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Hoje eu não tive tempo de me maquiar e a única saia limpa é a mesma de ontem. Não importa.


quem diga que toda vez que encaramos a esquina é como primeira, não é verdade. Para mim, é
sempre como a segunda vez. Na segunda noite, quando você já começa a não se importar muito.
Quando começa a fingir que não se importa mais. Me acompanha até a esquina?
Que cara é esta? Pena? Ou é culpa? Pela tua cara já deve ter montado umas históras trágicas para
justificar né não? Se perguntando o quanto de estrada este meu corpinho gasto percorreu até virar
esta silhueta a venda na curva. Duas. Para ir uma, para voltar outra. A mesma estrada que você
percorreu para ir do trabalho para casa. Já pode engolir a pena. Me leva ao trabalho.
Um carro espera o portão da garagem abrir, ela me sorri e acena da janela, em um quase grito diz:
tá bonita hoje. Gosto quando você usa esta saia. Sorrio de volta. Então é esse o gosto da a terceira
noite?

Vem cá, te mostro. É que se passar com pressa perde a curva certa. Mais para esquerda. Aqui.
Cuidado. De leve com estas mãos. Isso. Achou. Agora só gravar o ponto de referencia. Que não tem
mais erro. Tu achando o ponto direito elas chegam lá um pouco depois. Se tu souber manter o ritmo.
Gravou? Agora me mostra se aprendeu direitinho.
Tu tem que entender que na esquina tudo dobra. Tudo vira coisa outra. Eu sei de mais dos caminhos
para chegar onde interessa do que cabe em mapa. Sou boa nisso. Sou eu, quem? Só dona dos meus
gestos. A gente faz o que pode e o que sabe, né? Dona da esquina. Faço direito. Sei que presto. 50
reais e em 15 min dou conta, tu ainda chega em casa tua patroa com o gosto de novinha nos dedos.
Agora que já aprendeu direitinho deixa eu voltar para a labuta. Acabou a folga. Fala para felipe que
ele tá me devendo uma cerveja pela aula. Para tu é de graça,

Tu acha que eu tenho que aguentar qualquer coisa? Até eu tenho limite, agora vê vai querer me
dizer o que eu posso ou não falar? Cês são tudo a mesmo coisa, né? A mesma diferença sem gosto.
Passam babando e sem coragem de parar. E quando param... Velho babão! Vai me deixar aqui com
a boca seca? Ainda tem cerveja nesta lata? Não tenho nem saliva direito. Tu tem cara de que gosta
de mulher silenciosa, quietinha, tem cara... Eu tenho cara de que? Me quer calada, né? Quietinha
né? Ahãm... Te saquei de longe, chega mais perto para eu te ver direito. Olha, este pedaço de você
não me quer de boca fechada não, hein... eu sei que não. Me quer com a boca aberta, calada, mas
aberta. Mas com a boca seca não desce nada, nem nada sai... Me paga uma cerveja ao menos, para
molhar a goela, este cemitério de ideias. Que aí a gente decide o que fazer com a boca.

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