Resumo Haguette Interação Simbólica PDF

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HAGUETTE, Teresa Maria Frota.

Metodologias qualitativas na Socio-


logia. 3.ed.rev. e atual. Petrópolis: Vozes, 1992, 224p.

Metodologias qualitativas fazem a modelagem do seu caráter


na Sociologia não é um trabalho co- ora na direção da permanência, ora
mum em se tratando de uma obra na direção da mudança" (p.211 ). Há
versando sobre metodologia cien- também, ao longo dos capítulos,
tífica, já que não se limita, embora uma constante preocupação com o
o faça, a ensinar técnicas de pes- entrelaçamento da ação individual
quisa. Ao contrário, ele é, do pre- e da ação coletiva. Já a Introdução
fácio à última linha das Considera- deixa clara uma vontade teórica de
ções Finais, animado por uma re- inquirir as fronteiras entre o empi-
flexão teórica sobre as questões rismo, com sua valorização dos sen-
fronteiriças do agir humano, das tidos, da indução e da aproximação
ciências sociais e do ato de pesqui- direta com o real, e o racionalismo,
sar. O Prefácio à terceira edição com sua confiança no papel da ra-
revela que a motivação que presi- zão, da reflexão e da dedução. As
diu à sua redação foi uma preocu- tensões ou mesmo conflitos entre
pação em compreender as relações os imperativos políticos e aqueles
entre "estrutura e ação individual". do fazer científico encontram des-
Nas Considerações Finais lê-se: "O taque constante: quer-se apresen-
jogo entre a permanência (estrutu- tar "uma discussão que exiba as
ra) e o movimento (a ação social) angústias e impotencias de um cien-
representa, de fato, o componente tista social que se pretende com-
básico da sociedade... Não são as promissado com a justiça e a eqüi-
estruturas as responsáveis pela ma- dade, mas que se sente preso aos
nutenção da sociedade, nem são as imperativos do rigor científico"
ações sociais que a movem. São as (p.22). "Onde situar as fronteiras
entre ciência e política?", pergunta
duas — estruturas e ações — que
a autora.
tornam a sociedade possível e que
Um espírito questionador e uma sociedade primitiva ou de um
dialético no sentido de levar a re- grupo humano, a sociologia — em
flexão a superar os limites empo- sua vertente interacionista — fá-lo
brecedores do real vivido marca a porque acredita que toda a organi-
construção e o conteúdo da obra. zação societal está assentada nos
O título já é questionador e polê- 'sentidos', nas 'definições' e nas
mico: metodologias qualitativas na 'ações' que indivíduos e grupos ela-
sociologia. A autora quer desfazer boram ao longo do processo de
uma idéia largamente difundida en- 'interação simbólica' do dia-a-dia"
tre os cientistas sociais, a saber, que (p.66-67).
as metodologias qualitativas tive- As metodologias qualita-
ram suas origens na antropologia. tivas na sociologia, nascem, por-
"Os termos gerais 'trabalho de cam- tanto, em um ambiente social,
po', 'pesquisa de campo', 'estudo de intelectual e teórico específico: a
campo' eram usados tanto por an- sociologia americana da interação
tropólogos, para se contrapor aos simbólica, "que se reporta em
trabalhos que utilizavam o método origem a clássicos da sociologia do
comparativo dos 'antropólogos de fim do século XIX tais como
gabinete', como por sociólogos Cooley, Thomas e Mead, embora o
americanos que reagiam à crescen- termo interacionismo simbólico
te influência da teoria funcionalista, tenha sido cunhado por Herbert
na sociologia... As duas áreas, an- Blumer em 1937" (p.25). Essa
tropologia e sociologia, lançaram retificação sobre as origens so-
mão de técnicas semelhantes na ciológicas das metodologias qua-
abordagem do real, especialmente litativas permite à autora uma
no valor que alocaram à participa- grande originalidade: iniciar seu
ção do pesquisador no local pesqui- trabalho — Primeira Parte — por
sado, e à necessidade de ver o mun- uma apresentação e uma discussão
do através dos olhos pesquisados... dos "Fundamentos teóricos de
Enquanto a antropologia busca o algumas metodologias qualitativas
'sentido das coisas* para melhor na sociologia". Desta forma, a
compreender o funcionamento de autora estabelece que a pesquisa
social com seus métodos e suas to de vista teórico sobre o real. A
técnicas é caudatária de uma teoria, autora empenha-se em evitar uma
de um olhar prévio sobre o mundo. escolha definitiva, valorativa ou
Os métodos e as técnicas não são preconceituosa, entre métodos e
autônomos, nem neutros. A obser- técnicas quantitativas e qualitativas.
vação instrumentalizada não des- Para ela, o pesquisador deve utili-
venda mecanicamente o real vivido, zar o tipo de método mais adequa-
pois não prescinde de interpre- do para cada tipo de objeto de es-
tações e visões de mundo. Pesquisar tudo: "os métodos quantitativos
é sempre tematizar o real, dentro supõem uma população de objetos
de uma dialética do sujeito e do de observação comparáveis entre si
objeto, com a ajuda de métodos e e os métodos qualitativos enfatizam
técnicas que permitem uma mais as especificidades de um fenômeno
completa aproximação de um real
em termos de suas origens e sua
inesgotável e móvel, já que se mo-
razão de ser" (p.63). Desta forma,
difica constantemente através da
interação. Esta primeira parte apre- "tanto as estruturas quanto os
senta e discute as teorias da inte- microprocessos de ação social de-
ração simbólica nas vertentes de vem ser conhecidos, analisados e
George Herbert Mead, de Herbert interpretados, cabendo a cada um a
Blumer e Manford Kuhn e, mais metodologia apropriada, a metodo-
rapidamente, nas elaborações parti- logia que melhor se adequa ao pro-
culares de Harold Garfinkel, a etno- blema que se deseja investigar"
metodologia, e de Erving Goffman, (p.20). Quatro técnicas da meto-
a dramaturgia social terminando dologia qualitativa são discutidas,
com um quadro conclusivo e críti- destacando suas origens, seu poten-
co do ponto de vista da interação cial e suas limitações: a observação
simbólica. participante, a história de vida, a
A Segunda Parte pode, en- entrevista e a história oral. As Con-
tão, discutir as metodologias quali- clusões apresentam um balanço dos
tativas sem medo de que sejam con- méritos e limites das metodologias
sideradas independentes de um pon- quantitativas e qualitativas.
A Terceira Parte novamente quete operária exposta por Michel
manifesta originalidade e vontade Thiollent, a intervenção sociológica
de não deixar escapar nada que de Alain Touraine e a pesquisa-ação
possa instrumentalizar o pesqui- institucional de René Barbier como
sador na sua conquista do real. Em exemplos de pesquisa-ação e uma
conseqüência das críticas à meto- síntese de vários trabalhos sobre a
dologia da pesquisa tradicional das pesquisa-participante, a autora pro-
ciências sociais, especialmente no cura responder a essas perguntas,
que se refere à sua falta de neutra- para concluir que se "a interferência
lidade e objetividade e seu postu- do sujeito jqnto ao objeto de pesqui-
lado de distanciamento entre sujeito sa — a quebra da objetividade (pro-
e objeto de pesquisa, várias alterna- vocada pela pesquisa-ação e pela
tivas de pesquisa foram propostas, pesquisa participante) — se justi-
entre as quais a pesquisa-ação e a fica, porque não é a captação do real
pesquisa-participante. Essas alter- em determinado momento que inte-
nativas remetem à necessidade "não ressa e que representa o objetivo da
só da inserção do pesquisador no pesquisa participante e da pesquisa-
meio, como de uma participação ação, mas um conhecimento em
efetiva da população pesquisada no processo que se estabelece. Isto não
processo de geração do conheci- significa que toda geração de co-
mento, concebido fundamental- nhecimento deva necessariamente
mente como um processo de educa- tomar esta forma... Nada garante
ção coletiva... no intuito de mini- que as explicações, interpretações,
mizar as desigualdades sociais nos ações e práticas da pesquisa parti-
seus mais variados matizes (desi- cipante e da pesquisa-ação sejam
gualdades de poder, de saber etc.)" aquelas mais próximas "do verda-
(p. 109). Mas, o que são essas pes- deiro" — consonância entre o que
quisas alternativas, quais são seus é dito e o que é — nem que elas
fundamentos teóricos, epistemoló- conduzam ao melhor tipo de ação
gicos e metodológicos, e como se liberadora" (p.208-209).
comparam, criticamente, com a pes- A Quarta Parte retoma a
quisa tradicional? Escolhendo a en- questão dos fundamentos teóricos da
metodologia qualitativa na sociolo- qualitativa, o livro da professora
gia, mas, desta vez, em uma pers- Teresa Haguette convida a uma re-
pectiva marxista. A intenção é des- flexão sobre o significado e as con-
cobrir se existe afinidade teórica en- seqüências teóricas, sociais e éticas
tre os pressupostos das metodo- do ato de pesquisar. As metodo-
logias qualitativas e a teoria mar- logias e as técnicas são, de fato,
xista ou, melhor, as teorias marxis- ensinadas, mas dentro de uma in-
tas. Em outras palavras, quais as re- tenção teórica, interpretativa e crí-
lações entre estrutura e ação indi-
tica, o que dá ao livro um valor pe-
vidual no marxismo? É certo que a
interpretação estruturalista do mar- dagógico inegável e justifica seu
xismo minimizou a importância da sucesso. O leitor aprende que não
ação individual na interpretação so- existe empreendimento científico
ciológica. Mas o que dizer do mar- sem qualidade na observação, rigor
xismo analítico? Não estaria ele res- científico e atenção analítica que
tabelecendo "o trânsito, o individu- sustentem o caráter fundamental-
al, o coletivo e o estrutural, abrin- mente interpretativo, teórico e éti-
do amplas possibilidades para a ex- co da pesquisa social. A bibliogra-
plicação de fenômenos sociais an- fia e as notas de rodapé, bem docu-
tes obnubilados pelas várias orto- mentadas, incitam o leitor a com-
doxias que cerceavam a imagina- plementar os capítulos necessaria-
ção sociológica, tão cara a Marx mente sucintos. Vale notar um erro
quanto a Wright Mills"? (p. 12). Afi- editorial: há dois capítulos XII; o
nal de contas, a imaginação socio- primeiro é, na verdade, o XIII e
lógica pressupõe, nos dizeres de deveria vir após o segundo.
C.W. Mills, um trânsito entre "bio-
grafia e história", pressuposto tam-
bém das metodologias qualitativas. André Haguette
Mais do que introduzir aos Universidade Federal do Ceará
métodos e às técnicas da pesquisa (UFC)

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