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"O que é a verdade?

"
(Pôncio Pilatos, 33 d.C.)

CURSO DE
A p o l (FASE
oeética
2)
Curso de Apologética
(Fase II)
ESDRAS DIGITAL
Copyright © 2004 by IC P - Instituto Cristão de Pesquisas

Capa
M etam ídia

Diagramação
Spress - Bureau de fotolíto

Revisão
D eborah Balestríní

Iodas as referências bíblicas foram extraídas da


B íblia A pologética publicada pelo ICP.
J. F. de Almeida Corrigida e Revisada Fiel da SB T B

[2004]
Todos os direitos desta obra em língua portuguesa reservados por

IC P - Instituto Cristão de Pesquisas


Caixa Postal 832 - C E P 13200-970
Jundiaí - São Paulo
www.icp.com.br
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Proibida a reprodução por quaisquer meios, salvo em breves


citações, com indicação da fonte.
Introdução ao Curso
de Apologética

FASE II

Depois do sucesso dos cursos básicos de A pologética (que ultrapassou a


marca de 1800 matrículas no período de apenas um ano) e Teologia (que já conta
com cerca de 1000 alunos), o IC P novamente coloca à disposição dos irmãos
mais uma ferramenta com o objetivo de aperfeiçoar o combate contra as seitas.
Com o sempre, o desenvolvimento de mais este projeto é fruto das reivindi­
cações dos vários alunos que já concluíram ocurso básico de apologética e estão
desejosos em continuar aprendendo sobre o assunto. Estamos falando do Curso
de A pologética Fase II.
Após ter estudado cerca de 30 grupos religiosos no curso básico e ter pas­
sado por uma bateria de mais de 2 50 questões - entre questionários e avaliações
- o aluno que pretende aprimorar seus conhecim entos tem a oportunidade de
prosseguir seus estudos por meio deste curso.
O Curso de A pologética Fase II é constituído de três módulos (um por tri­
mestre) perfazendo um total de 10 disciplinas, cada qual acompanhada de um
questionário. Além destes, o curso exigirá tam bém a elaboração de três mono­
grafias as quais deverão ser enviadas, juntam ente com os questionários ao ICP,
que se incumbirá de orientar os alunos quanto aos demais procedimentos do
aprendizado.
Ao final do curso, caso todos os questionários e monografias tenham sido
enviados, o aluno receberá seu diploma em casa.

Nas horas vagas de lazer, aprenda apologética e cresça na graça e


no conhecimento
Para os interessados em fazer o curso, existem vários fatores que os influen­
ciarão objetivamente na realização do mesmo. Além da dedicação aos estudos,
condição fundam ental para a obtenção de bons resultados, o fator “tem po”
deve ser sistem aticam ente planejado para que os alunos alcancem o devido
sucesso.

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Aproveite todo o tempo disponível
Os interessados deverão aplicar todo o tempo disponível para que tenham
um bom rendim ento na assimilação do conteúdo da matéria. Isto é, devem
separar, no m ínim o, uma hora por dia para o estudo. Esse período dever ser
extraído dos intervalos que tiverem de suas atividades diárias. Para que tenham
êxito nesse propósito, devem ser extremamente metódicos.

Força de vontade e dedicação: armas fundamentais para se


alcançar o sucesso nos estudos de apologética
Assim com o em tudo na vida, a dedicação e a força de vontade tam bém são
essenciais para que o aluno obtenha bons resultados em seus estudos apologéti-
cos, que o tornará uma “arma viva” nas mãos de Deus.
O curso será dividido em trimestres, porém sua duração dependerá do ren­
dimento do aluno. Ao todo, serão estudadas dez disciplinas. A cada três meses,
o aluno receberá o volume do módulo respectivo para estudar, tendo o compro­
misso de apresentar os questionários e monografias até o final do curso.

O que é preciso para estudar apologética?


Seriedade! E tam bém que o aluno seja alfabetizado, isto é, saiba ler e escre­
ver. Encaixando-se nesse perfil, o interessado poderá ingressar facilm ente no
curso de apologética.

Dicas de como estudar


Primeiramente, o aluno deve procurar ler com atenção o material didático,
recorrendo, se necessário, às obras apontadas nas referências bibliográficas. Se
ainda assim o aluno tiver dificuldades, poderá contar também com a assessoria
do D epartam ento Ed u cacional do IC P, o que poderá ser feito por e-m ail:
cac@ icp.com .br, ou por carta: Caixa Postal 832 - C E P 1 3 2 0 0 -9 7 0 -Jundiaí, SP.

Quando se deve com eçar a estudar?


Em qualquer época. Em qualquer dia em que o aluno desejar inscrever-se
no curso. Nunca é tarde para se com eçar a estudar. Devemos nos lembrar de
que sempre é tempo para aprendermos as coisas de Deus. O IC P não limita
idade nem período para que os interessados com ecem a aprender. Pedimos ape­
nas que haja força de vontade e dedicação.

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É preciso comprar livros?
Não. O I C P fornecerá, a cada trimestre, todo o material necessário para o
desenvolvimento satisfatório do curso.

O aluno poderá transferir seu endereço durante o curso sem


prejudicá-lo?
Sim. Ele terá apenas de avisar o departamento de cadastro do curso para
que o endereço seja atualizado.

Quantos livros serão utilizados durante o curso?


Ao todo, três. Abaixo, as matérias abordadas em cada um deles:

Módulo I
• História das religiões não-cristãs
Uma vez que o mundo atual possui mais de 10 mil subdivisões das grandes
religiões antigas, e considerando que grande parte das heresias contempo­
râneas têm sido resgatadas destes grupos, é essencial que o apologista dete­
nha o conhecim ento de todos eles: Animismo, Hinduísmo, Jainism o,
Budismo, Sikhismo, C onfucionism o, Taoísmo, Xintoísm o, Judaísmo,
Zoroastrismo e Islamismo.

• História das heresias primitivas


Não há dúvidas de que os grupos religiosos que mais arrebatam adeptos
do cristianismo são as seitas pseudocristãs, ou seja, aquelas que se pare­
cem cristãs, mas que distorcem a cristologia bíblica. Assim, esta disci­
plina apresentará ao aluno as raízes das heresias que encontramos hoje
entre os mórmons, testemunhas de jeová, adventistas do sétimo dia, espí­
ritas etc. O aluno estudará nesta disciplina: M arcionism o, M ani-
queísm o, M ontanism o, Sabelianism o, (m odalism o-unicism o), Aria-
nismo (unitarism o), Apolinarianism o, Nestorianismo, Pelágianismo,
Eutiquianismo entre outros.

• M etodologia científica
Esta disciplina terá com o objetivo proporcionar ao aluno ferramentas
para elaborar as monografias que serão exigidas ao longo do curso. Aqui
o aluno irá adquirir noções básicas para observar os métodos de pesqui­
sas, elementos pré-textuais, textuais, pós-textuais - referências, citações,
bibliografias etc.

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Módulo II
• Apologética ao Antigo Testamento
O objetivo desta disciplina será defender a total autenticidade do Antigo
Testamento como documento fidedigno, dado como mensagem infalí­
vel pela inspiração plenária do Espírito Santo. Será uma introdução apo-
logética em oposição à alta crítica. Destacaremos questões com o a auten­
ticidade autoral, histórica, geográfica e sua inviolabilidade.

• Línguas originais
Nesta matéria introduziremos o aluno aos estudos das línguas bíblicas
originais - o hebraico e o grego. A abordagem será voltada para os textos
bíblicos que freqiientem ente são adulterados pelas seitas e que são facil­
m ente compreendidos quando contrastados com os escritos originais.

• Apologética aplicada
Aqui o estudante vai adquirir conselhos estratégicos sobre o comporta­
mento do apologista cristão diante das argumentações diversas dos adep­
tos de seitas. Nos restringiremos aos movimentos religiosos mais expres­
sivos. Forneceremos algumas dicas sobre com o abordá-los com o intuito
de contribuir para a evangelização destes grupos não-alcançados.

Módulo III
• A pologética ao Novo Testamento
Esta disciplina figura como um com plem ento da anterior - Apologética
ao Antigo Testamento e, portanto, seguirá a mesma tendência, porém,
enfatizando os elementos críticos peculiares ao Novo Testam ento, tais
com o o surgimento dos evangelhos sinópticos, sua forma literária, a his-
toricidade de Jesus, seus milagres, ressurreição e outras controvérsias,
tais com o, Jesus dos 12 aos 30 anos, João Batista e a comunidade dos
essênios, etc.

• Direito e religião
Eu posso ser processado por estar me opondo publicam ente às doutrinas
ensinadas pelas seitas? Até que ponto pode-se argumentar contra uma
religião? Quais são os limites para isso? Qual é o parecer da Constituição
Federal Brasileira sobre o assunto? E a D eclaração Universal dos Direi­
tos Humanos? Q ue cuidados devemos ter ao expor nossas objeções a
determinada crença? Todas estas perguntas e muitas outras serão escla-

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recidas nesta disciplina que é fundamental para que o estudante conheça
as leis que regem o tema e proceda com cautela e segurança.

• Estatísticas das religiões


Esta disciplina apresentará aos alunos dados religiosos estatísticos atuali­
zados no Brasil e no mundo. O material será constituído de mapas e grá­
ficos. Veremos as religiões m ajoritárias nos países mais expressivos,
número de adeptos e taxa de crescimento anual entre outras coisas.

• Filosofia e religião
Neste estudo introduziremos o aluno à filosofia segundo uma perspec­
tiva cristã. O nosso objetivo será apresentar ao aluno as bases filosóficas
para que este possa enfrentar os diversos desafios intelectuais lançados
contra o cristianismo. O conhecimento, a verdade, a realidade e o pro­
blema do mal são alguns dos conceitos que serão comentados.

O aluno receberá certificado no final do curso?


Sim. O IC P fornecerá um certificado em reconhecim ento ao aprendizado
apologético de todos os alunos que concluírem o curso observando a entrega
periódica das monografias e questionários.
Feitas todas essas considerações, prossigamos em nossos estudos em Defesa
da F é que uma vez foi dada aos santos (judas 3).

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História das religiões
não-cristãs
SUMÁRIO

Introdução.................................................................................................................. 11
Capítulo 1 - An im ism o ........................................................................................... 13
Capítulo 2 - H induísmo ......................................................................................... 19
Capítulo 3 - Ja in ism o ............................................................................................. 25
Capítulo 4 - B u d ism o ............................................................................................. 32
Capítulo 5 - C onfucionism o .............................................................................. 39
Capítulo 6 - T a o ísm o ............................................................................................. 46
Capítulo 7 - X in to ísm o ......................................................................................... 53
Capítulo 8 - ZOROASTRISMO................................................................................ 59
Capítulo 9 - JUDAÍSMO............................................................................................. 66
Capítulo 10 - Isla m ism o ....................................................................................... 73
Capítulo 11 - SlKHISMO......................................................................................... 81
C o n clu são .................................................................................................................. 86
Questionário
Referências bibliográficas
Introdução

Neste módulo estudaremos uma série de informações correspondentes a


onze religiões que não documentam a existência histórica de um Deus Salva­
dor que tenha se encarnado para que, uma vez entre os homens, propusesse-
lhes, por um único sacrifício, a salvação de todo o gênero humano.
E natural no meio teológico apologético brasileiro, que estas religiões não
recebam uma atenção significativa, haja vista o fato do desuso de suas práticas
até os lim ites da Am érica do Sul. Entretanto, manda a matéria apologética
cristã, que estejamos aptos a captar elementos que derivam das mais insólitas
culturas religiosas, para que tenhamos acesso a esclarecimentos necessários no
diálogo inter-religioso.
Não se adapta ao título de apologista cristão o aspirante que domina apenas
e precariamente a história das crenças que lhes são apresentadas à porta, a exem­
plo do mormonismo, do jeovismo e do tradicional catolicism o romano. Conside­
rando a sociedade aculturada hodierna e o trabalho m aciço de pregação de seus
missionários estas profissões de fé já espalharam seus elem entos em todos os
seguim entos sociais, granjeando muitos sim patizantes. Entre seus adeptos
podemos observar considerável desprendimento na argum entação, o que os
torna capazes de promover um diálogo denso e quase inacessível aos apologis­
tas evangélicos de pouco conhecim ento.
Este é um dos principais fatos que acabam por impelir o apologista cristão
iniciante a se desdobrar na busca por cada vez mais informações, separando-se
do comum e ampliando suas possibilidades de sucesso na empreitada da defesa
de sua fé, iniciativa muitas vezes responsável por uma evangelização frutuosa.
D iferentem ente do que se observou anteriormente com a disciplina Histó­
ria das heresias primitivas , aqui serão estudadas religiões devidamente estabele­
cidas, possuindo, cada uma delas, além da história, um rol de crenças, escritos
sagrados, rituais, festas e demais peculiaridades.
Por não se ater este módulo apenas à historicidade das onze religiões desta­
cadas, julgamos necessário nesta introdução a exposição das duas principais
definições do termo religião, as quais não constam na genérica definição dos
dicionários portugueses disponíveis, meio impróprio para consulta do tema.
Vejamos algumas definições:
1. Uma série de sistemas reconhecíveis de crença e prática que apresentem

n
uma sem elhança familiar; elementos comuns a este ou a sistemas assem elhados
podem então ser escolhidos para definir uma série de religiões.
2. O termo religião na sua form a mais abstrata, pode denotar:
a) A classe de todas as religiões;
b) A essência supostam ente com um de todos os fenôm enos au tentica­
mente religiosos;
c) O ideal de que todas as religiões verdadeiras são consideradas manifesta­
ções imperfeitas;
d) A religiosidade hum ana, expressa não só em sistemas e tradições - a reli­
gião explícita - mas tam bém em modos de vida onde ela está escondida -
implícita.
Convém não esquecer que o fato de ser religioso, obviamente, diz respeito
à pessoa, mas não necessária e exclusivamente àquelas que professam alguma
crença ou que se acham envoltas em práticas religiosas de quaisquer espécies.
Assim, reconhecem os uma variedade religiosa de singular amplitude, o
que conseqüentem ente culmina com uma quase infinda fonte de trabalhos e
pesquisas, que convidam o apologista a uma imprescindível dedicação e consi­
deração do maior número possível de teses e conceitos. E o que passaremos a
fazer a partir daqui.

12
Capítulo 1

ANIMISMO

Introdução
odemos entender por animismo, a modalidade religiosa que

P implanta espíritos em toda a natureza, sendo estes espíritos


semelhantes ao espírito do homem.
Esta profissão religiosa também já foi conhecida pelo nome de feti-
chismo, palavra que foi inserida na história religiosa no século XVIII
pelo grande líder republicano De Brosses (1709-1777), também autor
da obra Du Culte des Diêux Fetiches, editado no ano de 1760.
“Fetiche” é, curiosamente, um termo que procede do português “fei­
tiço”, e que por sua vez deriva do latim factícius, tudo significando “coisa
feiticeira” ou “coisa encantada”, dando a idéia de que algo seja dotado
de força mágica. Esta expressão foi popularizada pelos navegadores por­
tugueses, que a empregavam para designar objetos que estivessem rela­
cionados a cultos e instrumentos de magia utilizados pelos negros.
Para De Brosses, o ritual dos fetiches estaria necessariamente ligado à
origem de todas as religiões. Foi também com base neste conceito e
palavra, que o filósofo Augusto Comte (1798-1857) formulou em seu
primeiro ensaio do curso de Philosophie Positive, a conceituada Lei
dos Três Estados.
Segundo esta tese, a inteligência humana teria passado por três esta­
dos básicos sucessivos:
1. O primeiro seria o estado teológico, no qual o homem explica os
fenômenos por desejos equivalentes aos seus, todavia, mais potentes;
2. O segundo, o metafísico, quando os mesmos fenômenos são eluci­
dados a partir de abstrações, com a força da natureza;
3. E, finalmente, o terceiro seria o estado positivo, no qual fenômenos
explicam fenômenos.

*3
Registrou-se evolução no estado teológico quando o homem ingres­
sando posteriormente no politeísmo, promoveu a intervenção de deu­
ses, espíritos em número menor, mas detentores de maior poder, con­
densando numa próxima etapa estes deuses como se fosse apenas um,
aderindo à prática monoteísta.
Considerando a etnia, depreendeu-se de forma cada vez mais clara
que os negros, mais do que os objetos materiais cultuavam forças espi­
rituais comparadas a entidades e, assim, ao invés do termo “feti-
chismo”, adotou-se imediatamente o termo julgado mais apropriado à
questão, o “animismo”.
A etnologia de Tylor, exposta na segunda metade do século XIX, teo­
rizou o animismo, alcançando o acatamento de boa parte de seus con­
ceitos pelo evolucionista Herbert Spencer (1820-1903), numa mostra
de que a matéria e a prática eram de tal forma expressivas, que desper­
tavam o interesse da ciência e da antropologia.

Peculiaridades
O aprofundamento na teoria animista exige que se reconheça a impossibi­
lidade de se distinguir nitidamente o animismo das concepções religiosas que
dele se aproximam, posto que nele podemos encontrar elementos oriundos do
totemísmo (O conjunto de práticas sociais, crenças religiosas e ritos relaciona­
dos aos totens).
Esses elementos relacionados aos totens incluem a crença em forças sobre­
naturais provenientes dos espíritos e que operam num objeto ou numa pessoa;
idéias de tabus; idéias de ancestrais m íticos, semi-animais e semi-humanos.
Todos os aspectos citados acabam por encontrar indícios práticos em todas as reli­
giões de todos os meios.
E possível, entretanto, definir o animismo com o religião de numerosas
sociedades, obviamente mais evoluídas que a sociedade de praticantes austra­
lianos, mas de ritualística rudimentar, quando comparada com as demais civi­
lizações antigas, com o por exemplo, as sociedades negras da África não m uçul­
m ana, as sociedades animistas da Polinésia, os índios encontrados nas duas
Américas, os esquimós, etc.
Isso provoca a necessidade do conhecim ento das crenças desses povos pri­
mitivos, no que concerne à alma e a natureza, às práticas mágicas e toda a sua
liturgia cerimonial.

H
Crenças
Para os primitivos, a alma está ligada estreitamente ao corpo ou a alguma
parte dele, enquanto que os australianos já a associam à gordura e aos rins.
Ainda segundo esta crença, a alma pode deixar o corpo m om en tanea­
mente sem que haja falência deste, inferindo-se daí, que do corpo a alma guarde
certa distância, ocorrendo então, quando unidos, uma ação de presença. Alguns
estudiosos, com o Frazer, autor da obra R am eal d' Or, estudaram particular­
mente este conceito de alm a exterior.
Mostrou-se, a partir daí, alguns raros conceitos que derivaram da crença
animista, com o os que consideram a possibilidade de a alma ser comida, rou­
bada, transportada e em determinados casos, substituída, consertada ou até
reformada.
A crença primitiva do animismo ensina que a individualidade não se detém
na periferia de sua pessoa, devido ao entendim ento de que a m entalidade
funde-se ao próprio corpo, com o que cresce sobre ele e ainda com aquilo que
sai dele, notadamente as unhas, cabelos, secreções, urina, excrementos, lágri­
mas, esperma etc.
Sem elhantem ente a outras práticas de feitiço africanas, tam bém aqui se
aceita a realidade do dano que pode ser causado a uma pessoa, bastando para
tanto que um desses elementos integrantes seja empregado em ritual de magia.
Dessa crença nasce uma escravidão supersticiosa, na qual todo os indiví­
duos da sociedade se aprisionam no excessivo cuidado com seus particulares
fragmentos humanos, para que os mesmos não caiam em mãos de terceiros que
possam efetivamente empregá-los para fins ritualísticos maléficos.
Numa concepção cultural mais abrangente, para eles, dispor destes ele­
mentos de forma irresponsável, é dispor da própria vida, já que compreendem
ser estes resíduos a própria pessoa ou partes dela, com o pés, mãos, cabeça ou
qualquer outro órgão interno, com o pertences estritamente íntimos.
Não sendo suficiente este cuidado, resta ainda cuidar das marcas deixadas
no chão, em assentos e, em especial, as pegadas. Nesta noção, repousa a certeza
de que, caso uma criança seja colocada sobre as marcas deixadas por um grande
feiticeiro, tam bém o pequeno poderá ter impregnado em si os poderes do mago.
Avançam mais em suas crendices quando cuidam para não se exporem de
forma a projetar sombras ou reflexos na água, dos quais o feiticeiro inimigo pode
suscitar um desenho, pintura ou outra espécie de retratação, outro artifício de tra­
dicional emprego mágico. Para estes elementos extremamente pessoais, dá-se o
nome de pertenças.

lS
Em contraposição a crença teológica cristã, explica Rasmussen (estudioso
da cultura esquimó animista), que para os esquimós animistas um hom em é
composto de corpo, alma e nome, e não de corpo alma e espírito.
Há testemunhos de pessoas que contemplaram noutra etnia animista, os
Fidjianos, moribundos que gritavam desesperadamente seus próprios nomes,
na esperança de que por esta prática não sucumbiríam à morte. Ainda segundo
a crença desta etnia, a roupa de um hom em , achando-se impregnada de sua
transpiração, caso posta sobre uma mulher, pode proporcionar-lhe gravidez. A
vestimenta torna-se, portanto, outra forma de pertença. A morte do indivíduo,
dado este conglomerado de possibilidades, impele seus familiares à queima de
todos os utensílios que lhes pertenciam.
Com relação à constituição humana, diferentemente dos esquimós, entre
os Fidjianos prevalece a crença numa tricotomia (corpo, alma e espírito), escla­
recendo-se que, no ato da morte, a alma se desprende do corpo, mas o espírito
não. Ele perm anece no cadáver e, por isso, propaga-se que é necessário ter cui­
dado, pois o falecido, tomado de um surto de ciúm e dos vivos, pode vingar-se
destes.
Os mortos animistas são apegados à comida, bebida e homenagens. A menta­
lidade primitiva, embora não excludente de contradição, é convicta de que os mor­
tos podem estar presentes ou ausentes, considerando ainda a possibilidade de que
eles possam estar em vários lugares ao mesmo tempo. A poli-presença dos mortos,
com o definido, admite que por vezes, possam eles aparecer aos vivos, muito
embora habitem outros mundos. Sobre a pós-morte, ainda se define, paradoxal­
mente, que os mortos vivem.
Esta sociedade de extintos está dividida em clãs, num contexto semelhante
ao dos vivos. Da mesma forma que é possível uma reencarnação, tam bém aceita
é a tese de que alguns deles desapareçam definitivamente. Compreende-se que
caso se tratasse de almas puramente espirituais, estas seriam imortais, mas não
se trata este de um conceito aceito nas sociedades animistas primitivas, posto
que em nenhum a delas se vislumbra consenso quanto a imortalidade. O que
existia em algumas sociedades religiosas era a crença na sobrevida, mas nunca
numa vida pós-morte sem fim.

Ritualística
Com o é aceito por todos que forças místicas podem ser comparadas a espí­
ritos, animando a natureza, logo, o hom em poderá exercer ação sobre esta
mesma natureza com o age sobre os seres espirituais, através de palavras e gestos

16
apropriados ao ritual. A consideração séria desta influência é essencial para que
se produzam os efeitos esperados da denominada magia.
Salomon Reinach (1858-1932), estudioso da matéria em questão, propôs
uma fórmula espantosa, na qual a “magia é a técnica e a matéria do animismo”,
segundo a qual, basta-nos a pronúncia de palavras apropriadas em voz alta ou
cantadas para que se produzam efeitos com o curas, com o por exemplo: “O
papagaio voou; o cuco voou; a codom a voou e enfim, a doença voou...”.
Imita-se um acontecim ento para que façamo-lo se produzir.
Desse modo, antes que se despeça uma expedição, planejam-na nas suas
minúcias, ensaiando inclusive as danças guerreiras, o que garantiria aos adep­
tos desta fé, vitória segura. O derramamento de água que acompanha a obser­
vância de várias normas rituais é elemento correto para a produção de chuvas.
Esta modalidade de feitiço é chamada apropriadamente de m agia imitativa.
A cultura determina aos praticantes que produzam ou adquiram imagens
que lhe sejam como almas suas e, estes fetiches propiciam outra forma de magia
desta sociedade, a m agia simpática.
Neste modelo de ritual, presume-se uma participação do homem e da maté­
ria na formação de um só elemento e, assim, a quebra ou completa destruição
desta imagem, prejudica severamente o indivíduo a ela associado. Este princípio
é evidenciado em muitas outras sociedades dadas a prática das bruxarias. Esta
imensa variedade de possibilidades de acesso à pessoa que se deseja lesar, admite
ainda outra nomenclatura bastante sugestiva, ou seja, a de m agia contagiosa.
Os animistas são avivados estimuladores do uso de talismãs, amuletos e
objetos de feitiço, todos com inquestionável poder mágico. Os adornos, tanto
masculinos com o femininos, só podem ser empregados com o artefatos exclusi­
vamente de enfeite se antes já tiverem produzido seus efeitos como agentes de
rituais de magia.
Quanto à variedade mágica, esta pode ser definida em mais de uma forma.
Existe a boa magia, praticada pelos chefes e pelos sacerdotes ou mesmo pelos fei­
ticeiros, enquanto a magia má é praticada pelos nigromantes (necromantes).
Através de seus encantamentos, podem provocar a enfermidade e até a morte,
além do que, dão-se ao exercício do canibalismo, que é executado após a magia,
quando a vítima sequer se apercebe do que lhe ocorre, entretanto, não servem de
alimento depois de mortas, antes, morrem por causa do consumo que os nigro­
mantes lhes impinge à carne viva.
O meio de anular este ato é o contra-feitiço, com o bem observou a pesqui­
sadora dos negros congueses, Mary Kingsley, que esclarece: “invoca-se o espí­
rito do remédio para que anule o espírito da doença, agindo sobre ele”.

!7
O animism o forneceu aos hom ens uma primeira hipótese que permite
estudar o mundo encorajando os primitivos de outrora e os primitivos de hoje,
numa contínua tentativa de agir sobre os fenômenos naturais, os quais habitam
numa natureza carregada de espíritos semelhantes ao espírito que possuem.
Augusto Com te afirmou que o animista primitivo conseguiu tirar o espírito
humano de sua inércia moral, característica comum na criação irracional.
Conclui-se assim a verificação de que a magia animista pode estar embutida
na própria origem do desenho, da pintura, da escultura, da dança ou ainda da
música. Logo, direta ou indiretamente, o animismo se compõe dos mais variados
elementos das artes.
Se refletirmos nos benefícios promovidos pela arte em todos os seguimen­
tos da sociedade, depreenderiamos que tudo o que o animismo poderia propor­
cionar à humanidade seriam benfeitorias.

18
Capítulo 2

HINDUÍSMO

Introdução
a história da cultura indiana, encontra-se a inigualável força

N da religiosidade de seu povo, que vai desde a definição de


uma casta, até os hábitos milenares adotados e que fazem
parte do cotidiano social, numa mescla de religião e cultura.
Com uma adesão de mais de um bilhão de adeptos pelo mundo, e cuja
esmagadora maioria se encontra no continente asiático, o hinduísmo
se constitui num conjunto de princípios, doutrinas e práticas religio­
sas dominante na índia, conhecido pelos seus seguidores pelo nome
sânscrito Sanatana D harm a, traduzido por “ordem permanente”.
Está fundamentado nos Vedas, que significa “conhecim ento” em
sânscrito, língua indo-européia do ramo indo-ariano na qual foram
escritos os quatro Vedas, entre 1200 e 900 a.C., e que, entre os séculos
VI a.C. e XI d.C., se tomou a língua da literatura e da ciência hindu.
E mantida, ainda hoje, por razões culturais, como língua constitucio­
nal da índia; conjunto de textos sagrados compostos de músicas e des­
crições de rituais. Atrelado a um politeísmo que acomoda um panteão
de mais de trinta mil divindades e à crença na reencarnação, o hin­
duísmo é a terceira religião do mundo em número de praticantes, e
seus preceitos influenciam fortemente a organização desta classe
social.

História e doutrina
A tradição dos Vedas nasceu com os arianos, grupo étnico das estepes da
Asia central, que a levaram para a região da índia em 1500 a.C ., quando da inva­
são e conquista dos vales dos rios Indo e Ganges. Está estribada na lem brança
da comunidade hindu sobre deuses tribais e cósmicos, sendo repassada oral-

*9
mente e, posteriormente, grafada em seus livros sagrados, os Vedas. Essa obra de
quatro tomos foi juntada durante o século X a.C e contêm , na crença hindu, as
verdades eternas reveladas pelos deuses: a ordem do dharm a universal que rege
todas as coisas e os seres, classificando-os em categorias, por eles denominadas
castas ou vamas.
Segundo os Vedas, o homem está preso à realidade cíclica e eterna que se
resume em morte e renascimento, condição irrevogável chamada sâmsara, e
segundo a qual o homem está fadado a reencarnar e a sofrer em infinitas vidas. As
reencarnações alcançam tanto o ser humano como o animal e são regidas pelo
carma, que é o preceito segundo o qual é traçada a forma como renascemos em
nossa vida atual, todavia sendo definida na vida anterior, colocando tudo na
dependência do estágio espiritual que alcançamos e os atos que praticamos numa
vida póstuma. O hindu busca fundir-se a Brahm an, a chamada verdade suprema;
um espírito que rege o Universo. Esta condição só pode ser conquistada liber­
tando-se do sâmsara pela purificação de seus infinitos carmas, atingindo o estágio
conhecido como nirvana, a sabedoria resultante do conhecimento de si mesmo
e do universo. A busca e o alcance do nirvana estão intrinsecamente ligada às prá­
ticas religiosas, as orações e a ioga, mas muitos hindus adotam tam bém dietas
vegetarianas e a renúncia aos bens e prazeres materiais, prática conhecida como
ascetismo, e que muitos tem por imprescindível para alcançar o nirvana.
Do século IX ao X IV tem início o tantrismo, linha de filosofia hindu que
prega o aperfeiçoam ento espiritual pelo dom ínio da m ente e do corpo,
excluindo, porém, o ascetismo, uma vez que se adota a prática sexual e hábitos
a ela atinentes. Em reação à expansão do islamismo na índia a partir do século
V II, e ao domínio britânico, iniciado no século XV III, surgem várias correntes
no hinduísmo.

Revelação e tradição
A filologia parece revelar que a partir de inúmeros estudos e pesquisas rea­
lizados entre os povos da índia, houvera, desde os tempos mais remotos, coloni­
zações promovidas por povos que falavam diversos idiomas.
No ano 1500 a.C ., grupos de colonizadores conhecidos com o árias
(nobres), portadores de uma língua indo-européia que achava similaridade
com o latim e o grego, devastaram as regiões do Vale do Indo, parte do conti­
nente asiático que parece ter sua existência vinculada a períodos que antece­
dem quatro milênios a.C.
Esta antiga civilização quase não comportava o meio rural, tendo o povo se
aglomerado em sociedades urbanas e que se concentrava principalm ente no

20
atual Paquistão e a noroeste da índia. Subjugadas as civilizações do Vale do
Indo, exatamente por aqueles que traziam o idioma dos árias, observou-se então
o surgimento de elementos que favoreceram a instituição de castas, tradições e
crenças diversas, as quais posteriormente receberíam o nome de hinduísmo.
C om o passar dos anos, o idioma indo-europeu trazido pelos colonizado­
res, foi sendo substituído pelo sânscrito, este, desenvolvido entre os indianos
natos que, à sem elhança do árabe para os muçulmanos, é o idioma sagrado pelo
qual se transm item os textos do hinduísm o, além da filosofia e da cultura
indiana, que se principiam nos Vedas, docum entos hindus originários que
alcançaram a nossa civilização, e cujo nome, advém da raiz Vid, que significa
“conhecer”. Trata-se de uma imensa coletânea de escritos sagrados compostos
por hinos e que, na sua maioria, são atribuídos a videntes e místicos.
E possível distinguir alguns dos textos que naturalmente foram transmitidos
pela tradição oral, além daqueles que foram grafados e mundialmente conheci­
dos com o fundamentos da religião hindu, formando a tradição e a revelação.

Tradição
Tam bém chamada de Shruti, ou “audição”; aquilo que foi ouvido pelos
videntes, chamados rishí, que receberam estes textos por meio do sentido da intui­
ção mística peculiar a esta casta, compreendendo os três volumes (Sam hita ) dos
Vedas: o brahm ana, o aran jakal e o upanishadi. Para a fé hindu, estes escritos pos­
suem autoridade máxima, sendo proibido a qualquer pessoa contestá-los ou
alterá-los, e teriam chegado até nós por meio de uma fidelíssima tradição oral.

Revelação
Este conceito da religião hindu é chamado de smrití, significando “lem ­
brança” ou “m em ória”. Na revelação se acham agrupados os elem entos que
funcionam com o uma com plem entação ao texto dos Vedas e que possibilita a
perfeita execução da ritualística cotidiana e sacerdotal, o que, obviam ente,
impede seu emprego isolado quando da realização destes eventos.

Textos sagrados
O hinduísmo detém uma vasta relação literária que acomoda as normas
referentes à vida cotidiana além de formar a sociedade para uma correta obser­
vação dos ensinos. D e toda essa literatura, a mais arcaica - os Vedas - traz um
rol normativo que antecede o século X a.C .
Outras obras escritas tam bém são destacadas entre os hindus, com o os
Puranas, que formam a narrativa sobre a tríade divina do hinduísmo, formada

21
pelos deuses Brahm a, Shiva e Víshnu, descrevendo ainda as festas, condutas
sociais e religiosas do hindu. Contam tam bém com um poema histórico que
narra a grande epopéia do Bharatas, o M ahabharata.
Este poema possui nada menos que noventa mil versos, e é a compilação
de um antigo material épico indiano, provavelmente escrito entre o século II a.C.
e o século I d.C. Ele ainda trata da luta do bem e do mal, dos cultos a Shiva e
Vishnu e as lutas entre as tribos hindus; descreve os Upanishads, que são as aulas
dos mestres; o R am ayana, outro poema, este, sobre o amor de Rama por Sita,
além do Código de M anu, outro conjunto de normas, regras e práticas sociais
hindus.
O enredo se desenrola na planície do Rio Canges e seu ponto principal é a
batalha entre os Kauravas e os Pândavas (outro ramo dos Bharatas), povo que
afirma descender de um antepassado epônimo, isto é, que cedeu seu nome a
famílias indianas, o grande Bharata.
O riginariam ente, o M a h a b h a ra ta era considerado um poema m arcial
escrito, preservado e transmitido às gerações pela classe dos brâmanes, o qual
recebeu, com toda certeza, um vasto volume de material didático e religioso no
decorrer de sua transmissão. No curso desta obra, considerada de primeira gran­
deza para os hindus, encontram-se narrativas de guerras, mescladas com cenas
que retratam mitologia e pronunciamentos morais, revelando valores éticos das
antigas sociedades hindus e, em especial, textos que versam sobre os deveres de
cada indivíduo.
A parte que encontra mais reverência entre os fiéis do hinduísmo, destaca o
discurso de Krishna ao herói desta novela, Arjuna, também conhecido como Bha-
gavad-Gita, ou, o canto do bem-aventurado, isto é, de Krishna como avatar, a reen-
carnação de um deus supremo, e, especialmente, no hinduísmo, a reencarnação
do deus Vishnu.
O discurso transcorre, num primeiro momento, sobre o dharrna da classe
kshatriya, a varna (forma com o se denom inam os grupos ou castas no hin­
duísmo) guerreira. Outra parte que integra o poema é o Shanti Parvan; um dis­
curso sobre a ética e o governo, este, pronunciado pelo moribundo Bhishm a.
Uma última história é a de e Damyanti, que tem o propósito de advertir os segui­
dores contra os malefícios do jogo.

O sistema de castas
Varna, como já visto, é o sistema de separação de grupos entre os fiéis desta
seita, e que foi se codificando com o passar do tempo.
Segundo a literatura sagrada hindu, os homens, devido à soberana vontade

22
de seus deuses, devem pertencer a diferentes classes sociais, as chamadas castas,
sendo que esta separação é determinada logo na natividade do indivíduo, res-
peitando-se sempre a ascendência paterna. Esta crença milenar, além de deter­
minar a qual classe irá pertencer a criança recém-nascida, tam bém fixa sua posi­
ção profissional na comunidade em que conviverá.
Uma vez sendo esta uma norma religiosa e que excede em importância
qualquer outra, não pode ser modificada por intervenção hum ana, já que se
considera entre os hindus, que a fidelidade aos ritos ditados pela literatura espi­
ritual é um dos elementos que proporcionam ao indivíduo o gozo celeste.
As castas tam bém estão divididas hierarquicamente e, baseado nesta tradi­
ção, os que pertencem às classes mais altas gozam de todos os privilégios previs­
tos na seita, enquanto que os que se acham resignados às varnas mais baixas, não
usufruem nenhum. Esta separação pode determinar ainda uma outra privação,
que se define na incomunicabilidade entre as classes, principalmente no que
diz respeito às atividades sociais desenvolvidas por cada um. No casamento, por
exem plo, não poderão se unir pessoas de castas diferentes. No princípio, o
número de castas existentes se resumia a quatro. As três mais importantes deri­
vavam de uma divisão que já ocorria entre uma horda de colonizadores árias,
enquanto que a quarta, por não se achar inserida sequer na sociedade, estando
limitada aos grupos que se sujeitaram aos invasores, não podia ser contada com
aquelas que advinham destes povos. São elas:

Brahm an ou brâmanes
São os portentosos colecionadores da sabedoria contida nos Vedas, acumu­
lando ainda a responsabilidade da ministração dos sacrifícios, atributos exclusi­
vos àqueles que detém o poder sacerdotal e o conhecim ento dos mantras sacri-
ficiais, isto é, fórmulas encantatórias que têm o poder de m aterializar a
divindade invocada. Os hindus acreditam que a partir destas fórmulas os deuses
se tornam obrigados a baixar à terra, aceitar os alimentos e bebidas e a ouvir as
orações dos sacerdotes.

Kshatriya
É a classe dos guerreiros e dos príncipes, os quais funcionam ainda como
defensores dos tesouros, tendo ainda por atribuição a instigação dos sacrifícios
e a proteção do país.

Vaishya
É a classe dos que desenvolvem atividades braçais e produtivas, como a cria­
ção de gados, a agricultura e o com ércio.

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Shudra
Não possui qualquer outra atividade dentro da sociedade hindu, à exceção
de funcionar com o servo.
Há duas outras classes ainda mais inferiores que é a dos shudras, que são os
can dala e os sem-castas. A partir da proliferação de ramificações das castas den­
tro da sociedade hindu, o número de classes aumentou substancialmente, exce­
dendo em muito o número original delas. Atualmente, a regra para definição
de a qual das castas pertencerá a criança hindu, está diretamente ligada a ativi­
dade ocupacional que ela desenvolverá e esta, seguindo a hereditariedade
paterna.
Os sem-castas, também conhecidos com o párias, constituem-se num grupo
numeroso, ao qual o líder político e religioso indiano Mohandas Karamchand
Gandhi (Mahatma Gandhi, 1869-1948), chamava karijan, que significa “filhos
de Deus”, entretanto, a sociedade hindu não parece ter tido o mesmo sentimento
fraternal por esta casta, qualificando-os posterior e genericamente como dalit, ou
“excluídos”.
Em prol dos “excluídos” e das castas mais inferiores, emergiu um governo
afinado com o mundo moderno, que reconheceu a igualdade social diante do
Estado e aboliu o sistema de castas. A índia independente tam bém abortou ofi­
cialm ente este sistema, tornando-o inexistente ante o governo, não se
nom eando mais castas entre a sociedade; oferecendo-se recom pensas para
jovens que se propuserem a contrair matrimônio com membros de outras clas­
ses; adotando medidas que favoreçam as castas tidas por inferiores e demais pro­
vidências que efetivamente baniram a desigualdade ditada pela fé hindu.
Em 1950, Nehru, líder hindu à época, declarou que, em dez anos, conse­
guiría desarticular todo o sistema de castas, entretanto, a sociedade com um
pareceu não aceitar a intervenção governamental, desejando a prevalência da
tradição, o que promoveu um entrave no processo de extinção das castas,
fazendo com que até hoje, esta norma prevaleça entre o povo.

24
Capítulo 3

JAINISMO

Introdução

F
oi fundado entre 599 e 537 a.C., pelo indiano Nataputa Verda-
mana, que posteriormente recebeu o título honorífico de Ver-
damana Mahavira, ou “o Grande Herói”. Assim como ocorre
no budismo e no hinduísmo, também o jainismo encontra a origem de
sua nomenclatura no sânscrito, derivando do termo “jaina”, o qual se
traduz por “vitorioso”.
Essa filosofia, tal e qual o materialismo charvacan, é considerada um dos
principais sistemas heterodoxos dentre os que podem ser observados nas
dissidências hinduístas, tendo sido a primeira a emergir de diferenças
surgidas dentro do hinduísmo. Toda a sua estrutura religiosa veio da
índia, posto que, da mesma forma que ocorreu com o budismo, também
o jainismo traz um histórico de herança religiosa hindu, fato que ocor­
reu por volta do século VI a.C., e que à época, ganhou a justa conotação
de corrente filosófica diversa de sua crença-mãe, período no qual Maha­
vira era contemporâneo de Buda, sendo casado e pai de uma filha.
As diversidades que acabaram promovendo o cisma e o conseqíiente
surgimento desta ramificação, versavam sobre os conceitos até então
usuais e que se referiam às divindades, revelando uma tendência que
apontava para a rejeição ao teísmo.
O jainismo comunga do conceito budista que vislumbra a possibili­
dade de salvação com base apenas nas virtudes do indivíduo, dispen­
sando a intervenção de quaisquer divindades para este fim.
A antigüidade desta seita é atestada pela história, que aponta ativida­
des do jainismo na região norte da índia, em Magadá, desde os séculos
V e VI da Era cristã.
Mahavira foi o maior difusor dos conceitos doutrinários desta religião.

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Este, após a morte de seus pais, tornou-se um fervoroso perseguidor da
iluminação espiritual, objetivo que supostamente alcançou após doze
anos de vida ascética (kaiulya), abstendo-se das vestes corporais e
vagueando nu por toda a índia, deixando o cuidado corporal e perma­
necendo mudo durante todo este período, quando já contava quarenta
e três anos de vida, segundo a tradição.
Nesse tempo, iniciou a ministração de seus ensinos, os quais estavam
baseados em quatro pontos básicos. São eles:

Ahinsa
O princípio da não violência em quaisquer circunstâncias e no seu mais
amplo significado.

Anekantwad
O conceito que refere não uma, mais muitas verdades e cada qual baseada
num ponto de vista.

Aparígraha
A renúncia a toda possessão material.

Karma
A responsabilidade moral que cada pessoa possui pelos seus atos visíveis e
invisíveis, o qual também determina o destino da pessoa.

O monastério jainista
Vardhamana fundou a primeira ordem monástica jainista, exigindo de seus
candidatos, a realização de quatro votos básicos, alguns deles extraídos de seus
primeiros ensinos, que eram:
a) Não causar dano a qualquer ser vivo;
b) Ter caráter incondicionalm ente verdadeiro;
c) Jamais furtar;
d) Eximir-se de possessões materiais.
A estes votos, posteriormente, Mahavira acrescentou o celibato, além de
requerer dos aspirantes ao monastério uma vida de intensos exercícios espiri­
tuais de mortificação, devoção e meditação religiosa.
Baseado nesta vida de resignação, o termo “jaina” parece retratar o signifi­

26
cado paralelo ao da palavra “santo”, empregada entre os que seguem o cristia­
nismo, uma vez que sua definição está diretam ente relacionada à “vitória”,
entretanto, também no conceito jainista, “vitória” sobre as mazelas e vicissitu-
des cotidianas e, neste sentido, a devoção dos jainistas equivalería à devoção que
os católicos prestam às personalidades do panteão romanista.
Mahavira e Parshva são considerados pelos fiéis como os últimos dos vinte
e quatro grandes líderes religiosos do mundo, motivo pelo qual teriam galgado
o título de Tirthankara, que significa “atravessador do vale”, no caso, aquele que
auxilia seu semelhante a atravessar “o mar” de dificuldades terrenas cotidianas.

Os escritos sagrados
A relação dos livros sagrados do jainismo, originariamente, são compostos
no idioma ardham agadhi, e cuja transmissão oral se assemelha à forma com o se
observa no hinduísmo. Essa coleção de escritos foi vitimada por extravio apa­
rente desde o século III d.C ., afirmando seus adeptos que esta mesma tradição
oral teria sido reescrita por volta do ano 454 d.C. Uma peculiaridade dessa dis­
sidência hindu, talvez a maior, é a rejeição dos Vedas, incluindo seu panteão de
divindades e suas muitas cerimônias, além de reputar com o supérfluo o sacer­
dócio brâmane. Esta com pleição crítico-literária constitui-se na estrutura hete­
rodoxa do jainismo. Também consta desta época (III d.C.) que a comunidade
jainista que habitava a índia oriental, lugar da residência de Mahavira, migrou
para Guzerate e Rajasthan, na índia ocidental. Foi ao tempo desta migração que
surgiu um cisma na seita, formando duas correntes de pensamento acerca de
até que ponto deveria evoluir o caráter. Uma das correntes entendia ser o cor­
reto a abstenção até mesmo das vestes, aos quais atribuiu-se o título de digamba-
ras, termo que se traduz por “vestidos de céu ” ou “nus”; os contradizentes con­
traíram um nome oposto, os shvetambaras (vestidos de branco), por causa de
sua indumentária originariamente branca.
Os digambaras, com o passar do tempo, tam bém se moldaram aos trajes,
empregando túnicas quando surgiam em público, mas jamais deixando de
apresentar a diversidade existente com os shvetambaras.
Cada uma delas desenvolveu sua própria literatura, mas sempre, tanto
numa como noutra cultura jainista, explorando as questões do carma, preser­
vando-se ambas dentro dos territórios da índia e resistindo ao tempo, mantendo
seus costumes, crenças e práticas.
Segundo seus valores, mantêm um rigoroso vegetarianismo, prática ligada
ao ahim sa, uma das doutrinas fundamentais.

27
Esses ensinos adquiriram uma tal força entre os povos desta religião, que
até mesmo Mahatma Gandhi, tam bém natural de Guzerate, sofreu influências
do jainismo.
Após a morte de Mahavira, esta seita passou a ser liderada por um povo cha­
mado “ganadharas” (líderes da assembléia), os quais continuaram a propagar
suas crenças pelos territórios da índia, entretanto, por dispensarem a moderni­
dade dos transportes motorizados, viajando sempre a pé, esta lenta e difícil divul­
gação impediu uma maior expansão de suas crenças.
Acha-se ainda, dentro das sagradas escrituras jainistas, como portadoras de
seus princípios, as doze angas, que possuem posição suprema, mas é no
segundo volume desta coleção, que encontramos as bases para a compreensão
da natureza deste grupo religioso.
Ele fala sobre o reconhecim ento daquilo que escraviza a alma, para que,
uma vez reconhecido, seja removido. Todas as coisas são eternas por sua própria
natureza. Estes escritos tam bém ensinam que o ignorante, independente de sua
opinião, é prisioneiro tal qual pássaro na gaiola. Aponta para três formas de
pecado: aquele que se com ete pelos atos; aquele que é autorizado e aquele que
é aprovado, esclarecendo, em contrapartida, que o sábio se afasta na mesma
intensidade do amor e do ódio.
Por odiarem a dor, logo, todos os seres vivos devem ser poupados da morte
provocada, o que, na literatura jainista, se coloca com o princípio de toda a sabe­
doria, além do abandono do orgulho, da ira, do engano e da cobiça, sabendo
que os homens, na verdade, sofrem, cada qual, pelas conseqiiências das práticas
pecaminosas praticadas por eles mesmos.
Também deve fazer parte da consciência do sábio a verdade acerca de que
todos os seres vivos sofrem, posto que é este pensamento que impede o homem
de mergulhar na presunção, uma espécie de chaga do caráter defeituoso.
As boas ações, segundo rezam os angas, não devem ser utilizadas para auto­
promoção, mas sim, empregá-las para atender às necessidades de todas as coisas
vivas, colaborando em tudo aquilo em que gostaria de receber colaboração.
A meditação, segundo a norma, é o exercício mais importante, colocado ao
fiel numa modalidade filosófica e comparado à embarcação que, estando na
água, evita os perigos e desvia-se com sabedoria dos obstáculo, para então, con­
seguir chegar à praia.

Crenças
A esperança de salvação dentro do entendimento jainista está presa a três nor­
mas principais: o conhecimento; a fé e uma conduta correta, ou seja, condizente

28
com o que se acha na sagrada escritura da seita, editada no idioma ardhamagadhi,
a exemplo do islamismo, que só confere autoridade ao Corão grafado em árabe.
O empenho de cada indivíduo neste aspecto acaba por determinar um asce­
tismo intenso, por meio do qual se alcança a plena libertação do espírito humano.
O renascimento e o carma são as doutrinas básicas mais importantes do código
sacro do jainismo. Esboçando similaridade às profissões de fé que aplicam os ensi­
nos reencamacionistas, também aqui se reconhece que é na salvação que opera
a libertação definitiva dos ciclos de renascimento, a cuja situação seus adeptos
atribuem o nome de “conhecimento perfeito” e, para os quais, todavia, o conhe­
cimento temporal, está associado ao princípio de syadvada. Este termo ardham a­
gadhi se traduz por “talvez”, significando que todo o conhecimento humano se
limita à probabilidade e à parcialidade, não podendo exaurir o todo de qualquer
disciplina social, científica ou religiosa.
As questões atinentes ao conhecim ento ainda são mais abrangentes, divi­
dindo-se esta parte da liturgia jainista em classes, que são:

Conhecim ento ordinário


E identificado por meio da memória, do reconhecim ento e da indução.

Conhecim ento por meio de sinais e símbolos


Abrange a associação de idéias, a compreensão e algumas questões relacio­
nadas ao verdadeiro sentido das coisas.

Conhecim ento à distância


M escla de clarividência e meios psíquicos.

Conhecim ento dos pensamentos alheios


Telepatia

Conhecim ento perfeito


A este nível de conhecim ento só pode chegar àquele que usufrui salvação;
estágio no qual se anula o conhecim ento temporal limitado pela parcialidade
que proporciona, além do vínculo indissolúvel com o “talvez”.

O conceito do não-teísmo
O jainismo, com o forma filosófica religiosa não possui vínculo específico
de servidão com qualquer Deus formal, muito embora considerem que aqueles
que alcançaram a definitiva libertação espiritual pelo conhecim ento perfeito

29
adquiram status de divindade e, mesmo assim, numa compreensão um tanto
quanto distinta daquela observada no cristianismo, por exemplo.
Não podemos omitir, entretanto, que embora Mahavira tivesse abominado
o reconhecim ento de deuses por parte de seus seguidores, ele mesmo passou a
se tornar uma divindade após sua morte, tornando-se Mahavira um ídolo de
adoração para os jainistas. E nesta oportunidade que recebe o título de vigésimo
quarto Tirthankara; o último e maior dos seres salvadores, passando a ser consi­
derado com o alguém que tivesse descido do céu sem pecados e portador da ple­
nitude do conhecim ento.

Fé e cronologia cósmica
Acreditam na eternidade universal, entendendo que o universo se move por
meio de ciclos contínuos de ascensão e queda, movimento do qual acreditam
advir o estado ideal. O universo não conta, segundo eles, com qualquer Deus
supremo, que o tenha criado que promova sua subsistência, possuindo, porém,
divindades secundárias, sendo certo aos seus seguidores que todas as ocorrências
terrenas seguem uma ordem previsível, por serem originárias de meras forças
mecânicas do cosmos.

Classificação das essências


Independentem ente do espaço ou posição que a matéria viva ocupa no
globo, é classificada por alma e, cada uma delas, num incondicional estado de
transmigração. Essas essências são divididas em cinco classes:

Nígodas
São seres que não possuem qualquer percepção que provenha dos sentidos,
o que os relevaria a classes inferiores, até mesmo, à classe dos minerais e das
pedras, provavelmente numa alusão aos elementos do átomo, nos quais não se
observa, efetivamente, qualquer qualidade que seja inerente ao ser.

Seres com um único sentido


O tato seria o único ponto de contato com o todo, e nesta classe aparece a
água, as pedras, o fogo e demais minerais, além das raízes vegetais consumíveis.

Seres com dois sentidos


Nesta classe se encontra o tato e o paladar, além da possibilidade de desen­
volverem alguma forma de com unicação. São os vermes.


Seres com três sentidos
Dotadas de tato, olfato e paladar, este grupo de seres abrange os insetos, os
escorpiões e os mosquitos.

Seres com cinco sentidos


Não importando o lugar ou “estado” no qual se encontre o indivíduo desta
classe, celestial ou infernal; os animais superiores, o homem e os habitantes de
outros mundos. A mente seria um sentido adicional que alguns destes seres pos-
suiriam.

O destino da alma
Para o jainismo, a alma, uma vez liberta do ciclo constante de renascim en­
tos, atinge a verdadeira im ortalidade, sendo neste ponto que o indivíduo
adquire atributos e posição de divindade, com o o da onisciência, por exemplo.
Este estágio é atingido por bem poucos indivíduos, segundo se constata em sua
doutrina, mas, os poucos a alcançá-la, passam a receber a veneração dos vivos,
têm templos construídos em sua hom enagem , tornando-se exemplos para as
futuras gerações de jainistas. O jainismo contabiliza hoje cerca de três milhões
e quinhentos mil seguidores.

31
Capítulo 4

BUDISMO

Introdução

E
uma das mais antigas religiões não-cristãs, e que séculos após
séculos, continua fazendo discípulos muito além das terras
orientais. Trata-se do sistema ético, religioso e filosófico criado
na região da índia pelo príncipe hindu Sidarta Gautama, o Buda, que
viveu entre 563 e 483 a.C. aproximadamente. A veneração que repousa
sobre o Buda, oriunda dos seguidores desta seita, reputa-o como um
guia espiritual e não um deus. A importância desta distinção repousa
sobre a possibilidade de seus seguidores aderirem a outras profissões de
fé e continuar seguindo os preceitos budistas. A origem do budismo está
no hinduísmo, religião na qual Buda é considerado a nona encarnação
ou avatar de Vishnu.
A invasão muçulmana procedida no século VII tornou-se um entrave
no desenvolvimento da religião budista em todo território indiano, por
promover um estrondoso crescimento do islamismo nesta região, o
que não impediu o budismo de multiplicar seus seguidores no conti­
nente asiático. O budismo subdividiu-se em várias escolas, ganhando
diversidade sempre que é incorporado a novas culturas.

O nascimento do Buda
O pequeno Sídartha nasceu em uma família nobre do Nepal, gozando,
desde a natividade, do título de príncipe, sendo criado em confinamento no palá­
cio até os 29 anos, quando, após desabrochar para o mundo e conhecendo suas
fragilidades, fica chocado ao descobrir as doenças, a velhice e a morte. A partir
daí, esmera-se por conseguir respostas que expliquem as causas do sofrimento
humano, juntando-se a um grupo de ascetas, indivíduos que praticavam o exer­
cício prático que leva à efetiva realização da virtude e à plenitude da vida moral;
iniciando um período monástico de seis anos, no qual apenas jejuou e meditou.

32
Esta auto-flagelação, entretanto, não proporcionou a Sidharta a elucida­
ção de seus questionamentos, frustração que o leva a separação do grupo origi­
nário, quando, numa oportunidade solitária, sentado sob uma figueira, tem a
revelação das “quatro verdades nobres” do budismo. São elas:

A realidade do sofrimento
Todo sofrimento humano é resultado do carma passado. As ações de uma pes­
soa determinarão o ciclo de reencarnações pela qual ela terá de passar até chegar
ao nirvana.

A causa do sofrimento
A causa do sofrimento é o desejo: gratificação, o desejo da existência e tam­
bém o da não existência.

O fim do sofrimento
O sofrimento pode e deve ser totalmente eliminado. O objetivo central do
budismo é dar ao hom em a eterna libertação do sofrimento por meio da liber­
tação de todo o desejo, o que equivale a ser liberto do ciclo interminável de reen­
carnações e entrar no bem-aventurado estado do nirvana.

O cam inho para a elim inação do sofrimento


Trata-se de oito passos básicos destinados a suprimir o desejo e, desta
maneira, abrir o caminho para a iluminação, conhecidos como “Os oito cami­
nhos nobres”.

A concepção de Buda sobre Deus era semelhante a do ateísmo, divergindo


apenas quanto à existência, posto que ela era possível, todavia, para Sidharta,
inútil, pois a confiança em divindades ou demônios não ajuda nem atrapalha.
O hom em deveria sempre depositar sua confiança em si mesmo.
E nesta oportunidade que recebe o título de Buda pelos seus seguidores,
isto é, “o iluminado”, na linguagem do sânscrito, língua indo-européia do ramo
indo-ariano na qual foram escritos, tam bém , os Vedas, entre 1200 e 900 a.C ., e
que, entre os séculos VI a.C. e XI d.C., se tornou a língua da literatura e da ciên­
cia hindus.
Decide, então, pregar seus preceitos pela região da índia. Não tarda para
que seus ensinamentos ganhem adeptos e atinjam toda a Ásia, incorporando
novas diversidades e rituais em diversas culturas, dentro das três grandes escolas
de filosofia budista, a H inayana, a M ahayana e ainda a Vajrayana.

33
Budismo hinayana
Com põe a forma mais remota dessa religião, tam bém conhecida com o
Theravada, que significa “pequeno veículo”, uma expressão que explica o fato
de só os monges terem acesso a esta corrente, possuindo maior expressividade
nos países do sul da Ásia, como Sri Lanka, M ianmar, C am boja, Laos e Tailân­
dia. Seus seguidores acreditam que a única forma de se chegar ao nirvana, que
é o estado de ausência total de sofrimento, é detendo a paz e a plenitude a que
se chega por uma evasão de si na expansão da sabedoria, é resignando-se à vida
dentro de uma ordem m onástica e rejeitando o conceito de bodhisattva do
budismo m ahayana (veja a seguir a tendência da escola m ahayana).
A sociedade dos monges está dividida em duas partes, cada qual para o res­
pectivo sexo. A dos Bhiksu (monges) e das Bhiksuni (monjas). Ambas as classes
são, acima de tudo, uma casta elevada de mendicantes que renunciam à posses­
são de qualquer bem material, ao exercício de qualquer profissão remunerada
e que só pode receber doações em espécies animais ou vegetais, sem jamais
tocar em dinheiro.
O patrimônio destes resignados adeptos se resume numa vestimenta ama­
rela e, nos países de relevo montanhoso, acresce-se um par de sapatos. Não pos­
suem residência fixa e o am biente do mosteiro pode ser usado apenas para
encontros nos dias de retiro e, por períodos limitados, para abrigo da chuva.
Seguem uma rotina bastante rígida e sistemática, levantando-se cedo, bus­
cando a esmola antes do meio dia e, num ato contínuo, realizam a única refei­
ção do dia. Á tarde, entregam-se à meditação e ao repouso até a hora estabele­
cida para a leitura da escrituras, durante a reunião pública.
A noite é reservada para o banho purificador e, depois, emprega-se um
longo período noturno para o diálogo que se desenrola entre grupos de dois ou
mais irmãos da casta monástica. Além do costumeiro jejum praticado entre os
monges e monjas, também se reúnem para a celebração do uposatha (observân­
cia), ritual que se constitui num retiro de rigorosos jejuns e que se realizam a
cada quarto de lua.
Há ainda, a cada mês, o ritual da confissão pública, que é conduzido pelo
bhika (mestre da cerimônia) mais velho, o qual, após a leitura dos 227 preceitos
da disciplina monástica, solicita a manifestação dos presentes quanto aos erros
praticados naquele período. A falta dessa confissão implica em culpa por falsi­
dade, o que rende severas penalidades.

Budismo mahayana
Esta ramificação do budismo é traduzida do sânscrito por “grande veículo”,

34
por permitir que um grande número de pessoas alcance a salvação. Surgiu no
século II a.C em meio a uma insurreição na escola hínayana.
O m ahayana define que, ainda que a aspiração final do ser humano seja o
nirvana, o sábio que já o tenha alcançado, chamado de bodhisattva, ou futuro
Buda, tem o poder e o dever de adiar sua morte e libertação do sâmsara, para
dedicar-se a ensinar aos seus semelhantes os meios para se chegar ao nirvana,
numa atitude prioritária de compaixão com os demais seres humanos. Duas
correntes budistas se projetam com destaque dentro desta filosofia bastante
conhecida no Ocidente, que são o budismo tibetano e o zen-budismo.
O budismo tibetano desponta no final do século V III, surgindo da fusão das
tradições que derivavam do budismo e do hinduísmo, passando a ser reconhe­
cida com o a primitiva religião do Tibete.
E nesta ram ificação budista que se encontra o representante de uma
famosa ordem monástica, o chefe espiritual dalai-lama, que é considerado um
bodhisattva.
Já o zen-budismo nasceu na China, no século VI, onde foi introduzido pelo
mestre indiano Bodhidarm a, difundindo-se principalmente no Japão, a partir
do final século XII, passando a influenciar a cultura e as artes marciais, além do
modo de pensar do povo japonês.
Está alicerçado no exercício da meditação e na prática da postura e da res­
piração, com o meios de se atingir os ápices desejados durante a m editação,
dando muito mais ênfase a esta nuança da seita do que aos exercícios teóricos e
aos estudos das escrituras. Acreditam os praticantes desta modalidade de
budismo, que o corpo é dotado de sabedoria própria, e que esta deve ser empre­
gada para fins de ordenamento da vida cotidiana.
O budismo mahayana qualifica-se como o ensinamento que parte do mes­
tre diretamente ao seu discípulo; de coração para coração, espécie de budismo
que tem atraído muitas pessoas em todo mundo. O fukan-zazenzi é uma série
de conselhos para a meditação zen e se acha inserido num texto que fora escrito
pelo mestre zen Dogen, em 1227, logo após ter ele retornado na China, país no
qual tomou aulas e adquiriu o conhecim ento com os mestres locais, e é avaliado,
com o texto indispensável para o aprendizado zen.
Carrega em sua matéria escrita, os sutras, que na literatura da índia, são tra­
tados em que se reúnem, sob a forma de breves aforismos, as regras do rito, da
moral e da vida cotidiana. Esta modalidade literária se difundiu fora da velha
tradição do tripitaka, assim conhecida com o coleção canônica budista, tradu­
zida no sânscrito para “coleção tripla”. Os sutras do rito m ahayana são quatro; o
sutra da sabedoria; da flor de lótus; do lótus sublime e o sutra do Buda Amina.

35
O sutra da sabedoria
Ensina que todo o corpo material ou imaterial existente não é solidamente
estável, e sim relativo. Aquilo que é percebido pelo sentido da visão, nada mais
é do que o acúmulo de energias que acabaram por se tornar a causa daquela exis­
tência. Mesmo tangíveis, todas as coisas são transitórias e a verdadeira sabedoria
consiste em que se reconheça esta verdade.

O sutra da flor de lótus


E talvez o sutra mais importante do rito m ahayana, propagando o budismo
com o o único caminho, ainda que se apresente numa vasta gama de correntes;
por meio das quais toda a humanidade pode chegar à salvação. Seu estilo literá­
rio é simples, resumindo-se em belas parábolas de fácil compreensão.

O sutra do lótus sublime


Adota a tese de que dentro de cada ser há uma porção da natureza do Buda;
e tudo o que existe e acontece está misteriosamente relacionado não havendo
na atmosfera qualquer existência absorta, que exista esparsamente e sem uma
interdependência.

O sutra do Buda Amida


Muda os conceitos anteriores, apresentando uma nova concepção de Buda
e de salvação. O Buda, nesta escola, é chamado Amida, que traduzido revela a
“vida infinita” e a “luz infinita”, divindade que é infinitamente misericordiosa.
Segundo seus adeptos, qualquer pessoa, por mais miserável, fraco ou pecador
que seja, se de forma devotada invocar seu nome com fé, alcançará salvação
segundo a misericórdia de Amida, para que, após a morte, possa renascer em seu
paraíso.

Budismo vajrayana
Também traduzido por “veículo do diamante”, é a corrente menos difun­
dida e que mais aponta diversidade com as origens do budismo, perseverando
em aspectos que mereceram apenas a crítica de Buda, ou seja, o ritualismo, a
mística e a magia. Reclam ou espaço como corrente budista no século V I, pro­
pagando-se posteriormente pela M ongólia e Tibete, onde é conhecido com o
Lamanismo, uma vez que reconhece a autoridade tanto política quanto reli­
giosa do dalai-lama, personalidade máxima no budismo tibetano.

36
A morte de Buda
Por estar atrelado a remotos períodos da antigüidade, é pela tradição que se
observa a história da morte do Buda por volta dos oitenta anos de idade. E parte
do enredo deste "ilum inado” que, em sua última peregrinação, deteve-se num
bosque nos termos de Kusíngara, o atual Nepal. Ananda, seu principal discí­
pulo, lhe preparou um modesto aposento entre as árvores para que repousasse,
m omento em que Sidharta teria pronunciado suas últimas palavras, que foram:
“Eu vos exorto: todas as coisas perecem. Lutar sem tréguas”.
Morto, o Buda, segundo a tradição, teria sido cremado e suas cinzas distri­
buídas pelo território, para serem guardadas como relíquias sagradas. Tem iní­
cio, a partir daí, a veneração budista.

O budismo pós Buda


Em bora os preceitos budistas não tenham a pretensão de possuir uma vali­
dade absoluta, contempla-se entre seus adeptos um ardor missionário bastante
expressivo. Esta filosofia propaga o próprio desejo de Buda, de que seu conhe­
cim ento fosse transmitido ao mundo e não restrito a um grupo específico no
meio budista. Duzentos anos após a morte do Buda, o grupo religioso passou a
se alastrar em regiões bastante além de suas origens; da índia para todas as
nações, apresentando um discurso que versa sobre a libertação de todos os
homens, a interpretação que ele havia desenvolvido do mundo, além de seus
princípios morais.
Esta filosofia explica ainda a luta de Buda para vencer os obstáculos cria­
dos pelas inúmeras e férteis civilizações que compunham a Ásia dentro da con-
temporaneidade de sua existência; entre elas a dos próprios indianos; dos indo-
chineses; chineses e japoneses, formando no transcorrer de um ano, uma
estruturada comunidade espiritual, o atual mundo budista.

A fidelidade budista
Embora encontremos diferenças nos objetivos dos leigos budistas, os cha­
mados upassakas, e que são muito inferiores ao ideal dos monges (bongos ), para
aqueles, Sidharta deixou recomendações específicas que vão além da lição pri­
meira da fraternidade, que no budismo se resume no sustento dos monges; ou
seja, que o bom leigo deve esmerar-se por exercitar três grandes virtudes, que são
a fé, a moral e a benevolência.
A fé, na concepção budista, é uma predisposição interior que propicia ao

37
hom em abrir o coração para a chamada “tríplice pedra preciosa”: o Buda; o
D harm a, que é a lei do budista e o Sangha; sua comunidade.
Esta fé, entretanto, permite ao budista acumular a prática de antigas reli­
giões nas quais desenvolveu crenças, podendo definir, dentre quantas desejar,
a qual divindade se devotará.
A parte moral consiste em respeitar cinco proibições, além da pratica m en­
sal de pelo m enos um dia de jeju m . Considerando uma fusão entre a fé e a
moral, alcança-se uma estrutura sólida para pôr em prática a terceira virtude,
que deflagra o sentim ento de bondade, despertando a compaixão para com
todos os seres vivos.
Soberanos e governantes praticam a benevolência valendo-se da facilidade
oferecida pelo cargo, realizando, por exemplo, obras públicas, com o estradas,
pontes, represas e plantações, enquanto que os monges preocupam-se exclusi­
vamente com o objetivo eterno de alcançar a perfeição pessoal, o que acaba por
torná-los, à vista dos não budistas, indivíduos anti-sociais, que ignoram todos os
seus semelhantes.
Já o bom leigo exercita-se nas chamadas virtudes ativas, servindo com o
voluntários em instituições de caridade, hospitais, doando esmolas, assisten-
ciando os doentes terminais e os velhos moribundos. E desta classe de leigos que
surge o “grande veículo”, já embebido de idéias altruístas e de profunda cons­
ciência religiosa.

38
Capítulo 5

CONFUCIONISMO

Introdução

O
confucionismo é uma religião de humanismo otimista,
grande representatividade e de imensa expressão social na
filosofia política da China. Seu fundador, Confúcio (551-
479 a.C.; grafia latina do nome Koung Fou Tseu, ou mestre Kung), fun­
dou esta norma religiosa por volta do século V a.C.
Embora este personagem histórico seja reconhecido como grande vulto
dentro da tradição chinesa, pouco se tem em matéria de informações no
que diz respeito a sua vida e obra. O documento de maior circulação que
pode informar a história a seu respeito, se constitui nos Analectos, coletâ­
nea que enumeram suas declarações, produzida pelos seus seguidores.
Informações adicionais sobre a vida deste líder chinês emergem num
período posterior, revelando pontos ainda não conhecidos sobre sua bio­
grafia, todavia, este mesmo material acabou por não ser reputado como
totalmente verdadeiro. Mesmo assim, alguns fatos históricos expostos
neste material pareciam ter coesão com os elementos fáticos ocorridos, já
que demonstravam aspectos peculiares ao pensador que deu vida a suas
muitas idéias, às quais, uma vez reunidas num conjunto de normas, atri­
buiu o nome de confucionismo.
O princípio básico do confucionismo é conhecido pelos chineses
como junchaio (ensinamentos dos sábios) e define a busca de um
caminho superior ( tao) como forma de viver bem e em equilíbrio
entre as vontades da terra e as do céu.
Confúcio foi mais um filósofo do que um pregador religioso. Suas
idéias sobre como as pessoas devem comportar-se e conduzir sua espi­
ritualidade se fundem aos cultos religiosos mais antigos da China, que
incluem centenas de imortais, considerados deuses, criando um forte
sincretismo religioso.

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O confucionismo foi a doutrina oficial na China durante quase dois
mil anos, do século II até o início do século XX. Fora da China, a maio­
ria dos confucionistas se encontra na Ásia, principalmente no Japão,
Coréia do Sul e em Cingapura.

A vida de Confúcio
O mais novo dentre os onze irmãos, Confúcio nasceu com C hiu King, na
região de Lu, atualm ente em Xantung. Teria sido contem porâneo de Buda,
muito embora a história não registre um encontro pessoal entre esses dois per­
sonagens, que existiram num período imediatamente anterior aos filósofos gre­
gos Sócrates e Platão.
Pouco se sabe a respeito de sua família e modo de vida na infância, a não ser
o fato de que teria se originado numa comunidade humilde, o que ele mesmo
declara em suas obras, afirmando: “Quando eu era jovem, não tinha posição
social e vivia em circunstâncias humildes”.
C om a morte do pai logo após seu nascimento, o pequeno Koung Fou Tseu
passou a ser criado apenas por sua mãe, sendo introduzido, na sua juventude,
em várias atividades sociais de sua comunidade, com o a caça e pesca, mas, dizia
ele: “...quando cheguei aos quinze anos, voltei minha m ente para a erudição...”.
Foi admitido numa repartição pública, aos moldes de sua época, sendo-lhe
atribuída a função de coletor de impostos, quando ainda não havia atingido duas
décadas de vida. Ainda neste período casou-se, mas foi um relacionamento de
curta duração, culminando com divórcio. Esta rápida relação gerou um casal de
filhos a Confúcio.
Aos trinta anos ingressou no corpo docente, lecionando filosofia e política
social, atividade que revelou seu potencial como mestre, rendendo-lhe fama e
provendo o surgimento de um primeiro grupo de seguidores.
Preso a uma certa presunção acreditava ser necessário ocupar um cargo de
maior expressão social, sem o qual, jamais se observaria uma mudança signifi­
cativa na sociedade do meio no qual habitava. Confúcio reconhecia que esta
seria a única forma de pôr em prática seus objetivos. Apesar de sua am bição, teve
de amargar cargos secundários no serviço público por cerca de quinze ou vinte
anos, até que, após meio século de vida, conquistou um alto cargo de oficial no
governo de Lu.
Embora o cargo o habilitasse à exposição de suas idéias, defrontou-se com
severa oposição de seus superiores, resignando-se, após esta experiência, às tarefas
concernentes ao seu posto. Passou então a peregrinar pelas províncias adjacentes

40
com o intuito de difundir suas idéias na sociedade, realidade que ocupou sua vida
por treze anos.
A falta de êxito neste objetivo o enclausurou em seus cinco últimos anos de
vida, para que pudesse expressar suas idéias por escrito, tratado de conceitos que
se tornaria a mais clássica e conhecida obra literária desta classe religiosa. Os
analectos.
C onfücio morreu em Chufou, província de Xantung, em 479 a.C ., mas
não antes de ter se sagrado como o mais importante mestre da cultura chinesa.

Doutrina
No confucionismo não existe um deus criador do mundo, nem uma igreja
organizada ou sacerdotes. O alicerce místico de sua doutrina é a busca do Tao,
conceito herdado de pensadores religiosos anteriores a Confúcio.
O tao é a fonte de toda a vida, a harmonia do mundo. No confucionismo, a
base da felicidade dos seres humanos é a família e uma sociedade harmônica. A
família e a sociedade devem ser regidas pelos mesmos princípios: os governan­
tes precisam ter amor e autoridade com o os pais; os súditos devem cultivar a
reverência, a humildade e a obediência de filhos.
O fundador esclarecia que o ser humano deveria cultuar seus antepassados já
extintos, numa representação que se exigia do prolongamento do respeito que se
tinha pelos pais ainda vivos. O homem, de acordo com esta doutrina, é composto
por quatro dimensões: o eu, a comunidade, a natureza e o céu - fonte da auto-rea-
lização definitiva.
Pregava tam bém o que considerava “as cinco virtudes essenciais do ser
hum ano”, as quais relacionou em amar o próximo, ser justo, comportar-se ade­
quadamente, conscientizar-se da vontade do céu e cultivar a sabedoria e a since­
ridade desinteressadas.

Princípios doutrinários
E possível traçar um sumário referente às doutrinas do confucionismo, que
esteja preso aos seus termos-chave ou caminhos. O ]en é reconhecido com o
regra áurea; o Shung-tzu é o cavalheiro; Cheng-ming, é aquele que desempenha
um papel; Te, é o poder da virtude; Lí, é o conceito de padrão de conduta e o
Wen são todos os elementos que abrangem as artes pacíficas.
U m a abordagem superficial sobre estes princípios é capaz de revelar a
estrutura doutrinária básica da crença confucionista. Vejamos:

41
]en
Discorre sobre os conceitos que abrangem a humanidade, a bondade e a
com placência do homem para com o homem. Jen, neste aspecto, se constitui
na regra maior; a norma que reflete a reciprocidade, ou seja, que exorta a não
atingirmos alguém da forma com o não gostaríamos de ser atingidos.
Os analectos apresentam um diálogo entre Tzu-Kung e Confúcio, em que
aquele lhe indaga: “Seria possível definir numa só palavra qual a conduta que
deve ter o hom em durante sua vida?”, ao que respondeu C onfúcio: “Talvez,
Shu, isto é, Não imponhas aos outros o que tu mesmo não desejas”. (C onfúcio;
15.24; Os analectos). Esta seria a virtude maior segundo o confucionismo, que
compreende o exercício desta regra com o antídoto para a guerra e a intolerân­
cia mundiais.

Chun-tzu
Pode ser traduzido por “hom em gentil” ou “hom em em seu m elhor
aspecto”. Os ensinamentos de Confúcio tinham por alvo o hom em de virtudes,
ao qual o mestre se referia em termos de que, aquele que pudesse pôr em prá­
tica as “cinco normas”, seria digno de ser chamado “hom em em seu melhor
aspecto”. Estas cinco normas são a humildade, magnanimidade, sinceridade,
diligência e cortesia.
A humildade livra do escárnio; a magnanimidade atrai os semelhantes, a
sinceridade desenvolve confiança entre os que o rodeiam e a cortesia o favorece
diante de seus subalternos. O hom em que baseia sua conduta nesses preceitos
é aquele que pode mudar a sociedade.

Cheng-ming
Outro im portante conceito que consiste na correção do nome. É neces­
sário segundo Confúcio, para que haja uma sociedade que habite na ordem,
que cada integrante desse grupo desempenhe o papel que lhe cabe, para que,
em consequência, um rei haja com o um rei e um cavaleiro haja com o cavaleiro.
A este respeito se estabeleceu outra discussão, desta vez, entre o mestre e o
duque C híng de Sh'i, que indagou C onfúcio sobre a questão do governo,
obtendo como resposta: “Que o governante governe, que o cidadão ocupe seu
espaço, que o filho seja filho e o pai seja pai”. (C onfúcio, 12.11; Os analectos). E
do repertório temático de Confúcio, ainda a seguinte declaração: “Disse Tzu-lu:
Se o senhor Wei deixasse a você a administração de seu Estado, o que reputarei
como maior em importância? Resposta do mestre: "S e algo tiver de ser posto em
primeiro lugar, seria a retificação dos nomes”. (C onfúcio , 13.13; Os analectos).

42
Te
Este termo se traduz, literalmente, por “poder”, mas seu conceito dentro
confucionismo é bem mais amplo. Trata, por exemplo, do poder para governar.
D e acordo com Confúcio, esta expressão traduz muito mais do que mero
poder físico e, talvez por isso, haja a necessidade de que os detentores deste
poder sejam homens virtuosos ( C hun-Tzu), com potencial para induzir seus
súditos à obediência, por m eio de um m odelo irrepreensível de virtudes.
Enquanto Confúcio atuava entre os homens, esse entendimento extraviou-se,
posto que em sua época a força física era tida com o a única forma eficaz de se
ordenar a sociedade.

Li
Este era um dos vocábulos-chave de Confúcio. Seu significado vai além de
uma mera tradução específica e, cada uma de suas interpretações deve estar
atrelada aos contextos de sua aplicação. E le pode significar propriedade, reve­
rência, cortesia, ritual ou padrão ideal de conduta.
No livro de cerimônias do confucionismo, o L i-Chi, discute-se o conceito
sobre este vocábulo nos seguintes termos:
Diálogo de Ai, o duque, a Confúcio: “Qual é o grande Li? [...] Porque você
fala sobre o Li com o se fosse algo importante?” Resposta: “Seu humilde servo
não é capaz e nem digno de compreender o L i”.
A partir daí prosseguiu C onfúcio discorrendo sobre todo o seu aprendi­
zado, esclarecendo que, aos seus olhos, de todas as coisas pelas quais as pessoas
vivem, o Li é a maior. Sem ela não saberiamos com o adorar devidamente os
espíritos do universo, ou como especificar com exatidão qual seja a função que
cabe ao monarca e seus ministros, ou com o definir diferentes graus de relação
em famílias, por isso que um Chun-Tzu (“hom em gentil”) dá tanto valor ao Li.

Wen
Este conceito está ligado às artes pacíficas, aquelas às quais Confúcio dava
tanto valor. Neste ramo se inclui a música, a poesia e demais modalidades artís­
ticas típicas da cultura chinesa.
Confúcio condenava a cultura contemporânea, por acreditar que ela não
trazia qualquer virtude inerente aos seus ensinamentos. Quanto a isso, decla­
rava: “Por certo, quando alguém diz: os ritos, os ritos, não devem estar destaca­
dos apenas em presentes de jade ou de seda, da mesma forma que quando
alguém diz: a música, a música, não pode estar preso ao pensamento de sinos e
tambores...”

43
Dada esta verdade confucionista, presumia-se que aqueles que desprezassem
as artes pacíficas estariam desprezando os caminhos virtuosos do homem e o pró­
prio céu.

Escritos sagrados
Durante o período em que atuou como docente, Confúcio reuniu numa cole­
ção escritos antigos, os quais editou, adicionando-lhes comentários. Distribuiu
esses manuscritos em quatro livros, incluindo a estes um quinto volume, escrito de
próprio punho.
Esta coleção alcançou renome entre os confucionistas sob o título Os cinco
clássicos, que não eram conforme os que existem à disposição atualmente, haja vista
as inúmeras edições e alterações que julgou-se cabíveis, distorções do original pro­
movidas pelos próprios seguidores de Confúcio. Muito dessas obras, entretanto,
tiveram a originalidade preservada, de acordo com aquilo que havia sido transmi­
tido por Confúcio. São eles:

O livro das m udanças - í Ching


Este livro é composto por uma coletânea de oito triagramas e mais sessenta
e quatro hexagramas de linhas unicam ente quebradas ou não quebradas, as
quais, para os seguidores originais, tinham um grande significado para aqueles
que fossem capazes de desvendar a chave das mesmas.

O livro dos anais - Shu K'ing


Traz a história das cinco dinastias anteriores, além do exemplo deixado
pelos antigos, tidos como cruciais para a compreensão da m ente de Confúcio
quanto ao seu conceito sobre a conduta do hom em superior.

O livro da poesia - Shih Ching


A poesia antiga foi montada numa coleção por Confúcio, por acreditar que a
leitura de poemas colaborava com a construção de um caráter que formava homens
virtuosos.

O livro das cerimônias - Li C hi


D irigido exclusivam ente ao hom em superior, para ensiná-lo a agir de
forma correta e com respeito às tradições. Confúcio acreditava ser importante
imitar o exemplo dos ancestrais.

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Os anais da primavera e do outono - C h 'um C h 'iu
Sua autoria, segundo a tradição dos antigos, é atribuída a Confúcio, mas há
divergências. Este volume comentava os eventos ocorridos na província de Lu,
contemporaneamente ao mestre.

Ensinamentos de Confucio
Nenhum dos escritos que com põem esta relação contém os ensinamentos
tipicamente confucianos, mas constituem uma antologia com base na qual o
mestre transmitiu seus preceitos na forma em que chegaram até nós, por meio
das obras produzidas por seus discípulos, que são:

Os analectos
Forma a fonte mais importante desta crença, da qual podem-se extrair dados
a respeito de Confucio, e está composto de declarações tanto dele quanto de seus
discípulos.

A grande erudição
Trata da educação e do treinamento que se aplica àquele cujo plano de vida
alm eja o título Chun-Tzu , ou “hom em gentil”. Esta obra, porém, não é atri­
buída ao fundador do confucionismo, o que se prova pelo fato de advir de um
período posterior a sua existência (250 a.C .).

A doutrina da m oderação
Refere-se ao relacionamento existente entre a natureza humana e a ordem
natural do universo. Também forma uma coleção de escritos alheia a Confúcio
e cuja escrituração não possui origem autoral específica, mas, entre os cogita­
dos, acha-se um neto de Confúcio, Tzu-Ssu.

O livro de mêncio
M êncio era um aplicado discípulo e propagador dos ensinamentos de C on­
fúcio, e teria redigido este volume por volta do ano 300 a.C ., colecionando ensi­
nos da época confuciana e tentando acomodá-los de forma ordenada em sua
publicação. Esse trabalho de grande impacto expõe uma visão idealista da vida,
procurando ressaltar a bondade que, segundo M êncio, é imprescindível à natu­
reza humana.

45
Capítulo 6

TAOÍSMO

Introdução
emelhantemente ao confucionismo, o taoísmo também encontra

S suas origens em território chinês, contrastando, entretanto, seus


princípios éticos e humanísticos com aqueles ditados por Confucio
em seus ensinamentos. Ainda outros aspectos que o diferenciam do confu­
cionismo é a observância das crenças místicas e enigmáticas, características
que derivaram de uma figura igualmente mística e enigmática - Lao-tsé.
O taoísmo tem suas raízes nesta figura misteriosa; alguém de cuja histó­
ria pouco se sabe e, mesmo o que é conhecido, carece de credibilidade.
Alguns expositores históricos vão além e chegam a questionar a existên­
cia desta personagem épica, o que se acha fundamentado nos incertos
relatos de seu nascimento, que varia em mais de meio sécido (entre 604
e 570 a.C.).
Um registro lendário relata que Lao-tsé nunca foi jovem e o apresenta,
desde o seu nascimento, como um ancião de cabelos e barba brancos
e o corpo coberto por uma pele rugosa.
Uma outra história derivada desta cultura religiosa, conta sobre o ape­
lido hilário aplicado pela sua mãe, que o tratava por “orelhas de amei-
xeira”, codinome que se embasava no seu nascimento, dado que ele
teria nascido embaixo de uma ameixeira, destacando a característica
anatômica verificada em Lao-tsé, isto é, orelhas enormes.

Desenvolvimento
Seu nome está relacionado à personalidade social que a comunidade reco­
nhecia nele, sendo que Lao-tsé significa “velho filósofo”. Ocupou cargos de
confiança com o zelador dos arquivos do império chinês, na cidade de Loyang,
capital da província de C h'u .

46
A posição estatal do “velho filósofo”, entretanto, tomou-o de uma fadiga
que estava instalada não em sua carne, mas em seus valores. Isso porque a admi­
nistração estatal de sua época agia de forma tirânica para com os súditos do
império, e isso se refletia no próprio conceito de governo que as autoridades
locais possuíam.
Partindo destes valores particulares, Lao-tsé passou a expor suas idéias con­
cernentes a uma forma de vida mais modesta com o padrão a ser seguido pelos
homens; divorciando-se das honrarias e sem necessidade de uma busca infrutí­
fera pelo conhecim ento. Este posicionamento culm inou com a demissão de
seu cargo, recolhendo-se em seu lar.
Uma vez que seus discursos já haviam sugado estudantes e discípulos inte­
ressados, espécie de movimento que dispensava, viu-se obrigado a alongar-se do
lar estabelecido entre a civilização, para poder buscar paz e meditação longe de
todos.
Adquiriu então uma carroça e um bovino negro e partiu, abandonando a
sociedade na qual estava inserido e que reputava demasiadamente corrupta.
Porém, foi impedido pelo amigo Yin-hsi, que após tomar parte em seu plano,
obstruiu-lhe a passagem. Este amigo resolve exortá-lo com palavras que o inti­
mavam a inscrever todos os pontos essenciais de seus ensinamentos para que,
após sua partida, todos tivessem acesso, já que esta era a marca que o identifi­
cava entre todos.
Foi nesta oportunidade que Lao-tsé redigiu o T ao Te King, ou “o caminho
e o seu poder”, outras vezes traduzido por “o caminho e o princípio moral”.
Diz-se que após a entrega deste documento ao requerente amigo, Lao-Tsé
teria subido a montaria com destino ao pôr-do-sol, encerrando neste episódio
sua lem brança entre o povo.
Uma segunda versão mostra o amigo Yin-hsi instando com ele para que o
levasse consigo, após ter lido o tratado a pedido redigido, porém, qualquer que
tenha sido o real enredo, certo é que a obra foi deixada para trás, passando a ser
reconhecida como a primazia literária do taoísmo.

Escritos sagrados
O tratado escrito por Lao-tsé, que acabou tomando este mesmo nome, é
um pequeno compêndio contendo aproximadamente cinco mil e quinhentas
palavras, que propõe, segundo os valores do autor, uma modalidade de governo
feito com arte, pretensamente escrito para as autoridades da época.
Seu tratado tenta implantar entre os dirigentes, um governo que se fortifi­

47
casse naturalmente e não baseado na tirania. Essa idéia obviamente não alcan­
çou o respeito e, menos ainda, a adesão de qualquer governante contemporâneo.
O Tao Te King também tem seu lado filosófico orientando seus portadores a
correta forma de procederem para resistirem aos terríveis flagelos que, à época,
assolavam a C hina. Seu conteúdo é tímido, sem a pretensão com um que se
observa em obras filosóficas, colocando o homem num plano inferior, exata­
mente para supostamente ajudá-lo a destituir-se das ambições e capacitando-o a
resistir ante as adversidades.
Os estudiosos e historiadores ainda não chegaram a um consenso quanto à
data da escrituração deste compêndio, embora tradicionalmente se aceite que o
livro tenha sido escrito por Lao-tsé, contemporâneo de Confúcio, no século VI
a.C. Esta data encontra amparo no volume Shin-chi, biografia de Lao-tsé, tam­
bém conhecida com o “registros do historiador”, escrito por volta de 100 a.C.
A idéia mais recente sobre este volume qualifica-o como sendo uma com ­
pilação datada de 300 a.C . O ambiente que se vislumbra na história que serve
de referencial para o texto, está em maior conformidade com uma C hina atri­
bulada do que com o período que historiadores tradicionalistas defendem.

Chuang-tsé
Depois de Lao-tsé, esse é o mais importante representante dessa ordem reli­
giosa. Trata-se de um famoso discípulo do fundador e autor de expressiva pro­
dutividade que viveu no século IV a.C. Escreveu aproximadamente trinta e três
títulos. Seu talento com a escrita possibilitou-lhe divulgar com considerável
habilidade as doutrinas de Lao-tsé, de uma maneira assemelhada àquela com a
qual M êncio honrou a escola deixada pelo seu predecessor, Confúcio.
As explanações de Chuang-tsé sobre a matéria derivada do taoísmo eviden­
ciam seu caráter filosófico, o qual ele ajudou a popularizar. Podemos constatar
isso em suas próprias palavras, quando diz: “C erta feita, eu, C huang C hou,
sonhei que era uma borboleta e que me sentia feliz como uma borboleta [...]
Subitam ente, despertei, e lá estava eu, um bem visível Chou. Não sei dizer se
foi Chou quem sonhou que era uma borboleta, ou se uma borboleta sonhou
que era Chou. Entre Chou e uma borboleta deve haver uma distinção. Chama-
se isso de transmutação das coisas”.1
A respeito da morte de sua companheira, afirmou: “...Quando ela morreu,

1 Wing-Tsit Chan, editor, A sourcebook in C hinese Philosophy, Princeton Universitv Press:


Princeton, Nova Jérsei, p. 190.

48
com o poderia deixar de ser afetado? Mas quando repensei sobre a questão, per­
cebí que, originalmente, ela não tivera vida, e não somente não tivera vida, mas
tam bém não tivera forma, e não somente não tivera forma, mas tam bém não
tivera força material. No limbo, entre a existência e a não-existência, houve uma
transmutação, e a força material evoluiu...”.2
Estas colocações refletem o quão este discípulo primava pela responsabili­
dade filosófica quanto à fundamentação dos ensinos de Lao-tsé para o taoísmo.

O Tao
O conceito principal do Tao Te King é aquele que se refere ao Tao, o qual
não permite a simplicidade em sua elucidação, uma vez que, com o a palavra
“Tao” literalmente signifique “cam inho” ou “vereda”, é certo que seu pensa­
mento vai muito além disso.
Assim, as palavras de abertura do Tao Te King, numa explanação um tanto
complexa, exprimem que o Tao (caminho) que porventura possibilite sua própria
compreensão, não pode ser o verdadeiro Tao (caminho). O entendimento deste
conceito se firma na tese que diz que o nome que pode ser pronunciado não pode
ser um nome verdadeiro.
Vemos na famosa declaração taoísta o seguinte: “Aqueles que sabem, não
dizem; e aqueles que dizem, não sabem”. Por se expor dessa forma, a palavra Tao
é reputada como sendo da língua de origem, expressão e significado misteriosos;
acima de toda a compreensão, imaginação e bom senso humano. Todavia, é
daqui que se parte se o adepto desejar encontrar o cam inho para a realidade
última, ou seja, a verdade máxima sobre toda a existência. Seria, num conceito
mais simplificado, o caminho do universo, aquele através do qual o indivíduo
teria condições de dirigir sua vida.
Q uanto a este tem a, levanta-se a questão: Dada a com plexidade que
envolve toda a aura taoísta, com o poderia alguém basear, estruturar ou alinhar
sua vida a partir do Tao? Se a filiação ao “caminho do Tao” é o alvo a ser seguido
pelo hom em , com o deverá proceder o indivíduo para alcançá-lo?
A resposta taoísta para estes questionamentos previsíveis é verificada no
próprio Tao Te King, que descobre esta possibilidade aos seus seguidores,
mediante o exercício da iniciativa básica, a qual se denomina Wu Wei, signifi­
cando, literalmente, “inação”.
Este princípio abom ina toda forma de violência, seja física, verbal ou

^ Idem, p.209.

49
mesmo aquela que reside apenas em nosso inconsciente. O homem então tem
de cultivar atitudes espontâneas, promovendo uma existência pacífica entre os
demais, distanciando toda forma de tensão e agressividade e possibilitando uma
convivência harmoniosa entre o homem e a natureza. Esta é a única autêntica
manifestação de vida que está genuinamente alicerçada no Tao.

Yin e o Yang
Esta característica taoísta recebeu simpatia da comunidade confuciana,
com apreço tanto pela secção filosófica quanto pela parte estritam ente reli­
giosa.
Não obstante, mesmo que todas as coisas fluam do Tao, existem elementos
que se opõem mutuamente, com o o bem e o mal; a vida e a morte. A parte posi­
tiva destacada por este conceito é o “Yang”, oposto ao seu lado que exprime
negatividade, o “Yin”. A contraposição pode ser claram ente expressa quando
comparamos situações cotidianas da sociedade, com o nos exemplos abaixo:

Yang Yin
Verão Inverno
Vida Morte
Bom Mau
M acho Fêm ea
Positivo Negativo
Luz Trevas
Atividade Passividade

Cada um destes princípios é interdependente e expressa de forma diversa


o Tao. A participação do homem neste princípio está referido com o “misturar-
se com o ciclo universal, todavia sem esforçar-se, unindo-se ao Tao, e portanto,
alcançando o objetivo”.
Originariamente do território e da cultura chinesa, surgiu um conceito de
maior amplitude a respeito do Yin e do Yang, o qual ensina que uma vida har­
mônica pode ser adquirida tão somente quando operamos de modo a permitir
que estas duas forças interajam.

Taoísmo filosófico
A história mostra-nos que o taoísmo seguiu por dois caminhos diferentes. O
taoísmo que se ampara na filosofia tem suas origens anotadas em 300 a.C . e des­
creve o Tao com o a fonte da verdade última, isto é, inatingível e inabalável, ten­


tando instalar o homem numa relação harmoniosa com a natureza, para permi­
tir-lhe o livre exercício de suas faculdades instintivas e imaginárias.

O taoísmo religioso
Já sua corrente religiosa m arcou seu início aproximadamente no século
II d. C ., oportunidade na qual o imperador Hwan determ inou a construção
de um tem plo em hom enagem a Lao-tsé. A partir daí, foi este o lugar desig­
nado para que se lhe oferecesse oferendas. O reconhecim ento com o institui­
ção religiosa devidamente estabelecida, só veio depois, por volta do século
V II d.C.
Esta modalidade passou a contar com seus próprios escritos sagrados, com
um sacerdócio, templos e discípulos, desfrutando todos de uma crença prevista
para os tempos últimos, o qual surgiría uma nova Era que suplantaria a ordem
anteriormente estabelecida.
Durante o desenvolvimento desta corrente, implantou-se gradualmente o
panteão de deuses, formando-se consenso sobre a existência do céu e do
inferno, culminando, quase que num último estágio de desenvolvimento reli­
gioso, com a deificação do precursor Lao-tsé.

Cronologia taoísta
212 a.C.
E procedida a queima de toda a literatura confuciana pelo imperador Shi
Huang T i, estabelecendo definitivam ente o taoísm o, além de enviar frotas
navais à ilha de Formosa, cujo objetivo era descobrir uma determinada erva da
imortalidade.

ld .C .
A liderança taoísta da China tenta produzir a tão desejada fórmula da imor­
talidade.

156 d.C.
EIwan, imperador chinês, inicia a prática de oferendas a Lao-tsé.

5 7 4 -5 8 1 d.C.
O imperador Wu organiza uma relação religiosa ficando estabelecidas: I a
confucionismo; 2a taoísmo; 3a budismo. Sua desilusão com as duas últimas pro­
fissões de fé o leva a aboli-las, todavia, o próximo imperador, Tsing, restabelece-
as assim que assume o trono.

51
6 5 0 - 6 8 4 d.C.
Lao-tsé é canonizado na qualidade de imperador e seus escritos são instituí­
dos entre as matérias que determinavam os exames para ocupação de cargos
governamentais.

7 1 3 -7 4 2 d.C.
Kai Yuen, imperador chinês da época, distribui cópias do Tao Te King a
todos os súditos do império, efetuando ainda a ingestão de determinada medi­
cação taoísta denominada “pedra dourada”. M ultiplicam -se, a partir daí, as
artes mágicas.

8 3 5 - 8 2 7 d.C.
O imperador Pao-Li expulsa todos os médicos taoístas por não concordar
com a discórdia promovida pelos mesmos e as muitas dissensões instaladas por
eles entre o povo, enviando-os para as duas províncias mais ao sul da índia.

8 4 1 - 8 4 7 d.C.
Wu Tsung, tam bém imperador chinês, determina o fecham ento de todos
os monastérios budistas e taoístas, todavia, restabelece o taoísmo mais tarde
reputando-o favorável ao império. Ao budismo, entretanto, reputou religião
estrangeira, estigmatizando-a. Ingere a medicação taoísta na esperança de que
seus ossos se tornem em sublime pureza para que nesta esperança sonhasse com
a possibilidade de voar.

1 6 6 1 -1 7 2 1 d.C.
O imperador Kang Hsi ordena a punição dos taoístas declarando-os char-
latães, punição que tam bém deveria ser estendida a todos que se submetiam
com o pacientes. D ecreta proibição as reuniões e manifestações públicas do
taoísmo, enxugando as suas inúmeras ramificações já existentes.

1900 d.C.
O corre a revolução dos cham ados “boxers”, uma ardente ram ificação
taoísta, os quais criam na imunidade de seus corpos aos projéteis balísticos dis­
parados pelas armas dos estrangeiros, por aceitarem literalmente as palavras exa­
tas do fundador: “Quando vier entre soldados, ele não precisará tem er nem
armas nem armaduras...”.
Capítulo 7

XINTOÍSMO

Introdução

O
riginalmente o xintoísmo não possuía nome, doutrina nem
dogmas. Constituía-se de um conjunto de ritos e mitos que
explicavam a origem do mundo, do Japão e da família impe­
rial. Os protagonistas desses mitos eram os Kamis, deuses ou energias
divinas que habitam todas as coisas e se sucedem por gerações, desde
a criação do mundo. Recebe o nome de xintoísmo (caminho dos deu­
ses) para distinguir-se do confucionismo e do budismo.
O xintoísmo é a religião principal dos japoneses, reconhecida pelo
Estado como sendo a oficial. Ela também é uma das profissões de fé
mais antigas do mundo.
Sua peculiaridade em relação às demais se define por não se tratar de
uma instituição baseada em um sistema exclusivamente de crenças,
possuindo mais de uma definição, dentre as quais uma delas enxerga a
religião como uma maneira muito familiar de vida e que também se
associa a lugares familiares.
Entre os nipônicos, o amor à pátria é, em primeiro lugar, proveniente
do coração, como ocorre entre todas as outras nações, mas, em
segundo plano, acha-se ligado às questões doutrinárias do xintoísmo.
Noutra definição, o xintoísmo surge revelando práticas religiosas tra­
dicionais que também se originam no Japão, desenvolvendo-se natu­
ralmente entre seus nativos, os quais aprendem a aplicar seus valores e
atividades diárias a conceitos que se relacionam com a questão reli­
giosa, formando então a receita que propaga todo o conjunto.
Ainda segundo esta definição, expõe-se um xintoísmo que não goza de
um corpo doutrinário bem definido e dotado de organização, nem
tampouco um código de conduta coeso e sistemático.

53
Suas raízes rememoram épocas longínquas, quase inacessíveis aos
mais jovens, revestindo-se de toda nostalgia de períodos imemoráveis
da história japonesa. Entretanto, desde que o povo japonês tomou
ciência da posse de valores culturais próprios e da quase sacralização
de suas tradições, passaram a testemunhar que estas mesmas tradições,
práticas, atitudes e patriotismo, foram se condensando para que,
imperceptivelmente, apresentassem um xintoísmo já devidamente
formado.

História do xintoísmo
Com o religião puramente japonesa e considerando a antigüidade desta
nação, constatamos que sua fundação tam bém jaz num período remoto.
O amor e o respeito que o povo japonês declina em louvor aos seus arqui­
pélagos fomentam a crença de que desta região tenha principiado toda a cria­
ção divina, idéia que percorre a linha do tempo da história xintoísta, junta­
mente com seus conceitos inaugurais.
Este idealismo nacional e amor pátrio são os pontos de maior relevância
quando o assunto é a presença exclusiva desta cultura religiosa apenas em solo
japonês. A crença a respeito da divindade deste território, embora antiga, surgiu
como dogma bem mais tarde.
Nessa condição, a crença proporcionou a revelação de mais uma faceta do
patriotismo japonês, a qual trata sobre o suposto fato de que nenhuma outra nação
no mundo é divina. Atrelado a isso, também surgiu a crença na divindade (deus)
de sua terra, a qual é tão especial e sem par, mas também tão ausente dos outros
lugares do globo, que os leva a dizer que o Japão seria “o centro do nosso universo
de fenômenos”.
É dessa crença que surge o nome do país, dado pelos próprios nativos: Nip-
pon, significando “a origem do sol”.
Enquanto durou a segunda guerra mundial, era com um o ensino que trans­
mitia aos pequenos a respeito da procedência divina dos imperadores japone­
ses, supostamente provenientes da deusa Amaterasu. Ainda segundo a tradição,
essa deusa teria concedido à casa imperial japonesa o direito divino de governar,
entretanto, esta prerrogativa encontra seu fim em 1946, quando o imperador
Hiroito repeliu este suposto direito divino de administração temporal.

Religião oficial
O imperador japonês M eiji estabeleceu o xintoísmo com o religião oficial

54
do Japão, substituindo então o budismo, entretanto, com o se mostrava patente
a simpatia do povo por muitos dos cultos e práticas budistas, em 1877 o gover­
nador admitiu aos conservadores budistas a prática de seus rituais em solo japo­
nês. Esta concessão impulsionou, dois anos mais tarde, a decretação da com ­
pleta liberdade religiosa.
O xintoísmo oficial, classificado por todos como ritual patriótico que descon­
sidera as predileções religiosas de cada indivíduo, homenageia seu imperador,
cuja decretação se dá em 1882. Esta oficialização visava atender aos interesses prá­
ticos da sociedade/Estado. Depois do sucesso militar japonês na primeira grande
guerra, entre 1914 e 1918, implanta-se novamente na comunidade o conceito de
personalidade divina que sempre se atribuiu ao imperador, mas a derrota de 1945,
durante a segunda guerra mundial, condenou o xintoísmo à abolição quanto a sua
oficialidade religiosa.
Esta queda retirou das mãos do Governo a administração dos santuários
xintoístas, determinando até os tempos hodiernos, uma manutenção patroci­
nada pela iniciativa privada nacional japonesa.

O que significa “xintoísmo”


O vocábulo nipônico shinto se origina em uma nom enclatura chinesa
transcrita com o shen-tao, ambas traduzidas por “caminho dos deuses”. Todavia,
a aplicação deste termo à religião japonesa só ocorreu no século VI d.C., e isso,
com a finalidade de evidenciar sua distinção do budismo.
C om relação à term inologia, vale destacar uma característica xintoísta
única, que se refere à noção que se tem de Kam i que, essencialmente, refere-se
ao conceito do poder sagrado que crê-se existir tanto no inanim ado quanto
naquilo que tem vida.
Eruditos da fé xintoísta definiram o termo Kam i e seu significado, expli­
cando que esta religião mostrava - e prossegue mostrando - um poderoso senso
de presença de deuses e de espíritos que estão ligados à natureza, aos quais se
atribui o termo Kam i, traduzido nesta ótica por “seres superiores”, o que propi­
cia a veneração a estas personalidades do além.
O contingente declarado destes seres impossibilita a criação de um rol sis­
temático que sirva a uma organização na adoração e mesmo planejar uma hie­
rarquia sistematizada, de forma estável. Porém, entre tantos personagens, obvia­
m ente se destaca uma, a “deusa sol”, Amaterasu, que já ocupa o centro do
panteão xintoísta há muito tempo.
O Xintoísmo prega que o primeiro “deus” celestial teria dado orientações a

55
Izanagi e a Izanami, divindades m acho e fêmea do panteão japonês, para que
criassem o mundo e em particular as ilhas que compõem o território japonês, o
que os expositores xintoístas revelaram posteriormente serem uma mesma coisa.
Em pregando, segundo a crença, o processo de geração sexual, criaram
então a terra, os kam i (deuses) dos montes, das árvores e dos riachos, o deus do
vento e o deus do fogo, assim prosseguindo até a constituição completa do pla­
neta. Amaterasu é uma divindade que parece não gozar a eternidade, vinda à
existência eventualmente, acumulando ainda o título de “grande deusa do sol”.
Mesmo considerando suas personagens que usufruem poderes de divinda­
des, a linha que as separa dos homens é por demais estreita. Os japoneses xin­
toístas acreditam que descendem dos kam i (deuses), e que a linhagem dos
imperadores deriva de uma potestade superior, que seria a própria Amaterasu.
Ela teria enviado seu filho, Ni-ni-gi, para a terra (Japão), a fim de governá-la em
seu lugar, providência que determinou a procedência da linhagem imperial
japonesa. Foi esta tradição que impôs em tempos hodiernos um xintoísmo que
determinou a expansão nacionalista.
Outra divisão quase nebulosa é verificada entre os kam i (deuses), que
supostam ente se dividem entre os pessoais e os impessoais. Os impessoais,
segundo a classificação xintoísta, deriva do fato de eles não serem associados a
lugares ou coisas particulares, o que atribuiría personalidade a estas entidades.
Além disso, vale tam bém ressaltar que a mitologia que cerca alguns deuses e
deusas é estritamente antropomórfica, isto é, procura atribuir forma humana a
santidades às quais se devotam.

Escritos sagrados
Em bora os xintoístas não cultivem a crença de que volumes isolados pos­
sam apresentar veracidade quanto a revelações plenamente inspiradas, e sobre
as quais a religião esteja alicerçada, atribuem sacralidade a dois volumes de sua
literatura, os quais exercem influência sobre o comportamento do povo. São
eles: O Ko-ji-ki, ou “registro das questões antigas” e Nihon-gí, as “crônicas do
Japão”.
A escrituração de ambas é atribuída a uma mesma época e data aproxima­
das (720 d.C .), e se prestam a narrar os eventos sucedidos no Japão cerca de mil
e trezentos anos antes, antecedência que não as impede de serem classificadas
com o obras recentes, posta a antigüidade histórica do xintoísmo.

Ko-ji-ki
O Ko-ji-ki, porém, é o mais antigo documento escrito de que se tem conheci­

56
mento no idioma japonês, estando eivado de mitologia, lendas e enredos históri­
cos ligados ao desenvolvimento desta civilização, aos antepassados dos imperado­
res e à corte imperial, considerando uma data um pouco mais precisa para sua
redação, 712 d.C.

Nihon-gi
O Nihon-gi, por sua vez, foi estabelecido como compilação em 720 d.C. e
carrega em seu conteúdo a crônica sobre a origem do Japão e os fatos decorri­
dos até o ano de 700 d.C.

Desenvolvimento
O desenvolvimento deste grupo ocorreu em estágios periódicos. O pri­
meiro vê seu nascimento numa época pré-histórica e que se alonga até 5 52 d.C.,
quando o xintoísmo reinava soberanamente entre o povo japonês, não regis­
trando até êste estágio qualquer rivalidade considerável com outras religiões.
D e 552 d.C . em diante, paralelam ente ao xintoísm o, encontram os o
budismo em ascensão, conquistando popularidade entre os nipônicos.
Já em 645, Kotoku adere ao budismo, repelindo o xintoísmo com todos os
seus ideais, práticas e cultura patrióticas. Entre 800 e 1700, o xintoísmo aparece
dando os primeiros sinais de adesão ao sincretismo, misturando sua essência
com elementos budistas e confucionistas, formando aquilo que posteriormente
passou a ser cham ado ryohu, isto é, um xintoísm o em dois aspectos. Nessa
época, a modalidade de xintoísm o que poderiamos qualificar com o “raiz”,
sofreu um drástico declínio.

O reavivamento
Por volta do ano de 1700 o xintoísmo vivência um necessário avivamento,
com o qual estudiosos contribuíram analisando textos arcaicos relacionados às
origens mais remotas dessa crença japonesa.
Hirata, um dos mais eruditos membros de grupo de cooperação avivalista, pro­
nunciou-se a este respeito afirmando que as duas doutrinas xintoístas fundamen­
tais são:
a) O Japão é o país dos deuses e, conseqüentem ente, seus habitantes são
descendentes destas divindades. Entre o povo japonês e os chineses, os india­
nos, os russos e os outros povos do mundo, há uma diferença de espécie, e não
somente de grau, segundo ressalvam.
b) O Mikado (termo usado por estrangeiros para se referirem ao imperador)

57
é o verdadeiro filho do céu, o qual tem o direito de reinar sobre os quatro ocea­
nos e tam bém sobre os dez mil países.
Do suposto fato da origem divina do povo japonês é que brota a crença da
superioridade sobre os demais povos da terra, quanto à coragem e à inteligên­
cia. Propaga-se ainda a honestidade e a pureza de coração, o que os impele a evi­
tar teorias inúteis e falsidades, com o declaram ocorrer freqüentemente no seio
de outras pátrias.
Foram essas concepções que reavivaram o xintoísmo no seio da nação japo­
nesa, acreditando, com uma convicção ainda maior, que esses estudos confir­
maram a origem divina tanto do povo quanto do território nipônico.

Adoração
Este procedim ento, que define o xintoísmo com o religião, é procedido
num dos numerosos templos que a isso se destinam e que se acham distribuídos
por todo o território japonês.
A cultura dos seguidores, embora pareça colocar como necessária a ereção
de um altar doméstico, ensina que o lugar propício para se proceder à adoração,
é o templo local. O xintoísmo, à semelhança de outras religiões orientais, tam­
bém detém um panteão de deuses que impede práticas sistemáticas de adora­
ção a todos.
As obras sacras do xintoísmo ensinam que apenas algumas das muitas divin­
dades possuem consideração para que possam ser adoradas com solidez, mas há
uma que se destaca das demais. A Amaterasu.
Esta divindade possui um grande e exclusivo santuário imperial dedicado
apenas a sua adoração, e está localizado em Isé, acerca de trezentos e sessenta
quilômetros de Tóquio, sendo considerado pelos praticantes o principal centro
de adoração do Japão. Proceder à adoração neste templo é rotina que remonta
a tempos anteriores a Jesus Cristo. Os muçulmanos peregrinam em M eca, os
cristãos em Jerusalém e os xintoístas neste templo, cujas dependências dispõem
de um pátio externo onde os fiéis se aglomeram para procederem ao ritual,
enquanto os sacerdotes e os oficiais do Governo ocupam o pátio interno.
Amaterasu, como principal divindade japonesa, tem sna sexualidade defi­
nida com o feminina, já que se insere no ato da adoração que é dela que provém
todos os antepassados divinos originados na cultura xintoísta, o que se constitui
em elemento único, se considerarmos as principais formas de divindade cultua­
das pelo homem ao redor do mundo.

58
Capítulo 8

ZOROASTRISMO

Introdução

O
s expositores desta religião asseveram que ela possui uma
peculiaridade não encontrada nas demais crenças. Trata-se
da eterna batalha entre o bem e o mal, a qual exerce um
impacto muito mais expressivo que aquele declarado ou percebido
pelos seus pouco mais de cem mil seguidores.
Sua fundação é atribuída a um homem que teria vivido cerca de seis­
centos anos antes do nascimento de Cristo, e cujo nome serviu de
batismo a esta comunidade religiosa - Zoroastro. Este personagem é
originário da região babilônica, extremamente produtiva em matéria
de religião e que atualmente está ocupada pelo Irã e Iraque.
Seu nome deriva de uma variação grega do original - Zarathushtra,
este, essencialmente persa. Não há informações precisas sobre a data
e o local de seu nascimento, mas o próprio nome leva à inferência de
uma natalidade ocorrida na Pérsia (atual Irã) e a tradição, quanto ao
nascimento, propõe um período que se aproxima de 650 a.C. Entre­
tanto, estudiosos do tema, como Richard Cavendish, declaram haver
muitas dúvidas quanto a estes dados.

História
A fundamentação histórica na qual se acha envolto o zoroastrismo é extre­
mamente frágil. Ele teria sido fundado por Zoroastro, personagem para o qual
sequer se consegue definir local de estada, onde porventura tenha passado sua
vida, por quanto tempo viveu e quanto do zoroastrismo posterior a ele preservou
suas idéias.
A única base para uma análise é a tradição que o coloca instalado na parte oci­
dental do Irã, no século VI a.C ., num período pouco anterior ao Buda indiano.

59
Porém, contestando a tradição, estudos mais modernos passaram a propor uma
existência na região nordeste do Irã, entre as divisas dos atuais Afeganistão e Tur-
comenistão.
Outra especulação atribui a existência de Zoroastro numa época ainda
mais antiga, entre 1700 a.C . a 1500 a.C ., mas, nesta hipótese, já habitando as
planícies da Ásia Central.
Também é a tradição que concede a Zoroastro a paternidade de um comer­
ciante de camelos, este, nascido e criado numa época em que seus conterrâneos
persas eram dados à adoração de vários deuses.
A adolescência de Zoroastro já registrava momentos de manifesto interesse
pelas questões religiosas e de meditação nas mais profundas dúvidas do homem
quanto aos mistérios da vida. A postura de compaixão lhe concedeu renome
entre os seus contemporâneos, destacada a condolência que sempre demons­
trava, em especial para com os idosos.
Sua educação teria sido privilegiada, considerando que toda a sua formação
advinha das melhores escolas de mestres existentes na Pérsia. A inquietude, porém,
não o abandonava, e Zoroastro, aos vinte anos de idade, preferiu deixar o lar e os
pais, para partir em busca das respostas a suas dúvidas existenciais. Neste período
de buscas, tantos quantos passaram por Zoroastro, tornavam-se alvos de seus ques­
tionamentos religiosos.
Segundo narra a tradição, durante todo este período de intermináveis
inquirições, Zoroastro teria empregado suas habilidades médicas para benefi­
ciar aqueles que eram constantem ente vitimados pelas guerras incessantes
ocorrentes à época.
Ao atingir a idade de trinta anos, teria alcançado a iluminação, sucedida às
margens do rio Daitya, quando numa visão surgiu-lhe uma figura colossal, que
na oportunidade se auto denominou Vohu M an ah (Bom Pensamento). Esta
figura teria levado Zoroastro à presença de outra divindade cósmica que era tida
com o “sábio senhor”, e que atendia pelo nome de A hura M azd a , o qual instrui-
ria-o quanto à verdadeira religião.
Após este fato incomum, ele teria dedicado os próximos dez anos de sua
vida à propagação das verdades recém-descobertas, mas de forma modesta e
sem alcançar adesão significativa entre seus ouvintes.
O m ovimento iniciado por Zoroastro obteve expressividade som ente
quando ele conseguiu que o príncipe Vishtaspa aderisse às suas idéias e, não só
isso, antes, Vishtaspa cooperou com Zoroastro na divulgação de seus conceitos.
Este significativo apoio foi decisivo para o rápido crescimento zoroastrista nos
anos que se seguiram.

6o
Estes tradicionais registros de fatos pertinentes à história do zoroastrismo
trazem em seu bojo referencias de duas guerras ditas “santas” que teriam ocor­
rido em razão da fé que se apresentava, sendo que, no segundo conflito, Zoroas-
tro teria morrido, quando então já contava setenta e sete anos de idade.
Sua morte, de qualquer forma, jamais impedira a resistência do movimento
zoroastrista bem com o seu crescimento, embora este ocorresse de forma tímida.
Seus seguidores, imediatamente, se desfizeram das práticas místicas e cessaram
a adoração que se prestava a vários ídolos, até então exercidas entre os adeptos,
estabelecendo a partir daí uma crença monoteísta que tam bém sustentava a
certeza na existência do céu e do inferno.

Escrito sagrado
O livro sagrado do zoroastrismo é conhecido pelo nome típico de Avesta,
originalmente redigido num antigo dialeto iraniano, o avestan. A obra original,
entretanto, já não existe, à exceção de pequenos fragmentos, algo em torno de
dez por cento do que se acha no Livro Máximo do cristianismo, a Bíblia.
Ele está redigido na forma de hinos, orações e orientações para as práticas
ritualísticas, e é dividido em três partes, a mais antiga é chamada Yasna. Dentro
desta arcaica porção, encontram-se relacionados cinco hinos denominados
G athas, compostos em um idioma ainda mais antigo que todo o mais da obra,
de onde se infere que é nesta coleção de cânticos que se encontram as palavras
que possam ter pertencido a Zoroastro.

G athas
Os G athas se prestam à exaltação da divindade venerada entre os zoroas-
tristas, o A hura-M azda, considerado por todos os seguidores com o o único
Deus Supremo, além de fazer declarações acerca da recompensa que se reserva
aos justos e que se acha prevista para o final desta Era. Estes hinos acomodam
ainda em seu conteúdo uma exortação que se dirige aos vivos.

Yashts
A segunda parte do Avesta, de igual im portância, é cham ada de Yashts.
Curiosamente apresenta hinos que se destinam a várias divindades.

Videvdat
A terceira parte, conhecida por Videvdat, fora escrita num tempo bem pos­

61
terior ao das duas primeiras partes. Esta última seqiiência contém a lei contra os
demônios, juntam ente com outros códigos e normas.
Os sacerdotes do zoroastrismo são conhecidos por magi, francos pratican­
tes das artes mágicas quando o ritual se refere à comunhão com Deus. E daqui
que deriva a palavra portuguesa “m ágica”.

Ahura-Mazda
D e acordo com o zoroastrismo, existe apenas uma divindade a qual se possa
aplicar o título de verdadeira, ou seja, legítima, e para a qual devemos declinar
adoração. Seu nome é Ahura-M azda, o “senhor sábio”. Nas primeiras linhas da
literatura sagrada dos zoroastras, essa divindade é exaltada com uma espécie de
louvor sem elhante a este que transcrevemos: “Ahura-M azda, o criador,
radiante, glorioso, maior e melhor, o mais belo, o mais firme, o mais sábio, o
mais perfeito, o espírito mais generoso”.
Já os G athas atribuem muitos outros predicados a esta divindade, como:
“aquele que tudo vê, onisciente, poderosíssimo, amigável, Pai da justiça ou
direito”, etc.

Angra Mainyu
Em bora o zoroastrismo considere apenas A hura-M azda com o sua su­
prema divindade, a tradição revela que posteriormente à im plantação deste
conceito, o supremo ser sofreria uma severa oposição de outra entidade espiri­
tual poderosa, conhecida com o Angra-Mairryu, ou Ahriman (espírito mau).
Esta animosidade estaria presente entre estas duas criaturas espirituais desde o
com eço de toda existência.
São os dois espíritos primários, segundo a crença do zoroastrismo, os quais,
numa visão sucedida com o fundador, revelaram-se com o gêmeos, então clas­
sificados com o “M elhor” e “M au”, em pensamentos, palavras e ações, entre os
quais, apenas os sábios sabem definir corretamente cada personalidade.
A união que se consagrou entre estes dois seres no princípio estabeleceu a
Vida e a Não-vida, de onde se definiu a realidade de uma “pior existência”, popu­
larmente chamada “inferno”, e que se reserva para aqueles que seguem a m en­
tira. Do outro lado, o chamado “melhor pensamento” (paraíso), está preparado
para os que seguem o que é correto.
Isto ocorre como reflexo do que houvera no princípio com os dois espíritos
gêmeos, isto é, o espírito que seguiu a mentira (Angra-Mainvu), preferiu fazer as

62
piores coisas, enquanto que Ahura-Mazda, o mais “santo”, escolhera a prática do
que é correto.
Estes dois poderes têm atuado juntam ente desde o princípio de todas as coi­
sas, sendo certo que esta aversão mútua persistirá até o fim do mundo.
Os propagadores da crença zoroastrista, no decorrer do desenvolvimento
da doutrina, promulgaram sete atributos opostos para cada uma das divindades,
relação que recebeu o título de A mesha-stentas. Esta relação se resume em cor­
respondentes contrários, que são:

Ahura-Mazda Angra-Mainyu
Deus da luz Deus das trevas
Direito e justo Falso
Boa mente M ente ruim
Poder Covardia
Amor Pretensão falsa
Saúde Miséria
Imortalidade Aniquilamento

Julgamento futuro
O zoroastrismo foi uma das primeiras profissões de fé a propagar a esperança
de uma vitória definitiva do bem sobre o mal, além do dogma que define um
juízo vindouro para aqueles que preferiram seguir o mau caminho, bem como a
recompensa que se reserva para todos os que se tornaram partidários do bem.

Influências religiosas
Os mais conceituados estudiosos da matéria religiosa têm observado uma
clara influência do zoroastrismo nas três principais religiões do mundo, ou seja,
o judaísmo, o cristianismo e o islamismo. Numa mostra de opinião coesa, estes
estudiosos declaram que a importância do zoroastrismo sempre primou pela
qualidade que pela quantidade.
Seu maior significado repousa no fato de ter infligido inegável influência
nas principais e mais numerosas profissões de fé mundiais. Sua contribuição
para o judaísmo é observada por duas vezes:
Em 538 a.C., oportunidade em que os persas, sob o comando de Ciro, con­
quistaram a Babilônia e libertaram os judeus que se achavam em exílio naquela
região;
Em 330 a.C ., quando o im pério persa foi destruído por Alexandre, o
Grande.

63
Nestas épocas, o povo judeu se achava sob o governo dos zoroastristas.
Parece ter sido desta classe religiosa, que os judeus aprenderam a crer num A hri-
man, isto é, num “diabo” pessoal, personalidade que, no hebraico, recebería o
nome de Satanás. Atribuem que tam bém vem da cultura zoroástrica a crença
num céu e num inferno, e num dia de julgamento no qual cada indivíduo será
avaliado segundo suas obras.
Ensinam estes eruditos, ainda, que de todas as novas religiões extrabíblicas,
o zoroastrismo é a única que teve suas doutrinas emprestadas para serem inclu­
sas na Bíblia. É reconhecido por todos que o Antigo Testamento em todo o seu
contexto épico e incluindo o livro do profeta Isaías e o exílio, tem como fonte
originária de todas o Deus Yahweh.
Após o exílio, entretanto, constatou-se uma sutil mudança. Realizada uma
comparação entre dois relatos paralelos de uma mesma experiência do rei Davi,
esta mostra que um docum ento pós-exílico substitui “Iavé” (1 C r 21.1) por
“Satanás”, no relato pré-exílico (2Sm 24.1). Destarte, “Satanás” acaba por não
se constituir numa figura originária da Bíblia, antes, fora ah esculpido a partir
do conhecim ento extraído do zoroastrismo.
É possível, partindo deste fato, com entam os eruditos, que outras inovações
tenham sido extraídas da doutrina zoroástrica pelos hebreus após o contato
direto que eles tiveram com esta religião durante o exílio babilônico.
Neste mesmo exemplo pode-se aproveitar a idéia de uma constituída dou­
trina na área da angelologia e da demonologia; de um grande Salvador ou Liber­
tador que viria; de uma ressurreição e julgamento finais, além de uma existên­
cia no pós-morte bem definida. Alegam ainda que se pode ter por certo que a
palavra “paraíso” proclamada por Jesus em Lucas 23.43, ao menos em sua eti­
mologia, deriva-se de uma forma persa, o avestan “pairid aeza”.

Situação atual do zoroastrismo


Observa-se nos anais das principais religiões do mundo, o arrolamento de
seguidores que sempre excede os milhões. Baseados nesta perspectiva astronô­
mica temos que a presença do zoroastrismo no mundo, se apreciada a partir de
sua representatividade, é ínfim a. O núm ero de seguidores dos ensinos de
Zoroastro, na índia e Paquistão, estaciona na marca dos cem mil; localidades
onde eles são rotulados com o nome de parsís.
Dado o fato de não admitirem mais convertidos entre suas fileiras, a auto-
maticidade da extinção do grupo já mostra seus sérios efeitos. O Irã tam bém
acom oda alguns m ilhares de adeptos de Zoroastro, havendo com unidades
ainda menores na América do Norte, na G rã-Bretanha, na África Oriental e
em Hong Kong.
A diminuta sociedade zoroástrica, entretanto, apresenta riqueza de idéias,
quando comparada às demais religiões bem estabelecidas entre os homens, o
que fica evidenciado na influência que ainda exercem nos povos entre os quais
se abrigam.

65
Capítulo 9

JUDAÍSMO

Introdução

O
termo “judaísmo”, assim como o termo “judeu”, provém da
raiz “Judá”. A história dessa profissão de fé remonta ao ano 722
a.C ., quando o cativeiro assírio marcou o fim do reino do
norte, Israel, proporcionando a ascensão do reino do sul (judá), que se
manteve preservado dos efeitos das invasões por mais de cento e cin-
qüenta anos. Em 586 a.C., entretanto, tem início o cativeiro babilô-
nico, que pôs fim à resistência do reino do sul por determinado período.
Um grupo de remanescentes constituído quase que por apenas mem­
bros da tribo de Judá, retorna a sua terra após setenta anos com o propó­
sito de realizar seus objetivos primordiais, empenho este que culminou
com o restabelecimento da nação de Israel. “Judá” e “judeu” tornaram-
se então expressões que sempre estariam relacionadas, promovendo
uma ligação intrínseca à nomenclatura religiosa e o nome da descen­
dência da qual são oriundos. Dessa forma, a história, a sociedade, a reli­
gião e o governo (teocrático) predominantes em Israel, são partes de um
todo chamado judaísmo.
No que concerne à fé, o judaísmo se tornou o berço do cristianismo e
também a base de onde os muçulmanos extraíram inúmeros elemen­
tos para preencher o islamismo, não sendo alheio ao nosso conheci­
mento que no seio do próprio judaísmo formaram-se várias correntes
filosóficas, como os ultra-ortodoxos, os ortodoxos, os liberais e os ultra-
liberais, muito embora o âmago do judaísmo não acomode filosofias.

Tradição judaica
Segundo a tradição histórica, as origens do judaísmo tem seu alicerce fir­
mado no pacto de Abraão. Na religião judaica sempre se observou um código de

66
normas baseado exclusivamente na revelação, não demonstrando princípios
que pudessem ser identificados com o filosofias. Essa mesma revelação possui
uma estrutura que se firma no misticismo, isto é, em práticas que aos olhos huma­
nos são envoltas de muito mistério, tal qual ocorre no cristianismo. Foi com base
nestes mistérios que se documentaram as batalhas nas quais teve parte o povo
israelita, posto que o êxito ou fracasso de seus guerreiros estavam sempre relacio­
nados a sua espiritualidade e lealdade ao Deus que admitiram para si, cujo nome
deriva de um grupo de quatro letras hebraicas, identificadas no alfabeto latino
por “YH W H ”, com tradução para algumas variantes, uma delas, Yahweh.
Tudo o que se relaciona com Israel durante a história se mede tendo por
parâmetro o exercício da fé e a obediência às normas constantes de seus escritos
sagrados. Também seus monarcas foram homens de grande expressão, mas não
expressão ligada à temporalidade, ou à força militar, mas sim, a conduta que
tiveram diante de seu Deus, pela anuência ou renitência aos seus desígnios.
Essa postura milenar que tem lugar até hoje entre o povo granjeou-lhes o
título de povo do livro (Bíblia), uma vez que ele é o padrão de leis e de conduta
social, embora não seja exclusivo. Com base nesta estrutura, é possível enume­
rar vários conceitos que foram se desenvolvendo com o passar do tempo.

O monoteísmo
Ahistória parece revelar que este povo progrediu, de certa forma, de um pri­
meiro politeísmo para um henoteísmo (crença num só “deus” sem descartar a
existência de outros), até chegarem a um definitivo monoteísmo exclusivista,
tornando-se este o conceito central desse grupo.
Segundo esta crença, não há Deus fora de Yahweh; um Deus que se revela
a Si mesmo, sendo tam bém Ele que forma o conhecim ento espiritual e as nor­
mas éticas, traçando aos Seus seguidores uma possibilidade de salvação que se
acha intimamente ligada à justiça pessoal. O crescim ento virtuoso das questões
espirituais com o o pós-morte e a imortalidade da alma não achou espaço no
modelo original, sendo posteriormente alcançado de forma progressiva.
Paralelamente às religiões orientais e às filosofias ocidentais, o judaísmo
pareceu manter-se estagnado em fases, uma vez que a revelação era dada a seus
profetas apenas de tempos em tempos, para posteriormente serem inscritas no
livro sagrado dos judeus.

Os escritos sagrados
O cânon judaico constitui-se numa relação de normas que regem tanto a

67
vida espiritual com o a social, proporcionando aos seguidores um sólido padrão
de conduta, mesmo nos casos em que a fé judaica passou a enumerar paralelos
filosóficos. C om o passar do tem po, outras obras foram produzidas com o
intuito de cooperar na interpretação das Escrituras Sagradas.
Com o surgimento do cristianismo, o judaísmo sentiu a necessidade de fixar
em definitivo a relação de livros que identificariam seu código de fé, mas isso não
ocorreu com a esperada praticidade, uma vez que grupos diversos dentro do
judaísmo apontavam padrões diversos de literatura. Entre os saduceus e os sama-
ritanos, porém, estabeleceu-se como definitivo o Pentateuco; a relação dos cinco
primeiros livros da Bíblia, escritos por Moisés. Já entre os fariseus e palestinos
adeptos do judaísmo, prevaleceu o cânon que hoje se observa também entre os
protestantes, ou seja, o que contém trinta e nove livros, indo de Gênesis (o prin­
cípio de todas as coisas) à Malaquias, o último dos profetas menores. Há ainda o
cânon chamado “alexandrino”, que aderiu a versão da LX X (septuaginta), que
incorpora os livros tidos apócrifos e que se acham na Bíblia empregada pela
igreja romana, sendo esta a versão utilizada, a princípio pelos judeus da diáspora.
M esm o considerando todos estes casos, sempre se atribuiu autoridade
indiscutível, por todas as ram ificações judaicas, à Tannach, o Antigo Testa­
mento para os protestantes, dividido pelos escribas em três partes, que são:
Pentateuco - C inco livros que levam a Lei (Torah, ou seja, guia ou ensina­
mento);
Profetas - in ebiin) subdivididos em profetas anteriores (Josué, Juizes,
Samuel e Reis) e posteriores (Isaías, Jeremias e Ezequiel), chamados também
pela teologia cristã de profetas maiores, e os livros dos doze profetas, chamados
“menores”;
Escritos - (ketu bim ) compostos pelos livros de Salmos, Jó, Provérbios,
Daniel, Esdras, Crônicas e ainda os “cinco volumes festivos”, lidos em diferentes
oportunidades, os quais são: Cantares, Rute, Lamentações, Eclesiastes e Ester.
A Torah é o Livro Sagrado; é a Palavra de Deus. Ela compreende a história
da criação do mundo e o nascimento do povo judeu, mas, sobretudo as leis, prá­
ticas ou morais, que todo povo deve seguir, para ser digno da missão de difusão
destas palavras a toda a humanidade.

O Talmude
O texto da Lei requeria uma norma de interpretação e esta realidade trouxe
à tona uma publicação paralela aos escritos e que tinha esta específica finali­
dade, o Talmude e a Midrash.

68
O Talmude inclui as determinações civis e religiosas que não estão arrola­
das na Torah, além de apresentar explicações que esclarecem questões da Torah
e do próprio Talmude. Há uma escritura incluída no Talmude, a M ishnah, uma
espécie de sumário da lei oral que havia entre os séculos V a .C . e o século II d .C .
A própria M ishnah se acha ligada a G em ara, por ser esta uma espécie de litera­
tura de apoio que explica e amplia a M ishnah. O Talmude pode ser subdividido
em duas partes; o Talmude palestino, concluído no século V d.C. e o babilônico,
terminado dois séculos mais tarde.
A M idrash, literatura cujo conteúdo se destina à exegese da doutrina
judaica, foi desenvolvido entre os séculos IV e XII d.C., e também possui duas
subdivisões: o H alakha e o H aggadah. O primeiro traz as leis judaicas tradicio­
nais, acompanhadas de preceitos mais detalhados sobre a lei e que não aparecem
no texto original escrito. O segundo é composto pelas interpretações livres e
inclusão de determinado número de parábolas ilustrativas, totalmente baseado
nos ensinamentos das Escrituras.

As festas solenes
Rosh H â-Shanah
E a primeira festa do ano celebrada pelos judeus e acontece no outono. Foi
instituída com a finalidade de lembrar o momento em que teve início a criação
do mundo. Nessa data, os judeus participantes são convidados a rememorarem
o ano que se passou; corrigirem-se das faltas e voltar-se a Deus, que também é
Criador e Juiz, mas, sobretudo, Pai. É Ele quem acolhe os que fazem o teshuvah,
isto é, os que retornam a Ele. No culto da sinagoga, os fiéis trajam branco, como
símbolo da penitência e da pureza. Um instrumento musical feito com chifre de
carneiro, o shofar, é tocado repetidas vezes para estimular o arrependimento.
Nesta festividade, crêem , Deus julga todos os atos cometidos pelas pessoas no
ano que se passou e decide, por conseqüência, qual será o destino de cada indi­
víduo para o ano que se inicia. Todavia, manda a norma que, nos dez dias de peni­
tência, que vão do ano novo ao kippur, o arrependimento de cada homem pode
modificar a sentença do soberano magistrado.

Kippur
E conhecida tam bém com o a festa da expiação e ocorre dez dias após a festa
do ano novo. O seu dia de realização é chamado Dia do Kippur. Na sinagoga
adota-se uma liturgia que dura o dia todo, na qual se entoam repetidas vezes a
confissão dos pecados e as conseqüentes súplicas para a obtenção da misericór­

69
dia divina. Também acontece uma narrativa em estilo poético que rememora
os ritos que o sumo sacerdote celebrava no templo durante este dia.
Observa-se durante 25 horas um rigoroso jejum. Durante o ritual das confis­
sões, todos os erros passíveis de serem cometidos entre os homens são confessados.

As festas menores
H anukkah
Festa das luzes ou da dedicação. Celebra-se este evento em dezembro para
relembrar a purificação do templo de Jerusalém , ocorrida após a vitória dos
M acabeus sobre os Assírios no século II a.C.

Purín
A festa das sortes. Celebrada entre fevereiro e março para relembrar a sal­
vação do povo judeu que, uma vez morando quase que em sua totalidade no
império persa, foram surpreendidos por um edito de morte prolatado pelo rei.
Nesta festa prestam-se homenagens a Ester e Mardoqueu, os grandes articula-
dores que, com a ajuda de Deus, desbancaram o plano do malvado Hamã.

As festas de peregrinação
Estas festas estão relacionadas ao cativeiro egípcio pelo qual passou o povo de
Israel. Em Abraão os judeus encontram a origem desta estirpe, mas é José (bisneto
de Abraão) quem conclama seus familiares para irem ao Egito, ao seu encontro,
num tempo de seca e conseqriente carestia. Apartir desta família, forma-se o povo
judeu no Egito, na escravidão, unido apenas pela fé num Deus único e pela espe­
rança de um retorno a sua terra, Canaã. Vejamos quais são as festas chamadas “de
peregrinação”:

Pessach
A história desta festividade tem início quando Deus, com milagres e prodí­
gios, conduz Seu povo para fora da terra onde se achavam escravizados. Igual­
mente conhecida como Páscoa, vemos nesta mesma com em oração, este povo,
finalmente livre, mas ainda sem local estabelecido para viverem e sem normas
para que dirijam sua vida.

Shavuoth - (Pentecostes)
Nesta com em oração relembra-se a entrega da Lei a Moisés - os 10 manda­
mentos e a Torah - durante o tempo em que peregrinaram no deserto. Outro

70
nome que se atribui a este evento é Festa das Sem anas, por ser celebrada sete
semanas após o Pessach. E muito significativo para o povo judeu que a conquista
da liberdade se dê ao tempo da entrega da Lei a Moisés, já que, dentro do pró­
prio conceito judeu, não poderia haver liberdade sem uma lei que impedisse
essa mesma liberdade de se transformar em arbítrio ou prepotência.

Sukkoth
Os judeus que deixaram o Egito deveríam peregrinar por quarenta anos no
deserto, e durante todo este período, habitar em tendas, até que tivessem che­
gado à terra que Deus lhes havia prometido, com o forma de preparar e ensinar
o povo, para entrar na terra e nela aplicar as leis que haviam recebido para cum ­
pri-las. Também é conhecida como Festa das tendas.
Relacionando-se a esta com em oração, hoje o povo constrói tendas com o
teto coberto com grandes folhas, sobrepostas de forma a permitir a visão do céu,
o que tem por fim trazer sempre à memória judaica que jamais se deve esque­
cer da presença de Deus.
A liturgia da sinagoga compreende a leitura do H allel, um grupo de salmos
de louvor e agradecimentos, agitando um ramalhete de ramos de palmeira, cho­
rão (salgueiro) e mirto, conhecido na liturgia com o lulav, tendo ainda em mãos
um fruto do cedro.

A cabala
Tradição judaico-mística que surgiu no século XII da nossa Era, a qual ten­
tou interpretar a Torah de acordo com um conhecim ento secreto e oculto. As
raízes mais antigas da tradição cabalística datam do século I, na Palestina, onde
judeus místicos contemplavam o trono divino ou a “carruagem” mencionada
no primeiro capítulo de Ezequiel.
A raiz hebraica Q B L (que dá origem a palavra k a b a la ) originalmente signi­
ficava tradição oral. Os segredos não escritos da Torah eram interpretados e
transmitidos dos mestres para os alunos.
O maior texto da Cabala, que contém a maior parte da tradição é o Sefer
H aZ ohar (“O livro do esplendor”). O fato de ter sido escrito por volta de 1280
d.C. é significativo e demonstra a longevidade da tradição oral.
O cerne da Cabala está em desvendar os segredos da maravilha e da m ajes­
tade de Deus e sua criação divina. A tradição tam bém considera as reflexões
sobre o mal, a alma, a salvação e o futuro. Aspectos da natureza divina são reve­
lados em uma série de dez emanações. São elas: (1) Coroa, (2) Sabedoria, (3)

71
Entendim ento, (4) Misericórdia, (5) Poder, (6) Beleza, (7) Vitória, (8) Esplen­
dor, (9) Fundam ento e (10) Reino. A C abala floresceu no período entre os
séculos XV I e X V III e teve um grande impacto sobre o ocultismo. Cabalistas
dignos de nota incluem Moses de Leon, Isaac ben Solom on. Ashkenazi Luria
e H. V ital.3

O legado do judaísmo e do cristianismo


O judaísmo e o cristianismo são religiões marcadas por traços distintivos
salientes, todavia, ambas compartilham de uma herança intelectual e espiritual
bastante próxima em muitos aspectos. E isso o que alista o judeu Lapide em sua
obra Israelis, Jews and Jesus. Vejamos:
- a fé em um Deus, nosso Pai;
- a esperança de sua salvação;
- a ignorância sobre os Seus caminhos;
- a humildade diante de Sua onipotência;
- o amor e a reverência;
- a dúvida quanto a nossa hesitante infidelidade;
- a convicção de que o amor de Deus é prejudicado pela falta de amor ao pró­
ximo;
- o conhecim ento de que toda a fala acerca de Deus deve ser gaguejante,
quando nos aproximamos dele;
Entre outros.

3 Adaptado do Dicionário de Religiões Crenças e Ocultismo. Mather & Nichols. Vida.

72
Capítulo 10

ISLAMISMO

Introdução

T
rata-se de uma religião monoteísta, a exemplo do judaísmo, e
que se baseia nos ensinamentos de Maomé (Muhammad),
seu profeta maior. Estes ensinamentos se acham contidos no
livro sagrado islâmico, o Corão. A palavra islã significa, originaria-
mente, “submissão”, retratando a aceitação à lei de Alláh (“deus” em
árabe) e sua vontade. Seus adeptos são chamados de islâmicos ou
muçulmanos, termo que deriva da raiz “muslim”, que em árabe sig­
nifica “aquele que se subordina a Deus”. Estabelecido na região da
Arábia Saudita, o islamismo possui hoje o segundo maior regimento
de seguidores do mundo, sendo superado apenas pelo cristianismo
em número de adeptos. Seus fiéis se concentram, sobretudo, no norte
da África e na Ásia.
O mundo islâmico propriamente dito, isto é, os países em que a maio­
ria - quando não a totalidade - da população professa a religião muçul­
mana, cobre um território muito amplo; todo o norte da África,
incluindo o Sudão, a Mauritânia, além do Oriente Médio, a Ásia Cen­
tral, parte da região indiana e, sobretudo, a Indonésia que, apenas em
seus termos, reúne cerca de cento e sessenta milhões de fiéis muçul­
manos, acrescentando-se a este territórios, atualmente, a América do
Norte e a Europa, onde o número de convertidos vem aumentando.
Em qualquer destas localidades, segue-se o preceito islâmico da vene­
ração a Maomé, aquele que, segundo seus adeptos, recebeu e divulgou
a revelação divina definitiva. Meca é para todos a cidade santa, para a
qual se voltam em cada momento de oração, além da observação da
norma que pede, ao menos uma vez na vida, uma peregrinação do
muçulmano de qualquer parte do globo para a cidade sagrada.

73
O profeta
Seu principal profeta é M uham m ad ibnA bdallah (M aom é-trad u ção não
aceita pelos muçulmanos conservadores) e cujo prenome tem por significado a
expressão “digno de louvor”.
M aom é nasceu aproximadamente em 572 d.C., em M eca, filho de Abdal-
lah e Amina, numa importante família de mercadores, ficando órfão quando
ainda era muito jovem. Seu pai faleceu durante a gravidez de sua mãe, e ela, por
sua vez, quando M aom é era apenas um menino de seis anos de idade. A partir
daí o m enino passou a estar sob os cuidados de um tio e um avô que, da mesma
forma que os demais familiares, pertenciam a tribo dos Coraíxitas, do clã dos
Beni H ashem itas.
O nome M aom é é uma corruptela da nomenclatura árabe, de origem his­
pânica, com o mesmo significado do termo original. Seu tio, Abu Talib, foi pai
de Ali íbn Talib, e teria sido um dos primeiros discípulos do “profeta” e posterior­
m ente, o quarto califa. M aom é tornou-se mercador quando atingiu a maiori­
dade e, devido a sua honestidade, acabou granjeando o apelido de al-Amín, “o
confiável”.
Seu constante contato com os mercadores fê-lo muito culto quanto às tra­
dições religiosas, oportunidade em que, como com erciante e condutor de cara­
vanas, teve contato com o judaísmo e o cristianismo.
Neste período, as religiões da península arábica eram politeístas e presta­
vam adoração a um panteão de deuses tribais. Bem por isso, a proposta de
M aomé acerca da adoração de um único “deus” encontrou forte rejeição entre
o povo local, que embora fossem formados por compatriotas de M aom é, man­
tiveram seu apego aos antigos deuses, forçando o profeta e seus poucos seguido­
res, a migrarem para Yatub, posteriormente rebatizada com o Medina, que dis­
tava de M eca 400 Km.
Essa migração, a chamada Hégira (fuga), ocorreu no ano 622 d.C., data que
marca o início do calendário islâmico, cuja contagem do tempo se baseia no
período lunar proporcionando um ano de 354 dias. O califa Ornar usou a data
precisa de 16 de julho de 622 d.C. para marcar o início do calendário muçul­
mano, necessitando, portanto, de aproximadamente 103 anos lunares para cada
100 anos solares do calendário gregoriano que nós observamos. Assim, o ano do
retorno de M aomé a M eca foi grafado como ano 8 d.H. (depois da Hégira).
Em M edinat al N abi (cidade do profeta) - Medina, M aom é encontra qua­
tro tribos pagãs, três judaicas e duas cristãs, mas consegue dirimir a questão da
discórdia entre essas facções urbanas, o que lhe permite a livre pregação.

74
Nesta oportunidade ele gera a primeira grande comunidade podendo então
reunir para si muitos seguidores, os quais o fizeram sentir-se fortalecido o sufi­
ciente para retornar a M eca e impor-se sobre aqueles que o haviam desterrado.
Em 630 d.C ., M aom é entra triunfante em sua cidade natal, onde iniciou a
anunciação do absoluto monoteísmo, o que para o Islã fora revelado aos judeus
e confirmado por Jesus, mas não na qualidade de Cristo. Segundo os muçulma­
nos, Jesus o fez na qualidade de um dos 124 mil profetas enviados por Allah, e
que segundo M aom é, tal revelação teria sido corrompida com a concepção do
cristianismo quanto à trindade divina, doutrina que trazia a mesma conotação
de politeísmo de seus antepassados, o que levou o “profeta” a extinguir suas rela­
ções com os cristãos.
Casou-se antes dos 30 anos de idade (entre 25 e 29) com C ad id ja, uma
viúva rica com aproxim adam ente 40 anos e para quem M aom é trabalhava
com o mercador, ofício que deixou após casar-se, para dedicar seu tempo à soli­
dão e à meditação.
Foi numa dessas oportunidades de retiro solitário que M aom é, segundo a
tradição islâmica, recebeu a ilustre visita do arcanjo Gabriel, o qual abraçou-o
com força constrangendo-o com a ordem: “Recita em nome de Allah, o único
deus!”.
Segundo a crença islâm ica, no in ício, M aom é perm aneceu hesitante
quanto a tudo o que ocorria com ele, mas com o passar do tempo e considerando
o apoio que sua esposa lhe dava quando o encorajava a crer que ele realmente
era o “mensageiro de Allah”, M aom é resolveu dar crédito às revelações, pas­
sando a crer juntam ente com C adidja, que era realmente o escolhido de Allah.
Após ter recebido muitas dessas revelações, M aom é passou a meditá-las,
iniciando a partir daí, uma oposição a todas as religiões já existentes, as quais
eram o judaísmo, o cristianismo e uma forma de politeísmo que imperava tam­
bém na tribo da qual ele era oriundo, onde se veneravam vários deuses, entre
eles “A llah”, o deus da revelação islâmica.
M aom é morreu em Medina (632 d.C.) pouco tempo depois de seu retorno
a M eca, enquanto que a com unidade dos fiéis de Allah crescia vertiginosa­
m ente em toda a Arábia. Nasce a partir daí uma nova religião, o Islã.

As revelações
As mensagens recebidas por M aom é tornar-se-iam, segundo o pensamento
islâmico, superiores àquelas recebidas pelos judeus por Moisés, e pelos cristãos
por Jesus.

75
C om os judeus, M aom é rompeu devido a não aceitação dos mesmos
quanto ao título que ele passou a atribuir a si mesmo, ou seja, a qualidade de
“profeta”, pois cria estar anunciando exatamente o que os israelitas receberam
de Moisés.
Em M eca, M aom é purifica a C a a b a dos cultos politeístas, permitindo ape­
nas a permanência da pedra negra que ele consagrou ao culto de Allah, a qual,
segundo a tradição, foi entregue a Ismael pelo arcanjo M iguel como sinal para
selar a eterna aliança de Deus com os homens.

O Corão
O nome deriva do árabe qur'am (leitura/recitação), pelo fato de M aom é ter
sido constrangido pelo arcanjo G abriel para que recitasse os textos sagrados a
ele revelados. Por este mesmo motivo, os muçulmanos têm apenas por autên­
tico o Corão escrito na língua de origem, o árabe.
O Corão é considerado como sendo a revelação divina expressa na Bíblia.
Segundo os historiadores, os versículos do Corão eram pregados por M aom é,
enquanto seus seguidores tomavam nota, o que culminou com algumas varian­
tes, até que o terceiro califa, Otiman ibn Affan, ordenou que fosse considerada
com o oficial apenas a redação de Zayd - um dos com panheiros do profeta,
determinando a destruição de todas as demais traduções que trouxeram discre­
pância ao texto.
O Corão é dividido por capítulos chamados suras ou suratas, num total de
114, os quais somam 6326 versículos.

Os seis pilares do islamismo


Os seis pilares da fé islâmica são instituições básicas da lei. Eles compõem
a chamada Shari'a, sendo que a partir dela, todos os muçulmanos sadios, do
sexo m asculino, estariam incumbidos obrigatoriamente de administrar suas
vidas. Esse procedimento se inicia na vida do adepto na época da puberdade, ou
por volta dos quinze anos de idade. São elas:

S hahada
Aprofissão de fé islâmica, a qual se pronuncia na forma: “Não há outro deus
além de Allah e M uham m ad é o seu profeta (ou m ensageiro)”. No entendi­
mento islâmico, basta pronunciar esta fórmula em local público para que o indi­
víduo consagre sua adesão ao Islã.
Aprofissão de fé se reflete ainda na chamada para a oração, a qual é pronun­

76
ciada nas mesquitas pelo muezin, funcionário do templo responsável por esse
ato e, neste caso, chamada de Azan, que significa “chamado para a oração”,
seguindo a ordem das declarações como seguem abaixo:
Deus é maior (4x)
Testemunho que não há outra divindade além deA llah (2x)
Testemunho que M uham m ad é o mensageiro deA llah (2x)
Vinde à oração (2x)
Vinde à salvação (2x)
Deus é maior (2x)
N ão há outra divindade além deA llah (lx)

Salat
Orações que são praticadas cinco vezes ao dia, as quais formam um elo
direto entre o adorador e Allah. Quando realizadas nas mesquitas de predomi­
nância suníta, a oração é dirigida pelo im ã, ou seja, alguém com cabedal de
conhecim ento corânico suficiente para proceder à direção.
As orações contém versículos do Corão e são recitadas sempre em árabe, a
língua da revelação. Elas ocorrem ao am anhecer, ao meio-dia, no meio da
tarde, no anoitecer e à noite, sendo sua realização preferivelmente na mesquita
e em grupo.

Zakat
Significa tanto “purificação” com o “crescim ento”. Um significado para­
lelo citado na doutrina islâmica é o de “poda das árvores”, ou seja, o zakat pro­
porciona equilíbrio e oportunidade para novos crescimentos. A responsabili­
dade do cum prim ento desta determinação básica cabe apenas ao fiel, que faz
o cálcu lo do rendim ento de seu capital anual e daí extrai 2,5% , que serão
empregados no patrocínio de obras sociais e auxílio aos muçulmanos menos
favorecidos.
Existe ainda o sadaca, outra contribuição voluntária que o fiel deve fazer
em segredo, tam bém com o significado de caridade voluntária.

Sawn
Todos os anos, no mês do R am adan (o nono mês do ano muçulmano, con­
siderado sagrado), os muçulmanos jejuam por 30 dias desde o am anhecer até o
pôr-do-sol, período no qual se abstêm de comida, bebida e relações sexuais.
Para enfermos, idosos e gestantes existe a permissão de jejuar em outra
época do ano, observando, contudo, um período de 30 dias ininterruptos. Os

77
que não puderem jejuar deverão alim entar um necessitado por cada dia não
jejuado. As crianças com eçam a jejuar na puberdade, mas algumas iniciam essa
prática ainda mais cedo.

H ajj
Trata-se da peregrinação à cidade sagrada de M akka (M eca), a qual deve
ser feita pelo menos uma vez na vida e deve ser empreendida por todos os fiéis
que possuem condições físicas e financeiras para fazê-lo.
Este ritual leva cerca de 200 milhões de muçulmanos a M eca todos os anos.
Nesta oportunidade todos trajam túnicas brancas, leves e simples, com o sen­
tido de que todos pareçam tam bém iguais diante de Allah, sem distinção de
poder econôm ico ou etnia.
A tradição islâmica afirma que os ritos do H ajj foram instituídos por Híbra-
hin (Abraão), incluindo ainda o circungiro da C aah a por sete vezes, além de
percorrer pelo mesmo número de vezes a distância entre os montes de al-Saffa
e al-Marwa, que segundo ensina o Islã, fora o caminho percorrido por Hagar
quando procurava água para si e para Ism ail (Ismael). Também por ocasião do
H ajj, durante este percurso entre os montes, os peregrinos colocam-se de pé no
vale de Arafat para levantarem um clam or a Allah, pedindo perdão.
O encerramento dessa peregrinação acontece com um festival chamado
E íd al-Adha celebrado com orações e troca de presentes entre as comunidades
islâmicas. Outro ritual de encerramento é o de E íd el-Fitr, festa na qual se com e­
mora o final do R am adan. Essas são as principais festas do islamismo.

jih ad
Literalm ente, o termo não significa “guerra santa” com o muitos enten­
dem, antes, é traduzida por “esforço”, esforço que está relacionado à defesa pró­
pria e da religião, ou daqueles que foram expulsos de seus lares. A tradição
ensina, contudo, que civis inocentes, árvores e gados devem ser poupados. A
cultura m uçulm ana explica que se pessoas de bem não se preocuparem em
estar preparadas para arriscarem suas próprias vidas em defesa da causa do Islã,
logo, a injustiça triunfará no mundo, iniciativa denominada jih a d al-Asghar.
Outro significado para expressão Jih ad é a luta interior de cada um para se
desvencilhar de seus desejos egoístas, o que proporciona paz interior, sendo esta
denominada Jih ad al-Akbar.
M uitas obras que versam sobre o Islã não fazem m enção da Jih ad com o
sendo um dos seus pilares doutrinários, todavia, esta rejeição deriva do desco­
nhecim ento de muitos sobre o posicionam ento do califa O tm an ibn Affan

78
(644 - 656 d.C .), o terceiro após a morte de M aom é, que reconheceu na Jihad
uma forte expressão de devoção e fé que deveria fazer parte da vida muçulmana.

Divisões do Islamismo
Logo após a morte de M aom é, houve um cisma no cerne do islamismo.
Vejamos os grupos que resultaram desta “separação”:

Xiitas
O quarto califa depois de M aom é foi um membro há muito convertido e
que tam bém possuía íntimo grau de parentesco com o profeta, sendo marido de
Fátima, filha do profeta com C adidja. A história parece revelar um fim violento
para este califa, vitimado pela cobiça de um certo Muawiya, que reivindicava
para si o califado.
A tragédia que sobreveio à casa do quarto califa, com seu assassinato, e que
registrou ainda a morte de seus dois filhos, netos de M aom é, com eçaram a tra­
zer problemas para o partido Shi 'a A li, expressão de onde derivou o termo que
designa esta facção muçulmana.
Os partidários de Ali apresentavam suas pretensões de forma gradual, na
forma que era reivindicada por outras ram ificações xiitas já em exercício à
época. Estas primeiras apresentações iam ganhando cada vez mais opositores,
posto que, a principal delas, determinava que somente os descendentes diretos
do profeta poderíam alm ejar o califado, excluindo toda a possibilidade de uma
liderança que não fosse representada por esta estirpe.
Essa reivindicação parecia ser a única coisa que realmente interessava aos
seus proclamadores, mas não para os que se achavam em terras iraquianas, os
quais, além das reivindicações do califado excluído, alegavam que um legítimo
partidário de Ali, com eçando pelo próprio Ah, era um guia espiritualmente
nomeado, agraciado por Allah com conhecim entos especiais, o que é conside­
rado pelos maiorais das sociedades islâmicas como exagero, mas não uma here­
sia.
Essa facção do Islã representa não mais de 10% ou 15% de toda a com uni­
dade islâmica no mundo, estando presentes, sobretudo, no Irã, e cujo líder mais
expressivo até a década passada foi o aiatolá Khomeini.

Sunitas
O crescim ento acelerado da fé islâm ica confrontou seus adeptos com
outras questões cruciais e mais complexas que aquelas que já eram aplicadas e

79
praticadas entre os fiéis. Esta dificuldade proporcionou o levantam ento de
questões acerca da conduta em áreas que iam além dos limites da Arábia, nas
quais as imposições corânicas se mostraram insuficientes ou inaplicáveis.
Quando da manifestação destes problemas, os líderes espirituais apelavam
para a sunna (conduta ou prática) de M aom é em Medina, empregada para o
exercício do H adith (tradições), em que se achavam suas decisões e julgamen­
tos de caráter social. Os muçulmanos que passaram a adotar este método para
dirimir problemas dentro da comunidade islâmica, passaram a ser chamados
sunitas. Eles constituem 90% da população islâmica no mundo.

Su fitas
Uma corrente das mais antigas, a sufista, surge no século IX e é a mais mís­
tica do islamismo. Os sufistas enfatizam a relação pessoal com Deus e praticam
rituais que incluem danças e exercícios de respiração para atingir um estado
m ístico. São m em bros praticantes do sufismo os faquires, da índia e outras
regiões da Ásia, e os dervixes, da Turquia. Historicamente, o islamismo tem sido
m arcado pelo surgim ento de m ovimentos, grupos e correntes de m aior ou
m enor envolvimento político, de linhas fundamentalista (conservadora) ou
moderna.

8o
Capítulo 11

SIKHISMO

Introdução

O
sikhismo é uma religião quase desconhecida na cultura das
civilizações ocidentais. Seus seguidores encontram-se, na
sua maioria, na região indiana de Punjabe, e a história de sua
fundação se observa em períodos recentes.
O corpo doutrinário se prende a propósitos que, aos olhos dos muçul­
manos, mais buscam uma utopia do que uma fusão de conceitos, já
que o principal objetivo foi unir duas das maiores correntes religiosas
do planeta; o hinduísmo e o islamismo.
Depois do jainismo e do budismo, o sikhismo se constitui na terceira
maior ramificação do hinduísmo. Sua implantação entre os homens é
conferida a Nanaque, o qual, para este processo de fundição doutriná­
ria, importou uma série de elementos da cultura muçulmana.
Nanaque, o precursor, nasceu em Talwandi, uma aldeia indiana que
distava de Lahore cinqüenta quilômetros, a sudoeste da capital, Pun­
jabe. Seu nascimento é datado em 1469 d.C.
Seus pais estavam inseridos na sociedade local como cidadãos
comuns, compondo o quadro de seguidores do hinduísmo. O folclore
da época cita Nanaque mais precisamente em seu estágio juvenil,
quando aparece dirigindo exortações a mestres hindus.

Desenvolvimento
Acredita-se que Nanaque, ainda em sua juventude, teria discursado a dois
sacerdotes brâmanes do hinduísmo acerca do sacramento material. Indepen-
dentem ente da veracidade histórica sobre essa dem onstração de sabedoria,
certo é que Nanaque preferia prender-se às práticas religiosas com o a medita­
ção e os rituais, do que ao trabalho temporal.

8i
Indisposto a seguir o caminho profissional escolhido por seus pais, tornou-
se mal visto no seio familiar, todavia, aceitou um cargo governamental ofere­
cido por seu cunhado, em outra cidade.
Sua preocupação, porém, continuaria sendo a busca incansável pela ver­
dade religiosa, admitindo para si a crença de que, ao ter alcançado trinta e três
anos de idade, recebera o divino chamamento.
Conta a tradição, quanto ao fato, que em dada oportunidade Nanaque teria
desaparecido na floresta enquanto se banhava, tendo sido supostamente tomado
para a presença de Deus, segundo explicou posteriormente em sua própria visão.
Após oferecer-lhe uma taça de néctar, Deus teria dito a Nanaque que estava
com ele e com aqueles que tomassem seu nome, e acrescentou: “Vai e repete
meu nome, ensinando a todos a que procedam da mesma forma, praticando a
repetição do meu nome, a caridade, as abluções, a adoração e a meditação [...]
meu nome é Deus, o Brahma primeiro, e tu, o guru divino.”
Decorridos três dias desse fato, Nanaque ressurgiu na floresta e bradou
sobre a inexistência de hindus ou islâmicos.
Acompanhado do amigo Mardana, poeta e trovador, iniciou a propagação
de sua experiência e de seus conceitos, não alcançando, entretanto, maciça sim­
patia entre seus ouvintes, optando ambos pelo retorno a Punjabe, onde a ade­
são de futuros discípulos se tornaria mais acentuada. Assim tem início a religião
sikhi, que a partir daí não pára de crescer, fenôm eno que Nanaque observou
durante toda a sua vida.
Nanaque faleceu com aproximados setenta anos de idade, mas não sem
antes tomar o cuidado de nomear um sucessor, para que continuasse a difundir
suas idéias. Esta tarefa ficou a cargo de Angade, um digno e fiel discípulo, que
manteve a rejeição e o com bate ao hinduísmo e ao islamismo.
O nome deste sucessor de Nanaque era originalmente Lahina, o qual, pos­
teriormente, mudou para Angade (guarda costas). Também foi ele quem propa­
gou a doutrina que aponta Nanaque como sendo igual a Deus.
Uma série de diferentes gurus tornam-se seguidores do guru Angade. Após
a morte do décimo guru na linhagem de sucessão, em 1708 d.C., a lealdade dos
sikhis foi transferida da autoridade pessoal do gurus para o Granth Sahib, livro
sagrado do sikhismo compilado por um dos seguidores de Angade, chamado
Arjan.

Ensinos sikhis
Em linhas gerais, os sikhis (aprendiz), são seguidores do guru Nanaque e de

82
seus sucessores (gurus). A autoridade sikhista Rahit Maryada define o sikhi como
alguém que acredita nos dez gurus e seus ensinamentos e na iniciação (amrit) insti­
tuída pelo décimo guru, acrescentando que não lhe é permitido acreditar em quais­
quer outras religiões.
Os ensinamentos dos sikhis são uma unificação de idéias extraídas do isla-
mismo e do hinduísmo, o que não significa que tenham empregado a literatura
religiosa de qualquer dessas crenças. Os sikhistas preferiram compor seus pró­
prios escritos sacros, que são baseados em interpretações particulares derivadas
de idéias difundidas nestas religiões, o que acaba resultando numa miscelânea
teológica.

Escritos sagrados
Os escritos sagrados do sikhismo são conhecidos com o Granth Sahib, ou o
“livro do Senh or”. Esta literatura foi desenvolvida por inúm eros autores e,
curiosamente, alguns deles viveram num período que antecede a existência do
próprio Nanaque, e cuja relação com o sikhismo não excedeu o superficial.
A obra contém uma coletânea de poemas de várias dimensões, perfazendo
um total aproximado de 29.500 versos, todos em rima, com um teor que enfoca
a atenção sobre a exaltação do nome divino, além de advertências pertinentes à
conduta diária de seus seguidores.
Há uma peculiaridade bastante distintiva nestes versos, ou seja, a explora­
ção da filologia em seis idiomas diferentes e diversos dialetos, tornando-a prati­
cam ente impossível de ser estudada pelos próprios sikhis com profundidade.
Isso acaba por excluir qualquer possibilidade de aprofundamento por parte dos
adeptos iletrados.
Essa realidade determinou a existência de um seletíssimo grupo entre os
sikhis que estivesse habilitado a interpretar o Granth S ah ib em sua integrali-
dade, o que obviam ente impediu a instituição de escolas especializadas na
interpretação e estudos referentes a esta sagrada literatura.
Os que conseguem atingir um grau de sabedoria moderado dentro do
sikhismo, por certo conhecem muito pouco sobre esta complexa obra, dificuldade
perfeitamente previsível se considerarmos o emaranhado filológico em questão.
Eivado de dificuldades, o livro passou a ser classificado com o elemento de
segunda grandeza dentro da religião, chegando a ser considerado com o dispen­
sável quanto ao seu emprego para aperfeiçoamento dos membros sikhistas.
Este aspecto, todavia, não promoveu a rejeição ou desdém de seus seguido­

83
res para com a sua literatura maior, pelo contrário, eles observam uma exigente
reverência à obra, quase que a ponto da idolatria.

Deus
Os sikhis têm uma crença quanto à divindade que se assemelha ao isla-
mismo. A primeira declaração de Nanaque a este respeito, lavrada logo após ter
ele recebido a chamada divina, faz parte do conjunto de sentenças iniciais do
Granth Sahib.
E le declarou: “Há som ente um D eus, cu jo nome e verdadeiro criador,
isento de tem or e inimizade, im ortal, não-nascido, auto-existente, grande e
generoso. O verdadeiro que estava no com eço”.
O nome usualmente adotado pelos sikhis para referirem-se a deidade é Sat
N am , significando “nom e verdadeiro”. Mas apesar disso, é possível tam bém
observar uma variedade de nomes que são atribuídos a Deus, todos distintos, o
que está conforme a crença sikhi de que Deus se apresenta em diversas manifes­
tações. Sobre isso, assim ensina o Granth S a h ib : “Tu, ó Senhor, és um, mas mui­
tas são as suas manifestações”.
Uma distinção sikhi quanto a Deus versa sobre a crença de que, embora Ele
seja basicamente uma unidade, não é considerado um ser pessoal, antes, filoso­
ficamente, é assemelhado à verdade e à realidade.

Salvação
Ensinam que a salvação consiste em conhecer Deus, em obter Deus e em
sermos absorvidos por Ele. Este método parece estar de acordo com a suprema­
cia de um Deus incompreensível, além das doutrinas relacionadas à indigni­
dade da humanidade e do desamparo humano.
O método sikhi, na forma em que se mostra, fala sobre se obter a salvação
por meio de uma assimilação introspectiva de Deus que alcance o espírito; do
“eu” de cada indivíduo em relação à alma do mundo místico. Este conceito
atinge uma forte semelhança à idéia que refere salvação que é propagada entre
os upaníshads, seguidores do hinduísmo.

Distinções do sikhismo
Em relação ao hinduísmo
Teoricam ente, o sikhismo concorda com o hinduísmo quanto à crença em
uma Unidade Suprema mística, e uma certa aplicação teísta que se observa no
panteísmo, na forma com o ocorre com os upanishads e no Bhagavad Gita.

84
Crê na mesma forma de salvação pela fé na graça de Deus, na doutrina do
carma e na transmigração da alma. Discorda, porém, do politeísmo hindu, das
peregrinações ditadas pela norma, da ritualística e do modo de vida asceta,
embora aplique a adoração ao que é puro.
Rejeita tam bém os escritos hindus e a degradação a qual as comunidades
hindus infligem suas mulheres, por acreditar que elas m ereçam consideração
mais elevada. Preferem um aumento na taxa de natalidade ao infanticídio, que
é prática hindu com um , desobrigando ainda, a suposta necessidade de um
vegetarianismo total, proporcionando a todos uma dieta que inclui carnes.
Em relação ao islamísmo
Desta religião o sikhismo extraiu a crença da Unidade do Supremo Ser,
bem com o a soberania deste Ser Absoluto e sua divindade incompreensível.
E comum tam bém a esperança que se baseia na sujeição a Deus e a adora­
ção que se efetua na repetição do nome da divindade. Concorda com a cons­
tante repetição das orações prescritas e com a devoção que dirige ao fundador,
com o sendo legítimo emissário divino.
Assim com o os muçulmanos, os sikhis são reverentes aos escritos sagrados,
entendendo ser correta a linhagem de sucessores que se forma após a morte de
seu fundador (Nanaque para os sikhis e M aom é para os muçulmanos), além de
adotar uma estrutura de governo que esteja intimamente ligada à religião.
A unidade entre os seguidores e a definição de um santuário principal
muito reverenciado por todos (Amritsar para os sikhis e M eca para os islâmicos),
são pontos concordes em ambas, assim com o a abominação à idolatria.
Em divergência aos muçulmanos, os sikhis destacam a natureza colérica
de M aom é enquanto Nanaque era um líder gentil. Desta mesma forma, a divin­
dade sikhi não é rude e severa com o aquela do Islã. Apoiam a formação literária
que aconteceu pelas mãos de pelo menos trinta e cinco mestres, enquanto que
o Corão é atribuído a apenas um autor.
A prática do jejum no período do Ramadan, parte indivisível na cerimônia
islâmica, não possui equivalente no sikhismo, da mesma forma que não se prega
um dia de julgam ento específico no qual D eus operará a justiça sobre os
homens.

85
Conclusão

Neste primeiro contato com as religiões não-cristãs, pudemos ampliar a


gama de conhecim entos acerca das variadas liturgias, rituais e demais elem en­
tos que se acham inseridos nas culturas religiosas examinadas neste módulo.
Não se deve, entretanto, considerar o assunto de qualquer forma esgotado.
A coleção de dados colecionados nesta etapa do Curso de A pologétíca Fase II,
visa proporcionar um domínio mais significativo do estudante quanto a estas
onze profissões religiosas panoramicam ente estudadas, pouco exploradas até
mesmo pela apologétíca brasileira cotidiana, talvez devido à distância de suas
origens e práticas, talvez pela baixa representatividade das mesmas em territó­
rios sul-americanos.
O propósito, todavia, é o de habilitar o aluno para debater, explicar e tecer
comentários sóbrios e pertinentes acerca de cada uma delas, o que, sem dúvida,
importa àqueles que desejam efetivamente ingressar de forma sólida no campo
apologético cristão.

86
Questionário

1. 0 Avesta é considerado o livro sagrado de qual religião?


2. Defina o termo Samsara.
3. Em que ano morreu Maomé?
4. Quais são as quatro verdades nobres budistas?
5. Qual o conceito animista acerca dos mortos?
6. Quem foi Kong Fou Tseu?
7. Quais são as cinco virtudes essenciais do ser humano segundo o confucio-
nismo?
8. Explique o sistema de castas hindu.
9. Quem foram: Ananda (budismo), M êncio (confucionismo), C h u an g T zé
(taoísmo), Zayd (islamismo) e Angade (sikhismo)?
10. Que religião prega que seu fundador nasceu ancião?
11. Que festa judaica é celebrada dez dias após a festa do ano novo?
12. Quais são as cinco classes de essências classificadas pelo jainismo?
1 3 . 0 que significa a palavra xintoísmo?
14. Que religião considera o Japão como o país dos deuses?
15. Explique o que é o Talmude e a Midrash.
16. Onde, quando e com o surgiu o zen-budismo?
1 7 . 0 que é o Yin e o Yang?
18. Com ente sobre as divisões do islamismo - xiitas, sunitas e sufitas.
19. Em que o sikhismo difere do islamismo e do hinduísmo?
20. Que religião advoga ter influenciado as grandes religiões monoteístas?

87
Referências bibliográficas

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fia. São Paulo: Candeia, 1997.

88
História das heresias
primitivas
SUMÁRIO

Introdução - VERDADE VERSUS HERESIA........................................................... 91


Capítulo 1 - O PERÍODO APOSTÓLICO - JUDAIZANTES, EBIONITAS,
NlCOLAÍTAS EA FILOSOFIA GREGA.............................................. 93
Capítulo 2 - G nosticismo e M ontanismo - Dois importantes
DESAFIOS ÀCORRENTE PRINCIPAL DO
CRISTIANISMO ANTIGO...................................................................... 100
Capítulo 3 - M onarquianismo e Arianismo - As primeiras
CONTROVÉRSIAS CRISTOLÓGICAS................................................... 111
Capítulo 4 - N ovas controvérsias cristológicas -A polinarismo,
N estorianismo , E utiquianismo e M o n o t e l is m o .......... 130
Capítulo 5 - P elagianismo - U ma controvérsia sobre a
NATUREZA HUMANA E A GRAÇA DIVINA........................................... 140
Conclusão - Panorama G eral ............................................................................... 142
Apêndice 1 - QlJADRO RESUMIDO DOS CONCÍLIOS TRINITÁRIOS
E CRISTOLÓGICOS............................................................................... 144
Apêndice 2 - As heresias relacionadas com o E spírito Sa n t o .......... 145
Apêndice 3 - O T omo de L e ã o ............................................................................ 146
Apêndice4 - Alexandria e Antioquia - duas escolas t e o l ó g ic a s 149
C o n c lu s ã o ................................................................................................................... 153
Questionário
Referências bibliográficas
Introdução

VERDADE VERSUS HERESIA

“Estas coisas vos escrevi acerca dos que vos enganam.” (1 Jo 2.26)
A distorção do ensino cristão não é uma exclusividade de nossa época.
Aliás, em cada período da Igreja se levantaram homens que de uma forma ou
outra deturparam a mensagem da salvação.
A Igreja primitiva, desde o período apostólico, teve de lidar com este fator.
Além da perseguição externa que buscava levar os cristãos a renegar sua fé, havia
ainda ensinos errôneos que comprometiam a mensagem. Cabia, pois, aos líde­
res de cada época, manterem-se firmes contra a perseguição e ao mesmo tempo
rebater os ensinos heréticos por meio das Escrituras.
Estes falsos ensinos foram, muitas vezes, com pletam ente vencidos, ressur­
gindo tempos depois na história da Igreja. Outras vezes, formaram seitas parti­
culares que duraram anos até se extinguirem por si só. Na verdade, a primeira
área desenvolvida dentro do ensino teológico foi a apologética. O primeiro desa­
fio foi defender a fé diante dos falsos ensinos e mostrar a superioridade do cris­
tianismo sobre as filosofias e religiões vigentes.
Vale lembrar que o Evangelho snrge dentro de nm contexto cultural, tanto
judaico, quanto greco-romano e, portanto, era impossível evitar a influência
desse contexto sobre a mensagem. Era muito fácil para um indivíduo ou grupo,
misturar elementos evangélicos com a filosofia grega, ou com a religião judaica
ou mesmo com as “seitas de mistério” existentes na época. O sincretismo predo­
minou inúmeras vezes.
Nesse ínterim, é importante salientar a mensagem do Evangelho em dois
aspectos:

Uma nova m anifestação de Deus para a hum anidade


“E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a gló­
ria do Unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade” (Jo 1.14). Embora a vinda
de Jesus tenha sido o cumprimento de promessas milenares, agora não se trata­
va mais de mera continuação do Antigo Testamento, mas a introdução na histó­

91
ria humana do próprio Filho de Deus, possibilitando um novo relacionamento
com este Deus (E f 3.1-8).

Uma nova realidade expressa de forma escrita e inspirada divinamente


Não se tratava de simples reflexão sobre os acontecim entos, mas de uma
mensagem revelada: "M as faço-vos saber, irmãos, que o evangelho que por mim
foi anunciado não é segundo os homens. Porque não o recebi, nem aprendi de
hom em algum, mas pela revelação de Jesus Cristo” (G1 1.11,12). Em bora a
transmissão da mensagem pudesse se utilizar do contexto dos mensageiros, a
essência da mensagem era originária em Deus. Não era uma apropriação de
conceitos já existentes, mas a proclamação da verdade divina.
A luta interna dos líderes cristãos foi justamente manter pura esta revelação,
protegendo-a da infiltração das idéias pagãs ou mesmo judaicas correntes. C on­
forme a mensagem do Evangelho sofria influência do meio, tornava-se neces­
sário a formulação de conceitos bem definidos. A formação do Canon, os Con-
cílios e os Credos foram necessidades cristãs históricas como meio de proteger a
mensagem das distorções.
Principalmente em sua infância, quando a Igreja ainda estava em fase de
form ação, esse tipo de cuidado era relevante. O cristianismo poderia ter-se
diluído em meio aos inúmeros movimentos e as variadas filosofias da época,
com o quase aconteceu, se não fosse a firmeza das posições apresentadas pelos
apóstolos e apologistas da Igreja primitiva.
Porém, esta luta tem prosseguido através dos séculos. As heresias renascem
e crescem nesta Era de rápida informação. E o passado tem muito a nos ensinar
sobre esta batalha. O campo da ortodoxia cristã também gerou muitos heróis.
Dignos de serem lembrados e imitados não são apenas aqueles que foram ins­
trumentos de Deus para divulgação do Evangelho (os evangelistas), mas tam­
bém aqueles que dedicaram suas vidas a manter esse mesmo Evangelho puro
(os apologistas).
“Amados, procurando eu escrever-vos com toda a diligência acerca da sal­
vação com um , tive por necessidade escrever-vos, e exortar-vos a batalhar pela fé
que uma vez foi dada aos santos.” (Judas 3).
Que assim seja!

92
Capítulo 1

O PERÍODO APOSTÓLICO
Judaizantes, Ebionitas, Nicolaítas e a filosofia grega

O
período apostólico pode ser considerado, por convenção his­
tórica, como abrangendo a história da Igreja desde a sua for­
mação no dia de Pentecoste (At 2), até a morte do apóstolo
João, cerca de 90 d.C. Isto significa cerca de 57 anos em que a Igreja se
desenvolveu, tendo a supervisão direta ou indireta de algum apóstolo.
Durante este tempo, não foram poucas as vezes em que houve não só
desvios morais, mas também doutrinários entre aqueles que receberam
a Palavra. Isto levou os apóstolos a escreverem suas epístolas, que eram
verdadeiros tratados, com teores doutrinários, teológicos e apologéti-
cos. Não só as epístolas, mas até mesmo os demais escritos do Novo Tes­
tamento apresentam caráter apologético em algum ponto, visando cor­
rigir inverdades históricas e doutrinárias correntes.
Ao lermos os escritos apostólicos, nem sempre há declarações eviden­
tes sobre as distorções que o Evangelho estava sofrendo. Mas é bastan­
te evidente que as epístolas de uma forma especial, foram motivadas
por idéias errôneas entre os destinatários. Poderiamos classificar estes
desvios em duas correntes principais. Uma tinha sua origem no judaís­
mo, com sua ênfase sobre a lei e as cerimônias. A outra, era de origem
religiosa-filosófica, com profundas raízes no mundo grego.
Estas tendências não morreram juntamente com os apóstolos, mas se
desenvolveram em grandes sistemas como o gnosticismo ou em
pequenas seitas como os ebionitas. Todavia, os escritos apostólicos já
haviam erguido os muros da verdade contra os embaraços das heresias.
Mesmo que, algumas vezes, na história falsos conceitos, tenham pene­
trado na igreja, observamos que aqueles documentos inspirados foram
a base para defesa e correção dos desmandos, sempre que alguém se
dispôs a usá-los com coragem e sinceridade. A manutenção da verda­
de tornou-se possível, pois conceitos e idéias falsas já haviam sido devi-

93
damente rebatidas pelos escritos neotestamentários. As heresias pros­
seguiram, mas a verdade também.

Os judaizantes
O rompimento doutrinário com o judaísmo não se deu sem muita luta. O
cristianismo poderia ter permanecido uma mera seita judaica, não fosse a visão
e a persistência de Paulo frente às tentativas de alguns grupos em transformar a
mensagem do Evangelho em uma extensão da lei mosaica. Ele foi o homem
usado por Deus para fazer a conexão entre os mundos judaico e gentio. Seu
conhecim ento de ambos os mundos foi um importante fator de ligação.
Ao ler os escritos paulinos, é fácil perceber que este foi um dos piores pro­
blemas enfrentados pelo apóstolo. Sua insistência na salvação pela graça à parte
da lei mosaica, valeu-lhe a inimizade de pregadores com fortes raízes judaicas.
Para atacar Paulo, estes opositores buscavam invalidar sua autoridade apostóli­
ca, uma vez que ele não fazia parte dos doze. Por conseqüência, ele se via obri­
gado a defender não apenas o Evangelho que pregava, mas tam bém sua própria
autoridade.
Dos escritos mais significativos sobre este debate, tem os a epístola aos
Gaiatas. Nesta, ele defende tanto sua autoridade apostólica, quanto combate
elementos judaizantes que estavam se introduzindo nas igrejas daquela região.
D efinítivam ente ele exorta aos seus destinatários cristãos a não aceitarem
“outro evangelho” sob pena de maldição (G1 1.8,9). Em seguida, faz toda uma
defesa de seu apostolado e suas relações com os apóstolos em Jerusalém (G1
1. 11- 20 ).
Ao ler os capítulos seguintes, podemos ter uma idéia das heresias judaizan­
tes que estavam para ser introduzidas ali. O tom da carta é severo, pois caso estas
heresias não fossem rejeitadas, o cristianismo não seria mais do que um judaís­
mo com um Messias. E Paulo sabia muito bem que não se tratava disto. Em
meio aos elementos judaicos existentes entre eles, podemos identificar:

A prática da circuncisão
A circuncisão era um sinal do pacto de Deus com o povo de Israel, a des­
cendência física de Abraão (Gn 17.10). Mas os judaizantes exigiam dos conver­
tidos a Cristo que se circuncidassem. Assim, Paulo protesta veem entem ente
contra aqueles que se deixaram circuncidar (G1 5.3,4). Mostrou que os que
assim procederam, o fizeram por motivos falsos. E que estas coisas não tinham
valor em si mesmas, mas que o valor era se tornar nova criatura em Cristo e viver

94
uma vida de fé e amor (G 16.15). Para o apóstolo a verdadeira circuncisão era do
coração e isto estava de acordo com a lei e os profetas (Rm 2.28,29; D t 30.6).

A guarda de dias especiais e das festas judaicas


Quando os gálatas com eçaram a guardar as festas judaicas, tanto o Sábado
quanto as luas novas e outras festividades (G1 4 .10), Paulo viu isto com o um
retrocesso (G1 4.11) chegando a duvidar da eficácia da mensagem do Evan­
gelho entre eles (G1 3.3). Na epístola aos colossenses, entre os quais parece ter
havido uma heresia sem elhante, ele mostra que as festas eram apenas “som­
bras”, em contraste com a realidade revelada em Cristo (C l 2.16,17).

A lei com o padrão de comportamento para o crente


O terceiro elemento da judaização do Evangelho envolvia a questão da santi­
ficação. Alei não era mais o padrão para o viver diário e Paulo vai colocar a lei como:
provisória (2Co 3.11), como aio (G1 3.24,25), como impossível de herdar as pro­
messas (G14.30). Ele contrapõe o Espírito Santo à lei, como vemos em outros escri­
tos seus, no terceiro capítulo da segunda epístola aos coríntios, por exemplo
(2C o 3.6). Classifica a tentativa de aperfeiçoar-se pela lei, como uma tentativa car­
nal (C l 3.3). Condena o pecado tal qual a lei fazia, mas coloca a cruz e o Espírito
Santo como os meios existentes para levar o crente à santificação (G1 5.24,25). No
tempo em que foi escrita a primeira epístola a Timóteo, este problema subsistia
ainda, pelo que ele teve de mostrar o verdadeiro caráter da lei ( lT m 1.8-10).
Esta foi sua postura frente às heresias judaizantes. Suas colocações inspiradas
foram causas de uma ruptura definitiva entre cristianismo e judaísmo. Seria só
questão de tempo e estes elementos desapareceríam do seio da igreja, pelo menos
nestes moldes.

Filosofia e religião grega


Em Atos 17.18 vemos Paulo debatendo com os epicureus e estóicos, duas
das principais correntes filosóficas do mundo greco-romano. Era difícil impedir
que estas correntes de pensam ento viessem a influenciar a doutrina cristã.
Parece que, na epístola de Paulo aos colossenses, podemos ver alguns movimen­
tos heréticos surgindo. Lemos sobre:
• O cuidado com palavras persuasivas (C l 2.4);
• As filosofias, vãs sutilezas, tradição dos homens e rudimentos do mundo
que são opostos a Cristo (C l 2.8);
• A guarda dos sábados e dias de festas, questões alimentares (C l 2.16);

95
• O culto aos anjos e falsas visões (Cl 2.18);
• E , finalmente, o ascetismo1 (Cl 2.20-23).
O apóstolo mostra Cristo como sendo aquele sobre o qual estamos edificados
e enraizados (C l 2.7); Cristo com o a realidade representada nas festas (Cl 2.17)
e todo ascetism o com o sendo de nenhum efeito contra a cob iça da carne
(C l 2 .20-23). Esta é uma pequena amostra de como o Evangelho sofria ata­
ques doutrinários desde as suas raízes.

A questão da ressurreição
Um dos problemas enfrentados por Paulo entre os cristãos de Corinto foi a
questão da ressurreição. Este era um conceito estranho à cultura grega e logo
não tardou quem colocasse a ressurreição de Cristo com o algo duvidoso. O
capítulo quinze da primeira epístola aos coríntios, é um verdadeiro tratado apo-
logético da ressurreição, visando com bater essa heresia.
O capítulo começa com o apóstolo dos gentios mostrando que a ressurreição
era parte essencial do Evangelho ( IC o 15.1-4). Em seguida, ele relaciona as teste­
munhas históricas da ressurreição de Cristo (IC o 15.5-8). Era uma forma de fun­
damentar a pregação evangélica não apenas com especulações teológicas, mas
com fatos concretos que dispunha de inúmeras testemunhas (IC o 15.6). Em
seguida ele passa a apresentar os efeitos de uma negação da ressurreição de Cristo
sobre a mensagem do Evangelho (1 C o 15.12-19). Até o final do capítulo ele discor­
re profunda e amplamente sobre os detalhes ligados à ressurreição, desde a natu­
reza dos corpos ressuscitados até a natureza completa do evento (IC o 15.20-58).
Sem este maravilhoso capítulo paulino, com certeza perderiamos este precio­
so material expositivo sobre um dos pontos centrais do Evangelho. Mais tarde,
Paulo expõe novamente o conceito de ressurreição aos coríntios (2Co 5.1-10). Era
importante que esta verdade não se perdesse, pois faz parte do cerne do Evangelho.
Todavia, vamos encontrar posteriormente outra heresia em torno da ressur­
reição. Alguns a anunciavam com o se já tivesse acontecido (2Tm 2.18). Paulo
identificou isso como uma gravíssima corrupção do Evangelho, classificando-
a de gangrena2 ou câncer (2Tm 2.17) e tomou atitudes extremas contra os here-
ges deturpadores (2Tm 2.19).

1 Moral filosófica ou religiosa, baseada no desprezo do corpo e das sensações corporais, e que
tende a assegurar, pelos sofrimentos físicos, o triunfo do espírito sobre os instintos e as paixões.
^ Necrose de tecidos causada por defeito na contribuição de oxigênio pelo sangue, seguida de
decomposição e apodrecimento.

96
Gnosticismo embrionário
Em bora o gnosticismo tenha se desenvolvido plenamente após o período
pós-apostólico, encontramos vestígios do mesmo por meio de algumas epísto­
las, principalmente as de João, embora em alguns escritos paulinos, possamos
perceber o mesmo tam bém , bem com o em outros escritos.
Quando com eçam os a ler a respeito desta heresia nos tempos posteriores,
logo percebemos que muito do que foi escrito, teve com o propósito rebater estas
falsas doutrinas. Isto foi de grande valia, pois quando o gnosticismo se desenvol­
veu em um sistema com plexo, os pais chamados apostólicos dispunham dos
escritos inspirados para desmascarar a falsidade desse sistema.
Alguns líderes da Igreja primitiva fizeram retroceder a doutrina gnóstica
até Simão Mágico, personagem citado em Atos 8 que teve uma falsa conversão
e que tinha profundas raízes na magia grega. Não é possível confirmar essa afir­
mação pelos escritos do Novo Testamento, mas faz parte das tradições da Igreja
primitiva. Eusébio de Cesaréia, o grande historiador da Igreja no século IV,
apoiando-se em outro historiador (Hegesipo), coloca a origem do gnosticismo
em seitas judaicas. Ainda outros apontaram para a filosofia grega. É bem possí­
vel que se tratasse de um sincretismo que se utilizou elementos religiosos-filo-
sóficos de diversos grupos.
Paulo, em sua primeira carta a Tim óteo, diz para este evitar conversas vãs e
profanas e as oposições “da falsamente chamada ciência (gnose)” (lT m 6.20).
É bem possível que certas idéias gnósticas já circulassem neste período.
Entretanto, o principal tratado contra o gnosticismo se encontra nas epísto­
las joaninas. O ponto central é quanto à encarnação do Verbo. Os gnósticos em
sua aversão à matéria, não podiam conceber um Salvador de carne e osso. A
matéria era má e, portanto, Jesus não poderia ter vindo em carne. Neste aspecto
havia duas saídas: ou ele não teve um corpo verdadeiro, mas era puro espírito, ou
se fazia distinção entre Jesus e o Cristo, sendo que este último desceu sobre o
homem Jesus no dia de seu batismo.
Pelo que podemos deduzir de ljo ã o 2.26, havia grupos com eçando a dis­
torcer a mensagem do Evangelho. Pelos versículos 18 e 19 podemos perceber
que estas pessoas já haviam participado do cristianismo de alguma forma e
agora começavam a propagar falsos ensinos. Em ljo ã o 4.1-5 parece haver um
grupo com estas características. João classifica-os com o “anticristos” e falsos
profetas. Em sua segunda epístola ele insiste no mesmo ponto, dizendo que
“muitos enganadores entraram no mundo, os quais não confessam que Jesus
Cristo veio em carne. Este tal é o enganador e o anticristo” (v. 7). M esmo no

97
evangelho de João, a questão da encarnação do Verbo (Jo 1.14) tam bém é uma
refutação à doutrina gnóstica.

Nicolaítas
Este é um termo que aparece nas cartas do Apocalipse por duas vezes e por
isso ganhou a atenção dos estudiosos das heresias primitivas. Se considerarmos
o ano 90 d.C. com o data provável para o livro do Apocalipse, então já temos
aqui uma seita bastante desenvolvida, mas de difícil identificação. O Novo Tes­
tam ento fala em “obras dos nicolaítas” (Ap 2.6) e em “doutrina dos nicolaítas”
(Ap 2.15) o que dá a entender um grupo organizado com práticas e doutrinas.
Temos uma referência de Irineu sobre o assunto: “Os nicolaítas têm por mes­
tre Nicolau, um dos sete primeiros diáconos que foram constituídos pelos apósto­
los. Vivem sem moderação. O Apocalipse de João manifesta plenamente quem
são: ensinam que a fornicação e o comer das carnes oferecidas aos ídolos seja coisa
indiferente”.
Também Tertuliano de Cartago atribui ao diácono helenista a paternidade
da seita: “Nicolau de Antioquia, um gentio que seguia a religião judaica, m en­
cionado em Atos 6.5, teria, para se justificar, apresentado sua esposa à assem­
bléia dos crentes dizendo: ‘Quem a quiser pode desposá-la, pois é necessário ter
em pouca estima a carne’ (isto é, é preciso ter desprezo à carne)”.
Embora combatido, este movimento herético conseguiu sobreviver até por
volta do ano 200 d.C., quando então se dissolveu em um tipo de gnosticismo
denominado O fita, ligado ao culto às serpentes.
Com o podemos ver, o desenvolvimento de certas heresias a partir da dou­
trina cristã foi bastante amplo. Esse seria o segundo desafio que a Igreja do pró­
ximo período teria de enfrentar. O primeiro era a perseguição. O risco de per­
der a identidade em meio a tantos desvios diferentes era grande. Mas a Igreja
reagiu nos momentos certos e se não conseguiu refrear com pletam ente certos
elementos, conseguiu firmar sua doutrina de modo coerente, deixando funda­
mentos que mais tarde possibilitariam o renascimento do cristianismo bíblico
no século XVI.

Ebionitas
Os ebionitas tiveram sua origem no cristianismo judaico de Jerusalém.
Embora alguns tenham tentado criar um certo “Ebion” com o sendo o funda­
dor desta seita, o certo é que o nome deriva da palavra hebraica evjoním , que sig­
nifica “os pobres”. A princípio, este era um nome honroso para os cristãos em

98
Jerusalém. Mas neste contexto se refere a uma seita herética que emigrou para
leste do Jordão e misturou de forma inadequada elementos judaicos e cristãos.
A diferença substancial que separava os ebionitas dos demais judeus-cris-
tãos e dos helenistas consistia na maneira de conceberem a pessoa e a obra de
Jesus. Por seu monoteísmo restrito, não admitiam qualquer insinuação sobre a
divindade de Jesus.
Alguns supõem que os ebionitas se misturaram e conseqüentem ente rece­
beram forte influência dos essênios, povo que praticava um judaísmo ascético e
vivia na região do Alar Morto. C om o pouco material existente sobre eles, é
impossível fazer uma descrição minuciosa, mas podemos ter um pequeno vis­
lumbre do pensamento desta seita. Vejamos:

Influência do judaísmo
Tal qual os judaizantes da época de Paulo, os ebionitas insistiam na guarda
da lei de Aloisés, não só para si, mas para todos os que se convertessem entre os
gentios. Com o conseqiiência disso, rejeitavam os escritos paulinos e se recusa­
vam a aceitar suas epístolas.

A cristologia do ebionism o
Os ebionitas rejeitaram com pletam ente a divindade de Cristo. C o lo ­
cavam-no no mesmo nível dos demais profetas do Antigo Testamento. Ele nada
mais era do que o novo Moisés. Negavam sua preexistência, sua encarnação e
seu nascimento virginal. Em seu conceito, embora ele fosse o Messias, era pura­
mente humano. Som ente no batismo ele foi ungido com o o Messias, ou seja,
adotado com o Filho de Deus. Jesus era para eles um judeu, fiel, piedoso, profe­
ta e mestre inigualável.
O ebionismo não durou mais que 350 anos. Logo se dividiu em diversas sei­
tas e desapareceu sem deixar qualquer marca forte na teologia cristã. Todavia,
exerceu forte influência sobre a teologia islâmica e não é difícil enxergar seme­
lhanças entre o pensamento islâmico e o pensamento ebionista.

99
Capítulo 2

GN OSTICISMO E MONTANISMO
Dois importantes desafios à corrente principal do cristianismo antigo

F
oi uma das piores doutrinas inimigas do cristianismo. Embora
existissem várias correntes diferentes de gnosticismo, todas elas
foram influenciadas pelo neoplatonismo e pelo pensamento
grego em geral. Segundo o historiador Edward Gibbon, havia mais de
50 grupos gnósticos diferentes. Não podemos chamar o gnosticismo de
seita ou religião. O mais correto seria classificá-lo como uma corrente de
pensamento, dividida em vários sistemas e escolas. Ao que parece foi
uma das primeiras heresias cristãs visto que, conforme a opinião de
alguns, os escritos do apóstolo João foram concretizados visando comba­
ter essas idéias errôneas a respeito de Cristo.
Podemos classificar o gnosticismo como a tentativa racionalista grega,
de incluir o cristianismo em um sistema filosófico-religioso, com forte
predominância do elemento cognitivo^. Em outras palavras, embora
a fé fosse o elemento primordial no cristianismo apostólico, este movi­
mento tratou de transformar o conhecimento e a sabedoria em ele-
mento-chave, bem ao sabor da cultura grega.

Literatura gnóstica
Ao invés dos quatro evangelhos adotados pela Igreja, os gnósticos produzi­
ram uma literatura numerosa, com uma multidão de histórias fictícias, nas
quais as ações e discursos de Cristo e de seus apóstolos foram adaptados segun­
do as tendências dos diversos grupos. Em bora a maior parte dessa literatura
tenha chegado até nós somente através dos escritos dos pais apostólicos, recen­
temente (1946) foi descoberto em Luxor, no Egito, manuscritos de conteúdo
gnóstico. Foram encontrados cerca de 13 códices, contendo cerca de 48 escri­
tos gnósticos.

^ Aquisição de um conhecimento.

ÍO O
Conceitos principais do gnosticismo
Em bora variassem os costumes litúrgicos e os elementos mitológicos, é pos­
sível descobrir os conceitos básicos principais:

D ualism o da natureza
O gnosticismo enfatizava a dualidade da natureza. Havia o mundo físico e
o mundo espiritual. Até este ponto, nenhum problema. Mas o mundo físico era
identificado com o mal, com o algo inferior, enquanto o mundo espiritual era
identificado com o bem , sendo superior àquele. A partir deste princípio, origi­
nado do platonismo e do neoplatonismo, o cristianismo foi desfigurado. Este
conceito atingiría toda a doutrina cristã.

O Deus criador
Pelo fato de o mundo físico ser mal, ele não poderia ter sido criado por um
Deus bom. Logo, a criação não foi obra do Pai de Jesus Cristo, o Deus do Novo
Testamento, mas foi obra do Deus judaico, que se revela no Antigo Testamento.
Esse “deus” criador foi chamado de Demiurgo, um Deus inferior uma vez que
era o criador da matéria. Também por causa disto, o gnosticismo era contradi­
tório a tudo o que dizia respeito ao Antigo Testamento, rejeitando a lei e ensi­
nando que o homem se libertava dela adquirindo “percepções superiores”.
Os pais eclesiásticos, principalm ente Irineu, com bateram esse ensino,
mostrando que só havia um Deus único que foi o criador de todas as coisas e que
se revelou aos profetas e por fim revelou-se a si mesmo em seu Filho.

A doutrina dos éons


Para explicar essa distinção entre o Deus verdadeiro e o Demiurgo, entre o
mundo espiritual e o mundo material, os gnósticos criaram a doutrina dos éons.
Um dos principais gnósticos, Valentino, ensinava que existia uma corrente de 30
éons que emanavam da Divindade, sendo que o mundo material fora originado
pelo mais baixo éon da cadeia, não como resultado de um desejo criativo, mas
como resultado de uma queda. O Deus supremo ou progenitor formava o primei­
ro éon , também conhecido como buthos (abismo). Depois vinham, em ordem, o
silêncio ou idéia e o espírito e a verdade. Depois, por sua vez, vieram razão e vida
e desta veio o homem e a igreja. A partir daí outros dez éons apareceram. O últi­
mo éon teria caído como resultado de um ataque de paixão e ansiedade e foi por
causa desta queda que o mundo material chegou a existir. O Demiurgo - que
criou o mundo - procedeu deste éon caído.

101
A soteriologia do gnostícismo
Os éons mais elevados teriam dado origem a Cristo e ao Espírito Santo. A
tarefa de Cristo seria livrar as almas dos hom ens de seu cativeiro ao mundo
material e trazê-las de volta ao mundo dos espíritos. Este era o conceito gnósti-
co de salvação - um retorno das almas do mundo material, onde tinham caído
e sido aprisionadas, para o mundo espiritual.
Mas esta salvação só era possível por meio da percepção superior (gnosis).
Era um tipo de sabedoria esotérica que proporcionava conhecim ento rela­
tivo ao pleroma ou mundo superior espiritual e ao caminho que conduzia para
lá. Nem todos podiam alcançar esta salvação, apenas os chamados pneumatólo-
go, que possuíam o poder necessário para receber este conhecim ento. Os que
não eram capazes disso, eram classificados com o materialistas. Alguns gnósticos
criaram uma classificação intermediária chamada de “psíquicos ”, na qual os
cristãos eram geralmente inclusos.
A grande refutação dos polemistas (pais da igreja que combateram esse e
outros tipos de heresias), era que os gnósticos excluíram a fé do seu sistema,
substituindo-a por um conhecim ento pertencente a um pequeno grupo seleto.

A cristologia do gnostícismo
A posição gnóstica a respeito de Cristo recebeu o nome de “docetismo”, pala­
vra originária do grego dokeo, que significa parecer. Com o a matéria era má, Cristo
não podia ter um corpo humano apesar de a Bíblia dizer o contrário. Com o “bem ”
espiritual absoluto, Cristo não se misturava com a matéria. O homem Jesus era ou
um fantasma com aparência de corpo material ou o Cristo tomou seu corpo por
ocasião do batismo e o deixou no com eço de seu sofrimento na cruz.

Gnostícismo e Cristianismo
Embora existisse uma grande diferença entre cristianismo e gnostícismo,
este tomou vários conceitos daquele e atribuiu características diferentes. Cristo,
por exemplo, era considerado como salvador, por ter ele trazido conhecim ento
salvífico ao mundo. Mas este Cristo não era o Filho de Deus que encarnou, mas
uma essência espiritual que havia emanado. Este Cristo não podia ter assumi­
do a forma de homem , uma vez que então seria matéria e conseqíientem ente
seria mal. Ele apenas parecia ter corpo físico. E da mesma forma ele não sofreu
nem morreu, visto ser isto característica da matéria. Este ensino foi chamado de
docetismo (ver a seguir).
O sacrifício de Cristo na cruz não tinha importância alguma dentro do sis­
tema gnóstico. E le foi apenas o transmissor daquele conhecim ento de que o

102
homem precisa para iniciar sua jornada de volta ao reino da luz - a jornada em
direção ao pleroma.
O gnosticism o utilizava certos mistérios que lhe eram característicos.
Tomou emprestado do cristianismo o batismo e a C eia do Senhor de formas
deturpadas. Além de vários ritos sagrados de natureza similar. Por meio deles, os
gnósticos diziam receber os segredos da salvação. Eram fórmulas místicas que
segundo eles os protegiam e lhes davam forças para vencer o mal e caminhar
nesta jornada ao pleroma.

Gnosticismo e ética
Sua noção de dualismo influenciava tam bém seus conceitos éticos. Pois se
a matéria é má em si, então um afastamento físico dela tem sentido de purifica­
ção. Certos grupos como os chamados encratitas (citados por Eusébio em sua
História Eclesiástica, IV, 28-29) observavam um comportamento de abstinên­
cia excessiva. Alguns acreditam que foi este ascetismo que originou o movimen­
to monástico dentro do cristianismo. D e fato, o isolamento dos monges, a prin­
cípio individual com o no caso dos anacoretas egípcios, e depois coletivo no
Ocidente, identifica-se muito com a moral ascética gnóstica. Senão diretamen­
te, ao menos pode ter tido influência indireta.
Em alguns casos, porém, o efeito deste conceito de matéria conduzia ao
outro extremo. Com o a matéria não tinha valor algum, certos grupos gnósticos
entregavam-se a um comportamento libertino, manifestando todo tipo de con-
cupiscência com o sendo algo indiferente e que não podia afetar o espírito.
Vejamos dois grupos gnósticos, o cerintianismo e o maniqueísmo.

Cerintianismo
Antiga religião que recebeu o nome de seu fundador, Cerinto (por volta de
100 d.C.), primeiro mestre gnóstico, judeu de raça. Gnóstico cujas atividades
se intensificaram no fim do primeiro século. Segundo Irineu de Lião, ele ensi­
nava que não foi Deus quem fez o mundo, mas uma Virtude ou Potência sepa­
rada por uma distância considerável da Suprema Virtude. E tam bém ensinava
que Jesus não nasceu de um virgem, mas foi simplesmente produto de uma rela­
ção normal entre José e Maria. Foi somente no seu batismo que um Princípio
Superior veio sobre cie em forma de pomba. Antes de Jesus morrer o Cristo se
retirou dele e depois reapareceu impassível, visto ser apenas um espírito.
Seu gnosticismo apresenta outras características fortemente judaizantes e
idéias correntes entre o meio místico-judaico. Baseado em uma citação do his­
toriador eclesiástico Eusébio, parece que ele foi contem porâneo do apóstolo
João e é bem possível que tenha sido este tipo de gnosticismo combatido através
de suas cartas.

Maniqueísmo
Antiga religião que recebeu o nome de seu fundador, o sábio persa M ani,
ou Manes ou ainda Maniqueu (216 —276 d.C .). Ele acreditava que um anjo lhe
havia aparecido e o nomeara profeta de uma nova e última revelação. Pregou
por todo Império persa, inclusive enviou missionários ao Império romano. Foi
preso, acusado de heresia e morreu pouco tempo depois.
O maniqueísmo reflete uma forte influência do agnosticismo. Sua doutrina
baseia-se em uma divisão dualista do Universo, na luta entre o bem (Deus) e o mal
(Satã). Esses dois âmbitos estavam separados, porém a escuridão invadiu a luz e
se mesclaram. A espécie humana é o produto desta luta. C om o tempo, poder-se-
ia resgatar todos os fragmentos da luz divina e o mundo se destruiría; depois disso,
a luz e a escuridão estariam novamente separadas para sempre. E difícil não notar
a forte influência do zoroastrismo nos conceitos estabelecidos por Mani.
Podemos dizer que era uma com binação do pensamento cristão, do zoroas­
trismo e de idéias religiosas orientais. Em muitos pontos se assemelhava a outros
ramos do gnosticismo. Seu ascetismo, por exemplo, era extremo, exaltando o
celibato com o a maior das virtudes.
Os maniqueístas dividiam-se em duas classes: os eleitos, celibatários rigoro­
sos, eram vegetarianos e se dedicavam somente à oração; e os ouvintes, cuja
esperança era voltar a nascer convertidos em eleitos.
O maniqueísmo exerceu influência durante um bom tempo após a morte
de Mani. Agostinho por exemplo, no século IV, foi discípulo deles por 12 anos,
pois esta seita era bastante numerosa na África. Agostinho se viu atraído por eles,
devido à sua explicação racional do mundo, bem como pelo seu código moral
ascético, que temporariamente lhe ofereceu uma solução para os seus proble­
mas espirituais. Com o tempo, o caráter fraudulento da doutrina maniqueísta
foi se tornando evidente para Agostinho, até que decidiu deixá-la. Depois de sua
conversão, porém, trabalhou arduamente para refutá-los.

Outros nomes do gnosticismo

M arcião
Mesmo que alguns não o considerassem estritamente um gnóstico, devido
a algumas características distintivas, muitos pontos de sua doutrina se harmoni­
zavam com o gnosticismo. Rejeitou os elementos mitológicos utilizados pela
maioria dos gnóstícos, bem com o qualquer tipo de sincretismo, mas recebeu
bastante influência do gnóstico sírio Kerdo, a partir de quem desenvolveu toda
sua teologia.
Dizia que sua intenção era purificar o Evangelho de coisas que ele consi­
derava alheias a este. Neste sentido, fez uma separação radical entre lei e Evan­
gelho. C om o conseqüência, manifestou forte tendência antijudaica. Tudo o
que se referisse aos judeus de forma boa, foi por ele rejeitado. Logo, acabou
caindo em certas idéias predominantemente gnósticas. Não é difícil imaginar
porque a teoria dos dois deuses, um do Novo e outro do Antigo Testamento, foi
bastante atraente para Marcião.
O Deus do Novo Testam ento era um Deus de amor, que se manifestou
entre os homens através do Cristo. Todavia, seu conceito cristológico era ainda
carregado de gnosticismo. Por ser ele distinto do Criador, não podia ter carne
humana semelhante à nossa. Logo sua cristologia foi docética, embora ele acre­
ditasse no valor redentor de sua morte. Neste ponto ele tornou-se um pouco
confuso.
Em bora o Deus de M arcião fosse excessivamente bom, diferente do Deus
da Antiga Aliança que manifestava ira, ele ensinou uma moralidade extrema­
mente ascética. Condenou o matrimônio e ensinava que só uma vida regida por
estes princípios poderia libertar o hom em do Demiurgo, o Deus criador.
Chegou a Roma por volta do ano 140 d.C. Ao ser expulso da congregação
local por causa de suas idéias, organizou sua própria igreja, que em pouco
tempo cresceu consideravelmente. Vestígios dessa organização ainda puderam
ser encontrados em vários lugares até mesmo no século VI.

Saturnino
Apareceu na Síria no início do segundo século. Seu gnosticismo possuía
forte influência oriental.

Basilides
Foi o líder do gnosticismo egípcio por volta do ano de 125 d.C. Era um
gnosticismo bastante filosófico, de forte influência grega. Sua teoria docética
era ainda mais estranha. E le sugeriu que Sim ão C ireneu foi crucificado no
lugar de Cristo e assim Jesus escapou da morte na cruz. Insistia que a salvação
só se referia à alma e o corpo é naturalmente incorruptível. A lei não foi mais do
que um produto de Moisés. Sua ética pendeu para a sensualidade, uma vez que

105
as questões da matéria são indiferentes. Por isso chegou até mesma a aceitar o
sacrifício aos ídolos com o permitido.

Valentíno
Foi o líder da corrente romana do gnosticismo. Pregou em Roma de 135 a
160 d.C. Podemos dizer que ele propagou a versão clássica do gnosticismo. O
livro II da obra de Irineu, Adversus haereses (Contra as heresias), que versa sobre
a existência de um Demiurgo distinto de Deus, foi escrito para responder às
heresias de Valentino.

Os Pais antignósticos
Dentre os líderes que devotaram sua vida à refutação do gnosticismo, pode­
mos apontar três principais: Irineu,Tertuliano e Hipólito. Vejamos algo sobre cada
um deles:

Iríneu
/
Nasceu na Asia M enor e foi aluno de Policarpo em sua juventude, que por
sua vez havia sido discípulo do apóstolo João. Tornou-se bispo de Lyon em 177
d.C., permanecendo ali até a morte. D e seus escritos, apenas dois chegaram até
nós. Um deles Adversus haereses, ou seja, Contra as heresias. Restam desse escri­
to um fragmento do original grego e uma tradução latina. O segundo escrito,
Epideixis, apresenta as doutrinas básicas da “proclam ação apostólica”. Para
ele, a Bíblia era a única fonte de fé, o que o tornou um teólogo verdadeiramen­
te bíblico.
Este apego à Bíblia ia contra as afirmações gnósticas, que baseavam suas afir­
m ações em revelações de sabedoria oculta independentes das Escrituras
Sagradas. Tendo isto em conta, vemos que as fontes para o conhecim ento da ver­
dade divina para um e outro era muito diversa. Irineu colocava o Antigo e o Novo
Testamento como regra de fé e referia-se à Igreja na pessoa de seus líderes como
guardiã da fé apostólica, em oposição aos gnósticos que não tinham fundamen­
tação histórica para suas afirmações. Para Irineu, a salvação se realizava dentro
do processo histórico, primeiramente com a encarnação do Verbo e depois com
a ressurreição no final dos tempos, enquanto a salvação gnóstica se realizava
tirando o homem do contexto temporal.
Sua obra Adversus haereses é um verdadeiro tratado antignóstico. Ponto a
ponto ele analisou e refutou esses ensinos, reconhecendo a matéria com o cria­
ção de Deus, levando-a à necessidade de restauração através do poder da ressur­

106
reição. É im portante lem brar que Irineu fez amplo uso da filosofia grega e
mesmo assim não comungou da visão grega de rejeição à matéria, mas foi total­
m ente bíblico em sua teologia.

Tertuliano
Tertuliano de Cartago foi o primeiro grande teólogo ocidental e o funda­
dor da teologia latina. Foi um escritor bastante original que dedicou sua vida a
defender a fé cristã e instruir os fiéis. Era advogado e por isso sua obra está reple­
ta de idéias jurídicas. Tanto quanto Irineu, ele considerava o gnosticismo o pior
inimigo do cristianismo. Para com batê-lo escreveu duas importantes obras:
Adversus M arcionem; D e praescriptione Haeretícorum.
Este seu envolvimento na refutação dos gnósticos condicionou bastante
sua teologia. Isto se vê principalmente em sua oposição à filosofia. Diferente de
Irineu e outros pais apostólicos, ele rejeitou a filosofia grega com o algo nocivo
ao verdadeiro cristianismo, visto esta estar por trás das deturpações gnósticas.
Isso fica claro nesta declaração: “Q ue tem Atenas a ver com Jerusalém? Que
tem a academia (grega) a ver com a Igreja? [...] Nossa doutrina flui da sala de
pilares de Salomão que aprendera que é preciso buscar o Senhor com inocên­
cia de coração [...] Os gnósticos vão além da fé na sua sabedoria. O cristão pelo
contrário, adere à fé simples que é revelada nas Escrituras e preservada pela tra­
dição apostólica. Nada conhecer em oposição à regra de fé é conhecer todas as
coisas” (De praescriptione Haeretícorum, 14).
O que pesou contra Tertuliano foi o fato de o mesmo ter, em determinado
tempo, se unido ao montanismo, movimento considerado herético. Até hoje
não foram encontradas explicações satisfatórias para esse deslize, mas talvez o
caráter místico o tenha atraído, visto que, com o podemos perceber, ele nutria
forte aversão à filosofia grega.

Hipólíto
Foi bispo em Roma. Sua obra mais famosa intitula-se Philosophoum ena ou
“Refutação de todas as heresias”. Trata-se de um apanhado enciclopédico das
idéias filosóficas que derivaram dos filósofos naturalistas gregos, de vários con­
ceitos mágicos e religiosos de sua época, bem com o outras heresias eclesiásticas
que a seu ver tinham raízes na filosofia grega. Foi um importante apanhado
sobre as diversas escolas então existentes. O material polêm ico enfocou espe-
cialm ente os gnósticos.
Resumo
Embora incorporando conceitos ou pelo menos nomes do cristianismo, o
gnosticismo era na verdade uma com pleta negação do mesmo. Rejeitava a
encarnação do Verbo, pois a matéria era má. Recusavam aceitar Deus como o
criador do Universo. Cristo e o Espírito Santo nada mais eram do que uma ema­
nação dos éons, um conceito por sua vez com pletam ente alheio às Escrituras.
Dentro deste sistema não havia espaço para a ressurreição, pois esta nada mais é
do que uma redenção da matéria, o que para eles não tinha o mínimo sentido.
Substituíram a fé como meio de salvação por um conhecim ento esotérico perti­
nente apenas a algumas pessoas especiais. O elemento escatológico, tão forte no
cristianismo, foi totalmente excluído, uma vez que a salvação não é a redenção
humana e universal, através da restauração de todas as coisas, mas a saída desta
existência material para o pleroma (mundo espiritual).
D e certo modo, o gnosticismo contribuiu para o avanço da Igreja. O cânon
m arcionita, por exemplo, por ser facilm ente identificado como tendencioso,
obrigou o cristianismo a definir seus livros sagrados. Este fato foi preponderan­
te na definição do cânon. Além disso, um credo inicial, apresentando conceitos
básicos da fé cristã, fez-se necessário. Os líderes cristãos se uniram e armaram
para definir de maneira clara e inconfundível os limites da fé ortodoxa.
O atual movimento gnóstico não tem necessariamente raízes no gnosticis­
mo da Era primitiva cristã, embora muitos conceitos sejam semelhantes. Este
gnosticismo moderno foi criado por Sam ael Aun Weor, ocultista nascido em
1917, no interior da Colôm bia, que se dizia o novo Avatar para a Era de Aquário.
Fundou o movimento na década de 50 e morreu em 1977.

Montanismo
O montanismo foi uma reação ao desaparecimento dos dons espirituais na
Igreja do século II d.C. Foi um movimento bastante forte, principalmente na
região da Frigia. Seu fundador foi Montano. Ele intitulava seu movimento de
“Nova Revelação” ou “Nova Profecia”. Rejeitava a crescente autoridade dos bis­
pos (como sendo sucessores herdeiros dos apóstolos) e a autoridade dos escritos
apostólicos. Considerava as igrejas e seus líderes espiritualmente mortos e reivin­
dicava uma “nova profecia” com todos os sinais e milagres dos dias da Igreja pri­
mitiva no pentecostes.
Ele alegava ter recebido uma revelação direta do Espírito Santo de que ele,
com o representante do Espírito, lideraria a Igreja durante o último período dela ,
aqui na terra. Por isso se intitulava porta-voz do Espírito Santo e acusava os líde^

108
res da igreja de prender o Espírito Santo dentro de um livro, pois limitavam a
inspiração divina apenas aos livros apostólicos. Não é difícil identificar outros
grupos dentro da história da Igreja que caíram no “desvio pneum atológico” dos
montanistas.
M ontano acreditava na inspiração contínua e colocou-se como alguém por
meio do qual o Espírito Santo falava, no mesmo nível que falara através de Paulo
e dos outros apóstolos. Segundo seu entendimento, “o mais elevado estágio da
revelação” havia sido atingido nele. O fim do mundo estava próximo e o
Espírito o havia escolhido, juntam ente com duas profetisas, Maximila e Prisca,
para falar à humanidade sobre os últimos julgamentos de Deus sobre o mundo.
M ontano cria que era o último profeta escolhido por Deus para revelar seus
eternos planos.
Tertuliano, o mais famoso adepto do montanismo, em sua obra De Anima
(Sobre a Alma), deu o seu relato sobre o movimento. Falando sobre uma das pro­
fetisas, ele disse o que segue: “Nós temos entre nós uma irmã que tem sido agra­
ciada com muitos dons de revelação, os quais ela vivência no Espírito, por meio
de visões extáticas, na Igreja, no meio dos ritos sagrados do Dia do Senhor. Ela
conversa com anjos e, às vezes, até com o Senhor. Ela vê e ouve comunicações
misteriosas. Ela consegue discernir o coração de alguns homens e recebe instru­
ções para a cura sempre que precisa. Seja lendo as Escrituras, cantando salmos,
pregando ou oferecendo orações - em todos estes serviços religiosos, oportunida­
des são oferecidas a ela para que tenha visões”.
Além das visões e conversas com anjos, uma das profecias do movimento
era a de que, após a morte de uma de suas profetisas, Maximila, viria o fim, com
tumultos e guerras por toda a parte. A história provou a falsidade desta profecia.
O movimento tam bém se caracterizou por uma moral ascética onde o casa­
mento era proibido e algumas vezes, até mesmo as relações sexuais dentro do
casamento. Os jejuns eram extremamente severos.

A posição da Igreja
A Igreja cristã reagiu fortemente contra o montanismo. O fanatismo e as
reivindicações de possuir revelações superiores às do Novo Testamento fizeram
do montanismo uma ameaça à Palavra de Deus.
Na medida em que os profetas do movimento consideravam suas revela­
ções como sendo últimas, a revelação bíblica dada por Deus através dos profe­
tas e apóstolos, ficava rejeitada a um segundo plano.
Diante desta ameaça à Palavra de Deus, a posição da Igreja foi condenató-

109
ria. Um grupo de bispos da região onde morava M ontano se reuniu secretam en­
te e lavrou um docum ento excomungado-o, bem com o às duas profetisas e
todos os seus seguidores. Este talvez tenha sido o primeiro cisma dentro do cris­
tianismo em ergente, pois desde o ano 160 d.C. com eçou a existir dentro da
região da Frigia, tanto igrejas que diziam seguir a tradição apostólica, com o igre­
jas que diziam seguir o movimento “espiritual” de M ontano.
Em seu desejo de reavivar os dons espirituais na Igreja, M ontano acabou
provocando justamente o contrário. Levou os bispos a proibirem manifestações
com o profecias, línguas, interpretações e outras manifestações sobrenaturais,
mesmo as legitimamente bíblicas.
Em 381 d .C ., o C o n cilio de C onstantinopla, condenou o m ovimento
com o herético.

no
Capítulo 3

MONARQUIANISMO E ARIANISMO
As primeiras controvérsias cristológicas

S
uem foi, teologicamente, Jesus de Nazaré? A natureza do
Filho de Deus esteve em questão, logo nos primeiros séculos
da Era Cristã. Ele era o próprio Deus aqui na Terra ou um
ordinado? Sua natureza era divina ou humana?
Ao contrário do que muitos pensam este assunto é vital para o entendi­
mento do cristianismo. Uma definição falsa sobre a natureza de Cristo
comprometeria toda a mensagem de salvação.
Devemos lembrar as palavras do apóstolo Paulo: “E até importa que
haja entre vós heresias, para que os que são sinceros se manifestem
entre vós” (IC o 11.19). Sempre foram as falsas afirmações sobre o
Evangelho que obrigou a Igreja a se posicionar de forma clara e defini­
tiva. Sem este processo que houve através dos séculos II e VI, ficaria
uma grande lacuna e incerteza acerca de assuntos tão vitais.

A controvérsia monarquianista
O monarquianismo foi a primeira das controvérsias ligadas ao relaciona­
mento entre o Pai e o Filho. C om eça a surgir já no final do século II e embora
tivesse duas correntes bem distintas, ambas receberam o mesmo nome. Esta
controvérsia prosseguiu por todo o século III da Era Cristã, e foi combatendo
esta heresia, que o dogma da Trindade foi devidamente formulado. Podemos
encontrar nos trabalhos de Tertuliano diversas referências a esta heresia.
Era uma negação aberta da divindade do Filho, com o propósito de resolver
o conflito entre a unidade da divindade, diante da divindade de Jesus. Em resu­
mo, podemos dizer que o monarquianismo repudiava a idéia de “econom ia”,
segundo a qual Deus, que certamente é um, revelou-se de tal maneira que apa­
receu como o Filho e como o Espírito Santo. Uma forma de monarquianismo
foi chamada de dinâmica (ou adocionista) e a outra foi chamada de modalista.

n i
Monarquianismo dinamista
O primeiro representante do cham ado monarquismo dinamista foi o cur­
tidor Teodoto, que chegou a Rom a, vindo de Bizâncio em 190 d.C ., fugindo
da perseguição.
Em geral, negava por completo a divindade de Cristo. Julgava-o superior
aos outros homens, somente pela sua justiça. Em sua concepção, Jesus foi como
os demais homens até o tempo do seu batismo, quando então o Cristo veio sobre
ele como um poder e com eçou a atuar. Logo, o elem ento divino que estava em
Cristo, era apenas um poder outorgado por Deus. Por isso este tipo de monar­
quismo recebeu o nome de “dinamista” (do grego dynamus - poder). O bispo
de Roma, Vítor, excomungou Teodoto por esta heresia.

Paulo de Samósata
Entretanto, o mais destacado defensor desta posição, foi Paulo de
Samósata. E le acumulava as funções de bispo de Antioquia e de importante
autoridade política no governo de Zenóbio, rainha de Palmira, por volta do ano
de 260 d.C. Era um demagogo. Buscava na Igreja de Antioquia aplauso e ace­
nos. Chegou mesmo a organizar um coro feminino para cantar louvores a ele
mesmo. Sua fortuna sempre esteve sob suspeita, uma vez que não recebera
nenhum a herança.
Paulo de Samósata ensinava que Cristo não era mais que um mero homem ,
que pela justiça e penetração do seu ser pelo divino Logos, alcançou a divinda­
de e o caráter de salvador. Isto não o fazia divino, apenas lhe conferia qualida­
des divinas. Sua concep ção era de que o Filh o foi um simples hom em e o
Espírito Santo nada mais era do que a graça derramada nos apóstolos.
Em 264 d.C. foi realizado um Sínodo em Cesaréia da Capadócia, onde
supostamente houve uma “conversão” do bispo Paulo. Para afastá-lo da heresia,
os bispos redigiram uma “fórmula de fé”, à qual ele foi obrigado a assinar.
Todavia, após o Sínodo, ele voltou à mesma vida anterior, de fausto, luxo e licen-
ciosidade.
Os bispos tornaram a convocar um segundo Sínodo em Antioquia, no qual
foi declarado herético, no ano de 268 d.C. e deposto de seu cargo.

Monarquianismo modalista
Este tipo de monarquianismo surgiu primeiramente na Ásia M enor e foi
levado para Roma por Noeto e seus discípulos. Foi em Roma que surgiu Prax-
eas, o representante do modalismo contra quem escreveu Tertuliano.

112
Noeto não negava a divindade de Cristo, porém negava a distinção das pes­
soas. Para ele, o Pai e o Filho eram a mesma pessoa. Eram apenas “modos” dife­
rentes pelo qual a divindade se manifestava - por isso o nome de “modalismo”.
Para ele, era a mesma coisa dizer que o Pai sofreu ou que o Filho sofreu, pois
apenas os nomes eram diferentes, a Pessoa era a mesma. Praxeas tentou atenuar
um pouco esta posição, dizendo que o Pai sofreu com o Filho, mas sua posição
tam bém foi rejeitada. Tertuliano chamou esta posição tam bém de “patripassio-
nismo”.

Sabélio
Entretanto, o principal representante desta escola foi Sabélio, que viveu
em Roma por volta de 215 d.C. D aí o nome de sabelianismo ser aplicado a esta
heresia. Ele desenvolveu de forma mais ampla e minuciosa esta doutrina heré­
tica. Afirmava que o Pai, o Filho e o Espírito Santo são um; são uma única subs­
tância, isto é, só podem ser distinguidos um do outro, pelo nome. Foi atribuída
a ele a frase: “Deus, com respeito à hipóstase (natureza) é um, mas foi personi­
ficado nas Escrituras de várias maneiras segundo a necessidade do m om ento”.
Sendo assim, ele não apenas acreditava que a substância das três pessoas da
Trindade era uma só, mas tam bém que as três pessoas são a mesma.
Isto não quer dizer que ele ensinasse que Deus é o Pai, o Filho e o Espírito
Santo ao mesmo tempo. Eram formas de manifestação diferentes em tempos
diferentes. Eram distintas apenas em modo e tempo e não com o pessoas. Era
uma posição bem semelhante ao unicismo moderno.
Com o a heresia de Sabélio foi se tornando mais e mais evidente e o núm e­
ro de seus adeptos foi crescendo, o bispo de Roma daquela época, Calixto, exco­
mungou-o. Ele então fugiu para o Oriente e depois para o Egito, onde veio a
morrer em 260 d.C. Sua seita subsistiu até o final do século IV.

A controvérsia ariana
O arianismo foi a principal heresia que envolvia a identificação da nature­
za do Filho e seu relacionamento com a pessoa do Pai. Tinha suas raízes nas
controvérsias cristológicas precedentes, mas por ter surgido em um período de
oficialização da Igreja foi a que mais agitou o cristianismo nos tempos primiti­
vos e que de certo modo deu origem a dogmatização da fé e a tradição conciliar
da Igreja para resolver questões teológicas.
C om o Constantino, através do Edito de M ilão, deu ao cristianismo um
caráter oficial e as disputas eclesiásticas tendiam a afetar diretamente o Império.
Uma Igreja dividida enfraquecería Roma e por isso o imperador teve de intervir
para resolver a questão ariana que ameaçava dividir o Império ao meio.
A grande questão envolvida neste embate, que se arrastou pelos séculos IV e
V, se referia à relação entre a pessoa de Cristo e a sua divindade. Jesus poderia ser
chamado de Deus, no mesmo sentido que o Deus do Antigo Testamento? Se a
resposta deveria ser afirmativa, isto não comprometería a doutrina da unicidade
de Deus? Por outro lado, se ele não era Deus, porque as Escrituras se referem a
ele nos mesmos termos que confere a Deus aplicando-lhe os mesmos atributos?
Já desde o final do século II, algumas correntes teológicas, as correntes
denominadas de monarquianismo, haviam se desviado da ortodoxia, negando
uma divindade plena para o Filho de Deus e foram condenadas como heréti­
cas. Tertuliano, que teve grande influência na teologia ocidental, foi muito
claro em sua concepção da Divindade com o uma unidade de três Pessoas (uni­
dade composta). Mas após o período de perseguição, a questão centralizou-se
principalmente na área oriental do Império.

Raízes do conflito
Por volta do ano de 318 d.C., um bispo da cidade de Alexandria, chamado
Alexandre, discutiu com seus presbíteros “A Unidade da Trindade”. Dentre eles
estava Àrio, um erudito asceta e pregador popular, provavelmente nascido na
Líbia, por volta de 258 d.C., que viria a ser o grande pivô desta discussão que
duraria séculos.
Ario foi discípulo de Luciano de Antioquia, bispo que já estivera envolvido
com outros falsos conceitos cristológicos. Ele foi ordenado sacerdote e encarre­
gado pelo bispo de Alexandria da Igreja de Baucalis. Aparentemente, ele era
uma pessoa carismática e atraiu tantos seguidores devotos que desafiou aberta­
mente o bispo alexandrino a respeito da sua teologia sobre Cristo e a Trindade,
e muitos cristãos de Alexandria tomaram o seu partido.
Baseando-se em um texto isolado de Provérbio 8.22, onde diz que Deus
“criou” a sabedoria desde o princípio (a tradução mais aceita, seria “possuiu”) e
identificando a sabedoria com o Logos, Àrio classificou o Filho com o sendo
uma mera criatura, ainda que fosse a maior das criações de Deus. Desejando
evitar uma posição que parecesse um politeísmo, ele acabou negando a divin­
dade do Filho de Deus.
Na verdade, o presbítero alexandrino estava imbuído de um conceito filo­
sófico de Deus, que recusava a possibilidade deste conferir a qualquer outro sua
essência, pelo fato de ser uno e indivisível. Sendo assim, o Logos (Verbo) só

n4
poderia vir a existir por meio de um ato criador. Concluindo, Cristo não pode­
ría ser Deus, em sua opinião. Com o resultado desta concepção, o Filho acabou
adquirindo uma natureza intermediária, sendo um ser menor que Deus e maior
que os homens e anjos. Ele teria sido criado junto com o tempo, ou mesmo
antes do tempo.
Seu credo foi assim expresso: “O Filho não existiu sempre, pois quando
todas as coisas emergiram do nada e todas as essências criadas chegaram a exis­
tir, foi então que o Logos de Deus procedeu do nada. Houve um tempo em que
ele não era (een pote hote ouk een), e não existiu até ser produzido, pois mesmo
ele teve um princípio quando foi criado. Pois Deus estava só e naquele tempo
não havia nem Logos nem sabedoria. Quando Deus decidiu criar-nos, produ­
ziu, em primeiro lugar, alguém que denominou Logos e Sabedoria e Filho, e
nós fomos criados por meio dele” (Atanásio, Oratíones contra Arianos, I, 5).

A reação do Bispo Alexandre


O bispo Alexandre era, segundo se relata a seu respeito, um bispo meigo e
tolerante que não tinha prazer nos conflitos, mas que finalmente resolveu respon­
der às críticas de Ario a respeito de Deus e de Jesus Cristo, tentando corrigi-lo por
meio de correspondências e sermões, e quando essas coisas mais brandas não sur­
tiram efeito, convocando um sínodo de bispos em Alexandria a fim de examinar
as opiniões de Ario e de tomar uma decisão sobre sua ortodoxia ou a falta dela.
Antes, porém, de o sínodo reunir-se, Ario convocou seus seguidores cristãos
e com eçou a marchar pelas ruas da cidade, passando pela grande igreja e pela
casa do Bispo, levando cartazes e entoando lemas como: “Tempo houve em que
o Filho não existia”. Utilizando cânticos com este conteúdo doutrinário, con­
seguiu atingir a camada operária de Alexandria. Logo, os que seguiram Ario, o
fizeram mais por questões emotivas, atraídos pela música e pelo carisma, pois
não compreendiam plenamente as questões teológicas que estavam envolvidas.
Algo muito semelhante ao que aconteceu na Revolução Russa do século XX,
quando os proletários deixaram-se influenciar por Lênin, sem, contudo enten­
derem profundamente as questões políticas envolvidas.
Alexandre convocou um sínodo que se reuniu em 318 d.C ., com cerca de
cem bispos de vários lugares do lado oriental do Império. Alexandre acusou
Ario de ressuscitar a heresia de Paulo de Samósata, negando a Trindade e a
divindade do Filho. Para o bispo, esta negação comprometia a salvação, uma
vez que segundo esta heresia aquele que efetuara a salvação não era o próprio
Deus.
Uma Igreja dividida enfraquecería Roma e por isso o imperador teve de intervir
para resolver a questão ariana que ameaçava dividir o Império ao meio.
A grande questão envolvida neste embate, que se arrastou pelos séculos IV e
V, se referia à relação entre a pessoa de Cristo e a sua divindade. Jesus poderia ser
chamado de Deus, no mesmo sentido que o Deus do Antigo Testamento? Se a
resposta deveria ser afirmativa, isto não comprometería a doutrina da unicidade
de Deus? Por outro lado, se ele não era Deus, porque as Escrituras se referem a
ele nos mesmos termos que confere a Deus aplicando-lhe os mesmos atributos?
Já desde o final do século II, algumas correntes teológicas, as correntes
denominadas de monarquianismo, haviam se desviado da ortodoxia, negando
uma divindade plena para o Filho de Deus e foram condenadas com o heréti­
cas. Tertuliano, que teve grande influência na teologia ocidental, foi muito
claro em sua concepção da Divindade com o uma unidade de três Pessoas (uni­
dade composta). Mas após o período de perseguição, a questão centralizou-se
principalmente na área oriental do Império.

Raízes do conflito
Por volta do ano de 318 d.C ., um bispo da cidade de Alexandria, chamado
Alexandre, discutiu com seus presbíteros “A Unidade da Trindade”. Dentre eles
estava Àrio, um erudito asceta e pregador popular, provavelmente nascido na
Líbia, por volta de 258 d.C ., que viria a ser o grande pivô desta discussão que
duraria séculos.
Ario foi discípulo de Luciano de Antioquia, bispo que já estivera envolvido
com outros falsos conceitos cristológicos. Ele foi ordenado sacerdote e encarre­
gado pelo bispo de Alexandria da Igreja de Baucalis. Aparentemente, ele era
uma pessoa carismática e atraiu tantos seguidores devotos que desafiou aberta­
mente o bispo alexandrino a respeito da sua teologia sobre Cristo e a Trindade,
e muitos cristãos de Alexandria tomaram o seu partido.
Baseando-se em um texto isolado de Provérbio 8.22, onde diz que Deus
“criou” a sabedoria desde o princípio (a tradução mais aceita, seria “possuiu”) e
identificando a sabedoria com o Logos, Ario classificou o Filho com o sendo
uma mera criatura, ainda que fosse a maior das criações de Deus. Desejando
evitar uma posição que parecesse um politeísmo, ele acabou negando a divin­
dade do Filho de Deus.
Na verdade, o presbítero alexandrino estava imbuído de um conceito filo­
sófico de Deus, que recusava a possibilidade deste conferir a qualquer outro sua
essência, pelo fato de ser uno e indivisível. Sendo assim, o Logos (Verbo) só

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poderia vir a existir por meio de um ato criador. Concluindo, Cristo não pode­
ría ser Deus, em sua opinião. Com o resultado desta concepção, o Filho acabou
adquirindo uma natureza intermediária, sendo um ser menor que Deus e maior
que os homens e anjos. E le teria sido criado junto com o tempo, ou mesmo
antes do tempo.
Seu credo foi assim expresso: “O Filho não existiu sempre, pois quando
todas as coisas emergiram do nada e todas as essências criadas chegaram a exis­
tir, foi então que o Logos de Deus procedeu do nada. Houve um tempo em que
ele não era (een pote hote ouk een), e não existiu até ser produzido, pois mesmo
ele teve um princípio quando foi criado. Pois Deus estava só e naquele tempo
não havia nem Logos nem sabedoria. Quando Deus decidiu criar-nos, produ­
ziu, em primeiro lugar, alguém que denominou Logos e Sabedoria e Filho, e
nós fomos criados por meio dele” (Atanásio, Orationes contra Arianos, I, 5).

A reação do Bispo Alexandre


O bispo Alexandre era, segundo se relata a seu respeito, um bispo meigo e
tolerante que não tinha prazer nos conflitos, mas que finalmente resolveu respon­
der às críticas de Ario a respeito de Deus e de Jesus Cristo, tentando corrigi-lo por
meio de correspondências e sermões, e quando essas coisas mais brandas não sur­
tiram efeito, convocando um sínodo de bispos em Alexandria a fim de examinar
as opiniões de Ario e de tomar uma decisão sobre sua ortodoxia ou a falta dela.
Antes, porém, de o sínodo reunir-se, Ario convocou seus seguidores cristãos
e com eçou a marchar pelas ruas da cidade, passando pela grande igreja e pela
casa do Bispo, levando cartazes e entoando lemas como: “Tempo houve em que
o Filho não existia”. Utilizando cânticos com este conteúdo doutrinário, con­
seguiu atingir a camada operária de Alexandria. Logo, os que seguiram Ario, o
fizeram mais por questões emotivas, atraídos pela música e pelo carisma, pois
não compreendiam plenamente as questões teológicas que estavam envolvidas.
Algo muito semelhante ao que aconteceu na Revolução Russa do século XX,
quando os proletários deixaram-se influenciar por Lênin, sem, contudo enten­
derem profundamente as questões políticas envolvidas.
Alexandre convocou um sínodo que se reuniu em 318 d.C ., com cerca de
cem bispos de vários lugares do lado oriental do Império. Alexandre acusou
Ario de ressuscitar a heresia de Paulo de Samósata, negando a Trindade e a
divindade do Filho. Para o bispo, esta negação comprometia a salvação, uma
vez que segundo esta heresia aquele que efetuara a salvação não era o próprio
Deus.
Ário respondeu na mesma altura, alegando que era impossível a Divindade
e a humanidade se unirem em um único ser.
Os cento e tantos bispos reunidos em Alexandria condenaram Ário e seus
ensinos a respeito de Cristo como heréticos e o depuseram de sua condição de
presbítero. Ele foi obrigado a deixar a cidade, mas não considerou o assunto
como encerrado. Foi refugiar-se com seu amigo, Eusébio da Nicomédia, que
nesta época já era um bispo importante e o recebeu amigavelmente. Juntos
com eçaram um trabalho de persuasão, correspondendo-se com os bispos que
não fizeram parte do sínodo.
Esta extensa correspondência se perdeu, não restando senão aquilo que se
pode retocar dos escritos de seus oponentes. Ário também pretendia escrever uma
grande obra em verso, chamada de Thalia (Banquete), de fácil recitação para os
simples. Uma de suas declarações típicas referentes à relação entre o Pai e o Filho
declara o seguinte:
“E Cristo é o Verbo de Deus, mas por participação [...] até ele foi feito Deus
[...] O Filho não conhece o Pai com exatidão e o Logos não vê o Pai com perfei­
ção e ele não percebe o Pai com exatidão e nem o Logos o com preende; isto por­
que ele não é o verdadeiro e único Logos do Pai, mas somente em nome ele é
chamado Logos e Sabedoria, e pela graça é chamado Filho e Poder”.
Com o vemos, sua noção do Logos envolvia profundas questões filosóficas
e estava em clara oposição ao que Jesus disse com respeito ao relacionamento
entre o Pai e o Filho em Mateus 11.27.
Ário, contraditoriam ente, reconh ecia três seres divinos (Pai, Filh o e
Espírito Santo), sendo que somente um deles é verdadeiro Deus. Continuou,
na sua profissão de fé, afirmando que somente o Pai é sem princípio e que o
Filho, embora criatura grandiosa que compartilha de muitos atributos de Deus,
não existia antes de ser gerado pelo Pai. Era uma posição um tanto ambígua para
quem pretendia defender a Unidade de Deus, pois neste caso o Filho seria uma
espécie de semi-deus, o que era com pletam ente contrário a doutrina cristã.
Quando Alexandre, bispo de Alexandria, soube das maquinações de Ârio,
escreveu para o bispo de Roma, Silvestre, a fim de que este se resguardasse das
danosas heresias de Ário e se esforçasse em combatê-lo. Para combater as here­
sias arianas, escreveu um trabalho intitulado D eposição de Ário, em que busca­
va explicar os motivos de sua excomunhão. Exortava a que ninguém o recebes­
se, pois se tratava de um herege com o qual ninguém deveria ter comunhão.
Em sua exposição dos falsos ensinos de Ário, Alexandre fez um resumo de
seu erro teológico que bem sintetiza o arianismo:
“E as novidades que inventaram e publicaram contra as Escrituras são as

ll6
seguintes: Deus não foi sempre o Pai, mas houve tempo em que Deus não foi
Pai. O Verbo de Deus não existiu sempre, mas se originou de coisas que não exis­
tiam; porque o Deus que existe, fez aquele que não existia, a partir daquele que
não existia; portanto, houve tempo em que ele não existia; pois o Filho é uma
criatura e uma obra. Ele não é igual ao Pai em essência, não é o verdadeiro e
natural Logos do Pai e nem é sua verdadeira Sabedoria; mas ele é uma das coi­
sas feitas e criadas e é chamado Verbo e Sabedoria por um abuso de termos, pois
ele mesmo se originou do verdadeiro Verbo de Deus, e pela Sabedoria que exis­
te em Deus, mediante o qual Deus, não apenas criou todas as coisas, mas ele
tam bém . Portanto ele é, por natureza, sujeito a mudanças e variações, assim
como todas as criaturas racionais”.
Para termos idéia da contam inação e do entusiasmo que suscitaram as
idéias de Ario, basta pensar que tudo se deu no prazo de um ano: Palestina, Síria,
Ásia M enor, Egito estavam tomados por suas idéias, surgindo uma comunida­
de ariana ao lado da Igreja ortodoxa.
Bispos reunidos num sínodo em Cesaréia da Palestina puseram-se ao lado
de Ário e o autorizaram a reassumir suas funções sacerdotais em Alexandria.
Alexandre, porém, recusava-se a aceitá-lo, novamente, em sua diocese. Incen­
tivado por seus adeptos, Ário desembarcou em Alexandria. Sua chegada provo­
cou grande agitação, pois molineiros, marinheiros, viajantes, mercadores, cam ­
poneses e o povo mais simples cantavam suas canções pelas ruas e praças. O
arianismo tornou-se então, uma questão popular.

A entrada de Constantino no conflito


Constantino ficou sabendo do conflito através de seu capelão, o bispo Osio,
que o informou a respeito e relatou que os bispos do Oriente estavam se dividin­
do devido a uma rixa entre Ário e Alexandre. Com o o conflito estava concentra­
do mais na parte oriental do Império, os bispos do Ocidente não estavam com ­
pletam ente a par do que estava acontecendo.
Tendo nas mãos as correspondências de Eusébio da N icom édia e de
Alexandre, em que cada um fazia a apologia de seu ponto de vista da melhor
maneira possível, a questão parecia um tanto confusa, deixando os bispos oci­
dentais inteiramente perplexos. Quase de forma invisível, a Igreja se encontra­
va à beira de um cisma, e se uma providência não fosse tomada, em breve isto
seria uma realidade. Ninguém queria isso e o imperador Constantino seria o
último a desejar tal coisa. Para ele, o cristianismo seria o cim ento que haveria de
dar ao Império a unidade e estabilidade que ele tanto desejava. Dividir a Igreja

117
seria o equivalente a dividir o Império. Não era nada agradável ver os bispos tor-
narem-se inimigos devido a questões metafísicas a respeito de Deus.
Para resolver a questão e temendo que esta fosse provocar um cisma dentro
do Im pério, o imperador C onstantino convocou um concilio na cidade de
Nicéia, que pudesse resolver de forma definitiva essa controvérsia. Reunindo
cerca de 318 bispos, tanto do Oriente quanto do Ocidente, este C oncilio mar­
cou para sempre a história da Igreja. Era um acontecim ento até então único
dentro da história da Igreja. Os líderes cristãos, até então perseguidos e martiri-
zados por Roma, eram agora convocados pelo próprio imperador e às custas do
mesmo, para resolverem questões relativas à fé cristã.
Constantino escolheu esta cidade (Nicéia) porque já há muito estabelecera
residência nela, pois a nova capital do Império, Constantinopla, estava sendo cons­
truída. Dali ele administrava as questões do Estado e da Igreja. Havia trazido gran­
de número de súditos e conselheiros, estando assim cercado por toda a sua corte.
É importante destacar o fato de que até mesmo o bispo da cidade de Nicéia,
Teogno, estava inclinado à causa de Ario, principalmente devido à influência
de Eusébio de Nicomédia. Com isto, é possível perceber que o conselho já esta­
va de certa forma dividido mesmo antes do entrave. A questão estava demasia­
damente arraigada em meio ao povo e a Igreja para poder ser resolvida de forma
definitiva em um único concilio.
Em bora Eusébio de C esaréia tivesse feito um relato do C o n cilio , não
temos informações detalhadas das atas e relatórios do mesmo. Ao que parece,
Constantino estava assentado em um trono acima da sala onde os bispos se reu­
niam e dali intervia como mediador quando julgava que isto era necessário. Esta
atitude desagradou alguns bispos, ao ver o imperador se intrometendo em ques­
tões que para eles não eram da alçada do poder temporal. Mas o imperador não
pensava desta forma e com certeza os bispos não ousariam desafiá-lo.
O C oncilio durou cerca de dois meses e tratou de muitas questões que con­
frontavam a Igreja. C erca de vinte decretos diferentes foram promulgados, que
tratavam de diversas questões, que iam desde deposição de bispos relapsos até a
ordenação de eunucos. Tam bém foi em N icéia que foi concedido ao bispo de
Roma uma posição de liderança para a Igreja do Ocidente, mostrando que esta
posição não era originada da época apostólica e mesmo assim, nem mesmo
agora, incluía as Igrejas do Oriente, que passaram a ser regidas pelo bispo de
Alexandria, o bispo Alexandre.
Todos estes assuntos, porém, eram de importância secundária. A questão
central e motivadora da reunião foi a controvérsia ariana e era a respeito disso
que os bispos queriam debater.

118
Os partidos de Nicéia
Formaram-se três partidos diferentes em Nicéia. O primeiro partido pode
ser chamado de arianismo puro e era apoiado por Eusébio de Nicomédia e mais
uma minoria de presentes. No total não passava de uns vinte e oito bispos, mas
mesmo assim tinham esperança de convencer a maioria e mesmo o próprio
Constantino. O próprio Ário foi proibido de participar do C oncilio. Este grupo
insistia em Cristo com o um ser criado antes do tempo. Para eles Cristo seria de
essência ou substância diferentes do Pai. Era divino, mas não era Deus, nem co-
igual, nem co-eterno.
O segundo grupo teve a liderança de Alexandre, auxiliado por seu jovem
assistente Atanásio, dentro daquilo até hoje considerado a posição ortodoxa.
Para ele e seu grupo, Cristo era co-igual e co-eterno, da mesma substância e
essência que o Pai, embora fossem personalidades distintas.
Atanásio era uma dessas raras personalidades que deriva incomparavel­
m ente mais de seus próprios dons naturais de intelecto do que do fortuito da des­
cendência ou dos que o rodeiam. Sua carreira quase personifica uma crise na
história da cristandade, e pode-se dizer dele que mais deu forma aos aconteci­
mentos em que tomou parte do que foi moldado por eles. A esta descrição psi­
cológica devemos acrescentar sua fé profunda e inabalável, a serviço da qual
colocou suas qualidades naturais. D e estatura abaixo da média (pelo que foi
objeto de debique por parte do apóstata Juliano), segundo seus biógrafos, era de
com pleição magra, mas forte e enérgico. Tinha uma inteligência aguda, rápida
intuição, era bondoso, acolhedor, afável, agradável na conversação, mas alerta
e afiado no debate. A história não guardou o nome de seus pais. Pela elevada for­
m ação intelectual que ele demonstrara ainda jovem, julga-se que pertencia à
classe mais elevada.
Por sua firme posição contra as afirmações de Ário, a vida desse grande
defensor da fé tornou-se uma história de exílio (cinco ao todo) e perseguição, da
qual ele sairia por fim vitorioso.
O terceiro partido foi liderado pelo célebre historiador eclesiástico,
Eusébio de Cesaréia. Por sua natureza branda e avessa a controvérsias, ele ten­
tou uma posição conciliatória que agregasse a opinião de ambos e pudesse ser
aceita pelos dois grupos. Mais de duzentos participantes seguiram de início suas
colocações. Para ele, Cristo não foi criado do nada como dizia Ário, mas foi gera­
do antes da eternidade. Foi a proposição de Eusébio de Cesaréia que foi aceita
pelo Concilio.
A verdade é que nem todos os presentes estavam profundamente inteirados

n9
das questões que envolviam o conflito, que com o dissemos, concentrou-se na
região oriental. Nem mesmo o imperador tinha conhecim ento teológico para
tal. Sobre isto observou Justo Gonzales, historiador eclesiástico:
“A vasta maioria dos bispos parece não ter entendido a importância da ques­
tão em pauta e o receio do sabelianismo deixou todos relutantes para condena­
rem o subordinacionismo de forma contundente. Além disso, o imperador, que
se interessava mais pela unidade do Império que pela unidade de Deus, mos­
trou-se disposto a encontrar uma fórmula que fosse aceitável ao maior número
possível de bispos”.
E bom lembrar que embora nos sínodos e decisões anteriores buscou-se
combater qualquer posição de inferioridade do Filho, tanto em natureza quan­
to em posição e que pais com o Tertuliano já houvessem formulado um certo
conceito de Trindade, não havia uma formulação definitiva. D e certa forma, a
questão estava aberta e muitos temiam pender para posições que já haviam sido
consideradas heréticas. Isto enfraqueceu um pouco as posições dos bispos.
Portanto, é importante que o aluno compreenda que N icéia não criou a
doutrina da Trindade. Apenas se repetiu aquilo que havia acontecido diversas
vezes na história do cristianismo, inclusive no próprio C oncilio de Jerusalém
narrado em Atos 15, quando uma questão que estava conturbando a Igreja, foi
analisada de forma ampla e detalhada, para então se chegar a uma posição orto­
doxa. Conceitos teológicos aceitos eram definitivamente reunidos e esclareci­
dos dentro de uma fórmula doutrinária, que tinha por objetivo refutar falsos
ensinos e simplificar os verdadeiros.

A primeira reação
Alguém sugeriu que o primeiro passo fosse ler as proposições de Ario. O par­
tido ariano o fez de um modo que perturbou a todos os presentes ao afirmar que
Jesus era mera criatura, em uma declaração que negava de forma direta a divin­
dade do Filho de Deus e afirmando que não era de modo algum igual ao Pai.
Antes mesmo que Eusébio de Nicomédia terminasse a leitura, alguns bis­
pos já tamparam seus ouvidos com as mãos e pediram que se calasse, pois não
estavam a fim de escutar aquela blasfêmia. Um bispo que estava próximo a
Eusébio deu um passo à frente, arrancou o manuscrito de sua mão, lançou-o no
chão e pisoteou-o. Houve grande tumulto entre os bispos, que só foi interrom­
pido pela intervenção do imperador.
Esta reação se deve ao fato de que até então, as cartas escritas tanto por Ario
quanto por Eusébio, não eram explícitas em suas posições (eram proselitistas),

120
e foram escritas com intenção de atrair adeptos para seu partido. Não era o caso
agora, em que a afirmação simples e clara de Jesus com o uma mera criatura
ofendia toda a teologia da Igreja. Esta era uma proposição claram ente herética
e com certeza nenhum bispo a aceitaria.

O credo de Nicéia
Pouco a pouco foi surgindo a idéia de escrever um credo que exprimisse a
“fé antiga da Igreja”. O termo escolhido para descrever a relação entre o Pai e o
F ilho foi hom oousios - consubstanciai - que deriva de duas palavras gregas
“um a” e “substância”. Os arianos ficaram horrorizados com esta posição e os
partidários de Alexandre eAtanásio ficaram jubilosos. Som ente alguns manifes­
taram a preocupação de que o Pai e Filho fossem confundidos com a mesma
pessoa, tal qual ensinava o modalismo. Este primeiro credo de Nicéia foi assim
redigido:
“Cremos em um só Deus Pai onipotente, criador de todas as coisas visíveis
e invisíveis; em um só Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus, gerado de seu Pai,
unigênito, isto é, da substância do Pai, Deus de Deus, Fuz verdadeira de Luz
verdadeira, gerado, não criado, consubstanciai com o Pai ( hom oousios ), por
quem todas as coisas vieram a existir, tanto no céu com o na terra, que por nós
homens e pela nossa salvação desceu e encarnou, tornou-se humano, padeceu
e ao terceiro dia ressuscitou e subiu ao céu e virá para julgar os vivos e os mortos;
e no Espírito Santo”.
Ao se utilizar a expressão “gerado não feito”, este credo “atingia em cheio”
o arianismo, uma vez que este se apoiava muito na palavra “gerado” utilizado
por João para justificar uma origem para o Filho de Deus. O credo mostrava que
embora o termo “gerado” fosse aplicado, nunca foi utilizado o termo “criado”,
que fora tão com um ente usado para as demais coisas. Portanto, a palavra “gera­
do” não podia por si só justificar uma origem ao Filho.
Por fim, foi acrescentado um “anátem a” para aqueles que ensinassem o
oposto: “Mas quanto aos que dizem, houve um tempo quando o Filho não exis­
tia, que antes de nascer não existia, que veio a existir a partir do nada ou que asse­
veram que o Filho é de substância diferente da do Pai, ou que é criado e sujeito
a alteração e mudança, a esses a Igreja anatematiza”.
Isto definitivamente colocava Ario como herege e depunha a ele e aos bis­
pos que o apoiavam. Pela prim eira vez um herege cristão era condenado e
deposto por um governante secular.
O imperador exigiu que todos os bispos assinassem o credo. Apenas

121
das questões que envolviam o conflito, que como dissemos, concentrou-se na
região oriental. Nem mesmo o imperador tinha conhecim ento teológico para
tal. Sobre isto observou Justo Gonzales, historiador eclesiástico:
“A vasta maioria dos bispos parece não ter entendido a importância da ques­
tão em pauta e o receio do sabelianismo deixou todos relutantes para condena­
rem o subordinacionismo de forma contundente. Além disso, o imperador, que
se interessava mais pela unidade do Império que pela unidade de Deus, mos­
trou-se disposto a encontrar uma fórmula que fosse aceitável ao maior número
possível de bispos”.
E bom lembrar que embora nos sínodos e decisões anteriores buscou-se
combater qualquer posição de inferioridade do Filho, tanto em natureza quan­
to em posição e que pais com o Tertuliano já houvessem formulado um certo
conceito de Trindade, não havia uma formulação definitiva. D e certa forma, a
questão estava aberta e muitos temiam pender para posições que já haviam sido
consideradas heréticas. Isto enfraqueceu um pouco as posições dos bispos.
Portanto, é importante que o aluno compreenda que N icéia não criou a
doutrina da Trindade. Apenas se repetiu aquilo que havia acontecido diversas
vezes na história do cristianismo, inclusive no próprio C oncilio de Jerusalém
narrado em Atos 15, quando uma questão que estava conturbando a Igreja, foi
analisada de forma ampla e detalhada, para então se chegar a uma posição orto­
doxa. Conceitos teológicos aceitos eram definitivamente reunidos e esclareci­
dos dentro de uma fórmula doutrinária, que tinha por objetivo refutar falsos
ensinos e simplificar os verdadeiros.

A primeira reação
Alguém sugeriu que o primeiro passo fosse ler as proposições de Ario. O par­
tido ariano o fez de um modo que perturbou a todos os presentes ao afirmar que
Jesus era mera criatura, em uma declaração que negava de forma direta a divin­
dade do Filho de Deus e afirmando que não era de modo algum igual ao Pai.
Antes mesmo que Eusébio de Nicomédia terminasse a leitura, alguns bis­
pos já tamparam seus ouvidos com as mãos e pediram que se calasse, pois não
estavam a fim de escutar aquela blasfêmia. Um bispo que estava próximo a
Eusébio deu um passo à frente, arrancou o manuscrito de sua mão, lançou-o no
chão e pisoteou-o. Houve grande tumulto entre os bispos, que só foi interrom­
pido pela intervenção do imperador.
Esta reação se deve ao fato de que até então, as cartas escritas tanto por Ario
quanto por Eusébio, não eram explícitas em suas posições (eram proseiitistas),

120
e foram escritas com intenção de atrair adeptos para seu partido. Não era o caso
agora, em que a afirmação simples e clara de Jesus com o uma mera criatura
ofendia toda a teologia da Igreja. Esta era uma proposição claram ente herética
e com certeza nenhum bispo a aceitaria.

O credo de Nicéia
Pouco a pouco foi surgindo a idéia de escrever um credo que exprimisse a
“fé antiga da Igreja”. O termo escolhido para descrever a relação entre o Pai e o
Filho foi hom oousios - consubstanciai - que deriva de duas palavras gregas
“um a” e “substância”. Os arianos ficaram horrorizados com esta posição e os
partidários de Alexandre eAtanásio ficaram jubilosos. Som ente alguns manifes­
taram a preocupação de que o Pai e Filho fossem confundidos com a mesma
pessoa, tal qual ensinava o modalismo. Este primeiro credo de N icéia foi assim
redigido:
“Cremos em um só Deus Pai onipotente, criador de todas as coisas visíveis
e invisíveis; em um só Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus, gerado de seu Pai,
unigênito, isto é, da substância do Pai, Deus de Deus, Luz verdadeira de Luz
verdadeira, gerado, não criado, consubstanciai com o Pai ( hom oousios ), por
quem todas as coisas vieram a existir, tanto no céu com o na terra, que por nós
homens e pela nossa salvação desceu e encarnou, tornou-se humano, padeceu
e ao terceiro dia ressuscitou e subiu ao céu e virá para julgar os vivos e os mortos;
e no Espírito Santo”.
Ao se utilizar a expressão “gerado não feito”, este credo “atingia em cheio”
o arianismo, uma vez que este se apoiava muito na palavra “gerado” utilizado
por João para justificar uma origem para o Filho de Deus. O credo mostrava que
embora o termo “gerado” fosse aplicado, nunca foi utilizado o termo “criado”,
que fora tão com um ente usado para as demais coisas. Portanto, a palavra “gera­
do” não podia por si só justificar uma origem ao Filho.
Por fim, foi acrescentado um “anátem a” para aqueles que ensinassem o
oposto: “Alas quanto aos que dizem, houve um tempo quando o Filho não exis­
tia, que antes de nascer não existia, que veio a existir a partir do nada ou que asse­
veram que o Filho é de substância diferente da do Pai, ou que é criado e sujeito
a alteração e mudança, a esses a Igreja anatematiza”.
Isto definitivamente colocava Ario com o herege e depunha a ele e aos bis­
pos que o apoiavam. Pela primeira vez um herege cristão era condenado e
deposto por um governante secular.
O imperador exigiu que todos os bispos assinassem o credo. Apenas

121
Eusébio de Nicomédia e Teogno de Nicéia se recusaram. Devido a sua influên­
cia, ficava patente que a questão não fora resolvida definitivamente. Este pri­
meiro credo de Nicéia era um tanto ambíguo e, portanto, deixava possibilidade
de contestação, com o de fato aconteceu. A ortodoxia teve uma vitória temporá­
ria em Nicéia, com a afirmação da eternidade de Cristo e a identidade de sua
substância com o Pai. Mas o conhecido Credo N iceno, só seria definitivamen­
te formulado tempos depois, baseado nas decisões do C oncilio de Nicéia.
C om o resultado, haveria mais m eio século de com bate ariano. Im per­
adores arianos e semi-arianos tornariam a causa uma questão política e por
vezes parecia que a doutrina da Trindade estava destinada a m ergulhar no
esquecim ento. Isto só não aconteceu devido a corajosa posição de hom ens
como Atanásio, que de forma quase épica lutou para que a ortodoxia prevale­
cesse.
Existe tam bém o Credo de Atanásio, derivado deste, porém, mais detalha­
do e que busca evitar interpretações errôneas. Ao usar o termo “mesma substân­
cia”, corria-se o risco de cair no sabelianismo, por falta de distinguir as pessoas
dentro da Trindade. Por isso vale a pena con h ecer o cham ado Credo
Atanasiano:
“E a fé católica (universal) é esta: adoremos um Deus na Trindade, e a
Trindade na unidade.
Não confundimos as Pessoas, nem dividimos (separamos) a Substância.
Pois existe uma única Pessoa do Pai, outra do Filho e outra do Espírito
Santo.
Mas a Deidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo é toda uma só: a glória
é igual, a majestade é co-eterna.
Tal com o é o Pai, tal é o Filho e tal é o Espírito Santo.
O Pai não foi criado, o Filho não foi criado, o Espírito Santo não foi criado.
O Pai é incompreensível (imensurável), o Filho é incompreensível (im en­
surável), e o Espírito Santo é incompreensível (imensurável).
O Pai é eterno, o Filho é eterno, o Espírito Santo é eterno.
E , no entanto, não são três (seres) eternos, mas há apenas um eterno.
E não há três (seres) que não foram criados e que são incompreensíveis
(imensuráveis).
Há, porém, um só que não foi criado e é incompreensível (imensurável).
Assim sendo, o Pai é Todo-Poderoso, o Filho é Todo-Poderoso, o Espírito
Santo é Todo-Poderoso.
E , no entanto, não são três (seres) Todo-Poderosos, mas um só é Todo-
Poderoso.

122
Assim, o Pai é Deus, o Filho é Deus e o Espírito Santo é Deus.
E , no entanto, não são três deuses, mas um só Deus.
Igualmente, o Pai é Senhor, o Filho é Senhor, o Espírito Santo é Senhor.
E , no entanto, não são três Senhores, mas um só Senhor.
Pois da mesma forma que somos compelidos pela verdade cristã a reconhe­
cer cada Pessoa, por si mesma, com o Deus e Senhor, assim tam bém somos proi­
bidos pela religião católica (universal) de dizer: Existem três deuses ou três
senhores.
O Pai não foi feito de ninguém: nem criado e nem gerado.
O Filho vem somente do Pai: não foi feito nem criado, mas gerado.
O Espírito Santo vem do Pai e do Filho: não foi feito nem criado, e nem
gerado, mas procedente.
Assim há um só Pai, e não três Pais; há um só Filho, e não três Filhos; há um
só Espírito Santo, e não três Espíritos Santos.
E nessa Trindade nenhum é antes ou depois do outro. Nenhum é superior
ou inferior ao outro.
Mas todas as três Pessoas são juntam ente co-eternas e co-iguais de tal modo
que, em todas a coisas, foi dito, a Unidade na Trindade e a Trindade na Unidade
deve ser adorada.
Aquele, pois, que quiser ser salvo, deve pensar assim sobre a Trindade.
Tam bém é necessário para a salvação eterna que se creia, fielm ente, na
encarnação de nosso Senhor Jesus Cristo.
Pois a verdadeira fé é que creiamos e confessemos que nosso Senhor Jesus
Cristo, o Filho de Deus, é Deus e Homem.
(Concordia Triglotta)
Deus da Substância do Pai, gerado antes dos mundos, e Homem da subs­
tância de sua mãe, nascido no mundo.
Perfeito D eus e perfeito H om em , tendo alm a e subsistindo em carne
humana.
Igual ao Pai, referindo-se à sua divindade, e inferior ao Pai, referindo-se à
sua humanidade;
O qual, embora seja Deus e Homem, contudo não é dois, mas um só Cristo.
Um, não mediante a conversão da divindade em carne, mas por ter toma­
do a humanidade em Deus.
Um , juntam ente; não por confusão de Substância, mas por unidade de
Pessoa.
Pois tal com o a alma e a carne formam um só hom em , assim Deus e o
Homem é um só Cristo;

123
O qual sofreu pela nossa salvação; desceu ao inferno, ressuscitou dentre os
mortos ao terceiro dia.
E ascendeu ao céu. Está assentado à direita do Pai, Deus Todo-Poderoso,
de onde virá para julgar os vivos e os mortos.
Por ocasião de sua vinda, todos os homens ressuscitarão em seus corpos e
prestarão contas de suas próprias obras.
Aqueles que praticaram o bem irão para a vida eterna; e aqueles que prati­
caram o mal obterão as chagas eternas.
Essa é a fé católica (universal), a qual pode salvar o homem . Basta que ele
creia nela fiel e firm em ente”.

O retorno do arianismo
O imperador Constantino tinha uma irmã de nome Constança, que devi­
do a amizade com Eusébio de Nicomédia, se sensibilizara com a causa dos aria­
nos. Batalhou junto a seu irmão até que conseguiu a suspensão do exílio do
bispo Eusébio. Uma vez na corte, Eusébio de Nicomédia trabalhou juntam en­
te com Constança, para convencer o imperador a trazer de volta o próprio Ario.
Torna-se então o novo grande defensor do arianismo e com eça uma campanha
juntam ente com a irmã do imperador, atacando os principais bispos que fica­
ram contra Ario.
Sua vingança caiu fortemente sobre Atanásio de Alexandria, que fora o prin­
cipal expositor da posição ortodoxa, conseguindo autorização junto ao impera­
dor para exilá-lo. Em seguida consegue também o exílio de Eustácio de Antio-
quia e M arcelo de Ancira. Muitos sacerdotes tiveram a mesma sorte e foram
obrigados a substituir as fórmulas de fé de Nicéia pelas proposições dos arianos.
Eusébio conseguiu trazer Ario de volta em 331 d. C . o qual apresentou uma
fórmula ambígua e amorfa (informe) ao imperador, a fim de ser isento do exí­
lio. Era esta a situação quando o imperador Constantino morreu, no ano de 337.
Após a morte de seu filho Constantino II, o Império foi dividido entre Constante
no Ocidente e Constâncio, no Oriente.
Sob C onstâncio a perseguição contra os ortodoxos foi interrom pida e
Atanásio pôde retornar do exílio e as sentenças que o condenaram foram anula­
das em 340 d.C. O credo de Nicéia foi substituído por quatro fórmulas diferen­
tes nas quais não aparecia de forma alguma a palavra “consubstanciai”.
O sucessor de C onstantino foi seu filho C onstâncio, que permitiu que
Atanásio retornasse à sua sé em Alexandria. Porém, sua restauração não seria
permanente. O relacionamento entre Atanásio e o imperador Constâncio era

12 4
tempestuoso. O imperador, que governou até a sua morte em 362 d.C ., cons­
tantemente perseguia o bispo, que parecia ser o último e principal baluarte de
resistência da ortodoxia trinitária ante o arianismo e o semi-arianismo.
O imperador queria paz e a uniformidade era o cam inho para ela. Chegou
a achar que o termo homoousios, ironicamente, sugerido e imposto por seu pai,
Constantino, deveria ser substituído no Credo de Nicéia por homoiousios, que
significa “de substância sem elhante” e era aceitável para os semi-arianos e até
mesmo para muitos trinitários. A nova terminologia teria tornado ortodoxa, se
aceita, a crença de que o Pai e o Filho compartilham de “substância semelhan­
te” em vez de se crer que são da mesma substância ou existência.
Os que faziam pressão em favor dessa mudança são geralmente considera­
dos ”semi-arianos” e suas estrelas brilharam na igreja e no Império por volta de
360 d.C., quando Constantino passou a apoiá-los. A mudança teria excluído a
interpretação sabeliana da Trindade, deixando claro que o Pai e o Filho não são
idênticos. Mas tam bém teria aberto a porta para uma interpretação ariana
“subordinacionista” ao subentender que talvez o Filho não seja Deus da mesma
maneira que o Pai é Deus.
Atanásio resistiu com teimosia à mudança e até mesmo a condenou como
heresia e a equiparou com o anticristo os que a apoiavam. Sua preocupação não
era simplesmente defender uma linguagem sacrossanta, mas defender o pró­
prio Evangelho. Para Atanásio e seus partidários, a própria salvação dependia do
Filho ser o próprio Deus e não uma grandiosa criatura semelhante a Deus. Para
ele “a questão fundamental é que somente o verdadeiro Deus pode unir a cria­
tura a Deus” e a “salvação não é possível mediante uma corrente hierárquica,
do Pai através de um Filho intermediário até as criaturas. Um intermediário,
portanto, tanto separa quanto une as criaturas com o Pai”. Ele se recusava ter-
m inantemente a aceitar a afirmação ariana que dizia que “houve um tempo em
que o Filho não existia”. Era inaceitável porque o Evangelho inteiro dependia
de Jesus Cristo ser tanto verdadeiro Deus quanto verdadeiro homem.
Acusou-se Atanásio de ser intransigente por estar provocando a divisão do
Império Romano, apenas por uma letra - “i”. E verdade que era apenas uma
letra, mas a diferença entre homoousios e homoiousios, tratava-se aqui da dife­
rença entre Criador e criatura. A primeira diz que o Filho é Deus. A segunda
que ele é apenas semelhante a Deus. Se um ser é Deus, é totalmente errado
dizer que ele é apenas semelhante a Deus. Esta pequena alteração revestia-se,
portanto, de uma importância extrema.
Todavia, Constâncio mostrou-se extremamente simpático ao arianismo.

125
Não demora a surgir uma nova onda de perseguição aos anti-arianos, principal­
mente a Atanásio. Em 357 d.C ., os arianos triunfam no Oriente e no Ocidente.
Entretanto, os arianos não conseguiram manter a unidade. Com eçaram a
surgir diversas correntes dentro do próprio arianismo, que, como resultado, os
enfraqueceu. As duas principais correntes foram o anom eísm o e o homeusianis-
mo. Os primeiros ensinavam que o Filho era de natureza com pletam ente dife­
rente da do Pai, enquanto os últimos admitiam que eram de substância seme­
lhante. Foi necessário que o Imperador convocasse um C o n cilio em
Constantinopla no ano de 360 d.C. para resolver a questão.

Novas ações de Atanásio


Em um de seus últimos exílios, Atanásio viveu durante cinco ou seis anos
entre os monges no deserto, até que a situação se acalmasse. Conseguiu convo­
car um C oncilio em Alexandria, que embora não possa ser considerado ecum ê­
nico não teve o apoio, nem do imperador nem dos principais bispos da Igreja,
mas abriu o caminho para o segundo C oncilio Ecum ênico em Constantinopla,
que seria realizado após a sua morte. Seu sínodo reuniu-se em Alexandria no
ano de 362 d.C., reafirmando homoousios com o a única descrição válida para o
relacionamento entre o Filho e o Pai. O hom oiousios dos semi-arianos foi rejei­
tado como heresia pelagiana.
Os principais tratados teológicos de Atanásio foram De incam atione , traduzi­
do como “Da Encarnação do Verbo”, e quatro discursos contra os arianos. E óbvio
que também escreveu numerosas cartas, panfletos teológicos e livros pequenos.
Mas essas são as obras principais a respeito da Divindade e da salvação. Entre outras
obras de menor importância está “A vida de Antão” e “Contra os pagãos”.
“Da Encarnação do Verbo” continua sendo um grande clássico cristão e
ainda publicado dezessete séculos mais tarde. É uma obra clássica da teologia
construtiva cristã primitiva. É possível que Atanásio a tenha escrito em seu pri­
meiro exílio em Tréveris. É um livro sobre a necessidade de uma encarnação
genuína de Deus na humanidade, para a salvação dos homens e ressalta a divin­
dade de Jesus Cristo.
“Contra os arianos” é a obra mais polêmica de Atanásio e é dirigida contra
os arianos e semi-arianos. Foi escrita entre 3 56 e 360 d.C. quando então a here­
sia ariana, na forma de semi-arianismo estava para se tornar a ortodoxia obriga­
tória da Igreja inteira. A mensagem era muito parecida com aquela “Da Encar­
nação do Verbo”, mas expressa de modo negativo, para desm ontar o
subordinacionismo radical.
Atanásio morreu em 373 d.C. na cidade de Alexandria. Passou os últimos

126
sete anos de sua vida em sua cidade natal com o bispo dela, em relativa paz e
quietude. O imperador Valente, embora fosse ariano e o condenasse ao exílio,
teve depois compaixão e permitiu que ele voltasse para casa. Em seguida, o pró­
prio imperador tam bém morreu.

Os três capadocianos
Fundam ental para a vitória trinitária, foi tam bém a contribuição dos cha­
mados “Três Capadocianos”.
Basílio - o Grande, arcebispo de Cesaréia, foi o principal artífice da assim
cham ada teologia proto-nicena, que finalm ente derrotou o arianismo. Seu
irmão mais novo, Gregório de Nissa, desenvolveu o mesmo ponto de vista orto­
doxo de modo mais especulativo e G regório de Nazianzo interpretou-o de
maneira retórica em sua obra intitulada Orationes.
Enquanto Atanásio salientava vigorosamente a idéia de “uma substância”
e partia deste ponto para a descrição da Trindade, os capadocianos partiam da
idéia de “três pessoas distintas” e desenvolviam uma terminologia que descreve
tanto a unidade com o a Trindade. Assim fazendo, aceitaram a teologia grega
anterior que concebia três pessoas em níveis distintos no Ser Divino, conforme
defendera Orígenes.
Com sua colocação teológica, era possível rejeitar o arianismo por meio da
fórmula “o Filho da mesma substância que o Pai”, sem cair no modalismo, que
não deixava espaço para distinguir o Pai do Filho. Para isto, era necessário dei­
xar claro que embora Pai, Filho e Espírito Santo fossem da mesma substância
una (hom oousios ), não eram a mesma pessoa. São três pessoas (hypostases ) dis­
tintas e não três máscaras ou três manifestações do único Deus - sendo isto o
que o sabelianismo afirmava.
Parece que finalm ente a Igreja tinha chegado à definição trinitária latina
de Tertuliano, apresentada contra Práxeas um século e meio antes - una subs-
tantía, tres personae . Mas em 362 d.C., esta conclusão ainda estava longe de ser
universalmente aceita.

A solução definitiva - O Concilio de Constantinopla


Após a morte de Constâncio, surgem diversos governos curtos. O impera­
dor Valente (364-378 d .C .), no O riente, foi favorável ao arianismo. Mas seu
sucessor, Teodósio, um general e hábil administrador, era simpático à doutrina
do Ocidente e ao Credo Niceno. Empreende então uma campanha contra o
arianismo e o varre de forma definitiva do Império.

127
Em 381 d.C. aconteceu o C oncilio de Constantinopla que colocou as deci­
sões de Nicéia com o a posição ortodoxa. Este era o segundo concilio de caráter
ecum ênico, por reunir bispos de todas as partes do Império. O credo que aqui
se originou, juntam ente com o Credo de Atanásio e o Credo dos Apóstolos, são
os grandes credos universais da Igreja. O arianismo foi com pletam ente rejeita­
do com o heresia e a divindade de Cristo estabeleceu-se com o artigo de fé.
“Creio em um só Deus, Pai Todo Poderoso, criador do céu e da terra, de
todas as coisas visíveis e invisíveis.
Creio em um só Senhor, Jesus Cristo, Filho unigênito de Deus, gerado do
Pai antes de todos os séculos: Deus de Deus, Luz de Luz, Deus verdadeiro de
Deus verdadeiro; gerado, não criado, consubstanciai ao Pai. Por ele todas as coi­
sas foram feitas. E por nós homens, e para nossa salvação, desceu dos céus: e
encarnou pelo Espírito Santo, no seio da virgem Maria, e se fez homem. Tam­
bém por nós foi crucificado sob Pôncio Pilatos; padeceu e foi sepultado. Ressus­
citou ao terceiro dia, conforme as Escrituras e subiu aos céus, onde está assen­
tado à direita do Pai. E de novo há de vir, em sua glória, para julgar os vivos e os
mortos e seu reino não terá fim.
Creio no Espírito Santo, Senhor que dá vida, e procede do Pai (e do Filho);
E com o Pai é adorado e glorificado: ele que falou pelos profetas.
Creio na Igreja, una, santa, católica e apostólica. Professo um só batismo
para remissão dos pecados. E espero a ressurreição dos mortos e a vida do mundo
que há de vir. Amém ”.
Um novo docum ento foi promulgado contra os heréticos a partir deste
C oncilio, buscando estabelecer definitivamente a doutrina ortodoxa e rejeitan­
do o arianismo e o semi-arianismo com o heréticos: “Sejam absolutam ente
excluídos dos edifícios eclesiásticos, pois não estão autorizados a celebrar suas
assembléias ilegais dentro dos povoados. Se tentarem qualquer distúrbio, orde­
namos eliminar e expulsar das cidades esses frenéticos, de modo que as autori­
dades possam ser restauradas, no mundo inteiro, e recolocadas em mãos dos bis­
pos ortodoxos que confessam o credo de N icéia”.
Mas o presente Credo N iceno, na verdade, foi aprovado na Calcedônia, em
451 d.C., com toda probabilidade baseado em Credos sírio-palestinenses como
o de Jerusalém dos escritos de Cirilo. Este Credo, o Credo dos Apóstolos e o
Credo de Atanásio são os três grandes credos universais da Igreja. O arianismo,
ao qual estão relacionados o modernismo e o unitarianismo de hoje, foi rejeita­
do com o doutrina não-ortodoxa; a verdadeira divindade de Cristo foi colocada
com o artigo de fé. Em bora a decisão tomada em N icéia tenha se tornado um
fator de separação entre as Igrejas oriental e ocidental, não devemos esquecer o
valor desta decisão para a nossa fé.

128
O arianismo estaria para sempre banido da doutrina ortodoxa da Igreja.

Arianismo moderno
Não se pode deixar de notar que o arianismo está presente quase em sua
totalidade na cristologia ensinada pela Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e
Tratados - mais conhecida com o as Testemunhas de Jeová. Sua posição com
respeito à relação do Pai com o Filho é a mesma de Ario - o Filho com o criatu­
ra, superior aos anjos (embora algumas vezes o identifiquem com o arcanjo
Miguel) e inferior a Deus.
Na ânsia de defender esta doutrina, elaboraram uma tradução no intuito
de suprimir ou distorcer textos das Escrituras onde a divindade plena do Filho
é evidente, com o João 1.1, por exemplo, que posiciona o artigo [um] antes da
palavra Deus e escrevem o mesmo, transformando a frase “...o Verbo era D eus”
em “...a Palavra era [um’] deus”. Essas e outras distorções podem ser conferidas
pelo aluno no Curso de A pologétíca em sua primeira fase, no módulo III.

Efeitos de Nicéia
Nicéia custou à Igreja a sua independência. Embora a questão fosse solucio­
nada, abriu precedente para a interferência do Estado em questões eclesiásticas.
Com isto, o Estado passaria a estar cada vez mais dominando a Igreja. No O ci­
dente, a Igreja se livraria deste jugo e invertería os papéis, passando a dominar no
âmbito secular. Enquanto no Oriente, a Igreja jamais se libertou deste domínio.
Todavia, este envolvimento da Igreja com o Estado só vai ser definitivamen­
te rompido após o período da Reforma, pois nem mesmo o luteranismo e o cal-
vinismo se desligaram com pletam ente. Foram grupos mais radicais com o os
anabatistas que insistiram na igreja com o algo independente do Estado.
Outro efeito de N icéia, é que a partir de então a Igreja estaria apelando para
os Concílios para resolver suas questões teológicas e mesmo práticas, a ponto de
em certos m omentos da história do cristianismo, indagar-se sobre a fonte da
autoridade da Igreja, se era o Papa ou os Concílios.
Ainda um terceiro elemento que tem sua origem em N icéia, é a importân­
cia do dogma. O dogma cristão era uma afirmação de cunho doutrinário que
expressava de forma minuciosa e definitiva uma verdade, que não poderia de
forma alguma ser contestada. Embora já houvesse outros credos anteriores, em
N icéia eles ganharam importância extrema, principalmente dentro do catoli­
cismo romano.

129
Capítulo 4

NOVAS CONTROVÉRSIAS
CRISTOLÓGICAS
Apolinarismo, Nestorianismo, Eutiquianismo e Monotelismo

E
ra de se esperar que o reconhecimento da divindade do Filho
pusesse fim a qualquer controvérsia nesta área. Todavia, ocor­
reu justamente o oposto. Não agora no sentido de relacionar o
Pai com o Filho, mas em compreender o sentido da união entre
Homem e Deus na pessoa de Jesus. Por vezes tendia-se a ressaltar sua
natureza divina em detrimento da humana e por vezes tendia-se a des­
tacar sua natureza humana, em detrimento da divina.
Os séculos posteriores foram testemunhas de outras disputas teológicas,
quando novos dogmas, credos e definições foram levantados, no senti­
do de salvaguardar a doutrina cristã de novas interpretações errôneas.
Estas novas disputas em torno de conceitos teológicos, serve para com­
provar o cuidado da Igreja em não se desviar do ensino correto. O con­
flito com Ário e seus seguidores, quase deturpou completamente a
natureza divina e afastou a Igreja da verdade. Os bispos não estavam
dispostos a incorrer em novos riscos.
Neste ponto, a fusão entre Igreja e Estado já se encontra em um está­
gio bastante avançado. Mais do que nunca, a interferência de gover­
nantes e imperadores nas questões teológicas se fazia necessária. A
Igreja estava bastante politizada e mais do que nunca se escondiam
jogos de poder por trás das decisões. (Todavia, isto não é motivo para
duvidarmos da credibilidade das decisões). O critério continuava
sendo as Escrituras Sagradas, embora nem sempre isto transparecesse.
O que temos apenas é a expressão da fé bíblica, utilizando-se da lingua­
gem rebuscada da filosofia grega para tornar as profundidades da dou­
trina cristã claras e livres de falsas interpretações.

130
Apolinarianismo
Apolinário, o Jovem, era bispo de Laodicéia da Síria. Nasceu por volta de
310 d.C ., filho de Apolinário, o Velho, que tam bém foi bispo. Viveu com seu
pai nos tempos do imperador Juliano, o Apóstata, que rejeitou o cristianismo e
buscou de todas as formas reimplantar o paganismo dentro do Império.
Foi um incansável adversário do arianismo e buscou de todas as maneiras
confirmar as decisões do C oncilio de Nicéia. Entretanto, achava que as respos­
tas ficaram incompletas. Afirmar que Jesus era verdadeiro homem e verdadeiro
Deus, não explicava, contudo, com o se dava esta união das naturezas e ele se pro­
pôs a responder.
Apolinário, a fim de resolver o problema das duas naturezas (humana e divi­
na), aceita a posição tricotômica, ou seja, o homem como constituído de corpo,
alma e espírito. Tomou a posição de que o Logos (Verbo) assumiu o lugar da alma
no homem , que ele considerava como a sede do pecado. Assegurava assim a uni­
dade da pessoa de Cristo sem sacrifício da sua divindade e resguardava a impeca-
bilidade de Cristo.
As discussões geradas por suas afirmações levaram à realização do concilio
de Alexandria em 362 d.C ., na qual a doutrina de Apolinário foi condenada,
mas não sua pessoa. Ele particularmente continuou gozando de grande prestí­
gio de modo que ganhava muitos adeptos em diversas igrejas.
Entretanto a completa humanidade do Salvador foi perdida dentro do con­
ceito apolinarista, e sua teologia foi rejeitada no C oncilio de Constantinopla
em 381 d.C ., levando em consideração os seguintes pontos:

1.Gregório de Nazianzo já havia colocado na argumentação contra o aria­


nismo: “Aquilo que não foi assumido não foi salvo; mas o que foi unido a Deus,
foi salvo”, isto é, o hom em todo tinha de ter sido assumido pela Divindade, para
que pudesse ser salvo e não apenas parte dele.
2. Além disso, se a alma humana foi substituída pelo Verbo de Deus, este se
torna parte integral da natureza humana e é diminuída em sua divindade. O que
é impossível.
3. Enfim , sem alma humana, sem inteligência e vontade própria distinta da
de Deus, Cristo não pode nos dar a salvação porque são por nossos atos livres e
deliberados que nos apropriamos daquilo que Deus nos dá gratuitamente.

C om a morte de Apolinário em 390 d.C ., seus adeptos se dividiram. Um


partido mais radical acabou se aliando aos monofisistas (ver a seguir). O outro
partido, mais moderado, tornou a unir-se com a Igreja em Roma.
Nestorianismo
Seria mais sincero de nossa parte, como apologistas que somos, tentar res­
gatar a imagem de Nestor, bispo Sírio que foi condenado com o herege no C on ­
cilio de Efeso de 431 d.C ., ao tentar negar o título de mãe de Deus à Maria. E
importante frisar, que embora a questão tenha sido colocada como sendo acer­
ca da natureza de Cristo, havia outros elementos envolvidos, com o rixas pes­
soais e políticas e mesmo o culto à Maria que embora não fosse tão desenvolvi­
do e forte com o em nossos dias, já era bastante comum.

/
A história do Concilio de Efeso
“E (Paulo) de M ileto mandou a Efeso, a chamar os anciãos da Igreja. E ,
logo que chegaram junto dele, disse-lhes [...] Porque eu sei isto que, depois da
minha partida, entrarão no meio de vós lobos cruéis, que não pouparão ao reba­
nho. E que de entre vós mesmos se levantarão homens que falarão coisas per­
versas, para atraírem os discípulos após si” (At 20.17,29,30).
Fala-se muito hoje do C oncilio de Efeso com o “uma questão cristológica”.
O que estava em jogo não era se Maria deveria ser chamada de “M ãe de D eus”
ou não, mas se o Filho nascido dela possuía apenas a natureza humana ou se
possuía tanto a natureza humana quanto a divina. O resultado positivo deste
C oncilio foi o estabelecim ento da natureza teantrópica de Cristo, isto é, Jesus é
verdadeiro Deus e verdadeiro homem.
Mas a deturpação veio de “carona”. Todo o ambiente que cercou este C on­
cilio foi repleto de intrigas, corrupções, ódios e idolatria, mais especificamente a
idolatria mariana (adoração a Maria). O historiador Edward Gibbon, se referiu
a ele como um “tumulto episcopal, que na distância de treze séculos assumiu o
venerável aspecto de Terceiro C on cilio E cu m ên ico ” (D eclínio e Queda do
Império Romano, Vol II).
Na Síria, a escola de Nestor tinha sido ensinada a rejeitar a confusão das
duas naturezas, e suavemente distinguir a humanidade de seu mestre Cristo da
divindade do Senhor Jesus. A bendita virgem era honrada com o a mãe do
Cristo, mas os ouvidos de Nestor foram ofendidos com o irrefletido e recente
título de “M ãe de D eus”, que tinha sido insensivelmente adotado desde a con­
trovérsia ariana.
D o púlpito de Constantinopla, um amigo de Nestor e depois o próprio
Nestor, repetidamente pregou contra o uso, ou o abuso, de uma palavra desco­
nhecida pelos apóstolos, não autorizada pela Igreja, e que apenas tendia a con­
fundir os simples, entreter os profanos e justificar, por aparente sem elhança, a

1 32
genealogia do Olim po, pois era comum na mitologia grega as deusas concebe­
rem filhos humanos.
Em seus momentos mais calmos, Nestor confessou que poderia ter tolera­
do ou desculpado a união das duas naturezas, mas ele ficava exasperado pela
contradição de negar adoração a um recém-nascido um Deus infante, compa­
rado inadequadamente aos padrões de vida conjugal, (O Pai é Deus, a mãe é
Maria e o Filho desta relação é Jesus) e descrever a humanidade de Cristo como
apenas uma roupa (uma fantasia), um instrum ento ou Tabernáculo de seu
Deus. Ao som destas blasfêmias os pilares do cristianismo foram sacudidos. Os
fracassados competidores de Nestor, induziram seu ressentim ento pessoal e
pior, o clérigo bizantino foi secretamente desprezado pela invasão do estrangei­
ro, Cirilo de Alexandria, seu adversário. Todavia, tudo o que era supersticioso
ou absurdo era protegido pelos monges; o povo estava interessado na glória de
sua Virgem Patrona. Os sermões do arcebispo, e o serviço do altar foram pertur­
bados por sediciosos clamores; sua autoridade e doutrina foi rejeitada pela sua
própria congregação; cada vento espalhou ao redor do Império as folhas da con­
trovérsia. E a voz dos combatentes ecoou com o num sonoro teatro.

A oposição de Cirilo de Alexandria


Era dever de Cirilo iluminar o zelo e a ignorância de seus monges. Na esco­
la de Alexandria ele tinha embebido e professado a encarnação de uma nature­
za; e o sucessor de Atanásio consultou seu orgulho e am bição ao levantar armas
contra “outro Ário” (Nestor), mais formidável e mais culpado, o segundo trono
da hierarquia. Após uma curta correspondência, na qual o prelado rival disfar­
çou seu ódio na linguagem vazia de respeito e caridade, o patriarca de Alexan­
dria denunciou ao príncipe e ao povo, ao Oriente e ao O cidente, os daninhos
erros do pontífice bizantino. Do Oriente, mais especificamente de Antioquia,
Cirilo obteve o ambíguo conselho de tolerância e silêncio, que foram dirigidos
a ambas as partes enquanto se favorecia a causa dos nestorianos.
Mas Roma recebeu os mensageiros egípcios da parte de Cirilo de braços
abertos. A vaidade de Celestino, bispo de Roma na época, foi adulada pelo apelo
e a versão parcial de um monge que decidiram a fé do papa, que por sua vez, com
seus clérigos latinos, era ignorante da linguagem, das artes e da teologia grega.
A testa de um Sínodo italiano, Celestino pesou os méritos da causa, aprovou o
credo de Cirilo, condenou os sentimentos e a pessoa de Nestor, baniu o heréti­
co de sua dignidade episcopal, permitiu uma suspensão de dez dias para retra­
tação e penitência, e delegou ao seu inimigo a execução desta sentença preci­

*33
pitada e ilegal. Mas o patriarca de Alexandria (Cirilo) expunha os erros e pai­
xões de um mortal; e suas doze maldições4 ainda torturam a escravidão da orto­
doxia que adora a memória de um santo (Cirilo) sem perder sua lealdade ao
Sínodo da Calcedônia. Estas corajosas afirmações são indelevelmente tingidas
com as cores da heresia Apolinária.
Nem ainda o imperador, nem o prelado do Oriente estavam dispostos a obe­
decer ao mandado do sacerdote italiano; e um sínodo católico, ou melhor, de
gregos, foi solicitado pela Igreja como único remédio que poderia conciliar ou
decidir esta disputa eclesiástica. Efeso, acessível tanto por mar quanto por terra
para os dois lados, foi o local escolhido e o dia de Pentecostes foi a data do encon­
tro. Um escrito sumariando tudo foi despachado a cada metropolitano, e um
guarda foi designado para proteger e confinar os pais até que estivessem de acor­
do “os mistérios do céu e a fé da terra”. Nestor apareceu não como um crimino­
so, mas como um juiz. Ele dependia mais do peso do que do número de seus pre­
lados, e seus resolutos escravos estavam armados para cada injúria ou defesa. Mas
seu adversário, Cirilo, era mais poderoso nas armas, tanto da carne quanto do
espírito. Desobediente à carta, ou ao menos ao seu significado do resumo real,
ele foi atendido por cinqüenta bispos egípcios que esperaram do aceno de seu
patriarca, a inspiração do Espírito Santo. Ele tinha contraído uma íntima alian­
ça com o Bispo M ennon de Efeso. O despótico primado da Ásia dispôs pronta­
mente de trinta a quarenta votos episcopais: uma multidão de camponeses, os
escravos da Igreja, foram derramados na cidade para sustentar com barulhos e
clamores um argumento metafísico; e o povo zelosamente afirmou a honra da
Virgem, de quem o corpo repousava dentro dos muros de Efeso. O navio que
havia transportado Cirilo de Alexandria foi carregado com as riquezas do Egito;
e ele desembarcou um numeroso corpo de marinheiros, escravos, e fanáticos,
aliciados com cega obediência sob a bandeira de São Marcos e a mãe de Deus.
Os pais e ainda os guardas do concilio estavam receosos devido àqueles desfiles
esplendorosos de roupas guerreiras; os adversários de Cirilo e Maria foram insul­
tados nas ruas ou destratados em suas casas; sua eloqiiência e liberalidade fize­
ram um acréscimo diário ao número de seus aderentes; e os egípcios logo com ­
putaram que ele poderia comandar a atenção e as vozes de duzentos bispos. Mas
o autor das doze maldições previu e temeu a posição de João de Antioquia, que
com uma pequena, porém respeitável comitiva de metropolitanos e divinos,
estava avançando em vagarosa jornada da distante capital do Oriente. Impa-

^ Nos concílios era comum colocar uma lista de maldições sobre quem discordasse das conclu­
sões do Concíllio.

434
ciente com uma demora que ele classificou com o voluntária e culpável, Cirilo
anunciou a abertura do Sínodo apenas dezesseis dias após a Festa do Pentecostes.
Nestor, que dependia da chegada de seus amigos do Oriente, persistiu, como seu
predecessor Crisóstomo a negar a jurisdição e desobedecer ao chamado de seus
inimigos; eles apressaram seu processo e seus acusadores presidiram no trono de
seu julgamento. Sessenta e oito bispos, vinte e dois de posição metropolitana,
defenderam sua causa através de um modesto e temperado protesto; eles foram
excluídos dos concílios de seus irmãos, Candidianos, em nome do imperador,
requisitando uma demora de quatro dias; o profano prelado dirigiu-se com ultra­
jes e insultos a assembléia dos santos. O conjunto desta momentosa transação
ficou repleto para um dia de verão: o bispo entregou suas opiniões separado dos
demais; mas a uniformidade de estilo revelou a influência ou a mão de um mes­
tre, que tinha sido acusado de corromper a evidência pública de seus atos e subs­
crições. Sem uma voz dissidente eles reconheceram nas epístolas de Cirilo o
Credo Niceno e a doutrina dos Pais, mas as porções parciais das cartas e homí­
lias de Nestor foram interrompidas por maldições e anátemas; e o herético foi
degradado de sua dignidade episcopal e eclesiástica. A sentença, maliciosamen­
te escrita para o novo Judas, foi afixada e proclamada nas ruas de Efeso: os cansa­
dos prelados, assim que publicaram para a Igreja com respeito à mãe de Deus,
foram saudados como campeões; e sua vitória foi comemorada por luzes, cantos
e tumultos noturnos.
No quinto dia, o triunfo dos partidários de Cirilo foi obscurecido pela che­
gada e indignação dos bispos Orientais que, por sua vez, eram partidários de
Nestor. Em um cômodo da pensão, antes que João de Antioquia tivesse limpa­
do o pó de seus pés, ele deu audiência para Candidian, ministro imperial, que
relatou seus infrutuosos esforços para impedir ou anular a violenta pressa dos
egípcios. Com igual violência e rapidez, o Sínodo Oriental de cinqüenta bispos
degradou Cirilo e M em non de suas honras episcopais; condenou, em doze aná­
temas, o mais puro veneno da heresia apolinária; e descreveu o primado alexan­
drino com o um monstro, nascido e educado para a destruição da Igreja. Seu
trono era distante e inacessível; mas eles instantaneamente resolveram conce­
der ao rebanho de Efeso as bênçãos de um fiel pastor. Pela vigilância de M em ­
non, as igrejas foram fechadas contra eles, e uma forte guarnição foi colocada
na catedral. As tropas, sob o comando de Candidian, avançaram para o assalto;
as sentinelas foram cercadas e mortas à espada, mas o lugar era inexpugnável;
os sitiantes retiraram-se; sua retirada foi perseguida por um vigoroso grupo; eles
perderam seus cavalos e muitos soldados foram perigosam ente feridos com
paus e pedras. Efeso, a cidade da virgem, foi profanada com ódio e clamor, com

l 35
sedição e sangue; o sínodo rival lançou m aldições e excom unhões de sua
máquina espiritual; e a corte do imperador Teodósio ficou perplexa diante das
belas narrativas diferentes e contraditórias dos partidos da Síria e do Egito.
Durante um período tumultuado de três meses o imperador tentou todos os
meios, exceto o mais eficaz, isto é, a indiferença e o desprezo, para reconciliar
esta disputa teológica. Ele tentou remover ou intimar os líderes por uma senten­
ça comum de absolvição ou de condenação; ele investiu seus representantes em
Efeso com amplos poderes e força militar; ele escolheu de ambos os partidos oito
deputados para uma suave e livre conferência nas vizinhanças da capital, longe
do contagioso frenesi popular. Mas os orientais se recusaram a ceder e os católi­
cos, orgulhosos de seu número e de seus aliados latinos, rejeitaram todos os ter­
mos de união e tolerância. A paciência do manso imperador Teodósio foi provo­
cada, e ele dissolveu este tumulto episcopal, que na distância de treze séculos
assumiu o venerável aspecto de Terceiro C oncilio Ecum ênico. “Deus é minha
testemunha”, disse o piedoso príncipe, “que eu não sou o autor desta confusão.
Sua providência discernirá e punirá o culpado. Voltem para suas províncias, e
possam suas virtudes privadas reparar o erro e escândalo deste encontro”.
“Os abades Dalm ácio e Eutico tinham devotado seu zelo à causa de Cirilo,
o adorador de Maria, e à unidade de Cristo. Desde o primeiro momento de sua
vida monástica eles nunca tinham se misturado com o mundo ou pisado no chão
profano da cidade. Mas neste terrível momento de perigo para a Igreja, seus votos
foram suplantados por um mais sublime e indispensável dever. A frente de uma
ordem de eremitas e monges, carregando archotes em suas mãos e cantando
hinos à mãe de Deus, eles foram de seus mosteiros ao palácio do imperador”.5
Com o podemos notar, não apenas questões teológicas, mas questões políti­
cas, e porque não dizer, estratégias políticas, foram aplicadas neste C oncilio.
Nestor não tinha o propósito de negar a divindade de Cristo, mas apenas de refrear
uma possível divinização de Maria. Todavia, era difícil confirmar a natureza de
“Deus” ao Filho e ao mesmo tempo negar o título de “mãe de Deus” a Maria,
embora esta seja a verdade. Assim, Nestor foi condenado como herege e a Igreja
somente perdeu com isto, pois este fato fomentou ainda mais a mariolatria.

Eutiquianismo ou monofisismo
C om o uma reação contra Nestor, muitos assumiram uma posição comple-

^ Traduzido de D ecline and Fali ofR om an Empire, Edward Gibbon, Encyclopaedia Britan-
nica, INC. Vol II, pp 140-142.

136
tam ente oposta. Insistiam tanto na perfeita união das duas naturezas que acaba­
vam por não distingui-las de forma alguma.
Entre os que por este motivo acabaram distorcendo a natureza de Cristo,
estava Eutiques, monge de Constantinopla e amigo de Cirilo de Alexandria,
nascido em 378 d.C. Era muito estimado e influente no am biente eclesiástico
e tam bém no meio político, todavia, era pouco inteligente para a tarefa a que se
propusera.
Eutiques e seus seguidores assumem a posição de que a natureza humana
de Cristo foi absorvida pela divina, ou que as duas naturezas se fundem resul­
tando numa única natureza. Este conceito recebeu o nom e de monofisismo
(mono = um, único efysis = natureza). Sua declaração sumária foi considerada
herética:
“C onfesso que nosso Senhor teve duas naturezas antes da união (num
momento hipotético, em que de fato não existia se não a natureza divina, mas
de forma alguma ainda a natureza hum ana), mas depois da união, não reconhe­
ço senão uma só natureza”.
O C oncilio de Calcedônia, em 451 d.C ., condenaria todo conceito dife­
rente da crença na unidade da pessoa de Cristo e na dualidade das duas nature­
zas. Esta controvérsia produziría o famoso documento “Tomo de Leão” (Ver
apêndice).
Na verdade, se Eutiques e seus seguidores fossem um pouco diferentes em
suas afirmações, o resultado teria sido outro. Se tivesse apenas declarado que a
humanidade de Cristo havia sido divinizada, essas declarações não seriam tão
estranhas. Mas sua concepção na verdade era de que em Jesus havia um ser
com pletam ente híbrido, nem totalmente hom em , nem totalmente Deus, mas
uma mistura de ambos, em que a parte humana praticamente se tornava inexis­
tente, pois era absorvida na divina. Isto anulava Jesus com o hom em e logo com o
substituto da humanidade sobre a cruz. Segundo esta concepção não era um
homem “igual a nós em tudo” que estava perecendo no Calvário.
A controvérsia, com o as anteriores, envolvia questões mais amplas e mani­
festava a secular rivalidade entre as escolas de Antioquia e Alexandria. Foi con­
vocado um Sínodo em Constantinopla para condenar Eutiques. Depois, um
novo Sínodo foi convocado em Efeso, mas a questão só seria mesmo definitiva­
m ente resolvida no C oncilio de Calcedônia, iniciado em 08 de outubro de 451
d.C ., com a presença de bispos, dezoito oficiais de alto escalão do Estado, inclu­
sive o casal Imperial. No dia 25 de outubro foi terminada a declaração doutriná­
ria no intuito de resolver esta questão. A declaração assim dizia:
“Em concordância, portanto, com os santos pais, todos nós ensinamos una­

*37
nim em ente que devemos confessar que nosso Senhor Jesus Cristo é um só
m esm o F ilh o , igualm ente perfeito na Divindade e igualm ente perfeito na
humanidade, verdadeiramente Deus e verdadeiramente hom em , que consiste
de alma e corpo racionais, consubstanciai com o Pai na Divindade e igualmen­
te consubstanciai conosco na humanidade, semelhante a nós em todas as coi­
sas, à exceção do pecado, gerado pelo Pai antes de todos os séculos no tocante à
sua Divindade e assim tam bém nestes últimos dias por nós e por nossa salvação,
foi gerado pela Virgem Maria, theotokos, no que diz respeito à sua humanidade;
um só e o mesmo Cristo, Filho, Senhor, Unigênito, revelado em duas nature­
zas sem confusão, sem mudança e sem divisão, sem separação; a diferença de
naturezas não pode ser eliminada de modo algum por causa da união, mas as
propriedades de cada natureza são preservadas e reunidas em uma só pessoa
(prosopon) e uma só hypostasis, não separada ou dividida em duas pessoas, mas
um só e o mesmo Filho, Unigênito, Verbo divino, o Senhor Jesus Cristo, con­
forme os profetas do passado e o próprio Jesus Cristo nos ensinaram a respeito e
o credo dos nossos pais nos transmitiu”.

Monotelismo - a última controvérsia cristológica


Esta controvérsia com eça quando Sérgio, patriarca de Constantinopla,
querendo reconciliar aqueles que não ficaram satisfeito com a condenação de
Nestor, formulou uma cristologia baseada não nas naturezas humana e divina
de Cristo, mas na sua vontade. Sendo assim, afirmou que o Cristo, pela sua per­
feita união das duas naturezas, não possuía senão uma única vontade (monos-
thelem a = uma única vontade), daí, monotelismo.
Embora Sérgio conseguisse o apoio de Ciro de Fásis, bispo de Alexandria, o
bispo de Jerusalém, Sofrônio, julgou que esta era apenas uma forma disfarçada
de reafirmar o monofisismo condenado no C oncilio da Calcedônia. Na época,
o bispo de Roma, Honório, que já possuía autoridade para resolver certas ques­
tões, pediu que ambos deixassem de lado a disputa, alegando que apenas causa­
ria mais divisões dentro da Igreja e que se tratava apenas de uma forma diferente
de ver as coisas. Devido a esta posição e por ter feito declarações que pareciam
pender para o monotelismo, foi considerado mais tarde com o herege.
Flouve neste caso a intervenção do imperador Heráclito, que desejava apro­
veitar-se desta disputa para impor sua autoridade. D ecretou que todos deveriam
reconhecer em Jesus uma única vontade.
Os monotelistas foram, por fim, condenados no terceiro C oncilio de Cons­
tantinopla, inclusive o bispo de Roma, Honório. Depois de repetir as decisões

138
e afirmações promulgadas no C oncilio da Calcedônia sobre a pessoa de Cristo,
este C oncilio em Constantinopla afirmou:
“Pregamos tam bém duas vontades naturais Nele (Jesus), bem com o duas
operações naturais, sem divisão, sem mudança, sem separação, sem partilha,
sem confusão. Isto pregamos de acordo com a doutrina dos santos padres. Duas
vontades naturais, não contrárias, com o afirmam os ímpios hereges, mas sua
vontade humana seguindo sua vontade divina e onipotente, não lhe resistindo,
nem se lhe opondo, antes se sujeitando a ela. Pois a vontade da carne tinha de
ser dirigida e estar sujeita à divina, segundo o sapientíssimo Atanásio, porque
assim com o se diz que sua carne deve ser e é a carne de Deus Verbo, como de
fato pertence; ele mesmo diz: “...Desci do céu não para fazer a minha própria
vontade, mas a vontade do Pai que me enviou” (jo 6.38).
Portanto, assim com o a sua santíssima e imaculada carne, vivificada pela
alma, não foi destruída ao ser deificada, mas continuou no seu próprio estado e
esfera, assim tam bém a sua vontade humana não foi destruída ao ser deificada,
mas antes foi preservada, com o diz G regório, o teólogo; ‘Pois o querer que
entendemos ser um ato de vontade do Salvador não é contrário a Deus, mas é
inteiramente deificado’”.
O imperador reagiu negativamente a isto, mas acabou sendo deposto. E
com isto se encerravam as questões cristológicas que por cerca de seis séculos
haviam agitado o cristianismo. Outros desafios surgiríam com o passar dos anos,
mas as questões a respeito da pessoa de Cristo ficariam fixadas até os dias atuais.
Som ente no século XIX, o protestantismo germânico levantaria a questão do
Jesus histórico. Mas isto já em outros tempos bem diferentes.

x39
Capítulo 5

PELAGIANISMO
Uma controvérsia sobre a natureza humana e a graça divina

Quem foi Pelágio?


ouco se sabe a seu respeito. Nasceu na Grã-Bretanha por volta

P do ano de 350 d.C. e o que se conhece dele vem dos escritos


de seus opositores. Chegou em Roma em 405 d.C. e seguiu
para a África do Norte. Em seguida seguiu para a Palestina e escre­
veu dois livros sobre pecado, livre arbítrio e graça: “Da natureza e Do
livre arbítrio”. Agostinho e Jerônimo, os grandes representantes do
cristianismo na época, opuseram-se duramente aos seus conceitos.
C onseguiu ser inocentado do crim e de heresia no Sínodo de
Dióspolis na Palestina, no ano de 415 d.C. Neste Sínodo ele afir­
mou que a possibilidade de o homem viver sem com eter nenhum
pecado era teórica e não real, embora afirmasse antes disso que bas­
tava o homem desejar e ele viveria sem pecado. D e qualquer manei­
ra, ele foi mais tarde condenado como herege no C oncilio de Éfeso
em 431 d.C. Morreu por volta do ano de 423 d.C. sem se retratar
dos seus ensinos. C om o podemos perceber, quando sua doutrina
foi reprovada, ele já estava morto.

O que é o Pelagianismo?
O pelagianismo sustenta basicamente que todo homem nasce m oralm en­
te neutro, e que é capaz, por si mesmo, sem qualquer influência externa, de con-
verter-se a Deus e obedecer à sua vontade, quando assim o deseje. Uma das
grandes disputas durante a Reforma protestante versou sobre a natureza e a
extensão do pecado original. Ele afetou Adão somente, ou todo o gênero huma­
no? A vontade do homem decaído é ainda livre ou escravizada ao pecado? No
século V Pelágio havia debatido ferozmente com Agostinho sobre este assunto.

140
Agostinho m antinha que o pecado original de Adão foi herdado por toda a
humanidade e que7mesmo que o hom em caído retenha a habilidade para esco­
lher, ele está escravizado ao pecado e não pode não pecar. Por outro lado, Pelá-
gio insistia que a queda de Adão afetara apenas Adão, e que se Deus exige das
pessoas que vivam vidas perfeitas, Ele tam bém dá a habilidade moral para que
elas possam fazer assim. Ele reivindicou mais adiante que a graça divina era des­
necessária para salvação, embora facilitasse a obediência. Negava de forma defi­
nitiva a existência do pecado original. Assim ele escreveu:
“Eu disse de fato que um homem pode ficar isento do pecado e seguir os
mandamentos de Deus, se assim desejar; essa capacidade, pois, lhe foi outorga­
da por Deus. No entanto, não declarei que existe um hom em que nunca tenha
pecado desde a infância até a velhice, mas que, ao ser convertido de seus peca­
dos, pode perm anecer isento do pecado por seus próprios esforços e pela graça
de Deus, embora, mesmo assim, seja capaz de mudar no futuro”.
Agostinho dedicou muita energia para refutar os ensinos de Pelágio. Foi
neste combate que ele desenvolveu sua teologia sobre graça, livre arbítrio e sobe­
rania de Deus. Seus principais trabalhos nesta direção foram, nesta ordem: “Do
espírito e da letra”, “Da natureza e da G raça”, “Da Graça de Cristo e do Pecado
Original”, “Da Graça e do Livre Arbítrio”, “Da Predestinação dos Santos”.
Agostinho teve sucesso refutando Pelágio, mas o pelagianismo não morreu.
Várias formas de pelagianismo recorreram periodicamente através dos séculos.
Lutero escreveu um livro - “A Escravidão da Vontade” - em resposta a uma dia­
tribe (discussão filosófica) de Erasm o, em que o mesmo defendia conceitos
pelagianos. Lutero acreditava que Erasmo era “um inimigo de Deus e da reli­
gião Cristã” por causa do ensino dele sobre o pecado original. É bom notar que
o catolicismo medieval, sob a influência de Aquino, adotara um semi-pelagia-
nismo, mesmo que na Antigüidade houvesse rejeitado o pelagianismo puro.

141
Conclusão

Panorama Geral

E
mbora paralelamente a esta luta pela verdade tenha se desenvolvido prá­
ticas e ensinos antibíblicos, as doutrinas fundamentais do cristianismo
foram confirmadas e definidas nestes primeiros séculos de lutas contra
as heresias. O cristianismo, com o vemos, corria sério risco de desaparecer em
meio às filosofias e crenças do mundo de então.
M esmo que nossa mentalidade atual considere um pouco extremas algu­
mas atitudes tomadas durante esse tempo, não podemos ignorar que o zelo pela
doutrina correta ajudou a Igreja a escapar de certos erros. A m entalidade
moderna é superficial e altamente relativista e, portanto o pensamento dogmá­
tico lhe é um tanto estranho. Mas definir com exatidão nossas crenças nos livra
de inúmeros enganos. Senão, como diz o teólogo Jacques Doyon, “nossa fé não
terá nenhum conteúdo preciso e dela se poderá dizer o que quer que seja sem o
risco de se enganar. Se Deus se dignou falar-nos é justamente porque tinha algu­
ma coisa a dizer e é uma tarefa difícil, mas necessária, tentar compreendê-lo”.
A Reforma Protestante, ocorrida no século XVI, aceitou as decisões conci­
liares estudadas aqui, porque tinham fundamentação nas Escrituras, de acordo
com seu critério de Sola Scriptura (Som ente as Escrituras). Outros concílios
que vieram depois, já estavam tão mergulhados em um tipo de cristianismo
degenerado, que estabeleceu dogmas antibíblicos, com o na questão dos icono­
clastas que decidiram a favor das imagens ou o concilio que decidiu sobre a infa­
libilidade papal ou pela imaculada concepção de Maria.
D e modo geral, o balanço foi positivo. Mesmo que muitas destas heresias
tenham retornado no decorrer da história, já estavam devidamente refutadas.
Muitas delas estão vigentes nos dias de hoje, seja em seitas pseudocristãs, mas já
não exercem tamanha influência sobre a verdadeira Igreja de Cristo, especial­
mente se você, aluno do Curso de A pologética , procurar vacinar a Igreja acerca
dessas distorções. Não há dúvidas que o aluno que se propôs a desenvolver este
curso atrai para si uma grande responsabilidade diante da Igreja. Assim, como
nos dias remotos os apologistas bradaram em oposição às heresias, esta é tarefa

142
de todo aquele que entende a importância desse ministério e sente-se vocacio­
nado para desempenhá-lo.
Sobretudo, e finalmente, a lição permanece. Sem rejeitar novos enfoques
e novas formas de expressar a fé, a preocupação com a sã doutrina deve perma­
necer este elem ento solidificador da fé cristã. “Examinai tudo. Retende o bem ”,
disse o apóstolo Paulo (1 Ts 5.21).

H3
Apêndice 1

QUADRO RESUMIDO DOS


CONCÍLIOS TRINITÁRIOS E
CRISTOLOGICOS

LO C A L DATA ASSUNTO D E C R E T O S E D E F IN IÇ Õ E S

Nicéia 325 d.C Arianismo O Verbo é verdadeiro Filho de Deus, da


mesma substância do Pai ( hom oousios) e,
portanto, verdadeiramente Deus. De
finição de fé Nicena contra Ário. Consubs-
tancialidade do Filho e do Pai

Constantinopla 381 d.C Macedonianos O Espírito Santo é verdadeiro Deus como 0


Filho e 0 Pai

Éfeso 431 d.C Nestorianismo / Cristo, D eus-H om em , é um só sujeito


Pelagianismo (= pessoa): a união hipostática (de pessoas)
é substancial, não acidental, física, não mo­
ral. Foi condenado 0 pelagianismo

Caldedônia 451 d.C Eutiquianismo / As duas naturezas de Cristo estão unidas


Monofisismo (pessoalmente), mas não confusas nem
mudadas nem de qualquer forma alteradas.
As duas naturezas de Cristo se confinam em
uma só pessoa

Constantinopla 553 d.C Diversos Assuntos Confirma-se a condenação dos erros prece­
dentes (trinitários e cristológicos) afirman­
do os sentidos genéricos das definições con­
ciliares. Desarraigam-se erros derivados de
Orígenes.

144
Apêndice 2

AS HERESIAS RELACIONADAS COM O


ESPÍRITO SANTO

E
bom lembrar que em meio a todas estas controvérsias primitivas que aca­
bamos de estudar, não havia uma preocupação tão aguda em definir a
natureza do Espírito Santo. Não que não houvesse distorções neste
aspecto. Pelo contrário, pois era impossível distorcer a doutrina da Trindade,
sem distorcer a pessoa do Espírito.
Com o vimos, as posições heréticas variavam e o Espírito Santo foi identifi­
cado com o Pai e o Filho no modalismo, foi proclamado com o uma mera ima-
nação dos eons pelos gnósticos, ou mero poder ou força, tanto pelos ebionitas,
quanto pelos arianos. Sendo assim, sua identificação oscilava conforme as posi­
ções cristológicas, pois estava envolvida no próprio conceito da Divindade.
Quando as questões cristológicas e teológicas eram resolvidas e colocadas
dentro da ortodoxia, quase autom aticam ente o conceito do Espírito Santo
com o terceira pessoa da Trindade divina, era estabelecido. Poucas vezes a
questão pneumatológica se desviou desta atitude. Talvez a única que mereça
ser citada seja a de M acedônio. Seu conceito fugia não só da ortodoxia, como
tam bém das heresias usuais.
M acedônio, bispo de Constantinopla de 341 a 360 d.C ., ensinava que o
Espírito Santo era “ministro e servo” no mesmo nível que os anjos. Cria que o
Espírito Santo era uma pessoa subordinada ao Pai e ao Filho. Isto era uma nega­
ção da verdadeira divindade do Espírito Santo que seria tão m aléfica à doutrina
do Espírito Santo com o foram as idéias de Ario acerca de Cristo. O C oncilio
ecum ênico realizado na cidade de Constantinopla em 381 d.C ., tam bém con­
denou as idéias de M acedônio.
Quando o credo de Constantinopla, ou N iceno, foi recitado no terceiro
C oncilio de Toledo em 589 d.C., as palavras “e o Filho” (filioque ) foram acres­
centadas à declaração “que procede do Pai”, que se refere ao relacionamento
entre o Espírito Santo e o Pai e o Filho. As igrejas ocidentais desde então tem orto­
doxamente insistido na verdadeira divindade e na personalidade do Espírito
Santo com o co-igual, co-eterno e da mesma substância com o Pai e o Filho.

H5
Apêndice 3

O TOMO DE LEÃO

ocum ento escrito pelo Bispo de Leão (440-461 d.C.)

D I. Resposta ao desvario de Eutiques e sua incompreensão das Escrituras.


II. Eutiques, ignorando o que devia saber acerca da encarnação do
Verbo, não teve vontade de buscar a luz da inteligência no estudo diligente das
Escrituras. Devia ter adm itido, ao m enos, com respeitosa solicitude, a fé
comum e universal dos fiéis de todo o mundo que confessam crer E M D E U S
PAI T O D O -P O D E R O S O E E M JE S U S C R IS T O S E U Ú N IC O F IL H O ,
N O S S O S E N H O R , Q U E N A SC E U D O E S P ÍR IT O SA N TO E DA V IR ­
G E M MARIA. Esses três artigos derrotam as pretensões de qualquer herege.
Crem os que Deus é Pai onipotente, ao mesmo tempo Pai e onipotente. Segue-
se que vemos o Filho co-eterno ao Pai, em nada diferente do Pai, porque nas­
ceu Deus de Deus, O nipotente de Onipotente, co-eterno de co-eterno, não lhe
sendo posterior no tem po, nem inferior no poder, nem diferente na glória,
nem separado dele na essência. Este mesmo unigênito, Filho eterno do Pai
eterno, nasceu do Espírito Santo e da Virgem M aria. Seu nascim ento no
tempo, entretanto, nada tirou e nada acrescentou a seu nascimento eterno divi­
no, mas se integrou inteiramente para a restauração do hom em desviado, a fim
de poder vencer a morte e por própria virtude aniquilar o diabo, detentor do
poder da morte. Nós nunca poderiamos derrotar o autor da morte e do pecado,
se o Filho não tivesse tomado nossa natureza, fazendo-a sua, o Verbo que nem
morte, nem pecado podem deter, visto que Ele foi concebido pelo Espírito
Santo no ventre da Virgem Maria, cuja virgindade perm aneceu intacta tanto
em seu nascim ento como em sua concepção...6 Este nascim ento, unicam en-

^ Encontramos aqui indício da formação da doutrina Mariana. Realmente na concepção a vir­


gindade de Maria permaneceu intacta; pois José não teve relações com Maria durante a gesta­
ção. Mas no nascimento houve naturalmente a ruptura vaginal (ou será que houve um nasci­
mento através da um parto cesariano?). Isto em nada diminui ou atribui mácula, e durante o
nascimento deve ter havido algum sangramento, pois Maria buscou a purificação comum às
judias após o parto.

146
te maravilhoso e m aravilhosamente único, não deve ser entendido com o se
impedisse as propriedades distintivas da espécie [isto é, da humanidade] através
de novo modo de criação. Pois é verdade que o Espírito Santo deu fertilidade à
Virgem, embora a realidade do seu corpo fosse recebida do corpo dela.
III. Assim, intactas e reunidas em uma pessoa, as propriedades de ambas
as naturezas, a m ajestade assumiu a hum ildade, a força assumiu a fraqueza, a
eternidade assumiu a mortalidade e, para pagar a dívida da nossa condição, a
natureza inviolável uniu-se à natureza que pode sofrer. D esta m aneira, o
único idêntico M ediador entre Deus e os hom ens, o hom em Jesus Cristo,
pôde, com o convinha à nossa cura, por um lado, morrer e, por outro, não mor­
rer. O verdadeiro Deus nasceu, pois, em natureza cabal e perfeita de hom em
verdadeiro, com pleto nas suas propriedades e com pleto nas nossas [totus in
suis totus in nosíris]. Por “nossas”, entenda-se aquelas que o Criador no prin­
cípio formou em nós e que assumiu a fim de as restaurar; pois as propriedades
que para dentro de nós trouxe o Sedutor ou que, seduzidos, adquirimos por
própria conta, não existiram absolutam ente no Salvador. O fato de entrar em
com unhão com nossas fraquezas não o fez participar das nossas culpas; tomou
a forma de servo e não a m ácula do pecado, enobrecendo as qualidades hum a­
nas sem diminuir as divinas. Assim, “esvaziando-se a si m esm o”, o invisível se
tornou visível, o Criador e Senhor de todas as coisas se fez m ortal, não por
alguma deficiência de poder, mas por condescendência de piedade. Q uem ,
sem perder a forma divina, pôde criar o hom em , tam bém pôde fazer-se
hom em em forma de servo. Cada natureza guarda suas próprias característi­
cas sem qualquer diminuição de tal maneira que a forma de servo não reduz
a forma de Deus.
O diabo alardeava que, seduzido pela sua astúcia, o hom em estava priva­
do dos dons divinos, despojado do dom da im ortalidade, im placavelm ente
condenado à morte, tendo encontrado, neste com panheiro de pecado, certa
consolação de sua morte. Jactava-se tam bém de que, por causa da justiça que
exigia, Deus teve de mudar seu plano com respeito ao hom em , criado com
tanta distinção, pois precisou de nova dispensação para levar a cabo seus ocul­
tos desígnios; de que o Deus imutável, cuja vontade não pode ser privada de
sua própria misericórdia, só pôde realizar o plano original de seu amor por nós
mediante outro plano mais misterioso, para que este hom em , conduzido ao
pecado pela fraude maliciosa de Satã, não perecesse contrariando os propósi­
tos de Deus.
IV. Neste mundo fraco entrou o Filho de Deus. Desceu do seu trono celes­
tial, sem deixar a glória do Pai, e nasceu segundo uma nova ordem, mediante

H7
um novo modo de nascimento. Segundo uma nova ordem, visto que invisível
em sua própria natureza, se fez visível na nossa e, Ele que é incom preensível7,
se tornou com preendido; sendo anterior aos tem pos, com eçou a existir no
tem p o; S en h o r do universo, revestiu-se da form a de servo, ocu ltan d o a
im ensidade de sua E x ce lê n cia; D eus impassível, não se horrorizou de vir a
ser carne passível; im ortal, não se recusou às leis da m orte. Segundo um
novo modo de nascim ento, visto que a virgindade, d esconhecend o qual­
quer c o n c u p is c ê n c ia , co n c e d e u -lh e a m atéria de sua carn e . O S en h o r
tom ou, da m ãe, a natureza, não a cu lp a8. Jesus Cristo nasceu do ventre de
uma virgem, m ediante um nascim ento m aravilhoso, O fato de o corpo do
Senhor nascer portentosam ente não impediu a perfeita identidade de sua
carne com a nossa, pois E le que é verdadeiro D eus tam bém é verdadeiro
hom em . Nesta união não há m entira nem engano. Correspondem -se numa
unidade m útua [sunt ínvicem] a hum ildade do hom em e a excelsitude de
Deus. Por ser misericordioso, D eus [divindade] não se altera; por ser dignifi­
cado, o hom em [humanidade] não é absorvido. Cada natureza [a de D eus e
a de servo] realiza suas próprias funções em com unhão com a outra. O Verbo
faz o que é próprio ao Verbo; a carne faz o que é próprio à carne; um fulgura
com milagres; o outro submete-se às injúrias. Assim com o o Verbo não deixa
de morar na glória do Pai, assim a carne não deixa de pertencer ao gênero
hum ano... Portanto não cabe a ambas as naturezas dizerem: “O Pai é maior
do que eu ” ou “Eu e o Pai somos um ”.9 Pois, ainda que em Cristo nosso Se­
nhor haja só uma pessoa. Deus hom em , o princípio que com unica a ambas
as naturezas as ofensas é distinto do princípio que lhes toma com um a glória.

^ Não circunscrito especialmente.


^ Contrastando com a tendência Mariana, essa frase dá-nos excelente reflexão. Onde estavam
as doutrinas que ensinam que Maria era imaculada desde seu nascimento? Se fosse necessário
que Maria nascesse imaculada para ser mãe do prometido Messias, não deveria a mãe de Maria
também nascer sem pecado para gerar sem pecado? Nessa corrente chegaríamos à mãe Eva —
certamente a doutrina Mariana não tem lógica. Aqui, nesta frase, temos a confissão de que
Maria tinha culpa, embora não a tivesse transmitido a Cristo Jesus.
^ João 10.30; 14.28 — Contrastando com o quarto anátema de Cirilo.

148
Apêndice 4

ALEXANDRIA E ANTIOQULA - DUAS


ESCOLAS TEOLÓGICAS
Origens de Alexandria e Antioquia.

ão podemos ignorar a influência da geografia em relação às controvér­

N sias teológicas ocorridas no período primitivo. Levando em conta as


condições de locom oção da época, por melhor que fossem, possibilita­
va desenvolvimentos diferentes de pensamentos, em regiões diferentes.
No caso das controvérsias cristológicas, pelo menos duas escolas diferentes
estavam em conflito: Antioquia e Alexandria. Uma compreensão da localiza­
ção geográfica e das influências reinantes sobre ambas as cidades, pode nos aju­
dar muito no sentido de compreender as diferentes visões que se apresentaram
então.
Alexandria, no Egito, foi fundada por Alexandre o Grande quando da con­
quista da região, no século III antes de Cristo. Embora outras cidades tenham
sido fundadas na Asia com este nome, a de maior destaque e que subsistiu, foi
esta.
Durante o período da dinastia ptolemaica, os judeus foram morar ali em
grande quantidade. Logo ela foi se tornando um centro cultural de destaque,
com uma famosa biblioteca que até hoje tem sua perda lamentada pelos histo­
riadores. Além da biblioteca, tam bém um museu e uma universidade se desen­
volveram. C om o advento do cristianismo, Alexandria foi se tornando um cen­
tro de estudos cristãos de enorme importância, produzindo pensadores do porte
de Orígenes e Cirilo.
Antioquia, na Síria, nunca teve a opulência de Alexandria, mas tam bém se
tornou cedo um centro cultural e teológico. Foi fundada por Antíoco Epifânio,
um dos generais sucessores de Alexandre, que recebeu deste a região da Síria
com o domínio. Era a capital da região e, portanto, desfrutava de enorme pres­
tígio. Dentro da história do cristianismo, ela se reveste ainda de maior impor­
tância. C om o sabemos, foi ali que os seguidores do Messias foram primeira-

H9
m ente chamados de cristãos (At 11.26) e tam bém a igreja em Antioquia foi a
base missionária de onde partiu Paulo e Silas com o intuito de evangelizar os
gentios (At 15.22). Por todo o primeiro século da Era Cristã, Antioquia foi mais
importante que Alexandria.
Dentro desse contexto, é importante lembrar que Constantino transfor­
mou a cidade de Bizâncio, na Asia M enor, como a nova capital do Império e
para ali se mudou com toda a sua corte. Passou então a existir uma rivalidade
entre Alexandria e Antioquia, ambas desejando se aproximar de Constantino-
pla por ser a sede do poder, uma vez que o bispo desta cidade gozava de certa
influência sobre toda a Igreja. Sendo assim, podemos concluir que as rivalida­
des políticas precederam as rivalidades teológicas.

Distinções teológicas
N a Hermenêutica Bíblica
Além da questão política que envolvia as duas cidades, o fator teológico
deve ser levado em conta, principalm ente no que se refere à herm enêutica
bíblica, ou seja, a maneira de interpretar a Bíblia. Ambas tinham tradições teo­
lógicas diferentes.
Q uem definiu a herm enêutica alexandrina, foi um judeu por nome Filo,
que viveu no primeiro século. Ele desenvolveu o que ficou conhecido com o
método alegórico de interpretação, em que o sentido literal e histórico tinha
pouca importância. O que valia era seu sentido oculto. E le fez isso na tentativa
de harmonizar a lei mosaica com a filosofia grega e por isso interpretava muitas
passagens com um sentido alegórico que se ajustava aos ensinos de Platão.
Dentro do cristianismo, tanto Clem ente quanto Orígenes, seguiram este
método de interpretação. Com o resultado, tudo era visto com o alegoria, com o
representação de outra coisa, em detrimento do sentido literal e histórico.
No caso de Antioquia, deu-se o inverso. M esmo porque, Antioquia ficava
mais próxima da Palestina, onde os eventos dos evangelhos se sucederam e esta­
va mais ligada à tradição apostólica. Logo, sua tendência era ser mais histórica
e literal no seu entendimento das Escrituras.
Isto não significa que os teólogos de Antioquia recusavam alegorizar qual­
quer parte das Escrituras. Mesmo porque a própria Escritura alegoriza certas
passagens. Mas isto era feito de modo muito mais limitado e restrito. C om o
exemplo, temos Teodoro de Mpsuéstia, que em sua interpretação do livro de
Cantares, tratou-o com o um poema de amor, e não com o mera alegoria de
Cristo e a Igreja, como sempre foi costume, antes e depois dele.

150
Essas diferenças na forma de enxergar os textos bíblicos interferia na visão de
cada uma das escolas que se desenvolveram em torno de Alexandria e Antioquia.

N a doutrina da salvação
A escola alexandrina era bastante metafísica em sua abordagem da salvação.
Fora, sem dúvida, muito mais influenciada pelo platonismo. Isto os levava a um
pensam ento meditativo, transcendental em relação às coisas. Não podemos
esquecer que foi no Egito que se iniciou o movimento monástico com os anaco-
retas, que rejeitavam tudo que se relacionava à matéria para viverem sozinhos nos
desertos. Dentro de sua visão de salvação, eles colocavam a divinização dos salvos
como sendo de suma importância. O humano havia se tornado divino para que o
divino se tornasse humano.
A escola antioquena fora mais influenciada pelo judaísmo, devido a maior
aproximação com Jerusalém, tanto histórica quanto geograficamente. Tendia a
destacar a moralidade e a ética com o os fundamentos do cristianismo. Salvação
era vida transformada, procedimento santo, conduta exemplar. Não necessaria­
m ente um legalismo, mas uma visão de que a salvação de Deus se manifestava
não somente de forma transcendente, mas imanente na história humana.
Isto não significa que uma escola ignorasse total e completamente a ênfase
da outra em sua forma de ver a salvação. Pelo contrário, ambas estavam conscien­
tes de que a salvação era tanto metafísica quanto moral e ética. A questão era o des­
taque (ênfase) que cada escola dava e por isso acusava a outra de estar distorcen­
do o Evangelho.

N a Cristologia
Talvez mais do que outras áreas da teologia, a cristologia dessas escolas foi
profundamente afetada pelos motivos anteriormente referidos. Podemos dizer
que a visão cristológica de Antioquia era fortemente histórica, enquanto em
Alexandria ela era mais metafísica e especulativa.
Não se pode ignorar que Jesus viveu próximo à Antioquia e durante muitos
anos no início do cristianismo houve testemunhas oculares de sua vida ou dis­
cípulos das testemunhas oculares. Os lugares referidos nos Evangelhos e em
Atos podiam facilmente ser identificados pelos antioquenos. O Jesus que eles
conheciam muito bem era um Jesus histórico, um personagem de carne e osso
que fizera sua obra nas proximidades.
Isto conferia à cristologia antioquena um caráter bastante histórico. Jesus
era o Jesus de Nazaré. Hom em entre homens. C laro que não rejeitavam Sua
divindade, mas tam bém lhes era muito mais difícil rejeitar sua humanidade,
uma vez que esta estivera tão próxima deles. Jesus era Deus em toda a Sua ple­
nitude, mas tam bém era hom em em toda a Sua plenitude. C om certeza, sua
visão era muito mais ligada aos evangelhos sinópticos, do que ao Evangelho
de João.
No caso dos alexandrinos se dá o inverso. A distância dos eventos que envol­
viam a vida de Jesus tornava-o um belo elem ento para especulações filosóficas.
Neste ponto, seus aspectos históricos não eram tão interessantes quanto os
aspectos transcendentais. Era-lhes mais fácil trabalhar com o Logos joanino
semelhante ao conceito de Logos da filosofia grega, do que com o Messias judai­
co do Antigo Testamento. Não foi à toa que a maioria dos apócrifos nasceu nesta
região.
Mais uma vez, é bom frisar que não se trata de cristologias que se excluem
mutuamente, mas apenas que dão destaques diferentes. Claro que ambas criam
em um Jesus que era pré-existente e ao mesmo tempo transcendental. Mas as
tendências eram opostas e isto gerava entendim ento ao fato da natureza do
Filho de Deus.

152
Conclusão

ão podemos ignorar isto no estudo das controvérsias cristológicas. Mas

N seria bom frisar que longe destas diferenças serem fatores destrutivos
para o cristianismo, na verdade foram fatores que colaboraram mutua­
m ente para um desenvolvimento equilibrado da questão cristológica dentro da
história da Igreja.
Este fator pode muito bem servir para demonstrar aquilo que a filosofia
chama de dialética. Isto é, duas idéias contrárias se conflitam de uma tal forma,
que acabam chegando a uma síntese que resume o que há de correto em ambas.
Se a teologia fosse monopolizada por uma única escola, com certeza as distor­
ções seriam inúmeras. Foi isto que se deu com o catolicismo medieval. Na ânsia
pela uniformidade, suprimiu pensamentos que poderíam formar uma antítese
com outros e seguiu suas distorções teológicas sem ter quem se opusesse.
Esta dialética foi de enorme importância para o período e sua influência
perdura até os dias de hoje. Cabe-nos entender que nenhum conhecim ento,
nem mesmo o teológico, pode fugir da influência de seu contexto. Equilíbrio,
podemos dizer, foi o que resultou do encontro das duas escolas em pauta, mas
obviamente não podemos resumir tudo neste ponto. O todo é uma soma infin­
dável de múltiplos fatores. E , portanto, cabe a nós abordarmos tam bém estes,
caso queiramos fazer jus a um estudo sério das grandes heresias primitivas.
Por fim, não podemos ignorar nunca, que embora as ênfases não sejam
ruins em si mesmas, quando se vai ao extremo, há sem dúvida o perigo real de
abraçarmos a heresia, que na maioria das vezes, nada mais é do que uma “ver­
dade exagerada”.

*53
Questionário

1.Qual era a cultura dominante na região e na época do surgimento do cristia­


nismo?
2. Quais foram as heresias enfrentadas pelos apóstolos?
3. Quais os ensinos errados defendidos pelos jndaizantes?
4 . Quem eram os nicolaítas?
5 .0 que significa o termo ebionita e o que pensavam os ebionitas acerca de
Cristo?
6. Quais os principais conceitos do gnosticismo e quais os pais da Igreja que se
opuseram a essa corrente herética?
7. Q uem foi o fundador do maniqueísmo e qual grande teólogo permaneceu
muitos anos no maniqueísmo?
8 .0 que foi o montanismo e qual o pai apostólico que se uniu ao movimento
montanista?
9 .Qual a primeira controvérsia cristológica da história da Igreja?
10.Quem foi Paulo de Samósata?
1 l.Q u em foi Ario?
12.Q uem foi Atanásio e quantos foram os seus exílios?
13.Onde foi realizado o primeiro concilio geral?
1 4 .0 que foi a heresia chamada apolinarismo?
15. Em que ano se realizou o C oncilio de Efeso e quais foram os dois líderes
principais relacionados ao C oncilio de Efeso?
16. Quem foi Pelágio e que teólogo foi o grande opositor do pelagianismo?

*54
Referências bibliográficas

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Vida Nova, 1998.
O L SO N , Roger. História da Teologia Cristã. São Paulo: Editora Vida, 2001.
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Filosofia. São Paulo: Editora Candeia, 1997.
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mo. São Paulo:Editora Vida, 2000.
CH A N PLIM , R.N. O Novo Testamento interpretado versículo por versículo. São
Paulo: Editora Candeia, 1997.

*55
Metodologia Científica
de Pesquisa
SUMÁRIO

Introdução.................................................................................................................. 159
Capítulo 1 - P la n eja m en to ................................................................................ 161
Capítulo 2 - O PROGRAMA CIENTÍFICO DF, PESQUISA........................................ 165
Capítulo 3 - M e ias do pesq u isa d o r ............................................................... 169
Capítulo 4 - E squema organizacional de e s t u d o s .................................. 171
Capítulo 5 - U tilização de acervo p ú b l ic o ................................................ 174
Capítulo 6 - O pção de anteprojeto de pesquisa ........................................ 177
Capítulo 7 - L eitura e análise do texto - fo n t e .......................................... 182
Capítulo 8 - P rograma para elaboração df. monografia científica . 188
C o n clu são .................................................................................................................. 197
Referências bibliográficas
Tema de monografia do primeiro m ó d u lo ..................................................... 199
M odelo de página de r o s to .................................................................................. 201
Introdução

pós o contato estabelecido entre o estudioso da apologética e as duas dis­

A ciplinas estudadas neste primeiro módulo, reconhece-se a necessidade de


definir normas detalhadas sobre A M etodologia Científica de Pesquisas.
Em cada uma das matérias previamente estudadas, o aluno pôde apreciar
sem maiores dificuldades o conteúdo a ele preparado, todavia, esta praticidade
não encontrará espaço em níveis de estudo mais elevados, com o na elaboração
de monografias, por exemplo.
Este é exatamente o nosso propósito com esta disciplina, pois cada módulo
exigirá do aluno a apresentação de uma monografia, a qual deverá ser elaborada
de acordo com os parâmetros e regras expressos nesta matéria. Esta disciplina
funcionará como uma espécie de manual para auxiliar o aluno na composição
de sua monografia. Aliás, é bom frisar que a avaliação do trabalho produzido
será pautada pelas normas aqui expressas, portanto, esta abordagem m erece
especial atenção por parte do aluno.
Mas o que é metodologia científica de pesquisas?
O exercício da metodologia científica de pesquisas estará relacionado à pró­
pria organização pessoal e ao estilo de escrita do aluno. A matéria exigirá uma
redação de qualidade, o que, portanto, irá influenciá-lo em aspectos pessoais de
sua vida, com o uma maior disciplina na distribuição de seu tempo em prol desse
objetivo.
Outra previsão revelada pela experiência é a que se relaciona a todo o mate­
rial didático que venha a ser inserido no rol de fontes de pesquisas.
Não é comum às pessoas, com pouca intimidade junto a instituições aca­
dêmicas, possuírem preparação para pesquisa ou habilidade com ela, senão
com aquelas que preenchiam o currículo escolar do antigo primário e que se
limitavam a reunir uma série de dados muitas vezes desconexos, extraídos de
inúmeras fontes sem quaisquer citações, adaptações ou toque pessoal do aluno,
ocorrência que se multiplicou no advento on-line, quando ao aluno bastou um
click para supostamente concluir seu dever.
Adentramos, a partir daqui, num am biente mais exigente da apologética
cristã e que não se limitará mais às facilidades das compilações. Antes, demons­
trará a necessidade de se definir fontes de pesquisas, avaliar sua aplicação, exer­
cer adaptações, quando isso for pertinente ou necessário, limitar o número de

x59
citações idênticas ( ipsis litteris), além de outros elementos que concederão ao
aluno habilitação para um diálogo inter-religioso que possua qualidade.
O advento da informática, todavia, expôs um objeto indispensável para a
pesquisa acadêmica, uma vez que nesses sistemas se ampliam as possibilidades
de acumular dados das mais variadas disciplinas e seguimentos.
Assim sendo, a oposição por parte de alguns pesquisadores que classificam
como prejudicial a pesquisa on-line deve ser evitada, pois este método de pes­
quisa atual pode facilitar o trabalho sem necessariamente comprometê-lo.
Compreendidas estas observações, faz-se necessário salientar que esta dis­
ciplina necessitará de uma leitura vagarosa e atenta, lembrando que, daqui em
diante, o domínio da M etodologia C ientífica de Pesquisas determinará a quali­
dade de seus trabalhos e o progresso de seu aprendizado.

160
Capítulo 1

PLANEJAMENTO

este capítulo pretendemos abordar algumas questões relacio­

N nadas a uma pesquisa que obtenha resultados satisfatórios.


Assim, mesmo que a abordagem dos itens subseqüentes
venha parecer desnecessária, enfatizamos que não o é. Vejamos alguns
fatores importantes:

Ambientando-se
Uma pesquisa pode ser produzida por etapas, em lugares diversos, entre­
tanto, é incontestável o fato de que a concentração de todo o ferramental neces­
sário num mesmo am biente possibilita um resultado melhor.
Partindo dessa premissa, o aluno deve preparar em seu lar ou qualquer
outro recinto que lhe esteja disponível por todo o tempo da pesquisa, um
am biente que preencha suas necessidades para o trabalho.
Todo sucesso tem seu preço e, posto isso, preferir um local isolado no qual
o pesquisador não sofra com interferência externas, com o ruídos, ter boa ilumi­
nação, constitui-se num auxílio para o desenvolvimento favorável da pesquisa.
Neste ponto da preparação é que se identifica a necessidade de ter todo o
material (previamente reunido) junto à mesa de trabalho, com os apontamen­
tos que tiverem sido extraídos de fontes distantes ou emprestadas, e que se jul­
gue indispensável.

Temporalidade
Dentro do planejam ento organizacional da pesquisa, o tempo está locali­
zado em posição privilegiada, por estar diretamente ligado ao bom resultado.
E stab elecer um horário para desenvolver seu estudo é uma das regras que
garantirá o atendimento aos prazos estabelecidos pela escola.
Assuntos mais complexos devem merecer um horário mais amplo, pois a com­
preensão do que está sendo estudado auxiliará na realização do mais que ainda esti­
ver por ser produzido. O aluno deve procurar manter a disposição diante de uma
matéria desconhecida, mas que esteja “embutida” no contexto da pesquisa.

161
Lembre-se, compreensão exige tempo. Compreensão, absorção e transcri­
ção da matéria, respeitando as idéias e os objetivos do autor da fonte, exigem
muito mais. Logo, se não houver um planejam ento de horário para o exame do
material originário, observar-se-á deficiências no conjunto e resultados finais.

Temática
Este ponto tem singular abrangência. D ificilm ente uma matéria de cunho
apologético se resume apenas em si mesma.
Por exemplo: no planejam ento de uma pesquisa sobre a doutrina dos anjos,
bíblica e secular (com finalidades apologéticas), não há com o, no âmbito do
texto bíblico, prender-se apenas ao esclarecim ento dos fatos relacionados às
criaturas angelicais mencionadas em Hebreus 1.14 (espíritos mínístradores).
Destacamos este exemplo porque Cristo e Satanás também recebem este título,
mas em situações e com objetivos distintos.
Uma pesquisa que esteja centrada neste tema, não poderia omitir com en­
tários que esclarecessem cada uma dessas situações, definindo personagens e
guardando as devidas proporções, pois dependendo de a quem for submetida a
pesquisa, inúmeros conceitos m erecerão explanação. D aí a afirmação da inevi­
tável ligação entre temas.
Não existe qualquer assunto que se feche em si mesmo em teologia ou apo-
logética. Em qualquer ponto do contexto encontraremos ramificações e parale­
los com o mundo secular. Disso deriva a necessidade de uma cuidadosa defini­
ção do tema dentro da metodologia de pesquisa.

Aproveitamento
O aproveitam ento se manifestará conform e surgir o esclarecim ento na
m ente do estudante, mas não só isso. E no desenvolvimento e transcrição da
matéria que se efetivará a fixação do assunto, então, constatar-se-á a aquisição de
habilidade para tratar o tema de forma eloqtiente e, principalmente, didática.
Este padrão de aproveitamento reflete a aplicação de uma técnica correta
de planejam ento levando o aluno para algo além da pesquisa, proporcionando-
lhe a aquisição de conhecim ento e a capacidade de propagar seu aprendizado.
Num tal patamar de conhecim ento sobre o tema estudado, o aluno poderá
ainda tecer comentários sobre a obra pesquisada; formular críticas e avaliar con­
ceitos, provando uma qualidade de aproveitamento que excede as normais
expectativas de uma tarefa de pesquisa.

162
Sintaxe textual
Há uma série de análises indispensáveis quando examinamos a disciplina
pesquisada. Uma leitura atenciosa, feita com dedicação e conseqüente concen­
tração, provocará inevitáveis questionamentos.
A atenção ao que o texto (dissertação) traz em seu conteúdo colaborará com
a identificação e interpretação de pontos principais, de onde o aluno poderá
extrair sua introdução e, a partir dela, distribuir suas ramificações.
C onsiderando esses fatores, entende-se que cada fonte utilizada com o
meio de pesquisa apresentará suas peculiaridades e, nesse sentido, importantes
serão os questionamentos. Eles propiciarão uma maior interação do observador
com o texto, levando-o a esmiuçar todos os pontos que apresentarem dados des­
conhecidos até então, com os quais deverá empreender mais tempo, da mesma
forma que deverá dar atenção especial a tudo quanto não lhe for inteligível.
Quando o texto ou a própria matéria em si possuir pontos em comum com
o pesquisador, como um livro que fala a respeito de uma seita a qual já perten­
ceu, tanto mais fácil será interpretá-lo e desenvolvê-lo, mas tendo por positivo
que este material rememorará detalhes que enriquecerão a pesquisa, portanto,
não deve ser banalizado ou dispensado da análise.

Distinção da pesquisa apologética/teológica cristã


Na modalidade de M etodologia Científica de Pesquisa proposta pelo ICP,
algumas práticas devem ser consideradas como distintivas das que foram apresen­
tadas até aqui.
A investigação de temas relacionados à fé deve necessariam ente estar
ligada a crença de que o bom trabalho será provido por Deus (IC o 3.5), pessoa
pela qual o apologista advoga oralmente ou com o emprego da escrita.
A vista disso, destacamos a oração constante que irá requerer de Deus uma
capacitação para o desenvolvimento daquilo que se propuser realizar, juntamente
com o esclarecimento de tudo o que estiver obscuro, segundo a ação reveladora do
Espírito Santo.
Por se tratar de um exercício tipicamente religioso, é importante que tenha­
mos sempre à mão a Palavra de Deus, até porque, um escritor secular que esteja
sendo analisado, pode incorrer num erro de citação ou mesmo numa interpre­
tação fora de propósito, a qual, quando não devidamente censurada, induzirá o
aluno ao erro.
A importância destes cuidados tam bém nos fala sobre o emprego de um
dicionário bíblico adequado, isto é, que esteja de acordo com as melhores obras

163
teológicas, que seja abrangente e, se possível, que haja mais de uma obra. Esta
última recomendação se deve a necessidade de crítica aos variados conceitos que
envolvem a doutrina bíblica, diferentes de acordo com a interpretação de cada
corrente teológica.
Estas obras tam bém promoverão econom ia de tempo, quando a fonte nos
apresentar fatos, personagem ou coisas cujos nomes estejam em desuso ou não
façam parte de nossa cultura ou do nosso tempo.

164
Capítulo 2

O PROGRAMA CIEN TIFICO


DE PESQUISA

O
programa de pesquisa se compromete a atender as necessida­
des do aluno que atinge ou está obrigado a atingir um nível
mais elevado de conhecimento.
Esta necessidade deve ser atendida de forma a possibilitar ao interes­
sado a maior absorção possível da técnica, a qual, a partir daqui, será
apresentada em etapas.
Na primeira, evidentemente, estará em evidência a reunião de dados.
O aluno que pretende atender as especificações do primeiro capítulo
terá como compromisso primeiro do planejamento o acúmulo de
todas as informações que lhe parecerem importantes.
Num segundo momento, esta coleção de dados deverá passar pela
análise do pesquisador, que irá avaliar cuidadosamente cada obra,
para o que, deverá, antes de tudo, traçar critérios que o auxiliarão na
eleição do que for aproveitável e no descarte daquilo que acarretará
tempo improdutível ou culminará com acréscimo de redundâncias.
Na terceira etapa deste processo, já de posse de tudo o que apenas coo­
perará com a produção, inicia-se a organização dos dados. Neste
momento, o aluno irá considerar:

Cronologia do tema
Este exercício visa fornecer ao futuro leitor condições de se localizar no
tempo histórico da matéria. Isso é imprescindível para que a compreensão dos
dados históricos fique em harmonia com a redação.

Cronologia do material
A observação deste item é importante porque, quando se tratar de temas
atuais, dados antigos deverão ser dispostos de forma conveniente e apropriada,

t65
para que os dados recentes não sejam confundidos entre eles. Esse cuidado evi­
tará anacronismos que desmereceríam a pesquisa.

Conteúdo de cad a peça


Cada um dos recortes, textos, anotações e livros, após a avaliação, terão de
ser valorados quanto ao teor que apresentam. Matérias mais extensas devem ser
priorizadas na transcrição, pois, tomando por fato que o início da pesquisa conta
com um aluno cheio de disposição, é certo que se o material mais denso for dei­
xado como último a ser analisado, o desgaste natural comprometerá seu exame
e conseqüentem ente o resultado final da pesquisa.
Estes procedimentos condicionarão o início do trabalho, com a vantagem
de se ter empregado este primeiro período de maneira produtiva.
Programas de pesquisa científica são utilizados em todas as áreas da ciência
que se propõe a verificar fatos até então inexplicáveis ou que, com o emprego da
investigação se possa explicar.
Este primeiro conjunto de normas forma a ferramenta que examina o pro­
blema, identifica suas ramificações, propõe questionamentos e respostas, além
de considerar hipóteses.
A apologética cristã constitui-se num vasto campo de pesquisas que podem
ser desenvolvidas das mais variadas formas, não se prendendo somente a um
ambiente fechado, no qual se empregam todas as técnicas já catalogadas.
Outra maneira de se angariar informações está localizada na pesquisa de
campo. Isso se dá pela iniciativa de proceder à visitação a instituições religiosas
ou quaisquer outros locais nos quais se exerça atividade religiosa ou se acomode
literatura de uma determinada religião ou seita.
A visitação, como prática que exige ética e equilíbrio do pesquisador, quase
que se limitará apenas à observação da liturgia, dos procedimentos, da indu­
mentária etc.
Uma terceira modalidade se qualificaria com o experimental, isto é, efeti-
var-se-ia na promoção de um encontro inter-religioso em recinto adequado,
com um número mais limitado possível de participantes e que se destinaria tão
somente a troca de informações, uma vez que a causa desta iniciativa é a capta­
ção de material para pesquisa.
Aplicar o conceito de M etodologia C ientífica exige que o agente dessa pro­
dução empregue e ofereça elementos científicos aos seus leitores, como meio
de distinguir seu trabalho daqueles que os apologistas primários com um ente
apresentam, mas que se acham embasados exclusivamente em séries intermi­
náveis de refutações extraídas das páginas da Bíblia.

166
Neste caso, a dificuldade de alcançar eficácia surgirá cada vez que o leitor
se apresentar com o crítico cético do conteúdo bíblico, por não fazer dele caso
de verdade e arremessando-o no território místico.
Outra consideração relevante é que o apologista que adquire desenvoltura
tem de estar capacitado para referendar algumas áreas da ciência, dentre elas,
aquelas que estejam relacionadas à historicidade, ao misticismo, à religião, à
geografia, à arqueologia e todas as demais áreas que se relacionem de alguma
maneira com a matéria da fé.
A ciência, que tem por primeira e mais usual definição o conhecim ento,
logo se achará inserida na metodologia da pesquisa que se realize nos níveis aqui
estabelecidos, notadamente quando atendidos os pressupostos a ela ligados.
Com a adoção de uma vida dedicada à apologética, considerando este ramo
da intelectualidade, o aluno, agora realizando a pesquisa, estará familiarizado
com um cotidiano sistematizado, num exercício de trabalhos científicos que
serão devidamente identificados nas monografias e dissertações que produzir.
A identificação destas qualidades, porém, estará associada ao reconheci­
mento de alguns aspectos que devem ter espaço indispensável no texto. Nesse
sentido, a observação da criatividade desenvolvida durante a execução do traba­
lho é um dos elementos necessários.
A capacidade de selecionar pontos dentro de um mesmo tema, para com
isto definir termo, conceito, idéia, elem ento de classe, etc, alcança aqui um
estágio mais elevado, tam bém determinante da adequação de uma atividade
apologética cristã como depositária de princípios científicos.
Entretanto, a ciência em seu sentido estrito não pode ser encontrada nesta
obra ou ainda nas monografias desenvolvidas nos primeiros trabalhos universitá­
rios, já que nesses primeiros passos o que ocorre é uma introdução do aprendiz
na pesquisa científica na sua forma mais ampla; dilatada, cuja profundidade está
abaixo, por exemplo, de uma tese que se destine à graduação de doutorandos.
Apesar disso, todas as informações até aqui colecionadas, colaboram para a
exposição precisa de algumas modalidades de pesquisa que, a esta altura do
aprendizado, já poderão ser identificadas. Observe:

M odelo de pesquisa popular


Firma-se na prática da pesquisa com um , que se fundamenta em objetos
alcançados a partir do conhecim ento pessoal; experimental.

M odelo de pesquisa científico


Resulta da situação projetada neste estudo, tendo visado um método siste-
mático que tenha ido além do conhecim ento adquirido no modelo popular, por
ter propiciado a crítica, produto exclusivo da atividade científica.

M odelo de pesquisa filosófico


O modelo filosófico excede-se em relação à crítica, do molde científico, bus­
cando a com preensão da realidade, acreditando sempre que sua totalidade
esteja ainda por ser atingida, oferecendo sempre a idéia de que nada do que for
produzido numa investigação, esgotará o tema.

M odelo de pesquisa teológico


Este é o modelo que se destaca dentro do planejam ento do ICP, uma vez
que a apologética cristã é uma disciplina estritamente ligada à área teológica e
que deve reunir a observação crítica e a argumentação filosófica, que, embora
diferentes, ajudam a reunir um número mais expressivo de assuntos que enri­
quecerão o conteúdo, abrilhantando o trabalho.

168
Capítulo 3

METAS DO PESQUISADOR

irecionar uma motivação que introduza o pesquisador apro­

D priadamente para resultados positivos é a tarefa primordial


aconselhada a todos os que se comprometem seriamente com
a apologética cristã. Este posicionamento definirá o progresso de cada
um, dada a pessoalidade do aprendizado.
Todavia, este direcionamento ocorre naturalmente e o aluno irá iden-
tificá-lo tão logo amplie seus contatos com as atividades seminaristas,
tendo-se por certo que o ingresso espontâneo e consciente do aluno
num seminário já demonstra seu desejo de crescimento.
A própria organização/administração de instituições escolares de nível
médio, não exigem, obviamente, desenvolvimento de tarefas acadêmicas
dos alunos, o que limita o conhecimento referente a esta área científica de
pesquisas. Dessa forma, o progresso intelectual restará quase que exclusi­
vamente às instituições (seculares ou religiosas) de ensino superior.
Assim sendo, a verdade prática que servirá de modelo para compreen­
são preliminar do aluno quanto ao seu alvo, é o conjunto de atividades
intelectuais sistematizadas que atendam os objetivos do curso em
desenvolvimento.
Os alunos seminaristas têm a seu favor alguns princípios que coope­
ram com a realização das tarefas, quais sejam:

Técnica
Os elementos desse setor são sistemas, apoios e exercícios, cada um deles
oriundo da disciplina, sua fonte.
A técnica tam bém reúne os cuidados que se referem à organização de toda
a atividade intelectual. Aqui é importante a capacidade de empregar a análise
textual que redundará na interpretação e abrirá condições para a preparação de
materiais intermediários necessários, com o resumos, resenhas, relatórios e o
próprio planejam ento dos estudos.
Lógica
As ferramentas desse setor estão relacionadas a toda a atividade mental que
o aluno desenvolve no transcorrer do curso e na realização dos trabalhos a ele
atribuídos, portanto, o pensamento, o raciocínio e a crítica.
O emprego dessa ferramenta dependerá do estímulo que o aluno possuir
para realizar suas atribuições, considerando, é claro, as demais responsabilida­
des cotidianas do estudante de apologética.

C onceituai
São as informações e todos os demais recursos literários ou áudio visuais
empregados ao longo do curso.
E conceituai porque admite a análise de conceitos diversos, cada qual expla­
nado segundo a tese de cada autor e, por isso, com freqüência, constatar-se-á
posicionamentos diversos, por vezes discordantes. O recurso conceituai servirá
para anular estas distinções, revelando a crítica do aluno.
Capítulo 4

ESQUEMA ORGANIZACIONAL DE
ESTUDOS

C
omo já especificado, resultados positivos de um estudo cien­
tífico, são diretamente proporcionais ao empenho do estu­
dante.
Uma vez tendo o aprendiz alcançado incentivo para pôr em prática a
observação lógica, a análise e a crítica, o candidato terá de esforçar-se
na preparação de suas fontes e no planejamento de seu tempo.
Esta prática conduzirá o aluno a uma atividade que, assim como a pes­
quisa científica, muito provavelmente se lhe apresentará como nova.
E a montagem do arquivo literário pessoal, da biblioteca do aluno, seu
acervo pessoal de informações.
A coleção particular do aluno, todavia, deverá seguir alguns preceitos
que muitas vezes pode transcorrer de forma natural, ou, quando não,
pela inexperiência crítica, conduzir ao consumo desnecessário de
obras cujas capas o atraíram, mas o conteúdo delas o afastou. Daí, a
carência de alguns critérios:

Obras diversas especializadas


Nesta relação devem-se incluir as principais enciclopédias (Barsa , C on h e­
cer, Larousse, Britânica, etc), além de dicionários (escritos ou virtuais), sempre
considerando a abrangência e variação de conceitos de cada título.
Para o caso apologético em especial, o estudante deverá colecionar obras
que estejam intim am ente ligadas ao assunto, dentre as quais, pode-se conside­
rar Geísler, Josh M cdowell, D ave Hunt, a B íblia A pologética, a Série Apologé-
tica, além dos volum es consagrados da co leção de C h am p lin & Bentes, a
Pequena E n ciclop éd ia B íblica (O rlando S. Boyer) e o dicionário b íb lico de
Buckland.
Obras de caráter específico
C onform e é desenvolvido o trabalho científico, surge a necessidade de
obtenção de obras de caráter específico. A variedade de matérias teológicas e,
especialmente a apologética tornará obrigatória a aquisição de material especí­
fico que, muitas vezes, atenderá apenas ao esclarecim ento de um capítulo a ser
produzido ou apenas parte dele.
A partir da produtividade pessoal, o pesquisador se identificará com áreas
teológicas apologéticas com as quais descobrirá afinidade. Isso provocará o con-
seqüente interesse por adquirir títulos referentes ao seu interesse. Partindo dessa
realidade, o aluno passará a buscar materiais que abordem setores específicos os
quais darão personalidade a seu acervo e possibilitarão a identificação contex-
tual do estudante.
Considerando a necessidade da detenção de recursos para obtenção destas
matérias, o pesquisador deverá ainda considerar a idéia de fazer assinatura de ao
menos um periódico apologético cristão, visto que este produto trará sempre
informações atuais não constantes em enciclopédias e cujos autores/articulis-
tas, sempre variados, ampliarão o horizonte conceituai do estudante.
O acervo de um apologista dedicado deve contar ainda com a atualiza­
ção dos temas de sua preferência que não estiverem com preendidos na mídia
evangélica, mas que circulem na mídia secular, não importando tratar-se de
matéria específica ou apenas ligação com o tem a principal. Não há dúvidas
de que a avalanche de reportagens sobre o histórico atentado de 11 de setem ­
bro de 2001 contra as torres do Word Trade C enter arrastou multidões às livra­
rias, atrás de literatura m uçulm ana e corânica, num afã pelo conhecim ento
desta religião. D a mesma forma, a p ed ofilia sacerdotal rom ana, a presença de
personalidades com o D a la i L am a e R ael em território brasileiro, quando
docum entado na imprensa escrita, deve cham ar o pesquisador à necessidade
da aquisição de um exemplar do referido periódico. Portanto, o pesquisador
de religião deve tam bém estar sem pre atento às pu blicaçõ es que a mídia
secular proporciona em relação ao seu tema de estudos.
A mídia televisiva ainda proporciona qualidade de material em imagem.
Programas especializados na investigação religiosa, científica, arqueológica e
afins, exibem documentários que enriquecerão sobremaneira o acervo.
Outro meio de acréscimo informativo fértil pode ser adquirido em congres­
sos, seminários e palestras. Este material absorvido pelo aluno pela aprovação
ou ainda que rejeitado, preencherá capítulos obrigatórios em uma monografia
que tenha por objetivo discutir a importância das declarações do palestrante.

172
Dicas para desenvolver uma pesquisa científica

1 ° passo
Seleção do tempo disponível para cada dia, considerando ainda a disponi­
bilidade do local que será utilizado para o estudo, etapa dispensável quando o
pesquisador possuir local próprio.

2 o passo
Caso um mesmo trabalho solicitado envolver mais de uma disciplina, bom
será ao aluno distribuir o horário já classificado com o livre numa proporção
equivalente para cada grupo temático, incluindo exame, seleção, transcrição e
redação final.

3 o passo
O bom andamento e o resultado final do trabalho está relacionado à matu­
ridade do aluno quanto à responsabilidade com seus afazeres e, assim, o tempo
selecionado deverá ser preenchido de forma dedicada, com o máximo de apro­
veitamento, sob pena de prejuízo do resultado final.

4 o passo
Nesta etapa bastará ao aluno aplicar os preceitos enumerados no capítulo
2, sobre o programa científico de pesquisa.

173
Capítulo 5

UTILIZAÇÃO DE ACERVO PÚBLICO

D
ificilmente um estudante de qualquer disciplina conseguirá
reunir numa biblioteca pessoal todos os títulos que possam
estar relacionados à sua área de atuação ou estudos. Isso
implica em que, por vezes, o pesquisador terá de recorrer a acervos
mais volumosos e variados, como é o caso das bibliotecas públicas
(para os municípios que as possuem).
Muitos dos simpatizantes da apologética que se iniciam na pesquisa
literária, não estão habituados a estes ambientes e precisam adquirir
noções sobre a postura a ser adotada nessas repartições de uso público.
Este recurso também encontra paralelo nos seminários teológicos,
entretanto, ao aluno que não faz parte do curso, estará previsto impe­
dimento para utilização dessa instituição.
Alguns tipos de organização bibliotecária descritos a seguir poderão
ajudar o estudante para que proceda uma busca rápida, a qual deve
estar prevista no plano de organização da pesquisa, como as que
seguem:

Classificação de títulos
G en ericam en te, as bibliotecas empregam o sistema de catalogação de
livros conhecido como decim al. Esse sistema é semelhante a um índice literá­
rio, visto que cada assunto referente ao conteúdo recebe um número que se sub­
divide para identificar cada etapa intermediária da matéria. Exemplo:

Classificação Assunto
0 0 0 ................................. Gerais
1 0 0 ........................... Idiomas/Filologia
2 0 0 ........................................Arte
3 0 0 .....................................História
4 0 0 .................................. Literatura

*74
5 0 0 ................................ Tecnologia
6 0 0 .................................. Geografia
7 0 0 .................................. Biografias
800 ....................................Religião
9 0 0 ....................................Filosofia

Há outro sistema, conhecido com o Cutter, que evita a m ultiplicação de


volumes que possam possuir o mesmo número de catalogação. Embora seja um
pouco mais complexo, elimina quase que totalmente a possibilidade de uma
com binação que favoreça a ocorrência de pares.
Ele emprega a primeira letra do nome do autor seguida de um número, que
formará o código de com binação entre este núm ero e as letras do nom e do
autor. Na falta de m enção da autoria, este número estará relacionado ao título
da obra.
Quanto às categorias, a prática de catalogação tem reconhecido três, con­
forme a disponibilidade de acesso que é oferecida aos associados consultantes,
subdivididas da seguinte maneira:

Referência
Dada a importância, raridade, antiguidade ou valor dos volumes enquadra­
dos nesta classe, não são disponíveis para a retirada da biblioteca. Estão identi­
ficadas com a sigla “R E F ” acompanhada do respectivo número de catalogação.
Nesta classe encontramos livros exclusivos para consulta (não indicados para
leitura cadencial e sistem ática), com o por exem plo: dicionários, anuários,
comentários e enciclopédias.

Reserva
São obras de valor específico e que se prestam a atender pesquisadores espe­
cíficos. Permanecem nessa condição por um determinado período de tempo,
tendo sua solicitação, muitas vezes, vinculada a professores de diversas discipli­
nas que as utilizam para trabalhos especiais.

Circulação
Obedecendo ao regimento interno imposto pela administração da biblio­
teca, estes livros (a maioria do acervo) estão a disposição dos que preenchem os
requisitos estabelecidos para sua retirada.

l 75
Catálogo
O catálogo de uma biblioteca é o ambiente de boas vindas do pesquisador.
Nele, todas as obras que se desejam encontrar se acham alistadas, e não só os
volumes literários, mas, ainda, os docum entos, recortes, revistas e todos os
papéis que se constituam em partículas do acervo.
As divisões de material mais comuns adotadas pelos funcionários empregam
três fontes de referência: busca pelo autor, pelo título ou pelo assunto, cada um
deles disponível para uma rápida localização pelo aluno, já que cada um deles,
neste caso, possui pelo menos três fichas de cadastramento. Caso este arquivo
seja informatizado, digita-se uma destas três “palavras-chave” para busca em ter­
minal de computador.
Uma catalogação das mais completas, a priori, costuma incluir:

a) Nome do autor, iniciado pelo sobrenome;


b ) Número de catalogação (endereço no acervo);
c) Título;
d) Edição;
e) Tradutor (caso haja);
f) Local de publicação;
g) Editora;
h ) Data da publicação;
i) Número de páginas;
j) Classificação de obras ilustradas;
k) Título original;
l) Indicação de obras afins e arquivos semelhantes.

Os documentos esparsos e os periódicos, com o observado acima, ocupam


arquivos específicos dentro da biblioteca, contendo recortes de matérias de
importância social, religiosa, política ou de quaisquer outras áreas para as quais
se reserve espaço neste acervo. O aluno, nas bibliotecas que disponham de
m aquinário virtual e/ou eletrônico (computadores, impressoras, scanners e
copiadoras), não precisará se preocupar com cópias manuscritas desses recortes
e demais documentos, posta a praticidade da informática na duplicação de tudo
o que o estudante julgar necessário.
Capítulo 6

OPÇÃO DE ANTEPROJETO
DE PESQUISA

este capítulo, começaremos a planejar o roteiro para monta­

N gem da pesquisa propriamente dita. Esse planejamento é


importante e introduzirá no aluno valores estéticos e harmo­
niosos quanto aos trabalhos produzidos posteriormente. Esse capítulo
merece atenção especial porque o aluno deverá seguir estas normas
para a apresentação de sua monografia ao ICP. Vejamos:

Roteiro
A relação exposta a seguir terá por propósito aproximar o trabalho de um
aluno inexperiente quanto a essa modalidade de produção, daqueles que já se
encontram consagrados nas prateleiras das grandes livrarias, considerando que
o objetivo de qualquer aspirante de qualquer área, deve ser o de inovar ou até
superar o que já se acha disponível no mercado literário de pesquisas.

C apa
Assim com o ocorre com a própria redação, o projeto que formará todo o tra­
balho com o constituído num mesmo conjunto, terá seu ponto de partida. Neste
caso, a capa.
Esta etapa do trabalho não pode ser desprezada pelo autor, haja vista o fato
de que, na maioria das vezes, ela é a última parte do trabalho com a qual o estu­
dante se preocupa e, por isso, quando de sua elaboração, o aluno já foi alcan­
çado pelo desgaste combinado com a ansiedade da entrega, o que prejudicará
a apresentação, caso a capa não tenha recebido o mesmo zelo empregado na
redação.
Um sorriso amarelo ou danificado por toda sorte de enfermidades dentárias
causa péssima impressão. Por isso dizer-se que o sorriso é o "cartão de visita” do
indivíduo. Uma capa mal elaborada causará o mesmo efeito, não adiantando

177
tentar afirmar-se na máxima que diz: “Não se conh ece um livro pela capa”.
Muitos professores aplicam referência à apresentação do trabalho requerido do
aluno, portanto, capa ruim, apresentação ruim e conseqüente referência ruim.
Uma capa de qualidade pode ser produzida de várias maneiras.

Dicas para a elaboração da capa da pesquisa


Não escreva à caneta (esferográfica ou hidrográfica) na capa. Veja como
proceder nos seguintes modelos de capa:

C ap a impressa
O uso de impressora é a forma mais convencional. Não é necessário se lim i­
tar aos dizeres, antes, pode haver a inclusão de gravuras, ilustrações ou qualquer
outra representação por imagem que tenha ligação com o tema tratado no tra­
balho, que abrilhantará o conju nto. A capa tam bém exigirá papel distinto
daquele utilizado no conteúdo. Por exemplo: miolo em sulfite 24, capa em sul­
fite 40; miolo em sulfite 40, capa em cartolina. O miolo não deve ser produzido
em papel mais denso que sulfite 40, posta a inviabilidade do custo/benefício.

C ap a Off-Set
Esta modalidade não é com um ente usada dado o alto custo da operação,
mas emprega-se sempre que se tratar de trabalhos em nível de pós-graduação e
monografias mais extensas, proporcionando à obra qualidade semelhante à de
livros editados em série. Para esta opção, o estudante terá antes, de produzir o
layout (arte-final), que será entregue no ato do pedido na gráfica, por ser ele­
mento essencial ao orçamento e que, via de regra, é elaborado por profissional
arte-finalista.

C ap a Dura
D e custo intermediário, a capa dura pode ser produzida em qualquer enca-
dernadora especializada. Também acomoda recursos de identificação no sis­
tema hot-stamp, que incorpora dizeres, faixas, etc. Geralm ente as encadernado-
ras ainda oferecem variedade de cores para com posição da capa dura,
procedimento que ainda incorpora a encadernação do miolo, que deve ser ade­
quada a este modelo de acabamento.
O BSERVAÇÃ O: para satisfazer as exigências do nosso curso, bastará obser­
var o modelo de capa impressa.
Página de rosto (ver apêndice)
E um acréscimo interessante que coopera com a qualidade do trabalho e
deve ser posicionada após a capa. Nela, o aluno instalará uma segunda chamada
para o conteúdo, que em algumas obras, aparece apenas repetindo o enunciado
da capa. No quesito encadernação, esta página de rosto colabora com o proteção
contra danos nas primeiras páginas que já tragam o texto principal.
OBSERVA ÇÃ O : a observância deste item é exigida pelo nosso curso.

Dedicatória
A dedicatória, quando se achar conveniente sua inscrição, deverá ser sóbria,
polida e disposta de forma distinta, a fim de que nela se reconheça o agradeci­
mento pessoal do autor àqueles que de alguma maneira participaram de sua pro­
dução. Dedicatória é distinta de introdução, por isso, deve ser breve e objetiva.
OBSERVAÇÃ O : a dedicatória ficará a critério do aluno.

Página de agradecimentos
Sem elhante à d ed icatória, esta página poderá ser suprimida quando o
aluno empregar habilidade para, na mesma página daquela, expressar os agra­
decimentos que julgar necessários.
OBSERVA ÇÁ O : essa página ficará a critério do aluno.

Sumário/índice
Trata-se de elem ento de primeira grandeza no planejam ento da obra.
Qnase nunca é traçado antes da redação estar concluída, pois é extremamente
comum, no desenrolar da produção do texto, que acréscimos e ampliações não
planejadas no material, sejam encaixadas na matéria previamente selecionada.
O índice/sum ário é o mapa do trabalho e tam bém o primeiro ponto de
impacto quando se tratar de obra que passará pelo julgamento do professor ou
editor aos quais se submeta a redação. Deve necessariamente conter:

a) M enção de prefácio (com citação da página)


b) M enção da introdução (com citação da página)
c) Especificação dos capítulos/partes
d) Tópico (com citação de página inicial)
e) Sub-tópicos (com citação de página inicial)
f) Apêndices (quando houver, com citação de página inicial)
g) Bibliografia (com citação da página)

l79
Todos esses itens devem ser dispostos de forma descomplicada e bem legí­
vel. Se a capa é o “cartão de visitas”, o índice é o “convite” da obra literária, pois
todo bom e assíduo leitor tem por hábito consultá-lo antes de ingressar no texto
propriamente dito. Planeje-o bem!
O BSERVAÇÃ O: a observância deste item é exigida pelo nosso curso.

índice de abreviaturas, siglas e símbolos


Imprescindível. Para uma maior praticidade na digitação e posterior com ­
preensão do texto, o aluno terá a sua disposição o método de abreviaturas, o qual
propicia uma considerável economia no tempo da realização do trabalho. Não
seria conveniente, todavia, empregar este método sem discriminá-lo nas pági­
nas introdutórias, visto que muitos não têm intim idade com esta prática e,
ainda, por ser necessário considerar a hipótese de a matéria determinar a abre­
viação de termos incomuns; típicos apenas àquele assunto e que são propostas
pelo próprio autor.
OBSERVA ÇÃ O : é provável que a elaboração das monografias solicitadas
no curso não constem com o emprego de tantas abreviaturas ou siglas. Todavia,
caso haja tais elem entos e o aluno julgue didático, será válida a observância
deste item.

Glossário
Com o o ICP, neste volume, atenta para a tarefa apologética, logo, deve pre­
ver ser costum eiro, na análise das variadas práticas e culturas religiosas, o
emprego de expressões quase nunca usuais no meio cristão.
Estas palavras deverão estar compreendidas numa relação que as defina de
forma objetiva. A este apêndice chamamos glossário (vocabulário) e deverá ser
posicionado ao final da redação do capítulo ou da obra com o um todo.
Este recurso tam bém poderá ser substituído pelas notas de r o d a p é - final de
página ou final de documento.

A introdução
O texto introdutório deverá estar munido de alguns aspectos. Conterá uma
abordagem panorâmica do conteúdo do livro/trabalho, mas não se omitindo o
cuidado com a elaboração de uma lógica que considere os leitores finais, ao
qual a redação está dirigida. Esse cuidado evitará uma rejeição antecipada pela
não compreensão de uma introdução por demais técnica e complexa, ou em
decorrência de um texto considerado embaraçado para aquilo a que se propõe.

180
O volume de uma introdução está diretamente ligado ao volume integral
da obra ou à complexidade dela. Via de regra, introduções breves servem para
obras de conteúdo reduzido, enquanto que introduções prolixas (longas) se
reservam a trabalhos com redação, objetivo e leitor-alvo mais experimentados.
E prudente tam bém que esta introdução possua tam bém sua justificativa,
isto é, o que motivou o aluno/escritor a produzir aquele volume, sabendo que
este intervalo (narrado preferencialmente em terceira pessoa) poderá acumular
um ou mais depoimentos de experiências vividas pelo escritor e que desperta­
ram seu interesse pelo tema.
Outro fator a ser acrescentado é a finalidade, ou seja, a definição em suas
linhas da meta primordial do texto; para o quê ou a quem ele está direcionado.

181
Capítulo 7

LEITURA E ANALISE DO
TEXTO -FO N TE

C
omo vimos no capítulo 2, no Programa Científico de Pesqui­
sas, a análise e interpretação dos textos, que configuram a lei­
tura analítica, funcionarão como fundamentos para uma boa
elaboração de resumos, resenhas, relatórios, planos de estudo ou uni­
camente para o estudo pessoal.
Com estas atribuições, este capítulo adquire grande importância no
conjunto metodológico não só da apologética, mas de todo o trabalho
acadêmico que o aluno venha a desenvolver no decorrer de sua vida
estudantil, além, é claro, do benefício intelectual que decorre dessa
prática.
A teoria da comunicação é um tema comumente abordado nas insti­
tuições de ensino superior e faz referência à objetividade da comuni­
cação afetando tanto o autor como o leitor final, os quais, na atmosfera
literária, são classificados como emissor e receptor. E necessário que
tanto um quanto outro, considerem este fator no momento da com­
preensão do texto ou de sua produção. O quadro abaixo expõe de
forma prática esta relação:

EM ISSOR/ESCRITO R MENSAGEM R ECEPTO R /LE1TO R


Pensar Texto Decodificar
C onhecer Pensar
Codificar Assimilar

A textualização não se resume meramente à escrita (digitação), antes, aco


moda uma vasta variedade de modelos. A princípio, identificamos dois tipos bási
cos de texto:

182
Texto literário
E aquele que se destina ao entretenimento e informação. Nele se insere a
intuição e a imaginação;

Textos teóricos
Empregado em materiais científicos, filosóficos, de estudos ou pesquisas,
para os quais se adota o raciocínio com o meio abrangente que possibilita a cone­
xão lógica de todos os dados colecionados.
Para que a idéia destacada acima possa surtir seus efeitos e tornar o resul­
tado final virtuoso, é importante analisar os vários níveis de leitura, para que a
cada produção a tem poralidade não seja alvo da desorganização na seleção de
material.
Aqui definimos três níveis de leitura que ajudarão o aluno a definir qual dos
níveis deverá empregar para extrair apenas o que necessita da fonte, ou o
máximo dela, de acordo com o objetivo traçado durante o planejam ento. Veja­
mos:

Leitura elementar
Por ser elementar, isto é, simples, primária, é a que se emprega nos primeiros
estágios da aprendizagem. Nela não se vislumbra qualquer pretensão do livro para
com o leitor ou vice-versa. Constitui-se numa modalidade de leitura despreocu­
pada quanto à interpretação do texto analisado, todavia, atentando o leitor para a
meta da leitura. A leitura que se realiza com base neste nível é superficial, mesmo
que ela tome por alvo um conjunto escrito complexo. Para este caso, esta primeira
leitura elementar favorecerá a compreensão quando de uma segunda tomada de
análise, então, mais profunda.

Leitura de inspeção
É chamada assim porque inspeciona o texto, ou seja, aprecia-o com crité­
rios, vistoria-o. Não se inicia meramente pela introdução e subseqüentemente
ao texto principal, mas, antes, propõe um exame que pode se iniciar na própria
ficha catalográfica (particular ou de acervo público), das orelhas (extremidade
das capas dobrada para dentro), do sumário, prefácio, ficha do autor, etc, além
de uma leitura sucinta de cada capítulo.

Leitura Analítica
A leitura analítica vai além das duas modalidades já analisadas, pois requer

l8 3
do aluno uma observação interpretativa, não m eram ente observadora, e que
deve transcorrer neste propósito do princípio ao fim da obra. E este modelo de
leitura que arremessa o aluno na desenvoltura intelectual, por cobrar-lhe a apli­
cação da crítica com o meio de questionar o posicionamento do autor sempre
que a questão for nova ou parecer contraditória em relação ao modelo comum
costumeiramente aceito pelos estudiosos da área. Para o nosso caso, o da apolo-
gética cristã.
Nesta última classe de leitura, a norma científica propõe uma série de seis
etapas subseqüentes que devem ser atendidas em sua ordem original, com o
contribuinte de sua boa aplicação.
Concluídas as etapas, restará, ao final, a capacitação do aluno para uma boa
compreensão do texto, além da base para produção de resumos e resenhas. E
finalidade, ainda, dessa parte do capítulo, conceder recursos e diretrizes meto­
dológicos que aprimorem o exame textual quando este for de natureza teórica,
para isto, o estudante necessitará possuir noções gerais relacionadas à área na
qual o texto está introduzido.

I a Etapa - seleção textual da fonte


Localizada na primeira etapa, para que o aluno tenha por primeiro a impor­
tância metodológica desse exercício. A seleção se fará visando o tempo e as prio­
ridades que o trabalho requer, para que a análise de cada texto seja mais bem
aproveitada.

2 a Etapa - exame textual


O exame textual é o primeiro contato efetivo com o texto, quando já se intui
alguma compreensão do mesmo. Embora nesta etapa o aluno deva se valer de
uma leitura rápida, ela não deve, contudo, suprimir a atenção. Para esta etapa
inclui-se uma atividade paralela com o apoio do aluno. Nela o estudante desco­
brirá inform ações sobre a autoria da obra, significado de expressões pouco
usuais, historicidade abordada no texto, m enção de outros autores e conceitos
específicos.
Ao final, produzirá um esquema textual no qual se deterá com brevidade
sobre a introdução, desenvolvimento e conclusão do texto pelo autor.

3 a Etapa - exame temático


O exame temático deve estar adequado ao mais das normas de leitura pela
sua importância dentro do aproveitamento. Este exame poderá ser empregado

184
para produção de resumo de qualquer texto, além da matéria de pesquisa apo-
logética. O aluno que exercitar esta forma de exame deverá encontrar cinco
itens no conteúdo do texto:

Tema
O tema m erece um cuidado importante, já que a capa e o título, muitas
vezes, não estão adequados ao tema e, portanto, existe a obrigatoriedade da lei­
tura para busca dessa resposta.

Problema
“Problematizar” é uma expressão que se usa para chegar até o centro do “pro­
blema” que o autor quis abordar; qual foi a questão que ele quis solucionar, expli­
car ou se apenas apresentar um conceito. Logo, o aluno procederá ao exame do
texto buscando identificar qual o “problema” central que rege a obra. Este pro­
blema poderá estar vinculado à procura de uma teoria, a tese de uma teoria pré-
existente ou à formulação de uma tese diante de uma situação recente ou antiga.

Tese ou propósito principal


Este exercício tam bém é importante, visto que, definido o ponto, o leitor
poderá captar a idéia mais íntim a do escritor e, a partir dela, construir seu
resumo. Esta característica do autor pode aparecer tanto no comentário preli­
minar do problema, quanto no centro da tese proposta pelo escritor.

Assim ilação e explanação


No decorrer da criação do texto, é possível acom panhar o raciocínio do
escritor e, talvez, chegar à compreensão quanto ao desenvolvimento de seu con­
ceito, ou seja, com o ele formou aquela opinião.

Conceito secundário
É comum ocorrer na formulação da tese, que o autor acabe empregando,
com o atalho, comentários de exemplificação que são perfeitamente desneces­
sários. Quando o estudante estiver transcrevendo suas notas, essas concepções
secundárias não tomarão seu tempo nem ofuscarão o brilho do conjunto final.
É oportuno tam bém com entar que o acompanhamento fiel de um texto-fonte
coloca o aluno diante de uma pequena divisão entre a criação original e o plá­
gio (cópia). Dado isso, todas as citações devem ser criteriosamente m enciona­
das quando da transcrição para o trabalho definitivo, evitando que esse erro se
observe.

r8 5
4 a Etapa - exame e interpretação
Esta é a fase em que o autor do trabalho interpretará o autor da fonte para
que, a partir daí, possa delinear um posicionamento próprio, um conceito de
tudo o que leu.
Nesta fase, o estudante terá de ser capaz de captar o que sua fonte está
dizendo nas “entrelinhas”, questionando sempre o autor quanto aos pontos nos
quais perceber dificuldade. Esta leitura acurada e crítica tam bém é capaz de
fazer considerações acerca da qualidade textual da obra, qual a formação do
autor e, enfim, seu nível de conhecim ento factual.
O aluno desenvolverá cada vez mais este potencial para a crítica literária
apologética, se sua dedicação se voltar a uma área específica com a qual tenha
afinidade. Todavia, se faz importante que o estudante adote alguns critérios para
que o faça adequadamente. Vejamos quais são eles:

Filosofia e influências
Aquele que ingressa no ramo literário, seja para escrever ou meramente cri­
ticar, precisa efetivamente de ânimo para juntar conhecim entos que advenham
da leitura, para que o aluno possa reconhecer em si mesmo condições para tecer
comentários acerca de qualquer obra, visto que terá de analisar o autor e, às
vezes, até outras obras que o mesmo já tenha escrito.
Esta análise é realizada por capítulos, mas, ao mesmo tempo, à obra toda.
Noutra metodologia de análise, o autor que estiver em mãos, é criticado em
relação a obras afins redigidas por autores diversos. Para este último caso, obser­
varemos uma crítica quanto ao pensamento comum difundido sobre o tema.

Legitim ação e pressupostos


Com o forma de se identificar com o pensamento do autor durante a leitura,
o aluno deve, durante a pesquisa, focalizar os valores que justificam o pensa­
mento do autor, ou seja, porque ele se posiciona de determinada forma.

Similaridades
Nesta etapa, comparam-se as idéias do autor com as que são apresentadas
pelos demais expositores do tema. Esta prática possibilita a seleção de concei­
tos que porventura excedam, ou destoem daqueles que foram apresentados pelo
autor original.

Critério e avaliação da obra


A crítica sobre a obra deverá se ater apenas aos pontos dominados pelo

186
aluno e que estejam inseridos no texto principal. Os aspectos criticados pelo
estudante que efetivamente “leu” a obra irão habilitá-lo a criticar a originali­
dade, profundidade, im portância além da colaboração proporcionada pela
obra ao leitor final.
Esta análise pode ser concluída com um comentário pessoal do estudante,
cabendo a ele destacá-lo no trabalho definitivo, ou em suas anotações pessoais.
Perfeitamente enquadrada na necessidade da apologética cristã, essa apre­
ciação enxergará observações acerca de: erros ou acertos quanto a informações
prestadas, a seriedade do trabalho e das citações paralelas, as contradições, a
forma como o autor desenvolveu o assunto e as idéias apresentadas pelo escritor.

5 a Etapa - identificação do problema


Com um ente reconhecida em metodologia científica pelo nome técnico
de problem atização, esta etapa visa investigar e questionar os problemas que
condicionaram o autor à produção do texto.

6 a Etapa - síntese do texto


Uma vez absorvida toda a idéia apresentada pelo autor, em todas as suas
variações e im plicações, o aluno será capaz de produzir um com entário em
cujo teor se ache a concepção do escritor retratada no conteúdo do texto-fonte,
quando então, a forma original pesquisada é transformada para que adquira os
traços do aluno; sua personalidade agora descrita na redação.
Capítulo 8

PROGRAMA PARA ELABORAÇÃO DE


MONOGRAFIA CIENTÍFICA

monografia é uma modalidade de trabalho estudantil de cará­


ter científico; obra na qual o aluno relata, numa dissertação
edigida geralmente em terceira pessoa, os resultados de uma
investigação ou apenas de uma ponderação acerca de algum tema
específico, abordando o pensamento do autor de um livro ou qualquer
outra obra literária escrita, em contraste com outras verbalmente nar­
radas ou de arquivos virtuais.
As diretrizes traçadas a seguir não se limitarão a um roteiro para elabo­
ração apenas de monografias, mas ainda para os trabalhos didáticos
nos quais o estudante adquirirá a prática de expressar seus pensamen­
tos, não importando qual a área de abordagem.

Destacam-se seis pontos básicos.


I o - Uma monografia, para que seja inteligível, além de ter qualidade, deve
abordar apenas um assunto que funcione como tema central, sob pena de tor­
nar o trabalho desgastante e ininteligível.
2° - Ela não apresentará apenas os elementos colhidos na pesquisa. O estu­
dante fará constar na monografia todos os conceitos que formou a partir do
exame do material selecionado e que incorporou ao trabalho.
3o - O aluno deverá ter como prioritário que seu trabalho terá por objetivo
último o de transmitir na redação a mensagem pretendida no planejam ento;
com unicar o resultado final proporcionado pela pesquisa e qual a conclusão a
que chegou o autor/aluno.
4 o - Reiterando a advertência, deve-se ter em m ente tam bém que a m ono­
grafia não pode ser m eram ente uma infindável com pilação de idéias e con­
ceitos, deve se lim itar ao máximo à cópia de textos, a não ser que dela advenha
a apresentação de uma crítica, de uma com paração ou o resultado de uma
reflexão.

l8 8
5o - Obviam ente, espera-se do aluno a produção de um trabalho que ele
mesmo considere importante ao seu acervo pela qualidade e abrangência do
material. Um cozinheiro que não prova suas receitas, está sob suspeita.
6 o - A criatividade tam bém é elem ento de importância no conjunto da
obra. Nela o aluno exercitará seu potencial de criação redacional, de planeja­
mento e adaptação do tema. Essa criatividade refere-se ao talento do autor da
monografia em “m ontar” seu texto de tal forma que se faça compreensível e,
mais do que isso, convincente quanto à tese que defende. Uma monografia aca­
nhada e isenta de questionamentos importantes, principalm ente numa área
criteriosa com o a da apologética cristã, está fadada ao descarte.
A criação de uma monografia de qualidade deve seguir uma ordem de qua­
tro etapas, rigorosamente observadas para que, tam bém aqui, não se observe
prejuízo no resultado final.

I a Etapa - delimitação da temática


O tema de uma monografia deve estar bem definido na mente do aluno. Ele
deve ainda estar identificado com a afinidade de seu escritor, deve ser agradável.
Assim, o aluno deverá escolher um tema que apresente importância teórica
e prática, ou seja, que seja útil para o crescim ento intelectual tanto do transmis­
sor quanto do receptor.
Considerando que o aprendizado, em qualquer segmento, é progressivo, o
estudante tam bém precisará recon h ecer no tem a escolhido condições de
desenvolvê-lo.
Tão logo defina o tema de trabalho e o delimite, o pesquisador, com o tra­
tado nos primeiros capítulos, deverá reunir e qualificar todo o material que ser­
virá de fonte para pesquisa. Deve haver material suficiente e variado, deve tam ­
bém estar à disposição do aluno durante o tempo necessário para a conclusão
da monografia.

A monografia
A monografia não deve se resumir numa mera opinião do escritor quanto
ao tema abordado. Trata-se de conceito claro e direto.
Adquire o caráter de juízo, posto que o enunciado apresentará a opinião do
aluno, sempre apoiada em bases sólidas, não se formando em fontes cuja proce­
dência seja incerta, duvidosa ou m eram ente verbal, colhida oralm ente
mediante entrevista com suposto conhecedor da matéria, já que este procedi­
mento impedirá a devida citação da fonte.

189
A monografia, para que possa favorecer a constatação do aprendizado do
estudante, precisa seguir alguns critérios imprescindíveis.

•Deve ser razoável


Uma monografia séria precisa ter sido originada de uma idéia possível,
razoável, isto é, que não seja classificada com o absurda.
• N ão deve haver contradição
O aluno precisará atentar para tudo o que redige e transcreve. A obra pre­
cisa estar vivida em sua mente, para que não seja apanhado em contradições
dentro do próprio raciocínio. Por esta razão, é importante selecionar os textos-
fonte, separando os conceitos prós e contras a idéia principal, distinguindo-os
no corpo da matéria. Vejamos alguns elementos importantes para a construção
de uma monografia.

• Deve possuir identidade


Dar identidade ao trabalho é explicitar qual seu interesse e tema principal,
o que o leitor deve buscar e esperar daquela obra.
• Deve utilizar fontes acessíveis
Conform e é desenvolvida, a monografia precisará oferecer espaço para a
crítica científica, ou seja, utilizar os elementos pelos quais se definem critérios
para apreciação da obra. Uma monografia escrita sem esses cuidados, adotando
fontes de procedência questionável, apresentando idéias próprias que não têm
alicerce em conceitos que já existem, dificilmente receberá crédito.
• Deve ter clareza
Não se pode utilizar vocábulos complexos se o que se pretende é explicar
algo. Uma boa redação pode perfeitamente se valer de termos usuais para sanar
questões mais complexas.
• Deve ser objetiva
Empregar parágrafos muito longos e cansativos não colaborarão em nada
para que o receptor possa compreender o que o aluno pretende passar. Assim, a
objetividade é característica que somará quando o trabalho for submetido à crí­
tica do leitor.
• Deve solucionar um problem a
Ponto indispensável quando da apresentação do trabalho. Redigir uma
monografia sem revelar a razão de ser da mesma, constitui-se em obra vazia.

2 a Etapa - plano provisório


A elaboração deste plano permitirá ao aluno m ontar um esquema para
organização do trabalho que vulgarmente chamamos “esqueleto” ou esboço.

190
Nele, o aluno destacará todos os pontos que no decorrer da pesquisa lhe tenham
chamado a atenção para formulação da monografia ou explicação do problema.
Para tanto, destacam-se alguns cuidados:

• Todo problema tem um início, um auge e uma conclusão. Dado isso, a


argumentação do autor deve respeitar a ordem natural do “problema”, fazendo
com que ele seja gradual e didaticamente reconhecido no texto. Essa prática
coopera com a compreensão do leitor.
• Havendo subpontos, tam bém estes respeitarão uma ordem de apresenta­
ção clara, evitando que o próprio aluno ou mais possivelmente, o leitor, perca-
se em idéias desconexas que estejam “flutuando” no texto.
• E necessário que o autor tenha condições de “conduzir” seu receptor por
meio do texto, arquitetando no corpo provisório do trabalho a estrutura que pos­
teriormente guiará o leitor final ao mesmo resultado e, talvez, entendimento do
aluno/escritor.

3 a Etapa —coletânea de informações


D e forma mais criteriosa que aquela observada nos primeiros capítulos,
aqui constataremos maiores detalhes sobre estes procedimentos que precedem
a produção da monografia propriamente dita.

Levantam ento da bibliografia


Procedimento já tratado anteriormente, que visa condicionar o aluno à visi­
tação de grandes acervos literários com o fim de coletar, catalogar e assim defi­
nir quais serão as fontes que empregará em seu trabalho. Essa atividade se repete
por ocasião de uma seleção minuciosa, que dispense os materiais cu jo texto
apresente duplicidade de informações com relação à outra obra já selecionada,
valendo-se dos recursos destacados no capítulo 5.
Na própria bibliografia das obras selecionadas, destacada sempre nas últimas
páginas, o pesquisador encontrará várias obras relacionadas ao tema da pesquisa,
daí a importância desta consulta, que possibilitará uma abrangência maior.
Outras obras específicas, como dicionários, enciclopédias e recortes, tam­
bém poderão colaborar com a organização da monografia, sempre respeitando
o planejam ento provisório estabelecido pelo aluno.

Leitura de referências
Existem textos referenciados em algumas obras que não acham espaço na
bibliografia final, visto que seus autores preferiram identificá-los no rodapé da
página ou mesmo entre parênteses, no final da citação. Para esta análise, é neces­
sário que o pesquisador faça uma “varredura” no conteúdo das obras selecionadas,
página por página, a fim de que adiante a coleta de dados, anotando em uma folha
todas as páginas que tragam material importante a ser incluso na monografia.
Outro aspecto importante desta fase, é que se deve considerar sempre as
obras mais recentes com o primeiro alvo do exame, deixando as publicações
cuja edição é antiga. E possível que a obra moderna traga as informações cons­
tantes da obra antiga com acréscimos, economizando tempo de pesquisa.
A generalidade das enciclopédias e dicionários antecipam informações que
poderão ser pesquisadas posteriormente, portanto, devem ter a preferência do
aluno quanto à verificação.
Quando o tema envolver história, o que com um ente ocorre com apologé-
tica cristã, então, as obras antigas terão valor imprescindível na pesquisa, as
obras gerais (dicionários e enciclopédias) apresentarão sempre inform ações
globais, superficiais. É a partir dessas informações que se expande a matéria.

D ocum entação das informações


A organização dos dados coletados tem início nesta fase. Após reunir o aglo­
merado de informações que foram dispostas em folhas avulsas, estas receberão
uma ordem que facilitará a progressão do trabalho, como segue:

• Apontamentos que estruturam a introdução da matéria, que determinam


os termos de seu início, bem com o permitem o reconhecim ento do problema
e o objetivo da monografia.
• Em segundo plano, catalogam-se as fontes a partir de sua identificação,
seu autor, título, etc. (nom e do jornal, livros, sites, revistas), bem com o a página
onde estão localizados os textos que interessam.
• Devido à possibilidade de surgirem novas idéias durante a produção da
monografia, quando estas forem abrangentes, necessitarão de classificação e
subdivisão no índice e igualmente, no topo da página respectiva a ela.
• Por último, dentre a relação de apontamentos, depositam-se as idéias,
argumentos e conceitos do autor que servirão à obra com o oposição ante o pro­
blema proposto ou observado e que se deseja discutir.

4 a etapa - redação
Esta é a etapa efetivamente produtiva do trabalho, na qual o aluno apresen­
tará o problema e proporá sua tese, transformando seu raciocínio em palavras.

19 2
Tomando por base a forma como o aluno planejou a construção de seu tra­
balho, ele passa a redigir o texto, comparando as fontes, confrontando idéias e
formulando sua própria tese.
Uma técnica que colabora com a qualidade final é a redação em rascunho,
feita obviamente antes do texto definitivo e que auxiliará tanto na montagem do
texto final, com o nas alterações possíveis e nas correções necessárias.
Considerando a praticidade dos programas de criação de texto para com ­
putadores, em especial o Microsoft Word, a produção do texto de rascunho, para
os alunos que dispuserem dessa ferramenta será absolutamente dispensável,
visto que as alterações e correções podem ocorrer normalm ente enquanto se
desenvolve a redação.
Concluída a redação, nova leitura do texto integral se fará necessária, para que
a própria redação seja alterada, corrigida, reduzida ou ampliada, se necessário.
E importante que o aluno consiga dizer o máximo com um m ínim o de
espaço empregado na redação, auxiliando o leitor e tornando a obra agradável.
Regras gramaticais passarão a reger todo texto tenha ele o tam anho que
tiver. Na medida do possível o aluno não poderá ignorar concordâncias e orto­
grafia, desrespeitando a harmonia entre verbo e sujeito, grafando palavras de
forma errada, desatento quanto à pontuação. Espera-se do redator de uma
monografia, condições básicas para a produção de um texto aceitável, inteligí­
vel e harmonioso.
Havendo dificuldades nessa área, o aluno deverá se submeter a uma reci­
clagem em Língua Portuguesa, suas regras ortográficas e gramaticais.
Além desses pontos, outros quatro definem o que deve ser evitado:

• Eloqüência textual vazia: prática tipicamente conhecida pela expressão


vulgar “encher lin gü iça”, que define textos não apenas longos, mas ainda,
recheados de palavras que não fazem a menor falta ou são inadequadas. O aluno
tem por obrigação evitar esse estilo, conduzindo o texto apenas para o que real­
m ente interessar.
• Com o a monografia tem por objetivo apresentar a idéia do autor quanto
a um referido problema e sua oposição, logo, subentende-se que ela conterá o
próprio caráter do aluno. Assim, não há que tentar “florear” o texto com frases
feitas, chavões populares ou máximas famosas. A personalidade do autor ficará
ofuscada se o texto for contaminado com estilo alheio e que não possui brilho
redacional próprio.
• Desculpar-se o autor pelo que escreveu no texto, menosprezar o trabalho
desenvolvido, pedir autorização para escrever sobre isso ou aquilo, enfim, pro­
cedimentos similares, denotarão falta de maturidade do escritor, considerando
que uma monografia nos moldes científicos não leva a mesma proposta de um
romance ou de um depoim ento. É impessoal e se destina a um grupo que detém
idéias próximas acerca de um mesmo tema.
• O aluno não deve ignorar os elementos constituintes da redação: intro­
dução, desenvolvimento e conclusão. Na introdução deverá ser declarada a
finalidade do parágrafo. No desenvolvimento será abordada a finalidade junta­
mente com suas implicações e na conclusão será feito o resumo e orientação do
que foi exposto.

Características técnicas de uma monografia


Conform e tudo o que foi tratado no capítulo 6, reiteraremos aqui alguns
aspectos importantes da montagem do trabalho monográfico.
E interessante destacar que, embora apresentem os aqui um padrão suge­
rido para a elaboração do trabalho, deve saber o aluno que cada instituição
possui seus próprios parâmetros para elaboração de trabalhos e monografias.
Segue-se o que o nosso curso de apologética exige para elaboração da m ono­
grafia:

Diagramação

Formato do p ap el
O formato de papel com um ente solicitado na produção de trabalhos esco­
lares é o A4, que é encontrado em qualquer papelaria ou distribuidor de mate­
riais para escritório.

Formato da letra
A fonte (letra) mais adotada é o formato A rial (corpo 12) ou Times New
Rom an (corpo 14). Estes modelos são encontrados na barra de ferramentas do
Microsoft Word, programa de criação de textos para PC - Personal Com puter
(computador pessoal), largamente utilizado nas editoras.

Formato das margens


As margens tam bém possuem um padrão pré-definido, respeitando a
seguinte demarcação: superior esquerda com 3 cm e inferior direita com 2 cm.
Esta delim itação de margem favorece o trabalho de encadernação e acaba­

m
mento da monografia, permitindo que haja espaço na margem esquerda para
colocação de espiral, por exemplo.

N um eração de páginas e entrelinhas


A numeração de páginas deve vir no canto superior direito.
O espaço entrelinhas, que tam bém poderá ser selecionado na barra de fer­
ramentas do Microsoft Word, poderá ser simples, de 1,5 ou duplo. A vantagem de
empregar espaço entrelinhas duplo é a facilidade que se oferecerá ao leitor no
desenvolvimento da leitura, impedindo que ele se perca entre uma linha e
outra, obrigando-o a voltar e reler novamente linhas anteriores por ter perdido
o raciocínio.

Exem plo 1:
No princípio era o Verbo; e o Verbo estava com Deus; e o Verbo era
Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por
intermédio Dele, e, sem Ele, nada do que foi feito se fez (Entrelinha sim­
ples -A ria l 12).

Exem plo 2:
No princípio era o Verbo; e o Verbo estava com Deus; e o Verbo
era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram
feitas por intermédio Dele, e, sem Ele, nada do que foi feito se fez.
(Entrelinha 1,5 c m -T im e s New Roman 14).

Início de capítulo e subtópico


Em colaboração com a estética e uma compreensão rápida da matéria, o
aluno procederá bem se iniciar cada capítulo numa nova página, mesmo que
consuma uma página para apenas uma linha. Os subtópicos, entretanto, por se
referirem a um mesmo assunto, poderão ocupar a mesma página do tópico
anterior.

Citações de texto
As citações extraídas de obras consultadas devem ser mencionadas no pró­
prio corpo do texto, sendo grafadas entre aspas, sempre fazendo constar a fonte
na página reservada às bibliografias.
Quando for necessário, fazer m enção de documentos que serão relaciona­
dos em capítulos posteriores ou nos apêndices (anexos), o aluno precisará iden-

!95
tificá-los no m om ento da citação com núm ero, título e localização na obra,
sabendo que, na maioria das vezes, o leitor prefere apreciar o anexo tão logo ele
é citado.

Notas de rodapé
Poderão ser inseridas no final da página ou final de docum ento. Neste
último caso este recurso fará a vez da bibliografia que neste caso não aparecerá
no final da obra. No prim eiro caso, será utilizado para explicar termos ou
com entários que estejam embutidos no texto, mas que não são do con h eci­
mento geral do público alvo.

Exemplo 1:
1~Série Apologética; vol. I; cap. X; p. 114; IC P -2 0 0 2 .

Exem plo 2:
1- “a p o c a lip s e ” - Termo derivado da palavra grega que significa “revelar”.
O fato de ter sido usado com o título do último livro no NT, deve-se a frase de
abertura de João; Apokalypsis lesou Christou (apocalipse de Jesus Cristo).

Referências bibliográficas
No final da monografia devem ser relacionadas todas as obras efetivamente
consultadas e empregadas na sua elaboração. Para facilitar ao leitor a consulta,
o aluno tem de posicioná-las em ordem alfabética, destacando o sobrenome do
autor em letras maiúsculas, título da obra em itálico e separar com vírgulas cada
uma das informações sobre a obra (autor, título, página, edição, editora, ano de
publicação, etc.).
Exemplo:
K N IG H T & AN GLIN . História do cristianismo. São Paulo: CPAD, 1999,
p.81.
C A IR N S, Earle E. O cristianism o através dos séculos. São Paulo: Vida
Nova, 1998, p.18.
Em se tratando de fontes eletrônicas (Internet; C D R O M 's; etc), a biblio­
grafia deverá conter as mesmas informações das obras escritas, acrescidas do
nome e sobrenome do autor da matéria, nome da matéria, data da exposição na
Internet (dia/mês/ano), endereço eletrônico e data de acesso.

iq 6
Conclusão

Após ter apreciado o material criteriosamente produzido sobre A história das


heresias primitivas e história das religiões não-cristãs, teve-se por oportuno e neces­
sário que o aluno de apologética cristã do IC P fosse iniciado na prática redacional
literária.
O ingresso nesta árdua área exigirá cada vez mais de seus aspirantes, os
quais deverão se esmerar para refletir em seus trabalhos a gama de aprendizado
que lhes é posta à disposição.
Muitos adeptos de seitas, hoje em dia, encontram-se na classe culta, bem
formada e capaz de apresentar argumentos convincentes a todos os que forem
pegos como desinformados na malha fina da argumentação religiosa. A produ­
ção de um material aprimorado, com o este que o irmão tem em mãos, visou ao
progresso intelectual dos nossos alunos, não apenas para colecionar informa­
ções, mas ainda, para a formação de conceitos e aplicação da crítica, que ocorre
tanto no campo do diálogo com o na esfera literária.
O Instituto Cristão de Pesquisas, com isto, enaltece a pessoa de cada parti­
cipante, acreditando contribuir expressivamente para o crescim ento do corpo
de obreiros que advogam a causa do Evangelho de Cristo.

l97
Referência bibliográfica

S E V E R IN O , Antonio Joaquim . M etodologia do T rabalho C ien tífico. São


Paulo: Cortez Editora, 22a edição revista e ampliada (ABN T), 2002.

198
Tema de monografia do
primeiro módulo

Neste primeiro módulo o tema geral da monografia será norteado pela dis­
ciplina “História das heresias primitivas”.
Nesta primeira monografia, a tarefa do aluno será pesquisar e escrever
sobre um grupo religioso contemporâneo, o qual possua em seu credo doutri­
nário uma ou mais das heresias primitivas estudadas neste módulo. O aluno
deverá fazer um paralelo entre o grupo religioso atual que escolher e o líder ou
grupo de pessoas que disseminaram esta mesma heresia no tempo dos apósto­
los. Tudo isso deverá ser feito baseado em textos das próprias seitas com o fim de
comprovar a procedência dessa analogia.
A apresentação do texto deverá conter entre 20 a 30 páginas, observando as
regras de formatação para tipo e tamanho de letra, conforme informadas nesta
disciplina.
Pedimos que a monografia seja preferencialm ente entregue antes do
ingresso do aluno no segundo módulo, ou seja, dentro de 90 dias, porém, caso
o mesmo não seja possível o aluno poderá retardar a apresentação da mesma até
o final do curso, reiterando que o recebim ento da monografia e questionário por
parte do IC P é essencial para que o diploma do aluno não seja retido.
Quaisquer dúvidas, entre em contato com o nosso Departamento Educa­
cional. Fone: (11) 4526-3335 /E-mail: cac@ icp.com .br

l 99
Modelo de capa e página de rosto
da monografia

201
Escola de Apologética e Teologia Dr. Walter Martin

T ÍT U LO DO TRABALHO
MÓDULO I

Nome completo do aluno

Cidade - Data
Nome completo do aluno

T ÍT U LO DO TRABALHO
MÓDULO I
Trabalho exigido
pela disciplina H is t ó r ia d a s
h e re s ia s p rim itiv a s , do curso de
Apologética - Fase II, da Escola
de Apologética e Teologia Dr.
Walter Martin, do Instituto
Cristão de Pesquisas.

Cidade-data
“Antes, santificai ao SENHOR Deus em vossos corações; e estai sempre preparados
para responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança
que há em vós ” -1 Pedro 3.15.

Não faltam na Bíblia textos que nos impelem ao estudo da apologética cristã
(defesa da fé). Judas declara que nutria o desejo de escrever um tratado sobre a salvação,
porém sentiu a necessidade (obrigação) de insistir que os santos batalhassem pela fé que
lhes fora confiada (Jd 3). Judas também nos orienta a sermos “piedosos para com aqueles
que duvidam, arrebatando alguns do fogo” (Jd 22,23). O apóstolo Paulo, por sua vez,
considera imperativo o domínio das evidências cristãs por parte da liderança eclesiástica
para que esta seja capaz de “convencer os contradizentes” (Tt 1.9). A Timóteo, Paulo
receita “ser manso para com os que resistem, para ver se por ventura Deus lhes dará
arrependimento para conhecerem a verdade” (2Tm 2.25). É para fortalecer a busca desse
preparo que o ICP apresenta o Curso de Apologética - Fase II, que é constituído das
seguintes matérias:

Módulo I: História das religiões não-cristãs, História das heresias primitivas,


Metodologia Científica de Pesquisas.

Módulo II: Apologética ao Antigo Testamento, Línguas originais (hebraico e grego),


Apologética aplicada.

Módulo III: Apologética ao Novo Testamento, Direito e religião, Estatísticas das


religiões, Filosofia e religião.

Oramos para que mais esta ferramenta de combate às seitas possa cumprir seu
papel junto à igreja evangélica brasileira e, como o grande reformador Lutero, esperamos
que cada aluno acentue sua consciência em relação à importância desta disciplina para a
conservação da ortodoxia:
“Se não houvesse seitas, pelas quais o diabo nos despertasse, tornar-nos-íamos
demasiadamente preguiçosos, dormiriamos roncando para a morte. A f é e a Palavra de
Deus seriam obscurecidas e rejeitadas em nosso meio. Agora essas seitas são, para nós,
como esmeril para nos polir; elas nos amolam e estão lustrando nossa fé e nossa
doutrina, para se tornarem limpas como um espelho brilhante. Também chegamos a
conhecer Satanás e os seus pensamentos e seremos hábeis em combatê-lo. Assim, a
Palavra de Deus torna-se mais conhecida. Por meio desta luta entre o que é errado e o
que é certo muitos chegam a conhecer a verdade, e por ela são fortalecidos ”
-Martinho Lutero.

ICP Instituto Cristão de Pesquisas


www.icp.com.br

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