Brasil e o Capitalismo Histórico, O Passado e Presente Na Análise Dos Sistemas - Mundo Filomeno, Felipe Amin (Organizador) Vieira, Pedro Antonio (Organizador) e Vieira, Rosângela de Lima (Organizador)
logia. 3.ed.rev. e atual. Petrópolis: Vozes, 1992, 224p.
Metodologias qualitativas fazem a modelagem do seu caráter
na Sociologia não é um trabalho co- ora na direção da permanência, ora mum em se tratando de uma obra na direção da mudança" (p.211 ). Há versando sobre metodologia cien- também, ao longo dos capítulos, tífica, já que não se limita, embora uma constante preocupação com o o faça, a ensinar técnicas de pes- entrelaçamento da ação individual quisa. Ao contrário, ele é, do pre- e da ação coletiva. Já a Introdução fácio à última linha das Considera- deixa clara uma vontade teórica de ções Finais, animado por uma re- inquirir as fronteiras entre o empi- flexão teórica sobre as questões rismo, com sua valorização dos sen- fronteiriças do agir humano, das tidos, da indução e da aproximação ciências sociais e do ato de pesqui- direta com o real, e o racionalismo, sar. O Prefácio à terceira edição com sua confiança no papel da ra- revela que a motivação que presi- zão, da reflexão e da dedução. As diu à sua redação foi uma preocu- tensões ou mesmo conflitos entre pação em compreender as relações os imperativos políticos e aqueles entre "estrutura e ação individual". do fazer científico encontram des- Nas Considerações Finais lê-se: "O taque constante: quer-se apresen- jogo entre a permanência (estrutu- tar "uma discussão que exiba as ra) e o movimento (a ação social) angústias e impotencias de um cien- representa, de fato, o componente tista social que se pretende com- básico da sociedade... Não são as promissado com a justiça e a eqüi- estruturas as responsáveis pela ma- dade, mas que se sente preso aos nutenção da sociedade, nem são as imperativos do rigor científico" ações sociais que a movem. São as (p.22). "Onde situar as fronteiras entre ciência e política?", pergunta duas — estruturas e ações — que a autora. tornam a sociedade possível e que Um espírito questionador e uma sociedade primitiva ou de um dialético no sentido de levar a re- grupo humano, a sociologia — em flexão a superar os limites empo- sua vertente interacionista — fá-lo brecedores do real vivido marca a porque acredita que toda a organi- construção e o conteúdo da obra. zação societal está assentada nos O título já é questionador e polê- 'sentidos', nas 'definições' e nas mico: metodologias qualitativas na 'ações' que indivíduos e grupos ela- sociologia. A autora quer desfazer boram ao longo do processo de uma idéia largamente difundida en- 'interação simbólica' do dia-a-dia" tre os cientistas sociais, a saber, que (p.66-67). as metodologias qualitativas tive- As metodologias qualita- ram suas origens na antropologia. tivas na sociologia, nascem, por- "Os termos gerais 'trabalho de cam- tanto, em um ambiente social, po', 'pesquisa de campo', 'estudo de intelectual e teórico específico: a campo' eram usados tanto por an- sociologia americana da interação tropólogos, para se contrapor aos simbólica, "que se reporta em trabalhos que utilizavam o método origem a clássicos da sociologia do comparativo dos 'antropólogos de fim do século XIX tais como gabinete', como por sociólogos Cooley, Thomas e Mead, embora o americanos que reagiam à crescen- termo interacionismo simbólico te influência da teoria funcionalista, tenha sido cunhado por Herbert na sociologia... As duas áreas, an- Blumer em 1937" (p.25). Essa tropologia e sociologia, lançaram retificação sobre as origens so- mão de técnicas semelhantes na ciológicas das metodologias qua- abordagem do real, especialmente litativas permite à autora uma no valor que alocaram à participa- grande originalidade: iniciar seu ção do pesquisador no local pesqui- trabalho — Primeira Parte — por sado, e à necessidade de ver o mun- uma apresentação e uma discussão do através dos olhos pesquisados... dos "Fundamentos teóricos de Enquanto a antropologia busca o algumas metodologias qualitativas 'sentido das coisas* para melhor na sociologia". Desta forma, a compreender o funcionamento de autora estabelece que a pesquisa social com seus métodos e suas to de vista teórico sobre o real. A técnicas é caudatária de uma teoria, autora empenha-se em evitar uma de um olhar prévio sobre o mundo. escolha definitiva, valorativa ou Os métodos e as técnicas não são preconceituosa, entre métodos e autônomos, nem neutros. A obser- técnicas quantitativas e qualitativas. vação instrumentalizada não des- Para ela, o pesquisador deve utili- venda mecanicamente o real vivido, zar o tipo de método mais adequa- pois não prescinde de interpre- do para cada tipo de objeto de es- tações e visões de mundo. Pesquisar tudo: "os métodos quantitativos é sempre tematizar o real, dentro supõem uma população de objetos de uma dialética do sujeito e do de observação comparáveis entre si objeto, com a ajuda de métodos e e os métodos qualitativos enfatizam técnicas que permitem uma mais as especificidades de um fenômeno completa aproximação de um real em termos de suas origens e sua inesgotável e móvel, já que se mo- razão de ser" (p.63). Desta forma, difica constantemente através da interação. Esta primeira parte apre- "tanto as estruturas quanto os senta e discute as teorias da inte- microprocessos de ação social de- ração simbólica nas vertentes de vem ser conhecidos, analisados e George Herbert Mead, de Herbert interpretados, cabendo a cada um a Blumer e Manford Kuhn e, mais metodologia apropriada, a metodo- rapidamente, nas elaborações parti- logia que melhor se adequa ao pro- culares de Harold Garfinkel, a etno- blema que se deseja investigar" metodologia, e de Erving Goffman, (p.20). Quatro técnicas da meto- a dramaturgia social terminando dologia qualitativa são discutidas, com um quadro conclusivo e críti- destacando suas origens, seu poten- co do ponto de vista da interação cial e suas limitações: a observação simbólica. participante, a história de vida, a A Segunda Parte pode, en- entrevista e a história oral. As Con- tão, discutir as metodologias quali- clusões apresentam um balanço dos tativas sem medo de que sejam con- méritos e limites das metodologias sideradas independentes de um pon- quantitativas e qualitativas. A Terceira Parte novamente quete operária exposta por Michel manifesta originalidade e vontade Thiollent, a intervenção sociológica de não deixar escapar nada que de Alain Touraine e a pesquisa-ação possa instrumentalizar o pesqui- institucional de René Barbier como sador na sua conquista do real. Em exemplos de pesquisa-ação e uma conseqüência das críticas à meto- síntese de vários trabalhos sobre a dologia da pesquisa tradicional das pesquisa-participante, a autora pro- ciências sociais, especialmente no cura responder a essas perguntas, que se refere à sua falta de neutra- para concluir que se "a interferência lidade e objetividade e seu postu- do sujeito jqnto ao objeto de pesqui- lado de distanciamento entre sujeito sa — a quebra da objetividade (pro- e objeto de pesquisa, várias alterna- vocada pela pesquisa-ação e pela tivas de pesquisa foram propostas, pesquisa participante) — se justi- entre as quais a pesquisa-ação e a fica, porque não é a captação do real pesquisa-participante. Essas alter- em determinado momento que inte- nativas remetem à necessidade "não ressa e que representa o objetivo da só da inserção do pesquisador no pesquisa participante e da pesquisa- meio, como de uma participação ação, mas um conhecimento em efetiva da população pesquisada no processo que se estabelece. Isto não processo de geração do conheci- significa que toda geração de co- mento, concebido fundamental- nhecimento deva necessariamente mente como um processo de educa- tomar esta forma... Nada garante ção coletiva... no intuito de mini- que as explicações, interpretações, mizar as desigualdades sociais nos ações e práticas da pesquisa parti- seus mais variados matizes (desi- cipante e da pesquisa-ação sejam gualdades de poder, de saber etc.)" aquelas mais próximas "do verda- (p. 109). Mas, o que são essas pes- deiro" — consonância entre o que quisas alternativas, quais são seus é dito e o que é — nem que elas fundamentos teóricos, epistemoló- conduzam ao melhor tipo de ação gicos e metodológicos, e como se liberadora" (p.208-209). comparam, criticamente, com a pes- A Quarta Parte retoma a quisa tradicional? Escolhendo a en- questão dos fundamentos teóricos da metodologia qualitativa na sociolo- qualitativa, o livro da professora gia, mas, desta vez, em uma pers- Teresa Haguette convida a uma re- pectiva marxista. A intenção é des- flexão sobre o significado e as con- cobrir se existe afinidade teórica en- seqüências teóricas, sociais e éticas tre os pressupostos das metodo- do ato de pesquisar. As metodo- logias qualitativas e a teoria mar- logias e as técnicas são, de fato, xista ou, melhor, as teorias marxis- ensinadas, mas dentro de uma in- tas. Em outras palavras, quais as re- tenção teórica, interpretativa e crí- lações entre estrutura e ação indi- tica, o que dá ao livro um valor pe- vidual no marxismo? É certo que a interpretação estruturalista do mar- dagógico inegável e justifica seu xismo minimizou a importância da sucesso. O leitor aprende que não ação individual na interpretação so- existe empreendimento científico ciológica. Mas o que dizer do mar- sem qualidade na observação, rigor xismo analítico? Não estaria ele res- científico e atenção analítica que tabelecendo "o trânsito, o individu- sustentem o caráter fundamental- al, o coletivo e o estrutural, abrin- mente interpretativo, teórico e éti- do amplas possibilidades para a ex- co da pesquisa social. A bibliogra- plicação de fenômenos sociais an- fia e as notas de rodapé, bem docu- tes obnubilados pelas várias orto- mentadas, incitam o leitor a com- doxias que cerceavam a imagina- plementar os capítulos necessaria- ção sociológica, tão cara a Marx mente sucintos. Vale notar um erro quanto a Wright Mills"? (p. 12). Afi- editorial: há dois capítulos XII; o nal de contas, a imaginação socio- primeiro é, na verdade, o XIII e lógica pressupõe, nos dizeres de deveria vir após o segundo. C.W. Mills, um trânsito entre "bio- grafia e história", pressuposto tam- bém das metodologias qualitativas. André Haguette Mais do que introduzir aos Universidade Federal do Ceará métodos e às técnicas da pesquisa (UFC)
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