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Supremo Tribunal Federal

HABEAS CORPUS 137.211 MATO GROSSO

RELATOR : MIN. LUIZ FUX


PACTE.(S) : GIOVANI BELATTO GUIZARDI
IMPTE.(S) : RODRIGO DE BITTENCOURT MUDROVITSCH E
OUTRO(A/S)
COATOR(A/S)(ES) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

HABEAS CORPUS. PENAL E


PROCESSUAL PENAL. CRIMES DE
PARTICIPAÇÃO EM ORGANIZAÇÃO
CRIMINOSA, DE CORRUPÇÃO
PASSIVA E DE FRAUDE EM
LICITAÇÕES. ARTIGO 2º, CAPUT, DA
LEI 12.850/13, ARTIGO 317 DO CÓDIGO
PENAL E ARTIGO 90 DA LEI 8.666/93.
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE
RECURSO ORDINÁRIO.
INADMISSIBILIDADE. COMPETÊNCIA
DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
PARA JULGAR HABEAS CORPUS: CF,
ART. 102, I, D E I. ROL TAXATIVO.
INEXISTÊNCIA DE TERATOLOGIA,
ABUSO DE PODER OU FLAGRANTE
ILEGALIDADE. DECRETAÇÃO DA
CUSTÓDIA PREVENTIVA
DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA.
DEREVOLVIMENTO DO CONJUNTO
FÁTICO-PROBATÓRIO.
INADMISSIBILIDADE NA VIA ELEITA.
- Seguimento negado, com esteio no artigo
21, § 1º do RISTF. Prejudicado o exame do
pedido de liminar.
- Ciência ao Ministério Público Federal.

DECISÃO: Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar,

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HC 137211 / MT

impetrado contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça que denegou o


HC nº 362.483, in verbis:

“PROCESSUAL PENAL E PENAL. HABEAS CORPUS .


PRISÃO PREVENTIVA. PARTICIPAÇÃO EM ORGANIZAÇÃO
CRIMINOSA. CORRUPÇÃO PASSIVA. FRAUDE EM
LICITAÇÕES. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. NULIDADE
PROCESSUAL. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO TRIBUNAL
ESTADUAL. AUTORIDADE COM FORO PRIVILEGIADO.
INEXISTÊNCIA. NEGATIVA DE AUTORIA. ANÁLISE
INCOMPATÍVEL COM A VIA ELEITA. ILEGALIDADE.
AUSÊNCIA. HABEAS CORPUS DENEGADO.
1. Apresentada fundamentação concreta para a decretação da
prisão preventiva, evidenciada na periculosidade do acusado,
consistente na sua participação em complexa organização criminosa,
constituída com a finalidade de lesar o erário do Estado de Mato
Grosso, por meio de fraudes em procedimentos licitatórios, cobrança
de propinas para liberação de valores devidos à empresas prestadoras
de serviços públicos, não há que se falar em ilegalidade a justificar a
concessão da ordem de habeas corpus, ainda mais quando o Juiz
destaca a necessidade da constrição cautelar para fazer cessar a
atuação da organização criminosa, quando o paciente ocupa posição de
liderança e articulação na referida organização criminosa
2. Não se identifica manifesta usurpação de competência, em
razão de ter sido mencionado, como suposto beneficiário do ilícito,
autoridade com prerrogativa de foro, pois o próprio magistrado
assevera que não há indícios suficientes quanto a participação do
Secretário de Estado detentor da prerrogativa.
3. Matéria relativa à ausência de lastro probatório da
participação do paciente na organização criminosa, não é passível de
análise em sede de habeas corpus, por demandar mais aprofundada
análise do caso, sendo necessária dilação probatória incompatível com
a via eleita.
4. Habeas corpus denegado.”

Colhe-se dos autos a informação de que o paciente teve a prisão

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preventiva decretada em razão do suposto cometimento dos crimes


tipificados no artigo 2º, caput, c/c seu § 4º, II, ambos da Lei nº 12.850/2013,
artigo 317, caput, do Código Penal e artigo 90, da Lei nº 8.666/93.
O impetrante alega, em síntese, i) a ilicitude na produção probatória
decorrente da incompetência absoluta do juízo de primeiro grau; ii) a
existência de constrangimento ilegal consubstanciado na suposta
ausência de elementos concretos aptos a autorizarem a sua segregação
cautelar e na violação aos preceitos estabelecidos no artigo 312 do Código
de Processo Penal.
Requer, em sede liminar, ordem para “seja suspenso o decreto de prisão
preventiva, com a expedição de alvará de soltura, até o julgamento ulterior do
presente writ.”. No mérito, pleiteia “seja reconhecida a incompetência absoluta
do I. Juízo de Direito da 7ª Vara Criminal de Cuiabá/MT para decidir acerca da
manutenção dos autos em 1ª instância, anulando-se todos os atos decisórios
proferidos desde a aludida reunião, inclusive o r. decreto prisional” e “a
revogação da prisão preventiva em desfavor do Paciente em virtude da ausência
dos requisitos previstos no artigo 312 do CPP ou a sua substituição por outras
medidas cautelares”.

É o relatório, DECIDO.

A competência originária do Supremo Tribunal Federal para


conhecer e julgar habeas corpus está definida, taxativamente, no artigo 102,
inciso I, alíneas d e i, da Constituição Federal, verbis:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal,


precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I – processar e julgar, originariamente:

d) o habeas corpus, sendo paciente qualquer das pessoas
referidas nas alíneas anteriores; o mandado de segurança e o habeas
data contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara e
do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-
Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal;

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HC 137211 / MT


i) o habeas corpus, quando o coator for Tribunal Superior ou
quando o coator ou o paciente for autoridade ou funcionário cujos atos
estejam sujeitos diretamente à jurisdição do Supremo Tribunal
Federal, ou se trate de crime sujeito à mesma jurisdição em uma única
instância.

In casu, o paciente não está arrolado em nenhuma das hipóteses


sujeitas à jurisdição originária desta Corte.
A ementa do acórdão proferido na Pet 1738-AgRg, Rel. o Min. Celso
de Mello, Pleno, DJe 1º/10/199, é elucidativa e precisa quanto à
taxatividade da competência do Supremo Tribunal Federal:

“PROTESTO JUDICIAL FORMULADO CONTRA


DEPUTADO FEDERAL - MEDIDA DESTITUÍDA DE
CARÁTER PENAL (CPC, ART. 867) - AUSÊNCIA DE
COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.
A PRERROGATIVA DE FORO - UNICAMENTE
INVOCÁVEL NOS PROCEDIMENTOS DE CARÁTER PENAL
- NÃO SE ESTENDE ÀS CAUSAS DE NATUREZA CIVIL.
- As medidas cautelares a que se refere o art. 867 do Código de
Processo Civil (protesto, notificação ou interpelação), quando
promovidas contra membros do Congresso Nacional, não se incluem
na esfera de competência originária do Supremo Tribunal Federal,
precisamente porque destituídas de caráter penal. Precedentes.
A COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL -
CUJOS FUNDAMENTOS REPOUSAM NA CONSTITUIÇÃO
DA REPÚBLICA - SUBMETE-SE A REGIME DE DIREITO
ESTRITO.
- A competência originária do Supremo Tribunal Federal, por
qualificar-se como um complexo de atribuições jurisdicionais de
extração essencialmente constitucional - e ante o regime de direito
estrito a que se acha submetida - não comporta a possibilidade de
ser estendida a situações que extravasem os limites fixados, em
numerus clausus, pelo rol exaustivo inscrito no art. 102, I, da

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Constituição da República. Precedentes.


O regime de direito estrito, a que se submete a definição
dessa competência institucional, tem levado o Supremo Tribunal
Federal, por efeito da taxatividade do rol constante da Carta
Política, a afastar, do âmbito de suas atribuições jurisdicionais
originárias, o processo e o julgamento de causas de natureza civil
que não se acham inscritas no texto constitucional (ações
populares, ações civis públicas, ações cautelares, ações
ordinárias, ações declaratórias e medidas cautelares), mesmo
que instauradas contra o Presidente da República ou contra qualquer
das autoridades, que, em matéria penal (CF, art. 102, I, b e c),
dispõem de prerrogativa de foro perante a Corte Suprema ou que, em
sede de mandado de segurança, estão sujeitas à jurisdição imediata
do Tribunal (CF, art. 102, I, d). Precedentes.”

Afigura-se paradoxal, em tema de direito estrito, conferir


interpretação extensiva para abranger no rol de competências do
Supremo Tribunal hipóteses não sujeitas à sua jurisdição.
A prevalência do entendimento de que o Supremo Tribunal Federal
deve conhecer de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário
constitucional contrasta com os meios de contenção de feitos, remota e
recentemente implementados - Súmula Vinculante e Repercussão Geral -
com o objetivo de viabilizar o exercício pleno, pelo Supremo Tribunal
Federal, da nobre função de guardião da Constituição da República.
E nem se argumente com o que se convencionou tratar-se de
jurisprudência defensiva. Não é disso que se cuida, mas de necessária,
imperiosa e urgente reviravolta de entendimento em prol da
organicidade do direito, especificamente no que tange às competências
originária e recursal do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar
habeas corpus e o respectivo recurso ordinário, valendo acrescer que essa
ação nobre não pode e nem deve ser banalizada a pretexto, em muitos
casos, de pseudonulidades processuais com reflexos no direito de ir e vir.
A propósito da organicidade e dinâmica do direito, impondo-se a
correção de rumos, bem discorreu o Ministro Marco Aurélio no voto
proferido no HC n. 109.956, que capitaneou a mudança de entendimento

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na Primeira Turma, verbis:

“O Direito é orgânico e dinâmico e contém princípios,


expressões e vocábulos com sentido próprio. A definição do alcance da
Carta da República há de fazer-se de forma integrativa, mas também
considerada a regra de hermenêutica e aplicação do Direito que é
sistemática. O habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, além
de não estar abrangido pela garantia constante do inciso LXVIII do
artigo 5º do Diploma Maior, não existindo qualquer previsão legal,
enfraquece este último documento, tornando-o desnecessário no que,
nos artigos 102, inciso II, alínea ‘a’, e 105, inciso II, alínea ‘a’, tem-se
a previsão de recurso ordinário constitucional a ser manuseado, em
tempo, para o Supremo, contra decisão proferida por tribunal superior
indeferindo ordem, e para o Superior Tribunal de Justiça, contra ato de
tribunal regional federal e de tribunal de justiça. O Direito é avesso a
sobreposições e impetrar-se novo habeas, embora para julgamento por
tribunal diverso, impugnando pronunciamento em idêntica medida
implica inviabilizar, em detrimento de outras situações em que
requerida, a jurisdição.
Cumpre implementar – visando restabelecer a eficácia dessa ação
maior, a valia da Carta Federal no que prevê não o habeas
substitutivo, mas o recurso ordinário – a correção de rumos. Consigno
que, no tocante a habeas já formalizado sob a óptica da substituição do
recurso constitucional, não ocorrerá prejuízo para o paciente, ante a
possibilidade de vir-se a conceder, se for o caso, a ordem de ofício.”

No que concerne à suposta violação da competência do Tribunal a


quo e aos requisitos autorizadores para a custódia cautelar do paciente,
vale a transcrição do que decidido por aquela corte:

“HABEAS CORPUS - CRIMES DE ORGANIZAÇÃO


CRIMINOSA, CORRUPÇÃO PASSIVA, FRAUDE À
PROCEDIMENTO LICITATÓRIO (ART. 2 o , §4°, II, LEI
Nº12.850/2013; ART. 317, CP; ART. 90, LEI N 8.666/93) - 1.
PRELIMINAR DE NULIDADE DO DECRETO PRISIONAL -
INCOMPETÊNCIA DA AUTORIDADE COATORA -

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HC 137211 / MT

IMPROCEDÊNCIA - PESSOA COM FORO POR


PRERROGATIVA NÃO INDICIADA - 2. INIDONEIDADE DOS
FUNDAMENTOS DA CUSTÓDIA CAUTELAR - FALTA DE
PRESSOPOSTOS AUTORIZADORES DA PRISÃO
PREVENTIVA - IMPOSSIBILIDADE - DECISÃO
FUNDAMENTADA, COM ELEMENTOS CONCRETOS, SOBRE
A NECESSIDADE DA CUSTÓDIA - EVIDENTE RISCO DE
ABALO À ORDEM PÚBLICA - NECESSIDADE DA PRISÃO
CAUTELAR POR CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO
CRIMINAL - 3. SUBSTITUIÇÃO POR MEDIDAS CAUTELARES
DIVERSAS DA PRISÃO - INVIABILIDADE - INSUFICIÊNCIA -
COAÇÃO ILEGAL INEXISTENTE - ORDEM DENEGADA EM
CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL. 1. Não há
que se falar em incompetência do Juiz de primeiro grau, sob a
alegação, de que um dos envolvidos nos delitos possui foro por
prerrogativa de função, se tal pessoa sequer foi indiciada nos autos.
Além disso, mesmo, que um dos acusados possuísse tal prerrogativa, a
regra é o desmembramento do feito nestes casos. Precedentes do STJ e
STF. Não fosse suficiente, "(...) A competência por prerrogativa de
foro deixa de existir quando cessado o exercício da função pública.
Precedentes do STF e do STJ " (AgRg no AgRg no Inq 971/DF, Rei.
Ministro HUMBERTO MARTINS, CORTE ESPECIAL, julgado em
05/11/2014, DJe 21/11/2014). 2. Não pode ser considerada com
fundamentação inidônea, decisão em que se expôs a materialidade do
crime e os indícios suficientes de autoria, além, da necessidade da
custódia preventiva, para garantia da ordem pública, com base em
elementos concretos extraídos dos autos. Além disso, se evidenciado
nos autos que o paciente agia de maneira ardilosa visando evitar
vestígios do seu crime, utilizando-se de misturador de voz e trocando
por quatro ou cinco vezes, seu número de telefone, presente a
necessidade da custódia cautelar por conveniência da instrução
criminal. Ademais, se o paciente responde por outros processos
criminais, também por esta razão, existe risco de reiteração delituosa,
em evidente abalo à ordem pública. 3. Mantém-se a segregação
provisória quando nenhuma outra medida cautelar se mostra capaz de
tutelar com eficácia o meio social.”

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Com efeito, o juízo natural, ao decretar a conversão da prisão em


flagrante em preventiva, assentou, litteris:

“[...]
As licitações foram previamente distribuídas às pessoas
presentes na reunião, de modo que todos os certames ocorreram apenas
formalmente, eis que desde a reunião cada empresário já sabia qual iria
vencer. O trecho da reunião que foi transcrito no Relatório de
informações 183/2015 (fls. 17/27) bem ilustra como isso ocorreu: [...]
Apenas ressalvo, quanto às alusões feitas ao Secretário da pasta, que
entendo que, até este momento, não há suficientes indícios de que o
mesmo esteja realmente envolvido nos fatos criminosos noticiados.
A mera referência à pessoa do Secretário, ainda que por mais de
uma vez, não ice faz supor que esteja ele ciente ou mesmo envolvido
com o ocorrido, motivo pelo qual entendo que este juízo é o competente
paia processar e julgar o presente caso, reservando-me a adotar
entendimento contrário, caso surjam indícios que apontem para o
detentor da prerrogativa de foro. […]
Trata-se de organização criminosa estabelecida nos meandros da
Administração Pública Estadual, que se encontra em plena atividade,
ou seja, que está até mesmo em situação de flagrância, dada a sua
natureza permanente. Além disso, a prisão preventiva dos membros
até agora identificados poderá estancar, ou ao menos inibir a prática
dos delitos, servindo até mesmo como alerta vara que outros ramos da
Administração Pública percebam que não serão toleradas as práticas
delitivas que corroam o Estado. […]
Ademais, a periculosidade inerente desse tipo de organização
criminosa deve ser combatida com rigor e presteza, eis que a facilidade
de acesso aos órgãos, aos sistemas e às pessoas ligadas aos processos
licitatórios é muito grande. A contrario sensu, permitir que
permaneçam em liberdade acarretará risco atual e iminente, não
apenas graças à alta probabilidade de reiteração criminosa, como
também em razão da existência de forte suspeita de que possam tentar
destruir provas, ocultar documentos, alterar registros ou agir de modo
a obstruir a instrução processual. […]

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HC 137211 / MT

Nesse sentido, vejo que a medida cautelar de monitoramento


eletrônico seria incapaz de garantir que o grito continue agindo, bem
como que as provas permaneçam intactas, até porque as investigações
encetadas até o momento levaram, provavelmente, a apenas uma parte
dos envolvidos. Outro tanto pode estar ainda oculto, de modo que uma
breve comunicação entre ambos poderá frustrar toda a necessária
coleta de provas. Ora, é sabido que o único local em que há controle
rigoroso de comunicações, especialmente de visitas, é o sistema
prisional. Daí, mais um motivo para que a prisão seja imposta, ou
seja, para que o apartamento dos envolvidos garanta a lisura das
investigações e da futura ação penal. Finalmente, outro bom motivo
para a decretação das prisões é a possibilidade de que venham a foragir
logo após a deflagração da Operação, daí o cabimento da medida, como
forma de garantia da aplicação da Lei Penal. Como é sabido, a prisão
de natureza cautelar não conflita com a presunção de inocência,
quando devidamente fundamentada a sua necessidade, o que ocorre no
caso dos autos. [...]
Patente, assim, a necessidade da prisão preventiva, ante a
indicação de reiteradas práticas criminosas e o vultoso montante
envolvido, já que evidenciada a gravidade em concreto do delito
supostamente praticado.”

Deveras, o decreto da constrição cautelar da liberdade


fundamentado em elementos concretos e considerando o risco de
reiteração delitiva, o modus operandi da conduta, o risco de fuga e a
gravidade in concreto do crime encontra amparo na jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal. Consigna-se que o fato de o paciente ter bons
antecedentes, residência fixa e ocupação lícita não constituem óbice à
custódia preventiva. Nesse sentido, verbis:

“HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSO PENAL.


FORMAÇÃO DE QUADRILHA. ART. 288 DO CP (REDAÇÃO
ANTERIOR À LEI 12.720/2012). FRAUDE A PROCEDIMENTO
LICITATÓRIO. ART. 90 DA LEI 8.666/1993. CORRUPÇÃO
PASSIVA. ART. 317, § 1º, DO CP. EXTINÇÃO PREMATURA DA
AÇÃO PENAL. QUESTÕES DE MÉRITO QUE DEVEM SER

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DECIDIDAS PELO JUIZ NATURAL DA CAUSA.


DESMEMBRAMENTO DO PROCESSO. POSSIBILIDADE. 1. A
jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a extinção da
ação penal de forma prematura, via habeas corpus, somente se dá em
hipóteses excepcionais, quando patentemente demonstrada (a) a
atipicidade da conduta; (b) a ausência de indícios mínimos de autoria
e materialidade delitivas; ou (c) a presença de causa extintiva da
punibilidade. 2. A denúncia descreve de forma individualizada e
objetiva as condutas atribuídas à paciente, correlacionando-as aos
tipos penais em questão (art. 288, na redação originária, e art. 317,
§1º, do CP e art. 90 da Lei 8.666/1993). Revela a existência de grupo
de pessoas associadas e organizadas para a prática de fraudes
licitatórias e corrupção passiva, com a indicação detalhada do modus
operandi empregado na empreitada criminosa. As ações nela descritas
possuem relevo para a esfera penal. 3. Avançar nas alegações postas na
impetração, sobre a carência de provas concretas acerca da prática dos
crimes narrados, revela-se inviável nesta ação constitucional, por
pressuporem o revolvimento dos fatos e provas da causa. 4. O
desmembramento do processo, como consectário do excessivo número
de acusados, para imprimir maior celeridade processual, encontra
respaldo no art. 80 do Código de Processo Penal. Precedentes. A
reversão desse entendimento, com a posterior reunião dos processos,
implicou a superação dessas questões, de modo que não há como
avançar no exame da vulneração da paridade de armas e da ampla
defesa quanto aos atos processuais realizados no período em que os
autos permaneceram desmembrados, já que, sobre essa matéria
específica, o STJ não se pronunciou. 5. Ordem denegada.” (HC
127.288, Segunda Turma, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe de
05/09/2016).

“HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL.


SUBSTITUTIVO DE RECURSO CONSTITUCIONAL.
INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. HOMICÍDIOS
QUALIFICADOS. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA
ORDEM PÚBLICA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. EXCESSO
DE PRAZO. NÃO CONFIGURADO. 1. Contra a denegação de

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habeas corpus por Tribunal Superior prevê a Constituição Federal


remédio jurídico expresso, o recurso ordinário. Diante da dicção do
art. 102, II, a, da Constituição da República, a impetração de novo
habeas corpus em caráter substitutivo escamoteia o instituto recursal
próprio, em manifesta burla ao preceito constitucional. 2. Prisão
preventiva decretada em razão do risco à ordem pública, por
indicarem, as circunstâncias concretas do caso, o risco de reiteração
delitiva do paciente. Precedentes. 3. A razoável duração do processo
não pode ser considerada de maneira isolada e descontextualizada das
peculiaridades do caso concreto. 4. Habeas corpus extinto sem
resolução do mérito.” (HC 132.543, Primeira Turma, Rel. Min.
Rosa Weber, DJe de 06/09/2016).

“AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. PENAL


E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE HOMICÍDIO
QUALIFICADO. ARTIGO 121, § 2°, II E IV, DO CÓDIGO
PENAL. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE INDEFERIU
LIMINARMENTE O WRIT IMPETRADO PERANTE O
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AUSÊNCIA DE
INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO REGIMENTAL. ÓBICE AO
CONHECIMENTO DO WRIT NESTA CORTE.
INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE.
CONVERSÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE EM PREVENTIVA.
CUSTÓDIA PREVENTIVA DEVIDAMENTE
FUNDAMENTADA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA,
CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL E APLICAÇÃO
DA LEI PENAL. INEXISTÊNCIA DE TERATOLOGIA, ABUSO
DE PODER OU FLAGRANTE ILEGALIDADE NO ATO
IMPUGNADO. INVIABILIDADE DA ATUAÇÃO EX OFFICIO
DO STF. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIAS. AGRAVO
REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A custódia preventiva para
garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal e
para assegurar a aplicação da lei penal justifica-se ante a gravidade in
concreto dos fatos. (Precedentes: RHC nº 122.872-AgR, Rel. Min.
Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe de 19/11/2014, HC nº 113.203,
Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe de 22/08/2014). 2.

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HC 137211 / MT

In casu, inexiste excepcionalidade que permita a concessão da ordem


de ofício, ante a ausência de teratologia na decisão que decretou a
custódia preventiva do ora paciente, o qual teve sua prisão preventiva
decretada pautada no modus operandi, pois, em 07/02/2015, sem
motivo, mediante emboscada, inopinadamente e de surpresa, em uma
danceteria, desferiu contra a vítima disparo de arma de fogo,
atingindo-lhe as costas e causando-lhe a morte, tendo o juízo de
primeiro grau, ao receber a denúncia, acolhido a representação
ministerial para decretar a prisão preventiva do paciente, para
garantia da ordem pública, da conveniência da instrução criminal e da
efetividade da aplicação da lei penal. 3. O habeas corpus não é
admissível como substitutivo do recurso cabível, sendo certo ainda que
o impetrante não se desincumbiu do ônus de interpor agravo
regimental da decisão do Tribunal a quo que indeferiu liminarmente o
writ ali impetrado. 4. A supressão de instância impede o conhecimento
de Habeas Corpus impetrado per saltum, porquanto ausente o exame
de mérito perante a Corte Superior. (Precedentes: HC nº 100.595/SP,
Rel. Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJe de 9/3/2011, HC nº
100.616, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJe de
14/3/2011, HC nº 103.835, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira
Turma, DJe de 8/2/2011, HC 98.616/SP, Rel. Min. Dias Toffoli,
Primeira Turma, DJe de 22/02/2011). 5. Agravo regimental
desprovido.” (HC 130.426-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Luiz
Fux, DJe 16/09/2016).

“PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO.


PRISÃO PREVENTIVA DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA.
GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. MODO DE EXECUÇÃO
DO DELITO. PERICULOSIDADE DO AGENTE. FUGA DO
DISTRITO DA CULPA. 1. Os fundamentos utilizados revelam-se
idôneos para manter a segregação cautelar do recorrente, na linha de
precedentes desta Corte. A decisão aponta de maneira concreta a
necessidade de (a) garantir a ordem pública, considerada a gravidade
em concreto do crime, supostamente praticado com uso de violência
doméstica, mediante disparos de arma de fogo contra a própria esposa,
causando-lhe a morte; e (b) para assegurar a aplicação da lei penal,

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Supremo Tribunal Federal

HC 137211 / MT

dada a intenção de empreender fuga do distrito da culpa. 2. A


jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a
primariedade, a residência fixa e a ocupação lícita não possuem o
condão de impedir a prisão cautelar, quando presentes os requisitos do
art. 312 do Código de Processo Penal, como ocorre no caso. 3. Habeas
corpus denegado.” (HC 130.412, Segunda Turma. Rel. Min. Teori
Zavascki, Dje de 19/11/2015).

Assim, diante da inexistência de teratologia ou flagrante ilegalidade


no julgamento realizado, não se cuida de hipótese de concessão da
ordem.
Impende consignar, ainda, que o habeas corpus é ação inadequada
para a valoração e exame minucioso do acervo fático probatório
engendrado nos autos. Destarte, não se revela cognoscível a insurgência
que não se amolda à estreita via eleita. Nesse sentido:

“AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS . PENAL


E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE HOMICÍDIO
DUPLAMENTE QUALIFICADO. HABEAS CORPUS
SUBSTITUTIVO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
INADMISSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL PARA JULGAR HABEAS CORPUS:
CRFB/88, ART. 102, I, D E I . HIPÓTESE QUE NÃO SE
AMOLDA AO ROL TAXATIVO DE COMPETÊNCIA DESTA
SUPREMA CORTE. REVOLVIMENTO DO CONJUNTO
FÁTICO-PROBATÓRIO. INADMISSIBILIDADE NA VIA
ELEITA. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO CARACTERIZADA.
CUSTÓDIA PREVENTIVA DEVIDAMENTE
FUNDAMENTADA. ELEMENTOS CONCRETOS A
JUSTIFICAR A MEDIDA. ALEGADO EXCESSO DE PRAZO.
INOCORRÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.”
(HC nº 130.439, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe de
12/05/2016)

Ex positis, NEGO SEGUIMENTO ao writ, com esteio no artigo 21, §

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1º, do RISTF. Prejudicado o exame do pedido liminar.


Dê-se ciência ao Ministério Público Federal.
Publique-se. Int..
Brasília, 30 de setembro de 2016.
Ministro LUIZ FUX
Relator
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