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Brasília, 8 a 12 de setembro de 1997 - Nº 83

Data(páginas internas): 17 de setembro de


1997.

Este Informativo, elaborado a partir de


notas tomadas nas sessões de julgamento das
Turmas e do Plenário, contém resumos não-
oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A
fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo
das decisões, embora seja uma das metas
perseguidas neste trabalho, somente poderá
ser aferida após a sua publicação no Diário da
Justiça.

ÍNDICE DE ASSUNTOS
Aposentadoria e Tribunal de Contas da União
Criação de Município: Inconstitucionalidade
Ensino Técnico
Gratificação Natalina: Retroatividade
Lei 9.099/95 e Transação Civil e Justiça Militar
Loteamento Irregular e Crime Continuado
Mandado de Segurança no Processo Penal
Precatórios e Correção de Erro Material
Precatórios e Seqüestro
Procuradores Autárquicos e Vencimentos
Quadrilha e Liberdade Provisória
RE Adesivo
Transporte Escolar e Isenção do IPVA

PLENÁRIO
Aposentadoria e Tribunal de Contas da União
O Tribunal indeferiu, por unanimidade, mandado
de segurança impetrado por juiz classista contra decisão do
TCU que recusara registro ao ato administrativo da
Presidência do TRT da 1a Região que cumprindo decisão,
transitada em julgado, concessiva de mandado de segurança
favorável ao impetrante determinara a inclusão, para fins de
anuênio, do tempo de exercício da advocacia. Destacou a
impetração que a decisão do TCU, baseada em sua Súmula
123 (“A decisão proferida em mandado de segurança
impetrado contra autoridade administrativa estranha ao
Tribunal de Contas da União, a este não obriga, mormente
se não favorecida a mencionada autoridade pela
prerrogativa de foro conferida no art. 119, I alínea i da
Constituição.”), ofenderia a garantia da coisa julgada.
Prevaleceu o entendimento do relator, Min. Sepúlveda
Pertence, que, invocando a Súmula 6 do STF (“A revogação
ou anulação, pelo Poder Executivo, de aposentadoria, ou
qualquer outro ato aprovado pelo Tribunal de Contas, não
produz efeitos antes de aprovada por aquele Tribunal,
ressalvada a competência revisora do Judiciário.”),
ponderou não ser a coisa julgada oponível ao Tribunal de
Contas. A eficácia da sentença exauriu-se com a prática do
ato reclamado pelo Presidente do TRT; tal ato, no entanto,
continua a demandar a chancela da Corte de Contas (CF, art.
71, III, que dispõe sobre a competência do TCU para
“apreciar, para fins de registro, a legalidade ... das
concessões de aposentadoria ...”). Precedente citado: RMS
8.657 (RTJ 20/69). MS 22.658-RJ, rel. Min. Sepúlveda
Pertence, 10.9.97 .
Transporte Escolar e Isenção do IPVA
Por aparente contrariedade ao artigo 150, II da CF,
que veda aos Estados a instituição de tratamento desigual
entre contribuintes que se encontrem em situação
equivalente, o Tribunal deferiu medida liminar em ação
direta proposta pelo Governador do Amapá para suspender,
até decisão final da Corte, os artigos 1 o (“Ficam isentos da
incidência do imposto sobre a Propriedade de Veículos
Automotores - IPVA, os veículos automotores especialmente
destinados à exploração dos serviços de transporte escolar
no Estado do Amapá, devidamente regularizados junto à
Cooperativa de Transportes Escolares do Município de
Macapá - COOTEM.”) e 2o, que atribui competência à
Assembléia Legislativa para avaliar os efeitos da referida
isenção, todos da Lei Estadual 351/97. Vencido o Min.
Marco Aurélio. ADInMC 1.655-AP, rel. Min. Maurício
Corrêa, 10.9.97 .

Ensino Técnico
O Tribunal indeferiu medida liminar requerida pelo
Partido Comunista do Brasil em ação direta proposta contra
o art. 44 da MP 1.549-31, que acrescentou os §§ 5 o, 6o e 7o
ao art. 3o da Lei 8.948/94, que dispõe sobre a instituição do
Sistema Nacional de Educação Tecnológica. Os referidos
parágrafos cuidam da expansão da oferta de ensino técnico
mediante criação de novas unidades de ensino por parte da
União em parceria com Estados, Municípios e Distrito
Federal, que serão responsáveis pela manutenção e gestão
dos novos estabelecimentos. Afastou-se, ao primeiro exame,
a alegação de ofensa ao art. 211, § 1 o da CF (“A União, os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em
regime de colaboração seus sistemas de ensino. § 1 o - A
União organizará e financiará o sistema federal de ensino e
os territórios, e prestará assistência técnica e financeira aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para o
desenvolvimento de seus sistemas de ensino e o atendimento
prioritário à escolaridade obrigatória.”), já que eventual
parceria pressupõe o consentimento dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios. Vencido o Min. Marco Aurélio ao
argumento da inobservância do prazo de vigência da MP:
trinta dias. ADInMC 1.629-UF, rel. Min. Moreira Alves,
10.9.97 .

Precatórios e Seqüestro
Deferida em parte medida cautelar em ação direta
requerida pelo Governador do Estado de São Paulo contra a
Instrução Normativa nº 11, de 10 de abril de 1997
(Resolução nº 67/97) do TST, que “uniformiza
procedimentos para a expedição de Precatórios e Ofícios
requisitórios referentes às condenações decorrentes de
decisões trânsitas em julgado, contra a União Federal
(Administração Direta), Autarquias e Fundações, até a nova
regulamentação prevista no projeto de reforma do Poder
Judiciário, na Constituição da República”. Por aparente
contrariedade ao art. 100, § 2º, in fine, da CF que autoriza o
seqüestro da quantia necessária à satisfação do débito
exclusivamente na hipótese de preterição do direito de
precedência , o Tribunal deferiu a cautelar para suspender,
até o julgamento final da ação, a vigência dos incisos III e
XII da referida norma, que autorizam o seqüestro do valor do
precatório pelo presidente de tribunal regional do trabalho
quando a pessoa jurídica de direito público condenada não
incluir no orçamento a verba necessária ao seu pagamento ou
quando este pagamento for efetivado por meio inidôneo, a
menor, sem a devida atualização ou fora do prazo legal. Por
maioria, indeferiu-se a cautelar relativamente ao item IV da
instrução atacada (“A pessoa jurídica de direito público
informará ao Tribunal, até 31 de dezembro, se fez incluir
no orçamento os precatórios apresentados até 1 º de
julho”), tendo em vista tratar-se de ato ordinatório
meramente administrativo, sem qualquer sanção, que não
afronta o princípio constitucional da separação de poderes.
Vencidos, neste ponto, o Min. Maurício Corrêa, relator, e o
Min. Nelson Jobim que suspendiam a eficácia do referido
item.

Precatórios e Correção de Erro Material


Na acima mencionada ação direta, também, por
unanimidade, deferiu-se em parte a liminar quanto à alínea b
do item VIII da instrução impugnada, que prevê a
competência do presidente do tribunal regional para
“determinar, de ofício ou a requerimento das partes, a
correção de inexatidões materiais ou a retificação de erros
de cálculo”, dando às expressões sublinhadas interpretação
conforme à Constituição, segundo a qual a requisição a título
de complementação de depósitos insuficientes somente deve
referir-se às diferenças resultantes de erros materiais ou
aritméticos ou inexatidões de cálculos dos precatórios, não
podendo dizer respeito ao critério de elaboração dos cálculos
ou a adoção de índices diversos dos utilizados pela primeira
instância. Precedente citado: ADIn 1098-SP (DJU de
25.10.96). ADInMC 1.662-UF, rel. Min. Maurício Corrêa,
11.9.97.

Criação de Município: Inconstitucionalidade


Por violação ao § 4º do art. 18 da CF, que
condiciona a criação de municípios a consulta prévia,
mediante plebiscito, às populações diretamente interessadas,
o Tribunal, por maioria, julgou procedente a ação direta e
declarou a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 498/92 do
Estado de Tocantins na parte em que dando nova redação ao
inciso IX do art. 4º, da Lei 251/91, do mesmo Estado ,
modificou, sem a prévia consulta plebiscitária, a área, os
limites e as confrontações do Município de Cariri do
Tocantins, que já haviam sido submetidos a plebiscito.
Vencido o Min. Marco Aurélio, que julgava improcedente a
ação sob o entendimento de que a correção dos limites
geográficos do referido Município, que tinha por finalidade
adequá-lo a conceitos técnicos, não exigiria a realização de
novo plebiscito. ADIn 1.262-TO, rel. Min. Sydney Sanches,
11.9.97.

PRIMEIRA TURMA
Loteamento Irregular e Crime Continuado
O delito tipificado no art. 50, parágrafo único, I, da
Lei 6.766/79 [“O crime definido neste artigo (parcelamento
irregular de solo urbano) é qualificado se cometido: I - por
meio de venda, promessa de venda, reserva de lote ou
quaisquer outros instrumentos que manifestem a intenção de
vender lote em loteamento ou desmembramento não
registrado no Registro de Imóveis competente;”] é crime
único, não sendo de admitir-se a continuidade delitiva
quando as condutas criminosas do agente são atribuídas a um
mesmo desmembramento irregular. Com base nesse
entendimento, a Turma deferiu em parte habeas corpus para
excluir da condenação do paciente o acréscimo da pena
decorrente do crime continuado, reformando decisão que a
exasperara com base em sete promessas de venda realizadas
em um mesmo loteamento. HC 74.757-SP, rel. Min. Octavio
Gallotti, 9.9.97.

RE Adesivo - 1
Aplica-se ao recurso adesivo a disciplina do art.
188, do CPC (“Computar-se-á em quádruplo o prazo para
contestar e em dobro para recorrer quando a parte for a
Fazenda Pública ou o Ministério Público.”), tendo em vista
que sua interposição ocorre no prazo de que a parte dispõe
para responder (CPC, art. 500, I). Com base nesse
entendimento, a Turma rejeitou a preliminar de
intempestividade do recurso extraordinário adesivo da União
Federal, que fora interposto dentro do prazo em dobro a ela
conferido, mas após exaurido o prazo de interposição de
recurso da parte contrária.

RE Adesivo - 2
Considerando que o recurso adesivo segue a sorte
do recurso principal (CPC, art. 500, III), tendo sido provido
agravo de instrumento pelo STF para o processamento do
recurso extraordinário principal inadmitido na origem, não é
de se considerar prejudicado o recurso extraordinário
adesivo ainda que não tenha sido interposto agravo de
instrumento, se a inadmissão de tal recurso se dera
exclusivamente porque não admitido o principal, e não por
fundamento próprio ao adesivo. Precedentes citados: RE
87.355 (RTJ 95/210); RE 102.308 (RTJ 117/1190)

RE Adesivo - 3
Por outro lado, considerou-se que o não
conhecimento do recurso extraordinário principal com o
exame do mérito hipótese em que a decisão recorrida não
contraria dispositivo da Constituição (CF, art. 102, III, a)
não impede, em princípio, a admissão do recurso adesivo.
RE 196.430-RS, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 9.9.97.

Mandado de Segurança no Processo Penal


Tratando-se de mandado de segurança impetrado
pelo Ministério Público contra decisão em processo penal
favorável ao réu, é obrigatória a intervenção deste como
litisconsorte tendo em vista que a concessão de segurança
pode afetar sua situação jurídica. Com base nesse
entendimento e considerando que o mandado de segurança
não pode ser uma via transversa para afastar as garantias
constitucionais da ampla defesa, do contraditório e do devido
processo legal, a Turma deferiu habeas corpus para anular o
processo de mandado de segurança concedido para dar
efeito suspensivo a agravo de instrumento do Ministério
Público contra o deferimento de progressão de regime ao
condenado e determinar sua renovação após citado o
paciente. HC 75.853-SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence,
9.9.97.

Gratificação Natalina: Retroatividade


A Turma não conheceu de recurso extraordinário
interposto pelo Estado de São Paulo contra decisão do
Tribunal de Justiça local que reconhecera aos servidores
públicos estaduais o direito a receberem o 13º salário relativo
ao ano de 1988 com base na remuneração de dezembro, e
não de novembro, conforme sustentava o Estado. Afastou-se
a tese de que a retroação dos efeitos da LC 644, de 26.12.89
que disciplinou o benefício da gratificação natalina ao ano
de 1988 ofenderia o ato jurídico perfeito (CF, art. 5º,
XXXVI). Considerou-se, ainda, que a CF não impede que o
Estado-membro edite lei em benefício de seus servidores
estabelecendo a sua aplicação retroativa, como ocorreu no
caso (LC 644/89, art. 13: “Esta lei complementar estará em
vigor na data de sua publicação, retroagindo seus efeitos a 5
de outubro de 1988, revogadas as disposições gerais ou
especiais que disponham sobre a gratificação de Natal.”).
RE 206.965-SP, rel. Min. Ilmar Galvão, 9.9.97.

Quadrilha e Liberdade Provisória


Tendo em vista que a Lei 9.035/95 ao dispor sobre
os meios operacionais para a prevenção e repressão de
crimes resultantes de ações de quadrilha ou bando determina
em seu art. 9º que “o réu não poderá apelar em liberdade
nos crimes previstos nesta lei”, conseqüentemente, não tem o
réu direito a liberdade provisória. Com base nesse
entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus em que se
pretendia ver reconhecido o direito do réu ao referido
benefício até o trânsito em julgado da condenação por ser ele
primário, de bons antecedentes e por estar sendo processado
por crimes afiançáveis (receptação dolosa e quadrilha: CP,
arts. 180 e 288). HC 75.583-RN, rel. Min. Moreira Alves,
9.9.97.

SEGUNDA TURMA
Lei 9.099/95 e Transação Civil e Justiça Militar
A Turma decidiu afetar ao Pleno pedido de habeas
corpus contra decisão do STM que deferiu correição parcial,
nos termos do art. 498 do CPPM, por considerar inaplicável
à Justiça Militar a Lei dos Juizados Especiais Cíveis e
Criminais e, em conseqüência, anular a composição civil
celebrada entre a vítima e o paciente — acusado da prática
do crime de lesão corporal culposa — de acordo com o
artigo 74 da Lei 9.099/95 (“ A composição dos danos civis
será reduzida a escrito e, homologada pelo Juiz mediante
sentença irrecorrível, terá eficácia de título a ser executado
no juízo civil competente. Parágrafo único. Tratando-se de
ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública
condicionada à representação, o acordo homologado
acarreta a renúncia ao direito de queixa ou
representação.”). Considerou-se, sobretudo, a falta de
precedente do Tribunal sobre a extensão da composição civil
aos procedimentos especiais. HC 74.581-CE, rel. Min.
Nelson Jobim, 9.9.97 .

Procuradores Autárquicos e Vencimentos


Iniciado o julgamento de recurso extraordinário
interposto pelo Estado do Piauí contra decisão que
reconhecera, com base no direito adquirido e à vista do
princípio da isonomia, o direito dos servidores do quadro de
procuradores autárquicos, lotados no Instituto de Terras do
Piauí - INTERPI, de terem seus proventos equiparados aos
vencimentos dos procuradores do Estado. Após os votos do
Min. Maurício Corrêa, relator, e do Min. Nelson Jobim,
dando provimento ao recurso para cassar a segurança, já que
a equiparação pretendida só é viável mediante lei (CF, art.
39, § 1 “A lei assegurará, aos servidores da administração
direta, isonomia de vencimentos para cargos de atribuições
iguais ou assemelhados do mesmo Poder ou entre servidores
dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário ...”), e do
Min. Marco Aurélio que não conhecia do extraordinário, o
julgamento foi suspenso em virtude de pedido de vista do
Min. Néri da Silveira. Precedentes citados: RREE 179.156-
PI (DJU de 22.8.97), 192.963-PI (DJU de 4.4.97) e 171.213-
PI (DJU de 29.8.97); ADIns 112-BA (DJU de 9.12.96) e
120-AM (DJU de 26.4.96). RE 199.791-PI, rel. Min.
Maurício Corrêa, 9.9.97 .

Sessões Ordinárias Extraordinárias Julgamentos

Pleno 10.9.97 11.9.97 13


1ª Turma 9.9.97 --------- 389
2ª Turma 9.9.97 --------- 117

CLIPPING DO DJ
12 de setembro de 1997

ADIN N. 123
RELATOR : MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ENSINO PÚBLICO.
DIRETORES DE ESCOLAS PÚBLICAS: ELEIÇÃO:
INCONSTITUCIONALIDADE. Constituição do Estado de Santa
Catarina, inciso VI do art. 162.
I. - É inconstitucional o dispositivo da Constituição de Santa
Catarina que estabelece o sistema eletivo, mediante voto direto e
secreto, para escolha dos dirigentes dos estabelecimentos de ensino.
É que os cargos públicos ou são providos mediante concurso
público, ou, tratando-se de cargo em comissão, mediante livre
nomeação e exoneração do Chefe do Poder Executivo, se os cargos
estão na órbita deste (C.F., art. 37, II, art. 84, XXV).
II. - Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.
* noticiado no Informativo 59

ADIN N. 356
RELATOR : MIN. OCTAVIO GALLOTTI
EMENTA: - 1. Não colhe, sob color de aplicação do art. 37, XI,
da Constituição, estabelecer vinculação entre a remuneração de
diferentes carreiras ou classes de determinado grupo ou categoria
funcional, com infração do disposto no inciso XIII do mesmo artigo.
2. Não estão sujeitas à observância do teto estabelecido no
citado item XI do art. 37 s vantagens de caráter individual
(Constituição, art. 39, § 1º). Precedentes: RE 141.788, RMS 21.841,
RMS 21.857, RMS 21.943, ADI 1.418, ADI 1.443, RE 185.842 e
ADI 1.550).
* noticiado no Informativo 77

HC N. 75.051
RELATOR : MIN. SYDNEY SANCHES
EMENTA: - DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL.
APROPRIAÇÃO INDÉBITA (ARTIGO 168, § 1º, III, DO CÓDIGO
PENAL). LEI Nº 9.099/95: ARTIGO 89, § 1º, INC. I:
REPARAÇÃO DO DANO. ARTIGOS 170 E 155, § 2º, DO
CÓDIGO PENAL. "HABEAS CORPUS".
1. Pratica crime de apropriação indébita, previsto no art. 168 do
Código Penal, com o aumento de pena previsto no inc. III de seu §
1º, o Advogado que, depois de receber o valor da prestação
alimentícia devida a sua constituinte, se recusa a entregá-la,
obrigando-a a uma ação de prestação de contas, para só depois de
vencido nesta, efetuar o pagamento.
2. Sendo de um ano de reclusão a pena mínima prevista no "caput"
do art. 168, mas sujeita necessariamente ao acréscimo de 1/3, por se
tratar de apropriação indébita praticada no exercício da profissão de
Advogado, não se aplica à ação penal o disposto no art. 89 da Lei nº
9.099/95 e, conseqüentemente, o inciso I de seu § 1º, relativamente à
reparação do dano.
3. A reparação do dano ocorrida após a consumação do crime,
ainda que anteriormente ao recebimento da denúncia, só tem como
efeito a atenuação da pena, mormente se, como no caso, a restituição
só veio a ocorrer por força de ação cível proposta pela vítima. E,
tendo sido aplicada a pena mínima, não poderia esta ser reduzida,
ainda que presente circunstância atenuante.
4. Não é de ser considerada, em caso como o "sub-judice", a figura
privilegiada do art. 170 do Código Penal, porquanto, a exemplo do
que ocorre com o furto privilegiado (art. 155, § 2º), não se
identificam os conceitos de pequeno valor da coisa apropriada e de
pequeno ou nenhum prejuízo da ação delituosa. Até porque a
restituição só se fez por inteiro, após o resultado de uma ação civil
de prestação de contas.
5. "H.C." indeferido. Decisão unânime.

HC N. 75.353
RELATOR : MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Recurso do assistente do Ministério Público contra
sentença condenatória: divergência jurisprudencial que não alcança a
espécie.
Lavra divergência sobre a admissibilidade da apelação supletiva do
ofendido, assistente do MP, que vise apenas à exasperação da pena
aplicada pela sentença condenatória; o recurso, no entanto, é de
induvidoso cabimento quando se questiona a própria mudança da
infração penal pela qual condenado o agente, com patente alteração
das conseqüências da condenação, sobretudo, como ocorre na
espécie, quando a desclassificação do fato para lesões corporais
implica atribuição aos ofendidos da prática de denunciação
caluniosa pela imputação ao réu do crime de roubo

AG (AgRg) N. 151.641
RELATOR : MIN. MOREIRA ALVES
EMENTA: Agravo regimental.
- Não tem razão a agravante.
Com efeito, o artigo 108, II, da Constituição Federal encerra
somente uma norma de competência segundo a qual, quando houver
recurso para a segunda instância (e nada impede que a legislação
ordinária não o admita), por não ter o texto constitucional criado, no
caso, recurso específico, caberá ao Tribunal Regional Federal julgá-
lo. Por isso, entendeu-se constitucional a Lei 6.825/80 em face da
Emenda Constitucional nº 1/69 à vista de seu artigo 122, III, que
continha a mesma regra contida no referido artigo 108, II, da atual
Carta Magna, que, assim, não revogou a mencionada Lei.
Agravo a que se nega provimento.
AG (AgRg) N. 192.883
RELATOR : MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: - CONSTITUCIONAL. ELEITORAL. PARTIDO
POLÍTICO: INTERVENÇÃO.
I. - A espécie diz respeito à intervenção da Executiva Regional do
Partido no Diretório Municipal, em situação de emergência, e não de
punição de filiado. Não há falar, portanto, em ofensa ao direito de
defesa.
II. - Questões processuais não autorizam a admissão do recurso
extraordinário.
III. - R.E. inadmitido. Agravo não provido.

AG (AgRg) N. 192.918
RELATOR : MIN. OCTAVIO GALLOTTI
EMENTA:- Acumulação de emprego de atendente de
telecomunicações de sociedade de economia mista, com cargo
público de magistério.
Quando viável, em recurso extraordinário, o reexame das atribuições
daquele emprego (atividade de telefonista), correto, ainda assim, o
acórdão recorrido, no sentido de se revestirem elas de
"características simples e repetitivas", de modo a afastar-se a
incidência do permissivo do art. 37, XVI, b, da Constituição.

RE N. 167.995
RELATOR : MIN. ILMAR GALVÃO
EMENTA: FARMÁCIAS E DROGARIAS. FIXAÇÃO DE
HORÁRIO PARA FUNCIONAMENTO. COMPETÊNCIA
MUNICIPAL. ALEGAÇÃO DE AFRONTA À LEGALIDADE, À
ISONOMIA, À LIVRE CONCORRÊNCIA E INICIATIVA E À
DEFESA DO CONSUMIDOR.
O estabelecimento de horário de funcionamento do comércio local é
inerente à autonomia municipal conferida pela Constituição ao
município para tratar de assunto de seu peculiar interesse (art. 30, I).
Afrontas constitucionais inocorrentes.
Recurso extraordinário não conhecido.

RE N. 170.554
RELATOR : MIN. ILMAR GALVÃO
EMENTA: COMPETÊNCIA. JUSTIÇA DO TRABALHO. AÇÃO
DE SINDICATO DE TRABALHADORES CONTRA
EMPREGADOR, PLEITEANDO CONTRIBUIÇÃO
ASSISTENCIAL ESTIPULADA EM CLÁUSULA DE
CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO. ARTIGO 114 DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI Nº 8.984/95.
A Lei nº 8.984/95, editada com base no art. 114 da Constituição
Federal, retirou do âmbito residual deixado à Justiça Comum dos
Estados a ação de sindicato de trabalhadores contra empregador,
tendo por objeto o adimplemento de obrigação assumida em
convenções ou acordo coletivo de trabalho, incluindo-se na órbita da
Justiça Trabalhista.
Incidência imediata da nova regra de competência às demandas em
curso.
Recurso extraordinário conhecido e provido.

RE N. 194.300
RELATOR : MIN. ILMAR GALVÃO
EMENTA: ICMS. VENDA DE BENS DO ATIVO FIXO DA
EMPRESA. NÃO INCIDÊNCIA DO TRIBUTO.
A venda de bens do ativo fixo da empresa não se enquadra na
hipótese de incidência determinada pelo art. 155, I, b, da Carta
Federal, tendo em vista que, em tal situação, inexiste circulação no
sentido jurídico-tributário: os bens não se ajustam ao conceito de
mercadorias e as operações não são efetuadas com habitualidade.
Recurso extraordinário não conhecido.

RE N. 200.329
RELATOR : MIN. ILMAR GALVÃO
EMENTA: PENSÃO ESPECIAL. MILITAR CONVOCADO
PARA O EXÉRCITO NO PERÍODO DE GUERRA. ART. 53, INC.
II, DO ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS
TRANSITÓRIAS. LEI Nº 5.315/67.
Não cabe, à guisa de interpretação extensiva, reconhecer o direito à
concessão de pensão especial a alguém que não seja ex-
combatente da Segunda Guerra Mundial ou não haja participado
ativamente de operações de guerra. Ser integrante de guarnição de
ilha costeira não é fato gerador do direito à pensão militar.
Recurso extraordinário conhecido e provido.

RMS N. 22.790
RELATOR : MIN. ILMAR GALVÃO
EMENTA: JUSTIÇA MILITAR. CONCURSO PÚBLICO PARA
PROVIMENTO DO CARGO DE JUIZ-AUDITOR SUBSTITUTO.
ACÓRDÃO QUE TEVE POR IMPRESTÁVEL À
COMPROVAÇÃO DO REQUISITO DO EXERCÍCIO DE
"FUNÇÃO QUE CONFIRA PRÁTICA FORENSE", EXIGIDO
PELO ART. 34, V, DA LEI Nº 8.457/92, O ASSESSORAMENTO
PRESTADO PELO MILITAR AO COMANDO DA
CORPORAÇÃO, NA PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES AO
PODER JUDICIÁRIO, A ELABORAÇÃO DE PARECERES E A
PARTICIPAÇÃO EM INQUÉRITOS POLICIAIS MILITARES, EM
SINDICÂNCIAS E EM PROCESSOS ADMINISTRATIVOS.
Entendimento que não pode ser tido por ofensivo a direito subjetivo
dos candidatos, dada a exigência legal de prática forense, atividade
que não se caracteriza senão mediante o exercício de função ligada à
militância forense, ainda que na qualidade de serventuário da
Justiça.
Recurso improvido.

Acórdãos publicados: 420

T R A N S C R I Ç Õ E
S

Com a finalidade de proporcionar aos leitores


do INFORMATIVO STF uma compreensão mais
aprofundada do pensamento do Tribunal,
divulgamos neste espaço trechos de decisões que
tenham despertado ou possam despertar de modo
especial o interesse da comunidade jurídica.

Conexão Probatória ou Instrumental


(v. Informativo 79)

HC 75.219-RJ*
Ministro Sepúlveda Pertence (voto-vista)

Voto-vista: Rememoro as passagens fundamentais do relatório do


em. Ministro Octavio Gallotti.
Ao votar, na linha do parecer da
Procuradoria-Geral, o em. Relator aplicou
ao caso acórdão de minha lavra, no qual,
em caso de conexão emprestei força
atrativa à competência da Justiça Federal -
especial em relação à Justiça dos Estados -
de modo a atrair os crimes conexos a
infrações de caráter federal, que à Justiça
local ordinariamente tocaria julgar (HC
68.339, 19.2.91, Pertence, RTJ 135/672).
Entendeu mais S. Exa. ser de
invocar o mesmo precedente no que nele se
mostrou ser de nossa jurisprudência que, na
“área da repartição constitucional da
competência de atribuições (...), o vício de
incompetência afeta ex radice o processo,
seja por falta absoluta de jurisdição do
órgão judiciário, seja porque, de regra,
envolverá a ilegitimidade ad causam do
ramo do Ministério Público de que partiu
a denúncia.”.
Afirmada assim a competência
para ambos da Justiça Federal, nela -
porque denunciados, no que corre perante o
Tribunal de Justiça do Estado, titulares do
foro por prerrogativa de função daquela
Corte -, concluiu finalmente o Ministro
Gallotti incumbir ao respectivo Tribunal
Regional Federal o processo e julgamento
de ambas as ações penais.
Veio-me, no entanto, a impressão
de que, com todas as vênias, o precedente
adequado ao caso específico não é aquele a
que se apegaram o parecer e o Relator, mas
outro, o acórdão plenário do RE 68.846,
quando - nos termos do voto que então
proferi - em hipótese de conexão e
continência, deu-se prevalência à
competência por prerrogativa de função do
Tribunal de Justiça para julgar Juiz de
Direito por crimes comuns sobre a
competência ratione materiae da Justiça
Federal; reconhecendo-se ainda à
competência local prevalente a força para
atrair o julgamento dos co-réus do
magistrado estadual, posto que particulares
e acusados de crimes federais (HC 68.846,
2.10.91, Galvão, RTJ 157/563).
Os dois precedentes - o HC 68.339,
invocado pelo Relator, e o HC 68.846, que
agora recordo - não se contradizem.
Também em matéria judiciária,
rege o princípio básico da divisão de
competências do nosso modelo federalista -
o da reserva aos Estados dos poderes
remanescentes.
A regra geral é que a competência
da Justiça dos Estados se apura por
exclusão da reservada pela Constituição
aos Juízes e Tribunais da União. A começar
da Justiça Federal ordinária, cuja
competência, porque ditada exaustivamente
na própria Constituição, exclui a da Justiça
dos Estados e, havendo conexão, atrai a
que ordinariamente a esta tocaria: essa, a
doutrina, aplicável à generalidade dos
casos, do HC 68.339, assim deduzida no
meu voto - RTJ 135/672, 675:
“Dada a conexão, é dominante a orientação
jurisprudencial no sentido da prevalência da competência da
Justiça Federal, determinada, no caso, por ter sido lesada, no
segundo roubo, a Caixa Econômica Federal, empresa pública
da União.
Esse entendimento, consagrado na Súmula 52 do
extinto Tribunal Federal de Recursos, tem sido igualmente
acolhido pelo Supremo Tribunal, sem maior discussão nas
poucas vezes em que enfrentou o problema (v.g., RHC 50.431,
2-10-72, Xavier de Albuquerque, RTJ 64/333; HC 52.356, 7-5-
74, Thompson Flores, DJ 7-6-74; HC 53.851, 21-11-75,
Cordeiro Guerra, RTJ 77/417; RHC 55.912, 4-4-78, Leitão de
Abreu, RTJ 87/437, CJ 6.540, 12-11-87, Sydney Sanches, DJ
11-12-87; incidentemente, o voto do em. Ministro Moreira
Alves, no RHC 56.355, 16-6-78, RTJ 90/460).
A mim me parece correta a jurisprudência. Embora
dissentindo de respeitáveis opiniões doutrinárias em contrário
(v.g. Tourinho Filho, Processo Penal, 1979, 2/176, e, em
termos, Frederido Marques, Trat. Dir. Proc. Penal, 1980,
I/251), estou em que os Juízes Federais e os Tribunais
Regionais Federais - não obstante sejam a Justiça ordinária,
em relação aos ramos especializados da Justiça da União -, no
quadro da organização judiciária nacional, constituem uma
Justiça especial, em relação à dos Estados, que é
verdadeiramente a Justiça comum detentora de toda a
competência residual.
De modo semelhante, no referido CJ 6.540, admitiu o
em. Ministro Sydney Sanches, em relação à Justiça Federal
ordinária que, “sob certo aspecto, essa jurisdição comum, por
aplicar o direito comum a crimes comuns, na verdade, tem
certa conotação especial, por ser ditada em razão da pessoa da
vítima”.
Sendo, nesse sentido, uma Justiça especial, a Justiça
Federal quando em concurso com a Justiça dos Estados - que,
em relação a ela, é a Justiça comum - atrai a competência para
julgar os crimes conexos àqueles de sua esfera constitucional
própria, por aplicação do art. 78, IV, C.Pr.Penal”.
Essa orientação não serve, porém,
quando, como sucedia no HC 68.846 e
como ocorre no caso presente, a
competência por prerrogativa de função do
Tribunal estadual é de hierarquia
constitucional - e mais: tem a nota expressa
da privatividade - de modo a afastar a
competência em razão da matéria da
Justiça Federal.
Acentuei, nessa linha - no ponto,
para acompanhar o em. Ministro Ilmar
Galvão, no HC 68.846, RTJ 157/563, 579:
“Há aqui, como já se disse da tribuna e foi acolhido
pelo eminente Relator, uma peculiaridade marcante da regra de
competência por prerrogativa de função do Tribunal de Justiça
para o julgamento dos juízes estaduais. Peculiaridade que se
marca, inicialmente, por sua fonte constitucional; depois, pela
nota expressa de privatividade que sempre se lhe deu; e,
terceiro, pela única ressalva nela contida a essa competência
por prerrogativa de função dos Tribunais de Justiça, que é
restrita à área da Justiça Eleitoral”.
E depois de recordar a solução da
matéria nos textos constitucionais
anteriores, prossegui - RTJ 157/580:
“Chega-se à Constituição de 88 que, malgrado
prescreva, o art. 125, que a competência dos Tribunais dos
Estados será definida na Constituição Estadual,
significativamente, no art. 96, quando arrola atribuições quase
todas elas de caráter político - administrativo, de todos os
Tribunais da República, tratou - salvo engano meu - de uma
única competência jurisdicional: precisamente para dizer, no
art. 96, III, que “compete privativamente ao Tribunal de Justiça
julgar os juízes estaduais e do Distrito Federal e Territórios” -
acrescentando: “bem como os membros do Ministério Público,
nos crimes comuns e de responsabilidade” - e a mesma ressalva
que vinha desde 67: “ressalvada a competência da Justiça
Eleitoral”.
Como reagiu o Supremo Tribunal Federal nas diversas
fases dessa evolução?
Na proposta de remessa ao Pleno, opus, à decisão do
CJ 2.649, de 30-4-62, de Victor Nunes, a de 6-9-78, no CJ
6.113, Moreira Alves. Mas a contraposição é aparente (e, aqui,
ratifico a afirmação contida na proposta, feita de improviso, de
que o quadro constitucional não se alterara
significativamente): havia entre os contextos subjacentes à
decisão de 62 e à de 78, uma diferença óbvia, que aqui já se
ressaltou: em 1946, não havia a ressalva da competência da
Justiça Eleitoral. E, como se tratava precisamente de
determinar a competência para julgar juiz estadual por crime
eleitoral, entendeu-se, em 1962, que, embora se cuidasse de
crime especial, da competência de uma Justiça Federal,
prevalecia a única regra constitucional específica, que era a da
competência dos Tribunais de Justiça para julgar os juízes a ele
vinculados. Já em 1978, o acórdão do eminente Ministro
Moreira Alves, no CJ 6.113, tinha, por si, a ressalva explícita
da competência da Justiça Eleitoral, em que cabia a hipótese.
O importante, verdadeiramente, no voto condutor do
Ministro Moreira Alves, no mencionado CJ 6.113, é a
observação - lembrada no memorial do ilustre advogado
Evaristo de Moraes Filho, sobre o caso presente, de que a
norma geral da competência da Justiça Eleitoral só poderia ser
afastada por norma especial contida na própria Constituição
da República. Citava então, S. Exa., o exemplo do foro do
Supremo Tribunal, por prerrogativa de função, dos
desembargadores dos Tribunais de Justiça, que se impunha,
como norma especial, a regra geral da competência da Justiça
Eleitoral para julgar crimes eleitorais. Ora, em relação ao
julgamento dos juízes estaduais por crimes comuns - ao
contrário do que sucede com relação a Secretários de Estado e
Deputados Estaduais, é, como aqui já repetidamente se notou, a
própria Constituição Federal que lhe garante, com nota de
privativamente, o foro do Tribunal de Justiça.
Problema similar foi enfrentado no Supremo Tribunal
na série de habeas-corpus rumorosos sobre Governadores de
Estado depostos pelo movimento de 1964 e acusados, depois,
de crimes contra a segurança nacional, em tese, da
competência da Justiça Militar. E é significativo notar que no
caso Miguel Arraes (HC 42.108, de 19-4-65 - RTJ 32/614), o
voto prevalecente, do eminente Ministro Evandro Lins e Silva,
teve como premissa fundamental a afirmação de que o foro por
prerrogativa de função dos Governadores não decorria apenas
da norma expressa do Código de Processo Penal e da Lei dos
Crimes de Responsabilidade, mas resultava, implicitamente, do
sistema da própria Constituição Federal. Por isso, S. Exa.
colocou o problema exclusivamente em termos constitucionais e
pôde afirmar, com a maioria do Tribunal (vencido apenas o
saudoso Ministro Luis Gallotti), que prevalecia aquele foro por
prerrogativa de função do Governador, que a maioria entendeu
resultar da própria Constituição Federal, sobre a competência
ratione materiae da Justiça Militar”.
E finalmente para enfrentar a
questão da vis atrativa, naquele caso, da
competência do Tribunal de Justiça do
Estado e afirmá-la, então - aí, contra o em.
Ministro Galvão, que votara pela cisão do
processo - alinhei diversos argumentos e
concluí - RTJ 157/583:
“Impressionou-me, Senhor Presidente, o argumento
inteligente, extraído do parecer do ilustre Professor Hélio
Tornaghi, que procura estender à situação o dispositivo do art.
79, nº I, do próprio Código de Processo Penal Brasileiro, que
exclui, não obstante a conexão ou a continência, a unidade de
processo e julgamento, no concurso entre a jurisdição comum e
a militar. Argumenta o ilustre tratadista que esta norma há de
ser ampliada para adequar-se às constituições supervenientes,
porque ditada sob a Carta de 37, quando a Justiça Militar era
a única Justiça especial.
Mas, a meu ver, data venia, o que se passa aqui não é
concurso entre a jurisdição comum, que seria a do Tribunal de
Justiça, e uma jurisdição especial, que seria a da Justiça
Federal ordinária. Na técnica constitucional brasileira, a
competência privativa por prerrogativa de função, salvo
ressalva constitucional expressa - que, no caso, é unicamente a
da Justiça Eleitoral - inclui até a área das jurisdições
propriamente especiais, a exemplo da Militar.
Ademais, a exclusão da força atrativa da Justiça
Militar continua a ter razão específica na delimitação de sua
competência constitucional para julgar civis a hipóteses
absolutamente taxativas, inampliáveis, aí sim, por conexão ou
por continência, o que continua a explicar a leitura estrita do
art. 79, nº I, do Código de Processo Penal”
Na espécie, acabei por concluir,
entretanto, que o problema da unidade do
processo para as duas ações penais
verdadeiramente não se põe, à falta de seu
pressuposto, que é a existência da conexão
entre os crimes de que tratam.
O que os liga - além da identidade
dos agentes da corrupção ativa - é apenas a
circunstância de a descoberta de ambos os
fatos - a remuneração continuada de
numerosos policiais estaduais, objeto do
processo em curso no Tribunal de Justiça,
de um lado, e, de outro, a corrupção, para a
prática de atos determinados de um
procedimento específico, de alguns policiais
federais e um funcionário estadual, objeto
do processo instaurado na Justiça Federal -
é apenas a circunstância de as duas séries
terem sido descobertas na mesma diligência
e que haja provas comuns a elas nos livros
e dados informatizados de contabilidade,
então apreendidos.
Da existência dessas provas
comuns a ambas as imputações é que se tem
extraído a idéia da conexão instrumental
que as vincularia.
A circunstância, porém, ao que
penso, não implica conexão.
Reporto-me, no particular, aos
fundamentos do voto proferido no HC
67.769 (Caso Naji Nahas), 28.11.89,
acolhido pela maioria da Turma - RTJ
142/491, 515:
“Tudo está, assim, na chamada conexão probatória ou
instrumental, objeto do inciso III do art. 76:
“III - quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas
circunstâncias elementares influir na prova de outra infração”.
Aqui é que me valho de uma obra que Xavier de
Albuquerque, modestamente, agora chama de um trabalho de
juventude, mas que é, sem favor, um pequeno trabalho, mas de
excepcional relevo na evolução do direito processual penal
brasileiro, quando, à época, ainda se ensaiavam os primeiros
passos do seu tratamento científico. Refiro à sua primorosa tese
de cátedra. Aspectos da Conexão, de 1956.
Leio o trecho a que remete o parecer do próprio Xavier
de Albuquerque (p. 55):
“A casuística da lei processual penal inclui ainda,
entre nós, a hipótese de conexão caracterizada pela
interferência probatória de uma infração em outra, a qual se
costuma denominar conexão probatória, conexão processual,
ou ainda conexão instrumental...
....................................
Diz-se, porém, que a conexão probatória, conquanto
objetiva, é figura de direito processual e não substancial - e daí
certamente a denominação, que também se lhe dá, de conexão
processual. A aceitar tal natureza exclusivamente adjetiva desse
tipo de conexidade - compreendendo-a, como seria irrecusável,
qual resultado de mera ficção jurídica completamente alheia à
realidade essencial das coisas e dos fatos -, estaremos a braços
com a dificuldade de manter coerência com a afirmativa de que
a conexão em matéria penal é pré-processual. Mas realmente
não nos convence a natureza exclusivamente processual do tipo
de conexão em exame, antes pelo contrário, somos por que o
vínculo que lhe constitui o substrato é, da mesma forma que o
dos demais tipos, de caráter substancial ou material”.
....................................
Assim, a filiação processual dessa conexidade
caracterizada pela interferência de provas entre dois ou mais
crimes há de ser, para nós, entendida em termos; não se trata
de pura ficção jurídica que haja por conexos crimes
absolutamente estranhos uns aos outros. O que ocorre é que,
sendo também material esse tipo de conexão, os próprios
crimes são conexos: a conexidade diz com os fatos, principais
ou secundários, que configuram os delitos. É vinculo objetivo
que se insinua por entre as infrações em si mesmas. Pertence
ao direito substantivo, porque a ele cabe a própria definição
delituosa dos fatos da vida social; o direito processual não a
cria, mas somente lhe ressalta a relevância, sublinhando
caracteres já existentes mas até então juridicamente
irrelevantes. É ela, também, por conseguinte, antecedente ao
processo; nasce com os próprios acontecimentos e não com o
ajuizamento das relações jurídico-penais que deles resultam”.
Aqui fico eu de pleno acordo com o ilustre mestre.
Trata-se, a conexão instrumental - ao contrário do que
a prática forense dela tem feito - de um vínculo objetivo entre
os crimes, “que se insinua por entre as infrações em si
mesmas”.
É ler o preceito legal. Não se contenta ele com mera
utilidade probatória da reunião de ações, como a prática
forense tende a fazer. Assim, por exemplo, se se estivesse
investigando vários homicídios atribuídos a jagunços contra
posseiros ou invasores de terra, no Bico do Papagaio, talvez
fosse muito útil que, para caracterizar a ambiência, as causas
da violência naquela região, por tais questões de terra, que se
unissem os vários processos. Mas isso não é a conexão
instrumental que o Código autoriza, como está claro no inciso
III do art. 76. Existe a conexão, que se diz processual ou
instrumental, “quando a prova de uma infração ou de qualquer
de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra
infração”: não é qualquer circunstância de uma infração que
acaso seja útil, concretamente, ao deslinde das circunstâncias
de outras, que determinará essa conexão instrumental. Um
exemplo típico, que se enquadra perfeitamente no texto legal, é
o da reunião num mesmo processo, da ação penal por furto com
a correspondente à receptação da coisa: aí, a prova de uma
infração, na medida em que esta infração é pressuposto da
existência da outra, influirá na prova dessa infração acessória.
Ora, creio que no caso nada existe, ao menos nos
termos da denúncia, que me permita afirmar esta conexão
instrumental. São fatos paralelos da Bolsa. São, talvez,
operações idênticas, mas o que leio na denúncia é que se trata
de grupos distintos. E em nenhuma outra peça desmente a
afirmação da impetração, neste caso, da inexistência de
relação negocial ou de comparsaria nestas ações de ambos os
acusados que são ações notórias e de conhecimento público de
todos os profissionais da Bolsa”.
Acompanhando-me, sintetizou o
Ministro Gallotti que não pode a conexão
probatória ser “impropriamente
subestimada até o ponto de confundir-se
com um simples critério de utilidade
forense” (RTJ 142/517).
O precedente é de aplicar-se à
espécie.
Sem embargo de sua vinculação
histórica no mesmo contexto da ação
corruptora da organização do jogo do
bicho no Rio de Janeiro, não há conexão,
sequer instrumental, entre o episódio que,
por envolver o serviço da Justiça Federal,
lá se processa, e a série de delitos em que
segundo a denúncia oferecida ao Tribunal
de Justiça, cotidianamente se materializava
o conúbio entre a contravenção e a Polícia
do Estado.
Falta a essa vinculação histórica o
dado que, conforme a lei, caracterizaria a
conexão instrumental: ainda que elementos
de prova em comum - o que apenas impõe a
extração de cópias - à prova da imputação
de crimes federais não importa se haja
provado ou não todos ou cada um dos
crimes da alçada estadual. E vice-versa.
De minha parte, portanto, data
venia, mantenho as coisas como estão e
indefiro o habeas-corpus: é o meu voto.

Ministro Octavio Gallotti (relator)

Retificação de voto: Sr. Presidente, peço a palavra para


reconsideração de voto.
Continuo na convicção de que não são os mesmos os fatos a
que responde o paciente em cada uma das ações, ao contrário do que
se afirma na inicial.
Mas reconheço que, ao invocar o precedente do Habeas
Corpus 68.399, do qual extrai a força atrativa da competência da
Justiça Federal, fiz abstração do precedente mais adequado, à
espécie dos autos, que é o do Habeas Corpus 68.846, também
relatado pelo eminente Ministro Sepúlveda Pertence, agora perante o
Tribunal Pleno, no sentido de que não se exerce essa atração quando
a competência originária do Tribunal Estadual decorre da própria
Constituição, visto ser de tal hierarquia o foro especial por
prerrogativa de função. Na hipótese do precedente, para julgar-se um
Juiz de Direito, e, aqui, um Promotor.
Mais do que isso, mostrou, porém, Sua Excelência, que
nem indispensável seria adentrar no exame das conseqüências da
conexão, dado que, no caso concreto, é verdadeiramente
circunstancial o liame entre as duas causas, em face da simples
descoberta das duas séries de fatos ditos criminosos, como resultado
na mesma diligência.
A unificação dos processos obedeceria, pois, não mais que a
um critério de utilidade, suprível pela extração de cópias dos
documentos.
Retifico, assim, o voto anterior para, na linha do douto
pronunciamento do eminente Ministro Pertence, indeferir o pedido.

*acórdão ainda não publicado.

Assessores responsáveis pelo Informativo


Maria Ângela Santa Cruz Oliveira
Márcio Pereira Pinto Garcia
informativo@stf.gov.br

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