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5ª aula

Sumário:
O som e sua intensidade. Sons e ultrasons. Nível de intensidade do som e audibilidade.

O som e sua intensidade

Nas aulas anteriores já fizemos referência ao som, o qual, aliás, até nos serviu de
exemplo de fenómeno ondulatório. Em particular, vimos que a onda sonora é uma onda
longitudinal de pressão: num dado instante, a pressão ao longo do espaço alterna entre
máximos e mínimos como mostra qualquer uma das faixas da Fig. 2.3. E, num dado
ponto, a pressão aumenta e diminui ao longo do tempo, como mostra a sequência de
faixas da mesma figura.
Vamos nesta aula estudar mais alguns aspectos ligados ao som.
A parte da Física que se ocupa do estudo do som chama-se acústica. Há sons
muito diferentes produzidos de maneiras muito diferentes. A fala, que resulta da
vibração das cordas vocais, é apenas uma delas. O ouvido humano permite ouvir e
distinguir sons muito variados. A altura, a intensidade e o timbre do som, permitem-nos
distinguir os sons uns dos outros e identificar, por vezes, a sua origem. Do timbre
falámos já na aula anterior. As outras duas características, que estão intimamente
ligadas à frequência e amplitude da onda sonora, vão ser abordadas nesta aula mais em
pormenor (apesar de também já terem sido afloradas nas aulas anteriores).
A Fig. 5.1 mostra uma “lâmina vibrante”.

Figura 5.1

Quando a lâmina começa a vibrar ouve-se um som e, modificando o


comprimento, l, da parte livre da lâmina esse som resultante da vibração da lâmina
modifica-se. Essa diferença ocorre porque é diferente número de oscilações que a
lâmina executa por unidade de tempo (número de movimentos completos de vaivém
efectuados num segundo pela ponta da lâmina). Tem portanto a ver com a frequência
(ou com o período) do movimento. O funcionamento das nossas cordas vocais é
semelhante. As cordas vocais possuem músculos que as podem esticar mais ou menos, o
que lhes permite vibrar de formas diferentes − tanto em frequência como em amplitude

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− quando fazemos passar ar por elas. Para a produção da voz humana também
contribuem o nariz e a boca (lábios e língua), bem como os pulmões.
A oscilação da lâmina representada na Fig. 5.1 força as partículas do ar em
volta a oscilar, a perturbação no ar propaga-se e gera-se uma onda sonora. Quando uma
onda sonora atinge a membrana do tímpano no nosso ouvido, esta entra em vibração e
desencadeia-se um conjunto de processos que nos permitem percepcionar o som. A
onda sonora entra pela orelha e é canalizada pelo canal auditivo (ouvido externo) para o
tímpano, que vibra. Essa vibração é depois transmitida a um sistema ósseo constituído
pelo martelo, bigorna e estribo (ouvido médio). A vibração passa ao ouvido interno
onde os canais semi-circulares fazem a ligação ao nervo auditivo. A vibração é
convertida em impulso eléctrico, o qual é comunicado ao cérebro (Fig. 5.2). O tempo
mínimo para que um som seja percepcionado a seguir a outro é 0,1 s. Dois sons, para
serem distinguidos, têm pois de chegar ao ouvido com um intervalo de tempo superior a
0,1 s.

Figura 5.2

A intensidade é a característica que permite distinguir um som forte de um som


fraco. Na linguagem comum diz-se que um som é forte quando pode ser ouvido a uma
distância grande. Caso contrário, o som é fraco. Quando se tange a corda de uma viola,
o som emitido será tanto mais forte quanto maior for a amplitude da vibração da corda
e, portanto, quanto maior for a força exercida na corda. O diapasão emite um som mais
intenso se for percutido com mais força e menos intenso se for percutido com menos
força. A lâmina da Fig. 5.1 produz um som tanto mais intenso quanto maior for a
amplitude da sua oscilação.
A onda sonora associada a um som menos intenso tem uma amplitude menor do
que a onda associada a um som mais intenso da mesma frequência. No primeiro caso as
partículas do ar vibram mais (quer dizer, vibram com uma amplitude maior) do que no
segundo caso, originando maiores oscilações de pressão (ou de densidade).
Um som produzido, por exemplo, por um pequeno diapasão propaga-se em
todas as direcções. A energia emitida por unidade de tempo a partir da fonte
distribui-se por áreas sucessivamente maiores. Portanto, a mesma energia vai pôr a
vibrar mais partículas e, por isso, cada partícula vibra menos. Se uma pessoa estiver
perto da fonte sonora, o seu tímpano vibrará com amplitude maior do que se estiver
longe, causando sensações bem diferentes.

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As partes a vermelho, verde e amarelo na Fig. 5.3 representam calotes esféricas
(porções de superfície esférica), todas com a mesma área, perpendiculares à direcção de
propagação do som. Para a esfera mais próxima da fonte a área vermelha é uma fracção
da superfície esférica a maior do que a área verde (da segunda calote) relativamente à
superfície esférica b; esta fracção é, por sua vez, ainda maior do que a área amarela
(calote mais exterior) relativamente à superfície esférica c. Como por cada uma das
superfícies esféricas fechadas a, b e c passa a mesma energia, às calotes vermelha, verde
e amarela – que têm áreas iguais – chegam energias sucessivamente menores.

Figura 5.3

Se a fonte no centro emitir a energia E no intervalo de tempo ∆t , a sua potência


é

E
P= . (5.1)
∆t

Num mesmo intervalo de tempo, a energia que atravessa cada uma das superfícies
esféricas a, b e c da Fig. 5.3 é a mesma (admitindo que não há absorção no meio, o que
nem sempre acontece). De resto, a energia que, por unidade de tempo, atravessa
qualquer superfície fechada que envolva a fonte é ainda a mesma se não houver
absorção no meio. A intensidade é a energia que, por unidade de tempo, atravessa uma
unidade de área perpendicular à direcção de propagação:

P E
I= = , (5.2)
S S∆t

onde S é a área da superfície. Então, sobre qualquer ponto da superfície esférica a de


raio ra, a intensidade é

P
Ia = . (5.3)
4 π ra2

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Se quisermos saber a energia (Ea) que atravessa a calote vermelha (de área Sa) num
intervalo de tempo τ , só temos de multiplicar a intensidade (5.3) por esta área e pelo
tempo: Ea = I a × S a × τ .
A expressão (5.3) mostra que, para uma fonte pontual que emita com uma
potência constante P, a intensidade é inversamente proporcional ao quadrado da
distância. Mostra ainda que no Sistema Internacional a intensidade se exprime em watts
por metro quadrado (W/m2).
Por outro lado, a energia associada a ondas com a mesma frequência depende do
quadrado da amplitude da onda, ou seja E ∝ A2 . Por exemplo, uma onda sonora com
amplitude dupla (e a mesma frequência) de outra transporta uma energia que é quatro
vezes superior.
A energia também depende da frequência. Para a mesma amplitude tem maior
energia a onda de maior frequência. A energia depende, portanto, de dois factores: da
amplitude e da frequência.
A intensidade, dado que é proporcional à energia − vide (5.2) − também depende
da amplitude e da frequência da onda. No caso da radiação electromagnética, a energia
depende do quadrado dos campos eléctrico e do campo magnético e também da
frequência. Quando se escreve a energia da radiação electromagnética monocromática
como E = nhν a dependência com o quadrado da amplitude incluída no factor n (para o
qual a frequência também contribui).
Voltaremos, mais à frente nesta aula a falar da intensidade do som. Antes,
porém, vamos ver uma outra característica do som: a altura.

Sons e ultrasons

Para além da intensidade e do timbre, a outra característica do som é a altura. Na


linguagem comum fala-se em som agudo (ou fino) e em som grave (ou grosso). Em
acústica o primeiro chama-se som alto e o segundo som baixo. A lâmina vibrante da
Fig. 3.1 produz um som tanto mais alto quanto mais curta for a sua parte livre pois a
lâmina mais curta realiza maior número de vibrações por unidade de tempo do que a
lâmina mais longa. A altura do som está directamente relacionada com o número de
vibrações efectuadas por unidade de tempo (frequência). Quando a corda mais grossa de
uma viola é tangida executa menos vibrações por unidade de tempo do que a corda mais
fina. A primeira produz um som baixo e a segunda um som alto.
É a altura do som musical que fixa o seu lugar na escala musical. A nota musical
de referência é o lá (mais precisamente o “lá3”) cuja frequência é 440 Hz. A onda
sonora correspondente produz 440 vibrações por segundo nas partículas do meio onde
se propaga. O comprimento de onda no ar é λlá = 340 / 440 ≈ 0,77 m.
O ouvido humano só é sensível a ondas sonoras com certas características de
intensidade e de altura, quer dizer, há sons audíveis e sons não audíveis. Só são
percepcionadas pelo ouvido humano normal ondas sonoras com frequências
compreendidas entre os 20 Hz e os 20 000 Hz, aproximadamente (os sons musicais
agradáveis têm frequências inferiores a 5000 Hz; os sons mais altos já se tornam
desagradáveis). Os sons naquela “banda de frequências” dizem-se audíveis. Se a
frequência for inferior a 20 Hz os sons são denominados infra-sons. Os ultra-sons, por
seu lado, têm frequência superior a 20 000 Hz. Os cães conseguem ouvir sons numa
“banda de frequências” mais larga do que o homem: são sensíveis a ondas sonoras
compreendidas entre 15 Hz e 50 000 Hz. Os morcegos, as baleias e os golfinhos podem
ouvir e emitir ondas sonoras com frequências até 120 000 Hz!

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O sonar (nome formado pelas iniciais de sound navigation and ranging) é um
sistema de localização e prospecção de obstáculos por meio de ondas sonoras, tirando
partido da sua reflexão. Uma maneira de conhecer a profundidade do mar num certo
sítio recorre a este instrumento. De um navio enviam-se ondas sonoras (na zona dos
ultra-sons, com frequências de 40 000 a 50 000 Hz) em direcção ao fundo do mar. Estas
ondas são reflectidas e detectadas de novo no navio. Pelo tempo t que decorre entre a
emissão e a recepção dos ultra-sons − ou seja, o seu eco − , e uma vez conhecida a
velocidade de propagação do som na água, v, fica a saber-se a profundidade:

vt
d= (5.4)
2

(notar o factor 2, porque há um percurso de ida e outro de volta). Este método tornou
possível traçar, com grande rigor, o mapa do fundo dos oceanos. Certos navios
pesqueiros (Fig. 5.4) também utilizam o sonar para detectar cardumes (nesse caso são os
peixes que reflectem a onda sonora).

Figura 5.4

Nas ecografias, bastante comuns em diagnóstico médico, utilizam-se


ultra-sons com frequências da ordem do milhão de ciclos por segundo (mega-hertz,
MHz). Com a ecografia podem obter-se imagens do interior do corpo humano por
exemplo dos bebés antes de nascerem (Fig. 5.5).

Figura 5.5

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Nível de intensidade do som e audibilidade

O ouvido humano normal distingue uma gama muito vasta de intensidades. A


intensidade sonora mais pequena que pode ser percepcionada é de 10−12 W/m2, que é
chamado limiar de audição. Uma intensidade de 1 W/m2 causa dor e uma intensidade
de 104 W/m2 causa a ruptura da membrana do tímpano. Numa conversa normal a
intensidade do som, quando atinge o tímpano, é cerca de 10−7 W/m2.
A intensidade sonora não é, de facto, uma grandeza muito apropriada devido à
gama muitíssimo alargada de valores possíveis que vai de 10−12 W/m2 a 104 W/m2, ou
mais ainda! Como cada potência de 10 é uma ordem de grandeza, têm-se 16 ordens de
grandeza! Além disso, o ouvido humano não avalia de forma directamente proporcional
as diferentes intensidades sonoras: por exemplo, um som com o dobro da intensidade de
outro causa uma sensação auditiva que não parece ser o dobro. Os sons mais fortes
parecem menos intensos do que são de facto.
Por estes motivos criou-se uma outra grandeza física, designada por nível de
intensidade sonora, relacionada com a intensidade. O nível de intensidade sonora mede-
se em decibéis, unidade que se representa por dB. O limiar de audibilidade (mínimo que
se consegue ouvir) corresponde a 0 dB e o limiar de dor (máximo que se consegue
aguentar) corresponde a 120 dB. Pode obter-se o nível de intensidade sonora, em
decibéis, a partir da intensidade, em watts por metro quadrado. A correspondência está
indicada na Tabela 5.1. Por exemplo, o nível de intensidade correspondente a 10−7
W/m2 é 50 dB.

Intensidade /W/m2
10−12 10−11 10−10 10−9 … 10−3 10−2 10−1 100=1
Nível de intensidade /dB
0 10 20 30 … 90 100 110 120

Tabela 5.1

A Tabela 5.2 indica os níveis de intensidade (que se medem com sonómetros)


em diversas situações.

Situação Nível de intensidade

Limiar de audição 0 dB

Sussurro de folhas 10 dB

Conversa muito baixa 20 dB

Conversa normal 50-60 dB

Trânsito intenso 80 dB

Discoteca / limiar de dor 120 dB

Avião a jacto a 20 m 130 dB

Ruptura do tímpano 160 dB

Tabela 5.2

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Se designarmos por I0 = 10−12 W/m2 a intensidade do limiar de audibilidade, o
nível de intensidade em decibéis relaciona-se com a intensidade I de acordo com

I
nível de intensidade [em dB] : β = 10 × Log (5.5)
I0

(ao nível de intensidade chama-se, por vezes, simplesmente intensidade).


O ser humano não ouve todas as frequências da mesma maneira. Alguns tipos de
surdez parcial resultam da incapacidade da pessoa ouvir sons com certas frequências,
qualquer que seja o seu nível de intensidade. Outro tipo de surdez, mais frequente nas
pessoas idosas (mas não só), resulta da insensibilidade do aparelho auditivo a sons
pouco intensos. Hoje em dia existem próteses auditivas que melhoram
consideravelmente a capacidade auditiva.
Um audiograma é um gráfico que representa o nível de intensidade em função
da frequência e que permite averiguar se os ouvidos estão a funcionar bem. Os
audiómetros, que são os aparelhos utilizados para registar os audiogramas, fazem
obviamente parte do equipamento de qualquer otorrinolaringologista. A Fig. 5.6
representa um audiograma de uma pessoa normal. Para uma dada frequência, vai-se
variando o nível de intensidade desde 0 dB até ao limiar de dor. A curva de baixo do
audiograma mostra o nível de intensidade mínima para que a pessoa possa ouvir o som.
A curva de cima tem um valor aproximadamente constante (120 dB). Como se vê na
figura 3.33, a pessoa consegue ouvir desde frequências pouco superiores a 20 Hz até
frequências um pouco menores do que 20 000 Hz. Para uma frequência de cerca de
3000 Hz o ouvido humano normal consegue detectar um som praticamente de 0 dB.

Figura 5.6

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