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Sociologia

1ª Unida de

Tiago Arcanjo Orben


Copyright Centro Universitário Fundação Assis Gurgacz, Núcleo de Educação a Distância.
Todos os direitos são reservados. É proibida a reprodução, distribuição, comercialização ou
cessão sem autorização dos detentores dos direitos. Esse livro foi publicado no Ambiente
Virtual de Aprendizagem do Centro Universitário Fundação Assis Gurgacz, para leitura
exclusiva online pelos alunos matriculados no Ensino a Presencial. Os leitores poderão imprimir
as páginas para leitura pessoal. Os direitos dessa obra não foram cedidos.

Sociologia Autores: Tiago Arcanjo Orben


Título: Sociologia

Introdução À Sociologia
1ª Unida de

Diretor geral: Cleber Fagundes Ramos


Gerente de produção: Vanessa Anderle Zaiatz
Design Instrucional: Anderson Julio de Souza
Tiago Arcanjo Orben
Projeto gráfico: Bruno Vinícius dos Reis
Diagramação: Júlia Tonin Bordin

1ª Edição
2019

fag.edu.br
Av. das Torres, 500, Bloco 03
Fone: (045) 3321-3422
Loteamento FAG | ​​CEP: 85.806-095
Cascavel | Paraná | Brasil
Sumário

Apresentação da Disciplina.................................................................................10

Ponto de Partida........................................................................................................ 11

Roteiro do Conhecimento.................................................................................... 12

Unidade 01 - Introdução à Sociologia............................................................. 14

1.1 - Pressupostos, Origem e Desenvolvimento................................ 15

1.2 - O Indivíduo, A Sociedade e a Socialização............................. 28

1.3 - Uma Ciência da Sociedade............................................................. 40

1.4 - Augusto Comte e o Positivismo................................................... 52

O Que Aprendemos................................................................................................66

Referências.................................................................................................................. 67

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Apresentação da Disciplina PONTO DE PARTIDA

Olá, estimado (a) aluno (a), seja muito bem-vindo (a) a mais uma etapa
de seu processo de formação profissional. É com satisfação que apresento
o livro didático da disciplina de Sociologia. No decorrer deste livro você Nesta primeira unidade da disciplina de Sociologia vamos conversar
vai conhecer as principais características da sociologia, seus percursores um pouco sobre as características gerais da sociologia, seus pressupostos,
e objetos de estudos. Para tanto, trabalharemos com os pensadores que sua origem e consequentemente seu desenvolvimento. Além disso,
foram, e ainda são, essenciais para que possamos compreender as relações também estudaremos o indivíduo, a sociedade e alguns preceitos
humanas em sociedade a partir de seus distintos valores culturais. do chamado positivismo. Todos esses elementos são essenciais para
Dessa maneira, o debate será conduzido para que você não só compreendermos de que maneira a sociologia pode nos ajudar em nossa
tenha consciência da importância da sociologia para as nossas vivências atuação profissional.
em sociedade, mas, também, para que possamos nos apropriar de Ao final desta unidade, você deve apresentar os seguintes
tais conhecimentos em nossa prática profissional enquanto futuros aprendizados:
administradores e gestores. • Compreender os pressupostos de origem e desenvolvimento da
Ao longo da disciplina, vamos trabalhar quatro unidades estruturantes Sociologia ao longo da História.
para seu aprendizado sobre a Sociologia. Assim sendo, você vai ver os
seguintes conteúdos: • Refletir o indivíduo, a sociedade e o processo de socialização que
Unidade 1: Introdução à Sociologia. regem as diferentes sociedades.
Unidade 2: Abordagens clássicas e diferentes perspectivas de análise. • Entender a compreensão da Sociologia enquanto ciência e de que
Unidade 3: O processo de globalização, os conflitos da expansão maneira podemos nos apropriar de tais conhecimentos.
capitalista e a diversidade nas manifestações culturais.
• Perceber os preceitos positivistas e sua influência no constituir das
Unidade 4: Pós-moderno: o avanço e as transformações no capitalismo
interpretações sociológicas.
tardio.
Que nossos estudos sejam prazerosos e repletos de conhecimento!

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ROTEIRO DO CONHECIMENTO

No decorrer desta unidade, você conhecerá as características da


Sociologia, sua importância para compreendermos a organização da
sociedade, além das relações estabelecidas pelos indivíduos para a boa
convivência em sociedade.
A seguir, você pode acompanhar todas as seções que serão trabalhadas
ao longo da unidade, que é intitulada: Introdução à Sociologia:
1.1 - Pressupostos, origem e desenvolvimento.
1.2 - O indivíduo, a sociedade e a socialização.
1.3 - Uma ciência da sociedade.
1.4 - Augusto Comte e o positivismo.

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UNIDADE 01 - INTRODUÇÃO À SOCIOLOGIA 1.1 - P r e s s u p o s t o s , O r i g e m e D e s e n v o lv i m e n t o

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Como você deve ter notado, nosso objetivo neste primeiro tópico
de nossa primeira unidade de sociologia é apresentar os pressupostos
gerais da sociologia, ou seja, em que momento surge e de que maneira se
desenvolve ao longo do tempo. De tal modo, inicialmente podemos dizer
que esta disciplina é consideravelmente nova, já que sua consolidação
acontece apenas no século XIX, digo isso, pois, temos disciplinas ou
formas de pensar a sociedade que existem desde a Antiguidade Clássica Note, estimado (a) aluno (a), que mesmo não existindo o estudo da
Greco-romana, o que é o caso da Filosofia. sociologia assim denominada, já tínhamos pensadores que se propunham
Mas, eu imagino que você deve estar se perguntando, mas professor, pensar a sociedade e as relações estabelecidas pelos indivíduos. Mas, é
então em períodos anteriores as pessoas não pensavam criticamente em em grande medida para responder o quadro social que era apresentada a
relação à economia, a política ou mesmo a sociedade? Europa Ocidental em meio ao desenvolvimento do sistema capitalista de
Já que esta é uma característica marcante da sociologia! De imediato produção que a sociologia passa a ser ponderada. Nessa seara, Lorensetti
eu diria que sim, conforme nos lembra o sociólogo Everaldo Lorensetti destaca que é em razão das “transformações profundas, provocadas
“a angustia de se entender as sociedades” a partir de uma perspectiva pela consolidação do sistema capitalista, pela valorização da ciência
sociológica pode ser vista na Grécia Antiga, quando os sofistas começam contrapondo as explicações míticas a respeito do mundo”, e “pelos conflitos
“a dar mais atenção para os problemas sociais e políticos da época” derivados das condições de vida miseráveis dos operários, confrontadas
(LORENSETTI, 2006, p. 22). com o enriquecimento da classe burguesa”, que a sociologia procura se
constituir enquanto campo de estudo (LORENSETTI, 2006, p. 28).
Dessa maneira, mesmo não sendo os gregos os criadores da
sociologia, foram eles que “iniciaram o pensamento crítico filosófico”, Observe que para além de questionar a organização das sociedades
impulsionando o surgimento daquilo que podemos chamar ciência nos a partir do sistema capitalista de produção, a sociologia quando do seu
dias atuais (LORENSETTI, 2006, p. 22). Nesse sentido, Lorensetti nos surgimento também se inseria em um contexto de valorização da ciência,
expõe alguns elementos dessa conjuntura da seguinte maneira: ou seja, de que o mundo deveria ser compreendido a partir das explicações
científicas e não das míticas, que dominaram as formas de pensar de
Foram com os filósofos gregos Platão (427-347 a.C.) e Aristóteles
várias sociedades, ao longo da chamada Idade Média.
(384-322 a.C.), que surgiram os primeiros passos dos trabalhos mais
reflexivos sobre a sociedade. Platão foi defensor de uma concepção
idealista e acreditava que o aspecto material do mundo seria um tipo de
fruto imperfeito das ideias universais, as quais existem por si mesmas.
Aristóteles já mencionava que o homem era um ser que, necessariamente,
nasce para estar vivendo em conjunto, isto é, em sociedade (LORENSETTI,
2006, p. 22).

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Mas, o que podemos chamar de
ciência?
Ciência nada mais é do que
a produção de conhecimentos
intelectuais constituídos a partir da
observação, identificação, pesquisa e
consequentemente explicação. Vamos
tomar um exemplo, não faz parte do
universo científico às teorias religiosas
sobre a criação do mundo ou do homem,
já que tais explicações estão assentadas
em crenças e mitos religiosos.
Figura 1.1 - A Sociologia desenvolve-se enquanto forma de
entendermos a sociedade e suas relações sociais, no momento em
que há um grande desenvolvimento da ciência enquanto forma de
compreendermos a humanidade.
Fonte: Adaptado de freepik.com
Eva Maria Lakatos nos traz uma interessante definição de ciência
que nos ajuda a compreender de forma mais apurada de que maneira a
sociologia enquanto ciência foi constituída:
Entendemos por ciência uma sistematização de conhecimentos,
um conjunto de proposições logicamente correlacionadas sobre o
comportamento de certos fenômenos que se deseja estudar. “A ciência
é todo um conjunto de atitudes e de atividades racionais dirigidas ao
sistemático conhecimento com objeto limitado, capaz de ser submetido
a verificação” (LAKATOS, 1990, p. 19).
Observe que a ciência nada mais é que a sistematização de
conhecimentos constituídos a partir da observação e da pesquisa. Ou Por esse motivo, caro (a) aluno (a), caso você queira conhecer as
seja, é uma forma de ver e pensar o mundo diferente da religiosa, que relações econômicas, políticas, sociais e culturais que regiam determinada
procura observar e explicar o mundo a partir dos preceitos religiosos. realidade histórica, a sociologia em diálogo com a história pode lhe
Além disso, Lakatos também nos lembra que “pode-se conceituar o oferecer interessantes e importantes pressupostos de pesquisa. Vamos
aspecto lógico da ciência como o método de raciocínio e inferência acerca pensar em um exemplo, caso você esteja interessado (a) em pesquisar a
de fenômenos já conhecidos ou a serem investigados”. Por meio da lógica Sociedade Feudal e sua organização social, certamente a sociologia por
construímos preposições e enunciados que visam descrever e interpretar, meio de seus métodos e de referenciais teóricos lhe dará subsídios para
além de almejar uma explicação mais precisa sobre determinados fatos que você possa pensar aquela sociedade.
sociais (LAKATOS, 1990, p. 19, 20). No caso da sociologia, seu aspecto É evidente que a maioria dos sociólogos visa estudar as relações entre
científico está no interpretar das sociedades, na verificação das estruturas os indivíduos na sociedade contemporânea a partir do sistema capitalista
sociais que regem a nossa sociedade e outras do passado ou mesmo da de produção, já que é para ponderar a realidade social surgida deste
contemporaneidade. sistema que a sociologia se desenvolve. Mas, é importante que você saiba
Vista sob esta ótica a sociologia serve para compreendermos, por que podemos sim pensar os aspectos sociológicos quando nos referimos a
exemplo, as relações econômicas, políticas e sociais que regem a nossa outros períodos históricos, mesmos que eles estejam em uma conjuntura
sociedade, de que maneira estão divididas as classes socais na sociedade histórica distante.
brasileira. Mas, não só isso, ela visa pensar esses mesmos questionamentos
em relação a outras sociedades e outros períodos históricos.
Lakatos nos traz ainda uma interessante definição sobre a sociologia
enquanto área de estudos das Ciências Humanas, ao enfatizar que a
mesma é o “estudo científico das relações sociais, das formas de associação,
destacando-se os caracteres gerais comuns a todas as classes de fenômenos
sociais, fenômenos que se produzem nas relações de grupos entre seres
humanos”. Ou seja, o estudo da sociologia tem como grande referencial
a interação dos homens em sociedade, com ênfase para a “natureza dos
fenômenos sociais” (LAKATOS, 1990, p. 22, 23).

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A partir de tais preceitos, a função da sociologia não é simplesmente
representar determinada sociedade ou “contar a sua história”, mas sim,
ponderar a formação e desintegração dos grupos, a “divisão das sociedades Lembre-se, estimado (a) aluno (a), que nesta unidade estamos
em camadas, a mobilidade de indivíduos e grupos nas camadas sociais” estudando os principais pressupostos de pesquisa da sociologia. Dessa
e o processo de competição e cooperação (LAKATOS, 1990, p. 23). Todas maneira, além dos aspectos já elencados, esse campo do conhecimento
essas relações estão associadas aos aspectos políticos, econômicos, sociais também visa estudar “a sociedade como um todo, com características e
e culturais que regem as sociedades ao longo da história. relações que podem ser observadas em qualquer sociedade, ou em suas
partes, seja uma tribo, um tribunal, uma empresa industrial, um Estado,
um grupo de adolescentes” (LAKATOS, 1990, p. 23). Isso significa que a
sociologia é extremamente importante para entendermos a organização
dos indivíduos em sociedade, seja de uma determinada tribo indígena
que vive isolada da sociedade convencional, seja da nossa realidade de
trabalho que vivenciamos cotidianamente.
Tomazi também nos expõe contribuições nesse sentido, quando
menciona alguns dos principais pressupostos da sociologia para
compreendermos a sociedade e suas relações:
[...] uma das preocupações da Sociologia é justamente formar indivíduos
autônomos, que se transformem em pensadores independentes, capazes
de analisar o noticiário, as novelas de televisão, os programas do dia
a dia e as entrevistas das autoridades, percebendo o que se oculta nos
discursos e formando o próprio pensamento e julgamento sobre os
fatos, ou, ainda mais importante, que tenham a capacidade de fazer
as próprias perguntas para alcançar um conhecimento mais preciso da
sociedade à qual pertencem (TOMAZI, 2010, p. 8).
Essa é uma das contribuições que esta disciplina de sociologia
visa a você estimado (a) aluno (a)! Fazer com que você compreenda a
importância que a sociologia tem para as nossas vivências em sociedade,
demonstrar que a discussão sociológica está presente nas mais variadas
relações que estabelecemos em nosso dia a dia. Faz-nos pensar de forma
independente e a partir de uma perspectiva crítica, que contraria aquilo
que convencionalmente nos é apresentado e que a sociedade elege como
“bom” para todos.
Figura 1.2 - A Sociologia enquanto forma de conhecimento visa pensar e interpretar as relações dos indivíduos
em sociedade.
Fonte - freepik.com

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A sociologia nos faz perguntar: por que temos determinada
organização política? Por que vivemos inseridos no sistema capitalista
de produção e não em outro? Será que isso é bom e atende a todos?
Por que temos valores culturais diferentes dos de outras sociedades?
Essa e inúmeras outras perguntas os sociólogos procuram fazer para Tenha consciência, estimado (a) aluno (a), que em nossa vivência em
que tenhamos uma vida em sociedade que seja mais justa e igualitária, sociedade dificilmente conseguimos separar nossos valores pessoais ou
minimizando as possíveis desigualdades entre as classes sociais. mesmo nossa realidade diária do ambiente de trabalho. Carregamos junto
Além disso, a Sociologia, assim como as demais ciências que constituem de nós, normas, valores, crenças, costumes que na maioria das vezes são
as ciências humanas, História, Filosofia, Antropologia, dentre outras, diferentes daqueles com quem dialogamos cotidianamente. Essa diferença
busca “compreender e explicar as permanências e as transformações que de valores faz com que inevitavelmente tenhamos conflitos com outros
ocorrem nas sociedades humanas” ao longo da história (TOMAZI, 2010, indivíduos que possuem valores e crenças diferentes dos nossos.
p. 7). Por esse motivo, nunca é tarde relembrar que a sociologia é uma Dessa maneira, a sociologia pode ser útil em sua atuação profissional
disciplina que dialoga muito com a história, diria até que o seu constituir para que você possa identificar essas diferentes personalidades perceber
é basicamente a partir da sociedade e da história em suas inter-relações, as peculiaridades de cada indivíduo. É importante que você entenda
ou seja, de que maneira diferentes sociedades constituíram suas práticas que cada sujeito tem sua carga social e na maioria das vezes leva essa
sociais ao longo da história e ao mesmo tempo, de que modo tais práticas “trajetória” para dentro do ambiente de trabalho ou para a organização
influenciam na vida dos indivíduos contemporaneamente. onde está atuando. Portanto, tenha consciência que essa conjuntura é
Nelson Dacio Tomazi enfatiza que “através dos tempos, os seres fruto de processos mais amplos, que remetem as diferenças econômicas,
humanos buscam suprir suas necessidades básicas mediante a produção sociais e políticas.
não só de alimentos, abrigo e vestuário”, como também de “normas, Os indivíduos não possuem as mesmas orientações políticas,
valores, costumes, relações de poder, arte e explicações sobre a vida e tampouco têm o mesmo poderio econômico e o mesmo vale para a
sobre o mundo” (TOMAZI, 2010, p. 7). Isso significa que parte fundamental conjuntura social. Aqueles que possuem mais poderio econômico terão
da sociologia é pensar os valores, costumes e as explicações sobre a nossa consequentemente acesso a bens de consumo mais elevado. Além disso,
vida em sociedade. os valores culturais de cada indivíduo também diferem e são reflexo das
Por esse motivo, a sociologia é extremamente importante para quem relações econômicas que se verificam na sociedade.
trabalha em um ambiente de gestão, administração ou mesmo que está Por esse motivo, aprenderemos um pouco mais sobre tais conjunturas.
cotidianamente em contato com os indivíduos em sociedade. Por meio da Isto é, entenderemos as teorias sociológicas e de que maneira elas
sociologia podemos verificar, por exemplo, que em uma empresa podem procuram explicar e nos ajudam entender a sociedade contemporânea.
existir diferentes personalidades e que essas diferenças podem ocasionar Com base em tais preceitos, certamente teremos uma melhor sustentação
conflitos entre os trabalhadores ou colaboradores. Assim, com o estudo para a nossa atuação profissional frente às organizações sociais.
da sociologia conseguimos olhar a partir de uma perspectiva social para
tais sujeitos, isso significa perceber as conjunturas sociais em que cada
sujeito está inserido e consequentemente verificar de que maneira isso
tem influenciado em seu dia a dia de trabalho.

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AP RENDA UM P OUCO M A I S

Para que você entenda um pouco mais sobre os pressupostos, a origem e o


desenvolvimento da sociologia, separei o vídeo “Introdução à Sociologia”, PA R E E P E N S E N I SS O
que contextualizará o que você vai aprender nesta disciplina. Clique no link
indicado a seguir e assista ao vídeo. O conteúdo é simples e claro, facilitará
sua compreensão. Não se esqueça de fazer suas anotações sobre o que
aprendeu. Você já parou para pensar que a maneira como interpretamos
Disponível em:
a sociedade em que vivemos é fruto das relações que construímos.
Exatamente! Uma das questões que a sociologia procura nos colocar é
que “todo o conhecimento se desenvolve socialmente”. Dessa maneira,
se “quisermos conhecer e compreender como pensavam as pessoas de
determinada época, precisamos saber em que meio social elas viveram,
pois o pensamento de um período da história” foi criado pelos grupos
ou classes daquele período em resposta “a situações históricas de seu
tempo” (TOMAZI, 2010, p. 9).
Sociologia - Aula 01 - Introdução à Sociologia
Isso significa que, se quisermos conhecer determinada realidade
social, precisamos antes saber como pensavam as pessoas daquela época,
ou seja, conhecer o seu meio social. O mesmo vale para a nossa sociedade,
se daqui a 100 anos algum sociólogo tiver a intenção de conhecer a
organização, política econômica e social de nossa sociedade, precisará
NA P R ÁT I C A antes saber que preceitos ou pensamentos nos orientam hoje, para aí
então fazer uma análise mais apurada.
A sociologia é realmente incrível! Portanto, pare e pense nisso antes
Como você deve ter notado ao longo deste nosso primeiro tópico do
de seguir para o próximo tópico de nosso conteúdo.
conteúdo de sociologia, aprendemos alguns dos principais pressupostos e de
que maneira podemos nos apropriar de tais conhecimentos para nossa prática
profissional. Com base em tais aspectos, para que serve a sociologia em nosso
dia a dia? Será que essa disciplina é de fato importante para compreendemos
as relações econômicas, políticas e sociais que regem a nossa sociedade?

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Que bom que você segue acompanhando nosso conteúdo! Como você
deve ter notado no título deste nosso tópico, vamos trabalhar agora um
pouco sobre a inserção dos indivíduos em sociedade e como consequência
desse processo, de que maneira ocorre o processo de socialização. Mas,
faremos isso de uma forma um pouco diferente, serão apresentados
alguns preceitos sobre o surgimento e o desenvolvimento da sociologia,
mais especificamente a partir de alguns pensadores que introduziram
essa forma de pensar a realidade social em fins do século XVIII e durante
o XIX.
Você deve lembrar que alguns pensadores gregos, como Aristóteles
e Platão, já se propunham pensar a realidade social de forma separada
da religião, que até então dominava todas as formas de explicação da
vida social. Porém, é no período conhecido como renascentista ou no
Renascimento que temos as primeiras formas de interpretação da vida
social, que consequentemente contribuíram para a formação da sociologia
do conhecimento nos séculos posteriores.
1. 2 - O I n d i v í d u o , A S o c i e dad e E A S o c i a l i z a ç ã o A socióloga Eva Maria Lakatos nos dá subsídios para pensarmos
essa realidade social quando evidencia que é a partir de Thomas Morus
(1478-1535) e seu romance social e político, “avançado para a sua época”,
que temos os primeiros sinais que novas formas de compreender as
sociedades estavam sendo gestadas. Isso acabou sendo confirmado, já
que, a “partir de então, com o desenvolvimento do capitalismo comercial,
multiplicaram-se os tratados de economia em que eram abordados vários
aspectos dos problemas sociais” (LAKATOS, 1990, p. 40).
Além disso, a “própria evolução política” que acontecia enquanto
resultado do crescimento das cidades e das consequentes modificações
econômicas, “favoreceu o aparecimento de livros”, nos quais, além de
tais relações, também eram encontrados outros aspectos do “convívio
entre os homens”. Dentre os inúmeros exemplos de obras do período
renascentista e que contribuíram para a evolução da ciência e da sociologia
podemos citar: O Príncipe, de Nicolau Maquiavel (1469-1527), e Leviatã,
de Thomas Hobbes (1588-1679). De acordo com Lakatos, nessas obras os
“autores consideravam ser a vida da sociedade baseada no uso da força.
Esses livros tiveram e tem grande influência, assim como Ensaios sobre
o entendimento humano, de Locke (1632-1704)” (LAKATOS, 1990, p. 40).

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Tais obras do período renascentista contribuíram não só para o Um dos mais influentes trabalhos deste período foi o de Jean Jacques
desenvolvimento da sociedade a partir do sistema capitalista de produção, Rousseau (1712-1778), do qual podemos salientar sua obra O Contrato
mas também, para reflexão sobre a organização social, e, como consequência Social, no qual evidencia a importância do Estado para a legitimidade
do poder político. De acordo com Rousseau, o homem nasce livre,
disso, colaborando para o desenvolvimento da sociologia e de inúmeras todavia, a sociedade o corrompe e como consequência desse processo se
outras áreas do conhecimento humano, como, a Filosofia, a História, a torna escravo de suas necessidades, bem como daqueles que o rodeiam.
Psicologia, a Educação, dentre outras. Mas o século que é decisivo para o Mas, Rousseau acreditava em um mundo ideal, no qual o Estado seria
desenvolvimento da sociologia enquanto forma de pensar a sociedade e a o organizador da sociedade civil. Sua forma de pensar acabou servindo
relação entre os indivíduos é o XVIII. Nesse século “apareceram obras de de subsídio para o desenvolvimento dos princípios revolucionários da
grande valor no campo da política, economia e sociologia. Montesquieu Revolução Francesa e consequentemente para o desenvolvimento das
democracias contemporâneas.
(1689-1775), O espirito das leis, analisou o papel da lei e dos poderes políticos
Mas, quem é considerado um dos criadores do pensamento sociológico
na sociedade”, além dele, David Hume escreveu o Tratado sobre a natureza ou que pelo menos procura pensar a interação dos indivíduos em sociedade
humana; Adam Smith (1723-1790) em A riqueza das nações relacionou suas é Auguste Comte (1798-1857). Este pensador também foi o criador do
análises econômicas com as conjuntas que eram apresentadas a sociedade positivismo, mas, isso será trabalhado mais à frente, momento em que
daquele período (LAKATOS, 1990, p. 41). dedicarei todo um tópico para os ideais de Comte e do positivismo. Por
hora é importante que você entenda a importância deste pensador para o
Figura 1.3 - A Revolução Francesa que teve início em 1789 demarca uma importante ruptura para o mundo
desenvolvimento do pensamento sociológico, conforme destaca Lakatos:
ocidental. Já que quebra com os resquícios feudais que ainda vigoravam na França absolutista, além de
demarcar a ascensão e consolidação da burguesia junto ao capitalismo. Além disso, também podemos destacar
Este pensador francês lutava para que, em todos os ramos de estudos, se
a Liberdade, Igualdade e Fraternidade, lema que deu sustentação a Revolução e a democracia em períodos obedecesse a preocupação da máxima objetividade. Em sua classificação
posteriores.
Fonte: Eugéne Delacroix
das ciências, colocou a matemática na base e, no ápice, os esforços de
compreensão de tudo o que se referia ao homem, principalmente as
relações entre eles (LAKATOS, 1990, p. 42).
No entendimento de Comte os estudos “das relações humanas”
deveriam ser constituídos a partir de “uma nova ciência, a que se deu o
nome de ‘Sociologia’”. Os preceitos sociológicos não deveriam limitar-se
“à análise, mas propor normas de comportamento, seguindo a orientação
resumida na famosa fórmula positivista: ‘saber para prever, a fim de
prover’” (LAKATOS, 1990, p. 42). Além disso, para Comte a Sociologia
partiria dos princípios da observação, comparação, experimentação e
classificação, sendo tais preceitos a base do método sociológico.
Quem também apresentou contribuições à sociologia do conhecimento
foi o filósofo inglês Herbert Spencer (1820-1903). De acordo com “a
concepção desse pensador, a sociedade assemelha-se a um organismo
biológico, sendo o crescimento caracterizado pelo aumento da massa; o
processo de crescimento da origem a complexidade da estrutura; aparece
nítida interdependência entre as partes”. Com base nesses princípios,
Spencer formula uma lei geral “segundo a qual, a evolução de todos os
corpos (e, por analogia, a das sociedades) passa de um estágio primitivo,
caracterizado pela simplicidade de estrutura e pela homogeneidade, a
estágios de complexidade crescente” (LAKATOS, 1990, p. 42, 43).

Sociologia
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Observe, estimado (a) aluno (a), que com esses pensadores as
sociedades e a consequente organização social passam a ser vistas de forma
diferente. Se antes, não eram consideradas as estruturas da sociedade ou
se eventualmente eram vistas de forma secundária, com o surgimento da Marx entende que a organização econômica das sociedades a partir
sociologia e do pensamento sociológico passa a se pensar a interação do do sistema capitalista de produção é produtora de desigualdades sociais,
indivíduo em sociedade. sendo que quem dá sustentação a tal organização econômica da sociedade
são os trabalhadores, que enquanto sujeitos explorados, pelas relações
Quem também apresentou ricas contribuições para o pensamento
trabalhistas tipicamente capitalistas, mantêm os mais ricos, burgueses e
sociológico que se desenvolvia ao longo do século XIX foi o célebre
grandes capitalistas, em posições privilegiadas perante a sociedade.
filósofo, economista e sociólogo Karl Marx. Sua contribuição para o
desenvolvimento da Sociologia está relacionada às relações sociais que Para Marx essa realidade somente se modificaria quando o trabalhador
acontecem enquanto resultado dos modos de produção. Marx fundou a adquirisse consciência de classe, ou seja, conscientizasse de sua condição
corrente de pensamento conhecida como materialismo histórico, que visa de explorado e buscasse uma transformação social a partir da revolução
pensar as estruturas da sociedade capitalista a partir da sua divisão em social. Sua forma de perceber a realidade social a partir do sistema
classes sociais. Lakatos enfatiza que o “postulado básico do marxismo é o capitalista de produção revolucionou as compreensões sociológicas,
determinismo econômico, segundo o qual o fator econômico é determinante sendo que muitos sociólogos percebem em Marx uma grande referência
da estrutura do desenvolvimento da sociedade” (LAKATOS, 1990, p. 44). para compreendermos as relações sociais contemporâneas.
É evidente que esses são apenas alguns preceitos do pensamento
Figura 1.4 - As ideias marxistas influenciaram inúmeros movimentos sociais ao longo dos séculos XIX e XX,
talvez o mais famoso deles seja a Revolução Russa de 1917, nessa imagem Vladimir Lenin discursa para
marxista, os escritos de Marx já foram e ainda são interpretados de
multidão durante a Revolução. diferentes maneiras, sendo que deste autor derivaram diferentes correntes
Fonte: Diário Liberdade.
sociológicas para a compreensão da sociedade. Portanto, não fique
preocupado (a) em entender Marx e o marxismo agora, mais à frente será
dedicado todo um tópico para as contribuições de Marx e dos marxistas
para a sociologia.
Mas o que podemos notar nesse momento é que temos um contexto
de desenvolvimento do pensamento sociológico, com diferentes autores
se propondo pensar a sociedade e a relação estabelecida entre os
indivíduos. Nessa conjuntura de desenvolvimento da Sociologia, chamo
a sua atenção para as considerações desenvolvidas pelo francês Émile
Durkheim (1858-1917). Esse pensador passou a ser considerado “por
muitos estudiosos o fundador da Sociologia como ciência independente
das demais Ciências Sociais”. Sua forma de interpretar a realidade social
preconizava “o estudo dos fatos sociais como ‘coisas’, através de regras de
rigor científico, determinou seu objeto, próprio dos estudos sociológicos
e sua metodologia” (LAKATOS, 1990, p. 45).

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Em uma das suas mais importantes obras, A Divisão do trabalho
social de 1893, Durkheim expõe dois princípios básicos, “consciência
Como consequência desse processo podemos constatar que em nossa
coletiva e solidariedade mecânica e orgânica”. Tais preceitos e estudos
sociedade, por exemplo, as mulheres ganham salários inferiores aos dos
acabam influenciando inúmeros sociólogos posteriores, além disso, nesse
homens, mesmo desempenhando as mesmas funções. Por esse motivo,
trabalho Durkheim procurou salientar que quanto maior e mais complexa
a introdução do conceito de divisão social do trabalho introduzido por
for uma sociedade, maior a complexidade de relações que verificaremos
Durkheim, Marx, Weber, dentre outros sociólogos, busca não só pensar
na mesma. Além disso, em sua visão o crescimento populacional tem
essas questões, mas também, ponderar em que medida tais relações são
fator determinante para uma maior divisão social do trabalho, já que
fruto da organização econômica, política e social instituída a partir do
aumentaria a complexidade de relações.
sistema capitalista de produção.
Entretanto, não foi somente Durkheim que pensou as estruturas das
Seguindo nossa análise a partir dos vários pensadores que introduzem
sociedades a partir da divisão social do trabalho, Karl Marx, que estudamos
diferentes perspectivas de pensarmos o aspecto social, enfatizo na
brevemente há pouco, e Max Weber também procuraram pensar essa
sequência alguns elementos em torno do sociólogo e economista alemão
questão. Em grande medida, a divisão social do trabalho estabelece que
Max Weber (1864-1920). Os principais trabalhos de Weber são: A ética
cada sujeito possui determinada função na estrutura social e que essa
protestante e o espirito do capitalismo de 1905 e Economia e Sociedade,
posição que ocupa garante seu status perante a sociedade.
publicada após a sua morte, em 1922. Lakatos nos apresenta uma
Mas, em grande medida, é importante que você entenda que a divisão interessante síntese sobre a maneira como este autor pensa os preceitos
do trabalho é essencial para a manutenção do sistema capitalista de sociológicos para a compreensão da sociedade:
produção, já que é através dela que é possível aumentar a produtividade. O
Segundo Max Weber, a Sociologia é o estudo das interações significativas
aumento da produtividade somente acontece porque existe a especialização
de indivíduos que formam uma teia de relações sociais, sendo seu objetivo
que aumenta a eficiência produtiva, o que consequentemente permite a
a compreensão da conduta social. Esta ênfase dada a compreensão
comercialização de produtos com maior qualidade e menor preço. Por
subjetiva levou Weber a definir ação social como a conduta humana,
outro lado, a divisão social do trabalho acontece em todos os níveis da
pública ou não, a que o agente atribui significado subjetivo (LAKATOS,
sociedade, seja ele a partir do trabalho mental (intelectual), como no
1990, p. 50).
material (físico).
Para Weber a sociedade seria resultado das relações estabelecidas
Essa divisão fez com que surgisse uma “elite social” que não só
entre os indivíduos que a constituem, por esse motivo, sua preocupação
legitima essa estrutura, como também dá subsídios para que a mesma
central é o indivíduo e suas ações. A partir de Weber podemos nos
se mantenha. É interessante observar que essa divisão pode ser vista na
perguntar, por exemplo, por que os sujeitos tomam determinadas decisões
maneira como os indivíduos organizam suas tarefas cotidianas, como,
e posicionamentos? Que conjunturas fazem com que seja tomada uma
por exemplo, a divisão sexual do trabalho. Ou seja, foi historicamente
determinada atitude e não outra? Tomazi nos lembra que para Weber
construída uma percepção de que o trabalho doméstico deve ser tarefa
“a sociedade existe concretamente, mas não é algo externo e acima das
feminina, enquanto o homem deve provir a família financeiramente. Essa
pessoas, e sim o conjunto das ações dos indivíduos relacionando-se
é uma divisão social do trabalho instituída a partir da desvalorização do
reciprocamente” (TOMAZI, 2010, p. 26).
papel da mulher perante a sociedade, que deve ficar restrita ao ambiente
familiar e os afazeres domésticos.

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É a partir da análise dos indivíduos e de suas ações que Weber
procura ver e compreender a sociedade, para tanto, seu conceito chave é
o de ação social, “entendida como o ato de se comunicar, de se relacionar,
tendo alguma orientação quanto às ações dos outros” (TOMAZI, 2010, p.
26). Tomazi nos apresenta interessantes exemplos a partir de Weber, que
nos permitem entender de forma mais clara de que maneira esse autor
qualifica a ação social:
[...] Weber declara que a ação social não é idêntica a uma ação
homogênea de muitos indivíduos. Ele dá um exemplo: quando estão
caminhando na rua e começa a chover, muitas pessoas abrem seus
guarda-chuvas ao mesmo tempo. A ação de cada indivíduo não está
orientada pela dos demais, mas sim pela necessidade de proteger-se da
chuva (TOMAZI, 2010, p. 26).
Isso significa que para Weber, a ação social não significa
necessariamente uma ação homogênea, conforme podemos notar os
indivíduos abrem seus guarda-chuvas enquanto uma necessidade e
não porque todos resolveram abrir ao mesmo tempo. Tomazi também
relembra que a ação social em Weber “não é idêntica a uma ação
influenciada”, que ocorre quando existem uma aglomeração de pessoas
e os indivíduos fazem o que os demais estão fazendo por influência.
Dessa maneira, Weber ao analisar a forma como os sujeitos agem e
consequentemente como orientam suas ações, classificou as ações
individuais em quatro grandes tipos, que são: “ação tradicional, ação
afetiva, ação racional com relação a valores e ação racional com relação
a fins” (TOMAZI, 2010, p. 26).
Infelizmente não temos mais espaço para trabalharmos todos esses
importantes preceitos do pensamento weberiano nesse momento. Mas,
mais a frente dedicarei todo um item de nosso livro para a importância
de Weber na Sociologia e nas formas de compreendermos a sociedade e
a relação entre os indivíduos.
Figura 1.5 - A noção de Ação Social é o conceito básico de Max Weber, entendida como o ato de se relacionar entre os Em grande medida procurei chamar a sua atenção nesse item para
indivíduos em sociedade tendo alguma orientação quanto às ações dos outros indivíduos.
Fonte - freepik.com os principais pensadores que introduzem as discussões sociológicas ao
longo dos séculos XVIII, XIX e XX. É evidente que não trabalhamos todos,
mas, com base no que estudamos é possível dimensionarmos a relevância
destes estudiosos para o desenvolvimento da Sociologia.

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Em grande medida, é importante que você entenda que os sociólogos
buscam nos fazer pensar sobre a sociedade e os valores que nos são
apresentados. Por exemplo, quando nascemos já encontramos normas
N A P R ÁTI C A
e valores prontos, bem como regras que visam gerir a nossa vida em
sociedade e na maioria das vezes não há como “fugirmos” dessas regras
e valores. Pois bem, é justamente para pensar esses aspectos que a
Que tal, agora, você fazer um quadro com os três pensadores elencados
sociologia procura nos ajudar, mas, mais do que isso, com o estudo da na seção anterior (Durkheim, Weber e Marx)?
sociologia conseguimos identificar nossas escolhas, nossos limites e a
Nesse quadro você pode colocar: em que período viveram, a concepção
repercussão de nossos atos, afinal de contas, lembre-se sempre que de sociologia de cada um deles, seus principais conceitos e a importância
vivemos em sociedade e nossos atos sempre estarão relacionados com de tais estudos para compreendemos a sociedade contemporânea. Será
outros indivíduos ou práticas. que esses pensadores ainda têm relevância social? Será que de fato seus
estudos ainda podem ser utilizados para compreendermos as relações que
Por esse motivo, o estudo da sociologia é tão importante para a verificamos diariamente em nosso ambiente de trabalho, em casa ou mesmo
nossa atuação profissional, pois ajuda a nos conhecer melhor e também na universidade? Tente colocar em prática o que estudamos.
a conhecermos os indivíduos com que dialogamos cotidianamente, as
diferentes personalidades, as diferenças econômicas, sociais e culturais.
Tenha certeza que existem grandes diferenças nas pessoas com que nos
relacionamos e muitas vezes sequer percebemos essas diferenças. Pare e p e n s e n i ss o

Você já parou para pensar que é a sociedade que nos constitui enquanto
indivíduo, mas ironicamente, é essa mesma sociedade que nós constituímos,
AP RENDA UM P OUCO M A I S
ou seja, é a sociedade que nos legitima enquanto indivíduos, mas, somos nós,
os indivíduos que constituímos a sociedade! Dessa constatação advém uma
dúvida cabal, o fato de vivermos em sociedade retira a nossa autonomia? Até
Para que você entenda um pouco mais sobre o surgimento da Sociologia e que ponto nossa liberdade é respeitada perante a sociedade? Mais do que
seus principais pensadores, separei o vídeo “O tripé da Sociologia: Durkheim, isso, até que ponto nossa maneira de pensar e agir não influência os demais
Weber e Marx”, que contextualizará o que você já aprendeu e o que ainda indivíduos que constituem a sociedade e com quem nos relacionamos?É para
iremos estudar sobre esses importantes pensadores. Clique no link indicado pensar e tentar responder essas questões que os sociólogos procuram pensar
a seguir e assista ao vídeo. O conteúdo é simples e claro, facilitará sua e entender a sociedade e os indivíduos. Para tanto se analisa como acontece
compreensão. Não se esqueça de fazer suas anotações sobre o que aprendeu. o processo de socialização, os jogos de poder, as instituições sociais e as
Disponível em: hierarquias existentes na sociedade. Todas essas relações estão presentes
quando pensamos o indivíduo e sua relação com a sociedade e essa é uma das
preocupações centrais da sociologia. Você já parou para pensar nisso? Para e
pense de que maneira você enquanto indivíduo está inserido na sociedade e
de que maneira essa mesma sociedade influência em suas vivências.

O tripé da Sociologia: Durkheim, Weber e Marx (ft. Tese Onze)

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Ao longo deste tópico vamos aprofundar nosso conhecimento para
outros preceitos sociológicos, ou seja, estudaremos mais a fundo de
que maneira a sociologia se torna uma ciência da sociedade, sob que
conjunturas os pressupostos sociológicos são pensados, sua origem
e o seu desenvolvimento. Nesse sentido, para compreender “como a
Sociologia nasceu e se desenvolveu devemos analisar as transformações
que ocorreram a partir do século XIV, quando se iniciou uma grande
transformação” (TOMAZI, 2010, p. 234).
Mas, que transformação é essa? Essa mudança é basicamente
relacionada à passagem da sociedade feudal para a capitalista ou, em outras
palavras, a transição da organização econômica, política, social e cultural
da sociedade medieval para a moderna. Tomazi nos expõe interessantes
aspectos sobre esse momento de transição, quando menciona que:
Em cada sociedade, em todos os tempos, os seres humanos elaboraram
explicações próprias para as situações que viviam. Eram explicações
religiosas, místicas, culturais, étnicas, etc. No século XIX, a busca de um
outro tipo de explicação para os fenômenos da sociedade – a explicação
1 . 3 - U m a C i ê n c i a D a S o c i e dad e
científica – deu origem à Sociologia (TOMAZI, 2010, p. 234).
Essa é a grande contribuição que a sociologia do conhecimento
vai expor para pensarmos as sociedades, ponderar os seus variados
aspectos para além das explicações místicas ou religiosas. A maioria das
sociedades antigas e medievais buscavam explicações e justificativas
para a organização da vida social no aspecto divino, isto é, muitas
sociedades justificavam, por exemplo, a cobrança de impostos enquanto
uma determinação ou um meio para satisfazer os deuses.
Mas, será que com novas formas de se pensar a sociedade a partir
da ciência as sociedades deixam de lado os aspectos religiosos e místicos?
Mais do que isso, será que não precisamos mais pagar impostos, conforme
vimos em nosso exemplo? É evidente que sim, o Estado passa a ser
organizado de outra forma e usa outros preceitos para justificar tais
práticas, além disso, a religiosidade não deixa de existir, é claro que a Igreja
teve seu poder diluído entre as diferentes formas de pensar e interpretar o
aspecto divino, mas, o mais importante dessa nova conjuntura é que não
é mais a religiosidade e a Igreja que dominam o cenário de organização
econômica, política e social da sociedade.

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Pensar sociologicamente não significa refletir apenas
a sociedade em que vivemos, mas sim, refletir como
historicamente se constituíram as sociedades e de que
maneira isso influenciou na estruturação da sociedade
humana. Por esse motivo, lembre-se sempre que a sociologia
é uma disciplina que constantemente dialoga com a História,
já que para entender a organização social de determinada
época precisamos antes saber de que maneira essa sociedade
constitui-se historicamente, isto é, precisamos conhecer a
História dessa sociedade.
O mesmo vale para você, futuro (a) profissional, caso
você queira entender melhor a comunidade na qual sua
organização está inserida, precisará antes entender de que
maneira a mesma se formou. Da mesma forma, somente
conhecemos nossos colaboradores se entendermos o
contexto social no qual os mesmos estão imersos, a trajetória
histórica de um sujeito diz muito sobre a sua forma de agir
perante a sociedade.
Também podemos considerar esses preceitos em relação
aos autores ou pensadores que escrevem sobre a sociologia
do conhecimento. Os pensadores que estudamos, como,
por exemplo, Auguste Comte, Émile Durkheim, Karl Marx
e Max Weber pensam os aspectos sociológicos em vista as
conjunturas que lhes eram apresentadas naquele período
histórico. Ou seja, Karl Marx somente conseguiu desenvolver
suas considerações porque teve enquanto inspiração e
referência outros pensadores de outros períodos ou mesmo
do período em que vivia. Da mesma forma, somente consigo
expor os preceitos científicos da sociologia hoje porque
existiram tais autores e inúmeros outros que trouxeram
valorosas contribuições para pensarmos sociologicamente.

Figura 1.6 - Com a ascensão da burguesia e o desenvolvimento das primeiras relações comerciais
urbanas, também começam a aparecer às manufaturas, pequenas produções de caráter familiar e
artesanal, como a representada nessa Gravura de Bartholomaeus Anglicus (Jean Corbechon), de 1482,
mostrando o trabalho de tintura em uma manufatura de tecidos.
Fonte: Master of Edward IV

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Em grande medida é enquanto resposta às transformações que
vinham sendo apresentadas ao mundo ocidental e às novas formas de
pensar a sociedade que a sociologia deve ser considerada, conforme
menciona Tomazi:
A Sociologia, no contexto do conhecimento científico, surgiu como um
corpo de ideias a respeito do processo de constituição, consolidação
e desenvolvimento da sociedade moderna. Ela é fruto da Revolução
Industrial e é denominada “ciência da crise”, porque procurou dar
respostas às questões sociais impostas por essa revolução que, num
primeiro momento, alterou a sociedade europeia e, depois, o mundo
todo (TOMAZI, 2010, p. 235).
É em grande medida para pensar e dar respostas para as novas
conjunturas que eram apresentadas as sociedades a partir do
desenvolvimento do sistema capitalista de produção, que a sociologia
vem ganhar espaço enquanto forma de pensar a sociedade e a produção
do conhecimento humano. Portanto, é importante que você entenda que
como “ciência da sociedade” a sociologia “não surgiu de repente, ou da
reflexão de algum autor iluminado; ela é fruto de todo um conhecimento
sobre a natureza e a sociedade que se desenvolveu a partir do século XV”,
com a desintegração da sociedade feudal e a estruturação da sociedade
capitalista (TOMAZI, 2010, p. 235). Figura 1.7 - É na fase do Pré-capitalismo ou do capitalismo comercial que a expansão marítima acontece, esse período entre
os séculos XV e XVIII é marcadamente o momento em que a burguesia mercante começa a buscar riquezas em outras partes
do mundo, para além do continente europeu. A busca se dava principalmente por metais preciosos como, ouro, prata e outras
Note que as novas formas de se pensar a sociedade, com base nos especiarias que não existiam na Europa. É nesse momento que a coroa portuguesa
Fonte: História Livre
preceitos sociológicos, têm uma longa gestação. Você deve lembrar que
anteriormente apresentei alguns pensadores dos séculos XVIII e XIX.
Assim, em grande medida é somente nesse período que podemos falar
em uma ciência sociológica reconhecida enquanto disciplina acadêmica, Portanto, tenha consciência que não é de um dia para o outro ou de
por outro lado, as formas de pensar a sociedade a partir dos preceitos maneira rápida que as formas sociológicas de se pensar a sociedade são
sociológicos já vinham sendo desenvolvidas desde o século XV, quando desenvolvidas. Dentre os fatores que colaboram para o desenvolvimento
temos a transição do feudalismo para o capitalismo. do capitalismo e que dão maior complexidade para a organização política
e econômica das sociedades podemos destacar: “a expansão marítima,
o comércio ultramarino, a formação dos Estados nacionais, a Reforma
Protestante e o desenvolvimento científico e tecnológico” (TOMAZI,
2010, p. 235). Todos esses elementos estão vinculados ao processo de
desenvolvimento do capitalismo, além disso, os mesmos também nos
permitem entender melhor o grande movimento intelectual, tanto o
que procurou novas formas de explicar a natureza quanto o que buscou
pensar a forma de estruturação da sociedade capitalista.

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O desenvolvimento de grandes navegações com as rotas marítimas para
a África, Américas e as Índias apresenta uma nova concepção de mundo,
Observe que com o desenvolvimento de novas relações econômicas
de ver e pensar aos europeus, se antes das navegações as compreensões
e comerciais também ocorre uma série de mudanças políticas, sobretudo,
do mundo estavam restritas ao continente europeu, a partir de então são
em três aspectos: a centralização da justiça a partir do Direito romano, a
novos mundos, continentes sendo descobertos, o que colaborou para que os
centralização das forças armadas, essenciais para a proteção dos estados
pensadores europeus construíssem novas formas de pensar aquela e outras
nacionais que estavam em formação e a centralização administrativa, que
sociedades. Em termos de organização econômica essa nova dinâmica
tinha com uma das suas principais funções a cobrança de impostos que
mundial foi muito benéfica ao capitalismo, já que novos mercados foram
consequentemente garantiam o aparato “jurídico-burocrático-militar”.
abertos, impulsionando o comércio.
Essa é em grande medida a base de organização do Estado moderno,
Além disso, também se desenvolveu a economia monetária o que a mesma base que está presente em grande parte das sociedades
favoreceu a acumulação de capitais pela burguesia comercial, processo contemporâneas.
que foi fundamental para que posteriormente fosse desenvolvida a
Portanto, a sociologia é essencial para compreendermos essas novas
industrialização e o capitalismo passasse por uma nova fase. Mas, tente
conjunturas apresentadas à sociedade, ou seja, para compreendermos a
imaginar, caro (a) aluno (a), se descobríssemos hoje novos continentes,
organização do Estado a partir de seus aparatos é preciso saber sobre que
novos povos e culturas, certamente nossa visão e perspectiva de mundo
bases o mesmo está assentado, além disso, também precisamos entender
aumentariam substancialmente, pois é exatamente essa conjuntura que é
sob que estrutura essa nova organização se sobrepôs.
apresentada ao mundo ao longo dos séculos XV, XVI e XVII, uma nova
organização econômica e social, novas sociedades, novas culturas, tudo isso Mas, somente podemos considerar a sociologia uma ciência
impactou na maneira como os pensadores daquela época interpretaram a porque em algum momento esse conhecimento pôde ser considerado
sociedade, desenvolvendo consequentemente a sociologia enquanto forma científico. Dessa maneira, foi nesse momento de transição para a
de pensar a sociedade. sociedade capitalista que a razão passou “a ser soberana e entendida
como elemento essencial para se conhecer o mundo; isto é, os homens
Nessa linha de raciocínio, Tomazi apresenta outros elementos desse
deviam ser livres para julgar, avaliar, pensar e emitir opiniões, sem que
contexto de desenvolvimento da sociedade capitalista:
se submete a nenhuma autoridade transcendente ou divina” (TOMAZI,
As mudanças que se operavam nas formas de produzir a riqueza só 2010, p. 236). Tente imaginar uma sociedade regrada pela religião em
poderiam funcionar se ocorressem modificações na organização política. que a explicação da vida e de tudo que existe no mundo é dada somente
Assim, pouco a pouco, desenvolveu-se uma estrutura estatal que tinha sob a perspectiva religiosa.
por base a centralização da justiça, com um novo sistema jurídico
Pois era basicamente essa realidade que a sociedade europeia vivia
baseado no Direito romano. Houve também a centralização das forças
durante a chamada Idade Média, a vida e a natureza eram entendidas
armadas, com a formação de um exército permanente, e a centralização
apenas sob as justificativas religiosas, por esse motivo, Deus ocupava o
administrativa, com um aparato burocrático ordenado hierarquicamente
centro do universo, daí surge a doutrina filosófica Teocentrista, que busca
e com um sistema de cobrança de impostos que permitiu a arrecadação
em Deus a explicação para a vida dos indivíduos em sociedade. Entretanto,
constante para manter todo esse aparato jurídico-burocrático-militar
com a modernidade, temos o desenvolvimento do racionalismo, que
sob um único comando. Nasceu, dessa forma, o Estado moderno, que
procura considerar a existência do mundo, do homem e das suas relações
favoreceu a expansão das atividades vinculadas ao desenvolvimento da
em sociedade a partir da racionalidade.
produção têxtil, à mineração e à siderurgia, bem como o comércio interno
e externo (TOMAZI, 2010, p. 236).

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Com base nesses preceitos surge o Antropocentrismo, essa corrente
filosófica busca colocar o homem no centro do universo, ou seja, a É no século XIX, já com a consolidação do sistema capitalista na Europa,
humanidade deve ser entendida a partir dos entendimentos construídos que se encontra a herança intelectual mais próxima da Sociologia como
pelos próprios seres humanos e não com base em Deus, como até então ciência particular. O pensamento de Adam Smith, Saint-Simon (1760-
vinha sendo desenvolvido. O conhecimento racional, desenvolveu-se do 1825), Georg Wilheim Friedrich Hegel (1770-1830), David Ricardo
século XV ao XVII e “tornou-se regra seguida por alguns pensadores; foi (1772-1823) e Charles Darwin (1809-1882), entre outros, foi a fonte para
uma mudança lenta, sempre enfrentando embates contra o dogmatismo Aléxis de Tocqueville (1805-1859), Auguste Comte (1798-1857), Karl
e a autoridade da Igreja” (TOMAZI, 2010, p. 236). Marx (1818-1883) e Herbert Spencer (1820-1903) desenvolverem suas
reflexões sobre a sociedade de seu tempo (TOMAZI, 2010, p. 238).
Essa nova maneira de se perceber a natureza e a sociedade foi
desenvolvida por diversos autores, “entre eles, Nicolau Maquiavel (1469- Se no momento de transição da sociedade feudal para a capitalista
1527), Nicolau Copérnico (1473-1543), Galileu Galilei (1564-1642), Thomas as transformações sociais já eram inúmeras, imagine com o vigoroso
Hobbes (1588-1679), Francis Bacon (1561-1626 e René Descartes (1596- desenvolvimento do capitalismo e sua consolidação enquanto sistema
1650)” (TOMAZI, 2010, p. 236). Todos esses pensadores apresentaram econômico mundial. Por esse motivo, é graças às evoluções que ocorrem
novas formas de se pensar a sociedade, sobretudo, a partir de uma nos mais variados ramos da sociedade – das técnicas de produção a
perspectiva racional, em oposição aos preceitos divinos que até então ciência – que o mundo passa a ser visto de outra forma pelos pensadores
predominam grande parte do pensamento filosófico da sociedade. sociais. Assim, em um primeiro momento, de acordo com Tomazi,
podemos elencar as ideias de Saint-Simon que percebia uma nova ciência
Ao mesmo tempo em que tais processos aconteciam, o desenvolvimento
dos fenômenos sociais.
do capitalismo fazia com que uma nova categoria social ganhasse cada
vez mais destaque perante a sociedade, essa categoria era a burguesia. Saint-Simon considerava que para “a sociedade pós-revolucionária
Em grande medida, a “burguesia comercial, formada basicamente por na França se firmasse seria necessário que a ciência tomasse o lugar da
comerciantes e banqueiros, tornou-se uma classe com muito poder”, esse autoridade da Igreja, formando-se assim uma nova elite, agora científica”
poder advinha sobretudo das relações que estabelecia com os principais (TOMAZI, 2010, p. 238, 239). Ou seja, a nova força do mundo deveria ser
monarcas europeus, além de sustentar a economia de grande parte da a ciência e não mais a fé e a Igreja, isso justificava-se não só em razão da
Europa e do mundo, graças ao comércio desenvolvido com outros países nova conjuntura que era apresentada à sociedade, com a desvalorização
do mundo (TOMAZI, 2010, p. 236). dos preceitos religiosos, mas também porque o próprio capitalismo
tomou proporções que superavam o aspecto religioso e ao mesmo tempo
Todas essas mudanças fazem com que o capitalismo tenha um
necessitava da ciência para a sua evolução enquanto sistema econômico.
significativo desenvolvimento o que consequentemente torna o século
XVIII um século de grandes transformações, como a Revolução Francesa Tente imaginar o desenvolvimento de nossas relações econômicas
de 1789 e o desenvolvimento de novas reflexões para os novos cenários sem o progresso da ciência, será que a nossa sociedade estaria organizada
apresentados ao mundo ocidental. da forma como está? Mais do que isso, será que o próprio sistema capitalista
de produção conseguiria desenvolver-se e atingir o patamar que tem hoje?
Evidentemente que esses são somente alguns elementos desse
Por esse motivo, os avanços da ciência foram fundamentais e junto a esse
momento de passagem ou de advento da sociedade capitalista. Nesse
processo, também foi fundamental a interpretação das sociedades a partir
sentido, exponho na sequência algumas considerações de Tomazi
de sociólogos e cientistas sociais. Além de Saint-Simon, um dos mais
sobre as conjunturas do século XIX e o desenvolvimento da sociologia
importantes desse período foi Auguste Comte, que apresenta importantes
enquanto ciência:
contribuições para o desenvolvimento do pensamento sociológico.

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Mas, essas são questões que discutiremos mais à frente, por hora é
importante que você entenda a importância desse momento de transição,
de consolidação da sociedade capitalista com uma nova organização da
vida econômica, política, social e cultural dos indivíduos. Características
que marcam uma nova era para a sociedade ocidental.

AP RENDA UM P OUCO M A I S PA R E E P E N S E N I SS O
Para que você entenda um pouco mais sobre o surgimento das preocupações
sociológicas e de que maneira essa disciplina se torna uma ciência da
sociedade, separei o artigo “Sociologia: um momento Fundacional sob o Você já parou para pensar que para o desenvolvimento do capitalismo uma
Signo da Secularização” de António Joaquim Esteves”, que contextualizará o série de fatores exerceram significativa influência? Nessa conjuntura, um
que você vai aprender nessa disciplina. Clique no link abaixo e leia o artigo. O dos elementos mais importantes foi Reforma Protestante a partir das 95
conteúdo é simples e claro, o que facilitará sua compreensão. Não se esqueça teses publicadas por Martinho Lutero em 31 de outubro de 1517. Sobretudo,
de fazer suas anotações sobre o que aprendeu. por entrar em conflito com a autoridade “papal e com a estrutura da Igreja”
católica, valorizando o indivíduo e lhe dando liberdade para interpretar
Disponível em: as escrituras da maneira que lhe for conveniente. Essa perspectiva acaba
dialogando com a racionalidade do pensamento que estava em voga naquele
momento, ou seja, “os homens deveriam ser livres para julgar, avaliar, pensar
e emitir opiniões, sem se submeter a nenhuma autoridade transcendente ou
divina, que tinha na Igreja a sua maior defensora e guardiã” (TOMAZI, 2010,
p. 238, 239).

Essas noções acabam colaborando com o capitalismo então em ascensão,


além do mais, Max Weber em sua obra A ética protestante e o espírito do
Sociologia: um momento Fundacional sob o capitalismo, procura discutir que o desenvolvimento do capitalismo está
Signo da Secularização associado a um “espirito” que existia no pensamento dos indivíduos, antes
mesmo das relações capitalista serem desenvolvidas e que o Protestantismo
vai assentar nas revelações bíblicas sua organização da vida econômica a
partir de uma moralidade. Enquanto exemplo, podemos nos referir a noção de
NA P R ÁT I C A que o “trabalho dignifica o homem”, isto é, um homem sem trabalho seria um
sujeito indigno. Tais preceitos não só estimulam o trabalho como também o
acúmulo, constituindo-se em um importante pilar para o desenvolvimento de
Vamos colocar em prática o que aprendemos neste tópico?
relações capitalistas entre os Protestantes.
Indiquei ao longo do conteúdo o nome de diversos pensadores, como: Adam
Smith, Saint-Simon, Georg Wilheim Friedrich Hegel, David Ricardo, Charles
Darwin, Aléxis de Tocqueville, Auguste Comte, Karl Marx, Herbert Spencer,
Max Weber e Emile Durkheim. Dessa maneira, escolha pelo menos dois desses
autores e faça uma pesquisa na internet, veja vídeos, leia resumos e artigos
e tente entender a importância desses pensadores para a conjuntura que
estamos estudando.

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Caro (a) aluno (a), chegou a hora de estudarmos a contribuição de
Auguste Comte. Comte é considerado, por muitos, fundador da sociologia
e do positivismo, mas, o que é o positivismo? De que maneira Comte
percebe o conhecimento sociológico? É para pensarmos essas questões e
inúmeras outras que tecerei algumas considerações sobre este pensador.
Inicialmente é preciso que entendamos o contexto em que Comte
viveu e que conjunturas eram apresentadas à sociedade europeia naquele
momento. Quando Comte pensa as sociedades ao longo do século XIX, a
Europa vivia um momento de grande efervescência revolucionária, com
a recente revolução Francesa de 1789 e as consequências e adaptações
advindas da Revolução Industrial. Nesse momento histórico, Comte
entende que era necessário olhar de forma metodológica para a sociedade
francesa e europeia, entendia que as revoluções industrial e francesa
1 .4 - Aug usto C o m t e e o Pos it iv is m o ocasionaram uma desfragmentação social e moral, nesse contexto, via
como consequência disso uma série de causas sociais como desemprego,
pobreza, etc.
Para tentar entender tais conjunturas, Comte propõe pensar a
sociedade a partir de uma física social, isto é, pensar a sociedade e seus
aspectos sociais a partir de uma base científica. Assim, a “Sociologia
representava, para Comte, o coroamento da evolução do conhecimento.
Segundo ele, havia uma progressão entre as sete grandes ciências
(Matemática, Astronomia, Física, Química, Biologia, Moral e Sociologia)”
considerando a “Sociologia e a Biologia as mais complexas e concretas”
(TOMAZI, 2010, p. 239).
Observe que Comte nos expõe um novo dimensionar na forma
de compreendermos as sociedades, de acordo com este pensador,
a sociologia deveria ser encarrada enquanto uma ciência no mesmo
patamar que a Biologia.

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Lembre-se sempre que vivíamos naquele período o efervescer de
novas relações econômicas, sociais e culturais a partir da expansão do
sistema capitalista de produção. Portanto, Comte, enquanto sociólogo, está
preocupado em considerar que os indivíduos entendam o funcionamento
da sociedade e consequentemente façam com que a mesma evolua e
alcance o desenvolvimento.
Com base em tais preceitos, Comte propôs que se deve conhecer a
sociedade para antever os fatos e prever possíveis crises, portanto, toda
sociedade deve se autoconhecer para que no processo de evolução e
desenvolvimento se evite crises. Essa forma de interpretar a sociedade é
o que foi chamado de Positivismo, que está ligado ao racionalismo e ao
cientificismo para a evolução e o desenvolvimento da sociedade a partir
do sistema capitalista de produção.
No entendimento de Tomazi, Comte propôs uma mudança completa
da sociedade,
[...] mediante uma reforma intelectual plena do ser humano. A
“filosofia positiva” ou o “positivismo” foi o conjunto de postulados para
modificar, por meio dos novos métodos das ciências daquela época, a
forma de pensamento das pessoas. Consequentemente, haveria uma
reforma das instituições. A Sociologia, ou a “física social”, ao estudar
a sociedade pela análise de seus processos e estruturas, proporia uma
Figura 1.9 - Auguste Comte (1798-1857), considerado o criador da Sociologia e do Positivismo, Comte tinha como
grandes referências a razão e a ciência para se pensar a humanidade e a sua consequente ordem social. reforma prática das instituições (TOMAZI, 2010, p. 239).
Fonte: wikimedia.org
Comte tem como referência de análise as sociedades capitalistas,
portanto, entende que a filosofia positivista deveria apresentar novos
postuladas para a organização dos indivíduos com base no capitalismo,
O fato de Comte ser francês certamente influenciou na sua forma esses novos preceitos seriam constituídos a partir de uma reforma
de ver e entender a sociedade francesa e europeia daquele período. De das instituições. Nessa conjuntura, seu principal raciocínio é que as
acordo com Tomazi, Comte “defendeu em parte o espírito de 1789 e sociedades são constituídas a partir do movimento dinâmico e estático:
criticou a restauração da monarquia, preocupando-se fundamentalmente O movimento dinâmico é o progresso e as etapas necessárias para se
em organizar a nova sociedade, que, no seu entender, estava em ebulição e alcançar o desenvolvimento, ou seja, todas as práticas que buscam o
total caos”. Dessa maneira, o entendimento de Comte era que “a desordem progresso: o trabalho, as relações comerciais, a busca do conhecimento,
e a anarquia” imperavam com base em uma confusão de princípios o aperfeiçoamento profissional, etc.
metafísicos e teológicos e tais princípios “não podiam mais se adequar à
sociedade industrial em expansão” (TOMAZI, 2010, p. 239).

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Já o movimento estático é fundamental para que exista a ordem,
portanto, as leis são fundamentais para que a ordem possa imperar na
sociedade. Um dos exemplos mais significativos do movimento estático
da nossa sociedade é o nosso código jurídico e Constituição de 1988, que
garantem a ordem e a boa convivência da sociedade brasileira ou pelo
menos deveria garantir.
Tomazi lembra ainda que para Comte a sociologia, da mesma maneira
que as ciências da natureza, “deveria sempre procurar a reconciliação
entre os aspectos estáticos e os dinâmicos do mundo ou, na sociedade
humana, entre a ordem e o progresso” sendo que o progresso deveria
estar subordinado a ordem. Sob esta perspectiva, para Comte deveríamos
sempre buscar o progresso, “mas sob o manto da ordem para que não
ocorressem distúrbios e abalos no sistema” (TOMAZI, 2010, p. 239).
Em um exemplo prático, é através do trabalho que a sociedade evolui e
desenvolve-se, para tanto, existe a ordem ou as leis que garantem a boa
Figura 1.10 - A expressão é o lema político do positivismo, forma abreviada do lema religioso positivista formulado pelo
convivência da sociedade. filósofo francês Auguste Comte: "O Amor por princípio e a Ordem por base; o Progresso por fim". Em francês: L'amour
pour principe et l'ordre pour base; le progrès pour but.).
Da mesma forma a ciência, que deveria ser vista enquanto um meio Fonte: Wikipédia.

para o desenvolvimento da sociedade, ou seja, nós estudamos sociologia


para compreendermos melhor a sociedade em que vivemos e para que
possamos melhorar nossas relações sociais e consequentemente evoluir.
Outro importante ponto considerado por Comte é que quanto mais
Comte chegou até a cunhar um lema para o conhecimento positivo,
a sociedade se desenvolve, mais ela se afasta dos preceitos religiosos.
que era: “Conhecer para prever, prever para prover”. Isso significa que
Entretanto, Eva Maria Lakatos faz algumas ressalvas quando trabalha
o conhecimento deveria existir tanto para prever os caminhos que a
o pensamento sociológico/positivista de Comte, de acordo com esta
sociedade deveria seguir, quanto para entendê-la melhor e procurar
autora, “nos seus escritos sobre a sociedade, Comte esteve bem longe de
soluções.
seguir à risca as suas recomendações de ‘positividade’”. Mesmo assim,
Um interessante exemplo para pensarmos a significativa influência que seus estudos tiveram “enorme repercussão, e ainda têm, a atitude que
o pensamento positivista exerceu na sociedade é o lema de nossa Bandeira preconizou quanto ao estudo dos fenômenos sociais, não influenciado
Nacional “Ordem e Progresso”. Esse lema foi instituído em nossa bandeira pela emotividade, mas levado a efeito com a isenção de ânimo, semelhante
a partir da atuação de Benjamin Constant, militar brasileiro adepto do à adotada na Química ou na Física” (LAKATOS, 1990, p. 42).
positivismo e que participou do processo de Proclamação da República
do Brasil. Essa é uma característica marcante das ideias positivistas, elas
acabaram influenciando vários movimentos republicanos.

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Com base nesses preceitos de Comte, a sociedade brasileira, por
Esse é um dos aspectos que evidencia a diferenciação do pensamento exemplo, está constantemente acumulando conhecimento, que é
de Comte, sua forma de pensar o social a partir dos mesmos preceitos constituído tanto a partir do que nos foi ensinado em outras gerações,
de outras ciências como a Física ou a Matemática, procurava pensar os quanto com base nas experiências que são instituídas no presente. Por
fenômenos sociais sem a influência da “emotividade”, procurando uma exemplo, eu, enquanto professor, transfiro esse conhecimento a você
suposta isenção de ânimo na análise social. Evidentemente que essa aluno (a), tanto com base no que outros sociólogos já estudaram sobre
perspectiva foi muito criticada por autores contemporâneos, sobretudo, esse assunto, quanto a partir do que apresento ao observar a sociedade
por considerarem que é muito difícil isentarmos nossos posicionamentos contemporânea, por esse motivo é que o constante progresso do
e postura perante o aspecto social que analisamos. conhecimento é que nos caracteriza enquanto sociedade humana.
De qualquer forma, Lakatos enfatiza que podemos discutir os Por fim, o último princípio básico de Comte é que o “homem é o
estudos de Comte a partir de três princípios básicos. O primeiro deles mesmo por toda a parte e em todos os tempos, em virtude de possuir
é a prioridade do todo sobre as partes, que, segundo Lakatos, pode ser idêntica constituição biológica e sistema cerebral” (LAKATOS, 1990, p.
definido da seguinte maneira: 43). Eu imagino que você deve estar cético (a) em relação a essa afirmação
Prioridade do todo sabre as partes: significa que, para compreender e de Comte, mas, por incrível que pareça, os homens nem sempre foram
explicar um fenômeno social particular, devemos analisá-lo no contexto considerados iguais e em muitos casos ainda hoje são considerados
global a que pertence. Considerava que tanto a Sociologia Estática diferentes. Nos séculos XVIII e XIX, vários pesquisadores desenvolveram
(estudo da ordem das sociedades em determinado momento histórico) estudos que buscavam explicações sobre a relação entre o tamanho do
quanto a Sociologia Dinâmica (estudo da evolução das sociedades no crânio e a inteligência.
tempo) deveriam analisar a sociedade, de uma determinada época, Essa foi inclusive uma prática usada pelos nazistas na Segunda
correlacionando-a a sua História e a História da Humanidade (a Guerra Mundial para justificar uma suposta superioridade ariana, isto é,
Sociologia de Comte e, na realidade, Sociologia Comparada, tendo como o tamanho do crânio dos judeus justificaria o seu extermínio. É evidente
quadro de referência a História Universal) (LAKATOS, 1990, p. 42). que os nazistas não usaram apenas esse parâmetro, mas, esse era um dos
Isso significa que, de acordo com os preceitos de Comte, para que foi utilizado por Adolf Hitler e seus seguidores.
entendermos a nossa sociedade em seus aspectos políticos, econômicos, Mas, mesmo contemporaneamente os homens por terem traços
sociais e culturais, precisamos entender a História de nossa sociedade, diferentes – como a cor da pele – são taxados como inferiores. O exemplo
mais do que isso, compreender o contexto global ou a História da mais próximo a nós é a escravidão negra que aconteceu em nosso país
Humanidade. No entendimento de Comte, somente dessa forma teríamos até fins do século XIX, além do mais, muitos negros ainda sofrem
subsídios para entendermos as conjunturas nas quais estamos inseridos e descriminação em nossa sociedade por terem a cor da pele diferente do
assim consequentemente nos desenvolvermos enquanto sociedade. que a sociedade convencionalmente considera ideal de beleza.
O segundo princípio básico elencado por Comte é que “o progresso
do conhecimento é característico da sociedade humana”. Ou seja, no seu
entendimento, “a sucessão de gerações, com seus conhecimentos, permite
uma acumulação de experiências e de saber que constitui um patrimônio
espiritual objetivo e liga as gerações entre si”. Isso nos quer dizer que
para Comte “existe uma coerência entre o estágio dos conhecimentos e a
organização social” (LAKATOS, 1990, p. 42, 43).

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Lakatos enfatiza que, com base nesses princípios, Comte “concluiu
Por esse motivo, a afirmação de Comte mostra-se extremamente
ser natural que a sociedade, em toda parte, evolua da mesma maneira
relevante, ou seja, nos indica que, por base, todos nós temos “idêntica
e no mesmo sentido, resultando daí que a humanidade em geral
constituição biológica e sistema cerebral”, o que nos faz iguais em todas
caminha para um mesmo tipo de sociedade mais avançada”. Comte
as partes e em todos os tempos. Esse é um conhecimento e uma forma
tem claramente uma perspectiva de análise social calcada na ideia de
de se pensar a sociedade assentada na racionalidade, que nos coloca
evolução e desenvolvimento das sociedades, que concordam com os seus
interessantes pontos para refletirmos de que maneira está organizada
preceitos positivistas. Assim, é com base em tais ideias que Comte institui
nossa sociedade na contemporaneidade.
a “classificação das sociedades denominada ‘A Lei dos três Estados’”
(LAKATOS, 1990, p. 43), que podemos definir a partir de Lakatos da
seguinte maneira:
Estado teológico ou fictício, em que se explicam os diversos fenômenos
através de causas primeiras, em geral personificadas nos deuses. O
Estado Teológico subdivide-se em:
a) fetichismo, em que o homem confere vida, ação e poder
sobrenaturais a seres inanimados e a animais;
b) politeísmo, quando atribui a diversas potências sobrenaturais
ou deuses certos traços da natureza humana (motivações, vícios e
virtudes etc.);
c) monoteísmo, quando se desenvolve a crença num deus único.
Estado metafísico ou abstrato. As causas primeiras são substituídas
por causas mais gerais - as entidades metafisicas -, buscando nestas
entidades abstratas (ideias) explicações sobre a natureza das coisas
e a causa dos acontecimentos.
• Estado positivo ou cientifico. O homem tenta compreender as
relações entre as coisas e os acontecimentos através da observação
Figura 1.12 - Os nazistas promoviam exposições públicas para difundir sua ideologia racial. O cartaz exibido é intitulado científica e do raciocínio, formulando leis; portanto, não mais
“A Biologia do Crescimento”, e sua legenda diz: “Fases de Crescimento de Membros da Raça Nórdica”.
Fonte: United States Holocaust Memorial Museum.
procura conhecer a natureza íntima das coisas e as causas absolutas
(LAKATOS, 1990, p. 43).

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Nessa linha de raciocínio, o sociólogo Eudson de Castro Ferreira,
ao analisar o pensamento sociológico no mundo moderno, enfatiza que
“jamais devemos entender os fatos ou fenômenos sociais como ocorrências
Conforme você pôde notar, o primeiro exemplo de Estado que Comte naturais, como defendem os pensadores positivistas, como querem alguns
define enquanto fundamental para compreendermos o funcionamento fundadores da Sociologia, principalmente, Comte e Spencer”. Note que
das sociedades é o teológico ou fictício, no qual pode-se se explicar para Ferreira os pensadores positivistas, como Comte e tantos outros,
os fenômenos personificados em deuses. De acordo com Lakatos, este “as ocorrências ou fenômenos sociais não são coisas produzidas pelos
“Estado” pode ser dividido em: “fetichismo”, no qual o indivíduo percebe homens em sociedade”. Mas sim, “coisas regidas por leis naturais que, por
a vida a partir do poder e da ação de forças sobrenaturais baseadas em isso mesmo, independem da intervenção das pessoas e, enquanto tais,
seres inanimados ou animais. Além deste, também menciona, enquanto devem ser entendidas e estudadas” (FERREIRA, 2014 p. 14).
pertencente ao primeiro Estado o politeísmo e monoteísmo, que atribuem
sentido à vida a vários deuses – no caso dos politeístas – ou a um único Isso significa que o pensamento positivista está assentado em um
Deus – no caso dos monoteístas. determinismo social, isto é, a maneira como estamos organizados em
relação à nossa economia, à política e até aos nossos valores culturais,
O outro Estado explicitado por Comte é o metafísico ou abstrato, que são regidos por essas “leis naturais”, que independem da nossa
no qual, os indivíduos percebem nas entidades metafísicas ou nestas ação. Ferreira também entende que o pensamento de Comte somente
ideias metafísicas, as explicações sobre a natureza das coisas e como isso foi desenvolvido dessa maneira porque ele estava “comprometido com
interfere nas vivências dos sujeitos. Vamos pensar um exemplo, para o Estado nacional, liberal capitalista, que se consolidava em nome do
os indivíduos que pensam a sociedade a partir destas perspectivas, a ‘progresso’”, dessa maneira, “Comte preocupava-se, contudo, com a
nossa organização social em classes constitui-se a partir de um projeto devassa da guilhotina nos ‘estratos médios’ da sociedade francesa, criando,
de ideias, ou seja, só existe fome, desemprego, pessoas ricas e pobres segundo ele, um ‘desequilíbrio social’ que ameaçava o ‘desenvolvimento
porque o capitalismo assim foi constituído, sendo estas relações fruto de natural’ e o ‘progresso social’” (FERREIRA, 2014 p. 52).
sua forma organizacional.
No entendimento de Ferreira, essa forma de Comte perceber a
Por outro lado, último Estado constituído por Comte é o “Estado organização das sociedades e determinar as chamadas leis naturais para
positivo ou científico”. Neste os indivíduos procuram compreender as o seu funcionamento estão relacionadas ao comprometimento que este
sociedades a partir da observação científica e do “raciocínio”, entretanto, autor tinha com os burgueses e a organização do Estado a partir do
não buscam a natureza íntima ou última das coisas e as suas causas liberalismo econômico. Esse arranjo econômico apresentado aos Estados
absolutas. europeus nos séculos XVIII e XIX está assentado na prosperidade da
Note que Comte tem uma teoria extremamente complexa sobre o burguesia enquanto classe social e a própria evolução do sistema
funcionamento da sociedade e as relações estabelecidas pelos indivíduos. capitalista de produção.
Por esse motivo sua contribuição é fundamental para o desenvolvimento Portanto, no entendimento de Ferreira, essa forma de Comte perceber
sociológico ao longo dos séculos XIX e XX, não é à toa que Comte é a sociedade a partir dos preceitos positivistas está alinhada a burguesia,
considerado por muitos autores como fundador da Sociologia ou do ao Estado liberal capitalista e a formação dos Estados nacionais Europeus.
pensamento sociológico. Por esse motivo, é tão importante o pensamento positivista, já que
esse pensamento considera que a organização da vida social, política e
econômica independe dos indivíduos e são reguladas por leis naturais,
que consequentemente mantêm a nossa boa convivência em sociedade.

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A P R E N DA U M P O U CO M A I S

Mas, evidentemente que o pensamento sociológico não se encerra


Para que você entenda de forma mais apurada o pensamento de Auguste
nesse momento com Comte e os seus seguidores alinhados ao positivismo.
Comte a partir de sua teoria positivista, separei o artigo do sociólogo Gustavo
Assim, em “oposição aos pensadores positivistas, vamos encontrar Biscaia de Lacerda, “Augusto Comte e o ‘Positivismo’ redescobertos”, que
filósofos, historiadores, cientistas e analistas sociais, históricos críticos contextualizará o que você aprendeu nesse item, além de trazer aspectos
e dialéticos”, dentre os nomes de destaque podemos elencar: “Marx, novos que não tivemos tempo de trabalhar nesse momento. Clique no link
Engels, Lênin, Lukács, Gramsci, Goldmann, Perry Anderson, Florestan indicado a seguir e leia o artigo. O conteúdo é simples e claro, o que facilitará
sua compreensão. Não se esqueça de fazer suas anotações sobre o que
Fernandes, Hobsbawm, E. P. Thompson, entre outros” (FERREIRA, 2014
aprendeu.
p. 15).
Disponível em:
Esse grupo de pensadores, bem como inúmeros outros que ainda
veremos ao longo de nosso estudo, “defendem serem os fatos ou
fenômenos sociais, produtos ou resultados, conflitantes ou não, das ações
das pessoas que vivem em diferentes classes, grupos e segmentos sociais”
(FERREIRA, 2014 p. 15). Ou seja, esses pensadores entendem que não é
o determinismo social que rege a nossa organização em sociedade, mas
Augusto Comte e o “Positivismo” Redescobertos
sim, as ações dos indivíduos em suas diferentes classes sociais.
Tais estudiosos recolocam o protagonismo dos indivíduos na
organização social, entendem que são “pessoas, segmentos, grupos e
classes sociais que interagem e atuam em diferentes sociedades concretas
e, historicamente, localizadas. Estas sociedades e situações concretas
devem ser estudadas, fazendo história” e consequentemente o pensamento
sociológico (FERREIRA, 2014 p. 15). N A P R ÁTI C A
Evidentemente que exploraremos essas questões ao longo do nosso
conteúdo, apresentei rapidamente as mesmas nesse momento para que
tenha uma comparação sobre de que maneira Comte expõe seu pensamento Vamos colocar em prática o que aprendemos neste tópico?
sociológico positivista e em que medida outros sociólogos, historiadores Você deve ter notado que o pensamento sociológico de Comte ao mesmo
e filósofos se opõem a Comte. Portanto, não deixe de explorar os demais tempo em que é inovador e criador da sociologia, também foi muito
conteúdos e unidades de nossa disciplina de sociologia, certamente ainda contestado por estudiosos da contemporaneidade. Dessa maneira, você
considera Comte um crítico ou defensor do sistema capitalista de produção e
temos muito que aprender.
do liberalismo? Além disso, o positivismo comtiano contém os pré-requisitos
para o desenvolvimento da sociedade democrática? Tente colocar em prática
o que aprendemos ao responder esses questionamentos.

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O QUE APRENDEMOS REFERÊNCIAS

Que bom que você acompanhou nosso conteúdo até o final! Certamente
DURKHEIM, É. Da divisão do trabalho social. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes,
aprendemos muitas coisas nesta primeira unidade, mas, ainda temos 2004.
muito que aprender nas próximas. Por hora eu quero apenas lembrar
você que o objetivo desta Unidade 1 foi introduzir os conhecimentos FERREIRA, E. de C. Introdução à Sociologia. 3ª ed. Brasília, DF: Confederação
sociológicos, ou seja, pensar tanto a origem do pensamento sociológico, Nacional dos Trabalhadores em Educação, 2014.

a partir de alguns pensadores, bem como os seus principais preceitos e LACERDA, G. B. de. Augusto Comte e o “Positivismo” redescobertos. Revista
pressupostos para entendermos a sociedade em que vivemos, bem como de Sociologia e Política. Curitiba, v.17, n.34, 2009.
as demais sociedades. Dessa maneira, os temas abordados foram:
LAKATOS, E. M. Sociologia Geral. 6. ed. São Paulo: Atlas, 1990.
• Pressupostos, origem e desenvolvimento.
MAIA, J. M. E. História da sociologia como campo de pesquisa e algumas
• O indivíduo, a sociedade e a socialização. tendências recentes do pensamento social brasileiro. História, Ciências, Saúde
– Manguinhos. Rio de Janeiro, v.24, n.1, jan-mar. 2017.

• Uma ciência da sociedade. MARX, K. O capital: Crítica da economia política. Livro I (1867): O processo de
produção do capital. Trad. Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013.
• Augusto Comte e o positivismo.
TOMAZI, N. D. Sociologia. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
Com base em tais pressupostos, em nossa próxima unidade
WEBER, M. Economia e Sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva.
trabalharemos algumas das abordagens consideradas clássica no
Brasília: Universidade de Brasília, 2009.
pensamento sociológico, o que não só facilitará a sua compreensão sobre
o desenvolvimento da Sociologia, como também nos dará novos subsídios WEBER, M. A ética protestante e o espírito do capitalismo. Companhia das
para compreender a sociedade contemporânea. Letras: São Paulo, 2004.

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