos
outrora postulados que sustentavam a maneira de estudar a religião.
Mudanças paradigmáticas com impactos transculturais trazem um
efeito complicador como aponta Hiebert citado por Bosch:

O velho paradigma e o novo são incomensuráreis; as perspectivas


de seus respectivos defensores divergem tanto que se poderia,

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inclusive dizer que estão respondendo a realidades distintas.
Embora o mundo em que vivem seja o mesmo para todos,
respondem a ele como se vivessem em mundos diferentes [...]
Falando metaforicamente, um está jogando xadrez e o outro,
damas, sobre um mesmo tabuleiro. 6

Entretanto a questão que se coloca agora é mais identificar


qual é o jogo, mas onde está o tabuleiro? Se é que há tabuleiro.
O que o mosaico do passado mostra ao longo da história
é que Deus se revela e sempre de forma contextualizada dentro
desta ou daquela cultura com os ingredientes próprios que
formam cada época com todos seus particulares elementos.
Agora chega a realidade da emergência da pós-modernidade,
pós-cristã de um mundo neopagão e neorreligioso.

1. SURGIMENTO DA IGREJA EM EMERGÊNCIA


(EMERGING CHURCH – EC) E SUAS FACETAS.7

Dentro do campo da religião, o cristianismo influenciou

6 BOSCH, David J. Missão Transformadora. 3. ed. São Leopoldo. RS: EST, Sinodal,
2002, p. 231.
7 Necessário colocar o esclarecimento de entendimento distinto das expressões
“emerging” e “emergent” quando utilizadas na literatura ligada ao movimento que
acontece no meio da igreja. Tem sido indistintamente utilizadas em obras traduzidas
para o português equivocadamente pela mesma palavra “emergente”, como se fossem
sinônimas, causando um problema de compreensão e entendimento. Fica mantido
o uso dos termos originais em inglês neste artigo para que a diferenciação seja
claramente identificada e não confundida já que, possuem significados próprios e
distintos. Emerging é o termo ligado ao movimento global, geral. Emergent designa
um grupo organizado chamado Emergent Village. Importante ala com identidade
distinta das demais expressões dentro do movimento maior da Emerging Church
(indicado pela sigla EC). Essa diferenciação foi apontada pelo Dr. Scot McKnight
em palestra proferida em 27-26 de outubro 2006. “What is the Emerging Church?” -
Fall Contemporary Issues Conference Westminster Theological Seminary e no artigo
“Five Streams of the Emerging Church - Key elements of the most controversial and
misunderstood movement in the church today” CHRISTIANITY TODAY – publicada
no site www. christianitytoday.com em 19 de janeiro de 2007.

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e foi influenciado em cada um dos ciclos do passado
particularmente nas suas transições. É o que Robert Webber
chama de “o último suspiro do paradigma mais antigo” e “o
primeiro sopro do novo paradigma”. Porque nós estamos em
um momento de grande agitação cultural da modernidade para
a pós-modernidade, o século XX pode ser visto como o século
da transição8. Hoje há um inegável momento de enfrentamento
de dificuldades com mudanças culturais na transição de
modernidade para pós-modernidade. O século vinte pode ser
visto como o século da transição – particularmente nos seus
últimos vinte cinco anos – O ciclo do evangelicalismo neste
período interpretado como o último suspiro da modernidade
e o primeiro sopro da pós-modernidade segue cada vez mais em
um novo ciclo permeado de inseguranças e temores.
Reggie McNeal, diretor de desenvolvimento de liderança da
Convenção Batista da Carolina do Sul com mais de vinte cinco
anos de ministério pastoral e treinamento de líderes pastorais,
apresenta o seguinte confronto de realidade diante de pastores e
líderes atuais:

Para você que está satisfeito com as coisas como estão na vida da
igreja e na sua vida ministerial, ou se você concorda com uma
das seguintes afirmações a seguir:
• Se você edificar a igreja perfeita (da maneira que pensamos
sobre igreja), as pessoas virão.
• O crescimento da sua igreja irá automaticamente fazer diferença
na comunidade.
• O melhor desenvolvimento dos membros da igreja resultará num
evangelismo muito maior.
• A igreja necessita de mais obreiros (para o trabalho da igreja).

8 WEBBER, Robert. Listening to the beliefs of emerging churches. 1. ed. USA:


ZONDERVAN, 2007, p. 9.

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• O envolvimento das pessoas com a igreja resultará em discipulado.
• Melhores planejamentos irão levá-lo aonde você quer chegar (em
termos de efetividade missional).
Se você acredita em alguma destas pressuposições, você está
num mundo que, não faz muito tempo, já passou. Pior ainda,
se você persistir em seguir com estas pressuposições, você
pode estar atualmente obstruindo a Missão de Deus nos
dias correntes.9

A questão levantada por McNeal pode ser afastada,


ou mesmo ignorada por qualquer líder pastoral que está à
frente de uma igreja local, ou área de influência institucional
denominacional ou até mesmo em alguma agência paraeclesiática,
porque perturba a paz de sua zona de conforto de pressupostos
eclesiológicos, entretanto a realidade existe.
O surgimento da Igreja em Emergência não é uma
geração espontânea, isolada, autônoma, pontual, nem
mesmo um movimento estruturado a partir de uma pessoa
ou um núcleo organizado que se dissemina na transmissão
de valores, ideias e práticas. Ela faz parte de todo um quadro
que acontece na história. Surge como um movimento que
“emerge” dentro de um conjunto de fatores e em diversos
locais, com uma diversidade de manifestações, mas com
algumas particularidades ligadas ao seu momento histórico,
às culturas geracionais existentes e a um conjunto de
pensamentos e filosofias correlatas.
A pesquisa base de onde são extraídas as informações
que seguem foram coletadas e publicadas no trabalho dos

9 MCNEAL, Reggie. The Present Future – six tough questions for the church. 1. ed.
USA: JOSSEY-BASS, 2003. p.17

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professores Eddie Gibbs e Ryan K. Bolger10 com um relato
dessa história de forma concisa e objetiva mostrando pouco a
pouco como são os elementos que vão compondo essa história
e seu surgimento acrescidos de informações coletadas que
passamos a descrever resumidamente.

A fase dos ministérios para a Gen-X.

Nos anos 80, uma preocupação das lideranças pastorais


estava voltada com o grupo de jovens e adolescentes, era a época da
chegada dos primeiros integrantes da chamada Geração-X. Nessa
época, surgem algumas iniciativas de experiências independentes,
mas ainda com a aplicação de mudanças superficiais cosméticas
voltadas à juventude, entretanto preservando na essência os
mesmos modelos que eram aplicados com os grupos mais antigos,
já que vinham obtendo uma razoável dificuldade de comunicação
e penetração efetiva com esses grupos.
Uma das experiências pioneiras nos EUA surgiu em
1986 com Dieter Zander em Ponoma, Califórnia, mais tarde
outros líderes independentes de grande importância vão
surgir na primeira metade dos anos 90 como Chris Seay na
Baptist University Church em Waco, Mark Driscoll, a Mars
Hill Church em Seattle e ainda mais tarde Erwin MacManus
com a Mosaic Church em Los Angeles todos voltados para os
grupos Gen-Xers.
Esse modelo passou a chamar a atenção e ser observado
pelas lideranças das grandes igrejas sendo adotado e reproduzido
10 Eddie Gibbs, professor da cadeira de Crescimento de Igreja e Ryan K. Bolger,
professor assistente de Igreja na Cultura Contemporânea na School of Intercultural
Studies e diretor acadêmico, ambos no Fuller Theological Seminary.

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em diversas comunidades como uma diversificação funcional
dentro da sua estrutura ministerial destinada a atender o grupo
jovem, mas, ainda como um projeto voltado para o público alvo,
os jovens filhos das famílias das igrejas.
Nessa época, a cultura de departamentalização e
especialização com controles gerenciais nos ministérios das igrejas
vinha em forte ascensão, principalmente nas megaigrejas, cada
vez mais dentro de uma diversificação ministerial especializada e
direcionada na busca de maiores resultados em alcançar nichos
de “mercado”. Dessa maneira, começam a surgir as primeiras
experiências com a introdução dos ministérios voltados para a
chamada Geração-X dentro das igrejas institucionalizadas. Em
1993, uma segunda versão dessa tendência evolui e surge em
cena para o que chamaram de “igreja dentro de uma igreja”,
transformando o ministério jovem como uma igreja com
linguagem própria voltada para a juventude no seu estilo de
adoração, louvor, pregação irreverente e uma liturgia própria.
Entretanto ainda funcionam dentro das igrejas como cultos jovens,
que acontecem em horários e dias alternativos aos dos cultos
institucionais da igreja, e da qual recebem o apoio financeiro e
suporte de instalações como um tipo de diversificação ministerial,
visivelmente observado nas megaigrejas sob a direção e supervisão
da liderança pastoral.
Os líderes pastorais do momento passam a “contratar”,
ou formar, jovens pastores especializados para cuidar desta igreja
jovem dentro de suas igrejas. Na década de 90, surgem o “Next
Level” em Denver - Colorado com Trevor Bron, o “Axis” em South
Barrington (Willow Creek) com Dieter Zander, o “Graceland” em

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Santa Cruz com Dan Kinball, e o “Warehouse 42” em Charlotte
com Todd Hahn.
Como resultado dessas experiências ministeriais e a
ampla projeção que essas megaigrejas tinham, os anos 90 foram
recheados de publicações voltadas para os ministérios com a
chamada Geração-X. O marketing de divulgação e promoção de
estratégias, materiais específicos, táticas de trabalho e um sem
número de conferências temáticas para o segmento jovem dos
Gen-Xers aliados aos demais ministérios que eram desenvolvidos
pelas megaigrejas e outras organizações que os promoviam dentro
de suas estruturas ministeriais.
Paralelamente a todo esse movimento, já vinha acontecendo
no ramo pentecostal outra considerável influência com o
trabalho de John Wimber e a Vineyard, que atinge fortemente
a geração mais jovem nos EUA, Canadá se extendendo até o
Reino Unido. As visitas de John Wimber ao Reino Unido no
início dos anos 80 têm um grande e profundo impacto nas igrejas
evangélicas, especialmente na igreja anglicana, que patrocinaram
diversos seminários para clérigos e líderes leigos. Essa associação
com Wimber e a Vineyard veio se tornar conhecida como a
Terceira Onda11. Por que este fato é importante? Porque no
Reino Unido, virtualmente todos os líderes da “emerging

11 TERCEIRA ONDA – Esse foi um termo cunhado por Peter Wagner com o
movimento associado com John Wimber e a Vineyards que se tornou conhecido como
Terceira Onda do qual participavam leigos e clérigos anglicanos. Essa nominação por
Wagner foi colocada para descrever a ênfase do Espírito Santo que difere tanto do
pentecostalismo clássico como do movimento carismático ao se distanciar da busca
ostensiva do Batismo no Espírito Santo com o acompanhamento de sinais de falar em
outras línguas. Era marcado de forma especial pela forma como Wimber tinha o hábito
de apelar para o “convite” da presença do Espírito Santo mais do que “comandar” uma
manifestação em particular. GIBBS p.219.

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church” têm suas raízes no movimento carismático ocorrido nos
anos 1980 e início dos anos 90. Entretanto, nos EUA iso não é
tão evidente, embora dois dos líderes mais influentes nas redes
de trabalho da igreja em emergência, Todd Hunter12 e Brian
McLaren13, têm fortes raízes carismáticas da Terceira Onda.
Todavia a grande maioria desses líderes, nem no Reino Unido
nem nos EUA, trazem estilos carismáticos de adoração para
igrejas em emergência14.

Dos ministérios da Geração-X (Gen-X) para o surgimento da


Emerging Church

As estratégias dos ministérios Gen-Xers parecem ser a


solução para os líderes das igrejas, uma forma de atender os
grupos de jovens de suas comunidades, trazendo-os de volta
para a igreja local e promovendo paz e tranquilidade para seus
pais. No entanto, mais mudanças estão por acontecer com
esses ministérios. No meio dos líderes desses ministérios há
cada vez mais um desencantamento que vai crescendo após a
euforia dos primeiros anos de conquista de um espaço próprio
dentro da igreja. O sentimento é de frustração, pois, no final das
contas, descobrem que o que conquistaram é apenas um espaço
temporal, enquanto estão naquela faixa etária para aliviar as

12 Todd Hunter – foi diretor nacional da Associação das Igrejas Vineyard.


13 Brian McLaren – foi pastor fundador da Cedar Ridge Church até 2006, é um dos
membros fundadores do grupo Emergent Village. Em seu site pessoal apresenta-se
como escritor, palestrante e ativista. Autor de vários livros e apontado como uma
das principais referências do movimento emergente e formulador do pensamento do
Emergent Village.
14 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian
Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005. p.219-220.

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ansiedades imediatas do grupo. Logo começam a perceber que
no final nada mudou.
Essa forte mudança pode ser bem percebida em alguns
depoimentos como o de Brad Cecil líder do Axxess em Arlington,
Texas, que rejeita a identificação geracional como um parâmetro
de rotulação muito superficial em sua análise:

Assim como outras pessoas que tenho ouvido, eu entendo que


a filosofia de nosso ministério é muito diferente. Eu imagino
que cada um fica pensando da mesma maneira padronizada o
que somos, mas não é este o caso. Eu desejo ir a conferências
com vontade de aprender, porque eu quero aprender diferentes
filosofias ministeriais já existentes. Eu estou farto de ouvir boba-
gens como: Gen-xers são a geração mais desiludida na história;
Gen-xers são cínicos; Gen-xers não são confiáveis porque há um
grande número de divórcios entre seus pais, etc. Esta bobagem
geracional me incomoda, e eu acho tudo isso muito míope. Eu
não consigo aceitar como as pessoas são obsessivamente focadas
numa visão de um subgrupo, quando uma enorme mudança
epistemológica está acontecendo. Eu nunca confiei em largas
generalizações a respeito de qualquer subgrupo.15

O que aconteceu com Cecil não é um fato isolado nem


muito diferente do conflito que Dan Kimball enfrentou enquanto
ocupava a liderança do ministério de Gen-Xers chamado Graceland
em sua igreja.

Nossa liderança da igreja estava dividida em vários


departamentos e nos disseram que o ensino da Graceland
deveria ser exatamente o mesmo de todo o restante da igreja.
O objetivo era uniformidade de tal maneira que todas as coisas
fossem mais bem cuidadas e debaixo de um maior controle.
Isto me afetou profundamente, e embora não pedissem minha
opinião, mas ao contrário eu tinha que liderar a aplica-las.

15 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian


Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005. p.33.

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Eu compreendi que eu não poderia mais fazer isto. Todas as
mudanças que eu pedia para fazer eram rejeitadas com as razões
de que tudo devia voltar ao seu ponto de início. E o que me
respondiam era “Nada disso. Continue a tocar a música que
vocês tocam, mas pregue as mesmas mensagens que estamos
pregando na igreja principal para que haja unidade”. Mas eu
comecei a buscar na minha alma questionando, “Porque sinto
que isto está errado? O que temos que fazer é simplesmente o
mesmo que fazem na igreja principal a não ser a música?” Eu
comecei a fazer algumas questões fundamentais como: O que é
igreja? O que é ser um pastor? Foi então que eu compreendi que
o que tinha principiado como uma discussão de metodologia
tornou-se numa discussão de eclesiologia. 16

Da mesma forma, Dieter Zander, que recebeu o convite


de Bill Hybels em 1994 para implantar o projeto de “uma igreja
dentro de uma igreja” na Willow Creek, não passa incólume
no mesmo processo. Depois de uma fase de adaptação local
participando na área de ensino e liderança de grupos pequenos,
Zander, no ano seguinte, passou a liderar o ministério chamado
Axis, conduzindo-o sob sua responsabilidade até o final de 1997.
O relato de Zander sobre sua experiência com o Axis nesse período
traz um quadro semelhante aos anteriores.

Eu advogava em favor da geração Gen-X. Eu queria que os


boomers entendessem os Gen-Xers e lhes dessem espaço para
participar na condução da igreja. Muito do meu trabalho
naquela época foi buscar lhes dar oportunidades de liderança
onde não havia nenhuma. Havia uma dispensa generalizada por
essa diferença.”Quando eles crescerem e vierem para a igreja
principal, o Axis provavelmente não será mais necessário. Este
ministério para a Gen-X vai ajudá-los a permanecer por aqui
até que cresçam”, foi o que Hybels disse. Eu pensei que estava
construindo uma nova etapa que a igreja viria a se tornar, mas
no pensamento de Hybels não era nada mais do que um sub-

16 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian


Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005. p.279.

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ministério, como uma estratégia para estudantes secundaristas.
Quando eu descobri que o Axis não passava de um “tanque de
armazenagem”, um lugar para colocar os insatisfeitos até que eles
estivessem prontos para a igreja real. Foi aí que eu vi o quanto
de tempo eu havia perdido. Ultimamente não creio que o Axis
necessitasse ser absorvido no restante da igreja, e Hybels o fez.
Mesmo vendo que a “igreja dentro de uma igreja” não funcionou
neste caso, eu ainda sou esperançoso sobre este modelo. 17

É nesta segunda metade da década de 90 que começam


a surgir os efeitos de novas forças latentes alimentadas pelos
seguintes ingredientes que vão catalizar mais mudanças:
a) a chegada à idade adulta dos Xers dentro de uma igreja
domindada por boomers – um confronto de voz e espaço;
b) a introdução das influências das mídias digitais de
comunicação e seus efeitos – a adoção de aplicações cosméticas
superficiais pelas gerações mais antigas versus a mudança de
cultura nas gerações mais novas;
c) o fortalecimento das influências pós-modernas para
outras áreas da vida cotidiana além dos debates acadêmicos e
filosóficos;
d) o desencanto com os valores de mercado do mundo
moderno e ansiedade por novas alternativas, especialmente
voltadas para uma espiritualidade crescente nas mais diversas
áreas do conhecimento e ação humana – o descontentamento
com o status quo vigente da igreja;
e) a consolidação da “aldeia global” pluralista, com a
valorização das diversidades étnicas, religiosas e culturais – a
rejeição a modelos reducionistas e simplificadores.

17 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian


Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005. p.325-326.

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É nesse momento que começa a ocorrer uma série de
fatos que vão desaguar na redução do foco da ênfase restrita à
categorização de ações centradas em ministérios geracionais.
O trabalho desenvolvido por uma importante organização
interdenominacional voltada para o treinamento, capacitação e
intercâmbio de pastores e líderes chamada Leadership Network18
torna-se um agente catalizador para o que vai acontecer.
No ano de 1997, essa organização promove a segunda
conferência anual chamada Gen-X 2.0 passando a organizar a
YLN – Young Leaders Network – uma rede de diálogos e conversas
entre jovens pastores abordando temáticas em torno da pós-
modernidade. Embora a conferência fosse direcionada ao tema
da Gen-X, o rumo que se seguiu foi para além de meras discussões
sobre técnicas de um ministério geracional.
Na terceira conferência no outono de 1998, pós-modernidade
torna-se o tópico central do “Forum Re-evaluation” organizado por
Doug Paggit para a YLN, e as discussões concentram-se em avaliar
os benefícios e malefícios da pós-modernidade. O consenso
foi de que os desafios evangelísticos para a igreja não eram de
angústias geracionais, mas uma desconexão filosófica com uma
cultura mais ampla. Os desdobramentos dessas discussões geram
uma ampliação dessas discussões, principalmente confrontando
as técnicas ministeriais geracionais que foram se ampliando
nos três anos que se seguiram com o tema da pós-modernidade
continuando a ser o principal assunto da YLN. Passa por uma

18 Leadership Network é uma organização interdenominacional sem fins lucrativos


fundada em 1984 com o objetivo de trabalhar e divulgar as experiências e ideias
inovadoras que líderes estão aplicando na igreja local em seu crescimento, amadure-
cimento e preparo para o futuro. Sediada em Dallas. Site de acesso: www.leadnet.org.

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alteração de sua identificação como uma nova rede chamada
“Terra Nova Theological Project”, base embrionária do que mais
tarde se tornaria o “Emergent Village”.
A história da formação do grupo que se tornaria o porta-
voz da chamada “Emergent Church”, uma forte expressão dentro
do mosaico da “Emerging Church” (EC), é relatada por um de seus
líderes Tony Jones, coordenador nacional do Emergent Village
nos EUA.

Em maio de 2001 nós saímos por nossa conta e sentimos que


necessitávamos de um nome, uma bandeira, de uma forma,
sob as quais poderíamos nos reunir. Em maio daquele ano,
seis de nós começamos a debater sobre diversas opções de
possíveis nomes. Foi então que Brian McLaren, um dedicado
ambientalista disse:
Vocês sabem que quando um especialista em florestas visita uma
para determinar sua saúde, ele não sobe nas árvores mais antigas
e mais altas. Ao contrário, ele se dobra em seus joelhos e escava
em torno do que chamamos de crescimento emergente no chão
da floresta. Na ecologia da igreja americana há muitas organiza-
ções que estão acompanhando o que acontece com as grandes
árvores crescidas, mas nos parece mais interessante ver o que está
acontecendo no chão da floresta, no nível da igreja emergente.
Foi então que adotamos o nome Emergente e compramos o domí-
nio do nome “emergentvillage.org”
Passamos a contatar outros ao redor do globo que estavam obser-
vando as mesmas mudanças de modernidade para pós-modernida-
de que tinha nos intrigado tanto e que, de fato, nos reuniu juntos
em 1997. As conexões seguiram com grupos no Reino Unido,
Austrália e Nova Zelândia. O sucesso do livro de Brian “Um novo
tipo de cristão”, teve um papel importante de chamar a atenção
incrementando ainda mais o Cristianismo Emergente tornando-o
uma marca própria, para o bem ou para o mal.19

19 JONES, Tony. 2007_Wheaton_Theology_Conference_-_Tony_Jones.pdf. www.


emergentvillage.org. Acessado em: 28.06.2008. Relato extraído do texto de uma
palestra que seria proferida no Wheaton College em 2007, que não foi realizada, e que
Jones disponibilizou na internet.

Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 47


À primeira vista pode se inferir a conclusão de que esse
seria o surgimento do núcleo formador da EC, mas trata-se da
formalização de um segmento organizado inserido no movimento
bem maior e não estruturado. Outros relatos da história de mais
alguns líderes em diversos locais e situações mostram como este
movimento de mudanças já vinha acontecendo.
Karen Ward (pastora da Church of the Apostles, Seattle)
inicialmente via os desafios da igreja num escopo geracional.
Em 1999, ela trabalhava na sede central da ELCA – Evangelical
Lutheran Church of America – em Chicago, denominando a si
mesma uma “burocrata” de igreja. Enquanto lia a respeito da
geração pós-boomers num website episcopal, ela enxergou ali a
perfeita descrição de suas frustrações. Durante o ano seguinte,
ela criou um website (www.emergingchurch.org) para auxiliar
seu trabalho de busca de respostas para suas questões sobre a
igreja. Ela não fazia ideia que “emerging church” viria a se tornar a
nominação de um movimento internacional da igreja20.
Entretanto essas manifestações não são restritas, uniformes
ou mesmo alinhadas com o grupo que originou o Emergent
Village, vários líderes vão consolidando posições próprias
nesse ambiente, quer isolados, ou mesmo como um tipo de
intercâmbio de ideias.
Um desses líderes é Mark Driscoll. No início de 1996,
quando estava com vinte cinco anos de idade e seis anos de
uma vida de fé em Cristo, junta-se a um grupo de pessoas
como ele e planta uma igreja em Seattle. O nome escolhido

20 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian


Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005, p. 30.

48 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica


foi Mars Hill (a colina de Marte), referência ao local onde
Paulo pregou para a grande cidade pagã de Atenas que tinha
uma relevância cultural por causa de seus artistas e poetas.
Ele relata que eles tinham um sonho louco de fazer diferença
numa das maiores cidades americanas não alcançadas pela
igreja, onde apenas 8% da população são cristãs evangélicas
e 86 % não frequentam nenhum tipo de culto de qualquer
religião durante a semana21.
Outro importante líder é Rob Bell. Depois de ter sua
formação teológica no Wheaton College e completar seu
mestrado no Fuller Seminary, foi convidado para estudar com
Dr. Ed Dobson e cooperar na Calvary Church em Grand Rapids,
onde por vezes assumia a pregação nos cultos de sábado à noite.
Foi quando Bell tomou a iniciativa de iniciar um novo tipo de
comunidade e que se chamaria Mars Hill, baseada na mesma
experiência de Paulo em Atenas. Em fevereiro de 1999, Bell
fundou a Mars Hill Bible Church, que apesar da semelhança
com o nome da igreja fundada por Driscoll são totalmente
independentes e distintas. Ainda outras lideranças surgem na
mesma época como Chris Seay (Ecclesia Church em Houston) e
Erwin MacManus (Mosaic Church em Los Angeles).
Para avaliar e constatar o efeito diverso do surgimento de
um despertamento não articulado intencional e organizadamente
que vai desembocar no grande movimento da igreja em emergên-
cia, Gibbs junta como documentos à sua pesquisa a transcrição de
cerca de 50 biografias feitas de próprio punho de líderes desse mo-

21 DRISCOLL, Mark. Confessions of a reformission rev.: hard lessons from an


emerging missional church. 1. ed. USA: ZONDERVAN, 2006, p. 9.

Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 49


vimento – pesquisa restrita aos EUA e Reino Unido – que foram
reproduzidas na ordem em que iam sendo cronologicamente rece-
bidas. A partir dos relatos biográficos publicados na pesquisa do
Dr. Eddie Gibbs e Ryan Bolger anexos na obra Emerging Churches:
Creating Christian Community in Postmodern Cultures, foi realizada a
extração de dados cronológicos importantes e identificáveis infor-
mados em seus relatos pessoais que o autor deste artigo compilou
em duas tabulações que ajudam a analisar o perfil do grupo22:

a) Primeira Tabulação: Qual a data de nascimento do


pesquisado?
Para identificar o grupo a tipificação do grupo geracional:

Nascimento quantidade
1950-1955 02
1956-1960 10
1961-1965 07
1966-1970 09
1971-1975 13
1976-1980 02

O resultado conclui que na amostragem de 46 líderes


identificados: 22 são originários da faixa geracional final dos
boomers e 24 dos Xers, com uma média ponderada de data de
nascimento em torno de 1965. O momento crítico que coincide
com a fase de forte transição entre dois grandes grupos geracionais,
os boomers e o Xers.

a) Segunda Tabulação: Qual a data de “despertamento” do


22 Compilação dos dados e elaboração das tabelas realizadas por Rogério Hernandez
de Oliveira.

50 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica


pesquisado para a “emergência”?

Identificação do marco cronológico do momento em que


foi manifestado o seu despertamento para essa busca no tempo
geral e pessoal.

Época do despertamento quantidade


1980-1990 04
1991-1995 11
1996-2000 22
2001-2005 08

O momento do que foi chamado de “despertamento para


emergência” identificada em uma amostragem de 45 biografias,
onde se vê a data/época, resulta em uma idade média de 32 anos
o marco do acontecido e que o momento cronológico médio pon-
derado do acontecido geral foi o ano de 1997, meados da segunda
metade da década de 90 registrando 22 dos 45 casos identificados.
Daí para diante o movimento passa a ganhar corpo e se
manifestar em vários lugares, com pessoas diferentes, em igrejas
diferentes, manifestações diversas, com uma pluralidade cultural
de jeitos, modos e discursos, mas com um cenário de fundo muito
semelhante entre si e acontecendo cronologicamente quase que
na mesma época.

2. DO SURGIMENTO DA IGREJA EM EMERGÊNCIA


(EMERGING CHURCH - EC) AO DESPERTAMENTO
DENTRO DA ECLESIA JÁ ESTABELECIDA

Todo este movimento não passa despercebido para alguns

Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 51


líderes dentro da igreja vigente23. A percepção dos sinais da mudança
do cenário passa a ser objeto de observação de alguns missiólogos
e estudiosos nas áreas de plantação de igrejas e treinamento
de lideranças. Essa preocupação vai ocorrer tanto em algumas
denominações históricas como em organizações independentes
como a Leadership Network.  Essa agência interdenominacional
decide fomentar e dar espaço a oportunidades com os grupos dos
novos pastores líderes. Ela propicia  esse espaço com a formação
de um grupo adicional intitulado Young Leaders em seus encontros
regulares. Paralelamente, no mesmo viés, surgem também
alguns líderes dentro de denominações históricas organizadas
preocupados em observar e discernir sobre o que vem ocorrendo.
São criados fóruns de discussão e de compartilhamento de
experiências em seus programas com avaliações e preocupações dos
efeitos dos impactos das forças pós-modernas no crescimento da
igreja, desenvolvimento de líderes no seu alcance aos “unchurched”,
assim como o desempenho ministerial neste novo cenário.
Esse grupo tem algumas características interessantes.
Em primeiro lugar, o momento em que despontam com
suas inquietações e preocupações coincide com o período do
despertamento do movimento da EC no final dos anos 90, o que
vai se mostrar como um tipo de pré-organização da reação deste
grupo de líderes emergentes.
Em segundo lugar, e na sua grande maioria, são pessoas
com uma experiência de pastoreio em igreja local já consolidada,
alguns com mais de 20 anos de ministério ativo com trânsito
23 O uso do termo “vigente” é adotado para identificar a igreja contemporânea
dominante nesta época alinhada com a geração boomer no seu modo de ser, pensar e
estruturar a igreja local.

52 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica


no meio pastoral e de lideranças quer denominacionais
ou paraeclesiásticas.
Em terceiro lugar, são pessoas integrantes da geração boomer,
mas com preocupações bem visíveis da necessidade de uma
dinâmica que não deixe a igreja estacionada no tempo e no espaço
alienada das mudanças que vêm ocorrendo, principalmente nos
novos grupos geracionais.
Em quarto lugar, esse grupo, ao que transparece, busca a
criação de um espaço de diálogo e debates não com a nova EC e
seus integrantes, mas seu público alvo são os líderes e as igrejas já
estabelecidas no status quo vigente que eles entendem necessitar
uma renovação.
Em quinto, boa parte desses líderes integram grupos de
trabalhos comuns e diálogos cooperativos através de organizações
como a Leadership Network em eventos para lideranças
interdenominacionais. Entre os representantes desse grupo
destacam-se: Ed Stetzer, missiólogo diretor da área de plantar
igrejas na Convenção Batista da Carolina do Sul e diretor da
Life Way Research, Reggie McNeal, diretor de desenvolvimento
de lideranças também na Convenção Batista da Carolina do Sul
tambén na Leadership Network, Alan J. Roxburgh com a Allelon
Missional Leadership, Earl Creps, doutor e diretor do programa
de ministérios no Seminário Teológico das Assembléias de Deus
(AGTS) em Springfield, Neil Cole, fundador e diretor da Church
Multiplication Associates, e outros mais.
À medida que o grupo vai se robustencendo ao longo da
segunda metade da primeira década do século XXI, vem deles
boa parte do surgimento de publicações voltadas para essas

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preocupações e sua aglutinação em torno de uma temática central,
que é a implantação de uma mentalidade “missional”. Não se
alinham direta e explicitamente com vínculos com as versões pós-
modernas dos novos líderes da EC, entretanto buscam manter o
diálogo e cooperação com alguns deles, em especial com aqueles
que adotam uma linguagem evangelical como Mark Driscoll.
O grupo passa a ser identificado como integrantes de
um movimento missional que trabalha por uma transição da
igreja estabelecida para a realidade de um mundo que está se
modificando fortemente. Uma forte referência de construção do
pensamento em todo o movimento é construída a partir de textos
e reflexões do teólogo e missionário inglês Lesslie Newbigin, bispo
de Madras na India.
Além desses líderes ministeriais, alguns estudiosos da
área teológica, acadêmicos de seminários, passam a estudar
o movimento, pesquisá-lo e estabelecer um diálogo com seus
integrantes contribuindo no campo da reflexão teológica
e da compreensão da sua linguagem, sua mensagem e suas
inquietações. Pelo menos duas importantes figuras se destacam
pela forma como dialogam e trabalham com as pessoas, propostas
e inquietações da EC.
Uma é o Dr. Eddie Gibbs24, professor da cadeira de
crescimento da igreja, auxiliado por Ryan K. Bolger, professor
assistente de igreja na cultura contemporânea, ambos do Fuller
Theological Seminary na California, que no período de 2000 a 2005
realizaram uma ampla pesquisa de campo com líderes da EC nos
24 O Dr. Eddie Gibbs possui uma obra editada em português: Para onde vai a Igreja:
mudanças na maneira de conduzir ministérios. ESPERANÇA, 2012. Originalmente
editada em 2000 com o título CHURCHNEXT.

54 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica


EUA e Reino Unido, publicada em 2005, e ainda outras obras
de autoria de Gibbs tratando de balizamentos para lideranças e
eclesiologia para esses novos cenários.
Outro é o Dr. Scot McKnight25, professor de estudos
religiosos na North Park University, em Chicago, especilizado em
estudos a partir da vida de Jesus. Ambos são reconhecidamente
respeitados não só por seus pares, mas principalmente pelos
diversos líderes de tendências e matizes da EC pela sua capacidade
de diálogo com eles.
Apesar de não serem considerados membros integrantes do
movimento da EC são figuras importantes no relacionamento,
diálogo e aprofundamento da compreensão do pensamento e
formulação de pontos importantes que o movimento questiona
e propõe para a igreja.

A fragmentação da Emerging Church em diversas faces

Qualquer tentativa de tipificação simplista da EC


inevitavelmente incorrerá em equívocos, uma vez que ela é por
natureza fragmentada, diversa, não coordenadamente estruturada,
mas um grande movimento que “emerge” num caldo de muitas
e diversas forças que influenciam e suscitam formas de expressão
e pensamento das mais diversas, mesmo com um relativo corpo
de características em comum. É um retrato da fragmentação e
multiplicação das faces de uma humanidade que vem passando
por uma transição de mudanças paradigmáticas que ainda estão
em efervescência e não se acomodaram, o que traz uma série de

25 O Dr. Scot McKnight possui uma obra editada em português: O Credo de Jesus.
ESPERANÇA, 209. Originalmente editada em 2004 com o título The Jesus Creed.

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dificuldades de análise e interpretação, principalmente por ser
um processo em pleno andamento.
Na análise histórica da evolução do movimento da EC,
uma das marcas que chama a atenção ainda é outra faceta que
pode ser identificada exatamente pela sua ausência, e não pela
sua ascensão, que são as expressões pentecostais e neopentecostais
no novo cenário. Quais são? Como se manifestam? Existem?
Curiosamente todos os trabalhos de pesquisa trazem um forte
silêncio sobre essa faceta. Essa outra via existe?
Se as mudanças não são basicamente nucleares no que diz
respeito à essência da fé cristã, mas no sentido das mudanças
do ambiente moderno para o pós-moderno e do homem
contemporâneo, como ficam as expressões eclesiais pentecostais
e neopentecostais neste novo ambiente e na vida deste homem
em transição?
Na realidade, a única observação sobre o assunto constou
de apontamento identificado na pesquisa de GIBBS, quando
questiona: há grupos ou pessoas de origem pentecostal na EC?

No Reino Unido, virtualmente todos os líderes da “emerging


church” têm raízes no movimento carismático (alguns na
Terceira Onda*26, outros não) nos anos 80 e início dos anos 90.
Nos EUA isto não é tão evidente, embora dois dos líderes mais
influentes nas redes de trabalho emerging church, Todd Hunter
e Brian McLaren, tenham fortes raízes carismáticas da Terceira
Onda. A grande maioria, todavia, nem no Reino Unido,
nem nos EUA, estes líderes trouxeram estilos carismáticos de

26 TERCEIRA ONDA – Este foi um termo cunhado por Peter Wagner com o
movimento associado com John Wimber e a Vineyard que se tornou conhecido como
Terceira Onda do qual participavam leigos e clérigos anglicanos. Esta nominação por
Wagner foi colocada para descrever a ênfase do Espírito Santo que difere tanto do
pentecostalismo clássico como do movimento carismático.

56 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica


adoração para igrejas em emergência.27

Não existem ou ainda não emergiram? Se ainda estão


por se manifestar de forma e peso mais evidente no cenário
eclesiástico, essa é uma forte possibibilidade que não pode ser
afastada. À medida que as atuais gerações que ocupam a liderança
envelhecem e são sucedidas por novos grupos que surgem neste
novo meio ambiente, a vertente pentecostal vai construir sua
própria face nesse mosaico. Um forte indicador de uma possível
tendência pode ser observada no fenômeno ímpar com a Hillsong,
uma igreja pentecostal australiana em Sydney, integrante das
Assembléias de Deus, liderada pelo pr. Brian Houston28. Uma
igreja que se tornou conhecida pelo seu vigoroso ministério de
louvor com a liderança de Darlene Zschech, Reuben Morgan, Joel
Houston, Marty Sampson entre outros com o destaque para o
ministério jovem chamado UNITED, que já fez diversas turnês
com suas bandas ao redor do mundo. No entanto, é na pesquisa
dos seus registros discográficos e publicações29 que se encontram
alguns dados interessantes que fogem da percepção superficial das
músicas e vídeos tais como:

27 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian


Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005. p.219-220.
28 Brian Houston, pastor fundador da Hillsong, também já foi presidente das
Assembléias de Deus na Austrália e presidiu a Associação Nacional das Igrejas
Cristãs em seu país, notadamente voltado para uma predominante linha de pregação
na vertente da confissão positiva
29 Essas observações foram extraídas do estudo do conjunto das informações
que constam em toda a discografia e videografia publicada no período de 1996 a
2008, incluindo outras mais colhidas no site da igreja www.hillsong.com, e nos
livros editados pela própria Hillsong: HOUSTON, Bobbie. Heaven is in this house.
MAXIMISED LEADERSHIP. 2001; HOUSTON, Brian, et al The church that I see.
HILLSONG. 2003; A´BELL, Julia. Youth Ministry for a new millennium generation.
EMPOWER TEAM. 2005.

Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 57


- é uma igreja que tem um foco intencionalmente
direcionado para as gerações mais jovens;
- o envolvimento ativo de adultos, jovens, adolescentes é
voltado diretamente para os grupos etários imediatamente abaixo
dos seus, isso pode ser verificado nas lideranças dos trabalhos
com os jovens (UNITED) e nas crianças (Hillsong Kids);
- a forte transição geracional de lideranças ministeriais
ocorrida em meados de 2000 a 2001 resultou na mudança da
linguagem visual e boa parte do conteúdo de seus trabalhos,
sem, no entanto, alterar o corpo do governo da igreja (os
anciãos/presbíteros);
- a intencional abertura de espaço e sucessiva renovação
para jovens revelações que transitam e sucedem lideranças mais
antigas, principalmente onde há maior visibilidade passando para
apoio e supervisão;
- a ocupação da linha de frente ministerial na execução dos
projetos externos da igreja pelos grupos das gerações mais jovens;
- a criação de espaços que viabilizam a criatividade nas mais
diversas formas de artes aplicadas para expressões, inclusive com o
College com cursos específicos na área de TV e mídia visual, além
das produções de grandes eventos, gravações de CDs e vídeos.
Essa pode ser uma sinalização da construção de caminhos e
formas que possam emergir no viés pentecostal contemporâneo
ocupando um espaço significativo e, por isso mesmo, precisa
ser observada mais atentamente além da simples audição de
suas músicas.
Tentar analisar a EC é muito mais complexo do que se
estudar os movimentos e eventos da história passada da igreja

58 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica


nos séculos e eras já transformadas em memórias na clássica
ortodoxia da construção do conhecimento. Estudos assim como
este não são como o do pesquisador da anatomia do corpo
humano, que desenvolve seus estudos em corpos de cadáveres,
inertes conservados no formol. Ao contrário, analisar e estudar
a EC não pode ser tratado dessa forma. É como buscar entender
o funcionamento de um corpo vivo, que reage, sente dor,
tem reflexos e há o risco de comprometimento da sua própria
integridade, pois é, em última instância, como dissecar e cortar
com o bisturi a si mesmo e ainda sair vivo e melhor capacitado
para viver a vida.
Um quadro muito simples de todos estes elementos que
compõem esse cenário é que a partir de meados da segunda
metade da década de 90, o que eram algumas expressões isoladas
se tornam fortes influências e, de certa maneira, trazem também
consigo algumas heranças de seu passado imediato com fortes
marcas de diversidade plural, não só entre cada grande grupo, mas
mesmo dentro de cada vertente. Não há uniformidade e, mesmo
dentro de tendências comuns, há fortes conflitos de opinião,
de formas de expressão, de construção de soluções. Some-se a
tudo isso o atual quadro fragmentado da igreja contemporânea
que continua em plena ação com o qual se sobrepõe este novo
conjunto de forças.
O resumo do quadro histórico da evolução do cenário
eclesiástico é mais complexo e diverso do que se imagina, pois, não
se trata de uma simples sucessão de formas ou pensamento, mas
de uma sobreposição de expressões que ainda vive a turbulência
de forte transição paradigmática que ainda não se acomodou e

Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 59


está em transformação.
Seriam os líderes e as comunidades alinhados com o
pensamento e as propostas do grupo organizado do Emergent
Village uma nova versão pós-moderna da igreja liberal,
principalmente nos EUA? Algumas opiniões de importantes
figuras como Scot McKnight assim diagnostica e aponta que
uma das fontes que alimentam o pensamento daqueles assim
identificados tem a forte influência da agenda política de
temas e propostas da plataforma política do partido democrata
norte-americano30.
Outros líderes independentes que mesmo com algumas
diferenças de opinião alinham-se com uma postura bíblica
evangelical como Driscoll, que sustenta a afirmação de ser:
primeiro cristão, em segundo evangelical e em terceiro missional31.
Seriam eles uma nova edição paralela da ala evangelical dos
seeker services das megaigrejas modernas, dos grandes líderes
dos últimos 20 anos? Como podem ser chamados os pastores e
líderes influentes em denominações ou agências paraeclesiásticas
que buscam novos caminhos para adequar a igreja atual para os
novos cenários? E ainda, como serão as respostas pentecostais e
neopentecostais para adiante?

3. O QUE PODE ACONTECER DAQUI PARA DIANTE?

Haverá possibilidade de diálogo e cooperação conjunta


30 McKNIGHT, Scot. FIVE STREAMS OF THE EMERGING CHURCH - Key
elements of the most controversial and misunderstood movement in the church today.
CHRISTIANITY TODAY. www.christianitytoday.com. Postado em: 19/01/2007.
Acessado em: 06.05.2008.
31 Declaração de pontos centrais de crença do “The Resurgence” dirigido por Mark
Driscoll. www.theresurgence.com. Acessado em: 10.07.2008.

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debaixo do mesmo teto entre líderes que emergem e a sua geração
precedente? Até mesmo para essa pergunta as respostas podem
ser mais um elemento de incertezas e de possibilidades. Gibbs
questionou alguns líderes sobre essa questão e foi interessante a
sua conclusão ao observar que entre líderes baseados no Reino
Unido e outros nos EUA para a seguinte questão: “É possível
que congregações modernas e pós-modernas coexistam dentro de uma
igreja local”?32
A resposta obtida com líderes no Reino Unido foi de que
ainda não ocorreu, entretanto, creem que existe a possibilidade
para um espaço comum em que líderes evangelicais e pós-
evangelicais trabalhem lado a lado. Justificam essa avaliação
considerando que no Reino Unido há uma cultura de abertura
para novas coisas a serem experimentadas em comum e que o
caminho para essa experiência já foi pavimentado anteriormente
no diálogo e interação entre a Igreja da Inglaterra e as igrejas
carismáticas ocorridas desde a década de 80, o que lhes daria
uma flexibilidade suficiente para implementar nessas recém-
formadas comunidades.
Já na consulta norte-americana encontra-se um histórico
precedente bem conflituoso. A convicção primária é de que tanto
evangelicais como pós-evangelicais não conseguirão compartilhar
a liderança, muito menos desenvolverem ações comuns, seus
históricos vêm da formação de novas comunidades totalmente
desvinculadas das estruturas das igrejas existentes. Alguns outros
líderes norte-americanos até esperam que isso possa acontecer um

32 GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating Christian


Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER, 2005. p. 39-40.

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dia, entretanto duvidam de que venham a ver isso acontecer.
Por outro lado, a experiência de transições e convívios
comuns entre grupos de culturas e gerações distintas é a marca que
se observa na experiência de aplicada pela liderança da Hillsong
na Austrália, que ainda segue num processo de evolução a ser
observado nos anos adiante e seus impactos além-muros, dada à
sua grande influência nas gerações mais novas.
Gibbs crê que essas variações têm a ver com diferenças
culturais do próprio povo como das diferenças históricas na
formação tanto da igreja britânica onde há uma marca de busca
ou de intenção de uma possível e tolerante convivência, como
a igreja americana no seu perfil de confronto de tendências
com conflitos e quedas de braços em disputas de espaços. E
ainda acrescentamos o exemplo australiano onde a integração
foi intencional e amigavelmente implementada sob a direção
da liderança institucional, comandada por membros de uma
geração mais antiga convivendo com os novos líderes das gerações
emergentes. Se há um fator que concorre para essas incertezas,
ações e reações dos seus agentes é o confronto das diferenças, entre
novas e antigas aspirações, visões e práticas que se confrontam com
pessoas novas e antigas que debatem entre si, com suas culturas e
formas de desenvolver seu crer e expressar sua fé, mesmo que seja
em torno do mesmo Deus.
Esse confronto não é novidade na história humana. Cada
vez que os paradigmas estabelecidos passam pela turbulência de
mudanças, isso acontece seguindo a dinâmica do seu cenário
específico e a conjugação de forças e discussões envolvidas. A
história da formação do movimento da Emerging Church parece

62 Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 | Via Teológica


trazer o mesmo desafio hoje, e as saídas perseguidas nesse
momento histórico, principalmente nos EUA, parece repetirem
os mesmos discursos condicionais: desde que se “integrem”,
desde que se “comportem”, desde que se “limitem a fazer o que
quiserem”, mas dentro do “espaço deles” ou que busquem se
estabelecer por conta própria, em outro lugar. Essa história não é
simples nem é um desenrolar de aceitações, compreensões cheias
de serenidade e compreensão. A experiência humana passada
sugere que é permeada de conflitos, dificuldades, separações. A
desacomodação é parte da nossa contemporaneidade marcada
pela diversidade plural e a fragmentação de estruturas e formas
conhecidas, consideradas estáveis e seguras.
A história dessa primeira expressão visível mais ampla do
movimento traz um importante ingrediente a ser considerado, que
é a maneira como a liderança sustentadora do status quo vigente da
igreja lidou com o surgimento de novas aspirações de alguns líderes
e mais precisamente entre jovens com aspirações diferenciadas
daquelas já estabelecidas. A dificuldade de estabelecer um diálogo
que leve em conta a possibilidade de ajustes conjuntos observa-se
uma reação que beira a intransigência e intolerância para com
qualquer manifestação que possa manifestar um tipo de risco aos
modelos vigentes e, por consequência, um descaso de avaliação
humilde prevalecendo certa arrogância. A reação de fechamento
de espaços gera uma contrarreação em insurgências locais e o
surgimento de comunidades alternativas extraespaço institucional.
Em nome da preservação ou busca da verdade, destroem-se as
possibilidades de crescimento de corpo com diversidade.
O conjunto das histórias pessoais dos recentes líderes que

Via Teológica | Rogério Hernandez de Oliveira, Vol. 14, n.27, jun.2013, p. 31 - 66 63


foram pesquisados e encontrados nos registros das informações já
coletadas na pesquisa traz um detalhe extremamente importante
a ser considerado, que é o fato de que esses fragmentos dos relatos
não são reduzidos a poucos e menores eventos pontuais, mas são
remetidas a diversos locais, com diversas pessoas, em uma época
de tempo quase que comum e sem uma articulação conjugada ou
orquestrada por um ou mais polos. Elas se conjugam quase que
aleatoriamente como elementos de mudanças que vão acontecendo
diante de um cenário bem complexo ao fundo. Um cenário que é
mutante, inconstante, influenciado pela ascensão do pensamento
pós-moderno, às transformações sócioculturais e religiosas globais
e locais, e potencializado pelos impactos das tranformações das
mídias de comunicação com seus mecanismos de construção,
decodificação e interpretação da verdade conjugado com as
sucessões geracionais. Suas características são de um ambiente
complexo e quase caótico para quem está acostumado com os
modelos de igreja vigentes na maioria das comunidades locais do
final do século XX, ainda imersos na cultura da modernidade.
E o homem, como foco de atenção da ação da eclesia,
está passando por uma transformação onde as manipulações e
controles da modernidade estão mudando, o que significa que as
práticas e métodos de lidar com ele se realinham a partir de outras
formas de relação. Essa é uma antevisão que Drucker já sinalizou
sobre a relação das instituições com o homem baseadas numa
prática de “suborno”, de explorar a “ganância” das pessoas, no
seu prazer e ambição pessoal que tem sido a prática destes tempos
modernos mais recentes, terá que ser modificada satisfazendo seus
valores e atribuindo-lhes reconhecimento e poder social, através da

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sua transformação de subordinados em colegas e de funcionários,
bem remunerados, em parceiros33. Essa mesma tendência que
Drucker aponta para o campo das organizações do trabalho,
particularmente com os trabalhadores do conhecimento, já é uma
realidade nas organizações do terceiro setor e, particularmente, a
nova fronteira para a igreja e suas organizações conexas aprender
a lidar com seus membros. A história da EC, com seus acertos e
desvios, é o atestado de uma realidade que já chegou.
A visão que se descortina é do aumento de fortes
transformações e mutações eclesiais que surgem sem desaparecer
o passado. Há sobreposições, interações, divergências, novos
aprendizados e também erros e acertos. Esse é também um retrato
do homem contemporâneo, que com outros se ajunta e se agrupa
como igreja local, se alegra, entristece, trabalha junto com outros,
discorda, conflitua e até se dividem, em nome de Deus, de uma
visão particular e pessoal. Ao que parece, a recente história da
igreja, de emergentes ou não, também traz consigo estas mesmas
marcas que seguem redesenhando a eclesiologia contemporânea.

REFERÊNCIAS
BOSCH, David J. Missão Transformadora. 3. ed. São Leopoldo.
RS: EST, Sinodal, 2002.
DRISCOLL, Mark. Confessions of a reformission rev.: hard
lessons from an emerging missional church. 1. ed. USA:
ZONDERVAN. 2006.
DRUCKER, Peter F. Sociedade pós-capitalista. 1. ed. São Paulo:
PUBLIFOLHA, 1999.

33 DRUCKER, Peter F. O melhor de Peter Drucker: o homem. São Paulo: NOBEL,


2001, p. 190.

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________ O melhor de Peter Drucker: a sociedade. São Paulo:
NOBEL, 2001.
________ O melhor de Peter Drucker: o homem. São Paulo:
NOBEL, 2001.
GIBBS, Eddie, BOLGER, Ryan K. Emerging Churches: Creating
Christian Community in Postmodern Cultures. USA: BAKER,
2005.
JONES, Tony. 2007_Wheaton_Theology_Conference_-_Tony_
Jones.pdf. Disponível em: <www.emergentvillage.org>. Acesso
em, 28.06.2008.
MARTELLI, Stefano. A religião na sociedade pós-moderna. 1.
ed. São Paulo: PAULINAS, 1995.
McKNIGHT, Scot. FIVE STREAMS OF THE EMERGING
CHURCH - Key elements of the most controversial and
misunderstood movement in the church today. Disponível em:
<http://www.christianitytoday.com/ct/2007/february/11.35.
htmlwww.christianitytoday.com>. Acesso em 06.05.2008.
MCNEAL, Reggie. The Present Future – six tough questions for
the church. 1. ed. USA: JOSSEY-BASS, 2003.
WEBBER, Robert. Listening to the beliefs of emerging churches.
1. ed. USA: ZONDERVAN, 2007.

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