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RELATOBERLIM

DE CGEXPERIÊNCIA
ET AL

PRINCÍPIOS
E PRÁTICAS DO
EMPREENDEDORISMO : U M NOVO PARADIGMA
EM EDUCAÇÃO E EM PSICOPEDAGOGIA

Clara Geni Berlim; Fabiani Ortiz Portella; Ingrid Schroeder Franceschini; Mônica Timm de Carvalho

RESUMO – Este artigo indica alguns princípios que podem nascer no


cotidiano das práticas educacionais, com o objetivo de criar uma atitude
empreendedora nos diferentes sujeitos que fazem parte da comunidade
escolar. Apresenta uma proposta inovadora que está sendo construída numa
parceria entre o Colégio Israelita Brasileiro e o Serviço Brasileiro de Apoio
às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE/RS), com o apoio da Associação
Brasileira de Psicopedagogia - Seção Rio Grande do Sul (ABPp-RS). A
Psicopedagogia trabalha com os processos de aprendizagem e suas diferentes
formas de apropriação e manifestação. Assim, pode contribuir para a
compreensão da singularidade de cada sujeito envolvido nesse processo,
considerando suas atitudes, habilidades e competências. O grande desafio
da Psicopedagogia, nesse caso, está na articulação da proposta que busca
desenvolver o empreendedorismo, das características da instituição-escola e
da diversidade dos sujeitos e sua construção de projetos efetivos que
envolvam, inclusive, a responsabilidade social.

UNITERMOS: Psicopedagogia. Aprendizagem. Educação .


Empreendedorismo.

Clara Geni Berlim - Psicopedagoga, Orientadora Edu- Correspondência


cacional, Coordenadora Educacional do Colégio Clara Geni Berlim
Israelita Brasileiro, Conselheira Nacional da ABPp e Associação Brasileira de Psicopedagogia – Seção Rio
ex-presidente da Associação Brasileira de Psicope- Grande do Sul
dagogia – Seção Rio Grande do Sul. Avenida Plínio Brasil Milano, 388/203 – 90520-000
Fabiani Ortiz Portella - Psicopedagoga, Mestranda da
Porto Alegre – RS – Brasil – Tel: (51) 3343-9943
Faculdade de Educação – PUCRS, Professora da Uni-
E-mail: claraberlim@uol.com.br
versidade Estadual do Rio Grande do Sul – UERGS e
Presidente da Associação Brasileira de Psicopedagogia
– Seção Rio Grande do Sul.
Ingrid Schroeder Franceschini - Psicopedagoga, Pedagoga
de Educação Especial e 1ª Secretária da Associação
Brasileira de Psicopedagogia – Seção Rio Grande do Sul.
Mônica Timm de Carvalho - Licenciada em Letras,
Especialista em Gestão Empresarial, Membro da
Diretoria do SINEPE/RS, Diretora Geral do Colégio
Israelita Brasileiro.

Rev. Psicopedagogia 2006; 23(70): 62-7

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PRINCÍPIOS E PRÁTICAS DO EMPREENDEDORISMO

INTRODUÇÃO cotidiano e suas vicissitudes, operando na trans-


“O empreendedor é uma pessoa que imagina, formação do espaço social.
desenvolve e realiza visões”. Para Peter Drucker (1998), os empreendedores
L. J. Filion1 não causam mudanças, mas exploram as oportu-
nidades que as mudanças criam na tecnologia,
Este artigo apresenta alguns princípios do na preferência dos consumidores, nas normas
empreendedorismo que podem nascer no cotidiano sociais, etc2.
das práticas educacionais e que contribuirão para O conceito de empreendedorismo utilizado por
um novo paradigma em Educação e em Psicope- Dolabela refere que “o empreendedor deve ser
dagogia. É o relato de uma proposta inovadora visto como alguém que oferece valor positivo para
que o Colégio Israelita Brasileiro está realizando a sociedade e não deve ser encarado apenas
em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às como forma de enriquecimento pessoal. Deve ser
Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE/RS), com direcionado para o desenvolvimento social, fazer
o apoio da Associação Brasileira de Psicope- com que as pessoas sejam incluídas e o país tenha
dagogia, Seção Rio Grande do Sul (ABPp-RS). mais condições de viver”3.
O Projeto iniciou com um trabalho de instru- Desse modo, nossa pretensão é formar pessoas
mentalização da equipe pedagógica, dos profes- que, a partir dos seus sonhos, possam agir e, com
suas ações, realizar a transformação da realidade,
sores e das psicopedagogas representantes da
ampliando as oportunidades e o bem-estar social.
ABPp-RS, e a apresentação aos pais e alunos do
De acordo com o SEBRAE e a Agência Brasi-
colégio. O passo seguinte foi a criação do Núcleo
leira de Desenvolvimento Socioeconômico-
Educacional Empreendedor, com o objetivo de
ABASE, “empreendedor é o indivíduo que possui
criar uma atitude empreendedora nos diferentes
ou busca desenvolver uma atitude de inquie-
sujeitos que fazem parte da comunidade escolar.
tação, ousadia e proatividade na relação com o
Para tal, estão sendo realizadas oficinas e pales-
mundo, condicionada por características pes-
tras de capacitação para grupos de alunos e
soais, pela cultura e pelo ambiente, que favorece
professores - estes últimos mediadores do processo
a interferência criativa e realizadora no meio,
- sob a orientação do consultor técnico Cláudio
em busca de ganhos econômicos e sociais”1.
Forner, do SEBRAE/RS. Sendo assim, pode-se dizer que a ação
Afinal, o que significa empreender? Quais são empreendedora é, por um lado, fruto do desen-
as características de um empreendedor? Como volvimento da sociedade e, por outro, é agente
criar uma educação empreendedora? Como a de desenvolvimento pessoal e social, visto que
Psicopedagogia pode contribuir neste projeto? contribui ao introduzir inovações e criações.
Empreendedorismo é uma prática, é a criação, Empreendedores querem mais do que a maio-
é a inovação e a conseqüente transformação da ria das pessoas. Com propósito de suas realiza-
realidade. São atitudes e idéias para desenvolver ções pessoais, buscam projetos alternativos,
novas maneiras de fazer as coisas. É a busca da inovadores, diferentes e ousados. Têm atitude
realização de um sonho, de um projeto de vida. propositiva, procuram deixar a sua marca, fazer
É perceber uma oportunidade quando os outros a diferença, mantendo sempre os princípios de
enxergam o caos. Tão simples e, ao mesmo tempo, ética e comprometimento. Segundo Filion 4,
tão complexo! O diferencial está no simples fato “empreendedor é uma pessoa imaginativa,
de que, a partir das habilidades e competências caracterizada pela capacidade de fixar metas
geradas pela atitude empreendedora, podemos para si e alcançá-las. Ele manifesta perspicácia
oportunizar formas alternativas para atender às para detectar oportunidades e aprende com este
necessidades emergentes, ou ainda, poder ante- tema, tomando decisões de risco moderado, mas
cipar situações a partir da análise crítica do sempre com o objetivo de inovar”.

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A atitude empreendedora exige a delimitação O principal objetivo do Projeto Ação Empreen-


de metas e o planejamento das ações e estraté- der é criar, a partir de uma metodologia específica,
gias para atingi-las, a visualização do futuro. Rea- um ambiente propício para o desenvolvimento do
lizar um projeto exige que se considerem os riscos empreendedorismo nas diferentes etapas de
e desafios, sem esquecer dos aspectos sociais e escolaridade do Colégio Israelita Brasileiro.
coletivos, sabendo articular, criar, comunicar, Nessa proposta, serão trabalhadas as caracterís-
enfim, liderar. ticas do empreendedor e do processo de
Encontramos suporte para esse novo paradig- empreender, buscando o “desenvolvimento de um
ma no Relatório de Jacques Delors – UNESCO5, aluno com espírito crítico e postura empreen-
que propõe uma síntese dos pontos funda- dedora, que invista no autoconhecimento e
mentais da existência humana e da sua conti- disposto a “aprender a aprender, e a transformar
nuidade com dignidade, sabedoria, respeito às o entorno social na perspectiva do bem comum“.
diferenças e reforço dos talentos inatos do Pensar em educação empreendedora no século
indivíduo. XXI exige uma análise crítica da contempo-
Está fundamentado nos quatro pilares básicos raneidade e uma fundamentação teórica que dê
da educação ao longo de toda a vida: conta das exigências do mundo atual: novas
a) aprender a conhecer - aprender a aprender tecnologias, políticas de inclusão, descobertas
para beneficiar-se das oportunidades científicas, diversidade de linguagens, plura-
oferecidas; lidade de ações, rapidez da informação. Apesar
b) aprender a fazer - no âmbito das diversas do ser humano possuir uma incrível capacidade
exigências sociais; de adaptação e criação, somente uma extra-
c) aprender a viver juntos, a conviver - realizar ordinária mudança nos princípios e práticas da
projetos comuns e preparar-se para gerir educação poderá atender essas novas exigências.
conflitos; Considerando esses elementos, o consultor do
d) aprender a ser - agir com autonomia, discerni- projeto 6 propõe uma metodologia com as
mento e responsabilidade pessoal. seguintes abordagens:
Trata-se, portanto, de ver o ser humano como a) interacionista - porque reconhece que sujeito
um ser potencialmente criativo, com habilidades e objeto de conhecimento são organismos
e competências; enfim, com condições de buscar vivos, ativos, abertos e em constante troca com
o novo pelo seu próprio interesse e necessidade. o meio ambiente;
Uma educação empreendedora deve oportu- b) sociocultural - porque o “ser” se constrói na
nizar espaço para a criatividade e a iniciativa. Deve relação e o conhecimento é produzido na
prever espaços que valorizem a possibilidade do interação com o mundo físico e social, a partir
sonho e a capacidade de projetar o futuro. Como do contato do indivíduo com a realidade, com
não existe apenas um caminho, cada escola deve os outros, incluindo, aqui, sua dimensão social
procurar conhecer o seu entorno social, as carac- e dialógica, inerente à própria construção do
terísticas peculiares da comunidade escolar, pensamento;
reavaliar seu projeto político pedagógico e, a partir c) construtivista - porque o conhecimento é
daí, construir um currículo que proponha conhe- entendido como um processo em permanente
cimentos e desenvolva habilidades, competências construção;
e atitude empreendedora. d) sistêmica - porque o processo de conhecimento
De acordo com Forner6, o estudo do empreen- é compreendido como um todo integrado,
dedorismo “é complexo, influenciado não só cujas propriedades fundamentais têm sua
pelas capacidades, atitudes e considerações origem nas relações entre suas partes, cons-
pessoais, como também pelo ambiente institu- tituído de subsistemas que se inter-relacionam
cional e pelo padrão de oportunidades predo- formando uma rede em que estes estão
minante na sociedade”. interligados e são interdependentes.

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PRINCÍPIOS E PRÁTICAS DO EMPREENDEDORISMO

Afirma, também, que haverá “uma per- favor da aprendizagem em empreendedorismo,


manente interação entre a teoria e a prática e como princípio de transformação e avanço na
que a construção dos conhecimentos refletirá o formação dos sujeitos envolvidos. Essa inserção
estímulo a atitudes investigativas com e entre os se dará por meio da construção de ambientes de
sujeitos envolvidos: alunos, professores, aprendizagem, que oportunizem aprender a
psicopedagogos e empreendedores”. pensar sobre as diversas situações e compreender
Competências selecionadas para percorrerem a realidade, não como um produto pronto e aca-
o currículo, da Educação Infantil ao Ensino bado, mas como algo que pode ser transformado.
Médio: Nessa direção, a abordagem psicopedagógica
a) conceber a visão ao longo prazo; opera como uma aventura criadora que exige
b) perceber e agir sobre as oportunidades; dos alunos aprender a criar, a mudar, a agir e a
c) apresentar persistência; (re) agir.
d) comprometimento com o trabalho contratado; O psicopedagogo pode contribuir, ainda, no
e) ser capaz de buscar informações; auxílio aos alunos no que se refere à capacidade
f) planejar sistematicamente; de “aprender a ser” e “aprender a aprender”,
g) usar de estratégias de poder; escutando, acolhendo, mediando interativamente,
h) apresentar autoconfiança. e permitindo que eles busquem superar as
O Projeto prevê a criação de uma comunidade condições que os inibem no ato criativo. Requer o
empreendedora composta pelos técnicos da desenvolvimento de estratégias de intervenção e
Escola e das Psicopedagogas da ABPp/RS, construção a partir das especificidades do grupo,
facilitadores, alunos, familiares e empresários, provocando a transformação verdadeira no com-
cujos representantes formarão o Núcleo de promisso do saber ser e do saber fazer, promo-
Empreendedorismo. Será competência do vendo a possibilidade de autoria e autonomia de
Núcleo, “disseminar esse tema no Colégio, pensamento. É possível antecipar que a Psico-
articular a aprendizagem, acompanhar a pedagogia está vinculada às formas de apren-
docência empreendedora, aglutinar as ações dizagem, ao reconhecimento do objeto de estudo,
voltadas ao empreendedorismo e interagir com do interesse e da curiosidade dos envolvidos –
os pais e o ambiente externo”6. alunos e/ou professores.
Inserida no Núcleo de Empreendedor, a Morin (Apud Cruz), assim, colabora para
Psicopedagogia, que trabalha com os processos compreender a ativação da inteligência e da
de aprendizagem e suas diferentes formas de curiosidade7:
apropriação e manifestação, contribuirá para a “[...] existe uma relação direta entre o
compreensão da singularidade de cada sujeito conhecimento e a ativação da inteligência geral.
envolvido nesse processo, considerando suas Esta tese remete ao princípio de que a ação peda-
atitudes, habilidades e competências. gógica, ação do homem sobre o homem, portanto,
O grande desafio da Psicopedagogia está na ato intencional, deve beneficiar a disposição
articulação da proposta, que busca desenvolver inata da mente na elaboração e resolução de
o empreendedorismo, perceber as características problemas essenciais, ao mesmo tempo, em que
da instituição-escola e a diversidade dos sujeitos instiga e ativa a inteligência geral. Este processo
e a construção de projetos efetivos que incluam a pressupõe o livre exercício da curiosidade, fenô-
perspectiva da responsabilidade social. meno mais ativo e desenvolvido na infância e
Sua função não se encontra delimitada a priori. adolescência, que, infelizmente, os espaços
Será construída a cada momento do processo, educativos formais e não-formais tratam de
buscando uma interlocução teórica e prática em extinguir em vez de cultivá-lo“.

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Uma tarefa desafiadora será, identificar as Além disso, pretende-se qualificar a ação
características empreendedoras dos alunos, a institucional, criando uma cultura empreende-
inquietude daqueles que desejam novas possibi- dora, comprometida com o fazer da escola, tanto
lidades e orientar pais e professores para no processo de execução quanto na obtenção de
reconhecer e estimular essa capacidade resultados.
realizadora. Desde a educação infantil ao ensino médio,
Em conjunto com a equipe pedagógica, serão integrados ao currículo conteúdos e práticas
pesquisaremos, também, estratégias de ensino para desenvolver competências empreendedoras,
que possam colocar em evidência o potencial com propostas que comporão a base do futuro
empreendedor, propondo perspectivas e rumos. empreendedor.

SUMMARY
Principles and practices of entrepreneurship: a new paradigm in
education and psychopedagogy

This article points out some principles that can arise from everyday
educational practices, in order to develop an entrepreneurial attitude in
everybody who is part of school community. It presents an innovative
proposal that is being carried out by Israelita School, Brazilian Small and
Middle-sized Business Development Service (SEBRAE) and Brazilian
Psychopedagogy Association - Rio Grande do Sul Branch (ABPp-RS).
Psychopedagogy deals with learning processes and their different forms
of acquisition and manifestation. Thus, it can contribute to the
understanding of the singularity of each subject involved in this process,
taking into consideration his or her attitudes, abilities and skills. The big
challenge of Psychopedagogy in this case is to work out the proposal that
seeks to develop the entrepreneurship, characteristics of the school-
enterprise and diversity of subjects, as well as to put into effect their real
projects that also involve social responsibility.

KEY WORDS: Psychopedagogy. Learning. Education. Entrepreneurship.

Rev. Psicopedagogia 2006; 23(70): 62-7

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PRINCÍPIOS E PRÁTICAS DO EMPREENDEDORISMO

REFERÊNCIAS 5. Delors J. Educação um tesouro a descobrir.


1 . Site: Disponível em: <http://educacao. UNESCO. São Paulo:Cortez;2003.
sebrae.com.br>. Acessado em 9 jun. 6. Forner C. Projeto empreender. Desenvol-
2005. vimento de metodologia e bases de aplicação
2. Site: Disponível em: <http://www.fic.br>. do Colégio Israelita Brasileiro. Não publi-
Acessado em 17 jun. 2005. cado;2005.
3. Site: Disponível em: <http://empregos. 7. Cruz MW. Saberes epistêmicos –solidários.
com.br>. Acessado em 09 jun. 2005. A formação humanizadora de educadores e
4. Aprender a empreender. Programa Brasil de educadoras emancipatórios para a escola
empreendedor. SEBRAE. Fundação Roberto e para além da escola: por uma sociedade
Marinho. de utopia. Porto Alegre;2002.

Trabalho realizado numa parceria entre o Colégio Artigo recebido: 12/10/2005


Israelita Brasileiro e o Serviço Brasileiro de Apoio às Aprovado: 28/03/2006
Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE/RS), com o apoio
da Associação Brasileira de Psicopedagogia - Seção
Rio Grande do Sul (ABPp-RS).

Rev. Psicopedagogia 2006; 23(70): 62-7

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