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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS


DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS

DINÂMICA E DIFERENCIAÇÃO DE SISTEMAS AGRÁRIOS DA LINHA SÃO


JOÃO DE CANELA, RS

Gramado
2018

Tânia De Fatima Maciel De Souza Lourenco


Ubirata Ismael Colombo Camillo
Verônica Beatriz Paludo
Willian Boeira Marques
Introdução
O estudo realizado na disciplina “Dinâmica e diferenciação de sistemas
agrários” gerou esta pesquisa sobre a evolução e diferenciação dos sistemas agrários na
Linha São João, localizada ao sul do município de Canela, no Rio Grande do Sul.
Também é escopo deste trabalho descrever o espaço agrário desta região juntamente
com o zoneamento da mesma, reconstituindo a evolução e a diferenciação dos sistemas
agrários ali identificados.
A metodologia utilizada para o levantamento dos elementos históricos foi
pesquisa bibliográfica e documental, entrevista semiestruturada com moradores
remanescentes e diretor da Escola Estadual Neuza Mari Pacheco idealizadora,
proprietária e administradora do Centro Agrícola São João. Também foram realizadas
consultas a órgãos como EMATER/RS, Sindicato, Secretária Municipal da Agricultura
e Google Earth. A pesquisa documental pouco contribui dada a escassez de registros
sobra o início da comunidade denominada Linha São João. Este trabalho está dividido
em Introdução, três capítulos assim distribuídos: 1-Histórico e surgimento dos sistemas
agrários evolutivos na Linha São e adjacências; 2- Zoneamento e descrição do espaço
agrário estudado e 3- Reconstituição da evolução e diferenciação dos sistemas agrários
até os dias atuais, por fim, apresentamos algumas considerações finais.

2. Histórico e surgimento sistemas agrários evolutivos na Linha São João e


adjacências
O município de Canela encontra-se na transição entre Encosta da Serra e região
de Campos de Cima da Serra, com altitudes e tipos de solo muito diversos. A população
também é muito heterogênea, em função da formação do município, que se originou a
partir de local de pouso de tropeiros e viajantes, que aos poucos foram se estabelecendo
e povoando o lugar. Atualmente o município possui cerca de 44.489 habitantes, sendo
que destes, cerca de 4.000 habitam o meio rural.
Deste número, se pode afirmar que cerca de 250 famílias trabalham em
atividades agrícolas para gerar o sustento. O número de famílias residentes no interior
com membros trabalhando na cidade é bastante acentuado. Existem muitas famílias em
que um ou mais membros vão trabalhar na cidade diariamente, seja para complementar
a renda ou por falta de perfil pessoal para o trabalho agrícola. Cabe destacar que as
características do meio rural canelense são as áreas declivosas, problemas com a falta da
titulação das terras, envelhecimento da população, aumento dos sítios de lazer e
ausência de “ostentação” na população, pois mesmo as famílias com excelente padrão
econômico possuem casas muito simples, ao contrário do que se vê em outros
municípios.
A 834 metros de altitude, 124 km de Porto Alegre, o município de Canela está
situado na Encosta inferior do nordeste sul-rio-grandense, na região conhecida por
“Cima da Serra”, com uma área de 270km², limitando-se com São Francisco de Paula,
Três Coroas, Gramado e Caxias do Sul.
O legado histórico permite compreender que a origem da Linha São João está
atrelada à constituição histórica do município de Canela que remonta ao século XVII
chamada “Campestre Canella”. Era uma vasta região propícia para acampamentos dos
bandeirantes e também ponto de pousada para tropeiros que por picadas abertas, na
maioria, por casco de animais, vinham de Cima da Serra. Por aqui passavam as tropas
de gado e por possuir pastagem abundante, faziam parada os tropeiros para pernoitarem,
descansarem e alimentarem as tropas.
Ao amanhecer, desciam pela Picada Morro Chapadão, passando pela atual Vila
Santa Marta, desciam pelas proximidades do atual britador de propriedade da Prefeitura
Municipal, costeavam o Morro do Chapadão chegando à localidade chamada Sander,
atualmente pertencente ao Município de Três Coroas, serpenteando o vale o qual se
avista de cima da laje de pedra, onde hoje fica o Hotel Laje de Pedra. Esta picada era
conhecida como Picada do Arame. Mais tarde, foi construída uma estrada que
circundava pelo lado esquerdo do Chapadão, um percurso de 19 km. Por esta via era
possível conduzir o gado e as manadas de suínos para os matadouros de vilas e cidades
próximas a Novo Hamburgo e de lá para Porto Alegre.
As varas de porcos desciam a serra levando vários dias para chegar ao destino,
devido à lentidão e as dificuldades naturais da caminhada. Atrás das varas seguiam
carroças para levar os animais que cansavam e os que não podiam mais caminhar. Os
animais eram gordos prontos para o abate. Nem mesmo o relevo acidentado desanimou
os imigrantes que chegaram por volta de 1824, vindos da Alemanha em busca de terras
e melhores condições de vida. Desbravadores, os imigrantes alemães constroem a
comunidade chamada Linha São João.
O primeiro morador da comunidade foi o senhor Marculino Sander. Por volta de
1905, iniciam-se as atividades no local tendo como base econômica a agricultura
minifundiária. Segundo informações de um antigo morador entrevistado, o senhor
Anibaldo Säfer havia entorno de 30 famílias que moravam no local.
O sistema de cultivo era de derrubada-queimada e extração de madeira de lei. As
serrarias eram instaladas dentro da mata. Com o crescimento industrial floresceu o
comércio e, como consequência, o movimento de gente aumentou. Houve necessidade
de pensões para atender aos trabalhadores. Surgiu o primeiro hotel construído com
madeiras das serrarias. Chamava-se Hotel Sonnenstrahl propriedade do alemão Alvino
Sonnenstrahl. O hotel ficava numa comunidade próxima. Localizado numa zona de
difícil acesso e comunicação, não havia fornecedores para as necessidades básicas do
hotel, então o problema foi resolvido com o cultivo próprio de hortaliças variadas.
Havia também, nas comunidades rurais como a Linha São João, criação de bovinos,
suínos entre outros para subsistência.

3- Zoneamento e descrição do espaço agrário


A Linha São João situa-se ao sul do município de Canela- RS. Possui as quatro
estações bem definidas, clima tipicamente úmido da região serrana, no Planalto
Basáltico. O relevo da região é bastante acidentado com zonas de mata nativa, inclusive,
com a presença de araucárias numa vasta área.
Imagem 1 - Localização de Canela no Rio Grande do Sul

Fonte: MENGUE, 2011

O clima predominante na região , segundo a classificação climática de Köppen é


do tipo Cfb, apresentando clima temperado úmido, apresenta verão de temperaturas
amenas, com uma média anual de 15°C, média mínima anual de 10°C e a média
máxima anual em torno de 21°C, e uma precipitação média anual de cerca de 1.800
mm. a umidade relativa do ar apresenta uma média de 80% com nevoeiros ocorrendo
em todas as estações, no inverno a geada é frequente e neva eventualmente (MENGUE,
2011).
O solo da região é do tipo Cambissolo Humico em sua maioria, ou seja, formado
a partir de rochas, com predomínio de solo raso, espesso e e escuro, rico em matéria
orgânica. (MENGUE, 2011).
Figura 1 – Demarcação da linha São João

Hoje, Canela tornou-se destaque no cenário nacional e internacional por sua


potencialidade turística. O conhecimento e a compreensão desse resgate histórico desde
os primórdios do município e da Linha São João, possibilitou a identificação dos
sistemas agrários e a trajetória evolutiva até os dias atuais.

4- Reconstituição da evolução e diferenciação dos sistemas agrários até os


dias atuais
Apesar de haver indícios de que Canela tenha sido habitada por povos indígenas
da tribo guaianás no século XVII (STOLTZ, 1992), pouca informação foi encontrada
sobre essa época, sendo assim a presente pesquisa parte do recorte realizado a partir do
século XX, início do ano de 1900. Nesse contexto, percebeu-se a existência de
atividades de agropecuária como arar a terra para o plantio com tração animal leve,
derrubada-queimada, cultivo de policulturas para subsistência, prática do pousio,
aproveitamento das coivaras para extração de lenha, criação de bovinos, suínos, ovinos
e equinos para tração e manejo com os animais. Nesse sistema de produção havia
poucos excedentes não oportunizando às famílias investimentos necessários para
ampliação e manutenção da propriedade agrícola.
Com o passar dos anos, novas tecnologias são agregadas, também, por influência
da Revolução Verde, gerando aumento de produção levando a práticas comerciais. Sob
forte influência da cultura alemã, predominante na região, homens e mulheres
trabalhavam de "sol a sol" enfrentando todos os tipos de adversidades em busca de
prosperidade. Houve a evolução gradativa do Sistema Agrário Colonial (1820 - 1900)
para o Sistema Agrário Colonial Contemporâneo (1900 - 1960/1970).
Por volta da década de 60, as mudanças começam despontar nesse cenário com a
presença do êxodo rural. Passaram os agricultores com mais posses investir em outras
atividades mais viáveis economicamente como implementação de florestas comerciais
de pinus. Assim sendo, os agricultores mais capitalizados foram adquirindo áreas cada
vez maiores para a produção de madeira em detrimento do policultivo das pequenas
propriedades fomentando o traslado dos agricultores para os centros urbanos.
Configurando-se assim o Sistema Agrário Contemporâneo Atual (1960/1970.).
Imagem 2 – Plantio de Pinus em Canela

Fonte: MENGUE, 2011


4.1- Realidade agrária atual
Segundo informações colhidas junto a alguns moradores, a Linha São João, hoje,
conta com aproximadamente 60 propriedades. Dentre essas há propriedades produtivas
de agricultores familiares, agroindústrias diversas, sítios para lazer, propriedades
voltadas para a exploração de atividades turísticas, áreas de florestas comerciais e, ainda
existe, uma vasta área agricultável improdutiva, ociosa.
Figura 2: Vinícola Granja da Telha

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando a teoria estudada na DERAD 102: Dinâmica e Diferenciação de
Sistemas Agrários, verificou-se que as atividades/práticas agropecuárias na linha são
João vem sofrendo modificações consideráveis ao longo dos anos. Um dos fatores
relevantes nessas mudanças são os adventos de novas tecnologias de produção e o
surgimento de outras atividades mais viáveis economicamente, a diminuição da
sucessão rural, com a juventude se deslocando para os centros urbanos em busca de
qualificação profissional e garantia de trabalho. Diante desses eventos a zona rural
agrícola fica desprovida de mão de obra, dificultando a continuidade das atividades
produtivas agrícolas e levando a novas atividades econômicas como turismo, sítios de
lazer e especulação imobiliária. Ainda assim se verifica produção agrícola na forma de
agricultura de subsistência, agroindústrias e plantio de espécies florestais.
Logo, percebe-se que um dos fatores que poderia trazer mudanças significativas
para essa situação, seria o investimento em malha viária vicinal e investimento em
capital humano com foco na visão de empreendedorismo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CANELA. Central de Informações Turísticas. História de Canela. Disponível em
www.canela.com.br. Material de divulgação da Prefeitura. 2018.
MENGUE, Solange Drews Aguiar. Percepções e impactos socioambientais na
introdução do cultivo arbóreo de pinus no município de Canela RS. 83p.
Monografia (Tecnologia em Planejamento e Gestão para o Desenvolvimento Rural)-
Faculdade de Ciências Econômicas , Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto
Alegre, 2011.
MIGUEL, Lovois de Andrade org. Dinâmica e Diferenciação de Sistemas Agrários.
2. ed. Ver. E 212p.; Ed. UFRGS. Porto Alegre. 2018.
OLIVEIRA, Pedro org.; BARROSO, Vera Lúcia Maciel. Raízes de Canela. Porto
Alegre. EST, 2003.
STOLTZ, Roger. Primórdios de Canela: nascente turístico do Rio Grande do Sul.
Canela: NBS,1992.

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