Willard van Orman Quine (1908-2000) foi o filósofo americano mais
influente da segunda metade do século XX. Quine nasceu em Akron, Ohio, de ascendência holandesa e manesa. Após frequentar o Oberlin College, estudou como aluno pós-graduado em Harvard, obtendo o seu grau de doutor em 1932 com uma tese em que desenvolve e refina o sistema de lógica dos Principia Mathematica de Russell e Whitehead. Uma bolsa e um ano no estrangeiro pôs Quine em contacto com o Círculo de Viena, com Carnap, em Praga, e com Tarski, em Varsóvia. Após o seu regresso a Harvard, Quine tornou-se assistente em 1936 e professor associado em 1941. Depois da guerra, durante a qual trabalhou nos serviços secretos da marinha, Quine tornou-se professor catedrático de Harvard em 1948, marcando o resto da sua carreira com muitas viagens e lições proferidas no estrangeiro.
A atenção de Quine começou por incidir sobre a lógica matemática,
donde resultaram as obras A System of Logistic (1943), Mathematical Logic (1940) e Methods of Logic (1950). Foi com a publicação do conjunto de ensaios que formam o livro From a Logical Point of View (1953) que a sua importância filosófica se tornou largamente reconhecida. O seu célebre ataque à distinção analítico/sintético anunciou uma mudança profunda nas maneiras de encarar a linguagem provenientes do positivismo lógico e uma reapreciação das dificuldades em fornecer uma base empírica sólida para as teses sobre a convenção, o significado e a sinonímia. O estudo destes problemas foi dominado pela obra de Quine. A sua reputação consolidou-se com Word and Object (1960), no qual a indeterminação da tradução radical assume pela primeira vez o papel principal. Neste e em muitos outros ensaios e livros posteriores, Quine adopta uma perspectiva impiedosa sobre a natureza da linguagem com a qual atribuímos pensamentos e crenças a nós mesmos e aos outros. Estes «idiomas intensionais» resistem a ser facilmente incorporados na concepção científica do mundo e Quine reage com cepticismo em relação a eles; é verdade que Quine não sanciona o eliminativismo, mas toma os idiomas intensionais como idiomas de segunda categoria, inapropriados para descrever factos estritos e literais. Por razões semelhantes, Quine exprimiu sistematicamente suspeitas quanto à justeza lógica e filosófica de apelar às possibilidades lógicas e aos mundos possíveis. Só as linguagens da matemática e da ciência são bem comportadas e apropriadas para a descrição literal e verdadeira do mundo. As entidades às quais as nossas teorias se referem têm de ser seriamente encaradas nas nossas ontologias: apesar de empirista, Quine supõe assim que os objectos abstractos da teoria dos conjuntos são exigidos pela ciência e que portanto existem. Na teoria do conhecimento, Quine está associado à perspectiva holista da verificação, concebendo um corpo de conhecimento em termos de uma teia que na periferia está em contacto com a experiência, mas em que cada ponto está conectado a outros pontos por uma rede de relações. Quine é também conhecido pela perspectiva segundo a qual a epistemologia devia ser naturalizada, ou conduzida segundo um espírito científico, sendo o objecto da investigação a relação existente nos seres humanos entre os dados de entrada (inputs) da experiência e os dados de saída (outputs) da crença. Apesar de as abordagens de Quine dos grandes problemas da filosofia terem sido atacadas por denunciarem um cientismo ilegítimo e por vezes um behaviourismo, a clareza da sua visão e o âmbito da sua obra fez dele o maior centro de interesse da lógica, semântica e epistemologia anglo-americana dos últimos quarenta anos. Para além das obras já citadas, a sua bibliografia inclui The Ways of Paradox and Other Essays (1966), Ontological Relativity and Other Essays (1969), Philosophy of Logic (1970), The Roots of Reference (1974) e The Time of My Life: An Autobiography (1985).
Simon Blackburn Texto retirado de Dicionário de Filosofia, de Simon Blackburn (Gradiva, 1997).